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As violações aos direitos e garantias fundamentais durante a ditadura militar

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Academic year: 2021

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UNIJUÍ – UNIVERSIDADE REGIONAL DO NOROESTE DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL

Departamento de Economia e Contabilidade Departamento de Estudos Agrários Departamento de Estudos da Administração

Departamento de Estudos Jurídicos

LUCAS GOULART DA SILVA

AS VIOLAÇÕES AOS DIREITOS E GARANTIAS FUNDAMENTAIS DURANTE A DITADURA MILITAR

Ijuí (RS) 2012

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LUCAS GOULART DA SILVA

AS VIOLAÇÕES AOS DIREITOS E GARANTIAS FUNDAMENTAIS DURANTE A DITADURA MILITAR

Dissertação apresentada ao Curso de

Pós-Graduação Strictu Sensu em

Desenvolvimento, Área de Concentração: Direito, Cidadania e Desenvolvimento, da Universidade Regional do Noroeste do Estado do Rio Grande do Sul – UNIJUÍ, como requisito parcial à obtenção do título de Mestre.

Orientador: Prof. Dr. Doglas Cesar Lucas

Ijuí (RS) 2012

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S586v Silva, Lucas Goulart da.

As violações aos direitos e garantias fundamentais durante a ditadura militar / Lucas Goulart da Silva. – Ijuí, 2012. –

119 f. ; 29 cm.

Dissertação (mestrado) – Universidade Regional do Noroeste do Estado do Rio Grande do Sul (Campus Ijuí). Desenvolvimento.

“Orientador: Doglas Cesar Lucas”.

1. Ditadura militar. 2. Violação dos direitos. 3. Garantias fundamentais. I. Lucas, Doglas Cesar. II. Título.

CDU: 321.64 342.1

Catalogação na Publicação

Tania Maria Kalaitzis Lima CRB 10/ 1561

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UNIJUÍ - Universidade Regional do Noroeste do Estado do Rio Grande do Sul Programa de Pós-Graduação em Desenvolvimento – Mestrado

A Banca Examinadora, abaixo assinada, aprova a Dissertação

AS VIOLAÇÕES AOS DIREITOS E GARANTIAS FUNDAMENTAIS DURANTE A DITADURA MILITAR

elaborada por

LUCAS GO ULART DA S ILVA

como requisito parcial para a obtenção do grau de Mestre em Desenvolvimento

Banca Examinadora:

Prof. Dr. Doglas Cesar Lucas (UNIJUÍ): __________________________________________

Prof. Dr. Adalberto Narciso Hommerding (URI): ___________________________________

Prof. Dr. Gilmar Antonio Bedin (UNIJUÍ): ________________________________________

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AGRADECIMENTOS

A criação de uma dissertação de mestrado jamais ocorre de forma individual, o autor conta sempre com a ajuda de pessoas próximas e comprometidas com esse objetivo.

Por isso, agradeço aos meus pais, Veneza e Antonio, sempre dispostos a financiar a realização dos meus sonhos.

Agradeço o apoio incondicional da minha esposa Karla Schwerz, que ao meu lado decide pelo nosso futuro.

À professora Dra. Luciene Dal Ri, responsável por despertar o meu interesse em pesquisar sobre a ditadura militar.

Ao professor Dr. Doglas Cesar Lucas, que mesmo à distância sempre esteve a minha disposição.

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“Isso tudo acontecendo e eu aqui na praça dando milho aos pombos” (Zé Geraldo).

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A presente dissertação tem como objetivo abordar a gênese e a evolução histórica dos direitos fundamentais, as conquistas e retrocessos ao longo dos tempos e a inserção destes direitos perante a Constituição Federal de 1988. De forma crítica serão estudadas as violações aos direitos e garantias fundamentais durante a ditadura militar de 1964 a 1985. Serão analisados os principais Atos Institucionais, dando-se ênfase ao AI-1, AI-2 e AI-5, meios utilizados pelos militares na implantação e manutenção do poder vigente. Comparativamente serão abordados os tratamentos dados por outros países sul-americanos aos envolvidos com suas respecitvas ditaduras militares, estabelecendo-se um paralelo com a tentativa brasileira de revisão da Lei de Anistia através da Arguição de Descumprimento de Preceito Fundametal nº 153. Ação judicial proposta pelo Conselho Nacional da OAB e negada pelo Supremo Tribunal Federal, que reafirmou a validade da lei. Será analisada a condenação sofrida pelo Brasil no caso Gomes Lund vs. Brasil, perante a Corte Interamericana de Direitos Humanos, na qual o Estado brasileiro restou obrigado a reparar os danos causados às vítimas pelas atrocidades cometidas durante a Guerrilha do Araguaia.

Palavras-chave: Direitos e Garantias Fundamentais. Violação de Direitos. Ditadura Militar.

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ABSTRACT

This dissertation aims to address the genesis and historical evolution of fundamental rights, achievements and setbacks over the years and the inclusion of these rights under the Constitution of 1988. Will be critically studied violations of fundamental rights and guarantees during the military dictatorship from 1964 to 1985. We will analyze the principal institutional acts, giving emphasis to the AI-1, AI-2 and AI-5, the means used by the military in establishing and maintaining in power. Comparison will consider the treatment given by other South American countries to those involved in their respecitvas military dictatorships, establishing a parallel with the Brazilian attempt to revise the Amnesty Law by invoking a Violation of Precept Fundametal nº 153. Legal action filed by the National Council of the Bar Association and denied by the Supreme Court, which reaffirmed the validity of the law. Consideration will be given the sentence in the case suffered by Brazil vs Gomes Lund. Brazil, before the Inter-American Court of Human Rights, in which the Brazilian government remains obligated to repair the damage caused to the victims for atrocities committed during the Araguaia guerrilla movement.

Keywords: Fundamental Rights and Guarantees. Violation of Rights. Military Dictatorship.

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO ... 8

1 DIREITOS FUNDAMENTAIS: aspectos conceituais ... 12

1.1 Gênese e evolução histórica ... 14

1.2 Classificação dos direitos fundamentais ... 25

1.2.1 Direitos fundamentais de primeira geração ... 26

1.2.2 Direitos fundamentais de segunda geração ... 28

1.2.3 Direitos fundamentais de terceira geração ... 30

1.2.4 Direitos fundamentais de quarta geração ... 32

1.3 Os direitos fundamentais e a Constituição Federal de 1988 ... 33

2 A DITADURA MILITAR E OS DIREITOS E GARANTIAS FUNDAMENTAIS ... 37

2.1 O contexto histórico que precedeu a ditadura militar ... 38

2.2 As Constituições Federais que vigoraram durante a ditadura militar ... 49

2.2.1 A Constituição Federal de 1946 ... 49

2.2.2 A Constituição Federal de 1967 e a Emenda Constitucional nº 1 de 1969 ... 54

2.3 Os Atos Institucionais e a autoconcessão de poder ... 58

2.3.1 O Ato Institucional nº 1 e as condições para impor o novo regime ... 59

2.3.2 O Ato Institucional nº 2 e o fim da Constituição Federal de 1946 ... 65

2.3.3 O Ato Institucional nº 5 e a consolidação de uma ditadura ... 68

2.4 As principais violações aos direitos fundamentais durante a ditadura militar ... 75

3 OS REFLEXOS DAS VIOLAÇÕES AOS DIREITOS E GARANTIAS FUNDAMENTAIS DURANTE A DITADURA MILITAR ... 78

3.1 A abertura política e a Lei de Anistia (Lei nº 6.683/79)... 82

3.2 A tentativa de revisão da Lei de Anistia através da ação de Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental nº 153 ... 94

3.3 A condenação do Brasil perante a Corte Interamericana de Direitos Humanos ... 100

3.4 A criação da Comissão da Verdade e a Lei de Acesso à Informação ... 107

CONCLUSÃO ... 110

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INTRODUÇÃO

A evolução dos direitos fundamentais, cujo nascimento se deu na Antiguidade, culminou na elaboração da Declaração Universal dos Direitos Humanos (1948), em âmbito americano na Convenção Americana de Direitos Humanos (1969) e no Brasil na Constituição Federal de 1988. Influenciadas por declarações históricas de direitos, apresentam neste princípio de século problemas que questionam a efetividade de suas normas.

