• Nenhum resultado encontrado

Consciência e/ou habilidade metalinguística e alfabetização

aquisição do princípio alfabético. Conforme Rego (1995), a decodificação favorece o reconhecimento de palavras, o qual incide de modo efetivo sobre o processo de compreensão do texto.

Em vista do exposto, uma intervenção pedagógica que tenha com meta a aquisição da linguagem escrita deve se imbuir da promoção de um trabalho estratégico que vise ao o desenvolvimento da consciência fonológica, ou seja, da habilidade de a criança perceber as palavras, enquanto sequência sonora, via atividades que possibilitem a análise e a síntese dos sons que compõem a fala.

Como podemos observar, há uma série de habilidades metalinguísticas a serem desenvolvidas para que os sujeitos se tornem alfabetizados e letrados, dado que para compreender o funcionamento da língua como fenômeno interativo e complexo, exige explorá-la e estudá-la sob muitos ângulos.

Assim sendo, as habilidades metalinguísticas expressam os vários saberes produzidos pela linguística sendo esses vistos como potencializadores da alfabetização, à medida que esse conjunto de habilidades se presta à compreensão da linguagem em suas múltiplas dimensões.

Dentre as principais habilidades metalinguísticas temos a consciência fonológica, a consciência morfológica ou lexical e a consciência sintática. A consciência fonológica consiste em perceber intencionalmente os sons produzidos durante a fala, distinguindo semelhanças e diferenças entre eles. A consciência morfológica ou lexical implica a percepção das palavras numa sentença, frase ou texto pode se dar a partir da identificação de sua função gramatical, se substantivo, verbo, adjetivo, etc., ou em função do seu valor sintático-semântico ou contextual. A consciência sintática, por sua vez, pressupõe a relação que as palavras mantêm entre si numa sentença, frase ou texto para a construção de sentidos.

A consciência sintática expressa a estrutura da frase e se respalda sobremaneira no contexto sociopragmático para a atribuição de sentido à sentença.

Reiteramos que, pelo fato de termos como foco nesta proposta a habilidade de consciência fonológica, ela será descrita e discutida em maior profundidade que as demais habilidades metalinguísticas.

4.1.1 Consciência fonológica

A consciência fonológica está entre as habilidades metalinguísticas mais estudadas nas áreas de Linguagem, Psicologia, Neurociências e Fonoaudiologia; ela consiste na tomada consciente e metódica de segmentos como fonemas, letras, sílabas, objetivando uma apropriação competente da escrita e da leitura pelos iniciantes. “A consciência fonológica pode ser definida como a capacidade de compreender a linguagem oral em unidades cada vez menores: sentenças em palavras, palavras em sílabas e sílabas em fonemas” (CAVALCANTE e MENDES, 2003, p. 205).

Para Diniz (2008, p. 23) a consciência fonológica “se constitui de diferentes níveis perceptivos: a percepção de palavras curtas e compridas, o reconhecimento da repetição do conjunto dos mesmos sons no início de palavras (aliteração), ou no final dessas (rima); e finalmente a decomposição da linguagem oral em palavras, sílabas e fonemas”.

Em alguns casos, a consciência fonológica se desenvolve de forma natural, por meio do uso cotidiano que a criança faz da linguagem. Segmentos maiores que os fonemas como sílabas, rimas, aliterações e palavras, denominados por Morais (s./d., apud Feil, 1995) de suprafonêmicos, desenvolve-se espontaneamente, enquanto que a consciência fonêmica, por ser mais complexa, exige intervenções e manipulações mais sistemáticas e intencionais de microssegmentos. O autor diz que tal distinção se dá em função de as sílabas isoladas e segmentos mais amplos se manifestarem como unidades discretas da fala, enquanto os fonemas não.

