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Perspectivas dos cirurgiões-dentistas sobre a inserção da fitoterapia na atenção básica de saúde

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Academic year: 2017

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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE CENTRO DE CIÊNCIAS DA SAÚDE

PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ODONTOLOGIA

ÁREA DE CONCENTRAÇÃO: ODONTOLOGIA PREVENTIVA E SOCIAL

PERSPECTIVAS DOS CIRURGIÕES-DENTISTAS SOBRE A INSERÇÃO DA

FITOTERAPIA NA ATENÇÃO BÁSICA DE SAÚDE

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José Ferreira Lima Júnior

PERSPECTIVAS DOS CIRURGIÕES-DENTISTAS SOBRE A INSERÇÃO DA

FITOTERAPIA NA ATENÇÃO BÁSICA DE SAÚDE

Dissertação apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Odontologia da UFRN como requisito parcial para a obtenção do grau de mestre em Odontologia, área de concentração: Odontologia Preventiva e Social.

Orientadora: Profª Drª Magda Diniz Bezerra Dimenstein

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A Deus, por eu ainda estar vivo e defendendo esta dissertação. Muito obrigado, Senhor.

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AGRADECIMENTOS

À minha orientadora Magda Dimenstein pela liberdade concedida durante este tempo de convívio; por sempre responder todos meus inúmeros e-mails e pela orientação à distância que deu certo. O meu muito obrigado!

À minha mãe, pessoa mais importante da minha vida, por sempre me incentivar a estudar e compreender minha ausência.

Aos colegas que o trilhar da vida me permitiu classificar de “amigos-irmãos”: Luiz Carlos de Azevedo Souza, Eduardo Antônio de França Mota e Manoela de Souza Araújo Silva, pela convivência sempre prazerosa e amiga, imprescindível para mim.

À Patrícia, por entender que nem sempre eu podia estar por perto.

Ao professor e amigo Dr. Kenio Costa Lima, por acreditar nos alunos de Iniciação Científica e impulsioná-los a fazer a seleção do mestrado. Eu era um deles, hoje estou aqui e sonhando com o doutoramento. Por tudo, eu agradeço: valeu cara!

Aos professores e colegas do Programa de Pós-Graduação em Odontologia Preventiva e Social pela convivência harmoniosa durante estes anos de estudos em nossas vidas.

Aos que fazem a Secretaria Municipal de Saúde de Granjeiro (CE), por entenderem minhas ausências motivadas por atividades do mestrado.

A Srª Cleonice e Maria Dalva, pela atenção e solicitude dedicadas a mim desde o primeiro dia em nos conhecemos. Agradeço pela permissão para usar o computador, essencial para a feitura da parte final deste trabalho.

À Universidade Federal do Rio Grande do Norte, sem a qual eu dificilmente estaria aqui hoje. À UFRN devo muito pelos anos de moradia e alimentação na Residência Universitária, pela oportunidade na Iniciação Científica, pela graduação, pela pós-graduação e, principalmente, pela visão de mundo que imprimiu em mim. Por tudo isto, agradeço a esta universidade.

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É preciso sonhar, mas com a condição de crer em nosso sonho, de examinar com atenção a vida real, de confrontar nossa observação com nosso sonho de realizar escrupulosamente nossa fantasia. Sonhos: acredite neles.

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RESUMO

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ABSTRACT

This work aims at investigating the surgeons-dentists’ acceptability in the field of public health in the city of Natal, State of Rio Grande do Norte, about the possibility of medicinal plants insertion in basic attencion of health. Moreover, it searchs to know if during their professinal formation it had some theoretician-pratical basement on this subject, as well as investigating their confidence on the medicinal plants. The basic motivation for developing this study is the possibility of contributing to the insertion of a tradicional health pratical at public assistance scope, endorsed by popular use, but now scientifically proven. For in a such way, the medicinal plants use is emphasized as a way to be followed to increase basic pharmaceutical assistance, improving the acess to the medicine and diminish expenses. Following this logic, family health program constitutes the way through which this pratical will be available to the users of health services. The research was done over thirty surgeons-dentists, all of them pertaining to public service of Natal, state of Rio Grande do Norte. It was used, as research instrument, semi-estructured interview associated with methodological analysis user’s speeches. On this form, this work is inserted in a trend observed nowadays not only in Brazil, where the use of the medicinal plants has been stimulated and defended to be inserted at programs of primary attenction of health.

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LISTA DE SIGLAS AMA - Associação Médica Americana

CD - Cirurgião-dentista

CFO - Conselho Federal de Odontologia CNS - Conferência Nacional de Saúde DSO - Distrito sanitário oeste

FIOCRUZ - Fundação Oswaldo Cruz

IBPM - Instituto Brasileiro de Plantas Medicinais IDA - Integração Docente-Assistencial

IDH - Índice de Desenvolvimento Humano MS - Ministério da Saúde

NOAS - Norma Operacional de Assistência à Saúde OMS - Organização Mundial da Saúde

PACS - Programa de Agentes Comunitários de Saúde PSF - Programa de Saúde da Família

SMS - Secretaria municipal de saúde SUS - Sistema Único de Saúde. UFC - Universidade Federal do Ceará

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LISTA DE TABELAS

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SUMÁRIO

RESUMO...6

ABSTRACT ...7

LISTA DE SIGLAS...8

LISTA DE TABELAS...9

INTRODUÇÃO...12

FITOTERAPIA: ORIGEM E UTILIZAÇÃO... 12

REFERENCIAL TEÓRICO...16

CAPÍTULO 1. O PROCESSO DE FORMAÇÃO DOS PROFISSIONAIS DE SAÚDE E SUA RELAÇÃO COM O MODELO DE ATENÇÃO...16

1.1 - Breve resgate histórico e conceito do paradigma flexneriano ...16

1.2 - Movimentos de reforma educacional e sanitária no setor saúde...21

1.3 - O modelo de atenção segundo a concepção flexneriana...27

CAPÍTULO 2. PROGRAMA DE SAÚDE DA FAMÍLIA: A ATENÇÃO BÁSICA À LUZ DOS PRINCÍPIOS E DIRETRIZES DO SUS ...31

2.1 - O contexto histórico do surgimento do SUS...31

2.2 - A filosofia de prestação à saúde do SUS ...32

2.3 - Princípios que regem a organização do SUS ...35

2.4 - Atenção primária: breve histórico e conceito ...36

2.5 - O PSF e a atenção básica ...39

CAPÍTULO 3. FITOTERAPIA X ATENÇÃO BÁSICA: UMA RELAÇÃO A EXPLORAR ...44

3.1 - Fitoterapia: uma tradição milenar ...44

3.2 - A fitoterapia no SUS ...46

OBJETIVOS...53

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RESULTADOS E DISCUSSÃO...57

I. Perfil profissional ...57

II. A formação profissional dos cirurgiões-dentistas e o nível de conhecimento deles acerca da fitoterapia...65

III. Tipos e formas de utilização de fitoterápicos pelos usuários ...66

IV. Tipos de fitoterápicos prescritos pelos profissionais ...68

V. Utilização de fitoterápicos pelos próprios cirurgiões-dentistas...70

VI. Inserção da fitoterapia como alternativa terapêutica na rede básica de saúde ...72

VII. Fatores que dificultam a implantação da fitoterapia na rede básica de saúde ...86

CONCLUSÕES...95

REFERÊNCIAS. ...102

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INTRODUÇÃO

O ponto de partida deste estudo foi um projeto de Iniciação Científica do Programa Institucional de Bolsas de Iniciação Científica (PIBIC), ligado a Base de Pesquisas Grupo de Estudos em Saúde Bucal (GESB), do então Curso de Mestrado em Odontologia Social, hoje Programa de Pós-Graduação em Odontologia Preventiva e Social (PPGOPS) da UFRN. Tal projeto foi intitulado de “O uso de fitoterápicos e a saúde bucal”, tendo eu participado dele como bolsista quando aluno da graduação em 2001.

Tal trabalho investigou o uso de plantas medicinais pela população, bem como descreveu, dentro do universo de pessoas que fazem uso das propriedades terapêuticas do reino vegetal, a porcentagem de uso dos fitoterápicos para cuidados em relação à saúde bucal, além de ter verificado quais as indicações e formas de utilização mais comuns de tais plantas. Como conclusão deste estudo preliminar, obteve-se que grande parte das pessoas participantes da pesquisa usava plantas medicinais no tratamento dos mais diversos agravos à saúde, inclusive para tratar afecções bucais, tais como processos inflamatórios da orofaringe, odontalgias e gengivites.

