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A requisição do assistente social na construção civil

No documento Universidade do Estado do Rio de Janeiro (páginas 71-75)

2.2. O trabalho do assistente social na indústria da construção civil no

2.2.1. A requisição do assistente social na construção civil

Na maioria das construtoras, ainda é visível o desconhecimento, por parte do representante da empresa (gerente de obra), do trabalho do assistente social, existente antes, apesar das condições assinaladas, como agora. Ele ainda sofre com o desconhecimento de sua contribuição potencial para as demandas nesse campo, existindo também, como antes, objetivos diferenciados, desse gerente e do assistente social em função da formação diferenciada e do compromisso ético com o trabalhador: O seguinte depoimento revela o avanço do assistente social em relação aos demais técnicos, mesmo trabalhando com demandas emergenciais.

As empresas não têm consciência do que é o nosso trabalho, como o assistente social pode trabalhar, o que pode dar para a construção civil, em termos de trabalho. Eles acham que qualquer profissional poderia dar esse trabalho de treinamento e não é assim. A gente sabe que é uma área complicada, tem demandas específicas. O trabalhador da construção civil é um trabalhador específico e os problemas que assolam os trabalhadores são problemas diversificados. Com o assistente social, eles trazem uma série de questões:

condições de moradia precária, dentre outras. Outros profissionais não vão ser cuidadosos nesse olhar para com os trabalhadores, com o olhar para aquela demanda imediata, emergencial. O que está sendo mostrado ali e por não terem a formação do assistente social, de analisar fundo as questões, de perceber além desse aparente, não vão conseguir fazer um trabalho que atinja a realidade dessas pessoas e que dê algum resultado, tanto para a empresa, quanto para esses trabalhadores que, no nosso caso, é o nosso objetivo maior. (assistente social entrevistada).

Diferentemente da década de 1980, hoje em dia o assistente social, por conta da requisição das empresas em relação à certificação de qualidade e da divulgação do conceito de responsabilidade social, vem trabalhando diretamente, ou exclusivamente, em alguns casos, com os programas de qualidade, desenvolvendo palestras com o objetivo de sensibilizar técnicos e trabalhadores, e também com projetos de melhorias no entorno das obras.

Nessa década, a atribuição do Serviço Social é a de realizar propostas de coordenação e elaboração de programas sociais, de acordo com o levantamento de necessidade dos funcionários e “colaboradores” com o objetivo da empresa.

Realizar o programa de integração dos novos funcionários e “colaboradores”, orientando quanto à estrutura da empresa, benefícios que a empresa oferece, introduzindo os conceitos da política de qualidade. (assistente social entrevistada)

29.

No campo da prestação de serviços sociais, o assistente social atuava no sentido de criar benefícios ou buscar recursos a custo zero, muitas vezes por exigência da construtora para atender aos objetivos institucionais. Esses programas de assistência ao trabalhador deste campo visavam compensar a ausência de garantias de trabalho digno e regulado pela legislação trabalhista e, ao mesmo tempo, ampliar a adesão dos trabalhadores frente às tarefas realizadas na obra, sem maiores conflitos.

Como os espaços de trabalho, em sua maioria, são insalubres à saúde do trabalhador e precárias as condições de trabalho, com extensiva jornada, sem correspondência de valorização, o exercício do profissional de Serviço Social neste campo teve, em sua origem, uma peculiar característica no que se refere ao controle das manifestações da força de trabalho.

Com base em minha observação desse exercício no campo de estágio, verificava-se que, até meados da década de 1990, o exercício profissional do assistente social estava muito mais direcionado à elaboração de programas voltados à saúde do trabalhador, tais como prevenção de alcoolismo e de doenças sexualmente transmissíveis, e também para projetos de complemento da escolaridade, com implementação de salas de aulas no canteiro de obras, através do programa “Alfabetizar é Construir”30, dentre outros.

Na coordenação desses projetos, o assistente social desenvolvia a sua ação profissional em conjunto com o técnico de segurança do trabalho. Na maioria das obras, há descaso em dois sentidos. De um lado, com os Equipamentos de Proteção Coletiva (EPC’s), tais como elevadores e telas de proteção, sem

29 É interessante ressaltar a denominação de “colaboradores”, referente aos sub-contratados, próprios da linguagem neo-conservadora da “qualidade total”, incorporada pela assistente social.

