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O triângulo do bem-estar social no trabalho: Experiência de trabalho, gestão de recursos humanos e bem-estar global do emprego.

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Academic year: 2021

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O triângulo do bem-estar social no trabalho:

Experiência de trabalho, gestão de recursos humanos e bem-estar

global do empregado.

Elaborado por

Reinaldo Sousa Santos

Tese de Doutoramento em Gestão, área de especialização em Organização

e Recursos Humanos

Orientada por:

Professor Doutor Carlos Cabral Cardoso

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“O trabalho é a melhor das

regularidades e a pior das

intermitências.”

Victor Hugo, Monte de Pedras

“Chega-se mais facilmente

a Marte do que ao nosso próprio

semelhante.

Alguém não anda a cumprir o

seu dever. Não andam a

cumpri-lo os governos, (…) mas

também não estão a cumprir o

seu dever os cidadãos que

somos.”

José Saramago, discurso no banquete do Prémio Nobel, em 10 de dezembro de 1998

“De nenhum fruto queiras

só a metade.”

Miguel Torga, Sísifo

“Quem nasceu para cinco

nunca chega a dez.”

Avó Margarida, frase frequente, também usada para motivar os netos a conquistas maiores

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Nota Curricular

Reinaldo Sousa Santos é licenciado em sociologia das organizações, com pós-graduação em gestão de recursos humanos. Tem dezoito anos de experiência em gestão de recursos humanos e dois anos na liderança de direção comercial. Desenvolveu sistemas de gestão apostados na melhoria do bem-estar dos empregados, cujo mérito foi reconhecido através da inclusão nas 100 Melhores Empresas para Trabalhar em Portugal (Accenture/Exame), entre 2012 e 2014. Foi diretor de recursos humanos em diversas empresas de grande dimensão, com responsabilidades que incluíam, nomeadamente, o payroll, formação e desenvolvimento, comunicação interna e promoção do bem-estar. Tem o seu percurso construído no maior grupo empresarial português no setor do ambiente, no qual participou em diversos grupos de trabalho corporativos. No segundo semestre de 2019 desvinculou-se do grupo no qual trabalhou duas décadas, para desvinculou-se dedicar em exclusivo à conclusão do presente doutoramento, após o qual pretende abraçar novo projeto com renovado entusiasmo, seja como gestor de recursos humanos, seja como divulgador da importância do bem-estar em contexto de ensino ou formação. Tem diversas colaborações com entidades formadoras associadas à gestão de recursos humanos e comportamento organizacional, nomeadamente com a Associação Portuguesa da Qualidade no âmbito da norma NP 4427 – Sistemas de gestão de recursos humanos -, na medida em que foi responsável por um dos primeiros sistemas implementados e certificados segundo este referencial em Portugal, no ano 2007. É, também, orador frequente em eventos dedicados a temas associados ao bem-estar no trabalho e na vida. Tem preocupações na área social e envolvimento na comunidade. Foi fundador e dirigente de uma organização não governamental para o desenvolvimento e, desde há vários anos, integra projeto de voluntariado, responsável por assegurar refeições quentes às pessoas em condição de sem-abrigo, no Porto. É, também, diretor de clube desportivo, com intervenção ao nível de escalão da academia de formação de futebol. Gosta de escrever, embora ainda não tenha chegado o momento de começar a publicar. Gosta de ler e de aprender sempre algo mais, em qualquer lado e sobre qualquer assunto. Tem curiosidade infindável e descobriu com o doutoramento que tem, também, forte resiliência e capacidade de perseverar. O Reinaldo gosta de pessoas e de palavras. Nelas se escora para construir uma vida tão feliz quanto possível.

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Agradecimentos

Ao meu filho Guilherme, a quem dedico tudo o que de bom eu sou capaz de fazer nesta vida. Desculpa-me as noites em que não te li a história, acelerei a oração ou não adormeci contigo com pressa de voltar a este trabalho. Tenho muito orgulho em ti, também por compreenderes que a vida do teu pai tem objetivos pessoais e profissionais exigentes e consumidores de muito tempo. Agora que esta aventura termina, receber o teu sorriso largo de alegria e orgulho e ouvir a tua frase perfeita “e eu a ti!” é um apaziguamento para o meu coração. Muito obrigado!

Aos meus pais, Gracinda e Armando, que sempre transmitiram aos filhos que estudar é uma oportunidade de acesso a uma vida melhor que não deve ser desperdiçada. Eles, que tiveram passagem apressada pelas carteiras da primária, foram capazes de acumular sabedoria bastante para transmitirem este ensinamento valioso à família. Muito obrigado! Ao meu irmão Francisco, que partiu cedo demais e cujos últimos tempos coincidiram com o início desta aventura. Desculpa-me a distração com esta e outras coisas pequenas da vida e perdoa-me não ter sido capaz de te oferecer a presença, gestos ou palavras em doses certas e suficientes. Espero que lá onde estejas, lá onde repousam as pessoas de coração grande e bom, tenhas orgulho nesta minha conquista. Que bom que seria poder abraçar-te nesabraçar-te momento!

Ao meu irmão Rui, à família chegada e aos meus amigos, pela compreensão e incentivo. Desculpem-me a ausência em algumas ocasiões e, por vezes, ter sido demasiado aborrecido na partilha dos avanços e recuos do projeto. Certamente virá de seguida outro objetivo absorvente, mas, por agora, é momento de celebrar. E será sempre convosco que terei vontade de erguer os copos e celebrar as coisas boas da minha vida. Muito obrigado! A todos os que me ajudaram na operacionalização deste trabalho. À Vera Duarte e à Susana Carvalho pelas generosas informações e referências bibliográficas que muito me orientaram neste trabalho de investigação. O modo como acreditam e se entusiasmam com o trabalho académico é muito inspirador. À Mafalda Duarte e à Liliana Rodrigues pela disponibilidade para comigo descobrirem a abordagem metodológica acertada para o propósito deste projeto. Os nossos cafés e jantares de discussão foram dos momentos mais agradáveis desta aventura. À Daniela Xavier pela disponibilidade e apoio na

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transcrição das entrevistas. O teu cuidado e rigor foram também inspiradores para o zelo com que concluí este projeto. Ao Miguel Silva e Ricardo Vilaverde que me abriram as portas de suas casas e me deram guarida quando eu corria o país na recolha das entrevistas. Estar convosco, independentemente do local ou motivo, é sempre uma alegria. Ao Gil Afonso pelo apoio no aprimoramento das imagens incluídas no relatório final. A prontidão e cuidado do teu contributo foram, mais uma vez, demonstração de generosidade e amizade. A todos, muito obrigado!

Ao Nuno Aguilar, um amigo forjado nas lides do trabalho, cuja qualidade humana não deixaria antever tratar-se de um engenheiro. Em vários momentos deste percurso tiveste a presença e a palavra acertada para me fazer avançar. À Rita Aguilar pela disponibilidade para conversarmos na validação inicial do guião de entrevista. Muito obrigado!

Aos muitos colegas de trabalho acumulados ao longo destes vinte anos de experiência partilhada a cuidar do ambiente em Portugal. Em muitos de vós fundei a minha vontade de querer saber mais e ser melhor. Tanta gente de primeira água! Foram o meu farol e espero continuar a ver-vos brilhar. Aos colegas de recursos humanos que me permitiram realizar as entrevistas nas suas empresas sem qualquer condicionamento. Muito obrigado! Ao Professor José Carlos Tentúgal Valente. Espero ter estado à altura da confiança e responsabilidades que em mim depositou desde cedo e continuar a merecer o seu reconhecimento e amizade. Foi um privilégio trabalhar de perto consigo, ao seu serviço. Bem no início desta aventura está a carta de recomendação que elaborou e que instruiu a minha candidatura ao doutoramento. Muito obrigado!

Ao Professor Carlos Cabral Cardoso, meu orientador de doutoramento, pela sua paciência em ouvir as minhas dúvidas de leigo da vida académica e as minhas incertezas quanto à capacidade de concluir esta empreitada. As suas palavras foram sempre de incentivo e de exigência, colocando o seu conhecimento e disponibilidade ao serviço deste projeto. Durante este caminho, partilhámos conversas muito agradáveis, sobre o mundo e sobre o que nele se vai passando. O maior valor da academia estará em assumir-se como um espaço de reflexão, de troca de opiniões, de curiosidade permanente, de procura de entendimento do mundo, em exercício coletivo. Nas nossas conversas senti sempre o privilégio de estar dentro da academia e gostei muito. Muito obrigado!

