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Problemas Administrativos na Província da Ordem do Carmo Fluminense

No documento universidade federal de minas gerais (páginas 126-145)

2. FATORES ESTIMULADORES DA PRÁTICA AUTOGESTÃO

2.4. Problemas Administrativos na Província da Ordem do Carmo Fluminense

Para compreendermos a dinâmica envolvendo a relação equivalente de ingerência restrita como uma condição que favorece o exercício da autogestão administrativa dos Terceiros, precisamos, primeiro, compreender as singularidades da Província Carmelita no século XVIII e seu estrangulamento pela política regalista no século XIX.249 Os religiosos carmelitas pertencentes à província fluminense somavam um número pequeno de aproximadamente 180 religiosos em 1740. A província como determinação administrativa, religiosa e territorial abarcava um vasto território indo do Rio de Janeiro, São Paulo, Espírito Santo até parte do que conhecemos como Goiás à Capitania de Minas Gerais, dentro das suas circunscrições jurídicas.

Durante a segunda metade do século XVIII, ela fora marcada por diversos episódios correspondentes ao desregramento de seus freis e à falta de controle administrativo de suas

247 AEPNSP/OP OTCOP - Direitos e Regalias da Irmandade (Rosário de São João del Rei) Paroquiais Vol. 2.585 - Ano 1826; ARAÚJO, Mons. José de Souza Azevedo Pizarro e. Memórias Históricas do Rio de Janeiro. Lisboa:

Typografia de Silva e Porto, 1822. Vol. 7, p. 56.

248 AGUIAR, Marcos Magalhães de. Vila Rica dos confrades: a sociabilidade confrarial entre negros e mulatos no século XVIII. Dissertação (Mestrado em História) – Faculdade de Filosofia, Universidade de São Paulo, São Paulo, 1993. p. 268-275.

249 A prática regalista é amplamente discutida no capítulo terceiro. De forma sintética, podemos dizer que o regalismo qualifica a forma de modelo político e jurídico – de raízes medievais – no qual, por direitos alegados de iura regalia, monarcas absolutistas católicos europeus afirmavam como próprios iura maiestatica circa sacra, e que, nos territórios coloniais brasileiros, se caracterizou por prática política de atuação nos negócios da Igreja. Cf.

AZZI, Riolando. O catolicismo popular no Brasil: aspectos históricos. Petrópolis: Vozes, 1978.

127 instituições. As dificuldades oriundas da administração de vastas extensões territoriais, os problemas com a distância da jurisdição portuguesa concorreram para o desenvolvimento de um governo espiritual incipiente. Sandra Molina, ao analisar a condição da Ordem Regular no Rio de Janeiro, observa o grupo de religiosos caminhando progressivamente na direção de uma aproximação excessiva com laicato e com relação de dependência financeira junto às elites pela procura em obter seus legados e dotes.

Esta forma de vida em discordância com a proposta de altivez espiritual os conduziu a desenvolverem negócios de maneira semelhante aos leigos pertencentes à elite proprietária, prestando serviços externos ao convento, administrando tanto grandes fazendas pertencentes à ordem como também aquelas de suas famílias consanguíneas. Permaneceram, às vezes, meses ou anos sem receber visitas canônicas por seus superiores de Portugal, assim como também não as realizavam em tempo correto dentro de sua extensão provincial. Uma postura claramente na contramão das reformas desenvolvidas até o momento pela Santa Sé, levando à expedição da Carta Régia de 23 de março de 1702, na qual faziam-se recomendações expressas para que nenhum capitão de navios portugueses transportasse religiosos do Carmo sem licença para embarque.250

Esta condição de oposição crescente do Estado Monárquico aos Regulares em geral pode ser constatada em três cartas régias expedidas no mesmo ano de 1723 para a Capitania de Minas Gerais. A primeira delas, de 19 de maio, ordena a D. Lourenço de Almeida que execute

“inviolavelmente as reais ordens que há sobre expulsar os religiosos”, os quais, segundo consta, estavam espalhados pelos territórios da capitania, onde não havia casa alguma para recebê-los.

O documento atesta, a princípio, uma ação de conivência por parte das autoridades administrativas da Coroa relutantes, até certa medida, de agir com veemência e executar uma ação contra membros da Igreja. Por outro lado, também demonstra a falta de sentido ou função dos carmelitas, uma vez que não havia conventos, também não haveria razão para residirem ou transitarem sem destino certo. Termina o documento afirmando a presença de um “clamor” para o combate contra a maneira como vivem esses mesmos religiosos, considerados “tão escandalosos”. Em 27 de julho, foi emitida nova ordem exigindo a expulsão de todos os

250 MOLINA Sandra Rita. Des(obediencia), barganha e confronto: a luta da Provincia Carmelita Fluminense pela sobrevivência (1780-1836). Dissertação (Mestrado em História) - Instituto de Filosofia e Ciências Humanas Nível, Universidade Estadual de Campinas, Campinas, 1998. p. 50.

