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Na busca em indicar quando despontou os primeiros ideais constituintes da responsabilidade civil, é necessário retroceder ao princípio da civilização humana, ocasião em que o homem, convivendo em grupo, agia por vingança coletiva contra o ofensor que lesava outro integrante61.

Mais tarde, no período em que vigorava a Leis das XII Tábuas, a vingança adquiriu caráter privado, sob o enfoque trazido pela Pena de Talião, em que a lesão causada era reparada por outra lesão de igual natureza62.

Avançando no tempo, constatou-se que a fórmula “olho por olho, dente por dente” apenas resultava duplo dano, ou seja, aquele causado à vítima e ao ofensor, razão pela qual se deixou em desuso a retaliação e foi adotada a composição entre as partes, uma forma mais prudente de reparação63.

Consoante Diniz64, a composição surgiu para que “reparasse o dano mediante a prestação de poena (pagamento de certa quantia em dinheiro), a critério da autoridade pública, se o lesado fosse público (perpetrado contra direitos relativos à res pública), e do lesado, se tratasse de delito privado”, nas situações em que o prejuízo incidia contra os interesses de particulares.

Mais tarde, o Estado tornou a composição em compulsória, passando a exercer de forma exclusiva a função de fixar o valor dos prejuízos, neste período, não havia distinção entre a responsabilidade civil e penal, sendo que a composição servia como remédio para solucionar ambos os casos65.

Em crescente análise, a Lex Aquilia apontou as bases da responsabilidade extracontratual. Ela reforçou a medida de reparação pecuniária do dano, e a partir de sua edição, o conceito de culpa foi tracejado, o que propiciou ao

61 DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro: responsabilidade civil. 23. ed. São Paulo:

Saraiva, 2009. p. 10.

62 GAGLIANO, Pablo Stolze. PAMPLONA FILHO, Rodolfo. Novo curso de direito civil. 3. ed. São Paulo: saraiva, 2005. p.10.

63 GAGLIANO, Pablo Stolze. PAMPLONA FILHO, Rodolfo. Novo curso de direito civil. p. 11.

64 DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro: responsabilidade civil. p. 11.

65 DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro: responsabilidade civil. p. 11.

lesante a isenção da responsabilidade nos casos em que ele houvesse agido sem intenção. Ademais, passou-se a analisar o patrimônio do ofensor, a fim de que ele pudesse arcar com o valor exigido como ressarcimento, aplicando-se uma poena específica para o dano que deu origem.66

Sobre o assunto Gagliano e Pamplona Filho67 ensinam que:

Um marco na evolução histórica da responsabilidade civil se dá, porém, com a edição Lex Aquilia, cuja importância foi tão grande que deu nome à nova designação da responsabilidade civil delitual ou extracontratual. Constituída de três partes, sem haver revogado totalmente a legislação anterior, sua grande virtude é propugnar pela substituição das multas fixas por pena proporcional ao dano causado. (...) Com efeito, regulava ela o damnum injuria datum, consistente na destruição ou deterioração da coisa alheia por fato ativo que tivesse atingido coisa corpórea ou incorpórea, sem justificativa legal. Embora sua finalidade original fosse limitada ao proprietário de coisa lesada, a influência da jurisprudência e as extensões concedidas pelo pretor fizeram com que se construísse uma efetiva doutrina romana da responsabilidade extracontratual.

Assim, na busca por resoluções mais equitativas, o valor da prestação pecuniária – que era a mesma para todos os casos – começou a analisar dois pressupostos para ser estipulado, quantificava-se em concordância com o valor venal da coisa deteriorada e sua quantia estimada no decorrer de trinta dias anteriores ao delito 68.