Como país membro da Organização das Nações Unidas (ONU) e da Organização dos Estados Americanos (OEA), o Brasil compromete-se a cumprir as normas estabelecidas, distanciando-se gradativamente dos períodos de violações de direitos iniciados principalmente com o golpe militar de 1964.

Oriunda do temor socialista que dividia o mundo do pós Segunda Guerra Mundial, a ditadura militar teve início no golpe/revolução militar que culminou na deposição em 1964, do Presidente João Goulart. Apoiados pelos Estados Unidos e por parcelas da sociedade civil, os militares tomaram o poder e elegeram o primeiro presidente do regime militar, o General Humberto Alencar Castelo Branco.

A involução democrática iniciada nesse período culminou na edição de dezessete Atos Institucionais, decretos que possibilitaram as mais diversas violações aos direitos e garantias fundamentais estabelecidos pela Constituição Federal de 1946 então em vigor. Alternaram-se no poder outros quatro presidentes militares, responsáveis pela revogação da Constituição Federal de 1946 e a outorgação da Constituição Federal de 1967.

Considerada um dos maiores retrocessos da história política do país, suprimiu muitos direitos fundamentais, como a liberdade de publicação de livros e periódicos, restrição ao direito de reunião e criou a pena de suspensão dos direitos políticos. Sofreu forte influência da “Guerra Fria”, que no contexto internacional pregava a “teoria da segurança nacional”, combatia os inimigos internos rotulados de subversivos, no caso, os opositores de esquerda.

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A decretação por parte dos ministros militares da Emenda Complementar nº 01 praticamente outorgou uma nova Constituição Federal em 1969. Conforme César Caldeira e Marcos Arruda, “intensificou a concentração de poder no Executivo dominado pelo Exército e, junto com o AI-12, permitiu a substituição do presidente por uma Junta Militar, apesar de existir o vice-presidente (na época, Pedro Aleixo)” (1986, p. 40).

Já no fim do década de 70, sob o governo de João Figueiredo, diante da pressão exercida pela sociedade civil e também por militares contrários à manutenção da ditadura, iniciou-se o processo de redemocratização do país. Neste cenário foi promulgada a Lei nº 6.693/79, popularmente conhecida por Lei de Anistia, que tinha o objetivo de preparar a sociedade do pós-ditadura militar e anistiar exilados e presos políticos, bem como todos os brasileiros que cometeram crimes políticos ou conexos com estes, favorecendo assim os militares e seus agentes.

Porém, a controvérsia causada pela interpretação ampla da Lei motivou a interposição da ação de Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF), ajuizada pelo Conselho Federal da OAB perante o Supremo Tribunal Federal. Ferramenta jurídica trazida pela Constituição Federal de 1988 que visa evitar ou reparar lesão a preceito fundamental resultante de ato do Poder Público (União, Estados, Distrito Federal e Municípios), incluídos atos anteriores à promulgação da própria Constituição.

No entanto, o Supremo Tribunal Federal, em 29 de abril de 2010, decidiu pela improcedência da demanda (ADPF nº 153), negando a possibilidade de revisão da questionada Lei de Anistia, que, segundo Fábio Konder Comparatto, tinha por objetivo “recuperar a honorabilidade das Forças Armadas, após os atos de arbitrariedade – terrorismo, sequestro, assalto, tortura e atentado pessoal – praticados por integrantes da corporação contra opositores do regime militar” (2010).

Na prática, a procedência da demanda possibilitaria a investigação por abusos cometidos durante os “anos de chumbo”, punindo os envolvidos pelos crimes cometidos e não responsabilizados. Possibilidade que gera revolta no meio militar brasileiro, que se julga amparado pelo direito anteriormente adquirido.

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Internacionalmente a busca pela reparação dos danos decorrentes de ditaduras militares, principalmente em âmbito americano, tem ocorrido de forma mais incisiva. Neste sentido a Corte Interamericana de Direitos Humanos, órgão integrante da Convenção Americana de Direitos Humanos, já proferiu cinco acórdãos contra diferentes países considerando inválidas suas leis de autoanistia. Nessa situação encontra-se o Brasil, que, em 24 de novembro de 2010, teve julgado contra si demanda referente às atrocidades cometidas durante a Guerrilha do Araguaia (Caso Gomes Lund e Outros vs. Brasil). Evento ocorrido às margens do Rio Araguaia entre os anos de 1972 e 1975, onde cerca de 70 guerrilheiros opositores ao regime, membros do Partido Comunista do Brasil e camponeses da região, foram torturados e assassinados, sendo que vários corpos jamais foram localizados.

Os argumentos defensivos não foram aceitos, ocasionando a condenação de forma unânime do Brasil pelo desaparecimento forçado e, portanto, pela violação dos direitos ao reconhecimento da personalidade jurídica, à vida, à integridade pessoal, à liberdade pessoal e à liberdade de pensamento. Entenderam os juízes da Corte que o Estado brasileiro descumpriu a obrigação de adequar seu direito interno à Convenção Americana de Direitos Humanos, incluindo neste item a controversa Lei de Anistia. De forma conclusiva, entenderam os julgadores que as medidas adotadas pelo Brasil, como a Lei de Anistia e a política de indenizações e benefícios, não se constituíram em uma "reparação suficiente" às violações de direitos alegadas pelas vítimas e seus familiares.

Destacaram ainda que a intervenção ocorrida no Brasil produziu eficácia em países vizinhos, que revisaram suas leis de autoanista e puniram seus agentes que abusaram do poder durante suas ditaduras militares. Entendem os julgadores que essa condenação repercutirá na evolução democrática do país, solidificando a cultura de respeito aos direitos humanos fundamentais.

Para tanto, no primeiro capítulo deste trabalho serão abordadas questões referentes à gênese e à evolução histórica dos direitos fundamentais, as conquistas e retrocessos ao longo do tempo, as revoltas e revoluções que contribuíram na consolidação de direitos. Após a análise histórica serão estudadas as classificações dos direitos fundamentais e a sua inserção perante a Constituição Federal de 1988.

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O segundo capítulo destinar-se-á ao estudo dos retrocessos aos direitos fundamentais ocorridos a partir do golpe militar de 1964, o contexto histórico que precedeu a tomada do poder pelos ditadores militares. Cronologicamente serão analisadas as Constituições Federais que vigoraram durante o período de exceção, além das violações aos direitos fundamentais proporcionadas pelos Atos Institucionais editados pelos governos militares.

Por fim, o último capítulo tem como objeto a abordagem dos reflexos que o fim da ditadura militar proporcionou ao Brasil, culminando na tentativa de revisão da Lei da Anistia e na condenação do Estado brasileiro perante a Corte Interamericana de Direitos Humanos. Serão analisadas as recentes criações da Comissão da Verdade e a Lei de Acesso à Informação, imposições que o Estado brasileiro deverá adotar para a consolidação de sua democracia.

Nesta pesquisa adotar-se-á o método indutivo, o qual possibilita o desenvolvimento de enunciados gerais sobre observações acumuladas de casos específicos ou proposições que possam ter validades universais. Do ponto de vista dos procedimentos técnicos trata-se de uma pesquisa de documentação indireta, especificamente bibliográfica, elaborada a partir da literatura já publicada sobre o tema.

Os métodos de procedimentos adotados são o histórico e o comparativo. O primeiro consiste na investigação dos acontecimentos, processos e instituições do passado, para verificar a sua influência na sociedade de hoje. O segundo realiza comparações com a finalidade de verificar semelhanças e explicar divergências. É um método usado para comparações de grupos no presente e no passado, entre sociedades de iguais ou diferentes estágios de desenvolvimento.

