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Foto 15 Uso misto

1.4 Instrumentos da Política Urbana

1.4.4 Zonas especiais de interesse social – ZEIS

O Estatuto da Cidade75 trouxe importantes instrumentos para o reconhecimento das diferentes ocupações e garantir a recuperação das áreas e elevação das condições urbanísticas e habitacionais da população. Um dos instrumentos mais consolidado foi as ZEIS.

As ZEIS foram definidas pelo art. 46 da Lei 11.977, inciso V, como:

V – Zona Especial de interesse social - ZEIS: parcela de área urbana instituída pelo Plano Diretor ou definida por outra lei municipal, destinada predominantemente à moradia de população de baixa renda e sujeita a regras específicas de parcelamento, uso e ocupação do solo;

Com base no artigo supracitado, observa-se que as ZEIS são zonas definidas no âmbito da competência municipal, dentro das quais é permitido o estabelecimento de regras especiais de uso e de ocupação do solo em áreas destinadas para população de baixa renda. Gazola (2008) entende que, dentro dos instrumentos urbanísticos contidos nos planos diretores, a ZEIS merece destaque por permitir a

fixação de índices urbanísticos especiais para viabilizar a compatibilização da realidade fática com as normas de parcelamento do solo, assim como as normas edilícias, porquanto em muitas áreas urbanas decorrentes de ocupações desordenadas não é possível a adequação da realidade aos índices comumente utilizados no resto da cidade (GAZOLA, 2008, p.88).

75É o oportuno informar que, antes mesmo do Estatuto da Cidade, alguns municípios brasileiros75 já haviam implementado as ZEIS, vinculando-a, principalmente, a programas de regularização fundiária em favelas. Conforme Dias (2008), a experiência de Belo Horizonte (MG), com o projeto Profavela e, mais especialmente, a de Recife (PE), com a criação em 1983 das ZEIS e do Plano de Regularização das Zonas de Especial interesse social (Prezeis), tornaram-se referência para as demais cidades brasileiras.

Meirelles ressalta que

Não se trata de criar privilégios para os economicamente fracos, nem de conferir- lhes menos garantias de salubridade e segurança, mas, sim, de aplicar o Direito com razoabilidade, promovendo um contemperamento entre os diversos objetivos e valores constitucionalmente consagrados. (MEIRELLES, 2005, p.163)

As ZEIS podem ter os seguintes objetivos:

i. Estabelecer condições urbanísticas especiais para urbanização e regularização fundiária dos assentamentos precários;

ii. Ampliar a oferta de terra para produção de habitação de interesse social (HIS); iii. Estimular e garantir a participação da população em todas as etapas de implementação. (Ministério das Cidades, 2009, p.17)

Segundo o Ministério das Cidades (2004, p.83), as ZEIS são classificadas de acordo com as características de uso e ocupação da área urbana, podendo ser:

- Terrenos públicos ou particulares ocupados por favelas, por população de baixa renda ou por assentamentos assemelhados, em relação aos quais haja interesse público em promover a urbanização ou a regularização jurídica da posse da terra; - Loteamentos irregulares que, por suas características, coloca-se o interesse público na promoção da regularização jurídica do parcelamento, na complementação da infraestrutura urbana ou dos equipamentos comunitários, bem como na recuperação ambiental;

- Terrenos não edificados, subutilizados ou não edificados, necessários à implantação de programas habitacionais de interesse social. Para garantir a destinação das ZEIS, o Executivo municipal deverá constitui programas de intervenção, tais como a urbanização e regularização fundiária de lotes urbanizados e a construção de moradias populares.

De modo geral, as ZEIS são basicamente divididas em duas tipologias, em terrenos ocupados por assentamentos precários e terrenos vazios, subutilizados ou não utilizados.76 Assim, as ZEIS dão suporte aos processos de regularização fundiária e são destinadas

primordialmente à produção e manutenção da habitação de interesse social. Visam a incorporar os espaços urbanos da cidade clandestina: favelas, assentamentos urbanos populares, loteamentos irregulares e habitações coletivas (cortiços), à cidade legal. Por esse instrumento, fica reconhecido pela ordem jurídica da cidade, que para atender à sua função social, as áreas ocupadas pela comunidade de baixa renda devem ser utilizadas para fins de habitação de interesse social. (MINISTÉRIO DAS CIDADES, 2004, p. 83)

Tal instrumento possibilitou “a simplificação de normas de parcelamento, a redução das áreas mínimas dos lotes e a proibição de que fossem remembrados” (BASSUL,

76Em relação às ZEIS de vazios, por entender que se tratava de áreas estratégicas para potencializar os efeitos do Programa Minha Casa e Minha Vida, o Ministério das Cidades publicou o “Guia para Delimitação e Regulamentação de zonas especiais de interesse social – ZEIS em Vazios Urbanos” (2009), contendo as etapas e procedimentos do processo de criação, regulamentação e implementação das ZEIS de vazios.

2004, p.63), o que afastou, em parte, a cobiça do mercado, sendo, assim, capaz de atenuar o processo de periferização da população de baixa renda, bem como possibilitou a oferta de lotes para a população de baixa renda ou a criação de estoque de terras para construção de moradias populares.