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Resumo

O bem-estar no trabalho tem merecido atenção crescente na literatura e vem sendo caracterizado nas dimensões física, psicológica e social. O bem-estar social surge apresentado pela enunciação dispersa de construtos, com insuficiente investigação que sistematize o seu conteúdo, o modo de formulação no contexto de trabalho e de articulação com outras esferas do bem-estar, GRH e bem-estar geral do empregado. Este trabalho qualitativo dá voz aos empregados do maior grupo empresarial português do setor do ambiente, através da realização de entrevistas semiestruturadas, e recolhe as suas visões sobre o bem-estar social no trabalho. Os resultados mostram o bem-estar social composto por oportunidades de relacionamento (reuniões de trabalho, encontros de convívio, pausas de trabalho, locais de trabalho e voz e comunicação interna), fontes de apoio social (ambiente positivo, empatia e apoio, relação social com a chefia e amigos no trabalho) e partilha de valores sociais (respeito, confiança, equidade e não discriminação, ajuda e gratidão e liderança responsável). O efeito positivo do bem-estar social fica condicionado à atuação consistente do empregador. Ações episódicas e inconsistências discurso-realidade têm efeito nefasto no bem-estar. Os resultados obtidos permitiram, ainda, desenhar modelo conceptual, denominado Os três triângulos do bem-estar, para demonstrar a articulação sequencial das diversas dimensões do bem-estar. O triângulo inicial da experiência de trabalho, composto pelo trabalho, recompensas e oportunidades de relacionamento reúne as ações concretas do contexto de trabalho, às quais é atribuído significado no âmbito do triângulo do bem-estar social. No âmbito do terceiro triângulo - bem-estar psicológico - o empregado avalia a satisfação das pretensões de prazer, realização e conformidade de valores sociais para determinar o seu nível final de bem-estar, no qual sustenta a sua ação na organização. São discutidas as implicações teóricas e práticas dos resultados ao nível da GRH e da valorização do bem-estar das pessoas no trabalho.

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Abstract

Well-being at work has received increasing attention in the literature and has been characterized by its physical, psychological, and social dimensions. Social well-being has been presented through the dispersed enunciation of constructs, with insufficient research to systematize their content, the way it is formulated in the work context and how it is related to other spheres of well-being, HRM and the general employee well-being. A qualitative study was conducted, using semi-structured interviews, and involving employees from the largest Portuguese business group in the environmental sector, to collect their view on social well-being at work. Different dimensions of social well-being come out of the data: relationship opportunities (work meetings, social gatherings, work breaks, workplaces and voice and internal communication), sources of social support (positive environment, empathy and support, social relationship with supervisor and friends at work) and sharing social values (respect, trust, equity and non-discrimination, help and gratitude and responsible leadership). The positive effect of the social well-being depends on the evidence that the employer acts consistently. Episodic actions and inconsistencies between the management discourse and managerial action have a detrimental effect on employee well-being. The analysis allowed us to design a conceptual model, called The Three Triangles of Well-Being, with the purpose of demonstrating the sequential articulation of the various dimensions of well-being. The initial triangle of work experience (work, rewards, and relationship opportunities) brings together the concrete actions observable in the work context, to which significance is attributed within the social being triangle. In the third triangle - psychological well-being - the employee assesses the satisfaction of his claims to enjoyment, fulfilment, and conformity to social values to determine his ultimate level of well-being, which underpins his action in the organization. The theoretical and practical implications of results to HRM valuing the well-being of people at work are discussed.

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Índice de Texto

Nota Curricular ... iii

Agradecimentos ... iv

Resumo ... vi

Abstract ... vii

Índice de Texto ... viii

Índice de Figuras ... xi 1. Introdução ... 1 2. Bem-Estar no Trabalho ... 8 2.1. Bem-estar psicológico... 14 2.1.1. Subdimensão hedónica... 15 2.1.2. Subdimensão eudaimonia ... 16 2.2. Bem-estar físico ... 19 2.3. Bem-estar social ... 21

2.4. Articulação com conceitos próximos ... 25

2.4.1. Felicidade - bem-estar subjetivo ... 27

2.4.2. Motivação ... 34

2.4.3. Satisfação no trabalho... 37

2.5. Lacunas da literatura e oportunidades de investigação... 39

3. Gestão de Recursos Humanos e Bem-Estar ... 43

3.1. Perspetivas sobre a GRH ... 43

3.2. Sistemas e práticas de GRH ... 46

3.3. Reciprocidade social e contrato psicológico ... 48

3.4. Novos desafios da GRH ... 55

3.5. Lacunas da literatura e oportunidades de investigação... 65

4. Objetivos do Estudo e Metodologia ... 68

4.1. Abordagem de investigação ... 72

4.2. Procedimentos de recolha ... 74

4.3. Participantes ... 86

4.4. Princípios metodológicos e éticos ... 91

(9)

ix 5.1. Oportunidades de relacionamento ... 97 5.1.1. Reuniões de trabalho... 98 5.1.2. Encontros de convívio ... 103 5.1.3. Pausas de trabalho ... 110 5.1.4. Locais de trabalho ... 120

5.1.5. Voz e comunicação interna ... 123

5.2. Apoio social ... 130

5.2.1. Ambiente agradável e positivo ... 132

5.2.2. Empatia e apoio emocional e instrumental ... 143

5.2.3. Chefia – relação social ... 155

5.2.4. Amizade ... 162

5.3. Valores sociais ... 170

5.3.1. Respeito ... 172

5.3.2. Confiança ... 175

5.3.3. Equidade e não discriminação ... 180

5.3.4. Ajuda e gratidão ... 185

5.3.5. Liderança responsável ... 190

5.4. A montante e jusante do bem-estar social ... 201

5.4.1. Trabalho ... 202

5.4.1.1. Trabalho interessante ... 203

5.4.1.2. Chefia – relação hierárquica ... 206

5.4.1.3. Meios de trabalho ... 211 5.4.1.4. Segurança e saúde ... 213 5.4.2. Recompensas ... 216 5.4.2.1. Emprego ... 217 5.4.2.2. Retribuição ... 219 5.4.2.3. Local de trabalho ... 221 5.4.2.4. Desenvolvimento e formação ... 223 5.4.2.5. Família ... 225 5.4.2.6. Comunidade ... 227 5.4.3. Bem-estar psicológico... 229 5.4.3.1. Avaliação comparativa ... 231 5.4.3.2. Prazer/Realização ... 234

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5.5. Resultados e modelo “Os três triângulos do bem-estar” ... 236

