PONTIFICIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO
PUC – S.P
JANETE DA SILVA LOPES
Lugar de envelhecer: Narrativas de idosos
MESTRADO EM CIÊNCIAS SOCIAIS
PONTIFICIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO
PUC – S.P
JANETE DA SILVA LOPES
Lugar de envelhecer: Narrativas de idosos
MESTRADO EM CIÊNCIAS SOCIAIS
São Paulo 2014
Página | 3 Dedico este trabalho à vida, que refaz teu ciclo em meu ventre irradiando amor e energia.
Banca Examinadora –
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AGRADECIMENTOS
Agradeço aos meus familiares, pais, irmãos e cunhados que, mesmo sem entender minhas escolhas, me apoiaram e partilharam meus desejos me encorajando a realizá-los. De maneira muito especial agradeço meu marido Márcio, por todo o amor, paciência e solidariedade que a mim dispensou neste momento.
À minha grande paixão, o pequeno Arthur, um pedido de desculpas pelos momentos não vividos em detrimento da escassez de tempo para estarmos juntos.
Sou grata à Professora Maria Helena Villas Boas Concone pela atenção e paixão com que orientou este estudo e pela paciência e lucidez com que sempre acolheu minhas angústias e inseguranças. Encontrá-la foi o acontecimento mais importante desta trajetória. Outros bons encontros tive com professores e colegas da PUC – S.P a quem registro minha gratidão.
Partilhar a vida de cada um dos colaboradores desta pesquisa e poder publicizar histórias de luta e de resistência foi o maior presente da pesquisa. Seu Adelino (em memória); Seu Abel; Seu Antonio; Seu Cipriano, Seu Irine e Dona Tereza, às Marias da Vila Dignidade – Maria Aparecida, Maria Rosa e Maria Carvalho; à Dona Zélia, Dona Geni e aos demais moradores meu Muito Obrigada pela acolhida e pela sinceridade com que compartilharam suas intimidades abrindo suas vidas e possibilitando essa troca tão valiosa para a construção de novos saberes. Devo um agradecimento especial a Elisabeth do Rocio Minaif Santos, coordenadora da Proteção Especial do Município de Itapeva, pela atenção e confiança com que nos recebeu facilitando nossa inserção em campo.
Agradeço à Secretaria Estadual de Desenvolvimento Social, lugar que primeiro me propiciou o contato com o tema do envelhecimento. À Áurea Soares Barroso que sempre instigou meu desejo de investigação e aprofundamento sobre as questões que envolvem o envelhecer. Não posso deixar de agradecer aos colegas da equipe de Proteção Social Especial: Ângela, Angélica, Luciana, Nazira, Ana Paula, pela compreensão sempre que precisei sobrecarregá-las com minhas ausências, em especial ao meu coordenador Edson Pelagallo, e às colegas Fátima Nassif e Juliana Santos que me ajudaram na transcrição das entrevista.
Aos Programas de Pós Graduação em Ciências Sociais e Gerontologia da PUC-SP pelos momentos de conscientização e reflexão e às professoras Elisabeth Mercadante e Flamínia Manzano Ludovici pelas valiosas contribuições na qualificação deste trabalho.
Aos amigos de todas as horas: Luciana Ramin e Gabriel Netto pelo amor com que sempre me receberam todas as vezes que precisei ficar em São Paulo, pelas valiosas conversas e contribuições para esta pesquisa.
Página | 5 Havia, na minha rua, uma casa pequena e branca. Durante dias, lá não vivia ninguém. Mas se a lua era cheia, a janela se abria como um livro. Um homem, com rosto de anjo, vestido de luar, debruçava na janela e pensava, em sossego sobre a cidade. Mais calado que o silêncio, o homem olhava e mais nos olhava. Todos da cidade tinham cuidado para não quebrar o seu silêncio. Ninguém soprava uma palavra.
Cochichavam que ele esperava os habitantes dormirem. Na noite alta, ele saía para visitar o sono de cada um. Entrava mansinho, mais leve que o gato, doce como o sereno, suave como o perfume, e virava um sonho diferente para cada uma das pessoas. Naquela noite, todos dormiriam com um breve sorriso na boca.
O prefeito sonhava em ser governador; o padre, em ser bispo; a professora, em ser diretora; o deputado, em ser senador; o soldado em ser tenente; a solteira, em ser casada; o padeiro, em ser engenheiro; a criança, em ser grande; o sem-teto, em ter casa. Todos queriam outra coisa. E para tudo precisava tempo. No dia seguinte, todos acordavam como eram antes e com vontade de continuar sonhando.
LOPES, Janete da Silva. Lugar de envelhecer: Narrativas de idosos
RESUMO
A Casa carrega diversos signos e significados que permeiam nosso imaginário e sobre os
quais temos pouca consciência. Reproduzida e naturalizada em nossa cultura toda a riqueza
simbólica deste lugar é destituída dos sujeitos institucionalizados. As indagações deste
trabalho referem-se a como inventamos socialmente este espaço denominado Casa e qual a
sua importância para os sujeitos que envelhecem. A partir da política de assistência social
levantamos as questões: o que essa política pública pode ofertar às pessoas idosas como
formas de acolhimento? e, Como superar a histórica e excludente institucionalização da
velhice possibilitando formas alternativas de moradia/acolhimento para idosos? Nossa
hipótese é a de que as instituições podem ofertar melhores condições de vida se cultivarem as
características deste lugar ancestral que é a Casa. Assim, o exercício antropológico proposto
neste trabalho utilizou a História Oral como método de pesquisa. Mergulhando no conceito de
colaboração, propusemos um trabalho participante onde sujeitos ativos – entrevistados e
entrevistador – se uniram com o propósito de produzir um resultado que demanda conivência
(Meihy & Ribeiro: 2011). Nossos colaboradores são pessoas, entre 61 e 86 anos de idade, que
vivem no Programa Vila Dignidade implantado no município de Itapeva, interior de São
Paulo. Elas narraram suas histórias tendo como tema central a Casa. A pesquisa evidenciou a
necessidade de ampliarmos os conceitos e as caracterizações para a concepção de novos
modelos de acolhimento institucional considerando-os o local privilegiado das relações, do
convívio e da transmissão dos valores socioculturais, a Casa por excelência. Olhando mais
atentamente para o Programa Vila Dignidade alguns obstáculos se apresentaram à sua
consolidação como politica pública. O primeiro deles se refere à confusão e estranhamento
gerado e perpetuado pelos profissionais da assistência social que, por vezes, o reduz apenas à
política de habitação, negando as interfaces que possa ter com a política de assistência social.
O segundo refere-se às amarrações entre estas politicas: foram mal tecidas, não criaram
consensos entre seus operadores, não fomentaram a consolidação de um serviço
socioassistencial para ser ofertado neste Programa, e tão pouco, previram a destinação de
recursos estaduais para o custeio das ações a serem desenvolvidas, onerando financeiramente
os municípios contemplados. Apesar das limitações apresentadas, o trabalho realizado revelou
a importância de propostas como esta na construção de novas possibilidades de morar na
velhice.
Página | 7 LOPES, Janete da Silva. Place of getting older. Elder Narratives
ABSTRACT
The House (Casa) has several signs and meanings that pervade our imaginary upon which we
have little conscience.
Naturalized and reproduced in our culture, all the symbolic richness from this place is devoid
of institutionalized persons. This work’s inquiries refer to how we socially devise this place
denominated House (Casa) and which is its importance for the elderly people.