128 membros de Ordens que ali estavam, seguida pela carta de 9 de novembro, que reafirma todas as demandas precedentes.251

Se ordena ao governador D. Lourenço de Almeida que faça logo expulsar de Minas assim os estrangeiros como os religiosos que nelas não tem conventualidade, e que os remeta presos ao governador do Rio de Janeiro para que este, na mesma forma, os remeta para o Reino. E quanto aos frades filhos das províncias do Brasil que forem achados nas terras do sobredito governo e constar ao referido governador [...] os enviará presos aos seus prelados para que os castiguem com toda severidade.252

A pesquisadora Sandra Molina chama atenção para algumas medidas tomadas pela Ordem do Carmo de Portugal aproximadamente em 1728, após tomar ciência dos freis desregrados. Segundo ela, tratava-se de uma série de instruções enviadas pelo Frei Manoel da Esperança, Provincial da Ordem do Carmo de Portugal, para o Provincial do Maranhão e Grão- Pará, na tentativa de promover a disciplina entre seus membros e reafirmando a primazia dos bens espirituais.253 Mesmo assim, durante toda a segunda metade do século XVIII, cresceram as acusações de inobservância e relaxamento das Regras e da espiritualidade, o que ficou visível nos duros embates ocorridos entre os freis da Província Carmelita Fluminense frente à autoridade metropolitana, o Vice-rei D. Luis de Vasconcellos e Souza e o Bispo do Rio de Janeiro, D. Joaquim Castelo Branco. Tal fato serviu para a produção de uma Carta Relatório em 23 de maio de 1783, que fora enviada a Martinho de Mello e Castro, Secretário de Estado e Ministro de D. Maria I. Tratava-se de um pedido de anuência real para intervir na Província Carmelita para acabar com os descaminhos e evitar a contínua decadência da mesma organização.

O Vice-Rei D. Luiz de Vasconcelos relata, com base em fontes diversas, o constrangimento moral frente à lenidade para as punições relativas aos freis carmelitas desencaminhados. Não apenas fazia referência ao convento fluminense, mas a outros também pertencentes à província do Carmo do Rio de Janeiro que demonstravam semelhante desvio.

Em suas palavras, tudo respirava intrigas, desleixos e histórias desmoralizadoras, pautadas por

251 Cf. BOSCHI, Caio César. “Como os filhos de Israel no deserto”? (ou: a expulsão de eclesiásticos em Minas Gerais na 1ª metade do século XVIII). Vária História, Belo Horizonte, n. 21 (Número especial. Códice Costa Matoso), p. 119-141, jul. 1999.

252 BOSCHI, Caio César (org.). Coleção sumária e as próprias leis, cartas régias, avisos e ordens que se acham nos livros da Secretaria do Governo desta Capitania de Minas Gerais. Belo Horizonte: Secretaria de Estado de Cultura de Minas Gerais, Arquivo Público, 2010. p. 154.

253 MOLINA Sandra Rita. Des(obediencia), barganha e confronto: a luta da Província Carmelita Fluminense pela sobrevivência (1780-1836). Dissertação (Mestrado em História) - Instituto de Filosofia e Ciências Humanas, Universidade Estadual de Campinas, Campinas, 1998. p. 51.

129 relatos de fugas noturnas de frei e noviços do convento, como também a acumulação de bens materiais, o que conduziu-o a solicitar interferência do Bispo diocesano.

D. Luiz de Vasconcelos faz extenso relato apresentando as disputas internas constantes por poder, travadas, a princípio, por dois grupos rivais dentro da Ordem do Carmo. De um lado, estava frei Bernardo de Vasconcellos e, do outro, frei Inocêncio do Desterro Barros. O grupo de frei Inocêncio, há muito no poder, possuía quantidades razoáveis de partidários, muitos conquistados com favores e cargos na Ordem. Quando ocorria disputa pela direção da casa, era comum o uso de dinheiro para obter maior número de votos dentro dos opositores. Em 1743, começaram a contabilizar ocorrências que conduziriam à presente crise. Segundo D. Luiz de Vasconcelos, os carmelitas da província fluminense eram desorganizados, não seguindo as diretrizes básicas de obediência a sua Regra. O caso de Frei Francisco das Chagas ilustrava bem a situação. No mesmo ano acima, ele voltava para o convento quando foi tomado de assalto por freis rebelados que o aguardavam já na porta do convento. Ele foi cercado e conduzido a uma cela, deposto e substituído por eleição ilegal. Assumiu frei Filipe da Madre de Deus, presidente provincial. Frei Francisco permaneceu preso durante longo tempo e submetido a ameaças constantes de uma possível execução.