1 DIREITOS FUNDAMENTAIS: aspectos conceituais

Os direitos fundamentais são considerados um dos pilares de sustentação do Estado Democrático de Direito. Ao lado dos princípios da legalidade e da separação dos poderes, formam a proteção constitucional do indivíduo contra os abusos de poder por parte do Estado.

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Apesar da vasta produção teórica, as definições convergem no sentido de proteção da dignidade da pessoa humana, destacando-se o conceito proferido por José Afonso da Silva, o qual afirma serem os direitos fundamentais “aquelas prerrogativas e instituições que o Direito Positivo concretiza em garantias de uma convivência digna, livre e igual de todas as pessoas” (2003, p. 562).

Na respeitada opinião do jurista português José Joaquim Gomes Canotilho:

Os direitos fundamentais cumprem a função de direitos de defesa dos cidadãos sob dupla perspectiva: (1) constituem, num plano jurídico-objetivo, normas de competência negativa para os poderes públicos, proibindo fundamentalmente as ingerências destes na esfera jurídica individual; (2) implicam, num plano jurídico-subjectivo, o poder de exercer positivamente direitos fundamentais (liberdade positiva) e de exigir omissões dos poderes públicos, de forma a evitar agressões lesivas por parte dos mesmos (liberdade negativa) (1995, p. 507).

Embora uníssona na definição do conceito, a doutrina ainda busca o consenso para a nomenclatura adotada quando se refere a esta categoria de direitos. A utilização de expressões como “direitos individuais”, “liberdades públicas”, “direitos naturais”, “direitos civis”, vem sendo rechaçada progressivamente, restando aceita, conforme opinião de Ingo Wolfgang Sarlet, apenas a dicotomia entre os termos “direitos fundamentais” e “direitos humanos”, por se referirem aos mesmos direitos, porém, inseridos em contextos jurídicos diversos.

Em que pese sejam ambos os termos (“direitos humanos” e “direitos fundamentais”) comumente utilizados como sinônimos, a explicação corriqueira e, diga-se de passagem, procedente para a distinção é de que o termo “direitos fundamentais” se aplica para aqueles direitos do ser humano reconhecidos e positivados na esfera do direito constitucional positivo de determinado Estado, ao passo que a expressão “direitos humanos” guardaria relação com os documentos de direitos internacional, por referir-se àquelas posições jurídicas que referir-se reconhecem ao referir-ser humano como tal, independentemente de sua vinculação com determinada ordem constitucional, e que, portanto, aspiram à validade universal, para todos os povos e tempos, de tal sorte que revelam um inequívoco caráter supranacional (internacional) (2010, p. 29).

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Com a teoria de “direitos humanos internacionais” e “direitos fundamentais constitucionais” concorda Helenice Braun. Porém, defende a expressão “direitos humanos fundamentais”. Destaca a ideia de que as expressões “direitos humanos” e “direitos fundamentais” não são excludentes uma da outra, mas expressões que dão a ideia de interação, isto é, que se inter-relacionam (2001, p. 98).

Essa formatação contrapõe o conceito de Canotilho, para quem as expressões “direitos do homem” e “direitos fundamentais”, apesar de utilizados como sinônimos, por sua origem e significado podem ser distinguidos da seguinte forma:

[...] direitos do homem são direitos válidos para todos os povos e em todos os tempos (dimensão jusnaturalista-universalista); direitos fundamentais são os direitos do homem, jurídico-institucionalmente garantidos e limitados espaço-temporalmente. Os direitos do homem arrancariam da própria natureza humana e daí o seu caráter inviolável, intemporal e universal; os direitos fundamentais seriam os direitos objetivamente vigentes numa ordem jurídica concreta (1995, p. 505).

Segundo o jurista português, além da existência de direitos fundamentais formalmente constitucionais, há direitos fundamentais inseridos em leis e regras aplicáveis de direito internacional, e, por isso, considerados direitos materialmente fundamentais. Reforçando sua teoria que extrapola a dicotomia entre direitos fundamentais constitucionais e direitos humanos internacionais.

Contrapondo essas teorias e conjugações, destaca-se a opinião de Raimundo Panikkar, teórico indu, que afirma serem os Direitos Humanos apenas um conceito ocidental, negando seu caráter de universalidade. Esta teoria não nega a existência de uma natureza humana universal, embora esta natureza não seja totalmente específica e distinta da natureza dos demais seres vivos (1983).

A própria Constituição Federal de 1988 utilizou diferentes expressões ao se referir aos direitos fundamentais, contribuindo para a não resolução das divergências.

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Exemplo dessa heterogeneidade está na própria Constituição brasileira de 1988, que utiliza diversos termos ao tratar dos direitos fundamentais, tais como: direitos humanos no artigo 4º, inciso III, direitos e garantias fundamentais na epígrafe do Título II e artigo 5º, inciso LXXI, e direitos e garantias individuais, no artigo 60, § 4º, inciso IV, do seu texto constitucional (BRAUN, 2001, p. 97).

Independentemente das expressões utilizadas pela doutrina, a proteção aos direitos fundamentais e aos direitos humanos ganhou relevância no pós Segunda Guerra Mundial e mais recentemente após a ditadura militar de 1964, períodos marcados por constantes violações desses direitos, o que estimulou a criação e o aperfeiçoamento desses meios de proteção social.

1.1 Gênese e evolução histórica

A difícil tarefa de determinar a origem precisa dos direitos fundamentais explica a dissonância entre os conceitos. Porém, parte da doutrina concorda que as primeiras declarações de direitos surgiram durante a Idade Antiga, período entre os anos 4.000 a.C e 476 d.C. Consideram esses pesquisadores que até o fim da Pré-História a humanidade não havia evoluído o suficiente para respeitar normas previamente estabelecidas, tampouco criá-las, vivendo ainda de forma nômade e pelas atividades de caça e de coleta, respeitando tão somente a “lei do mais forte.”

Porém, a teoria jusnaturalista, atribuída a Aristóteles, questiona essas origens, julgando haver leis eternas, superiores às normas positivadas, dentre as quais, as primeiras declarações de direitos escritas da humanidade. Conforme afirma Ricardo Castilho:

Já na Roma Antiga, Cícero, no seu livro Da república, formulava a doutrina do direito natural, segundo a qual existem leis estabelecidas pelos deuses e que se antepunham à vontade dos governantes. Assim o direito natural seria eterno, imutável, superior e mais válido do que o direito positivo de natureza política (2010, p. 19).

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Ingo Wolfgang Sarlet ressalta a difícil constatação teórica acerca do surgimento dos direitos fundamentais, comparando a influência exercida pelas teorias do Direito Natural na positivação de direitos na Idade Antiga:

Ainda que consagrada a concepção de que não foi na antiguidade que surgiram os primeiros direitos fundamentais, não menos verdadeira é a constatação de que o mundo antigo, por meio da religião e da filosofia, legou-nos algumas das idéias-chaves que, posteriormente, vieram a influenciar diretamente o pensamento jusnaturalista e a sua concepção de que o ser humano, pelo simples fato de existir, é titular de alguns direitos naturais inalienáveis, de tal sorte que esta fase costuma também ser denominada, consoante já ressaltado, de “pré-história” dos direitos fundamentais (2010, p. 38).

Nesse sentido, Ricardo Castilho, afirma, mesmo isoladamente, que a origem deste pretenso constitucionalismo ocorreu através do Código de Hammurabi de 1780 a.C, na Antiga Babilônia (atual Irã), o qual em seus 282 artigos introduziu um início de ordem na sociedade (2010, p. 23). Contrapondo essa opinião, Bruno Galindo, de forma mais específica, qualifica o Código de Hammurabi como o primeiro catálogo, mesmo que insipiente de direitos fundamentais. Rejeita, porém, a característica de uma pretensa carta Constitucional.

[...] que é considerado por muitos como a primeira codificação a consagrar um catálogo de direitos fundamentais aos homens. Ainda não era uma constituição, mas um corpo legislativo genérico que regulava indistintamente as condutas humanas e impunha-se como legislação limitadora do poder governamental (2005, p. 34).