Starting from social care policies we raise the following issues: what this public policies can
offer to elder people in terms of reception? And how to overcome the historic and excluding
institutionalization of old-aging, enabling alternative ways of housing and reception for elder
people? Our hypothesis is that institutions can offer better life conditions cultivating the
characteristics of this ancient place which is the House. This way, the anthropologic exercise
proposed by this work used Oral History as its main research method. Diving into the
collaboration method, we proposed an involving concept where active subjects -interviewees
and interviewer- join together aiming to produce a result that demands connivance (Meihy &
Ribeiro: 2011). Our collaborators are people between 61 and 86 years old living on the
“Programa Vila Dignidade” (Dignity Village Program) implemented on the Itapeva
municipality, interior of São Paulo state. They reported their stories being the House the key
issue. The research highlighted the necessity of extending the concepts and characterizations
for the conception of new models of institutional reception, being these considerated as a
privileged place for relationship, companionship and transmission of sociocultural values; the
House par excellence. Looking closer to the Programa Vila Dignidade some obstacles
appeared on its consolidation as a public policy. The first one of them refers to the confusion
and strangeness generated and perpetuated by the social care professionals that sometimes
reduce it to housing policy refusing possible interfaces with social care policies. The second
one refers to closed connections made between this policies: they were badly joint without
consensus between its operators, without any foster of a consolidation for a socio-assistencial
service to be offered in this Program, neither was previewed the destination of state resources
for the financing costs of the actions to be developed, financially burdening the related
municipalities. Despite the mentioned limitations, the work carried out revealed the
importance of proposals as this one for the construction of new possibilities of old-age living.
Sumário
Introdução ... 11
Capitulo I: A estrada que leva à Casa: caminhos metodológicos ... 16
1.1 Nas trilhas do conhecimento: o pesquisador na História dos outros ... 17
1.1.1 A História Oral na Pesquisa Antropológica ... 19
1.2 O Programa Vila Dignidade ... 30
1.3 O Trabalho de Campo ... 34
1.3.1 Antecedentes do Trabalho de Campo ... 34
1.3.2 Apresentando nosso campo: a Vila Dignidade de Itapeva ... 36
1.3.3 Conhecendo nossos Colaboradores ... 39
Capitulo II: Tempo de Rememorar: o lugar de estar nas narrativas de idosos ... 46
Dona Maria Aparecida Duffet ... 47
Seu Adelino Rocha ... 63
Seu Antonio de Paula Galvão ... 80
Dona Geni de Oliveira Lima ... 89
Seu Irineu Fonseca ... 96
Seu Abel Paulino dos Santos ... 105
Dona Zélia Aires dos Santos ... 112
Dona Maria Teresa da Rosa ... 116
Capitulo III: A Casa é onde quero estar: Lugar, Memória e Velhice ... 130
3.1 Saberes que se entrelaçam arquitetando as percepções da Casa ... 130
3.2 Tecendo narrativas de idosos ... 136
3.2.1 Possibilidades de morar edificadas pelo Trabalho ... 136
3.2.2 As seguranças do morar: a vida após a inclusão no Programa Vila Dignidade ... 145
3.2.3 A Casa é onde quero estar ... 155
3.3 Estado e Proteção Social: Breves considerações ... 161
3.3.1 A proteção à velhice na politica de assistência social ... 168
Considerações Finais ... 175
Página | 9 LISTA DE SIGLAS
ABA: Associação Brasileira de Antropologia
AVDs: Atividades de Vida Diária;
BPC: Beneficio de Prestação Continuada
CCI: Centro de Convivência para Idosos
CDHU: Companhia de Desenvolvimento Habitacional e Urbano;
CRAS: Centro de Referência da Assistência Social;
CREAS: Centro de Referência Especializado da Assistência Social;
DRADS: Diretoria Regional de Assistência e Desenvolvimento Social;
FEBEM: Fundação para o bem estar do menor;
FUNDAÇÃO CASA: Centro de Atendimento Socioeducativo ao adolescente;
ILPI: Instituição de Longa Permanência para Idosos;
IPEA: Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada;
MDS: Ministério do Desenvolvimento Social;
NOB: Norma Operacional Básica
OAB: Ordem dos Advogados do Brasil;
PNAS: Política Nacional de Assistência Social;
PNI: Politica Nacional do Idoso;
PSB: Proteção Social Básica;
PSE: Proteção Social Especial;
SEDS: Secretaria Estadual de Desenvolvimento Social;
SH: Secretaria de Habitação;
SUAS: Sistema Único de Assistência Social;
SUS: Sistema Único de Saúde;
UBS: Unidade Básica de Saúde;
LISTA DE FIGURAS
Figura 1: Condomínio Vila Dignidade Itapeva... 37
Figura 2: Projeto Arquitetônico - Vila Dignidade – Itapeva – S.P ... 38
Figura 3: Entrada das Residências... 39
Figura 4: Moradores da Vila Dignidade – Itapeva – S.P . ... 40
Figura 5: Alguns de nossos colaboradores... 46
Figura 6: Rede Socioassistencial – Proteção ao Idoso... 171
Página | 11
Introdução
Esta dissertação surge do desejo, forte e involuntário, que corre na veia e se apodera
das pessoas que não concebem teoria sem pratica e vice-versa. Sua gestação foi intensamente
marcada por esse desejo que em mim germinava inconsciente, desde a inclusão no mercado
de trabalho (2006).
O primeiro emprego foi na pratica, ou seja, na atenção direta ao usuário da política
pública. A chamada “atuação na ponta” teve como foco os adolescentes que cumpriam
medida socioeducativa na FEBEM, hoje Fundação CASA. Na “linha de frente” sentia na pele
todas as tensões e discrepâncias entre a formulação e a efetivação da política pública, pois
atuava no penhasco que separa as idéias do fazer.
Da “ponta” migrei, no final de 2008, para o “gabinete” da Secretaria Estadual de
Desenvolvimento Social– SEDS. Essa mudança de lugar representava sair da pratica para a
teoria ou, simbolicamente, da periferia para o centro – na gestão da política pública.
Este novo lugar me possibilitaria viver a coisa pública por outros ângulos e
representava não só a mudança de lado, mas a possibilidade de teorizar com os pés no chão, e
problematizar a histórica separação entre teoria e pratica. A consciência de que “na ponta”
estão profissionais ansiosos por apoio e respaldo teórico seria o mote para pensar e propor
processos mais colaborativos de construção das políticas públicas.
Chegando à nova Secretaria fui alocada no Plano Estadual para a Pessoa Idosa –
Futuridade, recém-lançado pelo governador do Estado. Seu propósito era articular as diversas
secretarias para a construção de políticas públicas direcionadas à população idosa. O
fomentador desta rede seria a SEDS onde o Plano foi constituído.
Desde o primeiro contato com o tema do envelhecimento me interessaram as questões
que se referem ao morar na velhice. Interesse que tem sua origem nas semelhanças, que
enxergo com tanta nitidez, entre uma unidade de internação (para adolescentes que praticaram
atos infracionais), hoje denominada Centro de Atendimento Socioeducativo, e uma Instituição
de Longa Permanência para Idoso, os antigos asilos de velhos que após longa reestruturação
de suas práticas são rebatizados como ILPI’s – equipamentos públicos que ofertam serviço de
Proteção Especial de Alta Complexidade1 a idosos com ruptura ou fragilidade nos vínculos
afetivos e/ou com vivência de abandono ou maus tratos. Semelhanças que atormentam, me
afetando profundamente.