O caso tomou proporções legais, forçando o Ouvidor geral João Alves Simões a interpor ação de força para restituir não só a liberdade do frei cativo, como colocá-lo de volta ao seu cargo. O processo sofreu oposições entre os amotinados, que perpetraram um embargo junto aos tribunais. Em decorrência da demora em obter uma solução definitiva nos tribunais, que restabelecesse de uma vez por todas a ordem no convento e conduzisse à liberdade o cativo frei, o governador Gomes Freire sentiu-se impelido a interceder no evento. Para isso, convocou as tropas aquarteladas na cidade para restabelecer a ordem, se necessário fosse.

A ação foi interpretada entre os freis como um golpe à sua autogestão e um desafio claro a sua autoridade. Na tentativa vã de impedir a entrada dos homens do exército, carregaram o sacrário e o santíssimo sacramento e os colocaram atrás das entradas. Um dos altares ficava na porta da prisão e outro na portaria que dava ao pátio externo. O objetivo era dificultar a entrada das forças militares sem entrar em confronto físico. Ao usar os objetos sagrados como impedimento ou barreiras, colocava-se a própria retidão e submissão cristã daqueles homens.

São eles tão sacrílegos a ponto de derrubar símbolos tão sagrados?

Sob a tutela do governador, as tropas esquivaram-se dos impedimentos sagrados e forçaram a passagem. Do alto do convento, um frei carmelita, em desespero, deu início à excomunhão das tropas. As forças públicas derrubaram o portão principal, em seguida, a porta

130 da “obra nova, a porta junto da tamarinheira, a porta que vai da sacra-via para o pátio da capela dos terceiros”. Ainda sobrou a derrubada do muro da cerca do convento, seguida pela retirada de estacas de paus colocadas para atrasar ou evitar a passagem da cavalaria. Somente após a superação de todas as barreiras, atingiram finalmente a janela do cárcere, que foi destruída, e, com uma escada, foi possível pôr a salvo o frei Francisco das Chagas.

Ao final da invasão, os freis revoltosos abraçaram o Santíssimo Sacramento e saíram em procissão para refugiar-se no convento de Santo Antônio. Surpreendentemente, os insurgentes foram recebidos sem nenhuma penalização por parte dos seus superiores. A lista dos culpados havia sido composta com minúcia e entregue nas mãos do superior provincial Frei Francisco das Chagas por parte do governador e do bispo. O objetivo era que se aplicassem, conforme a Regra do Carmo, as punições devidas, o que decerto não aconteceu, pois, após alguns anos, um dos envolvidos, frei Manoel Villela, encontrava-se possuidor de privilégios e isenções em decorrência de seus longos anos na Ordem, detendo, nesse momento, o título de grão-mestre e doutor em Teologia e vivendo sem preocupações na Vila de Santos. O Vice-rei, apesar de identificar os culpados nessa cadeia de eventos, sentiu a ineficiência do sistema jurídico português para execução das necessárias diligências investigativas sobre o levante no Carmo. Na sua opinião, o tribunal havia tratado a questão com indiferença, ou, mais do que isso, com “descuido e frouxidão”. Essa atitude teve graves consequências para o próprio instituto carmelita, considerando que os amotinados que descumpriam os requisitos mínimos exigidos de obediência, de castidade e de pobreza ocuparam cargos da alta hierarquia e muitos tornaram-se provinciais em outras paragens, outros ocuparam o cargo de definidores, mestre de noviços e priorados.