O pioneirismo da Lei de Talião e suas severas punições baseadas na ideologia do “olho por olho, dente por dente” foi sucedido, na cadeia evolutiva das normas de organização da sociedade, pelo Código de Ur-Nammu, editado por este soberano assírio por volta de 1.200 a.C. Foi o primeiro a aplicar penas pecuniárias para punir delitos cometidos, considerado por Ricardo Castilho “a primeira notícia referente a um constitucionalismo, ainda tosco” (2010, p. 23).

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Ainda que de forma primitiva, esses códigos de conduta inauguraram a busca pela consolidação de direitos humanos, havendo outros povos do Oriente Médio, como os hebreus, que igualmente foram precursores na abordagem desse tema. Nesses códigos a influência de uma religião monoteísta era bastante acentuada, e também o humanismo judaico servia de fundamento para as autoridades enfrentarem problemas concretos no campo dos direitos fundamentais. No entanto, foi na Grécia Antiga que ocorreu o maior desenvolvimento de um humanismo racional, apesar do caráter excludente por se voltar apenas aos seus cidadãos, excluindo as mulheres, os estrangeiros e os escravos. Teve na pessoa de Aristóteles seu expoente (GALINDO, 2005).

Mas o grande exemplo veio mesmo dos gregos. Um dos mais representativos exemplos de reflexão sobre a necessidade de normas para uma sociedade política é um ensaio sobre a Constituição de Atenas, cujos fragmentos originais foram descobertos no Egito no final do século XIX. Escrito provavelmente entre os anos 322 e 332 a.C., foi atribuído a princípio – e falsamente – a Xenofonte. Hoje se reconhece a autoria da peça com segurança: é de Aristóteles, considerada a segunda obra mais importante do pensador estagirita sobre política. O livro historia as experiências constitucionais da Cidade-Estado de Atenas, conforme seus principais legisladores (Drácon, Sólon, Pisítrato, Clístenes e Péricles), e também pode ser lido como uma história política da cidade. [...] São Tomás de Aquino complementaria o pensamento aristotélico falando da “ordem que fundamenta e substantiva as leis” (CASTILHO, 2010, p. 24-25).

A partir do surgimento do Cristianismo no final da Idade Antiga e por toda a Idade Média, os direitos humanos ganharam destaque, mesmo que intimamente vinculados à religião, conquistas que culminaram na Reforma Protestante, período em que surge a democracia moderna ligada aos direitos fundamentais do homem (SARLET, 2010).

A evolução para Idade Média marcou o surgimento de declarações de direitos inseridos nos Forais e nas Cartas de Franquia, documentos outorgados pelos reis portugueses e espanhóis, que, segundo Ricardo Castilho, “dava foro jurídico próprio aos habitantes medievais de uma povoação que quisesse libertar-se do poder feudal” (2010, p. 27). Essas declarações de direitos antecederam a Magna Charta Libertatun de 1215, “principal documento referido por todos que se dedicam ao

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estudo da evolução dos direitos humanos” (SARLET, 2010, p. 41). Considerada por grande parte da doutrina o marco inicial dos direitos fundamentais.

Eficaz ou não, a Magna Carta de 1215 foi um marco na história, tornando-se o início da monarquia constitucional inglesa e um primeiro passo para o constitucionalismo no mundo ocidental. Foi redigida em latim medieval (chamado latim bárbaro), em pergaminho, e outorgada no dia 15 de junho de 1215 (CASTILHO, 2010, p. 30).

Apesar de ser considerada o primeiro passo para o constitucionalismo ocidental, a Carta Magna firmada pelo Rei João Sem-Terra e pelos bispos e barões ingleses, não teve por objetivo garantir direitos às classes menos favorecidas da sociedade. Conforme ensina Ingo Wolfgang Sarlet:

Este documento, inobstante tenha apenas servido para garantir aos nobres ingleses alguns privilégios feudais, alijando, em princípio, a população do acesso aos “direitos” consagrados no pacto, serviu como ponto de referência para alguns direitos e liberdades civis clássicos, tais como o

habeas corpus, o devido processo legal e a garantia da propriedade (2010,

p. 41).

Houve tão somente a tentativa por parte dos nobres e religiosos de limitar o comportamento despótico do rei, que, conforme Bruno Galindo, restou assim definida:

A Magna Charta Libertatum de 1215 foi o marco medieval da limitação do poder pelo respeito a alguns direitos fundamentais. Apesar de consagrar tais direitos apenas para os senhores feudais, a Carta inglesa, nascida das controvérsias entre esses nobres e o Rei João Sem Terra, teve o condão de colocar, em um plano normativo, as limitações ao poder de tributar, a proporcionalidade entre delito e sanção, o devido processo legal, o livre acesso à Justiça, e a liberdade de locomoção. Essa luta pela limitação do poder monárquico foi o principal fator influenciador das teorias democráticas da Idade Moderna, que defenderam um Estado onde predominasse a pluralidade em termos de participação popular na formação da vontade estatal e onde os direitos fundamentais pudessem ser garantidos com maior efetividade possível, teorias que culminaram nas Declarações de Direitos dos séculos XVII, XVIII e XX (2005, p. 36).

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Embora a destacada importância das declarações de direitos e privilégios medievais, suas outorgas pelas autoridades reais ocorreram em um contexto social e econômico marcado pela desigualdade, excluindo grande parcela da população de seus benefícios. Entretanto, a evolução dos direitos fundamentais se manteve constante ao longo da transição da Idade Média para a Idade Moderna, destacando-se as conquistas ocorridas através de eventos como a Reforma Protestante (século XVI), que levou à reivindicação e ao gradativo reconhecimento da liberdade de opção religiosa e de culto em diversos países da Europa (SARLET, 2010, p. 42).

As declarações de direitos de origem inglesa do século XVII, como a Petição de Direitos (Petition of Rights) de 1628, evento que a História considera responsável pelo início do constitucionalismo moderno (CASTILHO, 2010, p. 41), o Habeas

Corpus Act, de 1679, o Bill of Rights, de 1689 e o Establishment Act, de 1701, que,

segundo Ingo Wolfgang Sarlet, “foram direitos e liberdades reconhecidos aos cidadãos ingleses resultantes da progressiva limitação do poder monárquico e da afirmação do Parlamento perante a corte inglesa” (2010, p. 42).

As conquistas europeias de direitos fundamentais se difundiram para a América do Norte, onde, em 12 de junho de 1776, o povo da colônia de Virgínia, atual estado americano, divulgou a Declaração de Direitos do Bom Povo da Virgínia. Escrita por Thomas Jefferson, precedeu a Declaração da Independência dos Estados Unidos da América ocorrida em 4 de julho do mesmo ano. Evento fortemente influenciado pela Magna Carta inglesa, conforme ensina Ricardo Castilho:

Os colonos norte-americanos, ao se rebelarem contra o governo britânico, usaram como argumento a mesma filosofia que norteava os dominadores desde a Magna Carta: a concepção liberal de que o povo não deve ficar sujeito a um governo arbitrário, mas, sim, ser protegido pela lei e controlar o Executivo por meio do Poder Legislativo livremente eleito (2010, p. 54).

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Inovadora por inserir o “direito à vida” como norma a ser respeitada, a Declaração de Independência americana, aliada à Declaração dos Direitos da Virgínia, contribuíram para a edição da primeira e única Constituição dos Estados Unidos da América. Também considerada a primeira Carta Constitucional do mundo, foi promulgada em 4 de março de 1789, treze anos após a Declaração dos Direitos da Virgínia. “Nessa carta, as dez primeiras emendas são chamadas Bill of Rights, porque enumeram os direitos básicos dos cidadãos norte-americanos perante o poder do Estado” (CASTILHO, 2010, p. 60).

