• Nenhum resultado encontrado

Variação discursiva e gramaticalização: extensores gerais na fala natalense

N/A
N/A
Protected

Academic year: 2021

Share "Variação discursiva e gramaticalização: extensores gerais na fala natalense"

Copied!
93
0
0

Texto

(1)

UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE CENTRO DE CIÊNCIAS HUMANAS, LETRAS E ARTES

DEPARTAMENTO DE LETRAS

PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ESTUDOS DA LINGUAGEM

VARIAÇÃO DISCURSIVA E GRAMATICALIZAÇÃO: EXTENSORES GERAIS NA FALA NATALENSE

ANA CLARISSA VIANA DUARTE

Natal 2019

(2)

ANA CLARISSA VIANA DUARTE

VARIAÇÃO DISCURSIVA E GRAMATICALIZAÇÃO: EXTENSORES GERAIS NA FALA NATALENSE

Dissertação apresentada ao Programa de Pós-graduação em Estudos da Linguagem da Universidade Federal do Rio Grande do Norte, para fins de defesa, como requisito parcial para obtenção do título de Mestre.

Área de conhecimento: Linguística Teórica e Descritiva.

Orientadora: Profa. Dra. Maria Alice Tavares

NATAL 2019

(3)

Universidade Federal do Rio Grande do Norte - UFRN Sistema de Bibliotecas - SISBI

Catalogação de Publicação na Fonte. UFRN Biblioteca Setorial do Centro de Ciências Humanas, Letras e Artes -CCHLA

Duarte, Ana Clarissa Viana.

Variação discursiva e gramaticalização: extensores gerais na fala natalense / Ana Clarissa Viana Duarte. - Natal, 2019. 90f.: il.

Dissertação (mestrado) - Centro de Ciências Humanas, Letras e Artes, Programa de Pós-Graduação em Estudos da Linguagem,

Universidade Federal do Rio Grande do Norte, 2019. Orientador: Profa. Dra. Maria Alice Tavares.

1. Extensores gerais - Dissertação. 2. Variação

sociolinguística - Dissertação. 3. Gramaticalização - Dissertação. 4. Mudança - Dissertação. I. Tavares, Maria Alice. II. Título.

(4)

À minha mãe e A meu filho.

(5)

AGRADECIMENTOS

A Deus, pelas graças diárias concedidas, inclusive a vida.

À minha mãe (in memoriam) por dedicar toda sua existência a mim, guiando-me pelo caminho da vida da maneira mais linda, doce e sábia que poderia haver. Obrigada, mãe, pela educação, pelos valores e pelas crenças transmitidas. Sigo seus passos na criação de meu filho, e espero realizar um trabalho tão íntegro quanto o seu.

A Izac, meu esposo, a Miguel, meu filho, e a Lalá, minha segunda mãezinha, pela compreensão nos momentos mais difíceis e por serem meus maiores apoiadores e incentivadores, estando sempre ao meu lado.

À minha orientadora, Maria Alice Tavares, que sem perceber, transmite mais do que conhecimentos acadêmicos, transmite valores éticos e morais. Exemplo de professora, sempre doce e paciente, me acompanhou por todo o caminhar acadêmico, desde a iniciação científica até aqui. Obrigada, Professora, pelo tempo dedicado a mim e a minha formação acadêmica.

À Profa. Dra. Edair Maria Görski e à Profa. Dra. Érica Reviglio Iliovitz pelas ricas contribuições na ocasião do exame de qualificação e por aceitar, de maneira tão gentil, participar da banca de defesa.

Aos amigos da UFRN, que me acompanharam desde a graduação e compartilharam comigo os momentos mais alegres e mais difíceis de nossas vidas acadêmicas.

(6)