Não era de se admirar a insatisfação, afinal, o grupo contradizia o estado de manutenção da ordem e de subordinação não apenas aos seus superiores do Carmo, mas, preponderantemente, a própria Coroa portuguesa, tutelar da Igreja Católica no Império Ultramarino. Nas palavras do Vice-Rei, no ar pairava um cheiro de revolta, lembranças do perigo de ver a América Portuguesa desfazer-se territorialmente e fragmentar o poder a outras instâncias fora do controle da coroa. Ainda havia a crescente indisposição com o poder recrudescente das instituições monásticas e conventuais. O Estado monárquico absolutista era rivalizado por esses grupos autônomos, e por que não determiná-los como autárquicos? “De semelhante frouxidão o que seguiu foi não fazerem os frades caso algum da sentença, desprezarem a autoridade da cousa julgada e desconhecerem inteiramente a potestade regia

131 insistindo: na pertinácia de súbditos rebeldes, e passando à temeridade de vassalos sediciosos.”254

Dentro de um sistema de relações clientelistas mantido e organizado entre os freis da Ordem, a troca de favores era em parte paga com cargos simbolicamente importantes ou financeiramente mais rentáveis. No caso, Frei Francisco Quintanilha admitiu em sua hoste o Frei Inocêncio do Desterro Barros, religioso engajado em uma das alas que disputavam o controle do Carmo. Sua carreira eclesiástica foi constituída graças à relação de amizade mantida com o Bispo Dom Frei Antônio do Desterro. O único cargo relevante que havia ocupado era o de fâmulo, logo, não havia outras experiências de trabalho em seu currículo que justificassem a sua nomeação para secretário do provincial. Frei Manoel Ângelo, que, posteriormente, foi sucessor de Frei Quintanilha, esteve no governo da Ordem do Carmo durante nove anos.

Subsequentemente, foi tachado de irreligioso por alguns representantes da Coroa Portuguesa.

O fato é justificado após a sua morte, no qual o inventário constava a quantia de vinte mil cruzados, composta, em sua a maior parte, por moeda corrente.

Outro elemento do conjunto de lideranças foi a insensata escolha do frei José Pereira de Sant’Anna como Provincial do Carmo fluminense. Eleito com quase unanimidade, tendo apenas um voto contra. A escolha para secretário foi rápida: permaneceu no poder frei Inocêncio do Desterro, que futuramente seria eleito por duas vezes secretário do Capítulo, algo incomum para um frei novo e com poucos anos de hábito, aproximadamente quinze. Para o Vice-Rei, a presença de tal sujeito era danosa uma vez que, ao seu julgamento, ele era destituído de bom juízo e portador de má consciência.

Embora pesasse a pena quando relatava os eventos, tecendo considerações sobre o caráter geral degradante da maioria dos freis, o Vice-Rei expunha fatos de testemunhas que vivenciavam o cotidiano do convento, em decorrência das minuciosas descrições in loco, as quais acredito serem relatos dos opositores do poderoso frei Inocêncio do Desterro e seus seguidores. Desde sua ascensão, frei Inocêncio exercia sua força por meio da manipulação política e de convencimento. De forma inteligente, colocou seus dominados em cargos de importância, como de prior, assegurando votos de apoio para os Capítulos futuros da Ordem do Carmo. Neste caso, dois dos escolhidos eram conhecidos – o primeiro deles a assumir o priorado do Rio de Janeiro fora Miguel Antunes, seguido logo por frei José Barreto. Ambos foram acusados de promoverem o que D. Vasconcelos chama de “relaxação”. Pela amplitude

254 Negócios eclesiásticos no Brasil colonial: Oficio do Vice-Rei Luiz de Vasconcellos. Revista Trimestral do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro, Rio de Janeiro, tomo LI, parte II (3ª e 4ª trimestre), p. 97-157, 1888.

p. 122.

132 que esta palavra insere nos fatos descritos, ela abarca não só a condição moral como também a administrativa. Algumas vezes movido por sentimentos inferiores como a inveja, Frei Inocêncio desprestigiava membros ilustres da sua Ordem de cargos de importância, tal como frei Francisco Quintanilha, frei Manoel Ângelo.

Houve a premeditada escolha de priores, que fossem votos seguros para o futuro capitulo, e entre eles o foram neste convento do Rio de Janeiro primeiro frei Miguel Antunes, e depois frei José Barreto, dos quais se dirá no seu lugar: ambos promoveram a relaxação com todo o empenho, enquanto o provincial, entregue a largas visitas da sua província com muito numerosa comitiva, se entretinha a maior parte do triênio á custa de excessiva despesa da mesma província nas fazendas dela entregue ás maiores dissoluções.255

Nas visitas promovidas pelos priores mancomunados ao frei Inocêncio, as comitivas eram demasiadamente grandes e dispendiosas. A lentidão de um triênio para percorrer o território da província dava cabal dimensão da sua ineficiência em manter a regência espiritual dos conventos e muito menos das Ordens Terceiras em pontos mais remotos, tudo custeado pelos cofres da Ordem do Carmo fluminense. Festas e danças associadas a comportamentos libidinosos por parte da comitiva eram comuns. Certa vez, na fazenda Camorim, pertencente ao convento da Ilha Grande, os freis prepararam um pequeno baile ao anoitecer. Para lá foram as escravas mulatas e pretas mais formosas. Ao som da viola e com corpos quase à mostra, as escravas davam remexidas nos quadris e seduziam os presentes com suas formas voluptuosas.