A evolução da humanidade determinou a derrocada do período moderno e a entrada na Idade Contemporânea. O marco de transição entre estes períodos foi a Revolução Francesa de 1789, evento que Ingo Wolfgang Sarlet classifica como a “primeira que marca a transição dos direitos de liberdade legais ingleses para os direitos fundamentais constitucionais” (2010, p. 43).

Marcou também o surgimento da expressão “direitos do homem”, que, segundo Fernando Barcellos de Almeida, “foram a conquista de uma classe emergente como dona de poder econômico e que se torna dona também do poder político, como ocorreu mais significativamente com a classe burguesa na Revolução Francesa” (1996, p. 45).

A edição da Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, de 1789, fruto da revolução que provocou a derrocada do antigo regime e a instauração da ordem burguesa na França, conforme ensina Sarlet, sofreu forte influência das declarações de direitos americanas, as quais reciprocamente foram influenciadas pela doutrina iluminista francesa:

A influência dos documentos americanos, cronologicamente anteriores, é inegável, revelando-se principalmente mediante a contribuição de Lafayette na confecção da Declaração de 1789. Da mesma forma, incontestável a influência da doutrina iluminista francesa, de modo especial de Rousseau e Montesquieu, sobre os revolucionários americanos, levando à consagração, na Constituição Americana de 1787, do princípio democrático e da teoria da separação dos poderes. Sintetizando, há que reconhecer a inequívoca relação de reciprocidade, no que concerne à influência exercida por uma declaração de direitos sobre a outra [...] (2010, p. 44).

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O surgimento desta marcante declaração de direitos ocorreu de forma atrelada à Revolução Francesa, mais propriamente após a Tomada Bastilha, marco que simboliza as conquistas burguesas e a derrocada do absolutismo monárquico francês. Conquistas que influenciaram o mundo através dos ideais de “Liberdade, Igualdade e Fraternidade” e marcaram a evolução da humanidade para a Idade Contemporânea.

Alçados ao poder, os revolucionários convocaram a Assembléia Nacional Constituinte francesa para que se redigisse a primeira Constituição do país e, consequentemente, a Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão. Já o preâmbulo da Carta restou redigido em paralelo por um conjunto seleto de deputados reunidos na casa de Thomas Jefferson. Conforme ensina Ricardo Castilho:

Em paralelo, uma comissão de deputados decidiu escrever um preâmbulo para a Carta francesa, com uma síntese dos ideais da revolução. Reuniram-se na casa de Thomas Jefferson, então embaixador norte-americano em Paris. Os principais membros dessa delegação eram o marquês de La Fayette, que havia participado da guerra de independência dos Estados Unidos, Antoine Pierre Joseph Marie Barnave, grande orador e ativista da revolução, e o jornalista e escritor Honoré-Gabriel Victor Riqueti, conde de Mirabeau, este responsável pelo texto final. A declaração foi aprovada em sessão da Assembléia Constituinte de 26 de agosto de 1789 (2010, p. 67).

Apesar das conquistas alcançadas a partir da Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, bem como a reconhecida importância das mulheres na Revolução Francesa, a referência ao termo “Homem” no título que caracteriza a declaração francesa de direitos ocorreu por ser dedicada tão somente aos representantes do sexo masculino. Fato retratado pela autora teatral Marie Olympe de Gouges, que, em repúdio, escreveu e publicou em 1791 o manifesto chamado Declaração dos Direitos da Mulher e da Cidadã.

A História registra que as mulheres tiveram participação ativa na Revolução Francesa. No entanto, a Declaração é inteiramente dedicada aos representantes do sexo masculino. Uma autora teatral, Marie Gouze Olympe de Gouges, de certo destaque na época, escreveu e publicou em 1791 o manifesto chamado Declaração dos direitos da mulher e da cidadã,

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usando a mesma linguagem que o documento original, reivindicando que os direitos fossem estendidos às mulheres da França (CASTILHO, 2010, p. 69).

O manifesto não teve o poder de incluir direitos às mulheres no texto original. Porém, no mesmo ano em que os incomodados revolucionários prenderam e guilhotinaram Marie Gouze Olympe de Gouge, 1793, o documento foi revisado e nele incluída “a concepção de liberdade aos negros, e pela primeira vez eram proclamados os direitos econômicos e sociais, que incluíam direito à instrução, ao trabalho e à assistência” (CASTILHO, 2010, p. 69).

Constituída de XVII enunciados, a Declaração de Direitos do Homem e do Cidadão ficou marcada por seus avanços sociais ao garantir direitos iguais para todos os cidadãos, além do pioneirismo em permitir a participação política do povo. Restou sucedida somente em 10 de dezembro de 1948 com a edição da Declaração Universal dos Direitos Humanos, promulgada pela Assembleia Geral da Organização das Nações Unidas. Esse evento Flávia Piovesan caracteriza como a “verdadeira consolidação do Direito Internacional dos Direitos Humanos surge em meados do século XX, em decorrência da Segunda Guerra Mundial” (1997, p. 139).

O surgimento da Declaração dos Direitos Humanos em 1948 marcou a evolução dos direitos conquistados através das revoluções do século XVIII. Teve por objetivo dar proteção aos povos do planeta, baseando-se no princípio fundamental de que todos os homens nascem livres e iguais em dignidade e direitos.

Para que se possa compreender o processo de discussão até a promulgação da Declaração dos Direitos Humanos, de 1948, é necessário fazer referência a outros momentos relevantes da história que contribuíram para sua criação. Destacam-se as declarações de direito norte-americana, de 1776, e a declaração francesa, de 1789, as quais marcaram a emancipação histórica do indivíduo perante os grupos sociais, como a família, entidades religiosas e outros segmentos, dando em troca a segurança da legalidade, com garantia da igualdade de todos perante a lei (BRAUN, 2001, p. 130-131).

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Formalizada em 10 de dezembro de 1948, a Declaração Universal dos Direitos Humanos contou com a aprovação unânime de 48 países, havendo apenas 8 abstenções. A inexistência de qualquer questionamento ou reserva feita pelos Estados aos princípios da Declaração, e a inexistência de qualquer voto contrário às suas disposições conferem à Declaração Universal o significado de um código e plataforma comum de ação. Consolida a afirmação de uma ética universal, ao consagrar um consenso sobre valores de cunho universal a serem seguidos pelos Estados (PIOVESAN, 1997, p. 155).

Precedida de um preâmbulo e composta por trinta artigos, a Declaração Universal dos Direitos Humanos formalizou os objetivos declarados e defendidos pela Organização das Nações Unidas (ONU). Embora não possua obrigatoriedade legal, foi redigida após o final da Segunda Guerra Mundial e durante um princípio de Guerra Fria, pretendendo o alcance global de respeito aos direitos e liberdades fundamentais.

Em janeiro de 1946, a Assembléia Geral das Nações examinou um projeto de declaração sobre os direitos e liberdades fundamentais e o remeteu ao Conselho Econômico e Social, que, por sua vez, transmitiu-o à Comissão de Direitos Humanos e esta recebeu-o como subsídio a uma carta internacional de Direitos Humanos. Em 1947, a Comissão autorizou os membros de sua Mesa Diretora a formular um projeto preliminar, tarefa essa que depois foi assumida por um Comitê de Redação, integrado por membros da Comissão, representava oito Estados e que foram escolhidos em função de uma equânime distribuição geográfica (ALMEIDA, 1996, p. 108).

Importante destacar a proclamação solene inserida pela Assembleia Geral no corpo do preâmbulo da Declaração Universal dos Direitos Humanos. Parágrafo em que o Órgão plenário e deliberativo, composto por todos os países membros, expressou de forma didática os objetivos e intenções dos artigos que precede:

A Assembleia Geral proclama a presente Declaração Universal dos Direitos Humanos como ideal comum a atingir por todos os povos e todas as nações, a fim de que todos os indivíduos e todos os órgãos da sociedade, tendo-a constantemente no espírito, se esforcem, pelo ensino e pela educação, por desenvolver o respeito desses direitos e liberdades e por

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promover, por medidas progressivas de ordem nacional e internacional, o seu reconhecimento e a sua aplicação universais e efetivos tanto entre as populações dos próprios Estados membros como entre as dos territórios colocados sob a sua jurisdição (DUDH, ONU, 1948).

