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Importância de ser alfabetizado numa sociedade altamente letrada

3 ALFABETIZAÇÃO NA BERLINDA: DISCUTINDO OS SENTIDOS DAS CONCEPÇÕES E PRÁTICAS

Este capítulo compõe as bases teóricas da presente pesquisa e intenciona discutir a alfabetização em suas múltiplas facetas, abordando seu papel numa sociedade onde a escrita e a leitura são crescentemente exigidas como tecnologias que auxiliam os sujeitos na sua compreensão e inserção na realidade circundante e global. A intenção desse é problematizar como as compreensões e modelos paradigmáticos implicam sobre a aprendizagem da linguagem escrita na infância. Todo o seu conteúdo gira em torno da necessidade de explicitar a alfabetização em seus contornos práticos e teóricos, por entendermos que esse é um conceito-chave no delineamento da pesquisa que ora expomos.

conhecimentos. Sendo assim, esse modelo de sociedade, pautado sobremaneira no uso da oralidade, não colocava como imperativo a necessidade de saber ler e escrever para promover a troca de idéias e de opiniões, ou seja, não se utilizava a escrita e a leitura como atualmente.

Acerca disso, Corti e Vóvio (2007) afirmam:

Durante um longo período da história brasileira, a palavra escrita não estava tão presente no dia-a-dia da grande maioria das pessoas. Elas construíam sua vida, trabalhavam, participavam de partidos políticos, aprendiam, ensinavam os filhos, se comunicavam e trocavam informações de outras maneiras. Para muitas dessas pessoas, os conhecimentos e as informações, assim como as competências ligadas ao trabalho, eram aprendidas através da comunicação oral e do contato prático com as atividades produtivas, Ou seja, na sociedade brasileira do passado, a oralidade era central. (CORTI e VÓVIO, 2007, p.17).

Hoje, contudo, as necessidades são diversificadas e muito efêmeras, os registros são elementos partícipes e integradores das relações sociais e, por isso, documentar compõe grande parte das atividades desenvolvidas desde a vida pessoal e doméstica, até a vida profissional. Dominar a escrita e a leitura, todavia, não é o bastante para que o indivíduo faça um uso produtivo desse saber, afinal, é necessário que se consiga utilizar todas as possibilidades interativas que a linguagem põe à disposição dos indivíduos e das sociedades para que se desenvolvam e se compreendam frente às complexidades deste mundo tão diverso e transitório.

É nesse sentido que defendemos anteriormente o imbricamento, o caráter complementar que existe entre alfabetização e letramento, já que para Magda Soares (1998, p.

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Alfabetizar e letrar são duas ações distintas, mas não inseparáveis, ao contrário: o ideal seria alfabetizar letrando, ou seja: ensinar a ler e escrever no contexto das práticas sociais da leitura e da escrita, de modo que o indivíduo se tornasse, ao mesmo tempo, alfabetizado e letrado.

O letramento pode ser entendido como um conjunto de práticas sociais em que o uso da leitura e da escrita se prestam como tecnologias mediadoras. A complexa teia social envolve a leitura e a escrita como recursos ou ferramentas que auxiliam os sujeitos em todos os seus fazeres e empreendimentos, dessa forma, letramento é compreendido como “[...] o processo de apropriação da cultura escrita fazendo um uso real da leitura e da escrita como práticas sociais” (SOARES, 2004, p.24).

É por reconhecer a importância de ser alfabetizado e letrado que a rede escolar, sobretudo a privada, tem crescido assustadoramente nos últimos tempos. A busca por escolarização revela que o indivíduo reconhece que sem o domínio do saber escolar muitas lacunas são formadas, as quais se constituem como obstáculos para a sua inserção/inclusão nos vários espaços sociais.

É válido destacar que, na sociedade onde prepondera o letramento, algumas possibilidades se viabilizam apenas quando os indivíduos se encontram alfabetizados e letrados. Dentre as inúmeras possibilidades estão a conquista e a manutenção do emprego, salários mais atraentes, autonomia, desenvolvimento de novas competências, interações mais efetivas, melhor domínio e manuseio das tecnologias, dentre outros.

Refletindo acerca dessa dimensão inclusiva do letramento, Magda Soares (2004) nos diz:

O uso de habilidades de leitura e escrita para o funcionamento e a participação adequados na sociedade, e para o sucesso pessoal, o letramento é considerado como um responsável por produzir resultados importantes: desenvolvimento cognitivo e econômico, mobilidade social, progresso profissional, cidadania (SOARES, 2004, p.

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Imbuído dessa função social da escrita e da leitura, o indivíduo tem mais oportunidades de inserir-se nos diversos espaços sócio-político-culturais e, assim, participar ativamente da sociedade, contribuindo não exclusivamente com a formação individual, mas do coletivo.

Ter acesso e domínio sobre a escrita e a leitura se constitui, hoje, como instrumento de poder. Não ser alfabetizado e letrado, sobretudo em se tratando de jovens e adultos, pode significar, nesse contexto, maior dificuldade ou empecilho para realizar desde as mais simples tarefas do dia a dia, até atividades de maior complexidade.

As crianças operam com jogos e precisam entender suas regras de funcionamento, lidam com eletroeletrônicos, frequentam uma série de ambientes sociais e públicos, assistem a filmes e a programas legendados, observam rótulos, placas de casas comerciais, logomarcas e logotipos de produtos e empresas, escolhem produtos alimentícios, brinquedos, operam instrumentos eletrônicos, computadores, etc., enfim, participam de uma série de situações nas quais o domínio situado e contextualizado da linguagem escrita funciona como facilitador.

Talvez, sem tal domínio não fosse possível um pleno usufruto desses bens simbólicos.

Por isso, a preocupação com o sistema de escrita, especificidade da alfabetização, é algo com que a escola deve se ocupar com veemência sem, contudo, esquecer-se de que o

domínio desse sistema precisa estar atrelado ao seu uso nas múltiplas situações que fazem o nosso existir, ou seja, o domínio da escrita alfabética não pode se desvincular de atividades que objetivem ao letramento, tais como: redigir um bilhete, escrever uma carta, responder formulários, ler jornais, revistas e livros, dentre outras que fazem parte do cotidiano de uma sociedade grafocêntrica, pois a alfabetização só tem sentido quando desenvolvida no contexto de práticas sociais de leitura e escrita.

Com as políticas públicas de inclusão, com a compreensão cada vez mais propagada de educação escolar como direito inalienável à constituição da cidadania, a alfabetização deixou de ser mero objetivo de desenvolvimento econômico e, tem se tornado a cada dia, nos discursos e iniciativas governamentais, direito humano básico.

3.2 Paradigmas de alfabetização e implicações para a aprendizagem da linguagem