Essa experiência anterior motivou o desenvolvimento de uma nova investigação, agora em nível de mestrado, no sentido de ampliar o conhecimento produzido ainda na graduação, uma vez que a literatura relata a aceitação e utilização das plantas medicinais por parte da população; no entanto, não revela a aceitação dos profissionais de saúde, nem tampouco dos profissionais da Odontologia.

FITOTERAPIA: ORIGEM E UTILIZAÇÃO

As plantas medicinais têm sido utilizadas desde os primórdios da humanidade. A escolha daquelas mais adequadas para dar resolutividade aos males do homem primitivo se dava por tentativa e erro e o tempo tratava de mostrar qual era a mais indicada para determinado fim. O conhecimento adquirido foi, então, transmitido de geração a geração até os dias de hoje.

Segundo Teske e Trenitini55, a Fitoterapia - palavra originária dos radicais gregos

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pesquisas realizadas com ervas confirmam geralmente os usos tradicionais das plantas, o que traz aos cientistas a convicção de que há muito a se aprender com os costumes populares. Nesse sentido, algumas plantas já são bem conhecidas; outras, não se conhece nem a sua composição. Cerca de 300 a 400 plantas são estudadas no mundo e só o Brasil possui mais de 100 mil espécies, dos quais menos de 1% teve suas propriedades avaliadas cientificamente.

O emprego dos vegetais como alimento, medicamento ou cosmético, se perdeu na história do homem na face da Terra. Os estudos da Arqueologia demonstraram que há mais de 3000 anos as ervas eram utilizadas para este fim. Numerosas foram as etapas que marcaram a evolução da arte de curar, porém torna-se difícil delimitá-las com exatidão, já que a Medicina esteve por muito tempo associada às práticas mágicas, místicas e ritualísticas. Considerados ou não seres espirituais, as plantas, por suas propriedades terapêuticas ou tóxicas, adquiriram fundamental importância na medicina popular. É admirável o fato de todas as civilizações em todos os continentes terem desenvolvido pesquisas sobre as virtudes das plantas para fins medicinais. Porém, é mais admirável ainda que esse conjunto de conhecimentos tenha subsistido por milênios33.

Em todos os países, sejam desenvolvidos, sejam em desenvolvimento, são utilizadas plantas com fins medicinais. Nos primeiros, as plantas não só constituem matérias-primas para a produção industrial de derivados químicos puros, como também fazem parte de extratos ou compostos fitoterápicos, utilizados no tratamento das mais diversas enfermidades, função bastante presente nos países em desenvolvimento. Um exemplo deste procedimento encontra-se na Alemanha, onde atualmente 80% da medicação vendida é feito com fitoterápicos, pois a análise das espécies de uso popular à luz da ciência propiciou essa aproximação da Fitoterapia com a Alopatia.

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Apesar da pouca quantidade de estudos com fitoterápicos no Brasil, a partir da revisão bibliográfica feita, foram encontrados alguns estudos que comprovaram o uso de fitoterápicos pela população. No entanto, os trabalhos encontrados relacionavam-se sempre ao saber popular em relação às plantas medicinais, não fazendo nenhuma alusão ao conhecimento, aceitação e confiança por parte dos profissionais da saúde em relação a esta prática popular.

Diante disto, considera-se importante o desenvolvimento de linhas de pesquisa na área de políticas de saúde, no sentido de buscar indícios do nível de conhecimento dos profissionais sobre a fitoterapia para que, futuramente, esta prática possa fazer parte dos cuidados primários dentro da atenção básica em nível público, como por exemplo, no Programa de Saúde da Família. Outro ponto a ser considerado refere-se à acessibilidade e custos relacionados aos medicamentos fitoterápicos. Os trabalhos de pesquisa com plantas medicinais, geralmente originam medicamentos em menos tempo, com custos muitas vezes inferiores e, conseqüentemente, mais acessíveis à população, que em geral encontra-se sem quaisquer condições financeiras de arcar com os custos elevados da aquisição de medicamentos convencionais, que possam ser utilizados como parte do atendimento das necessidades primárias de saúde.

Além disso, vislumbra-se com este estudo a formulação de uma política de saúde que venha a promover discussões sobre a possibilidade concreta de inserção da prática da utilização dos fitoterápicos, por parte dos profissionais e pacientes, nas unidades básicas de saúde do município de Natal – RN, o que corrobora uma idéia defendida pela Organização Mundial da Saúde (OMS), haja vista o conhecimento e a utilização empírica dessas plantas medicinais pela população já serem bastante difundidas, porém, nem sempre de forma correta no que diz respeito às indicações e formas de utilização.

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O referencial teórico deste trabalho está organizado em três capítulos. O primeiro enfoca a questão da formação dos profissionais na área de saúde e sua relação com a maneira como é prestada a assistência à saúde, principalmente no âmbito dos serviços públicos.

No segundo capítulo, objetiva-se conceituar o Sistema Único de Saúde (SUS), discutindo seus princípios e diretrizes. Especial ênfase será dada para a Atenção Básica à Saúde, a partir da qual se chegará na Estratégia de Saúde da Família, objeto maior de discussão e análise, haja vista se configurar como uma nova proposta em termos de prestação dos serviços de saúde, onde a família constitui o núcleo central da abordagem.

No terceiro, ressalta-se a importância da fitoterapia dentro da Atenção Primária à saúde, enfatizando ser esta uma alternativa economicamente viável e tecnicamente exeqüível, ademais de ser incentivada pela OMS como forma de melhorar o acesso da população aos medicamentos que pertencem ao âmbito da atenção básica de saúde. Várias são as razões que fundamentam esta afirmação, dentre elas pode-se citar a utilização de plantas medicinais por grande parte da população e a facilidade do acesso das pessoas às espécies vegetais.

Na seqüência, encontram-se os objetivos do estudo e os aspectos metodológicos que nortearam a pesquisa. Por fim, são apresentadas e discutidas as falas dos entrevistados relativas às questões pertinentes a fitoterapia.

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REFERENCIAL TEÓRICO

1. O PROCESSO DE FORMAÇÃO DOS PROFISSIONAIS DE SAÚDE E

SUA RELAÇÃO COM O MODELO DE ATENÇÃO

Esse capítulo procura, inicialmente, realizar um resgate sobre as circunstâncias históricas que propiciaram o surgimento da concepção flexneriana na saúde, tendo como eixo norteador a publicação do Relatório Flexner, em 1910. A partir daí, são descritos os movimentos de reforma no setor saúde, que tanto influenciaram não só a prestação dos cuidados, como também o processo de formação dos profissionais da área. Por fim, esse capítulo ainda apresenta as influências que o Flexnerianismo e a educação superior no setor saúde tiveram sobre o modelo de prestação dos cuidados à saúde ao longo do século XX.

1.1 BREVE RESGATE HISTÓRICO E CONCEITO DO PARADIGMA FLEXNERIANO

Para estabelecer uma relação entre o processo de formação dos profissionais na área da saúde e a produção dos serviços de saúde, faz-se necessário, inicialmente, realizar um resgate histórico sobre a educação médica. Para tanto, analise-se inicialmente o caso dos Estados Unidos da América no final do século XIX e inicio do século XX. Na época, houve uma expansão do ensino médico naquele país, tendo surgido um grande número de escolas não ligadas à universidade, as chamadas “proprietary schools”, cujo ensino era considerado de baixa qualidade e insatisfatório. Isto ensejou um agudo questionamento da maneira como os médicos eram formados20.

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seu nome. Este documento, publicado em 1910, ultrapassou seus objetivos – políticos, institucionais, sociais e geográficos – e aportou em todos os países da região latino-americana, notadamente após a II Guerra. Sem sombra de dúvida, seus princípios e parâmetros - aparentemente voltados para a formação do médico – inspiram as diretrizes que até hoje costuram as relações entre ensino e serviços de saúde, orientam as políticas e a operação desses setores de produção social e, afinal, conformam ou orientam as próprias demandas sociais48.