Frei Inocêncio estava presente, e insatisfeito em apenas observar, caiu no convite desafiador de uma das dançarinas. Sua participação mais intensa levou a plateia de religiosos ao delírio, que o aplaudiram e também se atiraram na roda de dança.256

A celeuma atingiu o máximo do tolerável, fazendo com que o Vice-rei interviesse por solicitação de D. Maria I. Foi feito um pedido de Reforma ao Capítulo novo. No entanto, apesar de proceder de forma tranquila, o provincial no período, frei João da Costa, era um religioso do flanco de Frei Inocêncio do Desterro, seguiram suas máximas a todo risco, escolheram para o governo os frades mais relaxados, contanto que fossem parciais seguros, puseram francas as

255 Negócios eclesiásticos no Brasil colonial: Oficio do Vice-Rei Luiz de Vasconcellos. Revista Trimestral do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro, Rio de Janeiro, tomo LI, parte II (3ª e 4ª trimestre), p. 97-157, 1888.

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256 Negócios eclesiásticos no Brasil colonial: Ofício do Vice-Rei Luiz de Vasconcellos. Revista Trimestral do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro, Rio de Janeiro, tomo LI, parte II (3ª e 4ª trimestre), p. 97-157, 1888.

p. 124.

133 licenças para longas moradias por fora, destruíram as fazendas, dissiparam os rendimentos, levando à desordem.257

No entanto, a solução para o caos estava atrelada à aplicação de um aperfeiçoamento da província carmelita, algo factível, tendo em vista a recém-aprovada reforma da Ordem do Carmo em Portugal e nos seus domínios. O problema foi a escolha para reformador do frei José Caetano de Souza. A decepção de Luiz de Vasconcelos em decorrência dos descaminhos assumidos pelo eleito Reformador frei José Caetano de Souza teve início já pela escolha para comissário delegado o frei José Pereira de San’Anna e a controversa presença participativa na reforma de frei Inocêncio do Desterro Barros. Tornavam-se claras as danosas consequências, ou, diga-se, inconsequências, pela predileção de figuras notórias pela conduta incoerente com a Regra da Ordem do Carmo. O Vice-Rei desconfiava do real “desconhecer”, por parte do reformador, não apenas dos atos pregressos dos supracitados freis, mas pela necessidade de retirá-los para execução da purga moral e administrativa da província. Da forma como foi instaurada, podia-se esperar a manutenção da manipulação pecuniária nos capítulos e as constantes intrigas entre alas rivais. Seria uma reforma que arranharia a superfície, que, na opinião de Luiz de Vasconcelos, não conduziria à reparação almejada.

Entre as medidas adotadas estava a imposição da austeridade, minimamente executada e restrita às celas da clausura. Os móveis de jacarandá bem ornamentados como papeleiras, cadeiras e camas foram substituídos por outros, mais rústicos. No entanto, essa intervenção paira sobre o campo simbólico. As celas são representativas de uma vida regrada e afastada do contato com o mundo exterior, algo significante e identitárias quando tratamos de organizações Regulares. Os problemas maiores, como o acúmulo avultado de bens pecuniários, vastos plantéis de escravos, moendas de açúcar e sítios, ainda estavam sobre a posse e frequentemente utilizados pelos freis do Carmelo. Chama atenção a opção de alterar apenas o que era visível, superficial e simples. Não houve investida para contabilizar os bens adquiridos de forma indevida. Não foram também lançadas punições previstas no livro de Regras da Ordem do Carmo.

A mesma postura por parte do reformador é quase um padrão de conduta, podendo ser verificada no mutismo frente à livre circulação dos freis pelas ruas fluminenses. Observe que esse ato rompe com a condição de isolamento previsto na doutrina da ordem, como princípio fundamental na busca pela iluminação espiritual. Até mesmo os vestuários afetados, com

257 Negócios eclesiásticos no Brasil colonial: Ofício do Vice-Rei Luiz de Vasconcellos. Revista Trimestral do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro, Rio de Janeiro, tomo LI, parte II (3ª e 4ª trimestre), p. 97-157, 1888.

p. 127.

No documento universidade federal de minas gerais (páginas 126-145)