6. Conclusões ... 244

6.1. Contributos, limitações e oportunidades para pesquisa futura ... 247

7. Referências Bibliográficas ... 252

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xi

Índice de Figuras

Figura 1 Constelação da exigência (Bakker & Demerouti, 2007, p. 320) ... 13

Figura 2 Comparação de dimensões do bem-estar ... 14

Figura 3 Distribuição das fontes de felicidade (Lyubomirsky, 2011) ... 30

Figura 4 O que motiva os empregados? (Kovach, 1987) ... 35

Figura 5 Componentes do bem-estar no trabalho (Fisher, 2014, p. 15) ... 38

Figura 6 GRH para promoção do bem-estar (Guest, 2017) ... 60

Figura 7 Mapa de Distribição Nacional do Grupo ... 75

Figura 8 Valores do Grupo ... 75

Figura 9 Caracterização das empresas envolvidas no estudo ... 77

Figura 10 Apresentação da duração de cada entrevista ... 82

Figura 11 Duração de entrevistas em diversos estudos qualitativos ... 83

Figura 12 Imprecisões corrigidas na transcrição das entrevistas ... 85

Figura 13 Número de entrevistas em diversos estudos qualitativos ... 88

Figura 14 Caracterização individual dos participantes ... 89

Figura 15 Distribuição de Participantes – Sexo ... 90

Figura 16 Distribuição de Participantes – Idade ... 90

Figura 17 Distribuição de Participantes – Antiguidade ... 90

Figura 18 Distribuição de Participantes - Escolaridade ... 90

Figura 19 Distribuição de Participantes - Categoria profissional... 90

Figura 20 Distribuição de Participantes - Unidade Organizacional ... 90

Figura 21 Relações chefia-subordinado (Gardner et al., 2019) ... 141

Figura 22 Mapa Temático ... 237

Figura 23 Dimensões do bem-estar do empregado ... 238

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1. Introdução

O bem-estar no trabalho tornou-se um dos tópicos mais importantes da investigação organizacional (Van de Voorde et al., 2011), como demonstra a proliferação de diversos trabalhos com enfoque, por um lado, na satisfação do empregado perante as experiências subjetivas no trabalho (Fisher, 2010; Schueller, 2013), e, por outro, na proteção da saúde e segurança do empregado, nomeadamente em situação de stresse, assédio ou tensão no trabalho (Wright & Huang, 2012; Danna & Griffin, 1999). Grant et al. (2007) acrescentaram um terceiro enfoque para aprofundamento do tema do bem-estar no trabalho através da inclusão da dimensão social do bem-estar, identificada, de forma resumida, por associação aos construtos de confiança, apoio social, reciprocidade, cooperação e integração. Diversos autores contribuíram recentemente para o estudo da dimensão social do bem-estar, quer através do aprofundamento dos construtos acima enunciados (e.g. Cooper et al., 2019; De Clercq et al., 2019; Kennedy & Schweitzer, 2018; Koopman et al., 2016), quer pela exploração de novos construtos, nomeadamente amizade no trabalho (Hsu et al., 2019; Patulny et al., 2019), relações positivas no trabalho (Colbert et al., 2016; Feeney & Collins, 2014) , respeito (Walsh et al., 2018; Clarke & Mahadi, 2017) e liderança responsável (Cheng et al., 2019; Miska & Mendenhall, 2018). O bem-estar no trabalho surge, assim, estruturado nas dimensões psicológica, física e social, em alinhamento com a definição de saúde, considerada, mais do que a ausência de doença, como um estado de completo bem-estar físico, mental e social, conforme consta no preâmbulo de constituição da Organização Mundial de Saúde (WHO, 1946). A importância do bem-estar para uma vida saudável surge no objetivo n.º 3 de desenvolvimento sustentável definido pelas Nações Unidas: “assegurar vidas saudáveis e proporcionar o bem-estar de todos, em todas as idades” (UN, 2015).

A valorização do bem-estar aos empregados consiste num dos objetivos atuais da gestão da gestão de recursos humanos (GRH), entendida como o segmento específico da gestão dedicado aos assuntos de gestão das pessoas nas organizações (Boxall & Purcell, 2008), na medida em que os empregados são uma das mais relevantes partes interessadas das organizações (Kowalski & Loretto, 2017). Por outro lado, conforme previsto nos princípios de sustentabilidade e responsabilidade social, as organizações devem atuar de modo a proteger e valorizar as suas partes interessadas, numa perspetiva de médio e longo

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prazo (Luthans & Youssef, 2004). Todavia, a literatura alerta, também, para o facto de o atual contexto organizacional mostrar diversas situações penalizadoras do bem-estar dos empregados, nomeadamente o aumento da carga de trabalho sem compensação salarial (Bryson & Forth, 2015), intensificação do trabalho (Boreham et al., 2016), reforço da precariedade (Elliott, 2016) e redução de expectativas de evolução de carreira dos empregados (De Witte et al., 2016), seja por efeito, ainda, da crise mundial do final da primeira década do presente século (Bryson & Forth, 2015), seja pelo facto de a GRH se dedicar, principalmente, a entregar retorno financeiro e célere aos acionistas, sacrificando nessa busca os interesses e expectativas dos empregados (Guest, 2017).

Relativamente à dimensão social do bem-estar, a literatura indica que as relações sociais positivas aumentam o bem-estar (Dimotakis et al., 2011; Rogozińska-Pawełczyk, 2000), num efeito positivo que ultrapassa o acréscimo do prazer, na medida em que valorizam os empregados com diversos significados que contribuem, quer para a componente de realização associada ao bem-estar psicológico (Schueller, 2013; Ryan & Deci, 2000), quer para o fenómeno de florescimento humano, tido como a concretização do melhor potencial humano (Seligman, 2012; Colbert et al., 2016). No mesmo sentido, os bons ambientes sociais no local de trabalho estão associados ao bem-estar do empregado (Daniels et al., 2017). Os empregados atuam socialmente de acordo com a perceção geral que possuem da sua situação de trabalho (Dimotakis et al., 2010), o que atribui às características do trabalho uma parte significativa na constituição do bem-estar social dos empregados (Boreham et al., 2016). Neste contexto, a explicitação do bem-estar social não surge desassociada, por um lado, das condições objetivas do trabalho, e, por outro, do seu efeito ao nível do bem-estar psicológico dos empregados (Diener & Seligman, 2004). Todavia, a literatura não apresenta um estudo que concilie a explicitação dos mecanismos de formulação do bem-estar social e sua articulação com fatores relevantes da experiência de trabalho e do bem-estar geral dos empregados, concedendo este contexto relevância e pertinência ao desenvolvimento do presente estudo dedicado ao bem-estar social no trabalho.

Esta investigação decorre, também, de inquietação inicial do investigador sobre o que determina o bem-estar dos empregados, forjada em diversos anos de experiência acumulada na gestão de recursos humanos em contexto organizacional e num episódio

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interpelativo. Corria o ano de 2011, Portugal atravessava o período mais severo das medidas de austeridade, e foi promovida uma sessão de envolvimento e motivação com um grupo de operários num centro operacional, na região centro de Portugal, em Águeda, na qual se transmitiu a necessidade de os empregados continuarem empenhados e motivados no exercício das suas funções, pese embora a restrição salarial aplicada e outros condicionalismos existentes. Quando o investigador, na qualidade de coordenador de recursos humanos, terminou a apresentação, um operário levantou o dedo, tomou a palavra e, num tom severo, disse: “Não se esqueça, não há dinheiro, não há amor!”. E, realmente, desde esse momento o investigador não mais esqueceu essa frase, que lhe surge como inquietação permanente, e que, também, o impeliu a avançar para este trabalho de investigação, com o intuito de compreender melhor como se caracteriza e operacionaliza o bem-estar dos empregados. Essa inquietação tornou-se, ainda, mais viva pelo facto de a empresa onde ocorreu o momento “Não há dinheiro, não há amor!” ter sido considerada nos anos 2012, 2013 e 2014, umas das 100 Melhores Empresas para Trabalhar em Portugal1, por declaração dos empregados, apesar das fortes restrições remuneratórias, operacionais e outras que se verificaram nesse período. Afinal, poderá haver amor, não havendo dinheiro? O presente estudo coloca o enfoque na dimensão social do bem-estar do trabalho, por um lado porque é a dimensão do bem-estar que tem merecido insuficiente atenção na literatura e, por outro, porque no contexto organizacional do momento “Não há dinheiro, não há amor!” esta foi uma das dimensões mais reforçadas pela GRH nesse período de austeridade, sendo necessário reunir mais informação quanto ao modo como se constitui e influencia positivamente o bem-estar dos empregados. Em suma, este estudo foi desenvolvido com enfoque no bem-estar social, com o propósito de caracterizar as suas dimensões e mecanismos de formação no contexto de trabalho, assim como o seu modo de articulação com outras esferas do bem-estar, GRH e bem-estar geral do empregado.

O presente documento dedica os capítulos 2 e 3 à revisão crítica da literatura, expondo o enquadramento bibliográfico relevante, respetivamente, para os construtos de bem-estar no trabalho e gestão de recursos humanos. No capítulo 2 são apresentadas as dimensões do bem-estar no trabalho de acordo com as três dimensões proposta por Grant et al.