O respaldo alcançado pela Declaração Universal dos Direitos Humanos acabou por influenciar a elaboração e a formalização de tratados regionalizados de proteção de direitos. Seus princípios passaram a balizar os julgamentos dos tribunais internacionais e nacionais, servindo de referencial teórico para a elaboração de cartas constitucionais e infraconstitucionais.

Porém, dentre as importantes normas que a compõem, Helenice Braun destaca a “concepção de que o único regime político que respeita efetivamente os direitos do homem é o regime democrático, único caminho legítimo para a organização do Estado” (2002, p. 140). Normativa inserida no artigo XXI, que, de forma implícita, impõe a soberania do voto na organização política dos Estados: “A vontade do povo será a base da autoridade do governo; esta vontade será expressa em eleições periódicas e legítimas, por sufrágio universal, por voto secreto ou processo equivalente que assegure a liberdade de voto” (D.U.D.H., 1948).

Dentre os tratados surgidos a partir da Declaração Universal, destaca-se, em âmbito americano, a Convenção Americana de Direitos Humanos de 1969. Também influenciada pelo Pacto Interamericano de Direitos Civis e Políticos de 1966, é composta por órgãos ativos e regida por normas de efeito vinculante, impondo aos países integrantes o respeito às decisões de sua Corte de julgamentos.

Aprovada na Conferência de São José da Costa Rica em 22 de novembro de 1969, a Convenção reproduz a maior parte das declarações de direitos constantes do Pacto Internacional de Direitos Civis e Políticos de 1966. Quanto aos órgãos competentes para supervisionar o cumprimento de suas disposições e de julgar os litígios referentes aos direitos humanos nela declarados, a Convenção aproxima-se mais do modelo da Convenção Européia de Direitos Humanos de 1950 (COMPARATO, 2001, p. 364).

Igualmente conhecido por Pacto de São José da Costa Rica, tem por integrantes os países membros da Organização dos Estados Americanos (OEA).

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Diferentemente da Declaração Universal de Direitos Humanos, possui um órgão competente para o julgamento dos processos de eventuais violações, a Corte Interamericana de Direitos Humanos.

Similar ao sistema da ONU, o sistema da OEA é composto de uma Declaração, equivalente a uma recomendação e uma Convenção – A Convenção Americana sobre Direitos Humanos – equivalente ao Pacto da ONU, mas mais particularizado do que este -, também conhecida por “Pacto de San José”, por ter sido elaborada e assinada nesta localidade em 1969 (ARAÚJO; ANDREIUOLO, 1999, p. 73).

O caráter vinculante das decisões proferidas pela Corte Interamericana de Direitos Humanos conferiu à Convenção o respaldo necessário para o respeito às suas normas. As eventuais transgressões expuseram os demandados às punições impostas pela Corte, formando ao longo do tempo a jurisprudência de proteção aos direitos humanos em âmbito americano.

Desde a sua primeira sentença, no caso Velásquez Rodriguez, a Corte Interamericana de Direitos Humanos determinou que a obrigação de garantia estipulada no artigo 1º da Convenção. [...] Esse conceito foi reiterado sistematicamente pela jurisprudência da Corte, que o precisou definindo que o Estado é o organizador do respeito aos direitos humanos, inclusive nas relações interindividuais, quando por sua aquiescência, ação ou omissão, contribuiu para sua violação (NIKKEN, 2009, p. 258-259).

Composta por 82 artigos, a Convenção Americana de Direitos Humanos foi ratificada pelo Brasil somente em 1992 por meio do Decreto 678/92, pois, quando da sua subscrição, o país vivenciava um período de regime militar, inviabilizando a aplicação de seus preceitos de proteção e garantia aos direitos humanos.

No que se refere à posição do Brasil em relação ao sistema internacional de proteção dos direitos humanos, observa-se que somente a partir do processo de democratização do país, deflagrado em 1985, é que o Estado Brasileiro passou a ratificar relevantes tratados internacionais de direitos humanos (PIOVESAN, 1999, p. 126).

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Destaca-se a preocupação dos legisladores da Convenção Americana de Direitos Humanos em combater a impunidade dos signatários na garantia dos direitos humanos, como confirma Pedro Nikken; “a Corte Interamericana salientou que os Estados Partes na Convenção devem erradicar a impunidade” (2009, p. 261). Diretriz que impôs aos países a obrigação de responsabilizar seus agentes por crimes cometidos contra os direitos humanos no âmbito de suas ditaduras militares. Esse procedimento maximizou a importância da Convenção Americana de Direitos Humanos, alçando-a à condição de guardiã dos direitos humanos no período de consolidação democrática pós ditaduras militares sul-americanas.

1.2 Classificação dos direitos fundamentais

A Constituição Federal de 1988 e as doutrinas modernas que tratam dos Direitos Fundamentais divergem quanto às suas classificações e nomenclaturas. De acordo com a Constituição Federal, o Título II, os direitos e garantias fundamentais subdividem-se em cinco capítulos: direitos individuais e coletivos; direitos sociais;

nacionalidade; direitos políticos e partidos políticos. Dessa forma, ressalta Alexandre

de Moraes que a classificação adotada pelo legislador constituinte estabeleceu cinco espécies ao gênero direitos e garantias fundamentais; direitos políticos; e direitos relacionados à existência, organização e participação em partidos políticos (2004, p. 61).

Já a classificação apresentada por T. H. Marshall, proposta em 1950, classificou os direitos em civis (afirmados no século XVIII), políticos (conquistados no século XIX) e sociais (conquistados no século XX) (MARSHALL apud BESTER, 2005, p. 587). Ainda, de acordo com a autora, todas as classificações de direitos realizadas depois desta, de algum modo, desta se serviram.

Porém, a classificação por gerações feita pelo jurista italiano Norberto Bobbio em sua obra A era dos direitos encontrou simpatizantes na doutrina brasileira, dentre eles, Paulo Bonavides e José Afonso da Silva. No entanto, apesar desta consolidação teórica, o termo “gerações” também encontra oposição, conforme

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destaca Ingo Wolfgang Sarlet, que adota o termo “dimensão”, por afastar a compreensão de substituição de direitos por gerações futuras, complementando-se em dimensões coexistentes.

Num primeiro momento, é de se ressaltarem as fundadas críticas que vêm sendo dirigidas contra o próprio termo “gerações” por parte da doutrina alienígena e nacional. Com efeito, não há como negar que o reconhecimento progressivo de novos direitos fundamentais tem o caráter de um processo cumulativo, de complementaridade, e não de alternância, de tal sorte que o uso da expressão “gerações” pode ensejar a falsa impressão da substituição gradativa de uma geração por outra, razão pela qual há quem prefira o termo “dimensões” dos direitos fundamentais, posição esta que aqui optamos por perfilhar, na esteira da mais moderna doutrina (SARLET, 2010, p. 45).

Superadas as divergências, relativizam-se as opiniões no sentido de agrupar os diferentes direitos fundamentais constitucionais ou direitos humanos internacionais em três ou quatro grupos; direitos de primeira, segunda, terceira e quarta gerações ou dimensões.

1.2.1 Direitos fundamentais de primeira geração

Surgidos preliminarmente no âmbito da Magna Carta Libertatum de 1215, os direitos de primeira geração visavam à proteção das liberdades individuais em detrimento ao poder do Estado, que deveria respeitar e garantir a liberdade, a vida, a propriedade, a manifestação, a expressão, o voto, entre outros direitos dos cidadãos. Reconhecidos desde as primeiras Constituições escritas, são, segundo Ingo Wolfgang Sarlet, “o produto peculiar do pensamento liberal-burguês do século XVIII, de marcado cunho individualista, surgindo e afirmando-se como direitos do indivíduo frente ao Estado [...]” (2010, p. 46).