A instituição da ZEIS retira a área do mercado para outros usos, o que consequentemente implica na redução do preço e na garantia da permanência das famílias no local, sendo, assim, um importante instrumento no combate à especulação imobiliária77. Conforme Saule Jr., com a adoção de normas especiais com restrições urbanísticas para empreendimentos imobiliários, “busca-se preservar a forma de apropriação do espaço pelos ocupantes e viabilizar a permanência da população em locais centrais e privilegiados da cidade.” (SAULE JUNIOR, 2004, p.366).

Conforme Miranda e Moraes (2007), a ZEIS pode ser vista como instrumento de regulação e de regularização.

A Zeis está prevista como um dos instrumentos de regularização fundiária na Lei do Parcelamento do Solo Urbano (Lei 9.785 de 29/01/99), que altera a Lei 6.766/79 em seu artigo 3o, acrescentando o § 6o no artigo 2o e no Estatuto da Cidade (alínea “f”, do inciso V do artigo 4o).

A Zeis se constitui, a princípio, num instrumento de regulação e controle do uso e ocupação do solo, a partir da previsão de parâmetros urbanísticos, dimensões máximas das áreas dos lotes para novos parcelamentos ou resultantes de remembramentos, inibindo, assim, os interesses dos empreendedores imobiliários e comerciais. (MIRANDA; MORAES, 2007, p.417).

Pinho78 (2003, p.250) também tem tal entendimento, quando afirma que

a regulação da habitação popular de interesse social, ainda nos casos das leis instituidoras de ZEIS/AEIS, com normas destinadas às favelas, traz também instrumentos voltados à fixação de parâmetros para a regularização do parcelamento, uso e ocupação do solo na forma em que se encontram os assentamentos. São estabelecidas restrições para os núcleos, onde são aplicadas depois de concluídas a urbanização e a regularização jurídica da propriedade. Referem-se ao reparcelamento dos lotes, quase sempre fixando os tamanhos máximos possíveis, prevendo dilatadas taxas de ocupação, dispensando recuos e áreas de permeabilidade no interior do lote, ou seja, possibilitando uma alta densidade construtiva no interior dos assentamentos. Do ponto de vista da regulação de uso, são comuns as restrições

77Por ser um instrumento de combate à valorização imobiliária, as ZEIS são de difícil implementação, tendo em vista que são objeto de disputa entre os grupos da sociedade (tanto na definição das áreas, quanto do grau de flexibilização dos parâmetros).

78Pinho (2003, p. 252) neste estudo faz uma reflexão acerca das restrições relativas aos lotes e usos. Ela entende que tais restrições são feitas para evitar a expulsão indireta dos moradores, no entanto, ela ressalta que são poucas as avaliações existentes sobre os locais que já passaram por processo de urbanização e regularização jurídica, assim não se consegue saber se de fato as limitações auxiliaram a contenção do processo de substituição das populações moradoras, até porque, para isso seria necessário uma política de controle urbano eficaz. Neste estudo, a autora também questionou, em relação à implantação de novas unidades habitacionais, até que ponto os parâmetros podem ser flexibilizados sem impedir a boa qualidade do projeto. Ela cita que os conjuntos são construídos sem a reserva pública, sem equipamentos e sistema viário e com dimensões reduzidas.

aos usos não residenciais, exceto quando conjugados ao uso residencial, ensejando habitações de uso misto.

Este instrumento, conforme Lauermann e Wienke (200-, p. 01), na medida que reconhece a “diversidade das ocupações existentes na cidade, abandona a tendência homogeneizante até então adotada e possibilita a atuação do Poder Público de forma direcionada às necessidades de cada zona específica (...)” e estabelece normas diferenciadas de uso e ocupação do solo.

As ZEIS permitem parâmetros diferenciados relacionados aos atributos edilícios e de infraestrutura, permitindo, por exemplo, vias mais estreitas, maior densidade, menor porcentagem de áreas comuns, supressão de recuos, entre outros. Dias (2008) cita que a experiência em alguns municípios já demonstrou que a legislação da ZEIS deve possibilitar, além da flexibilidade da dimensão do lote:

(i) a verticalização das construções, com a instituição de lotes condominiais; (ii) a destinação de lotes do parcelamento aprovado à implantação de unidades econômicas, além das usuais unidades residenciais ou mistas; (iii) a execução, pela municipalidade, de obras em áreas particulares, mediante contrapartida do proprietário em áreas no município ou em moeda corrente; (iv) a admissão da venda (e não apenas da concessão) dos lotes de parcelamento em terras públicas municipais. (DIAS, 2008, p.147)

O art.5, da Resolução no 34 do Conselho Nacional das Cidades de 1º de julho de 2005, quando trata a instituição das ZEIS, considerando o interesse local, entende que deverá ter os seguintes procedimentos:

(…) III – demarcar as áreas sujeitas a inundações e deslizamentos, bem como as áreas que apresentem risco à vida e à saúde; IV – demarcar os assentamentos irregulares ocupados por população de baixa renda para a implementação da política de regularização fundiária; V – definir normas especiais de uso, ocupação e edificação adequadas à regularização fundiária, à titulação de assentamentos informais de baixa renda e à produção de habitação de interesse social, onde couber; VI – definir os instrumentos de regularização fundiária, de produção de habitação de interesse social e de participação das comunidades na gestão das áreas; […]

Assim, a demarcação das ZEIS perpassa pela delimitação do perímetro da área, critérios para regularização e diretrizes para estabelecimento das normas de parcelamento, uso do solo e de edificação e definição dos instrumentos jurídicos que poderão ser utilizados para a legalização das áreas.