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Composição/apreciação dos dados

2.4 Caminhos, estratégias e instrumentos de pesquisa

2.4.4 Composição/apreciação dos dados

Os estímulos e as proposições apresentados ao grupo tendem a quebrar as barreiras geradas por timidez, melhorar o entendimento das intenções do que se traz como questionamento ou problemática, ativar ideias e sentidos e, desse modo, aproximar os sujeitos do objeto posto em discussão. Tais estímulos referem-se a atividades didáticas, aliadas a questões postas ao grupo de docentes alfabetizadoras durante o Grupo Focal. Esses estímulos encontram-se na seção de anexos deste trabalho, constituindo o rol de Apêndices.

Sob esse olhar, a análise e a apreciação dos dados se delineia num intuito descritivo e atributivo de sentido, sem que tenhamos a pretensão de atingir a um grau idealizado de fidedignidade, isto é, sem que se creia que existe uma resposta ou interpretação legítima. O nosso objetivo é buscar em palavras, ideias, conceitos, frases e expressões que se mostrem recorrentes ou inusitadas no texto produzido a partir das falas emitidas pelos sujeitos, quando da elaboração dos planos de aula, bem como da aplicação da entrevista e do grupo focal, unidades de sentido que se constituam como categorias, as quais devem se configurar enquanto rubricas ou conceitos-chave para a construção de um parecer descritivo-analítico.

A interpretação é uma etapa importantíssima da pesquisa qualitativa, especialmente quando se faz uso da Análise do Conteúdo. Acerca disso, Moraes (1999, p. 9-10) nos diz:

O termo interpretação está mais associado à pesquisa qualitativa, ainda que não ausente na abordagem quantitativa. Liga-se ao movimento de procura de compreensão. Toda leitura de um texto constitui-se numa interpretação. Entretanto, o analista de conteúdo exercita com maior profundidade este esforço de interpretação e o faz não só sobre conteúdos manifestos pelos autores, como também sobre os latentes, sejam eles ocultados consciente ou inconscientemente pelos autores.

Por isso, é relevante que tenhamos cautela na construção dos pareceres de apreciação e análise do corpus, uma vez que propomos como uma das etapas da coleta de dados a realização de um Grupo Focal, técnica de coleta que não visa a uma busca por consensos, mas sobre pontos de vista do grupo e não sobre opiniões individuais.

Ao propor a Análise do Conteúdo como técnica e/ou metodologia de apreciação de dados, Bardin (1977) sugere uma composição do corpus por intermédio da busca de unidades de sentido no texto, através de pontos de vista, colocações e temas que os autores evocam com mais evidência em sua tessitura. A recuperação de unidades temáticas no texto de forma categorial foi o caminho por onde trilhamos em nossa análise.

Formar categorias que englobem as temáticas mais recorrentes e significativas é uma atitude essencial para proceder à Análise do Conteúdo. Segundo Bardin (1977, apud Oliveira, 2008, p. 571) a análise categorial considera a totalidade do texto na análise, passando-o por um crivo de classificação e de quantificação, segundo a freqüência de presença ou ausência de itens de sentido. É um método de gavetas ou de rubricas significativas que permitem a classificação dos elementos de significação constitutivos da mensagem.

Esmiuçando o processo de categorização, Moraes (1999, p. 6) assim o descreve:

A categorização é um procedimento de agrupar dados considerando a parte comum existente entre eles. Classifica-se por semelhança ou analogia, segundo critérios previamente estabelecidos ou definidos no processo. Estes critérios podem ser semânticos, originando categorias temáticas. Podem ser sintáticos definindo-se categorias a partir de verbos, adjetivos, substantivos, etc. As categorias podem ainda ser constituídas a partir de critérios léxicos, com ênfase nas palavras e seus sentidos ou podem ser fundadas em critérios expressivos focalizando em problemas de linguagem. Cada conjunto de categorias, entretanto, deve fundamentar-se em apenas um destes critérios.

Desse modo, categorizar pressupõe a “classificação dos elementos de uma mensagem seguindo determinados critérios. Ela facilita a análise da informação, mas deve fundamentar- se numa definição precisa do problema, dos objetivos e dos elementos utilizados na análise de conteúdo” (MORAES, 1999, p. 7).

As categorias dão ao pesquisador a possibilidade de fazer recortes do texto, sem perder seus possíveis sentidos. Entretanto, não pretendemos destacar por intermédio das categorias posições que denotassem apenas convergências de opinião, já que o Grupo Focal busca a construção de posicionamentos do grupo, o qual é tecido por uma diversidade de experiências e pontos de vista. Nosso objetivo foi, por meio das unidades de sentido, construir uma análise descritivo-interpretativa dos registros resultantes da aplicação dos 2 instrumentos de coleta de dados propostos.