1
Estas inquietações me levaram a estudar, no curso de especialização (2009-2011), a
institucionalização da velhice que, em sua essência, se move pelos mesmos preceitos que o
encarceramento da juventude pobre: surgimento de novas praticas de controle social após a
instalação da corte portuguesa no Rio de Janeiro.
Com o breve Trabalho de Conclusão de Curso encontrei algumas respostas para as
semelhanças que tanto me atormentam: é no contexto de urbanização das cidades brasileiras
que emerge a medicina social e se desenham as primeiras instituições totais2, lugar de
abrigamento dos diversos grupos de mendigos que perambulavam pelas ruas: doentes
psiquiátricos, crianças órfãs, inválidos, vadios e idosos (Groisman: In: Lopes: 2011).
Paralelo à especialização passei a acompanhar a implantação do Programa Vila
Dignidade em alguns municípios do Estado. Trata-se de uma das ações previstas no Plano
Futuridade, formulada pela Secretaria de Habitação e Companhia de Desenvolvimento
Habitacional e Urbano – CDHU em parceria com a Secretaria Estadual de Desenvolvimento
Social - SEDS.
A proposta deste Programa é oferecer aos municípios uma alternativa à
institucionalização de seus idosos. Assim, ao menos na teoria, não se reduz à oferta de
moradia, pois não se encerra na política habitacional, pretende, através da parceria com a
SEDS, garantir proteção aos idosos em suas diversas vulnerabilidades3.
Para viabilizar a acessibilidade, nos espaços internos e externos, a proposta
arquitetônica foi concebida a partir do Desenho Universal4. Já o suporte social, que deve
assegurar a proteção integral dos idosos atendidos, se dá pela articulação da política de
assistência social junto às demais políticas públicas no âmbito do município.
Este conjunto de ações, quando bem operadas, possibilitaria, às pessoas idosas, outra
possibilidade de morar além das instituições de longa permanência.
2
Uma instituição total pode ser definida como um local de residência e trabalho onde um grande número de indivíduos, com situação semelhante, separados da sociedade mais ampla, por considerável período de tempo, levam uma vida fechada e formalmente administrada. Goffman, E. Manicômios, prisões e conventos. São Paulo. Perspectiva. 1974; p.p 11.
3
As vulnerabilidades que devem ser consideradas não se referem apenas às sociais - decorrentes de riscos que expõem as pessoas à insegurança seja pela escassez de renda, incapacidade de prover o mínimo das necessidades humanas (alimentação, vestuário e abrigo) ou ruptura dos vínculos familiares – mas também no campo da saúde, às suscetibilidades das pessoas a problemas e danos de saúde.
4
Página | 13 Aparentemente inovador, desde o inicio, o Programa se depara com diversos
obstáculos que o impedem de consolidar-se como Política de Estado - emancipada dos vícios
de nossa cultura política que, intencionalmente, confunde Política Pública com Política
Partidária.
Um destes obstáculos se refere à confusão e estranhamento gerado e perpetuado pelos
profissionais da assistência social que, por vezes, entendem-no como política de habitação,
negando as interfaces que possa ter com a política de assistência social. Um pensar
fragmentado que, observado de perto, mostra-se fruto da pouca experiência dos profissionais
em pensar intersetorialmente e em promover articulações entre as políticas sociais.
Com tal argumento, esvaziado em sua fundamentação, justifica-se o não
responsabilizar-se sobre a operacionalização do Programa. Olhado mais atentamente deflagra
a carência por formação e atualização profissional - baseada nas novas perspectivas de
construção de políticas públicas - por parte de todo o corpo funcional das repartições,
incluindo aqueles que ocupam cargos de confiança e que normalmente são os que tomam
decisões.
Diante deste posicionamento de gestores da esfera estadual, tal responsabilidade recai
inteiramente sobre os gestores municipaisque,no fazer,identificam as demandas dos idosos e buscam as articulações necessárias.
Acompanhando a implantação do Programa Vila Dignidade percebi que, do lado de
cá, na atuação junto aos formuladores das políticas públicas, os desafios são de outra
dimensão e, qual a surpresa e falta de habilidade para lidar com os inúmeros interesses que
envolvem a sua elaboração (individuais, político-partidários e, raras vezes, coletivos).
São interesses que antecedem e, muitas vezes, prevalecem sobre as necessidades
daqueles a quem se destinam as ações do poder público, resultando em práticas não menos
confusas e imprecisas que, no extremo, colocam em xeque o empenho do Estado em dar
resposta às demandas sociais e inviabilizam as alternativas que só se consolidam pela
intersetorialidade.
Estas dificuldades, ainda longe de serem superadas nos processos de planejamento e
execução das políticas públicas, me inquietam e, diante da ausência de fóruns de discussão no
ambiente de trabalho, fermentaram a elaboração desta pesquisa me inserindo nos espaços da
universidade.
Constantemente questiono a dificuldade dos administradores e gestores públicos
como conceito norteador para as políticas de Proteção Especial5, e oferta do acolhimento em
suas diversas formas.
A Casa carrega diversos signos e significados que permeiam nosso imaginário e sobre
os quais temos pouca consciência. Reproduzidos e naturalizados em nossa cultura, toda essa
riqueza simbólica é destituída dos sujeitos institucionalizados: suas vidas são regulamentas
por formas de operacionalização do cotidiano, instituídas pelos gestores das instituições, sob
as quais pouco influem seus desejos e anseios.
Tais questões, somadas à subjetividade da pesquisadora, delimitaram nosso interesse
de pesquisa: investigar o que representa para os velhos ter/não ter Casa e quais seguranças6
são garantidas pela propriedade desse lugar/espaço.
Posto em outros termos: há quais inseguranças estão sujeitos os trabalhadores que,
após uma longa vida às margens do sistema produtivo, não desfrutaram da possibilidade de
ter seu próprio imóvel?
Falamos de pessoas que experimentam uma velhice assombrada pela faltada de
moradia e que, conseqüentemente, habitam locais em péssimas condições: quartinhos no
fundo do quintal de algum parente; porões mofados; casas insalubres escondidas nas áreas
mais periféricas das cidades; barracos em áreas de risco; etc.
Pessoas que, para disporem destes lugares, se sujeitam à especulação imobiliária, que
se apossa da maior parte de seus proventos, ou experimentam a humilhação de “viver de
favor” e, ou, de ter sua aposentadoria subtraída por parentes.
Pessoas para quem às fragilidades características da velhice7 se associam as
vulnerabilidades sociais decorrentes de toda uma vida de exclusão e, quando se torna
impossível administrar esse conjunto de inseguranças, terminam suas vidas abrigadas em
Instituições de Longa Permanência.
Pensando a partir da política de assistência social ecoa a questão: o que esta política
pode ofertar às pessoas idosas quando é chegado o momento da institucionalização? Ou;
5
A Proteção Social Especial é a modalidade de atendimento destinada a famílias e indivíduos que se encontram em situação de risco pessoal e social e divide-se entre serviços de Média Complexidade (oferecem atendimentos às famílias e indivíduos com seus direitos violados, mas cujos vínculos - familiar e comunitário - não foram rompidos) e de Alta Complexidade (garantem proteção integral – moradia, alimentação, higienização e trabalho protegido para famílias e indivíduos que se encontram sem referência, e, ou, em situação de ameaça, necessitando ser retirados de seu núcleo familiar e, ou, comunitário) PNAS: MDS: 2004.