A enorme força que teve esse Relatório fez com que ele, ademais de disciplinar o aparato formador dentro dos Estados Unidos, incluindo a redução das instituições de ensino existentes à época, influenciasse não apenas a formação (incluindo a discussão da participação feminina no trabalho médico), mas também a prática médica, não só naquele país como em todo o mundo. Consolidou-se, então, o paradigma da medicina científica, que orientou o desenvolvimento das ciências médicas, do ensino e das práticas profissionais em toda a área da saúde ao longo do século XX. As características ainda tão marcantes da educação superior nessa área, quais sejam a segmentação em ciclos básico e profissional, o ensino baseado em disciplinas ou especialidades e ambientado predominantemente no hospital têm origens no Relatório Flexner48.

Assim, tomando como base o resultado do estudo publicado em 1910, quando foram analisadas 155 escolas médicas que existiam à época nos Estados Unidos e no Canadá; apurou-se que 124 delas não adotavam o modelo aceito pela ciência moderna; tendo sido decretado o fechamento delas em consonância com a American Medical Association.

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O modo flexneriano de pensar a saúde através da formação e da prática médica vem ao longo dos anos impactando os processos educacionais e de produção dos serviços na área da saúde. O hospital como espaço da cura e eixo estruturante dos serviços e da formação, o privilégio da abordagem clínica/individual, a especialização intensiva e extensiva (primeiramente dirigida à formação do médico e, logo depois, um dogma a ser seguido pelas demais profissões da área), o controle e a auto-regulação do exercício profissional, a ênfase na pesquisa biológica, dentre outras práticas hegemônicas, traduzem de maneira inequívoca, a interpenetração da concepção flexneriana nos processos de formação e de assistência à saúde até os dias atuais. Sua adoção pelas instituições de ensino superior sempre esteve atrelada ao desempenho técnico e científico, inclusive credenciando-as mais e melhor, para captação de parcerias e investimentos nacionais, internacionais, públicos e privados27.

Conforme já explicitado, estas concepções foram pensadas inicialmente para a classe médica, no entanto, extrapolando seus objetivos, institucionalizaram-se como um caminho a ser seguido para as demais profissões do setor de saúde. Na Odontologia, é necessário se reportar ao relatório Gies de 1926, onde o mesmo aborda a educação dental nos Estados Unidos e Canadá, passando do modelo pouco sistematizado, para uma reorganização da prática odontológica e das faculdades de Odontologia, pelo modelo biologicista e curativista22. Ou seja, houve uma mudança de um modelo baseado no senso comum para outro ancorado na cientificidade.

No entender de Cordón22, o modelo Giesiano, que buscava maior autonomia para a Odontologia frente à Medicina, no início de sua formatação seguia os conceitos ideológicos do paradigma de Flexner condutor das práticas médicas, vindo a posteriori assumir posturas mais positivistas, monopolistas, biologicistas e mecanicistas que as contidas no paradigma flexneriano, tudo dentro da estratégia para assegurar tal autonomia profissional.

O triunfo das teses de Gies em 1935 e a criação do Conselho de Educação Dental nos Estados Unidos, que viria a dar sustentação à prática que se delineava e se realizava, vieram de encontro à aspiração corporativista dos odontólogos de se firmarem como categoria e não mais como uma simples especialidade médica, mesmo que para conseguir tal intento tenha tido que segmentar a prática (focalização na boca) e descontextualizá-la socialmente22.

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patrocinada pelo Estado, tanto pelo aspecto custo quanto pela visão individualista clínica de resolução do processo saúde-doença22.

O impacto ocorrido sobre a formação do dentista foi semelhante àquele ocorrido com os médicos, tendo como conseqüência, um profissional cuja prática estava orientada para atividades curativistas, individualistas, fragmentadas e centradas na clínica privada, sem lugar para o desenvolvimento de ações coletivas ligadas ao campo da atenção básica de saúde, tão enfatizadas atualmente nos programas governamentais de saúde pública. Cabe acrescentar que na filosofia de assistência à saúde apresentada, não há lugar para as práticas ou terapias alternativas, quais sejam a homeopatia, a fitoterapia, a acupuntura, dentre outras; haja vista elas não se enquadrarem no paradigma científico moderno.

Para o setor de produção dos cuidados à saúde, a incorporação da lógica que preside esta concepção é interpretada como aumento do seu potencial desempenho e produtividade. No entanto, tal incorporação tem resultado em impasses. Se bem que o contínuo desenvolvimento científico e suas aplicações tecnológicas, em termos de possibilidades propedêuticas e terapêuticas centradas no ato médico, conduziu o modelo flexneriano à glória; contraditoriamente, fez emergir crises e críticas no tocante à organização, financiamento e resultados dos serviços de saúde, bem como aos processos de formação profissional, destacadamente do médico.

Para Freitag27, uma explicação plausível relaciona-se à crescente expansão dos gastos associados ao consumo desenfreado de novidades ofertadas pelos serviços de saúde, em contraste com a finitude de recursos para o seu custeio, mesmo nos países mais ricos. Contudo, vale indagar se o modelo flexneriano encontra-se mesmo em crise ou, muito pelo contrário, em pleno apogeu, a despeito dos paradoxos e críticas que tem suscitado. O que ocorreu com o modelo flexneriano pode ser interpretado, essencialmente, como um processo político-social de aprendizado e incorporação, onde um valor com intenções práticas transforma-se em senso comum, em normatividade hegemônica – indispensável para estabilizar as relações de poder - e, com isso, as relações de produção.

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De acordo com Mendes37, os princípios básicos desta concepção podem ser expressos sucintamente pelos seguintes elementos estruturais:

1. O mecanicismo que faz analogia do corpo com uma máquina, elemento essencial do modo de produção dominante;

2. O biologismo, que pressupõe o reconhecimento exclusivo da natureza biológica das doenças e de suas causas e conseqüências;

3. O individualismo, que se manifesta pela instituição do objeto individual da saúde excluindo os aspectos sociais;

4. A especialização, que resulta na troca da globalidade do sujeito pelo conhecimento científico;

5. A exclusão de práticas alternativas, já que a viabilização do paradigma da medicina científica se fez com base na sua supremacia sobre as outras práticas médicas alternativas, populares ou acadêmicas;

6. A tecnificação calcada no ato médico, como nova forma de mediação entre o homem e as doenças;

7. O curativismo, ênfase no aspecto curativo privilegiando o diagnóstico e a terapêutica.

8. Concentração de recursos, nos planos espacial e institucional e, em conseqüência, a medicina cientifica tornou-se urbano-cêntrica e hospital-cêntrica.

Apesar de consagrado política e tecnicamente, conforme já referido, o modo flexneriano de pensar e agir emerge no cenário mundial como reflexo de um momento histórico no qual a sociedade passava por importantes transformações científicas, culturais e tecnológicas.

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assistência à saúde. Para este autor, ‘as causas do modo como se estabeleceu a formação e atuação dos profissionais da saúde são múltiplas, elas podem ser encontradas dentro e fora da ciência médica e estão inextricavelmente ligadas à crise mais ampla de natureza social e cultural’.

A educação e atuação médicas não são frutos exclusivos de Flexner e seus pressupostos. Não se pode creditar a ele toda esta força, uma vez que o conteúdo do seu relatório publicado em 1910 só vem expressar uma concepção de saúde/doença que permeia toda uma sociedade e é antes de tudo, política. Ou seja, este relatório surgiu e ganhou força porque havia toda uma concepção permeando a vida social sintonizada com as propostas.

A interação destas proposições cria um novo paradigma da prática médica, a medicina cientifica, que se caracteriza pela concepção mecanicista do homem, pela redução a-social e a-histórica da doença à sua dimensão biológica, pela individualização do seu objeto, pela crescente corporificação do conhecimento em tecnologia de alta densidade de capital exercitada por agentes especializados, pela ênfase nos aspectos curativos da medicina, pelo seu caráter urbano-cêntrico e hospital-cêntrico e pela exclusão de formas alternativas de prática37.

1.2 MOVIMENTOS DE REFORMA EDUCACIONAL E SANITÁRIA NO SETOR SAÚDE

Segundo Santana e Christófaro48, de forma quase paralela e concomitante, seguiram-se, a esse movimento de formulação da concepção flexneriana, outros tantos movimentos – medicina preventiva, medicina integrada, medicina comunitária, integração docente-assistencial. Todos esses movimentos de reforma educacional e, articuladamente, de reforma sanitária foram afluentes do processo que, no Brasil, culminou na Constituição de 1988, redefinindo as bases conceituais, legais e operacionais dos setores de saúde e educação nacionais.