30 É importante ressaltar que, nos últimos anos, esse programa de alfabetização, elaborado pelo Sindicato das Indústrias da Construção Civil no Rio de Janeiro (SINDUSCON-RIO) com apoio do Ministério da Educação, do Serviço Social da Indústria (SESI) e da Fundação Roberto Marinho, obteve resultados importantes quanto à diminuição do índice de analfabetismo dos trabalhadores da construção civil. Segundo dados do

SINDUSCON-RIO, na década de 1980, 60% da força de trabalho desse campo eram analfabetos. Em

1990,este sindicato estima que o índice de analfabetismo esteja por volta de 20%, sendo que, com a soma dos considerados “analfabetos funcionais” (que lêem e não entendem), chega a 35%.

investimentos nas novas tecnologias ou busca de assessoramento de órgãos públicos, como a Fundação Jorge Duprat Figueiredo de Segurança e Medicina do Trabalho (FUNDACENTRO). De outro lado, também há muita dificuldade com os Equipamentos de Proteção Individual (EPI’s) inclusive pela falta de treinamento participativo, incluindo neste a discussão sobre a qualidade e o conforto mínimo dos equipamentos. Em conseqüência, aconteciam muitos acidentes de trabalho. Diante deles, o assistente social aparece de forma preventiva, através de palestras com os trabalhadores, demonstrando o diferencial de sua linguagem que é dos principais meios do seu trabalho. Nas entrevistas de campo, uma delas demonstra expressivamente a forma adequada do Serviço Social traduzir na linguagem dos trabalhadores as normas do programa de qualidade:

No entanto, todos os envolvidos avaliam que um dos facilitadores do não uso dos EPI’s é a empresa “gato”, que não fornece uniforme adequado de proteção aos seus funcionários. Também o treinamento para utilização de ambos os equipamentos é precário, além das condições incômodas de trabalho, agravadas pelos EPI’s (calor, afecções na pele, entre outros).

Um segundo aspecto refere-se à política de benefícios. Os dados da pesquisa apontam que a implementação da política benefícios na indústria da construção civil é implementada como forma de “barganhar” a manutenção da força de trabalho que, em sua maioria, não possue salários que garantam a sua integridade e de sua família, sobretudo na sociedade capitalista de consumo. Estes salários, flutuam entre 2 (dois) salários mínimos (para servente e pedreiros) e 03 (três) salários mínimos (para profissões técnicas especializadas, como carpinteiro, armador etc.,), segundo os dados da convenção coletiva de trabalho de 2003 da indústria da construção civil, firmada entre o Sindicato dos trabalhadores (SINTRANCONSTR- RIO) e o Sindicato das Indústrias da Construção Civil no Estado do Rio de Janeiro (SINDUSCON-RIO), conforme o quadro a seguir.

Quadro n.º 04 – Valores salariais acordados para a construção civil no ano de 2003

Ocupações Por hora (R$) Por mês (R$)

Mestre de obra 5,65 1.243,00

Encarregado de obra e Encarregado administrativo de obra 4,36 959,2

Encarregado de turma 3,63 798,6

Almoxarife, Apontador, Bombeiro, Carpinteiro de esquadrias Eletricista, Ladrilheiro, Montador de Torre de elevador, 2,77 609,4

Operador de grua e Pastilheiro.

Armador, Carpinteiro de forma, Guincheiro, Pedreiro, Pintor 2,56 563,2 e demais profissionais qualificados não relacionados

½ Oficial e Vigia 1,98 435,6

Servente e Continuo 1,83 402,6

Chefe de pessoal de sede administrativa - 860

Auxiliares administrativos e similares - 500

Além disso, os benefícios e as garantias sociais são mínimas e esses trabalhadores não têm condições de pagar serviços para suprir as necessidades de saúde, educação, lazer e cultura.

O trabalho do assistente social nas construtoras exige a compreensão dessas expressões da questão social e estratégias que contribuam para a efetivação dos direitos sociais dos trabalhadores. Exige também a ampliação da discussão desses elementos junto às demais categorias profissionais da construção civil, no sentido de superar a visão da política de benefícios como um favor que a empresa oferece à sua força de trabalho, tendência esta ainda dominante, mesmo entre os assistentes sociais.

Desse modo, a requisição do assistente social na indústria da construção civil, nos últimos anos, apresenta como tendência o gerenciamento de uma “política” de comprometimento e envolvimento dos trabalhadores no processo de produção. Tal política é conduzida ao profissional de Serviço Social como forma de assegurar o pleno desempenho dessa política empresarial. Nesse sentido, o trabalho do assistente social tem um caráter educativo diferenciado. Ele tem gerenciado, junto aos trabalhadores da construção civil, os critérios e regras de desenvolvimentos dos cinco sensos (5S)31 , integrante dos processos da “qualidade”: intervindo em palestras e treinamentos da força de trabalho, assim como na utilização de recursos para uma maior capacitação e instrução escolar dos mesmos.

31 Os 5S correspondem aos sensos de limpeza, utilização, coordenação, saúde e autodisciplina.

Essas configurações impostas pelo mercado econômico mundial e nacional exigem, na maioria das vezes, uma atuação profissional que tenha um caráter educativo que procura garantir a denominada “conscientização”32 por parte do trabalhador, acerca da importância na observância das normas da política de qualidade.

2.2.2 O trabalho profissional a partir da década de 1990 frente às políticas

No documento Universidade do Estado do Rio de Janeiro (páginas 71-75)