1 Melhores Empresas para Trabalhar em Portugal, distinção promovida pela revista Exame, com avaliação

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(2007): bem-estar psicológico, bem-estar físico e bem-estar social. Considerando a proximidade existente na literatura quanto a diversos construtos dedicados ao entendimento do comportamento humano no contexto do trabalho, considerou-se relevante complementar a revisão crítica da literatura do bem-estar do trabalho através da sua articulação com os construtos de bem-estar subjetivo, motivação e satisfação no trabalho. No capítulo 3, é revista a literatura sobre gestão de recursos humanos com enfoque no bem-estar dos empregados, quer através da apresentação das perspetivas divergentes de ganhos mútuos (Nishii & Wright, 2008; Appelbaum et al., 2000) e resultados conflituantes (Peccei, 2004; Legge, 1995) em que se enquadra o debate da promoção do bem-estar, quer através da formulação do contrato psicológico em resposta a expectativas de valorização dos empregados (Rousseau, 1989). Neste âmbito, é analisada, também, a proposta de sistema de GRH apostado na promoção do bem-estar dos empregados, apresentada por David Guest (2017). A revisão crítica da literatura é fundamental para permitir a escolha acertada do objeto de estudo e a fundamentação teórica do projeto de investigação, identificando as zonas desconhecidas ou ainda menos iluminadas associadas ao bem-estar dos empregados, para as quais os contributos da investigação se assumem como mais necessários, mais prioritários ou mais relevantes. No capítulo 4 são apresentados os objetivos do estudo e a metodologia. Considerando que o propósito do estudo se fixou na explicitação do “como” o bem-estar social se forma e relaciona com o bem-estar global do empregado, com as outras dimensões do bem-estar e com as expectativas dos empregados e sistemas de gestão de recursos humanos, a adoção de metodologia qualitativa surgiu como escolha natural. Aliás, como referem Straus e Corbin (1998, p. 48), “utilizamos pesquisas qualitativas para desenvolver teorias quando existem teorias parciais ou inadequadas para certas populações ou as teorias existentes não capturam adequadamente a complexidade do problema que estamos examinando.” Manifestamente, os mecanismos de formulação, operacionalização e articulação do bem-estar social carecem de maior aprofundamento e a abordagem qualitativa permite apreender as visões singulares dos empregados quanto aos contributos decisivos para esse estado positivo associado ao trabalho. Neste capítulo são apresentados os princípios e procedimentos metodológicos que enquadraram o estudo.

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A informação recolhida foi analisada segundo a análise temática, método qualitativo de análise de dados proposto por Braun e Clarke (2006, 2014) para tratamento da informação obtida em entrevistas a participantes de estudo empírico, através da identificação, análise e apresentação de padrões nos dados recolhidos. Os temas identificados através da análise temática são expostos no capítulo 5 – Análise e discussão de resultados. Considerando o enfoque do trabalho no bem-estar social, são apresentados em detalhe os 3 temas que o caracterizam - oportunidades de relacionamento, apoio social e valores sociais -, na dupla perspetiva de apresentação dos contributos dos participantes e confrontação com a literatura relevante. Todavia, considerando que as entrevistas permitiram recolher informação adicional relativamente ao bem-estar dos empregados que ultrapassa a sua dimensão social, a análise temática identificou 3 temas adicionais - trabalho, recompensas e bem-estar psicológico -, os quais são apresentados no âmbito do subcapítulo a montante ou jusante do bem-estar social, com apresentação dos contributos dos participantes que os sustentam. A totalidade da informação recolhida permitiu identificar uma cadeia sequencial para a formulação do bem-estar dos empregados, no qual o bem-estar social assume papel central, por um lado atribuindo significado social às perceções do empregado quanto às condições objetivas da experiência de trabalho e, por outro, sustentando a avaliação final que o empregado formula no seu bem-estar psicológico, e na qual suporta a sua decisão de continuar ou não na organização e, em caso afirmativo, a sua decisão de adotar uma postura ativa ou passiva no trabalho. Uma frase famosa, de autor desconhecido e muitas vezes partilhada em conversas entre práticos de GRH, expressa bem os riscos associados aos empregados que se mantêm na organização, mas passam a adotar uma postura desinteressada: “pior do que os colaboradores que se demitem e saem, são os colaboradores que se demitem e ficam!”. Como resultado da identificação de três níveis sequenciais para formação do bem-estar do empregado, é apresentada no final do capítulo 5 uma proposta de modelo de explicitação para o bem-estar dos empregados, denominada d’Os três triângulos do bem-bem-estar.

O presente trabalho de investigação assume-se, também, como mais um contributo para a aproximação do saber académico ao mundo organizacional, tanto mais que a inquietação inicial que o desperta nasce no meio organizacional, desaguando no meio académico para obtenção de resposta capaz de ser devolvida ao meio organizacional para melhoria da gestão das pessoas no trabalho. O debate rigor-relevância sobre a ciência vem

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mobilizando a comunidade científica e perpassa a atual bibliografia de investigação em gestão (Vermeulen, 2005). Segundo Cabral-Cardoso (2001), as culturas académica e empresarial têm valores e enfoques distintos, a primeira mais orientada para a produção de conhecimento e a valorização do debate entre os pares numa perspetiva de reflexão de médio-longo prazo, enquanto a segunda visa atingir sucessivos ganhos de eficiência, envolvendo e orientando todos os recursos para esse desígnio superior, considerando o conhecimento somente como mais um instrumento ao serviço da maximização do resultado, numa lógica que tende a necessitar de apresentar esse resultado de modo mais célere. No mesmo sentido, Rynes et. al (2001) defendem que investigadores e práticos pertencem a comunidades distintas, com valores e motivações diversas, o que dificulta possibilidades de interação. Rousseau (2006) constata razões de afastamento em ambos os sentidos, sendo, no entanto, mais veemente na crítica aos gestores do que aos investigadores, considerando os primeiros mais facilmente seduzidos pelos gurus e consultores do momento, portadores de mensagens apelativas embora cientificamente inconsistentes, do que pela solidez do discurso e das soluções apresentadas pelos segundos. No essencial, a bibliografia mostra escassa articulação entre os mundos do rigor académico e da relevância organizacional e Gulati (2007) avança mesmo que rigor e relevância são dois tipos de conhecimento distintos – epistemológico e ontológico – que não se misturam. A este propósito valerá a pena recordar que no estado brasileiro da Amazónia, as águas negras do rio Negro e as águas barrentas do rio Solimões correm lado a lado, também não se misturam (Franzinelli, 2011). O rio Negro é mais ácido e escuro que o rio Solimões. O rio Solimões é mais rápido e frio do que o rio Negro. São rios com características muitos diferentes e, por isso, as suas águas não se misturam, quando se encontram no estado de Manaus. Seis quilómetros depois de correrem lado-a-lado sem qualquer permeabilidade, as águas dos rios Negro e Solimões começam a misturar-se. Juntos, dão origem ao maior rio do mundo, o rio Amazonas. O fenómeno do encontro das águas amazónicas afigura-se como metáfora poderosa para enquadramento do debate rigor-relevância. Considerando que uma “boa teoria científica deve ser capaz de iluminar caminhos” (Goshal, 2005, p. 86), o presente trabalho pretende, efetivamente, conciliar o rigor inerente ao processo de produção científica com a relevância desse conhecimento para a valorização da gestão das pessoas nas organizações. Como a natureza nos sugere,

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quando as águas que estavam afastadas se misturam, a consequência pode ser fazer surgir o maior rio do mundo.

Este programa de doutoramento foi realizado com muito trabalho e esforço, disputando atenção numa vida preenchida, também, com responsabilidades diárias em GRH em contexto organizacional e muitos outros afazeres familiares e pessoais. Foi projeto realizado com muito gosto e gozo pela novidade, com alguma criatividade e enorme entusiasmo, com uma curiosidade inesgotável balanceada com o sentido prático de ser necessário chegar ao fim. Poucas temáticas nos devem motivar tanto como a possibilidade de contribuir, por pouco que seja, para que as organizações e as pessoas tenham mais informação útil e relevante sobre como fazer felizes as pessoas no trabalho. Efetivamente, como afirma Baudelaire (1994, p. 76), nos Escritos Íntimos, “bem vistas as coisas, trabalhar sempre é menos aborrecido do que esforçar-se por estar contente”. Este trabalho posiciona-se como um humilde contributo para que esta mensagem poética possa ser, cada vez mais, real na vida das organizações e de quem nelas trabalha, valorizando o trabalho e o bem-estar dos empregados.