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assistência médica nos Estados Unidos é posta em xeque. É nesse momento que surge a proposta da Reforma Preventivista e da Medicina Integral, encampada pela Associação Médica Americana (AMA), antecipando-se a propostas mais radicais que propugnavam a intervenção do Estado na assistência médica. Vale ressaltar que nessa época foi criado na Inglaterra o Serviço Nacional de Saúde, que adota um modelo muito diferente do americano. A proposta da AMA era de que a ação médica estendida para outros níveis, especialmente o período pré-patogênico, resultaria numa medicina mais efetiva. A base doutrinária desse projeto foi o modelo da "história natural da doença" (desenvolvido por Leavell & Clark), que incluía no âmbito da ação médica não apenas os doentes, mas toda a população e, desse modo, beneficiária dos avanços científicos e tecnológicos da medicina.

Ao invés de uma reforma “por fora”, que reorganizasse o sistema de prestação de cuidados, como no caso da Inglaterra, tratava-se de uma reforma “por dentro”, no pressuposto de que se modificando a consciência e a abordagem dos profissionais de saúde reverter-se-ia o quadro sanitário49.

Os movimentos preventivista e da medicina integral, modulados principalmente pela experiência americana, disseminaram-se de forma sistemática na América Latina a partir da reunião de Viña del Mar - Chile, realizada em 1956 sob auspícios da Organização Pan-Americana da Saúde. Por vários motivos, em geral relacionados aos processos políticos em curso nos países dessa região e às condições sociais de suas populações, esse movimento ganhou características próprias, afastando-o da influência original. Dentre as heranças similares à experiência norte-americana estão a criação de departamentos de medicina preventiva nas escolas médicas latino-americanas e a cisão entre o saber/fazer preventivo (tido como foco principal da atenção primária de saúde) e o curativo (reconhecido como inerente aos serviços hospitalares)48.

Embora a medicina preventiva pretendesse constituir, ao menos para alguns de seus arautos, uma proposta de reforma do modelo flexneriano, o movimento preventivista apenas redirecionou as bases conceituais e operacionais dos processos de formação e de produção de serviços de saúde, constituindo-se, efetivamente, numa prática complementar ao flexnerianismo, articulando a saúde pública com a medicina liberal.

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encarece, em contraste com o incremento da consciência sanitária e das reivindicações sociais por mais e melhor atendimento.

A Medicina Comunitária corresponde a um retorno à medicina simplificada, uma volta ao modelo anterior à explosão tecnológica, como forma de tentar incluir as camadas marginalizadas pelo processo de desenvolvimento desigual. Para tanto, seria necessário estimular a participação da comunidade na produção dos serviços, mormente através do trabalho voluntário49.

Quanto ao movimento de Integração Docente Assistencial (IDA), cabe destacar suas propostas táticas de resistência e cooptação dirigidas à introdução, no ensino de graduação das profissões de saúde, dos princípios e métodos da "epidemiologia social" e da concepção do "processo saúde-doença". A IDA defendia, com igual ênfase, experiências educacionais e curriculares no contexto da realidade sanitária e dos serviços básicos de saúde com a presença, precoce e oportuna, do aluno; a participação de docentes na prestação de serviços e de profissionais desses serviços na formulação e operação do programa de ensino.

No Brasil, a partir da década de setenta, verifica-se a expansão de atividades de IDA, sob a designação de programas de extensão, tanto em áreas periféricas como urbanas. É interessante lembrar dois fatores que estão intimamente ligados ao espaço que as propostas de IDA conquistaram nas instituições de ensino superior de saúde do País: a inviabilidade de manter todos os estudantes nos hospitais de ensino, ante o expressivo e abrupto aumento de matrículas (em razão da expansão que se seguiu à aprovação da Lei 5540/681 - o que não ocorreu nas escolas do nível médio da formação profissional); e as mudanças de financiamento e clientela desses serviços, que exigiam maior produtividade, em geral incompatível com a presença de estudantes nos serviços hospitalares. Entretanto, tais atividades apenas tangenciavam o processo de formação, que persistia centrado no hospital, focalizado na assistência clínico-individual e devotado às especialidades.

Frente a todos estes movimentos contra-hegemônicos descritos, cabe neste momento, fazer o devido recorte para a área odontológica. Nesse sentido, surgiram várias experiências na tentativa de se contrapor à Odontologia dominante, quais sejam: Odontologia Sanitária, Odontologia Preventiva, Odontologia Social, Odontologia Simplificada, Odontologia Integral e a Saúde Bucal Coletiva.

1

(24)

Alguns autores trabalham no sentido de conceituar e diferenciar cada uma delas. Chaves citado por Narvai38 afirma que:

“Odontologia sanitária é trabalho organizado da comunidade, na comunidade e para a comunidade, no sentido de obter as melhores condições médias possíveis de saúde oral. Não estamos entre os que acham que Odontologia Preventiva e Odontologia Sanitária são sinônimos. A distinção entre ambas é ao nosso ver muito clara. A Odontologia Preventiva tomando prevenção em sentido restrito, é a parte da Odontologia que trata dos diferentes modos pelos quais se podem prevenir as enfermidades orais. A Odontologia Preventiva, ao estudar um método preventivo, não cogita de saber se aquele método será usado em clínica particular ou em saúde pública. Esta cogitação constitui objeto da Odontologia Sanitária”.

Frente ao exposto, o autor deixa claro que o objeto de estudo da Odontologia Sanitária é todo o conjunto de doenças sob a responsabilidade do dentista, porém no âmbito da comunidade, ao passo que a Odontologia Preventiva preocupa-se com os métodos preventivos utilizados em saúde bucal, quer sejam aplicados individualmente em clínica particular ou em programas de saúde pública.

Sobre a Odontologia Social, Pinto citado por Narvai38 relata que:

(25)

O mesmo autor complementa afirmando que a missão básica da Odontologia Social é identificar as verdadeiras causas que impedem a obtenção de bons níveis de saúde por parte

da população e agir pela sua superação. A expressão Odontologia Simplificada apareceu no discurso odontológico brasileiro

nos anos setenta. Tal expressão fazia crítica à Odontologia Científica e se reivindicava ‘alternativa’, a partir de um outro paradigma. Mendes e Marcos citado por Narvai38 definem assim a Odontologia Simplificada: “uma prática profissional que permita, através da padronização, da diminuição de passos e elementos e da eliminação do supérfluo, tornar mais simples e barata a Odontologia, sem alterar a qualidade dos trabalhos realizados. E que, ao tornar-se mais produtiva, torna viável os programas de extensão de cobertura”.

Sobre a Odontologia Simplificada cabe ressaltar ainda que ela não pretendeu uma mudança qualitativa na prática profissional. Apenas constitui-se em uma Odontologia complementar, destinada às classes sociais marginalizadas e concretizada pela simplificação dos elementos da prática profissional, em especial recursos humanos e equipamentos, sem questionar a Odontologia científica ou flexneriana38.

Um outro adjetivo que foi posto ao lado do vocábulo Odontologia foi Integral. Assim, a Odontologia Integral segundo Marcos citado por Narvai38 seria uma nova concepção da Odontologia na medida em que incorporaria o saber e o fazer ao nível do interesse da coletividade. A proposta desta Odontologia é alternativa, na medida de sua universalização e igualização, ou seja, não é uma prática destinada a populações marginalizadas, mas um novo modelo substitutivo do atual.

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reivindicava origem distinta das “odontologias”, bem como outras articulações e compromissos38 .

A despeito dessas tentativas (quer sejam da Medicina ou da Odontologia) de superação do paradigma flexneriano não terem logrado êxito, o saldo final dos diversos momentos de crises e conquistas tem sido positivo. O lema “Saúde para Todos” e estratégia da “Atenção Primária”, consagrados mundialmente na reunião de Alma-Ata em 1978, tiveram muito a ver com tais movimentos e seus avanços reformistas.

No Brasil, a Reforma Sanitária teve forte influência dos movimentos supracitados. A reformulação do setor saúde, com a implementação das Ações Integradas de Saúde (AIS), do Sistema Unificado e Descentralizado de Saúde (SUDS) e, por último, Sistema Único de Saúde, nos anos 1980, resultou da acumulação política e técnica proporcionada pelas experiências de medicina comunitária e integração docente-assistencial.

Com relação à reforma educacional, seu eixo principal estava centrado no currículo, onde deveria desenvolver uma nova consciência e uma nova abordagem dos problemas de saúde, extrapolando as questões meramente biológicas (endeusadas pela concepção flexneriana) e passando a ver os problemas e agravos à saúde como resultantes de uma realidade social na qual a pessoa (em nível individual) ou a população (em nível coletivo) está inserida.