6
Embasados no sociólogo francês, Robert Castel (2005), nos referimos às seguranças civis e sociais que, no estado moderno, são garantidas pela propriedade.
7
Página | 15 como superar a histórica e excludente institucionalização da velhice possibilitando formas
alternativas de moradia para as pessoas idosas que não dispõem de cuidados no âmbito de
suas famílias?
Viver num equipamento de acolhimento deve representar muito mais que o ato de
depositar um corpo velho num determinado espaço físico. O lugar de acolher deve ser um
lugar que promova a vida enquanto houver vida, que favoreça diariamente a construção de
laços afetivos e a descoberta de novas formas de se relacionar.
Então, nossa hipótese é a de que as instituições podem ofertar melhores condições de
vida às pessoas idosas se cultivarem as características deste lugar ancestral que é a Casa; se
tomarem-na como microcosmo das relações sociais, lugar real, com cenários idealizados onde
parte dos nossos sonhos são encenados e reproduzidos.
Assim, a questão que colore as indagações deste trabalho refere-se a como inventamos
socialmente este espaço denominado Casa e qual a importância dele para os sujeitos que
envelhecem.
O objetivo não é apontar a melhor forma de moradia pra idosos, longe disso, nossa
intenção é pensar sobre a importância da Casa na constituição dos sujeitos, como esse espaço
real e imaginado reproduz a sociedade e é representado na velhice.
Para tanto, nos utilizamos da História Oral, defendida pelo professor Sebe e praticada
no Núcleo de Estudos de História Oral da USP, como método desta pesquisa e, mergulhando
no conceito de colaboração, propusemos um trabalho participante onde sujeitos ativos –
entrevistados e entrevistador – se unem com o propósito de produzir um resultado que
demanda conivência (Meihy & Ribeiro: 2011).
Nossos colaboradores são pessoas entre 61 e 86 anos de idade – homens e mulheres
que vivem no Programa Vila Dignidade implantado no município de Itapeva, interior de São
Paulo - que nos narraram suas histórias tendo como tema central a Casa.
A escolha deste grupo se justifica pela própria configuração do programa que, ao criar
um lugar – físico e social – para pessoas com trajetórias de vida, por vezes, semelhantes,
dispõe de um conjunto de sujeitos que em razão de sua condição humana e de sua interação,
possui unidade argumentativa diante de uma problemática comum (ATAIDE: 2002), há uma
comunidade de destino.
Nas entrevistas realizadas utilizamos o gravador para serem arquivadas e trabalhadas
Assim, a gravação foi “apenas um momento do processo de elaboração da história oral”
(Meihy & Ribeiro: 2011).
A metodologia adotada é detalhada no primeiro capítulo do trabalho – A estrada que
leva a Casa: caminhos metodológicos. Aqui apresentamos ao leitor o local escolhido para a
realização do trabalho de campo, os números e características dos entrevistados, o processo de
aproximação junto aos nossos colaboradores, o questionário semi-estruturado utilizado para
nortear a pesquisadora e algumas indagações que surgiram em todos os momentos de
realização do trabalho.
No segundo capitulo, Tempo de Rememorar: o lugar de estar nas narrativas de
idosos, apresentamos oito das dez entrevistas realizadas em campo. Neste capitulo, seguindo
rigorosamente o protocolo do fazer da História Oral, os textos foram decantados do estado
oral para a linguagem escrita e devidamente legitimados pelos entrevistados.
As histórias narradas por nossos colaboradores são postas no centro da pesquisa e
fundamentam a reflexão proposta no terceiro e último capítulo, A Casa é onde quero estar:
Lugar, memória e velhice.
Em conjunto e tecidas, a partir da antropologia praticada por Geertz, estas narrativas
nos possibilitaram discorrer: sobre os imaginários do ser velho numa sociedade de consumo e
de ‘coisificação’ das relações humanas; sobre o trato dispensado pelo poder público aos
velhos mais empobrecidos; sobre os cuidados disponíveis e os desejados; sobre as percepções
acerca das velhas formas de institucionalização do curso de vida e, finalmente, sobre as
possibilidades de viver a velhice e de habitar o mundo.
Neste capítulo dedicamos espaço para o escrever do antropólogo que interpreta o
material - construído a partir do trabalho de campo - pensando o que é proteção, tema tão
recorrente em minha área de atuação profissional, a política de assistência social. Por fim,
propomos uma reflexão sobre como o Estado brasileiro, ao longo de seu processo de
formação, contempla os direitos sociais e a proteção – civil e social - de seus cidadãos.
Longe de encerrarmos qualquer discussão fica aberto o canal de debate para novas
proposições a partir de nossa incipiente reflexão.
Capitulo I: A estrada que leva à Casa: caminhos metodológicos
Página | 17
Espere alguma coisa mais linda que o mundo Maior do que o mar, mas pra que pensar se dá O desespero de esperar demais Pedro Pedreiro: Chico Buarque: 1966
Neste primeiro capitulo discutimos a metodologia que norteou a construção deste
trabalho, mas, fugindo de textos muito descritivos, buscamos um caminho alternativo para o
debate. Escolhemos abrir esta seção expondo ao leitor breve texto confeccionado a partir da
narrativa de um idoso.
Este texto foi produzido no curso A Comunidade e os Velhos, ofertado pelo Programa
de Pós Graduação em Gerontologia da PUC - S. P. Para encerrar a disciplina a professora, Drª
Elisabeth Mercadante, propôs um trabalho coletivo onde cada aluno deveria entrevistar um
idoso de sua rede de relacionamentos questionando-o sobre o lugar em que ele se sentia bem.
O painel de Integração intitulado Desafios da longevidade: moradia, comunidade e
lugar de pertencimento expôs as histórias de onze pessoas idosas, do circulo de
relacionamento dos alunos, entre elas: conhecidos, parentes próximos, vizinho de condomínio
e até pessoa em situação de rua. Uma destas histórias é a Pedro Pedreiro.
* * *
1.1 Nas trilhas do conhecimento: o pesquisador na História dos outros
Pedro - na vida real Antônio – é um dos muitos pernambucanos que sentiu na pele os
efeitos da seca do semiárido nordestino, de grandes proporções sociais e econômicas nos anos
50. A falta de perspectivas fez com que sua terra natal o abandonasse forçando-o a migrar
para o sul.
Pedro buscava “terra pra plantar, casa pra morar, mato verde pra olhar...”. Passou
pelo Mato Grosso, São Paulo e Paraná para, enfim, fincar suas raízes na metrópole paulistana.
Do campo para a cidade grande, a mudança o assustava. Na periferia da metrópole
Pedro e sua família se instalam. Ali encontra seu primeiro trabalho, muito diferente de todos
que já realizara: batia estacas para a construção de arranha-céus na cidade que crescia
desenfreada. Estático:
E a mulher de Pedro, esperando um filho pra esperar também Pedro Pedreiro: Chico Buarque: 1966
Numa casa pequena duas famílias – a de Pedro-Antônio e a de Pedro-cunhado -
juntavam forças pra suportar as dificuldades de viver na cidade grande; “foi um tempo difícil,
de muitas mudanças, casas improvisadas, impróprias, sem conforto e segurança para as
crianças, mas era o que a gente podia pagar”.
No movimento das cidades, de impelir os moradores mais pobres para as regiões mais
afastadas do centro, Pedro se juntou a outros trabalhadores sem teto, e ocupou terras, às
margens de um córrego, na zona norte da capital8.