Os fundamentos do Estado Absolutista começavam, lentamente, a desabar, principalmente diante das pretensões da emergente burguesia urbana, que

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buscava espaço para crescer economicamente. Com estas influências históricas e políticas, surgiram os direitos fundamentais de primeira geração (SCHÄFER, 2005, p. 19).

Segundo Paulo Bonavides, apesar de atualmente pacificados constitucionalmente, a consolidação dos direitos de primeira geração ocorreu de forma diversa entre os países, fato que demonstra as peculiaridades e as necessidades de cada sociedade.

Os direitos de primeira geração são os direitos da liberdade, os primeiros a constarem do instrumento normativo constitucional, a saber, os direitos civis e políticos, que em grande parte correspondem, por um prisma histórico, àquela fase inaugural do constitucionalismo do Ocidente.

Se hoje esses direitos parecem já pacificados na codificação política, em verdade se moveram em cada país constitucional num processo dinâmico e ascendente, entrecortado não raro de eventuais recuos, conforme a natureza do respectivo modelo de sociedade, mas permitindo visualizar a cada passo uma trajetória que parte com freqüência do mero reconhecimento formal para concretizações parciais e progressivas, até ganhar a máxima amplitude nos quadros consensuais de efetivação democrática de poder.

[...] os direitos e da primeira geração – direitos civis e políticos – já se consolidaram em sua projeção de universalidade formal, não havendo Constituiçlão digna desse nome que os não reconheça em toda a extensão (2003, p. 563).

Por definirem um não fazer do Estado em prol do cidadão, caracterizam-se como uma prestação negativa. Conforme refere Sarlet, “são por esse motivo, apresentados como direitos de cunho “negativo”, uma vez que dirigidos a uma abstenção, e não a uma conduta positiva por parte dos poderes públicos [...]” (2010, p. 47).

[...] essas idéias encontravam um ponto fundamental em comum, a necessidade de limitação e controle dos abusos de poder do próprio Estado e de suas autoridades constituídas e a consagração dos princípios básicos da igualdade e da legalidade como regentes do Estado moderno e contemporâneo (MORAES, 2000, p. 19).

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Segundo refere Jairo Schäfer, “o estudo da evolução dos direitos fundamentais confunde-se com a própria história do Estado de Direito” (2005, p. 14). Interpretação que ressalta a importância dos direitos fundamentais de primeira geração, que de forma precursora viabilizaram a criação de instâncias de controle dos poderes do Estado.

Sarlet exemplifica quais são os direitos considerados de primeira geração:

Assumem particular relevo no rol desses direitos, especialmente pela sua notória inspiração jusnaturalista, os direitos à vida, à liberdade, à propriedade e à igualdade perante a lei. São, posteriormente, complementados por um leque de liberdades, incluindo as assim denominadas liberdades de expressão coletiva (liberdades de expressão, imprensa, manifestação, reunião, associação, etc.) e pelos direitos de participação política, tais como o direito de voto e a capacidade eleitoral passiva, revelando, de tal sorte, a íntima correlação entre os direitos fundamentais e a democracia. Também o direito de igualdade, entendido como igualdade formal (perante a lei) e algumas garantias processuais (devido processo legal, habeas corpus, direito de petição) se enquadram nesta categoria (2010, p. 47).

Apesar de corresponderem à fase inicial do constitucionalismo ocidental, os direitos eminentemente de cunho civil e político estabelecidos pelos direitos fundamentais de primeira geração comprovam sua importância ao integrarem desde o surgimento a totalidade das Cartas Constitucionais.

1.2.2 Direitos fundamentais de segunda geração

Os problemas sociais e econômicos decorrentes do processo de industrialização do século XIX, aliados às doutrinas socialistas e à constatação de que somente a liberdade e a igualdade dos cidadãos não seriam garantidas por sua mera consagração formal, geraram, segundo Ingo Wolfgang Sarlet, “amplos movimentos reivindicatórios e o reconhecimento progressivo de direitos” (2010, p. 47). Direitos que necessitaram ser garantidos pelo Estado, contrapondo os direitos de primeiro grau e sua característica de prestação negativa.

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Esta posição ativa do Estado na garantia de direitos representou o nascimento de um pretenso Estado de bem-estar social, que, conforme Rodrigo César Rebello Pinho “significam uma prestação positiva, um fazer do Estado em prol dos menos favorecidos pela ordem social e econômica” (2005, p. 69). A utilização da expressão direitos sociais consolidou o processo histórico de formação do Estado Social, conforme destaca Jairo Schäfer:

A expressão direitos sociais, segundo Baldassarre, não era de utilização comum no âmbito do discurso político e jurídico antes do advento do Estado Contemporâneo, sendo que o reconhecimento dos direitos sociais resultou do processo histórico de formação e virtude da superveniência de dois relevantes eventos da época contemporânea, quais sejam, a industrialização e a democratização do poder político. Isso porque se, de um lado, a industrialização estimulou as diferenças entre classes sociais, separando radicalmente trabalho de capital, por outro a democracia permitiu o exercício de pressões políticas dialéticas (2005, p. 26).

Surgiram, conforme Rodrigo César Rebello Pinho, “em um segundo momento do capitalismo, com o aprofundamento das relações entre capital e trabalho. As primeiras Constituições a estabelecer a proteção de direitos sociais foram a mexicana de 1917 e a alemã de Weimar em 1919” (PINHO, 2005, p. 69), porém, pondera Sarlet, o fato das inserções anteriores.

Estes direitos fundamentais, que embrionária e isoladamente já haviam sido contemplados nas Constituições Francesas de 1793 e 1848, na Constituição Brasileira de 1824 e na Constituição Alemã de 1849 (que não chegou a entrar em vigor), caracterizam-se, ainda hoje, por outorgarem ao indivíduo direitos a prestações sociais estatais, como assistência social, saúde, educação, trabalho, etc” (2010, p. 48).

Destaca Sarlet, a característica de certos direitos considerados de segunda geração dissociados da prestação positiva por parte do Estado, as denominadas liberdade sociais, “liberdade de sindicalização, do direito de greve, bem como do reconhecimento de direitos fundamentais dos trabalhadores, tais como o direito a férias e ao repouso semanal remunerado, a garantia de um salário mínimo e a limitação de jornada de trabalho” (2010, p. 48).

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O vasto rol de direitos de segunda geração e seu caráter de bem estar social dificultam sua efetivação plena. Assim, enfatiza Paulo Bonavides “que os direitos de segunda geração passaram por um ciclo de baixa normatividade, tendo inclusive, sua eficácia posta sob suspeita” (2003, p. 565). A necessidade de recursos financeiros públicos, por vezes, inviabiliza a efetivação desses diretos.

1.2.3 Direitos fundamentais de terceira geração

Diferentemente dos direitos fundamentais de primeira e segunda geração, os direitos fundamentais de terceira geração possuem a coletividade humana como destinatário em detrimento ao indivíduo. Destinam-se, conforme Ingo Wolfgang Sarlet, “à proteção de grupos humanos (família, povo, nação), e caracterizam-se, consequentemente, como direitos de titularidade coletiva e difusa” (2010, p. 48).

Ainda considerados novos direitos, surgiram em razão dos processos de industrialização e urbanização do século XX, em que os conflitos não mais eram adequadamente resolvidos dentro da antiga tutela jurídica do homem-indivíduo.

Dotados de altíssimo teor de humanismo e universalidade, os direitos da terceira geração tendem a cristalizar-se no fim do século XX enquanto direitos que não se destinam especificamente à proteção dos interesses de um indivíduo, de um grupo ou de um determinado Estado (BONAVIDES, 2003, p. 596).