Dessa forma, os egressos das escolas de saúde estariam aptos a dominar os conhecimentos científicos básicos de natureza biopsicossocioambiental subjacentes à prática médica, tão necessários para um exercício profissional não autoritário, capaz de negociar condutas e intervenções a partir da escuta atenta das perspectivas de pacientes, famílias e comunidades.

(27)

1.3 O MODELO DE ATENÇÃO SEGUNDO A CONCEPÇÃO FLEXNERIANA

Considerando as características e princípios básicos que o Relatório Flexner imprimiu no setor saúde, cabe aqui agora descrever o modelo hegemônico de prestação de cuidados à saúde, haja vista o processo histórico de sua construção já ter sido delineado anteriormente.

No campo da saúde, a influência do paradigma flexneriano no pensamento médico resultou no modelo biomédico, alicerce consensual da moderna medicina científica.

A analogia do corpo humano como uma máquina muito complexa pressupõe constante inspeção de um especialista, daí a lógica da “troca da globalidade pelo conhecimento científico”, anteriormente já afirmado por Mendes37. O modelo biomédico não vê o corpo como uma máquina perfeita, porém com uma máquina que tem, ou terá, problemas, que só especialistas podem constatar.

De acordo com Koifman30, o fenômeno biológico é explicado pela química e pela física. Não parece haver espaço, portanto, dentro dessa estrutura, para as questões sociais, psicológicas e para as dimensões comportamentais das doenças. Acredita-se ser as doenças resultado ou de processo degenerativo dentro do corpo, ou de agentes químicos, físicos ou biológicos, ou, ainda, da falha de algum mecanismo regulatório do corpo. Segundo esta visão, doenças podem ser detectadas apenas por métodos científicos.

Partindo do principio, concernente a esse modelo, de que a saúde e a vida saudável emergirão automaticamente da ciência, os tratamentos médicos consistiriam em esforços para reestruturar o funcionamento normal do corpo, para interromper processos degenerativos.

A concepção mecanicista do organismo humano levou a uma abordagem técnica da saúde, configurando um modelo de atenção curativista no qual a doença é reduzida a uma avaria mecânica, e a terapia médica, à manipulação técnica30.

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Nesse modelo de prática médica, muito poder é atribuído aos profissionais, que são colocados numa posição em que somente eles sabem o que é importante para a saúde dos indivíduos e só eles podem fazer alguma coisa a esse respeito.

Destarte, a prática médica objetiva consertar um determinado mecanismo biológico em uma dada parte do corpo, sendo que para cada órgão ou sistema, há um especialista específico. Para Carvalho19, a saúde é um fenômeno que não pode ser entendido em termos reducionistas devido a envolver uma complexa interação entre os aspectos físicos, psicológicos, sociais e ambientais da condição humana.

Nesse sentido, cabe aqui explicitar que os princípios básicos do modelo biomédico estão sobremaneira enraizados na cultura vigente, que se tornou o modelo dominante no pensar e no agir do setor saúde. É necessário frisar que os estudantes desde sua formação, bem como ao iniciarem suas vidas profissionais, sentem as dificuldades de mudar os moldes atuais da assistência à saúde.

No caso brasileiro, esta, além de ineficaz e de não corresponder às necessidades de saúde dos usuários, mostra-se fragmentada haja vista não adotar uma abordagem holística, não priorizar a integralidade do indivíduo, como também não o considerar inserido numa realidade que é dinâmica e cheia de contradições19.

A formação dos profissionais de saúde é, sem dúvidas, um dos fatores que contribuem para tal fragmentação. Sobre a educação superior na área de saúde, Aguiar1 afirma que, nas escolas brasileiras, a exemplo do que acontece em outros países do mundo, existe um grande número de estudantes “anônimos” sendo “assoberbados” por informações “fragmentadas” transmitidas em aulas expositivas e de qualidade “variável”, em um processo que valoriza mais a memorização do que o raciocínio crítico.

Como conseqüência, um processo educacional impregnado de características como aquelas anteriormente referidas forma, prioritariamente, profissionais de saúde cuja atenção está restrita ao corpo, membros e órgãos, deixando de lado determinantes sociais, culturais, econômicos, comportamentais, psicológicos, ecológicos, éticos e legais, nos níveis individual e coletivo, do processo saúde-doença.

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No Brasil, as políticas de saúde desconsideram, em sua prática assistencial, as condições de vida (moradia, trabalho, educação, alimentação etc) dos usuários e as práticas de saúde são restritas à execução de recursos da assistência médica. Como resultado disso, a saúde da população fica limitada ao momento da consulta.

Sobre o modelo de assistência à saúde, Carvalho19 afirma ser este predominantemente do tipo pronto-atendimento da demanda espontânea, apoiado nessa concepção “biologizante” que por ser, na maioria das vezes, ineficaz, possibilita o constante retorno aos centros de saúde. Isso faz aumentar a demanda, a produtividade e, conseqüentemente, os gastos. Revela-se, portanto, além de ineficaz, dispendioso. Por vezes, o usuário do serviço necessita apenas de uma conversa e não de remédios, no entanto, a forma como as consultas é realizada, onde predomina a falta de atenção do profissional para os diversos fatores que estão permeando a doença, contribui para o aumento da demanda dos serviços públicos.

Nessa visão “biologizante” da saúde, é possível ter como solução ou cura o consumo de remédios. A visão do medicamento como símbolo de saúde, a partir de uma concepção biologizada do processo saúde-doença, pressupõe que a enfermidade seja considerada como um fator orgânico, enfrentável através do medicamento, o que implica deixar de lado “as esferas do social e do comportamental, as verdadeiras sedes da saúde-doença, privilegiando como terreno de jogo o universo concreto e seguro do organismo e da biologia” 31.

Dessa forma, o medicamento assume um papel de grande importância na medida em que se torna o centro do processo de cura nesta visão biologizante da saúde. Assumindo seu papel de protagonista, através do medicamento, a alopatia se firma como sinônimo de cura para todos os males, enraizando-se no modelo de atenção à saúde.

Discutindo o modelo típico da década de 1970, Dimenstein24 enfatiza que ele foi oriundo de uma formação em saúde especializada e tecnificada, distante do quadro de saúde do país; um modelo excludente de parcelas expressivas da população – logo elitista – além de marcado por desigualdades no acesso quantitativo e qualitativo entre a população urbana e dessa com a rural.

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assistencialista e hospitalocêntrica. Com tais características, o medicamento, conforme já referido, assume um papel de grande importância como símbolo de saúde.

Por fim, necessário se faz aclarar a intrínseca relação existente entre este modelo anteriormente caracterizado e a concepção flexneriana da qual ele emergiu. Esta foi institucionalizada na cultura da formação superior em saúde, como um dogma a ser adotado por todas as academias. E assim ocorreu. Como conseqüência, uma legião de profissionais médicos (e também das demais profissões de saúde) passou a desenvolver um trabalho em saúde, que nunca correspondeu às expectativas sanitárias da população atendida, quer seja no Brasil ou no mundo.

Em uma tentativa de reverter este quadro de formação superior em saúde, foi lançado em Agosto de 2004 o Aprender SUS, política formulada por uma ação intersetorial proposta pelos Ministérios da Saúde e da Educação. Considerando que a história de formação e exercício profissional em saúde é marcada pelo desenho flexneriano no ensino e trabalho, para ampliar a qualidade à saúde da população brasileira, se torna essencial orientar as graduações em saúde para a integralidade e este é o objetivo desta política, para se mudar a formação dos profissionais de saúde no âmbito do ensino da graduação11.

Apesar deste quadro característico das práticas públicas de saúde, não há como negar, no entanto, que inovações assistenciais tem sido implantadas, algumas delas com sucesso. Este foi o caso do Programa de Saúde da Família (PSF), um dos eixos temáticos do próximo capítulo, ele surgiu em 1994 e consiste numa proposta de mudança do modelo assistencial ainda hoje vigente.