Eis o porquê de os teóricos, em sua maioria, chamarem a atenção para a necessidade de se fazer distinção entre consciência fonológica e consciência fonêmica. Para Guedes e Gomes (2010, p. 266) “a consciência fonêmica, [...] se refere à compreensão de que as palavras são constituídas de sons individuais ou fonemas e à habilidade de manipular esses segmentos”.

Tal tarefa exige manipulação complexa dos segmentos menores, a exemplo de a criança ter de perceber que numa palavra cada som pronunciado corresponde a uma letra.

A consciência fonológica é maior que a consciência fonêmica, pois a manipulação complexa de cada unidade sonora e sua conversão em grafema fazem parte das habilidades de consciência fonológica. Entretanto, a consciência fonológica abrange, como já foi dito, análises de estruturas mais amplas, como é o caso de palavras, sílabas, rimas, aliterações, e de estruturas mais singulares como os fonemas, compreendidos como sons individuais que compõem cada sílaba da palavra.

Analisar palavras, sílabas, rimas e aliterações é tido como algo mais simples, pois se tratam de macroestruturas, perceptíveis pelas crianças espontaneamente, em jogos e brincadeiras do dia a dia. A análise fonêmica, por outro lado, contribui sobremaneira para a aquisição e compreensão da escrita alfabética, por sua complexidade, já que analisar os segmentos menores de uma palavra exige atenção e conhecimento mais apurado do funcionamento da língua do que analisar segmentos como rimas, sílabas, sons iniciais e finais de palavras.

Na visão de Freitas (2004), a manipulação lúdica de palavras por intermédio de jogos espontâneos com os sons representa um nível de consciência fonológica implícita, já a análise consciente dos sons constituintes das palavras, por outro lado, caracteriza a consciência fonológica explícita.

A consciência fonológica envolve como habilidades principais: Consciência da Rima, Consciência da Aliteração, Consciência da Sílaba ou Silábica e Consciência do fonema ou fonêmica.

A rima é algo que a criança já traz certo domínio antes mesmo de adentrar o ambiente escolar; os jogos orais, as parlendas e travalínguas, as cantigas de ninar e toda uma série de atividades jocosas permitem que a criança identifique a rima intuitivamente. A rima, para Barrera e Maluf (1997), compreende a consciência de sequências fonológicas que se mostram similares ou são compartilhadas entre as palavras. Ter consciência da rima é perceber sistematicamente como as palavras de um dado poema, parlenda, travalínguas, música, trova, etc., apresentam semelhanças dos sons vocálicos concentrados no seu final. A rima se constitui, sobretudo, por meio da vogal da sílaba tônica.

Sobre a rima, Adams (2007, p. 51) explica: “Por direcionar a atenção das crianças às semelhanças e diferenças entre os sons das palavras, o jogo com rima é uma forma útil de alertá-las para a ideia de que a língua não tem apenas significado e mensagem, mas também uma forma física”.

Outra habilidade importante para desenvolvimento de consciência fonológica é a aliteração, a qual tem a ver genericamente com a repetição de um mesmo fonema ou sílaba no início da palavra.

“Aliteração é a repetição de um fonema numa frase ou numa palavra (por exemplo:

“quem com ferro fere, com ferro será ferido” (BRASIL, 2008, p. 28).

Há vários estudos que anunciam a grande valia do desenvolvimento da rima e da aliteração para que a criança desenvolva certo domínio das habilidades fonológicas.

Sobre essa valia, Ângela Freire (s/d., p. 8) ratifica:

Os estudos a respeito da consciência fonológica comprovaram que a habilidade de detectar rima e aliteração é fundamental no progresso na aquisição da leitura e escrita. Isto se dá porque a capacidade de perceber semelhanças sonoras no início ou no final das palavras permite fazer conexões entre os grafemas e os fonemas que eles representam, ou seja, favorece a generalização destas relações.