Adiante, as sanções da referida lei foram aplicadas aos casos de omissão ou verificados sem o estrago físico e material da coisa. No período da Idade Média, a concepção de dolo e de culpa no seu stricto sensu tomou forma, o que ocasionou a distinção da responsabilidade civil e penal.69

66 DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro: responsabilidade civil. p. 11.

67 GAGLIANO, Pablo Stolze. PAMPLONA FILHO, Rodolfo. Novo curso de direito civil. p. 11-12.

68 LIMA, Alvino. Culpa e risco. 2. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1999. p. 21.

69 DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro: responsabilidade civil. p. 11.

O berço da conceituação doutrinária da responsabilidade civil foi à obra do jurista francês Domat, teoria que logo foi concebida pelo Código Civil francês e demais legislações que estabeleceram a culpa como pressuposto70.

Por fim, a responsabilidade civil se assemelhou à concepção contemporânea quando seu estudo compreendeu que não bastava apenas garantir a reparação das hipóteses de culpabilidade, ou seja, de ênfase subjetiva, mas também das circunstâncias que ocasionavam o simples risco de prejuízo, estendendo sua área de incidência para acontecimentos que dispensavam a efetivação da culpa.71

Neste enfoque, esclarece Lima72:

O movimento inovador se levanta contra a obra secular; a luta se desencadeia tenazmente e sem tréguas; Ripert proclama Saleilles e Josserand ‘os síndicos da massa falida da culpa’, e, a despeito das afirmações de que a teoria do risco desfaleceu no ardor de seu ataque, seus defensores persistem na tarefa, e as necessidades econômicas e sociais da vida moderna intensa obrigam o legislador a abrir brechas na concepção da teoria clássica da responsabilidade.

Ambas, porém, continuarão a subsistir, como forças paralelas, convergindo para um mesmo fim, sem que jamais, talvez, se possam exterminar ou se confundir, fundamentando, neste ou naquele caso, a imperiosa necessidade de ressarcir o dano, na proteção dos direitos lesados.

Assim, frente à fundamentação de tal teoria, as legislações modernas optaram por ampará-la, sem desprezar a teoria da culpa, fato ocorrido, inclusive, em nosso ordenamento jurídico73.

Não obstante o Estado se tratar de um ente figurado hábil a cometer equívocos por meio de seus agentes públicos, a medida sob seus indivíduos não era a mesma aplicada contra si, ele não aderiu primordialmente à concepção de que suas ações também resultariam em ressarcimento, o dever

70 DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro: responsabilidade civil. p. 11.

71 DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro: responsabilidade civil. p. 12.

72 LIMA, Alvino. Culpa e risco.p. 41.

73 GAGLIANO, Pablo Stolze. PAMPLONA FILHO, Rodolfo. Novo curso de direito civil. p. 13.

estatal de reparação dos danos causados aos particulares foi uma construção mais tardia, ocorrida ao longo da sua salutar estruturação.

Sob a égide Farias74 esclarece que:

A responsabilidade civil do Estado passou por processo mutativo na medida da evolução da sociedade e do Estado. Inicialmente, o Estado era concebido como irresponsável visto estar ele acima do Direito. Da irresponsabilidade evoluiu-se para a responsabilidade com culpa (subjetiva), chegando, finalmente, à responsabilidade sem culpa (objetiva).

À luz do doutrinador Paul Duez , apud Cahali75 esquematiza o processo em fases:

a) numa primeira fase, a questão inexistia; a irresponsabilidade aparece axioma, e a existência de uma responsabilidade pecuniária da Administração é considerada como entrave perigoso à execução dos seus serviços; na ordem patrimonial, os administradores têm à sua disposição apenas uma ação de responsabilidade civil contra o funcionário; b) numa segunda fase, a questão se põe parcialmente no plano civilístico: para a dedução da responsabilidade pecuniária do Poder Público, faz-se apelo às teorias do Código Civil, relativas aos atos dos prepostos e mandatários; c) numa terceira fase, a questão se desabrocha e se desenvolve no plano próprio do direito público; uma concepção original, desapegada do direito civil, forma- se progressivamente no quadro jurídico da faute e do risco administrativo.

Destarte, o instituto da responsabilidade civil sofreu evolução no tempo e no espaço, por meio das diversas teorias ao seu respeito que foram criadas, conforme análise a seguir.

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