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2. PROGRAMA SAÚDE DA FAMÍLIA: A ATENÇÃO BÁSICA À LUZ DOS

PRINCÍPIOS E DIRETRIZES DO SUS

Este capítulo objetiva apresentar o Sistema Único de Saúde (SUS), realizando um breve resgate sobre o contexto histórico do seu surgimento, bem como descrever a lógica de atenção à saúde proposta por ele, discutindo seus princípios e diretrizes. Nesse sentido, será feito um recorte e especial ênfase será dada para a Atenção Primária à saúde, a partir da qual se chegará na Estratégia de Saúde da Família. Inicialmente concebido como um Programa e hoje consagrado como uma Estratégia (apesar de ainda ser conhecido como “PSF”), este novo modelo será discutido à luz dos princípios do SUS e dentro da lógica da atenção primária à saúde, a qual ele se propõe.

2.1 O CONTEXTO HISTÓRICO DO SURGIMENTO DO SISTEMA ÚNICO DE SAÚDE

No fim da década de 1970, numa tentativa de reverter o modelo de atenção hegemônico, ineficaz, de baixa resolutividade, excludente e individualista; profissionais de saúde e intelectuais da área de saúde pública lutavam por políticas de saúde mais universalistas24,46.

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Na década seguinte, grande foi a crise de caráter social, política e econômica vivenciada pela sociedade brasileira. O país estava saindo do autoritarismo do regime militar e o poder público vivia um período de re-organização com a perspectiva de uma nova Constituição. Este clima de euforia caracterizou-se como o momento exato para que profissionais de saúde, usuários, técnicos, políticos, lideranças sindicais e populares, todos juntos promovessem a VIII Conferência Nacional de Saúde (CNS), realizada em 1986 na cidade de Brasília-DF. Esta foi, sem dúvida, um marco histórico dentro do Movimento pela Reforma Sanitária Brasileira46.

O relatório da VIII CNS criou o alicerce para a reestruturação do Sistema de Saúde Brasileiro, a ser defendida na Constituição de 1988. Nele é enfatizado o conceito ampliado de saúde, que é colocada como um direito de todos e dever do Estado.

Com efeito, a saúde foi institucionalizada como direito de todos e dever do Estado na Carta Magna de 1988, que em seu artigo 196 diz: “A saúde é direito de todos e dever do Estado, garantida mediante políticas sociais e econômicas que visem a redução do risco da doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação”.

A partir de então, estava criado o Sistema Único de Saúde (SUS), que teoricamente teve início em 1988, contudo na prática ainda dá seus primeiros passos, mesmo após 16 anos de seu surgimento jurídico-institucional. “Construção” é a palavra que sucintamente melhor define o SUS.

Agora, o Sistema Único de Saúde será discutido à luz dos princípios que norteiam tanto a filosofia (doutrina) quanto a operacionalização das ações e serviços de saúde prestados à população brasileira.

2.2 A FILOSOFIA DE PRESTAÇÃO À SAÚDE DO SUS

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Resultado de negociações, uma nova lei, a 8142 de dezembro do mesmo ano recupera alguns vetos e o que hoje se conhece como Lei Orgânica da Saúde é formado pelo conjunto das leis 8080 e 8142 de 199046.

Estes instrumentos definem um conceito ampliado de Saúde e apontam para as estratégias de organização e controle das ações e serviços de saúde, interligando setores e buscando soluções para situações e problemas que são considerados como os determinantes do atual estado de saúde da população. Constitui, ainda, o arcabouço legal de sustentação do SUS, significando, em última análise a responsabilização do Estado, sob o ponto de vista jurídico, pela atenção à saúde da população, objetivando a consecução dos princípios de universalidade, integralidade, eqüidade e controle social.

Roncalli46 ressalta que o Sistema Único de Saúde, garantido pela Constituição e regulado pela Lei Orgânica da Saúde, prevê um sistema com princípios doutrinários e organizativos. Os princípios doutrinários dizem respeito às idéias filosóficas que permeiam a implementação do sistema e personificam o conceito ampliado de saúde e o princípio do direito à saúde. Os princípios organizativos orientam a forma como o sistema deve funcionar, tendo como eixo norteador, os princípios doutrinários.

A partir de agora, discutir-se-ão os princípios do Sistema Único de Saúde, haja vista eles possuírem uma especial relevância para as questões que se seguirão neste trabalho.

Dentro desta perspectiva, a filosofia do SUS pode ser alicerçada em um tripé, cuja base é formada pelos seguintes elementos: universalidade, eqüidade e integralidade.

No que tange à universalidade, Brasil8 diz que ela pode ser entendida como:

“A garantia de atenção à saúde por parte do sistema, a todo e qualquer cidadão. Com a universalidade o indivíduo passa a ter direito de acesso a todos os serviços públicos de saúde, assim como àqueles contratados pelo poder público. A saúde passa a ser direito de cidadania e dever dos governos federal, estadual e municipal”.

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político e de planejamento, oferecendo às populações o acesso ótimo aos planos, programas, sistemas e serviços de saúde, em todos os níveis da assistência.

Com base no exposto, pode-se afirmar que a universalidade pressupõe a todos os cidadãos, independentemente de pagarem ou não a previdência social, o direito de acesso às ações e serviços de saúde; não apenas o direito à assistência médica, mas também a garantia do Estado sobre a formulação e efetivação de políticas públicas que garantam as condições gerais de sobrevivência digna de toda uma coletividade, quais sejam: emprego e renda, alimentação, educação, habitação, lazer, dentre outras.

Já em relação à eqüidade, Brasil8 conceitua como:

“É assegurar ações e serviços de todos os níveis de acordo com a complexidade que cada caso requeira, more o cidadão onde morar sem privilégios e sem barreiras. Todo o cidadão é igual perante o sus e será atendido conforme suas necessidades até o limite que o sistema puder oferecer para todos”.

Como desdobramento da idéia de universalidade, Roncalli46 afirma que o princípio de eqüidade assegura que se considerem as diferenças entre os diversos grupos de indivíduos. Isso significa tratar desigualmente os desiguais, isto é, alocando recursos onde as necessidades são maiores. O autor prossegue dizendo que a eqüidade é uma espécie de “filtro” para a universalidade (que é mais abrangente), pois é possível a existência de um discurso universalista mesmo na existência de modelos desiguais do ponto de vista de acesso aos serviços.

Pelo exposto, fica evidente que a eqüidade é um princípio de justiça social; isto é, cada um deve receber atenção à saúde conforme suas necessidades. Portanto, cada grupo populacional deve ter sua atenção específica, a qual deve ser diferente para os diferentes grupos dentro da população.

(35)

Com efeito, depreende-se que há necessidade de ruptura histórica do modelo flexneriano, anteriormente já analisado, onde o sistema de saúde culturalmente aceito é fragmentado, a lógica da assistência à saúde é mecanicista e centrada no biologicismo, desconsiderando os aspectos sociais que permeiam o processo saúde-doença. O princípio da integralidade vem justamente romper com estes parâmetros que tanto marcam o modo de agir dentro do setor saúde, na medida em que coloca o homem como um ser bio-psico-social, havendo o interligamento das questões biológicas, psicológicas e sociais. Assim, para tratar este “novo homem”, mais complexo, só mesmo um sistema de saúde integral, que não só ofereça assistência médica, mas também a promoção e proteção da saúde.

Dessa forma, Dimenstein24 enfoca a necessidade da superação das ações parcializadas de saúde que vêm a pessoa como um amontoado de partes e não como um todo integrado, que pertence a uma determinada sociedade, a um contexto histórico. As ações de saúde, por sua vez, devem estar voltadas ao mesmo tempo para o indivíduo e para a comunidade, para a prevenção e para o tratamento, não podendo ser compartimentadas.

A partir de agora, serão descritos os princípios organizativos, ou seja, aqueles que tratam da forma como o SUS deve funcionar em termos práticos. São eles a regionalização e a hierarquização, o controle social, a resolubilidade, a descentralização, a participação dos cidadãos e a complementaridade do setor privado.

2.3 PRINCÍPIOS QUE REGEM A ORGANIZAÇÃO DO SUS

Com relação à regionalização e hierarquização, Brasil8 expõe que:

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À capacidade de resolver os problemas de saúde demandados pela população, dá-se o nome de resolubilidade. Oficialmente, pode ser entendida como “a exigência de que, quando um indivíduo busca um atendimento ou quando surge um problema de impacto coletivo sobre a saúde, o serviço correspondente esteja capacitado para enfrentá-lo e resolvê-lo até o nível de sua competência” 8.

Com relação à participação dos cidadãos, o Ministério da Saúde afirma que é a garantia constitucional de que a população através de suas entidades representativas participará do processo de formulação das políticas de saúde e do controle de sua execução, em todos os níveis, desde o federal até o local 8.