Por outro lado, considerando o domínio de rimas e aliterações em situações de produção escrita ou oral, Roazzi (1988, p. 33) argumenta:

A maioria das crianças, quando cria poemas, usa aliteração, rimas e outras técnicas relacionadas com sons. Isto indica que, de certa maneira, elas estão conscientes das similaridades e diferenças de sons entre as palavras. Isto significa que elas possuem um nível de consciência fonológica. Isto naturalmente não significa, também, que elas possuam todas as habilidades implícitas no conceito de "consciência fonológica”.

A consciência da sílaba é a capacidade de segmentar as palavras em sílabas, por meio de palmas, contagem nos dedos, etc. Para desenvolver consciência silábica, é necessário que os alfabetizandos participem de atividades tais como “contar o número de sílabas; dizer qual é a sílaba inicial, medial ou final de uma determinada palavra; subtrair uma sílaba das palavras, formando novos vocábulos” (FREIRE, s/d., p. 10).

Como a fala se desenvolve como um contínuo sonoro, há uma maior dificuldade de percepção dos fonemas individualmente. Nesse sentido, a consciência fonêmica constitui um nível de consciência fonológica mais complexa, já que a crianças lida com unidades abstratas e, algumas vezes, os fonemas se confundem com o nome da própria letra.

Ângela Freire (s/d., p. 9) diz que consciência fonêmica “é a capacidade de identificar, utilizar, pensar e brincar com os sons das palavras. É no processo de aquisição da escrita que esse tipo específico de habilidade passa a se desenvolver”. A autora diz ainda que para desenvolver essa habilidade na criança é necessário promover atividades em que essas tenham que “dizer quais ou quantos fonemas formam uma palavra; descobrir qual palavra está sendo dita por outra pessoa unindo os fonemas por ela emitidos; formar um novo vocábulo subtraindo o fonema inicial da palavra”.

Apesar de a habilidade de consciência fonêmica estar diretamente ligada à compreensão do princípio alfabético, ela se refina e se amplia a partir da aquisição da leitura e da escrita. Baseadas em estudos que evidenciam a complementaridade entre consciência fonológica e alfabetização, Mota et al ( 2012, p. 3) afirmam que:

A consciência fonológica e a escrita se desenvolvem paralelamente, a consciência fonológica contribuindo nos estágios iniciais do processo de alfabetização e por outro lado, a alfabetização levando ao processamento de aspectos fonológicos mais complexos como a análise fonêmica, que deriva do domínio da alfabetização.

Morais (2012) discorda dos demais teóricos, quando esses compreendem consciência fonêmica como identificação isolada de cada fonema que compõe a palavra, e diz que as habilidades de consciência fonêmica não são requisitos para alguém se alfabetizar. Segundo o autor, identificar um vocábulo fonema a fonema é coisa de adulto superletrado e imbuído de áreas profissionais bem específicas como Fonética e Fonologia, Fonoaudiologia, Letras e Psicopedagogia. Às crianças e aos demais sujeitos, essa é uma tarefa impossível e sem sentido funcional para a aquisição e apropriação da linguagem escrita.

As crianças, assim como os adultos superletrados, tendem a nunca (grifo do autor) conseguir pronunciar um a um os fonemas de cada palavra. Tampouco conseguem

contar os fonemas de uma palavra, segmentando-os um a um. Quando lhes pedimos que realizem essas segmentações e contagens fonêmicas, o que fazem é dividir as palavras em sílabas ou soletrar e contar cada letra das palavras (MORAIS, 2012, p.

88).

Portanto, as análises e reflexões fonológicas consideradas menos complexas em que se tomam intencionalmente palavras, rimas, aliterações e sílabas, tendem a auxiliar as análises mais complexas de consciência fonêmica e, desse modo, todas contribuem como ações mediadoras para a construção da base alfabética pela criança. Com efeito, tais habilidades servem como instrumentos dos quais o/a docente se vale para compreender as práticas de ensino da leitura e da escrita e, assim, oferecer intervenções mais efetivas aos/às alfabetizandos/as.