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3. APLICAÇÃO DO ART 139, INCISO IV, DO CPC/15 NAS OBRIGAÇÕES

3.4 LIMITES E ALCANCES DA APLICAÇÃO DAS MEDIDAS ATÍPICAS NAS

3.4.3 Vontade do credor e o papel do magistrado

O sincretismo processual não alterou a necessidade da parte autora provocar o Judiciário para dar andamento a fase de cumprimento de sentença. De modo ainda mais lógico, a execução de alimentos exige o requerimento do exequente para que o Juízo possa dar início à execução de título extrajudicial.

A partir da análise do art. 528, caput e §8º, do CPC/15, observa-se que o rito do cumprimento de sentença que reconhece a exigibilidade de obrigação de prestar alimentos é condicionado ao requerimento do exequente, além disso, nota-se que a ele é oportunizado a propositura do cumprimento de sentença ou da decisão nos moldes do que dispõe o Livro I, Título II, Capítulo III, do diploma processual, denominado “Do cumprimento definitivo da sentença que reconhece a exigibilidade de obrigação de pagar quantia certa”, hipótese em que a decretação da prisão civil seria totalmente rechaçada.

Nessa toada, não se observa nenhuma prevalência legal entre os ritos acima dispostos, de sorte que eventual omissão do exequente quanto ao rito desejado impede o uso da medida típica da prisão por ser condicionada ao requerimento do exequente. Mesmo se assim não fosse, caberia a aplicação dos princípios norteadores do Direito, sobretudo o da menor onerosidade (art. 805, do CPC/15), de modo que presumir-se-ia a impossibilidade da aplicação da prisão civil.

Por sua vez, o Livro II, Título II, Capítulo VI, do CPC/15 traz as diretrizes acerca da execução de alimentos. Frisa-se, neste quadrante, o que dispõe o art. 913 do aludido diploma:

Art. 913. Não requerida a execução nos termos deste Capítulo, observar-se-á o disposto no art. 824 e seguintes, com a ressalva de que, recaindo a penhora em

29 Esse entendimento é o sustentado pela Terceira Turma do STJ, conforme análise do REsp. 1.782.418 - RJ

(2018⁄0313595-7). (STJ - REsp: 1782418 RJ 2018/0313595-7, Relator: Ministra NANCY ANDRIGHI, Data de Julgamento: 23/04/2019, T3 - TERCEIRA TURMA, Data de Publicação: DJe 26/04/2019)

dinheiro, a concessão de efeito suspensivo aos embargos à execução não obsta a que o exequente levante mensalmente a importância da prestação.

Perceba, portanto, que o próprio CPC/15 estabeleceu como ordinário para a efetivação das obrigações alimentícias o meio expropriatório, previsto no art. 824 e seguintes da legislação processual. Deixando ainda mais evidente que a prisão civil somente incidirá quando, expressamente, o exequente deixar claro a adoção deste rito.

Nesse sentir, a prisão civil, além de só existir como medida típica (conforme já demonstrado), somente pode ser decretada face à eventual requerimento da parte exequente.

Ainda sob a vigência do Código de Processo Civil de 1973, a Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça, tendo como Relator o Ministro Massami Uyeda, em sede de Habeas Corpus (Nº 128.229 - SP), assentou o entendimento pela inviabilidade da decretação de ofício da prisão civil do devedor de alimentos, sob o fundamento de que restando ausente a manifestação pelo exequente, maior interessado no crédito, pela via executória da prisão civil, não cabe ao magistrado tomar pra si essa decisão. Em esclarecedor trecho do seu voto, dispõe o que segue:

Não se concebe, contudo, que a exequente da verba alimentar, maior interessada na satisfação de seu crédito e que detém efetivamente legitimidade para propor os meios executivos que entenda conveniente, seja compelida a adotar procedimento mais gravoso para com o executado, do qual não se utilizou voluntariamente, muitas vezes para não arrefecer ainda mais os laços de afetividade, já comprometidos com a necessária intervenção do Poder Judiciário, ou por qualquer outra razão que assim repute relevante (BRASIL, 2009).

Mesmo com o advento da Lei nº 13.105/15, embora diversas mudanças tenham aparecido, o fundamento de validade da decisão permanece contemporâneo.

Outros questionamentos, todavia, surgem: supondo que a prisão civil seja a vontade do exequente, pode o juiz determinar medida atípica de ofício? Requerendo medida atípica, é possível a aplicação de outra medida ex officio?

Em consonância com o que já foi ventilado neste trabalho, advoga-se pela sobreposição da vontade do credor quando este solicita a aplicação de medida típica, em virtude do seu caráter ordinário.