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2. Bem-Estar no Trabalho

No trabalho, o empregado não é um ser isolado, pertence a um grupo de empregados, e partilha determinado contexto social (Antonovsky, 1987), no qual é simultaneamente mediado por instrumentos sociais como regras, linguagens, instituições, e mediador na criação de relações com outros indivíduos e objetos (Clot & Litim, 2008). O trabalho remunerado pode oferecer, como indicam Diener e Seligman (2004, p.11), “não apenas atividades agradáveis, mas também uma estrutura para o dia, contacto social, um meio de obter respeito e uma fonte de envolvimento, desafio e significado”. No mesmo sentido apontam os estudos que demonstram que estar empregado tem um impacto positivo muito significativo no bem-estar das pessoas (Kowalski & Loretto, 2017), na medida em que a pessoa desempregada tem pior bem-estar físico e psicológico do que a pessoa empregada (Waddell & Burton, 2006). O trabalho satisfaz muitas das necessidades mais críticas das pessoas, quer quanto à recolha de recursos tangíveis para responder a necessidades vitais e de segurança, quer para desenvolver capacidades e obter significado através da experiência de trabalho, quer para integrar uma rede social que estruture a identidade pessoal e reforce o respeito dos colegas (Boreham et al., 2016).

A literatura tem assumido que o bem-estar no trabalho é influenciado pelos atributos da organização, do trabalho, das chefias, ou outros aspetos do ambiente de trabalho (Fisher, 2010; Wright & Huang, 2012), assim como das características genéticas (Lyubomirsky, 2011) e de personalidade (Fisher, 2010) dos empregados, e o seu efeito pode gerar resultados valorizadores para a organização e para os empregados, nomeadamente ao nível da produtividade, qualidade de decisão e absentismo (Price & Hooijberg, 1992; Fisher, 2003), assim como criatividade, saúde cardiovascular ou a satisfação no trabalho (Wright & Huang, 2012; Wright, 2006).

O bem-estar dos empregados assume particular importância no contexto organizacional porquanto os empregados são dos recursos mais valiosos para o funcionamento das organizações (Luthans & Youssef, 2004; Boxall & Steeneveld, 1999; Barney & Wright, 1998) e a organização necessitará de obter o máximo retorno possível através da otimização eficiente dos recursos existentes (Kalleberg, 2009), seja pela via do reforço da flexibilidade e precarização da relação de trabalho (Imhof & Andresen, 2018; Kowalski & Loretto, 2017; Baluch, 2017), seja pela via alternativa ou complementar do

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reforço do estar dos empregados (Roehling et al., 2000). A importância do bem-estar bem-estará a aumentar, enquanto ponto de equilíbrio duradouro na relação empregador-empregado (Roehling et al., 2000). Por exemplo, Wright e Bonett (2007) mostraram que o aumento de um ponto no nível de bem-estar dos empregados (escala de sete pontos) duplicou a probabilidade de o empregado continuar na organização.

O bem-estar dos empregados é um tópico específico da literatura, que se refere à qualidade da experiência do empregado no trabalho (Warr, 1987), e que se distingue, por um lado, do bem-estar global do indivíduo ou felicidade (Guest, 2017), cujo enquadramento ultrapassa as fronteiras do trabalho (Diener et al.,1999), e da satisfação no trabalho, cujo conceito se associa somente à dimensão hedónica do bem-estar, conforme adiante analisaremos em secções específicas. O enfoque no bem-estar traduz-se numa alteração do olhar da gestão perante a organização, passando o foco da análitraduz-se dos riscos psicossociais, centrado na doença, para uma perspetiva salutogénica, centrada na saúde (Bertrand & Stimec, 2011; Antonovsky, 1987). Em consequência, o bem-estar no trabalho não será simplesmente “não estar doente no trabalho” (Aborde de Chatillon & Richard, 2015, p. 55), que se poderia refletir na ausência de psicopatologias para o empregado, mas sim pela existência de manifestações positivas de bom desempenho psicológico, físico e social do empregado (Cowen, 1994). Estar bem no trabalho implica ter prazer e realização no trabalho (Ryff & Singer, 1998; Kahneman et al., 1999).

Guest (2017) refere que o bem-estar dos empregados se assume como um dever ético das organizações, pelo que as organizações devem proteger e valorizar o bem-estar dos empregados (Kowalski & Loretto, 2017). Segundo Karasek (2001) a promoção do bem-estar dos empregados assume-se como um objetivo do próprio trabalho, o qual deverá ser desenhado com esse propósito, tornando-se a promoção do bem-estar uma questão crucial da gestão (Wright, 2006). O bem-estar no trabalho surge com três características distintivas (Wright & Huang, 2012): 1) é um evento fenomenológico, na medida em que os empregados relatam uma avaliação que resulta de um estado de consciência; 2) está associado a emoções, ao processo através do qual os empregados se emocionam no trabalho; 3) decorre de uma avaliação global, liberta da avaliação específica de determinada variável do contexto de trabalho. Esse estado de consciência emocional, que resulta de avaliação global, movimenta-se entre ‘frias cognições’, como crenças e

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julgamentos avaliativos, e ‘quentes fenómenos afetivos’, como humor e emoções (Fisher, 2010). As experiências emocionais e sociais do empregado no trabalho determinam o modo como trabalha e repercutem-se nas esferas pessoais da sua vida (Danna & Griffin, 1999). Segundo os mesmos autores, o bem-estar será influenciado, a montante, pela configuração do trabalho, pelas características pessoais do empregado e, em resultado desse ajustamento ou desajustamento, do nível de stresse ocupacional gerado para o empregado. A jusante, o bem-estar no trabalho contribui para o nível de bem-estar de determinada comunidade ou sociedade. No essencial, para “alcançar uma vida boa, as pessoas devem trabalhar em boas organizações” (Gavin & Mason, 2004, p. 387). A escola das Relações Humanas postula que “os trabalhadores são sobretudo entes sociais, movidos não apenas por necessidades económicas, mas também de pertença e de inclusão social” (Cunha et al., 2007, p. 173) e surge como alerta fundamental para sinalizar estilos de gestão e organização de trabalho alternativos ao the one best way do maquinismo industrial associado à gestão científica (Taylor, 1911) e que levou à desumanização do trabalho (Cunha et al., 2007). A segunda metade do século XX, beneficiada pela disseminação dos ideais de democratização pelo mundo ocidental, fez proliferar os princípios da escola das relações humanas e concedeu maior atenção aos domínios do comportamento organizacional, da GRH e das relações industriais (Cunha et al., 2006). Surge no contexto organizacional uma visão humanista, centrada na valorização dos empregados, que substitui uma visão paternalista, centrada numa relação unilateral e descendente, através da qual o empregador oferecia ao empregado uma experiência de trabalho cientificamente definida. O conceito de Qualidade de Vida no Trabalho, conforme formulado por Walton (1974), é considerado um antecedente muito relevante para o atual conceito de bem-estar no trabalho (Guest, 2017), na medida em que identificou oito condições determinantes para o bem-estar do empregado, nas quais surge em evidência a dimensão social do trabalho:

 ambiente saudável e seguro: associada às condições físicas de execução do trabalho, implicando exposição a risco de acidente e excesso de volume de trabalho;

 desenvolvimento das capacidades humanas: associada à autonomia e controlo sobre as tarefas a executar, envolvendo autonomia na tomada de decisão e

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capacidade para aproveitamento das competências e conhecimento do empregado;

 crescimento e segurança: associada à possibilidade de desenvolvimento pessoal através de progressão na carreira e obtenção de maior conhecimento e competências, em enquadramento de previsível estabilidade do vínculo de emprego;

 integração social: associado ao relacionamento interpessoal, ao comprometimento e envolvimento dos empregados e à igualdade de oportunidades na organização, sem manifestações de discriminação;

 direitos e representação: associado ao respeito pelos direitos legais e regulamentares dos empregados, nomeadamente quanto à sua representação e liberdade de expressão;

 relevância social do trabalho: associada ao valor percecionado do trabalho, que pode decorrer de uma imagem corporativa da organização assente em elevados padrões sociais ou por elevado significado associado ao impacto das atividades realizadas;

 consideração da vida total: associado à possibilidade de beneficiar de organização de trabalho que permita uma conciliação mais favorável entre as esferas profissionais e familiares da vida do empregado;

 compensação adequada e justa: associada à retribuição enquanto contrapartida das competências e desempenho do empregado, observando critérios equitativos entre titulares da mesma função dentro e fora da organização.