Um outro princípio é aquele que trata da questão da descentralização. Para entendê-la, basta se atentar para o fato de que quanto mais próximo da situação-problema a decisão de resolvê-la for tomada, mais chances de acertos terá tal decisão. Assim, com a delegação de poderes para níveis mais próximos dos serviços de saúde, fica facilitada a questão do gerenciamento desse serviço, tornando-o mais eficaz.

Por fim, há, no caso de insuficiência do setor público, complementaridade do setor privado no que concerne à questão da prestação dos cuidados à saúde. Para tanto, constatada a insuficiência dos serviços públicos, o gestor deverá contratar os serviços privados, porém com normas de direito público, isto é, interesse público prevalecendo sobre o particular. O gestor, quando da contratação, deve preferencialmente escolher os serviços não lucrativos conforme reza a Constituição.

Destarte, foram descritos os princípios que rezam a organização do SUS. A partir de agora, pretende-se conceituar e discutir a Atenção Primária de Saúde segundo a lógica doutrinária e organizativa do SUS aqui já referenciada. A partir daí, se chegará no Programa de Saúde da Família, que também será objeto de reflexão deste trabalho.

2.4 ATENÇÃO PRIMÁRIA: BREVE HISTÓRICO E CONCEITO

(37)

compreendem como um meio para ofertar serviços a populações marginalizadas ou unicamente como mais um nível de assistência.

Quando se descreveu o processo de organização do SUS, foi demonstrado que este se encontra organizado em níveis de atenção. A partir de agora, será dada ênfase ao nível primário, isto é, ao primeiro nível a que os cidadãos devem (ou pelo menos deveriam) ter contato ao acessarem os serviços públicos de saúde.

Na seqüência, será feito um resgate histórico sobre a questão do surgimento da atenção primária para então se definir seu conceito.

Segundo Starfield53, em sua trigésima reunião anual realizada em 1977, a Assembléia Mundial de Saúde decidiu unanimemente que a principal meta social dos governos participantes deveria ser a “obtenção por parte de todos os cidadãos do mundo de um nível de saúde no ano 2000 que lhes permitirá levar vida social e economicamente

produtiva”. Hoje conhecida como “Saúde para todos no ano 2000”, esta declaração

desencadeou uma série de atividades que tiveram um grande impacto sobre o pensamento a respeito da atenção primária. Os princípios foram enunciados em uma conferência realizada em Alma-Ata e trataram do tópico da atenção primária à saúde. O consenso lá alcançado foi confirmado pela Assembléia Mundial de Saúde em sua reunião subseqüente, em maio de 1979. A atenção primária à saúde foi definida como:

Atenção essencial à saúde baseada em tecnologias e métodos

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A conferência de Alma-Ata especificou ainda mais que os componentes fundamentais da atenção primária à saúde eram educação em saúde; saneamento ambiental, especialmente de águas e alimentos; programas de saúde materno-infantis, inclusive imunizações e planejamento familiar; prevenção de doenças endêmicas locais; tratamento adequado de doenças e lesões comuns; fornecimento de medicamentos essenciais; promoção da boa nutrição e a medicina tradicional 53.

É necessário frisar que em países onde se encontra cultural e historicamente institucionalizado o modelo biomédico no pensar e agir do setor saúde, torna-se pouco exeqüível implantar de forma imediata os componentes fundamentais da atenção primária sugeridos na conferência de Alma-Ata. Infelizmente, as mudanças não acontecem tão logo detectados os erros ou surgidas propostas inovadoras.

As mudanças, mormente no campo das práticas de Saúde Pública, são bastante morosas em função da burocracia do governo, da falta de recursos financeiros, da vontade política; enfim, muitos são os empecilhos que se contrapõem à efetivação de um simples programa ou projeto. Para exemplificar isto, observe que existe no Ceará o Projeto Dentista da Família II, proposto para cidades com um baixo Índice de Desenvolvimento Humano (IDH). Ele foi implantado em 2004 pelo Governador Lúcio Alcântara. Realizou-se um processo seletivo em março do referido ano na Escola de Saúde Pública do Ceará. Após aprovados, os profissionais foram lotados nos municípios para os quais prestaram o concurso. No entanto, os acordos firmados não foram honrados, o consultório odontológico prometido nunca chegou aos municípios (até Fevereiro de 2005), as fiscalizações propostas, não aconteceram; enfim, uma experiência pequena, pontual que abarcou poucos municípios e, mesmo assim, não foi efetivada com sucesso.

Diferentemente da experiência cearense no campo da Saúde Bucal, há dez anos o Ministério da Saúde implantou o Programa de Saúde da Família (PSF), o qual percorreu um caminho difícil, tortuoso (principalmente logo após sua implantação), porém sempre avançando e modificando, embora que a passos lentos, a forma de prestação dos serviços e ações de saúde pública no Brasil.

(39)

É necessário neste momento se estabelecer uma diferença entre Atenção Básica e Atenção Primária à saúde, termos já bastante referidos neste trabalho. Como se observou anteriormente, o termo Atenção Primária surgiu em fins da década de 1970 como resultado da Conferência de Alma-Ata. Este termo passou a ser utilizado por profissionais de saúde de todo o mundo, ao se referir às ações e serviços de competência do primeiro nível de atenção à saúde. No entanto, aqui no Brasil, consagrou-se utilizar o termo Atenção Básica para se referir à Atenção Primária à saúde. Na verdade, o conceito de Atenção Primária, apesar de mais complexo, é similar ao de Atenção Básica em seus objetivos, porém este termo é empregado aqui no Brasil, ao passo que àquele tem larga utilização mundial 36.

2.5 O PSF E A ATENÇÃO BÁSICA

No que tange à terminologia empregada, a partir de agora será usado o termo Atenção Básica, posto que este é de uso mais corrente aqui no Brasil.

Nesse momento, a partir do qual o Programa de Saúde da Família será analisado e discutido à luz dos princípios do SUS, é relevante resgatar as origens de seu surgimento e implantação. Inicialmente, vale ressaltar que a origem do Programa de Saúde da Família está na decisão do Ministério da Saúde, em 1991, de implantar o Programa de Agentes Comunitários de Saúde (PACS), como medida de enfrentamento dos graves índices de morbimortalidade materna e infantil na região Nordeste do país. O PACS pode ser considerado o antecessor do PSF por alguns de seus elementos que tiveram um papel central na construção do novo programa. Entre eles, pode ser enumerado o enfoque na família e não no indivíduo e o agir preventivo sobre a demanda, constituindo-se como um instrumento de organização da mesma. De certo modo, o que se percebeu é que houve a adoção de uma prática não reducionista sobre a saúde, evitando ter como eixo apenas a intervenção médica e buscando a integração de fato com a comunidade 13, o que corrobora com um princípio organizativo do SUS que é a questão da participação social no controle e gestão do sistema.

(40)

principalmente nas regiões norte e nordeste, através da extensão de serviços de saúde para as áreas mais pobres e desvalidas.

A mesma autora prossegue afirmando que, conforme já descrito, uma das variáveis que o programa de agentes introduziu, é que, pela primeira vez o enfoque na família e não no indivíduo dentro das práticas de saúde passou a ser observado. Por outro lado, o programa também introduziu uma visão ativa da intervenção em saúde de forma preventiva.

Os resultados alcançados com o PACS estimularam os secretários municipais de saúde a expandir o programa a outros profissionais da saúde e operacionalizar a rede básica.

Dessa forma, por falta de recursos financeiros, os mesmos começaram a pressionar as estruturas centrais, levando a realização de uma reunião nos dias 27 e 28 de dezembro de 1993, em Brasília, durante o qual foi concebido o “Programa de Saúde da Família”, que viria a ser implantado oficialmente em 1994 pelo Ministério da Saúde.

As primeiras equipes foram implantadas em janeiro de 1994, incorporando e aumentando a atuação dos agentes comunitários. Com a implantação do PSF buscou-se uma ampliação e uma maior resolutividade das ações na atenção básica.

Consoante a publicação oficial do Ministério da Saúde, onde se encontram explicitados os princípios do programa, o PSF reafirma e incorpora os princípios básicos do SUS já apresentados anteriormente: a universalidade, a descentralização, a integralidade e a participação comunitária15.