As etapas para realização da apreciação do corpus, conforme indicam alguns teóricos da análise do conteúdo, foram seguidas por nós, a partir daquelas indicadas por Oliveira (2008):

1. Pré-análise - etapa em que se desenvolvem as operações preparatórias, tais como escolha dos documentos, formulação das hipóteses e dos objetivos e elaboração dos indicadores que oferecem fundamento à interpretação final;

2. Exploração do material ou codificação – nessa etapa acontece o processo de transformação dos dados brutos em unidades que permitem uma descrição das características pertinentes ao conteúdo expresso pelo texto;

3. Inferência e interpretação ou tratamento dos resultados - o objetivo dessa etapa é colocar em relevo as informações fornecidas pela análise, através de quantificação simples (frequência) ou mais complexas como a análise fatorial, permitindo apresentar os dados em diagramas, figuras, modelos etc.

Como já foi dito anteriormente, nossa análise se centrou nos referentes linguísticos em seus possíveis sentidos no texto, levando em conta a freqüência maior ou menor de sua ocorrência. Com efeito, o nosso caminho se delineou a partir das três (3) etapas sugeridas

anteriormente, destacando a nossa consciência sobre o uso capacidade de inferir como recurso de interpretação, considerando que, numa pesquisa de cunho qualitativo, não se trabalha com vistas a legitimar uma opinião, um saber ou ponto de vista, mas de ver cada parecer construído, cada atribuição de sentido, como uma possibilidade entre muitas outras que poderiam ser consideradas em função dos contextos e dos sujeitos constituintes do universo da pesquisa, dentre eles, o pesquisador.

Para Bardin (1977, apud, Oliveira, 2008, p. 571) inferência consiste numa

[...] operação lógica através da qual admite-se uma proposição em virtude da sua ligação com outras proposições já aceitas como verdadeiras. A intenção maior da Análise do Conteúdo é a inferência de conhecimentos relativos às condições de produção e de recepção de uma mensagem, inferência esta que recorre a indicadores relativos ao texto.

Portanto, a nossa capacidade inferencial foi uma das habilidades que precisou estar em ação ao longo da análise e apreciação dos dados, posto que inferir implica atribuir sentidos nem sempre explícitos no texto, habilidade essa muito útil em pesquisa de cunho qualitativo, na qual o processo deve prevalecer sobre o produto. Essa inferência se constitui, segundo Bardin (1977), enquanto momento da intuição, quando se opera a análise reflexiva e crítica.

A inferência exige que o pesquisador esteja atento ao texto que se constitui como documento, sem, no entanto, desconsiderar o contexto onde se dá a vivência dos sujeitos; é imprescindível que, de certo modo, conheça que ideias e concepções condicionam seu pensamento e suas ações, saiba que saberes, valores e aspirações pautam seu ideário de vida, enfim, faz-se necessário ter um perfil traçado acerca dos sujeitos, é preciso sair do lugar comum, daquilo que é objetivo e aparente.

Nesse sentido, Triviños (1987, p. 162) afirma:

Não é possível que o pesquisador detenha sua atenção exclusivamente no conteúdo manifesto dos documentos. Ele deve aprofundar sua análise, tratando de desvendar o conteúdo latente (grifos nossos) que eles possuem. [...] Os investigadores que só ficam no conteúdo manifesto dos documentos seguramente pertencem à linha positivista.

O Plano Semanal de Aula e os registros resultantes do Grupo Focal não podiam nem deveriam se tornar meros documentos, após seu registro, afinal, são frutos de sujeitos com saberes e experiências pessoais e profissionais específicos e, apesar de na Análise do Conteúdo se ter como um dos princípios norteadores buscar caracteres comuns dentro de um

conjunto de textos (categorias), nenhum texto pode prescindir ao contexto, sobretudo à situação de seu autor no tempo e no espaço. Pensar nesse aspecto inferencial, quando se pretende analisar conteúdo, implica considerar que Bardin (1977), embora partilhe da necessidade de o pesquisador seguir certas etapas para a construção da análise dos dados, sempre expressou sua rejeição por essa ideia de rigidez e de pretensa completude de tais regras.

O autor evidencia que a sua proposta de Análise de Conteúdo oscila entre dois pólos - o da investigação científica, o qual expressa o rigor da objetividade, da cientificidade, e o da riqueza da subjetividade, onde, a nosso ver, as inferências se mostram bastante fecundas. Sob essa compreensão, a técnica tem como propósito o ultrapassar do senso comum do subjetivismo e o alcançar do rigor científico necessário, mas não a rigidez inválida, que não condiz mais com tempos atuais.

3 ALFABETIZAÇÃO NA BERLINDA: DISCUTINDO OS SENTIDOS DAS CONCEPÇÕES E PRÁTICAS

Este capítulo compõe as bases teóricas da presente pesquisa e intenciona discutir a alfabetização em suas múltiplas facetas, abordando seu papel numa sociedade onde a escrita e a leitura são crescentemente exigidas como tecnologias que auxiliam os sujeitos na sua compreensão e inserção na realidade circundante e global. A intenção desse é problematizar como as compreensões e modelos paradigmáticos implicam sobre a aprendizagem da linguagem escrita na infância. Todo o seu conteúdo gira em torno da necessidade de explicitar a alfabetização em seus contornos práticos e teóricos, por entendermos que esse é um conceito-chave no delineamento da pesquisa que ora expomos.