Nesse sentido, Vieira dispõe que, na hipótese de pedido de prisão do devedor de prestação alimentícia, não pode o órgão jurisdicional se abster do que foi requerido (VIEIRA, 2018, p. 466). Talamini, por sua vez, afirma que uma vez requerida a prisão civil pelo exequente, pode o magistrado aplicar medida atípica, desde que aliada a medida típica ora requerida (TALAMINI, 2018, p. 53).

Assis, outrossim, impõe que “deixou a lei ao juiz, na execução, vários e grandes espaços para uso de liberdades discricionárias”. Contudo, uma vez externada a vontade do exequente pela via do crédito alimentar pelo rito da prisão civil, não pode o magistrado se furtar de aplica- la e definir a via da expropriação. Além disso, como está adstrito a vontade do credor, caso a inicial não expresse sua intenção, deverá conceder prazo para a emenda a inicial, persistindo o vício, a rejeitará (ASSIS, 2016, p. 77).

Convém realçar que pode o magistrado designar audiência no processo executivo (com espeque no art. 772, I, do CPC/15), antes de aplicar os meios coercitivos, com o fito de que as partes conversem e possam encontrar a melhor forma de efetivar o ato decisório ou o título extrajudicial ou, simplesmente, no afã de alertar o devedor sobre o que está por vir - acentuando- se, assim, o caráter coercitivo da medida.

Nesse toar, caso o magistrado, compulsando os autos, observe a existência de medida atípica potencialmente menos onerosa e de efetividade similar ao encarceramento, pode levantar essa alternativa na audiência antes de aplicar o meio típico, cuja substituição dependerá da vontade do exequente. Relembra-se que o processo se fundamenta em um modelo cooperativo e de fortalecimento democrático.

Basta pensar na inviabilidade que uma prisão civil pode acarretar no pagamento da pensão nos casos em que esta via possa ensejar o desemprego do devedor ou, até mesmo, ocasionar a impossibilidade de pagamento dos alimentos durante o período em cárcere.

No caso de requerimento de medida atípica, a partir da leitura dos artigos 139, inciso IV, art. 318, parágrafo único, art. 536, §1º e art. 497, todos do Código de Processo Civil, abstrai- se a percepção da possibilidade do magistrado ordenar medida atípica diversa de ofício.

Frisa-se que a decretação de medida executiva atípica sem o requerimento da parte exequente implica em redobrado zelo do magistrado em fazer efetivar as normas que norteiam o Código de Processo Civil e a ordem jurídica, com destaque para o que aduz o art. 8º do CPC/15.

O enunciado nº 396 do Fórum Permanente de Processualistas Civis expõe entendimento similar. 30

Embasando-se no que afirma o alusivo enunciado, assim como no que diz o art. 8º do CPC/15, Benedito Crezzo Pereira Filho apud Pereira entende que o magistrado não pode atuar de forma engessada, de sorte que pode aplicar medida executória diversa da requerida pela parte

30 Enunciado 396, FPPC. (art. 139, IV; art. 8º) As medidas do inciso IV do art. 139 podem ser determinadas de

interessada, não devendo se limitar a intensidade da medida ou a natureza da técnica solicitada (PEREIRA, 2018, p. 288).

Ademais, o pedido de medida atípica realizado pelo exequente não está abarcado pelo princípio da congruência, de modo que o órgão jurisdicional pode determinar técnica diversa da pleiteada na exordial (VIEIRA, 2018, p. 466).

Analisando ambas as teses doutrinárias, percebe-se que a aplicação de medidas atípicas de ofício não fere o que restou disciplinado no diploma processual, tendo em vista que a finalidade de sua aplicação reside em dar efetividade a demanda, e, principalmente, porque a aplicação de medidas atípicas ex officio é amparada pelo ordenamento jurídico.

Para tanto, com base no critério da proporcionalidade (art. 8º, CPC/15), da razoabilidade (art. 8º, CPC/15), da menor onerosidade (art. 805, CPC/15) e da eficiência (art. 8º, CPC/15), pode o magistrado adotar medida diversa da requerida, desde que sua decisão seja devidamente fundamentada, apontando as razões pelas quais determinada medida foi escolhida, como também os motivos de não ter acolhido o meio apontado pelo exequente.

Outrossim, rememora-se que não é admissível a atuação do magistrado em desrespeito ao contraditório, mesmo que diferido, devendo sempre oportunizar às partes o direito de se manifestar, mesmo tratando-se de matéria que deva decidir de ofício, conforme dispõe o art. 10, CPC/1531.

No que se refere ao credor, entendendo que os ônus da execução, caso frustrada, serão suportados por ele, antes da aplicação do meio executório, deverá o magistrado intimá-lo para deixa-lo ciente sobre os fundamentos da sua escolha e oportuniza-lo prazo razoável para manifestação.

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