Mais de uma década depois, o modelo da Vitamina de Warr (1987) constitui mais um importante contributo para a estruturação do bem-estar dos empregados, complementando o trabalho de Walton, na medida em que através da revisão da literatura existente, identificou as seguintes características comuns ao trabalho que proporciona elevado bem-estar:

 oportunidades de controlo: exercer controlo sobre a sua atividade e grande parte dos seus resultados;

 valorização das competências: realizar atividades que recorram e aproveitem as suas melhores competências e talentos;

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 diversidade de trabalho: estimular a variação das tarefas e objetivos, não sucumbindo à monotonia e repetição;

 segurança física: estar defendido de ameaças físicas, dispor de condições de conforto e privacidade adequadas;

 objetivos externos: perseguir objetivos externos, repletos de significado, que concedam sentido à dedicação e empenho no trabalho;

 respeito e status social da posição: ocupar uma posição que seja reconhecida pelos outros como de elevado valor na estrutura social da organização;

 valorização de contacto interpessoal: possibilidade de interagir com outras pessoas, beneficiando de uma experiência de trabalho colaborativa;

 boas recompensas: dispor de rendimento suficiente para garantir a sua sobrevivência e das pessoas a seu cargo;

 informação clara: obter feedback de desempenho e conhecer o sistema social e normativo da organização tornando previsível os efeitos das ações encetadas no contexto organizacional.

Com o modelo da vitamina, Warr (1987) defende que a administração diária das características positivas do trabalho acima indicadas irá permitir que o empregado corrija deficiências e melhore o seu bem-estar no trabalho, sendo que, a partir de determinado momento, e logo que atingida a “dose diária recomendada”, o efeito benéfico para o bem-estar tornar-se-á muito limitado ou até negativo (Fisher, 2010; Hodson, 2001). Do mesmo modo que uma dieta sem determinadas vitaminas se traduz em doença para a pessoa, também um ambiente organizacional sem as características indicadas por Warr irá gerar penalização para o bem-estar do empregado (Hodson, 2001). A enumeração das características positivas do trabalho concilia o enfoque no desempenho da atividade, assim como na interação social e nas práticas de GRH (Guest, 2017). O bem-estar do empregado resulta do prazer da experiência e do desenvolvimento das suas capacidades (Paschoal & Tamayo, 2008), sendo o resultado influenciado pelas condições ambientais associadas à organização (De Jonge & Schaufeli, 1998).

Através do Job Demands-Resources model (JD-R model), Bakker e Demerouti (2007) vêm propor que o bem-estar tem por objetivo equilibrar a interação existente entre as exigências físicas, mentais e emocionais do trabalho e os recursos do empregado para o

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realizar, incluindo autonomia, apoio social ou feedback. Bakker et al. (2005) desenvolveram estudo empírico com mil empregados de organização de ensino superior e constataram que situações com elevado volume de trabalho e elevadas exigências físicas e emocionais não geraram elevados níveis de esgotamento quando os empregados exercem a atividade com autonomia e dispõem de feedback de desempenho, apoio social e instrumental e bom relacionamento com a chefia. O JD-R model defende que um elevado nível de bem-estar social tem capacidade para valorizar o bem-estar dos empregados mesmo em contextos mais adversos, e, em consequência, reduzir nível de burnout e stresse e aumentar os níveis de compromisso e envolvimento (Bakker & Demerouti, 2007; Schaufeli et al., 2009; Van de Voorde et al., 2016). Quando assegurada a entrega dos necessários recursos ao empregado, a sua motivação será alta ou média em contexto de baixa ou elevada exigência, respetivamente, como demonstrado na “constelação da exigência”, indicada na figura seguinte:

Em termos estruturais, surgem dois modelos distintos para enquadramento do bem-estar no trabalho (Rolland, 2000): 1) os modelos Bottom-Up consideram que as condições objetivas de realização do trabalho são fundamentais para determinação do nível de bem-estar do empregado; 2) os modelos Top-Down consideram que o olhar subjetivo do empregado sobre as condições e conteúdo do trabalho são mais importantes do que o enquadramento objetivo do trabalho. Curiosamente, esta estrutura é muito similar à existente no âmbito da psicologia quanto à determinação do nível individual de felicidade, para uns determinado em resultado das condições objetivas de vida e, para outros, em

Recursos Elevado Baixa tensão Alta motivação Média tensão Alta motivação Baixo Baixa tensão Média motivação Alta tensão Baixa motivação Baixo Alta Exigências

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resultado do setpoint de felicidade de cada indivíduo, conforme será analisado em secção adiante (Diener, 1994).

O bem-estar no trabalho é um conceito multidimensional (Grant et al., 2007; Page & Vella-Brodrick, 2009), cuja definição e amplitude decorre do contributo de diversas ciências, nomeadamente a medicina, a gestão, a psicologia, a sociologia e a antropologia (Kowalski & Loretto, 2017). Reunindo todos esses contributos, Grant et al. (2007) construíram um enquadramento conceptual para entendimento do bem-estar dos empregados que estabelece três dimensões: psicológica, física e social. Posteriormente ao modelo de Grant et al. (2007) surgiram novas propostas de modelos, com novos acrónimos e designações apelativas, mas cujo conteúdo não se afigura acrescentar enfoques ou tópicos novos. Por exemplo, os modelos apresentados por Aborde de Chatillon e Richard (2015) e Fisher (2014), embora introduzindo designações diversas, seguem, no essencial, a estrutura do modelo de Grant et al. (2007), como a seguir se apresenta:

Grant et al. (2007) Aborde de Chatillon & Richard (2015)

Fisher (2014) Bem-estar psicológico S – Sentido do Trabalho

A – Atividade

Bem-estar no trabalho: eudaimonia/bem-estar subjetivo

Bem-estar físico C – Conforto

Bem-estar social L – Ligação Social Bem-estar social no

trabalho

Figura 2 Comparação de dimensões do bem-estar

Em consequência, passamos a apresentar o bem-estar dos empregados nas páginas seguintes, através da análise das suas dimensões psicológica, física e social (Grant et al., 2007), aliás, seguindo o mesmo roteiro de apresentação também utilizado por Guest (2017) para apresentação mais detalhada do conceito de bem-estar dos empregados.

2.1.Bem-estar psicológico

A dimensão psicológica do bem-estar, a que os autores designam por felicidade (Grant et al., 2007), está associada à experiência subjetiva do empregado no trabalho e inclui duas

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subdimensões: 1) hedónica, que se refere ao quão agradável é a experiência de trabalho; 2) eudaimonia que se refere à possibilidade de o empregado concretizar todo o seu potencial.

O Chartered Institute of Personnel and Development (Harrison, 2016) definiu bem-estar no trabalho como um ambiente favorável ao contentamento dos empregados e à concretização do seu potencial, incorporando na sua definição as duas subdimensões indicadas do bem-estar psicológico. Por outras palavras, como refere Ben-Shahar (2008, p. 72), o bem-estar no trabalho é uma "sensação global de prazer carregada de significado”, não sendo sustentável no tempo o bem-estar que decorre do prazer do trabalho perante a ausência do bem-estar que decorre do significado do trabalho (Fisher, 2010). Na literatura, os estudos foram inicialmente dedicados à dimensão hedónica do bem-estar, sendo que na segunda década do século XXI nota-se uma presença crescente dos estudos que analisam o bem-estar, em termos conceptuais e empíricos, segundo a perspetiva eudaimonia (Schueller, 2013). Atentemos em cada uma das subdimensões do bem-estar psicológico, com maior detalhe.

2.1.1. Subdimensão hedónica

O bem-estar do empregado inclui o prazer que advém da experiência de trabalho. Inclui o que faz, como faz e com quem faz o trabalho, e está muito associado ao conceito de satisfação no trabalho (Guest, 2017). Decorre do balanço subjetivo e individual sobre todas as situações mais agradáveis (prazer, conforto, otimismo) e desagradáveis (medo, desconforto, stresse) ocorridas, numa perspetiva de prazer ou contentamento para o empregado (Aborde de Chatillon & Richard, 2015).

A experiência hedónica inclui o afeto positivo, por exemplo, a alegria e o entusiasmo, e a ausência relativa de afeto negativo, por exemplo, falta de ansiedade e sensação de calma (Daniels et al., 2017). A capacidade de o empregado experimentar emoções positivas é crucial para a sua capacidade de prosperar, mental e psicologicamente, dentro e fora do trabalho (Wright, 2006).