Com a ajuda dos vizinhos, Pedro conseguiu erguer sua casa própria - um barraco, que
em tempos de arrocho salarial o livrou dos pesados aluguéis. Só assim foi possível “fazer um
pé de meia” pra comprar um terreno com escritura.
Do loteamento irregular Pedro partiu para mais longe, indo morar em um dos bairros
fronteiriços, destinado aos trabalhadores pobres. No extremo da cidade foi possível comprar
seu canto - neste bairro as terras valiam pouco, por conta de uma fábrica de cimento instalada
nos arredores.
Num lugar marcado pela ausência de políticas públicas coube ao movimento religioso
organizar e gerenciar as demandas sociais. Nos anos 80 a paróquia do bairro organizava os
trabalhadores em mutirão para a construção de casas, poços artesianos - que minimizavam a
ausência da Sabesp -, creche, e outros equipamentos públicos.
Militante nos movimentos religiosos, os domingos de Pedro eram especialmente
dedicados às obras e se transformavam em grande festa onde “as mulheres, desde a véspera,
preparavam os alimentos; os homens enchiam lajes e as crianças corriam por todo lado,
numa alegria só”.
Pedro sentia-se realizado. Conseguiu erguer sua casinha! A alegria aumentou quando
conquistou um emprego fixo e com carteira assinada - a oportunidade de trabalho veio em boa
hora, pois o terceiro filho de Pedro já estava a caminho...
Neste ritmo viveram os anos 80 “esperando o aumente; desde o ano passado para o
mês que vem...” (Chico Buarque) e quando chegam os 90 outra mudança radical... A
8
Página | 19 metalúrgica de Pedro será transferida para o interior. Neste momento, Pedro se vê diante de
duas alternativas: mudar com a família para o desconhecido ou perder o emprego, à beira da
aposentadoria.
Sem escolha é obrigado a seguir a empresa. A família, habituada e enraizada no bairro,
resiste, mas não há outra possibilidade. Os meninos de Pedro cresceram - o mais velho já é
pai; eles decidem ficar e manter seus empregos.
Pedro, a mulher e as duas filhas menores mudam-se num domingo quente e triste. O
processo de adaptação não foi fácil: em São Paulo, mesmo na periferia, vivia-se uma
efervescência e turbilhões de acontecimentos impossíveis de se imaginar no interior, além de
que, doía deixar pra trás os vínculos afetivos construídos ao longo dos anos...
No interior Pedro relembra as dificuldades de moradia vividas no passado, quando o
alto custo dos aluguéis lhe impunha mudanças constantes e, sempre para casas menos
confortáveis.
Ao se aposentar todos já estavam familiarizados com a nova cidade e já não pensavam
em retornar para a periferia da metrópole. Depois de algum tempo aposentado Pedro consegue
comprar sua casa, num bom bairro da cidade - conquista enfim a tão sonhada tranqüilidade.
A sensação que define o velho Pedro hoje é de “sossego e paz”. Relembra o passado
com garra, para ele “a vida é assim mesmo”. Sente-se vitorioso por ter tido uma vida honesta
e por dar aos filhos coisas que não teve - como educação.
Diz não ter mais sonhos, mas, afirma ainda desejar uma casa melhor: um terreno maior
com uma casa que planeje e acompanhe a construção, do inicio ao fim; onde possa plantar e
receber a grande família com mais conforto.
A vida de Pedro, hoje, pode ser resumida às idas, quase cotidianas, ao supermercado;
às tardes na praça e às constantes reformas em sua casa - que nunca se concluem. Pedro esta
sempre inventando algo para se (re)fazer.
No manuseio da pedra, areia, cimento, cal e outros artefatos, Pedro Pedreiro segue
inventando sua velhice... Quando questionado sobre o seu lugar no mundo é enfático: “gosto
da churrasqueira, pois é aqui que reúno os filhos, netos, genros, noras e amigos”.
Nossa intenção, desde a formulação do projeto de pesquisa era falar com velhos acerca
do envelhecer e das formas de viver a velhice e, a partir de seus relatos, refletir, de forma
sistemática - auxiliados por teóricos das áreas de gerontologia, antropologia e sociologia-,
sobre a velhice9 vivida sem os recursos garantidores de proteção e redes de segurança.
Neste ínterim, percebemos que as armadilhas impostas aos estudos sobre o
envelhecimento são muitas. No que nos compete, duas preocupações se fizeram latentes: o
endeusamento da velhice e seu extremo o “idadeismo depreciativo” (Hillman: 2001a).
O primeiro deriva das limitações de um pesquisador ainda distante deste momento da
vida: é possível a um jovem falar do desconhecido sem cair em idealizações? O segundo
deriva do vicio que herdamos das analises fisiológicas – nos impelem a olhar o
envelhecimento exclusivamente pela perspectiva biológica, focando apenas o colapso e
esgotamento das reservas do organismo (Hillman: 2001a).
Depararmos-nos com tais armadilhas seria algo natural já que nos propomos ao
dialogo com pessoas que enfrentaram diversas limitações ao longo do curso de vida;
sobreviveram na ausência do estado, muitas vezes sem acesso à educação, saúde, alimentação
adequada, trabalho digno, moradia, previdência social (C.F: 1988); e chegaram à velhice
desprovidas de capacidades que lhes assegurem, por seus próprios recursos, proteção contra
os riscos pessoais e sociais: doença, escassez de renda, ausência de familiares, fragilidades,
circunstâncias imprevisíveis, entre tantas outras.
Nossos colaboradores são pessoas com mais de 60 anos de idade que, pelas razões
elencadas foram incluídos no Programa Vila Dignidade, um Programa Estadual que se propõe
a ofertar moradia e proteção social a idosos em situação de vulnerabilidade.
Diante de contextos tão adversos o desafio foi encontrar a linha tênue que equilibrasse
estes extremos – cremos que ela se desenrola pela busca dos significados não aparentes da
velhice e pelo questionamento freqüente, do poder da manipulação biológica da vida.
Na tentativa de alcançá-la, os processos que envolveram este trabalho nasceram
compartilhados, afinal foi preciso nos aproximar para tocar as particularidades - olhar e ouvir
de perto -, e depois, nos afastarmos para pensar e teorizar a realidade apresentada.
Assim, as três etapas de apreensão do fenômeno social - Olhar, Ouvir e Escrever –
foram tematizadas e questionadas à luz das proposições do antropólogo Roberto Cardoso de
Oliveira (2000), pois, como bem nos apresenta:
9
Página | 21
[...] os atos de olhar e de ouvir são, a rigor, funções de um gênero de observação muito peculiar – isto é, peculiar à antropologia -, por meio da qual o pesquisador busca interpretar – ou compreender – a sociedade e a cultura do outro “de dentro”, de sua verdadeira interioridade.
Cardoso: 2000: 34
Parte vital deste Projeto de Pesquisa, o trabalho de campo, se faz no olhar e ouvir, e
para realizá-lo refletimos sobre as entrevista em pesquisas qualitativas na área da
antropologia.
Éramos conscientes de que o uso de entrevistas pelas diversas áreas - história,
jornalismo, sociologia, antropologia e tantas outras – sem o devido rigor metodológico
reproduzia generalizações, bem como, a banalização dessa técnica, colocando-a, por vezes,
em descrédito diante das demais técnicas de pesquisa.