São direitos que a coletividade impõe ao Estado, principalmente no que se refere a realizar ações concretas para garantir-lhes um mínimo de igualdade e de bem-estar social. Conhecidos também por Direitos de Fraternidade e Solidariedade, referência ao lema revolucionário francês do século XVIII, “liberdade, igualdade e fraternidade”, englobam, segundo Ingo W. Sarlet:

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Dentre os direitos fundamentais de terceira dimensão consensualmente mais citados, cumpre referir os direitos à paz, à autodeterminação dos povos, ao desenvolvimento, ao meio ambiente e qualidade de vida, bem como o direito à conservação e utilização do patrimônio histórico e cultural e o direito de comunicação (2010, p. 48).

Segundo José Afonso da Silva, os direitos de terceira geração dividem-se em dois tipos:

Relativos ao homem trabalhador – assim considerado o produtor de bens e

partícipe de uma relação empregatícia. Estes, por sua vez, podem englobar direitos individuais e direitos coletivos, de participação nas negociações coletivas de trabalho, de representação classista, de substituição processual etc.

Relativos ao homem consumidor – referem-se especialmente ao homem

como sujeito que consome bens e serviços públicos, tais como: direito à seguridade social; direito à educação; direito à habitação; direito a cultura, direito ao lazer; direito ao meio ambiente; direitos sociais para as crianças e os idosos (2005, p. 592).

Por serem atuais, o surgimento de novos direitos de terceira geração pode e tende a ocorrer, principalmente em virtude das novas formas de comunicação que universalizaram as relações e potencializaram as necessidades.

1.2.4 Direitos fundamentais de quarta geração

Não reconhecidos pela totalidade da doutrina, “a existência de uma quarta dimensão, que, no entanto, ainda aguarda sua consagração na esfera do direito

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internacional e das ordens constitucionais internas” (SARLET, 2010, p. 50), possui íntima relação com a globalização e o neoliberalismo.

Dessa forma, visam à dissolução do Estado nacional, “afrouxando e debilitando os laços de soberania e, ao mesmo passo, doutrinando uma falsa despolitização da sociedade” (BONAVIDES, 2003, p. 571).

Por se tratar de direitos de caráter internacional, conforme refere Gisela Maria Bester:

“[...] constituem-se na condição de possibilidade do surgimento das Declarações, Pactos e Cartas Internacionais para a proteção da humanidade fora do âmbito dos Estados Nacionais e tem como marco o ano de 1948, sendo a Declaração Universal dos Direitos do Homem, assinada pelas Nações Unidas naquele final da primeira metade do século XX o mais importante documento dentro desta categoria de direitos (2005, p. 593).

Portanto, possuem caráter supranacional, tendo como destinatário não somente o cidadão de um país, mas o gênero humano como um todo, incluindo-se o direito à democracia, à informação e ao pluralismo.

Segundo Bester, os direitos de quarta geração compreendem:

Direito ao desenvolvimento – é uma conquista bastante recente,

referindo-se ao fenômeno contemporâneo denominado subdereferindo-senvolvimento, referindo-sendo este justamente um dos maiores entraves ao reconhecimento e ao respeito pelos direitos humanos, notadamente dos econômico-sociais, eis que gera, por um lado, uma legião de excluídos e marginalizados e, por outro, um Estado geralmente autoritário, ineficaz e dependente de países ricos. Direito

ao meio ambiente sadio – necessário porque o crescimento urbano e o

desenvolvimento tecnológico têm causado profundos danos ao habitat natural dos seres humanos, a ponto de podermos falar inclusive em uma espécie de vingança da tecnologia. [...] Esse direito é recente, passando a ser reconhecido a partir da década de 1960. Direito à paz – quanto à paz, todos a queremos e todos sabemos o que ela significa, mas todos temos também o conhecimento a respeito da dificuldade de se fazer respeitar este direito amplamente reconhecido em vários textos jurídicos internacionais [...]

Direito à descolonização – intimamente associado ao direito à

autodeterminação dos povos, pleiteado para evitar que alguns países, de forma reiterada, interfiram nas políticas internas dos demais, como o fizeram os Estados Unidos em relação ao Brasil e a muitos outros países na década de 1990, com seu Consenso de Washington (2005, p. 594).

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Além destas quatro gerações de direitos, há ainda um grupo de direitos recentes, classificados de Novíssimos Direitos. Também conhecidos por direitos fundamentais de quinta geração, não são reconhecidos pela totalidade dos autores. Encontram-se em fase de reivindicações, como os direitos relativos à inteligência artificial e à informática; à bioética, posse de patrimônio genético de pessoas, clonagem etc.

1.3 Os direitos fundamentais e a Constituição Federal de 1988

O retorno do Brasil ao Estado Democrático de Direito após a ditadura militar, que perdurou de 1964 a 1985, influenciou diretamente a elaboração da Constituição Federal de 1988. O movimento legislativo constitucional que desencadeou no vasto rol de direitos e garantias fundamentais preconizados por esta Carta Constitucional possui semelhança ao ocorrido no pós Segunda Guerra Mundial com a edição de inúmeros tratados internacionais para proteção dos direitos humanos. Conforme destaca Ingo Wolfgang Sarlet:

No que concerne ao processo de elaboração da Constituição de 1988, há que fazer referência, por sua umbilical vinculação com a formatação do catálogo dos direitos fundamentais na nova ordem constitucional, à circunstância de que esta foi resultado de um amplo processo de discussão oportunizado com a redemocratização do País após mais de vinte anos de ditadura militar (2010, p. 63).

Neide Maria Carvalho de Abreu destaca a influência exercida pelo pós Segunda Guerra na elaboração das declarações de direitos e também nas cartas constitucionais.

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Os direitos fundamentais foram inseridos de maneira explícita nas constituições, há bem pouco tempo, precisamente após a 2ª Guerra Mundial, quando todos os povos intuíram que a preocupação internacional deveria estar voltada para uma proteção aos direitos da pessoa humana, após as violências cometidas pelos regimes fascista, stalinista e nazista, como também pelo perigo de ameaça à tranquilidade universal decorrente da instabilidade das relações entre diversos países (2006, p. 09).

Porém, importante enfatizar que a Constituição Federal de 1988, apesar de inovadora ao tratar dos “direitos fundamentais antes de tratar da organização do próprio Estado, bem como ao incorporar junto à proteção dos direitos individuais e sociais a tutela dos direitos difusos e coletivos” (PINHO, 2005, p. 72), não pode ser considerada pioneira e tampouco exclusiva ao tratar de direitos individuais, conforme relembra Rodrigo César Rebello Pinho:

Todas as Constituições brasileiras contiveram enunciados de direitos individuais. A de 1824, em seu art. 179, garantia “a inviolabilidade dos Direitos Civis, e Políticos dos Cidadãos Brazileiros, que tem por base a liberdade, a segurança individual, e a propriedade”. A Constituição de 1891 destinava uma seção à declaração de direitos, assegurando a “brasileiros e a estrangeiros residentes no país a inviolabilidade dos direitos concernentes á liberdade, á segurança individual e á propriedade” (art. 72). A de 1934, editada após a Constituição alemã de Weimar, continha, ao lado de um título denominado “Das Declarações Direitos”, um outro dispondo sobre a ordem econômica e social, incorporando ao Texto Constitucional diversos direitos sociais. A tutela a essa nova modalidade de direitos, os sociais, permaneceu em todas as demais Constituições. A Carta de 1937 consagrava direitos, mas o art. 186 declarava “em todo o país o estado de emergência”, com a suspensão de diversas dessas garantias. [...] A Constituição de 1946 destinou o Título IV à declaração de direitos. Esse enunciado permaneceu nas Constituições de 1967 e 1969 [...] (2005, p. 71).

No entanto, inegáveis as inovações trazidas pela Constituição Federal de 1988, resultado de um período de amadurecimento e de consolidação do direito constitucional em âmbito nacional e internacional, representando o marco do processo de redemocratização do Estado. “Traçando-se um paralelo entre a Constituição de 1988 e o direito constitucional positivo anterior, constata-se, já numa primeira leitura, a existência de algumas inovações de significativa importância na seara dos direitos fundamentais” (SARLET, 2010, p. 63).

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