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A acumulação de momentos agradáveis influencia positivamente o nível geral de satisfação do empregado (Fisher, 2010). Para a corrente hedonista, o bem-estar no trabalho será tanto maior quanto maior for o prazer associado à experiência de trabalho (Kahneman et al., 1999). Fisher (2010) associa a componente hedónica do bem-estar psicológico ao julgamento individual e subjetivo quanto à satisfação com o trabalho (avaliado globalmente e em domínios específicos como relacionamentos, saúde, função e lazer), que se traduz num balanço que demonstre a preponderância de emoções positivas e a escassez de emoções negativas.

No entendimento do impacto dos momentos de contentamento na autoapreciação do bem-estar, importa considerar o conceito de adaptação hedónica, segundo o qual um acontecimento novo, mesmo que muito desejado e positivo, não tem um efeito constante ao longo do tempo. Se, no início, pode, realmente, aportar grande incremento de contentamento, a partir de determinado momento, e devido ao fenómeno de adaptação hedónica (Brickman & Campbell, 1971; Schkade & Kahneman, 1998), esse efeito tende a diminuir ou a anular-se ao longo do tempo. As sensações de bem-estar são reações emocionais rápidas e os empregados tenderão a regressar a um estado de neutralidade hedónica (Wright, 2006), na medida em que todo o efeito tende a passar e o que era extraordinário passa a ser ordinário, e o elevado efeito de uma circunstância extraordinária dá lugar ao ausente efeito de uma circunstância ordinária. Por exemplo, estudos demonstram que praticar a gratidão três vezes por semana é menos eficaz para reforço do bem-estar do que praticá-la somente uma vez (Lyubomirsky et al., 2005). A adaptação hedónica surge, também, como condição para que novas alegrias possam ser vividas, na medida em que nenhuma pessoa conseguiria viver em permanente estado de elevado nível de emoção positiva sobre todas as variáveis da sua vida. Uma vida em “perpétuo orgasmo” (Kets de Vrie, 2000, p. 303) soa mais a castigo do que a bênção.

2.1.2. Subdimensão eudaimonia

Eudaimonia é uma palavra grega, utilizada por Aristóteles para identificar o fim maior da ação humana, no qual o indivíduo se sente realizado através da concretização do seu propósito de vida (Price, 1980; Ryff & Singer, 1998). A subdimensão eudaimonia

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transcende o mero prazer hedonista do momento (Kets de Vrie, 2000) e está associada à concretização do potencial do indivíduo e à busca de significado e propósito no trabalho (Guest, 2017). Terá mais bem-estar quem estiver mais próximo do seu daimon – do seu “eu verdadeiro” -, pelo que o bem-estar está associado à autorrealização e à possibilidade de aproveitar oportunidades de valorização e crescimento individual (Waterman, 1993). Bertrand Russell (1958) indica o trabalho como uma das fontes de felicidade individual na medida em que contribui para evitar o aborrecimento, reforçar a autoestima, o reconhecimento e o sucesso, e construir um propósito individual para a vida. Na busca desse propósito, o trabalho é, cada vez mais, uma fonte de significado, crescimento e energia para os empregados (Ragins & Dutton, 2007), pelo que terão mais bem-estar se sentirem um calling ou uma ligação entre o que fazem no trabalho e um propósito mais elevado ou valor importante (Seligman, 2012). “O trabalho cheio de significado é o trabalho percecionado como particularmente significativo e com significado mais positivo para os indivíduos” (Rosso et al., 2010, p. 95). Entender o bem-estar unicamente pelo prazer momentâneo, pela sua subdimensão hedónica, seria o mesmo, como dizem alguns autores, que tratar os empregados como meros animais contentes (Koprowski, 1981; Ledford, 1999). Os empregados desejam um nível superior de realização pessoal (Wrzesniewski et al., 2003) e estão dispostos a suportar atividades e contextos adversos em favor desse objetivo maior (Kets de Vries, 2000). A dimensão de bem-estar psicológico - eudaimonia – constitui, para Fisher (2014), a reunião de diversos conceitos importantes da literatura organizacional:

 envolvimento: consiste na capacidade de se identificar com o trabalho e de obter reforço de autoestima através dele;

 compromisso: inclui a energia, resistência mental, o entusiasmo e a concentração que o empregado coloca no seu trabalho;

 prosperidade: inclui a crença de que o trabalho contribui para a autorrealização;  fluxo: ocorre quando o empregado está totalmente absorvido numa atividade

desafiadora;

 motivação intrínseca: interesse ou prazer que decorre de uma atividade;

 significado: associado ao valor do trabalho em si mesmo, sendo-lhe atribuído um sentido em favor de um valor maior.

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Ryan et al. (2008) identificam as condições necessárias para reforço do nível de bem-estar psicológico - eudaimonia:

 prosseguir objetivos e valores intrínsecos;  comportar-se de maneira autónoma e natural;  agir com atenção e consciência;

 procurar satisfazer as necessidades psicológicas básicas de competência, relacionamento e autonomia.

Estas abordagens sugerem um enquadramento conceptual próximo entre o bem-estar psicológico eudaimonia e a teoria da autodeterminação proposta por Ryan e Deci (2000), segundo a qual há contextos sociais e organizacionais que facilitam ou prejudicam os processos naturais de automotivação e desenvolvimento pessoal. Segundo os autores, existem três necessidades psicológicas inatas, essenciais e universais – autonomia, competência e relacionamento – que, quando satisfeitas pelo contexto organizacional e social, alimentam a motivação intrínseca do empregado e proporcionam maior automotivação e bem-estar, na sua dimensão eudaimonia (Ryan & Deci, 2000). “Os contextos que apoiam a autonomia, competência e relacionamento promovem uma maior internalização e integração do que os contextos que frustram a satisfação dessas necessidades. Esta constatação é de grande importância para os indivíduos que desejam motivar os outros para obter comprometimento, esforço e desempenho de alta qualidade” (Ryan & Deci, 2000, p. 76). Ou seja, o bem-estar psicológico eudaimonia florescerá em contextos organizacionais que permitam o desempenho de atividades em que o empregado assuma o locus de controlo das suas tarefas, disponha de competências para as executar e interaja com os outros com a regularidade e qualidade necessárias para garantir o seu equilíbrio pessoal e um sentido de integração no contexto social da organização. A teoria da autodeterminação estrutura-se em torno da satisfação das referidas três necessidades básicas do indivíduo e da motivação intrínseca gerada pelas atividades realizadas em contexto de autonomia e competência pelo empregado. A articulação entre motivação intrínseca e bem-estar será explorada adiante, em secção dedicada a motivação. No modelo proposto por Daniels et al. (2017), a eudaimonia inclui sentimentos de autonomia, domínio, crescimento pessoal, relações positivas com os outros, propósito na vida e autoaceitação. O sentido pode vir, não diretamente das

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condições de execução da tarefa, mas da pertença ao grupo, sendo que essa dimensão gregária pode ser percecionada pelo próprio como cheia de significado (Colbert et al., 2016).

2.2.Bem-estar físico

A dimensão física do bem-estar decorre da relação entre o trabalho e a saúde do empregado e inclui, nomeadamente, as situações de lesão, doença e risco de stresse (Grant et al., 2007). O bem-estar físico traduz-se em indicadores subjetivos de saúde, ora positivos como energia, ora negativos como exaustão e stresse (Guest, 2017). “Os investigadores organizacionais há muito tempo que estão cientes dos elevados custos humanos e financeiros atribuíveis ao bem-estar disfuncional. Depressão, perda de autoestima, hipertensão, alcoolismo e consumo de drogas ilícitas estão associados ao bem-estar disfuncional relacionado com o trabalho.” (Wright & Huang, 2012, p.2) As fontes de perigo para os empregados têm aumentado no contexto organizacional, nomeadamente por via do reforço da flexibilização e precariedade da relação de trabalho, somando-se às habituais fontes físicas de lesões e doenças, as situações crescentes de stresse, assédio e violência (Danna & Griffin, 1999; Boreham et al., 2016). O reforço das denominadas práticas de gestão de recursos humanos de elevado desempenho constitui ameaça adicional à saúde do empregado, na medida em que, em consequência do maior volume de trabalho, “podem criar trabalhos que drenam a energia e têm efeitos colaterais negativos em outros domínios da vida” (Boreham et al., 2016, p. 596). O stresse surge como sendo, não um output do trabalho atual, mas sim, uma característica inerente ao modo de organização do próprio trabalho, que passa a ser exercido com um nível determinado de stresse que se considera necessário e eficaz para reforçar o objetivo de maior produtividade (Gavin & Mason, 2004). No mesmo sentido, a procura de redução de custos estabelece que menos recursos produzam mais resultados, pelo que o risco de excesso de trabalho assume-se como um efeito previsto na própria configuração da experiência do trabalho (Boreham et al., 2016).