Por outro lado, sabíamos que, quando conduzidas com o necessário rigor, poderiam
criar o cenário ideal onde uma verdadeira relação de co-labor-ação- ação de trabalhar junto10
- entre pesquisador e os sujeitos que irão narrar suas histórias, se desenrola.
Considerando tais questões sabíamos, desde o inicio, que alguns conceitos clássicos
das pesquisas em ciências humanas, como: objeto de estudo; informantes, depoimento,
neutralidade, racionalidade e objetividade seriam descartados deste trabalho.
Assim, em vez do pesquisador analista, que com rigor irá questionar os depoentes
(orientando-os na reconstrução de suas histórias) e controlar a veracidade das informações por
eles apresentadas, optamos por uma relação bem menos hierarquizante - a relação de
colaboração - e vimos na história oral praticada por Sebe, a liberdade e o rigor necessários
para o ver e ouvir da antropologia:
No caso da história oral, por acatar eticamente o interlocutor e colocá-lo como centro gerador de visões, por levá-lo em conta além de seu papel de “fornecedor de dados”, de “transmissor de informações. ou “testemunho”, valoriza-se o conceito de colaboração.
Sebe: 2011: 23
Assim, as entrevistas foram o meio criteriosamente escolhido para explorarmos os
temas desta pesquisa já que elas promovem o contato e a troca direta entre os sujeitos
envolvidos pois, como bem pontuou o professor, “é na entrevista que o pesquisador encontra
10
o “outro”, sujeito dono de sua história retraçada com lógica própria e submetida às
circunstâncias do tempo em que é realizada” (Sebe: 2011: 22).
As narrativas produzidas por nossos colaboradores são parte desse processo
colaborativo que se inicia no trabalho de campo. Foram captadas com o uso do gravador para,
posteriormente, serem transcriadas pelo pesquisador e, finalmente, retornar aos colaboradores
que legitimaram e autorizaram seu uso. O produto final dessa interação
pesquisador-colaborador resultou no próximo capitulo deste trabalho: Tempo de Rememorar: o lugar de
estar nas narrativas de idosos.
Pensando o processo de entrevistar e ser entrevistado, a fim de amadurecer nossa
escolha por este método de pesquisa, resolvemos exercitá-lo antes de irmos a campo.
Experiência que se mostrou muito mais difícil do que imaginávamos. Tornar público a nossa
vida, ainda que indiretamente, através da história de nossos pais, e as peripécias do destino,
não acontece com naturalidade; por vezes nos constrange e provoca uma intensa reflexão
sobre o vivido, capaz de tirar o sono...
A narrativa escolhida para abrir esta seção é o resultado desse exercício. Foi
confeccionada no curso A Comunidade e os Velhos e apesar de não ter sido realizada nos
moldes propostos pela História Oral, é utilizada aqui, não como ilustração da metodologia
mas apenas para apontarmos os desconfortos que afloram no momento de sua realização.
Um exercício extraordinário, pois, ao mesmo tempo em que a exposição da narrativa
ilustra o processo de entrevistar, e a própria formatação do tema pesquisado; ao exibir a
intimidade do pesquisador coloca-o em xeque com o método que tão cuidadosamente adotou
para consolidar seu trabalho. Viver este ciclo lhe antecipou algumas das sutilezas que
irromperiam no momento em que as entrevistas da pesquisa fossem realizadas.
Assim, entrevistar Pedro Pedreiro, que é Antônio Lopes das Chagas e é também o pai
da Janete foi imprescindível para que a pesquisadora, antes mesmo de se aproximar de seus
colaboradores, conhecesse-os previamente.
Certamente entrevistaria outros Pedros Pedreiro, pessoas que enfrentaram as mais
variadas infortunas em suas trajetórias individuais e que, ao contrário de seu pai Antônio, não
viram o suor do trabalho se transformar no sonho e na segurança da Casa própria. Pessoas a
quem o suor “não vira nada/Vale Nada/Vira Vento” (Karina Buhr: 2010: Vira Pó).
Por ser tão próxima do narrador foi possível perceber o constrangimento e receio em
falar de determinados assuntos, a inquietação e a vontade de por fim à entrevista que, por
Página | 23 Ter consciência dos incômodos causados nos fez pensar sobre o lugar, a situação e a
exposição a que iríamos submeter os sujeitos colaboradores desta pesquisa: as pessoas que
disponibilizaram suas narrativas de vida e percepções de moradia, para produzirmos o corpus
documental desta pesquisa, seriam desnudadas pelas inquietações do pesquisador.
Assim pudemos dimensionar e ter consciência da responsabilidade do pesquisador ao
pôr no centro de sua pesquisa a vida do Outro; e com isso, pensamos sobre o Respeito, pois
nos “parece tão fundamental para a nossa experiência das relações sociais e do self que
devemos definir com mais clareza o que ele é” (Sennett: 2004: 68), afinal, na vida social
“existe um enorme abismo entre esperar agir bem em relação aos outros e agir bem de fato”
(Sennett: 2004:78).
Tratar com respeito as necessidades do outro foi a preocupação central do primeiro
contato. Principalmente porque o tempo disponível para estar junto era reduzido, o que
impossibilitava a emergência de empatia e afetividade entre pesquisador e narrador.
Chamou nossa atenção o respeito dos idosos pelas nossas necessidades. Ainda que
individualmente não tivessem a dimensão do que seria o conjunto das narrativas, e como
serviriam à pesquisa, cada pessoa teve, com mais ou menos disponibilidade, paciência,
cuidado e preocupação em atender aos anseios da pesquisadora, dispondo-se integralmente ao
encontro.
Devolvemos o respeito recebido tentando uma aproximação que não fosse tão
invasiva. A privacidade de nossos colaboradores foi se expondo, ou não, de acordo com seus
desejos e vontade11. Da interação e respeito entre narrador/pesquisador emergiram as
histórias de vida - ao nos contar essas histórias, percepções e performances da realidade
nossos colaboradores nos autorizam a expor sentimentos acumulados no tempo, sofrimentos e
formas de dominação que jamais seriam expressas publicamente.
Cabe ao pesquisador a difícil tarefa de transpor para a linguagem escrita o que lhe foi
narrado, sem abrir mão da riqueza e singularidades do oral.Aqui e no momento posterior –
analise das narrativas - se encerra a terceira etapa de apreensão do fenômeno social –
Escrever. Para ilustrá-la, novamente nos reportamos à Oliveira:
Se o olhar e o ouvir constituem a nossa percepção da realidade focalizadas na pesquisa empírica, o escrever passa a ser parte quase indissociável do nosso
11
pensamento, uma vez que o ato de escrever é simultâneo ao ato de pensar. Quero chamar a atenção sobre isso, de modo a tornar claro que – pelo menos no meu modo de ver – é no processo de redação de um texto que o nosso pensamento caminha, encontrando soluções que dificilmente aparecerão antes da textualização dos dados provenientes da observação sistemática.
Oliveira: 2000: 32
Transpor para o texto escrito toda a riqueza da narrativa oral é tarefa complexa e cabe
ao pesquisador realizá-la. Acreditamos que na interpretação dessa polifonia de visões de
mundo reside forte potencial para a superação dos saberes compartimentados - quer da
biologia médica, da psicologia, da sociologia, da economia, da demografia e das outras áreas
que, em seus guetos, se dedicam ao estudo do envelhecimento.
