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Igreja ministerial: Protagonismo dos leigos

3.2 Dom Giocondo: presença missionária e pastoral na Igreja

3.2.3 Igreja ministerial: Protagonismo dos leigos

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apostólico, supriam o que faltava no campo de apostolado e, ao mesmo tempo, davam um novo ânimo na revitalização da vida comunitária (AA 10).

Para Leonardo Boff, isso implicava: “Ter a coragem de deixar crescer uma Igreja popular, uma Igreja do povo, com os valores do povo, em termos de linguagem, expressão litúrgica, religiosidade popular etc. Até há pouco a Igreja não era do povo, mas dos padres para o povo”225. E, ao mesmo tempo, existia também uma fragilidade no meio desse processo,

“Uma fragilidade evangélica, proveniente do fato de as CEBs serem integradas por gente pobre, semianalfabeta, oprimida e alienada, mas que apesar e por causa disso é depositária da missão da Igreja e das promessas do Reino”226.

A formação dos leigos para assumirem essa causa foi o grande desafio. Unir fé e comunidade não era tarefa fácil, para ser realizada de um dia para outro. Necessitava-se semear muito naquele novo solo, cheio de grandes desafios, e cultivar os pequenos e frágeis brotos que apareciam. Os novos agentes de pastoral deviam receber formação e treinamento para desenvolver principalmente o papel de coordenadores ou monitores na frente das suas Comunidades. “Se não é pela fé, um treinamento se justifica pela consciência que dá ao pessoal de seus direitos concretos com vistas a vencer a velha e negra opressão e marginalização em que se acham. Além da do Evangelho como tal, a causa do Povo vale toda a pena. Os monitores, despertados, iriam ajudar seu povo a se despertar”227.

O primeiro treinamento de monitores, realizado nos dias 11 e 12 de setembro de 1971, como os outros treinamentos que se seguiram depois, eram treinamentos bastante rápidos, de apenas um dia e meio de duração, de intensa vida comunitária e um roteiro de palestras, debates e encenações, obedecendo ao seguinte esquema: 1ª. A realidade do mundo que nos cerca; 2ª. Jesus Cristo; 3ª. Igreja como Comunidade; 4ª. O monitor; 5ª. O Novo Testamento.

Com a multiplicação dos grupos e o nascimento das Comunidades, tornou-se sempre mais imperioso, como consequência de uma opção de fé e amor evangélicos, um trabalho lento e persistente de conscientização. Conscientização era imprescindível numa evangelização libertadora que encarava a totalidade do homem. Precisava-se criar uma rede de Comunidades, tendo o leigo como protagonista principal, e onde os pobres criassem uma real fraternidade, sendo solidários e promovendo a libertação dos oprimidos228.

Depois, cada qual, compreendeu sua missão específica: a Igreja-grande – instituição assume a rede de comunidades de base, presta-lhes serviços que

225 BOFF, Leonardo. Op. cit. 1994, p. 223.

226 BOFF, Clodovis. Teologia Pé-no-Chão. Petrópolis: Vozes, 1984, p. 115.

227 Ibidem, p. 56.

228 BOFF, Leonardo. Op. cit. 1978, p. 91.

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somente uma instituição organizada pode prestar, confere-lhe universalidade e a coloca na grande tradição apostólica; a rede de comunidades de base restitui à Igreja seu caráter comunitário, enraíza a fé na história, faz encarnar os anseios do povo a condições mais humanas de vida dentro do mistério da salvação de Jesus Cristo e permite uma verdadeira eclesiogênese no sentido de a Igreja se re-inventar em seus novos ministérios, em sua expressão litúrgica e nos acentos novos que coloca nas verdades cristãs, elaborando uma síntese original entre vida e fé229.

Não era qualquer um que se tornava agente de pastoral de um dia para outro. No Plano de Pastoral já eram definidos alguns critérios para todos saberem quem podia ser agente de pastoral. A pessoa devia ser escolhida e aceita pela comunidade. Não era o bispo quem a escolhia. Não era o vigário quem a indicava. Na Prelazia o agente de pastoral era o cristão que a própria comunidade aceitava e escolhia para coordená-la. Assim, a pessoa escolhida devia submeter-se às exigências de sua função: testemunho de vida cristã; comunhão com a Igreja;

engajamento na comunidade; sentido de corresponsabilidade; aceitação das normas do Plano de Pastoral. Contudo, os agentes não são improvisados230. Eram formados através de treinamentos, tanto em nível de paróquia como de Prelazia. O papel do monitor era justamente coordenar: juntar, unir, aproximar as pessoas e os grupos, animar e ajuntar o pessoal. A função do monitor era ser um eixo entre os diversos grupos, articulando o movimento de cada um numa caminhada só.

Nas teologias anteriores se colocavam os ministérios acima da Igreja. Mais do que serviços, eram funções criadoras. A hierarquia parecia não estar a serviço da Igreja, mas se achava a fundadora da Igreja. Com a nova visão do Vaticano II, os ministérios começaram a ser serviços para agir dentro e em favor da própria Igreja e também tornavam visível a ação da Igreja dentro da mesma realidade humana. Novos carismas e serviços, portanto, surgiram diante das necessidades que apresentavam as Comunidades. Os serviços deviam ser em favor do povo e dentro do povo, no verdadeiro espírito fraterno e comunitário. Existia uma igualdade fundamental nessa forma de ser Igreja, pois todos tinham consciência de ser o Povo de Deus. Todos recebiam o envio oficial de parte da Igreja, pois todos eram responsáveis pela unidade da Comunidade e todos se deviam ajudar na própria santificação.

Estão aí, todos em círculo. Olho-os e vejo a Igreja dos pobres. São na verdade todos lavradores, seringueiros, pequenos comerciantes, lavadeiras, domésticas etc. Vejo a Igreja dos leigos: são os batizados, que assumem sua fé e sua Igreja como coisa própria. A divisão de trabalho não é rígida como aparece no caso do clero. Há ministros entre eles: dos enfermos, do dízimo,

229 BOFF, Leonardo. Op. cit. 1978, p. 85.

230 LIBANIO, Frei Alberto. O canto do galo. Revista Eclesiástica Brasileira, vol. 37, fasc. 146, junho de 1977, p. 263.

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da catequese, da Palavra (monitor), do canto, da oração, dos direitos humanos etc. Mas são funções não vitalícias, pouco institucionalizadas, e em profunda igualdade entre elas (sem hierarquia verticalista). Por fim, vejo aí a Igreja dos vencidos, dos derrotados, mas não dos covardes e acomodados. É uma Igreja da resistência, da constância e da esperança, como era a Igreja do livro do Apocalipse. É uma Igreja que “não abre” e que morre de pé231.

Diante da nova realidade havia um ofício especial e fundamental, como era o de dar unidade a todos os serviços para que tudo crescesse na harmonia: é a função do presbítero na comunidade paroquial, a do bispo na comunidade diocesana e a do monitor na comunidade local e particular. O importante era ser sinal de unidade, tanto na organização como na transmissão da fé. Aos poucos, foram-se dando os passos necessários para a promoção e protagonismo dos leigos. Era o novo Povo de Deus caminhando junto com seus pastores.