O bem-estar está negativamente correlacionado com a depressão, ansiedade e burnout, e positivamente correlacionado com a saúde física (Faragher et al., 2005). A doença gera

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decréscimo acentuado de bem-estar (Diener & Seligman, 2004) e a pulsação dos empregados, indicador do estado de ansiedade e exaustão, tem correlação negativa com o bem-estar (Wright & Huang, 2012). Ser testemunha ou vítima de comportamentos não éticos ou de situações de bullying decresce o bem-estar no trabalho (Lyons et al., 1995), e gera menor saúde física e mental, manifestando-se através de depressão, stresse, trauma, insónia, menor autoestima e, em situação mais grave, suicídio (Giacalone & Promislo, 2010). No mesmo sentido, os empregados que são vítimas de discriminação manifestam vício do tabagismo, ansiedade, problemas de sono e diversos outros problemas de saúde mental (Giacalone & Promislo, 2010).A introdução de programas para tratar empregados com depressão, não só aumentou o bem-estar, como reduziu significativamente o turnover (Wright, 2006). Estudo realizado por Macky e Boxall (2008) identificou uma associação entre o reforço do empowerment dos empregados e a redução da fadiga e stresse, permitindo aos autores defender que a valorização do bem-estar poderá ser conseguida através da alteração do ambiente de trabalho para “que os empregados trabalhem de modo mais inteligente, por meio de maior capacitação, mas sem pressão indevida para trabalhar mais” (Macky & Boxal, 2008, p. 52).

Surgem diversas evidências de correlação entre dimensões do bem-estar social e dimensões do bem-estar físico, nomeadamente quanto à associação do apoio social à redução do stresse no trabalho e proteção de esgotamentos (Hammig, 2017) e quanto à correlação negativa entre gestão participativa e stresse no trabalho, insegurança no emprego, interferência do trabalho na vida pessoal e excesso de carga de trabalho (Boreham et al., 2016). Neste âmbito, destaca-se a importância do apoio da chefia no bem-estar e saúde mental do empregado: “No geral, a falta ou a inexistência de apoio da chefia tornou-se a mais importante fonte de stresse no trabalho e fator de risco para a saúde do empregado, consideradas todas as fontes de apoio social, independentemente do tipo ou domínio dos problemas envolvidos” (Hammig, 2017, p. 398). A correlação entre o bem-estar do empregado e o desempenho da chefia adquire, por mediação do construto apoio social, maior solidez (Wright & Huang, 2012).

Na literatura surge, também, incluída na dimensão física do bem-estar a acessibilidade do empregado, por via do emprego, a serviços médicos não disponíveis para a restante

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comunidade (Grant et al., 2007), na medida em que essa possibilidade permitir-lhe-á valorizar a sua saúde e, subsequentemente, o seu nível de bem-estar.

2.3.Bem-estar social

A interação social será a dimensão da vida humana mais associada ao crescimento e desenvolvimento de uma pessoa (Colbert et al., 2016) e “as relações sociais têm um efeito poderoso na felicidade e em outros aspetos do bem-estar, e talvez sejam sua maior causa” (Argyle, 2001, p. 71). Os relacionamentos de elevada qualidade são uma fonte importante de bem-estar e energia para os empregados (Ragins & Dutton, 2007) e as interações sociais influenciam os estados afetivos dos empregados, com impacto na satisfação no trabalho (Dimotakis et al., 2011).

A qualidade das relações sociais é fundamental para o bem-estar dos indivíduos, na medida em que necessitam de apoio, relacionamentos positivos e sentido de pertença para sustentar um nível positivo de bem-estar (Diener & Seligman, 2004; Dutton & Heaphy, 2003; Ragins & Dutton, 2007). As relações sociais respondem à necessidade de pertença de cada indivíduo e geram uma resposta positiva ao nível do aumento da energia, autoconhecimento e apoio que alimenta um movimento de crescimento e desenvolvimento pessoal (Colbert et al., 2011). O bem-estar dos indivíduos é influenciado positivamente por relações pessoais profundas (Griffin, 1986) que gerem amor mútuo, sexualidade, benevolência, entendida como preocupação com o bem-estar dos outros, e retidão, entendida como conduta moralmente correta (Becker, 1992). O bem-estar decorre, no essencial, do amor e afeição que as pessoas recebem e entregam aos outros nas relações sociais que estabelecem (Russell, 1958), sendo a capacidade para amar uma condição fundamental para a saúde mental positiva (Jahoda, 1958; Birren & Rener, 1980). No trabalho, as ações do empregado são determinadas pelas suas relações (Rogozińska-Pawełczyk, 2000) e os empregados têm maior satisfação no trabalho e afeto positivo nos dias em que experimentam interações sociais mais positivas do que habitualmente, e reportam menor satisfação no trabalho e maior afeto negativo quando experimentam interações mais negativas do que habitualmente (Dimotakis et al., 2011). “Os relacionamentos não apenas têm o potencial de aumentar a satisfação no trabalho,

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mas também promovem perceções de trabalho significativo, geram emoções positivas no trabalho e sustentam a satisfação com a vida; eles apoiam o florescimento dos empregados e beneficiam indivíduos e organizações” (Colbert et al., 2016, p. 1219). Embora os modelos de avaliação das relações empregador-empregado demonstrem que bons ambientes sociais no local de trabalho estão associados ao bem-estar do empregado, o bem-estar social é a dimensão do bem-estar do empregado que tem merecido menos atenção da literatura (Daniels et al., 2017), e consiste, no essencial, no enquadramento social de que o empregado dispõe na experiência de trabalho, incluindo interações de curto prazo e relacionamentos de longo prazo com os outros (De Simone, 2014). Decorre da qualidade das relações sociais do empregado com as outras pessoas e com a comunidade, e está associado ao nível de suporte social – emocional e instrumental – e à perceção dos níveis de confiança e igualdade de tratamento no trabalho (Guest, 2017). O bem-estar social vem sendo caracterizado por diversos construtos, nomeadamente confiança, apoio social, reciprocidade, cooperação e integração (Grant et al., 2007). O bem-estar tem uma elevada capacidade de contágio para as pessoas em redor, quer na perspetiva de contágio vertical do líder para os subordinados (Bono & Ilies 2006; Johnson, 2008; Sy et al., 2005), quer na perspetiva de contágio horizontal entre colegas de equipa (e.g. Bakker et al., 2005; Barsade, 2002; Ilies et al., 2007; Kelly e Barsade, 2001), assim como contágio para o exterior, do cliente ao prestador de serviços (Dallimore et al., 2007). A liderança carismática está fortemente correlacionada com a satisfação dos subordinados (DeGroot et al., 2000), e a troca de líder (Gerstner & Day, 1997) e a confiança no líder (Dirks & Ferrin, 2002) também estão correlacionadas com a satisfação no trabalho e o compromisso organizacional. SegundoRath (2006), quem tem o melhor amigo no trabalho tem uma maior probabilidade de estar envolvido com o trabalho do que os restantes,na medida em que ter um amigo no trabalho está associado a emoções positivas, felicidade e prazer (Colbert et al., 2011). Por outro lado, o conflito associado ao relacionamento social gera mais stresse do que outras formas de conflito (Dimotakis et al., 2010). As relações positivas têm impacto na redução do absentismo e turnover, maior partilha de recursos e engagment, e redução de custos de saúde porque empregados mais felizes são mais saudáveis (Colbert et al., 2016). O apoio social, de diferentes tipos e fontes, demonstra ter impacto positivo e de proteção ao nível da saúde

Referências

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