Dai, colocarmos as histórias narradas no centro desta pesquisa: elas fundamentarão a
reflexão proposta e, em conjunto, nos possibilitarão discorrer sobre: os imaginários do ser
velho numa sociedade de consumo e ‘coisificação’ das relações humanas; o trato dispensado
pelo poder público aos velhos mais empobrecidos; os cuidados disponíveis e os desejados; as
percepções acerca das velhas formas de institucionalização do curso de vida; novas
possibilidades de viver a velhice e de habitar o mundo.
Nossas indagações mergulhavam na idéia de Casa e na importância deste lugar para as
pessoas velhas. A hipótese levantada neste trabalho é a de que ter a Casa, necessidade humana
fundamental, como primeiro espaço de acolhimento e proteção social, pode possibilitar novas
formas de atenção aos idosos fragilizados, quer por questões de saúde; renda precária ou
abandono.
Partindo desta hipótese, as narrativas tiveram na Casa o foco e o lugar desencadeador
das recordações. Assim, optamos pela história oral temática e o produto das entrevistas nos
esclareceu sobre o tema estudado. Nossos objetivos eram:
• Pensar sobre as percepções simbólicas dos idosos acerca dos lugares onde viveram/
vivem e a complexidade das relações estabelecidas com estes lugares;
• Analisar as formas como os entrevistados criam, recriam e mantêm vínculos
identitários com o lugar de moradia refletindo sobre a importância da Casa na
constituição destes sujeitos;
• Explorar as diversas percepções sobre envelhecer e onde viver na velhice;
Neste gênero de história oral, a atuação do entrevistador é evidente e a utilização de
Página | 25 procurados” (Sebe: 2011: 89). Então, pensamos num questionário semi estruturado que
serviria primeiro, à pesquisadora, que o utilizou como roteiro.
Nele, as questões não poderiam ser indutivas, muito diretas ou que fechassem o
assunto. Nosso propósito era estimular o narrador, possibilitando-lhe alçar vôos a partir das
questões apresentadas.
Este questionário teve como tema central a Casa e as relações estabelecidas a partir
deste lugar: com a família, o bairro, a cidade, o trabalho, as diversas fases da vida e, em
particular, com o momento presente e com a velhice12.
Assim, num primeiro momento foram exploradas questões que se relacionavam ao
passado mais distante cronologicamente: as diversas moradias onde o narrador viveu ao longo
de sua vida13.
Em seguida exploramos a relação Trabalho - Casa, no intuito de reconhecer como as
vicissitudes do destino se impuseram, impossibilitando a esse grupo de trabalhadores ter
garantido, pelo trabalho, o acesso à moradia própria e às proteções que ela garante.
Nosso questionário teve um bloco que se referia exclusivamente à nossa hipótese, aqui
ela pode ser “testada com insistência” (Sebe: 2011: 88), diluindo-se nas questões formuladas.
Exploramos exclusivamente o presente: onde e como as pessoas viviam até serem incluídas
no Programa; as mudanças vividas depois disso; a importância do morar e a vida neste novo
lugar.
Por fim, partindo do momento presente, questionamos sobre as percepções da velhice
e as perspectivas para o futuro. Desta forma nosso roteiro teve a seguinte estruturação:
Bloco I: A casa e as histórias de vida
1 – O que o srº/srª pode dizer sobre as casas onde viveu? Pode narrar sua trajetória por
esses lugares?
2- Qual delas é a mais importante na sua história e porque?
Bloco II: Relações de trabalho
1 - Pode nos falar sobre os trabalhos que executou ao longo da vida?
2 - De qual deles sente mais saudade?
3 - Realiza algum tipo de trabalho hoje?
12
Distinguimos o tempo presente da velhice, porque, nas narrativas em análise, aparecem como distintos. A velhice quase sempre é um devir, que todos esperam que esteja distante do momento presente.
13
Bloco III: Moradia e velhice: a vida depois da inclusão no Programa 1 - Depois de fazer sessenta anos onde e com quem viveu?
2 - Com eram essa casas?
3 - Como foi o processo de mudança para essa vila?
4 - O que ficou pra trás (amigos, parentes, animais de estimação, etc)
5 - Sua vida mudou muito depois de vir morar aqui?
6 - Como é viver aqui? Encontrou alguma dificuldade de adaptação?
7 - O que gostaria de ter aqui?
8 - Acha que ter vindo pra cá lhe trouxe algum beneficio? (saúde, sociabilidade,
segurança, tranqüilidade, etc)
9 - Como é o seu relacionamento com os vizinhos?
10 - Quem são seus familiares? Com quais deles se relaciona?
11 - Como era esse relacionamento antes de vir pra cá? Algo mudou?
12 - Sente falta de alguma coisa ou alguém?
Bloco IV: Percepções sobre envelhecer 1 – O srº/srª se considera velho?
2 – Como imagina(va) que vai (iria) envelhecer?
3 – Onde imagina (va) que vai (iria) morar na velhice? Como é este lugar?
4 – O que espera para o futuro?
5 – Alguma coisa lhe causa medo?
6 – Se pudesse voltar no tempo mudaria algo em sua história?
7 – O srº/ srª segue alguma religião? Sempre foi essa?
Neste roteiro o trabalho a ser realizado estava focado em três eixos centrais onde a Casa
assumia papel determinante: Casa e família; Casa e trabalho e Casa e velhice. A partir daí
exploraríamos as demais questões que permeiam a pesquisa.
Em campo percebemos que estes eixos não apresentam relações tão imbricadas como
supomos anteriormente. Com sua idealização nossa intenção era explorar as relações
familiares e os espaços de moradia, bem como, o trabalho e as casas que ele possibilitava ter.
Página | 27 propondo que a estruturação mais adequada deva ser por eixos independentes: Trabalho,
Casa, Família e Velhice.
A história oral foi utilizada como técnica investigativa das problemáticas que envolvem o
morar na velhice e as entrevistas compõem o núcleo documental da pesquisa apresentado no
próximo capítulo.
As entrevistas realizadas foram únicas e tiveram como suporte o roteiro apresentado
acima; estimulo que propiciou às pessoas narrar e ressaltar detalhes da sua história pessoal
tendo a Casa como eixo central de sua narrativa.
Realizadas as entrevistas iniciamos o processo de transposição da linguagem oral para
o documento escrito, processo de materialização das narrativas que são traduzidas da
linguagem oral para o texto escrito - que consiste em três etapas: transcrever, textualizar e
transcriar. Meihy e Ribeiro (2011) descrevem com rigor estas três fases.
Segundo estes autores a transcrição é trabalho longo e exaustivo, de grande
importância à construção e analise da documentação escrita, “é outro momento de interação
das subjetividades dos sujeitos envolvidos na pesquisa” (Meihy&Ribeiro: 2011: 107) e deve
ser valorizada.
Ao realizarmos essa etapa nos demos conta de nossa ignorância; das gafes cometidas;
da falta de jeito no trato com o outro, mas também, da riqueza que foi o contato com cada um
de nossos colaboradores.
Este é o momento em que o pesquisador, sozinho, pode ouvir quantas vezes sentir
necessidade, a entrevista. Os sentimentos que se fizeram presentes no momento da realização
emergem com a mesma força e, agora, distante do colaborador, é possível avaliá-los
calmamente e desfazer, refazer muitas das sensações vividas.
A segunda etapa, textualização, é o momento em que as perguntas são retiradas e
fundidas às narrativas. Aqui, “o exercício é o de aproximar os temas que foram abordados e
retomados em diferentes momentos” (Idem: 109), tendo por objetivo facilitar a leitura do
texto e possibilitar uma melhor compreensão do que o narrador expôs.