Sobre a implantação do PSF, Neto e Vilar 39 afirmam que para impulsionar os avanços até então conquistados pelo SUS, e buscar dar um salto qualitativo na atenção à saúde, o Ministério da Saúde se propôs o desafio de desenvolver um novo modelo de atenção, baseado na saúde da família, como operação estruturante de ações congregadas, que permitisse novos e consistentes avanços do SUS e de seus princípios de universalidade de acesso, eqüidade no cuidado, integralidade da atenção e participação comunitária.

Portanto, o PSF propõe-se a reorganizar a assistência à saúde a partir de novas bases, substituindo o modelo clássico, curativista, fragmentado, biologizado e devotado à hospitalização. A Unidade de Saúde da Família passa a ser a base operacional deste novo sistema, cujos princípios podem ser visualizados a seguir:

Caráter substitutivo: Não significa a criação de novas estruturas de

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convencionais de assistência por um novo processo de trabalho, cujo eixo está centrado na vigilância à saúde;

Integralidade e Hierarquização: A Unidade de Saúde da Família está

inserida no primeiro nível de ações e serviços do sistema local de saúde, denominado atenção básica. Deve estar vinculada à rede de serviços de forma que se garanta atenção integral aos indivíduos e famílias e seja assegurado a referência e a contra-referência para os diversos níveis do sistema, sempre que for requerido maior complexidade tecnológica para a resolução de situações ou problemas identificados na atenção básica;

Territorialização e adscrição da clientela: trabalha com território de

abrangência definido e é responsável pelo cadastramento e acompanhamento da população adscrita a esta área. Recomenda-se que uma equipe seja responsável pelo acompanhamento de, no máximo, 4.500 pessoas;

Equipe multiprofissional: A equipe de Saúde da Família é composta

minimamente por um médico generalista ou médico de família, um enfermeiro, um auxiliar de enfermagem e de quatro a seis agentes comunitários de saúde (ACS). O número de ACS varia de acordo com o número de pessoas sob responsabilidade da equipe – numa proporção média de um agente para 550 pessoas acompanhadas”15.

Sobre o processo de implantação do PSF, Roncalli46 realiza uma discussão bastante rica ao relatar que:

(42)

perduram até hoje. Concebido inicialmente como programa dentro da Fundação Nacional de Saúde, o PSF foi, aos poucos, sendo tomado como prioritário dentro dos modelos propostos para a atenção básica e hoje se fala em ‘Estratégia de Saúde da Família’ embora a denominação PSF persista. Decerto, a “estratégia” de se falar em estratégia e não mais em programa, foi uma forma de responder as críticas que eram dirigidas ao programa, taxado de ‘foquista’ e de ser uma medida impositiva que não considera as realidades locais”.

A esse respeito, Souza51 elucida que o PSF não é uma estratégia de Médico de Família, e sim de Saúde da Família, onde uma equipe multiprofissional tem a co-responsabilidade de enfrentar os desafios de uma nova produção de saúde, tendo como base de atenção as famílias.

A interpretação do PSF como saúde pobre para os pobres foi uma constante durante sua implantação; no entanto, ele não é uma estratégia para atender somente regiões pobres e famílias/comunidades excluídas, muito embora tenha como parte de suas responsabilidades ajudar a superar as desigualdades no campo da saúde.

Assim, o PSF consiste em uma estratégia para reverter a forma atual de prestação da assistência à saúde, na edificação de um novo modelo, cujo produto, resultado da substituição do processo de trabalho, é representado pela transformação das Unidades Básicas de Saúde em Unidades de Saúde da Família, essas com a responsabilidade social de resolver em média 85% das situações-problema encontradas nos territórios de atuação 51.

A Norma Operacional de Atenção à Saúde (NOAS/SUS 01/2001) define as responsabilidades e ações estratégicas mínimas que todos os municípios brasileiros devem desenvolver no âmbito da Atenção Básica. São elas: controle da Tuberculose, controle da Hipertensão, controle da Diabetes Melittus, ações de Saúde Bucal, ações de Saúde da Criança e ações de Saúde da Mulher 14.

(43)
(44)

3. FITOTERAPIA X ATENÇÃO BÁSICA: UMA RELAÇÃO A EXPLORAR

Este capítulo tem como escopo ressaltar a importância da fitoterapia dentro da atenção básica de saúde, mostrando os esforços e as experiências que têm sido efetivadas no âmbito dos serviços públicos de saúde para consolidar esta alternativa terapêutica. Para tanto, far-se-á inicialmente um breve resgate histórico do seu surgimento, para então ressaltar a importância de sua utilização nos serviços de saúde, inclusive exemplificando experiências exitosas que lançam mão da fitoterapia comunitária.

3.1 FITOTERAPIA: UMA TRADIÇÃO MILENAR

Neste momento, cabe expor alguns conceitos importantes visando evitar dilemas conceituais posteriores. Por isso, encontram-se a seguir alguns termos e seus respectivos significados.

Alopatia: sistema terapêutico que consiste em tratar as doenças por meios contrários a elas, procurando conhecer suas causas e combatê-las 25.

Homeopatia: sistema terapêutico que consiste em tratar as doenças por meio de substâncias ministradas em doses diluídas a ponto de se tornarem, por vezes, infinitesimais, capazes de produzir em indivíduos sãos, quadros clínicos semelhantes aos que apresentam os doentes a serem tratados 25.

Medicamento fitoterápico: droga vegetal, planta ou suas partes, após processos de coleta, estabilização e secagem, podendo ser íntegra, rasurada, triturada ou pulverizada9.

Medicamento fitoterápico novo: aquele cuja eficácia, segurança e qualidade sejam comprovadas cientificamente junto ao órgão federal competente, por ocasião do registro, podendo servir de referência para o registro de similares 9.

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etnofarmacológicos e de utilização, documentações tecnocientíficas ou publicações indexadas9.

A Fitoterapia - palavra originária dos radicais gregos phyton (planta) e therapia

(tratamento) - é uma prática antiga. Desenhos de plantas, folhas e órgãos humanos em clara alusão a uma correspondência terapêutica, encontradas em uma região do sul da Ásia, mostram que a utilização de plantas medicinais no tratamento de doenças tem pelo menos 60 mil anos de história que não podem simplesmente ser jogados fora. Até o período paleolítico, os processos de cura empregados pelos homens se baseavam na observação de animais e permitiam descobrir as propriedades terapêuticas de diversas plantas. Devia funcionar bem, pois o comércio dessas plantas movimentou regiões da Europa, Oriente Médio e Ásia desde o século 2 a.C., uma vez que diversas espécies existiam somente em determinados continentes21.

A mesma autora prossegue afirmando que os países com mais longa tradição no emprego desse tipo de remédio eram e são a China e a Índia, onde o registro sobre o uso de plantas curativas data de aproximadamente 1500 a.C. De acordo com Botsaris citado por Colavitti21, o livro mais antigo sobre fitoterapia que se tem conhecimento é o Shennung pen ts’ ao ching, escrito pelo imperador chinês Shen Nung, por volta de 200 a.C. “O uso medicinal das plantas é característico da humanidade e está presente em todos os contextos, de qualquer civilização”, explica Botsaris.

No Egito, já no tempo do faraó Ramsés III, havia descrições da eficácia do cânhamo para tratar problemas oculares, e menções aos efeitos calmantes da papoula. Essas referências foram extraídas do Papiro de Ebers, escrito por volta de 1500 a.C. Ali são descritas centenas de plantas e suas respectivas propriedades. Algumas das espécies citadas, como o sene, são utilizados até hoje. Os povos da Suméria, Assíria e Babilônia também fizeram menção às características terapêuticas de cerca de 250 espécies vegetais21.

No ocidente, as primeiras prescrições de remédios começam no século 5 a.C. e coincidem com o apogeu da Grécia antiga. Não por acaso, algumas plantas eram consideradas sagradas pelos antigos gregos e relacionavam-se à mitologia dos deuses – o termo “farmácia” tem origem na palavra grega “farmakon”, que significa “erva de enfeitiçar”.

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Tabela 01. Nomes populares, indicações e formas de utilização das plantas  medicinais citadas pelos CD’s para tratamento de afecções odontológicas
Tabela 02. Nomes populares e indicações de plantas medicinais e resultados obtidos  com o tratamento fitoterápico prescrito pelos CD’s
Tabela 03. Nomes populares e indicações de plantas medicinais utilizados pelos  CD’s e resultados obtidos com o tratamento

Referências

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