Por fim, a transcriação é a elaboração de um texto recriado em sua plenitude,
momento em que os elementos extra texto são incorporados (anotações do caderno de campo
e dos aspectos da vivência junto ao grupo). Como descrevem os autores: “trata-se da
transformação final do oral em escrita, recriando-se a performance da entrevista, procurando
O documento final obedeceu a acertos combinados com cada colaborador e foi
validado após conferência e assinatura do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido.
A razão de ser desta pesquisa é o conjunto das narrativas, corpus documental do
trabalho. Após exaustivo e instigante trabalho de produção destes textos – que resultaram no
próximo capítulo, cabe ao antropólogo no fazer especifico de sua área de atuação, interpretar
este material, construindo conexões e formas de cruzamentos entre si.
Este exercício materializou-se na confecção do último capitulo deste trabalho: A casa
é onde quero estar: Lugar, memória e velhice. Na idealização do Projeto de Pesquisa
pensávamos nos seguintes cruzamentos:
1. - o cruzamento entre si: as narrativas seriam alocadas, inicialmente, em três grupos:
Homens – Mulheres; Campo – Cidade; e Alfabetizados – Analfabetos onde seriam
analisados os pontos de semelhança e divergência em seu interior.
2. - relacionamento das narrativas com textos, inicialmente, da antropologia, sociologia e
gerontologia a fim de construir uma interpretação, com análises e reflexões
características de um trabalho acadêmico.
Na analise do conjunto das entrevistas nos demos conta de que não fazia sentido os três
blocos construídos à priore: Homens – Mulheres; Campo – Cidade; Alfabetizados –
Analfabetos, pois o grupo de idosos por nós pesquisado apresenta, nestes quesitos, muito mais
semelhanças que diferenças: independente de gênero a maior parte deles nasceram no campo
e, na vida adulta foram expulsos para a cidade e, com exceção de Seu Abel, todos possuem
baixa escolaridade (quando muito concluíram a 4ª série primária).
O cruzamento de gênero nos mostrou que entre os homens foi comum os deslocamentos
territoriais em busca de trabalho e a conexão com o mundo externo da rua. Enquanto que as
mulheres estiveram dedicadas aos cuidados com a família e conectadas com o mundo interno
da casa. Mesmo Dona Maria Rosa, única mulher que não se casou, e que esteve inserida no
mercado de trabalho formal – dedicou sua vida para cuidar da família de seus patrões. Este
cruzamento nos evidenciou ainda a ocorrência de divórcio entre os homens enquanto que,
entre as mulheres, o fenômeno mais marcante foi a viuvez.
Para além deste foi preciso encontrar outros pontos de intercepção das narrativas. A
identificação destes pontos se deu num processo lento e cuidadoso de analise individual de
Página | 29 Neste processo percebemos que os discursos convergiam para pontos comuns e então,
começou-se a desenhar uma teia que, como num jogo de quebra cabeça, as peças vão se
encaixando pela complementaridade. Estes pontos de encontro foram se evidenciando aos
poucos e, ao final da analise individual das entrevistas, foram elencados.
O grande tema, ou ponto de conexão do conjunto das entrevistas individuais foi o
Trabalho – é através dele que nossos colaboradores se inserem e se reconhecem no mundo.
Sua importância é tamanha que, involuntariamente, ocupou o lugar que nós, pesquisadores,
havíamos designado para a Casa – que acabou se revelando como segundo ponto de
convergência.
Ela deriva do Trabalho, embora a relação direta entre Trabalho e Casa não seja percebida
de forma tão consciente por nossos colaboradores. No conjunto, as narrativas mostraram que
os idosos não reconhecem a moradia como direito social. A impossibilidade de adquirir um
imóvel é não é associada às péssimas condições de trabalho, com baixos salários, agregada à
escassez de políticas de acesso à moradia de interesse social; individualmente estes idosos
acreditam que não conseguiram adquirir um imóvel por falta de sorte, por acaso da vida ou
por não ser a hora certa.
Outros três pontos de convergência se evidenciaram: Passado; Presente; Percepções da
velhice. Assim, ao todo identificamos cinco zonas de convergência das narrativas dos idosos:
Trabalho, Casa, Passado, Presente e Percepções da velhice.
A interpretação por nós proposta tentou conectar estes grandes temas cruzando-os com
outras fontes documentais, utilizando-se das teorias antropológica e sociológica, bem como da
musica e da literatura.
Em todo o processo do fazer desta pesquisa o computador foi intensamente utilizado e
a internet totalmente incorporada: além do uso freqüente para organização, análise estatística
dos dados e construção de diário de campo, o computador foi, para nós, valiosa fonte de
pesquisa.
Conectados todo o tempo na internet mantivemos contato virtual com nossos
colaboradores e, através da rede online, os mesmos puderam acompanhar e participar do
processo de consolidação das narrativas até a chegada ao texto final.
O acesso à rede virtual de computadores nos possibilitou navegar pelas páginas dos
idosos que utilizam o Facebook complementando e enriquecendo os textos finais com dados
que não foram expostos, ou satisfatoriamente abordados no momento das entrevistas, bem
Muitas informações sobre o Programa Vila Dignidade: textos, entrevistas, eventos
realizados no condomínio, fotografias, comunicação institucional dos governos do estado e
prefeitura municipal de Itapeva, foram postadas na rede mundial de computadores e
capturadas pela pesquisadora em pesquisas rápidas nas ferramentas de busca disponíveis.
Pela internet soubemos da repercussão do Programa à época de seu lançamento, bem
como, da intensa exposição das imagens e histórias de vida dos seus moradores.
Além dessa relação direta com os colaboradores, a internet também facilitou o
desenvolvimento da pesquisa ao possibilitar o contato quase instantâneo com diversas bases
de dados que armazenam artigos e teses acadêmicas e o acesso, em poucos clicks, a uma
variedade incrível de abordagens sobre os temas que se entrelaçam em nossa pesquisa.
Com todos esses recursos fomos traçando os caminhos que nos levaram à Casa, ou
seja, a metodologia que fez nascer nossa pesquisa. Adiante podemos avançar na descrição das
demais etapas de construção deste trabalho: apresentação do local de pesquisa; aproximação
junto aos colaboradores e o trabalho de campo. Cada um desses momentos é descrito adiante.
1.2 O Programa Vila Dignidade
A necessidade de proporcionar outras formas de acolhimento, alternativas às
Instituições de Longa Permanência, ao idoso vulnerável é uma das justificativas que
fundamentam o Programa Vila Dignidade14. Ele foi pensado para atender as demandas de
municípios que acabam institucionalizando idosos independentes para a realização das
Atividades de Vida Diária -AVD.
Elaborado em 2009, pelo governo do estado de São Paulo, através de parceria
intersecretarial que envolvia principalmente as Secretarias de Habitação e de Assistência
Social,este Programacompunha as ações do Plano Estadual para a pessoa idosa, denominado
Futuridade15.
14
Este texto foi construído a partir de informações extraídas de material institucional das Secretarias de Habitação e Desenvolvimento Social e matérias disponíveis nos sites de ambas: www.habitacao.sp.gov.br e
www.desenvolvimentosocial.sp.gov.br. Registro meu agradecimento à Mariana de Sylos Rudge, funcionária da CDHU com quem mantive contato constante durante a produção desta pesquisa, pela disponibilidade com que sempre atendeu nossas demandas por esclarecimentos, bem como, por suas valiosas reflexões.
15