RESUMO

Extensores Gerais são expressões discursivo-pragmáticas, características da fala, que exibem uma estrutura composicional em comum. No português brasileiro, as variantes apresentam como núcleo os pronomes tudo e tal ou o substantivo coisa. Embora haja diversos pesquisadores que analisam esse fenômeno em outros idiomas (cf. CHESHIRE, 2007; TAGLIMONTE e DENIS, 2010; PICHLER, 2010; PICHLER e LEVEY, 2011; FERNÁNDEZ, 2015; SECOVA, 2017), até o momento, não há trabalhos destinados a analisar a variação das formas no português brasileiro, que seja de nosso conhecimento. Nesta dissertação, temos como objeto de estudo o uso dos Extensores Gerais na comunidade de fala natalense. Nosso corpus é composto por 48 entrevistas sociolinguísticas constituintes do Banco de Dados FALA-Natal (cf. TAVARES, 2016). O principal objetivo desta pesquisa é circunscrever os contextos de ocorrência de cada variante, além de descrever e analisar os fatores envolvidos nesse fenômeno variável. No que se refere à fundamentação teórica, empregamos a sociolinguística variacionista – teoria que defende que a variação, embora seja inerente à língua, não ocorre de modo aleatório, por isso pode ser sistematizada e analisada quantitativamente – somada à gramaticalização, do ponto de vista do funcionalismo norte-americano, – responsável pelos estudos da mudança linguística que objetivam demonstrar como itens lexicais, em certos contextos linguísticos, passam a desempenhar funções gramaticais. Desse modo, seguimos uma interface variação-gramaticalização, visto que a análise da gramaticalização “permite a elaboração de explicações mais refinadas para os padrões sincrônicos de distribuição de variantes discursivas cuja origem histórica reside em processos de gramaticalização” (TAVARES, 2017, p. 188). No tocante à análise, de cunho quantitativo, consideramos as seguintes variáveis independentes: sexo, faixa etária, função desempenhada pela forma e extensão estrutural da forma. Quanto à função, os resultados mostraram que tal foi favorecido pela requisição de solidariedade, a função mais gramaticalizada, e coisa e tudo foram favorecidos pela função de marcação de categoria, a menos gramaticalizada. Esses resultados apontam para a possibilidade de que

tal seja a forma mais gramaticalizada. A variável independente extensão estrutural da

forma não pode ser analisada uma vez que as formas variantes apresentam, em sua maioria, apenas um ou dois elementos composicionais. No que diz respeito ao sexo, as mulheres favoreceram coisa e tudo e os homens favoreceram tal, o que pode ter duas explicações. Pode se tratar de avanço da gramaticalização de tal liderada por homens ou

(7)

disseminação social de coisa e tudo liderada por mulheres. Quanto à idade, os resultados obtidos para coisa nos permitem aventar a possibilidade de mudança liderada pelos pré-adolescentes. Por sua vez, tal pode estar passando por mudança liderada pelos adolescentes, com a manifestação de um pico de uso, embora o fenômeno de age grading não possa ser descartado. Por fim, tudo não parece estar passando por mudança. Há uma polaridade em seu uso: ele é favorecido pelos dois grupos etários mais velhos e desfavorecido pelos dois grupos etários mais jovens. Em suma, nossa pesquisa descreve e analisa o comportamento dos Extensores Gerais na comunidade de fala de Natal. Palavras-chave: Extensores Gerais; variação sociolinguística; gramaticalização; mudança.

(8)

ABSTRACT

General Extenders are discourse-pragmatic expressions, characteristics of speech, which exhibit a compositional structure in common. In Brazilian Portuguese, the features present as a core the pronouns tudo and tal or the noun coisa. Although there are several researchers that analyze this phenomenon in other languages (cf. CHESHIRE, 2007; TAGLIMONTE e DENIS, 2010; PICHLER, 2010; PICHLER e LEVEY, 2011; FERNÁNDEZ, 2015; SECOVA, 2017), until now, there are no papers intended to analyze the variation of the forms in Brazilian Portuguese, which we know of. In this dissertation, we have as object of study the usage of General Extenders in the speech community of Natal. Our corpus is composed by 48 sociolinguistic interviews constituents of Banco de Dados FALA-Natal (cf. TAVARES, 2016). The main objective of this research is to circumscribe the occurrence contexts of each feature, in addition to describe and analyze the factors involved in this variable phenomenon. With regard to the theoretical basis, we use the variacionist sociolinguistic – a theory that argues that variation, although inherent in the language, does not occur in a random way, so it can be systematized and analyzed quantitatively – added to grammaticalization, from the point of view of American functionalism – responsible for the studies of language change that aim to demonstrate how lexical items, in certain linguistic contexts, begin to perform grammatical functions. Thus, we follow the variation-grammaticalization interface, because the analysis of grammaticalization "allows the elaboration of more refined explanations for the synchronic patterns of distribution of discursive features whose historical origin resides in grammaticalization processes" (TAVARES, 2017, p. 188). Regarding the analysis, from quantitative nature, we consider the following independent variants: gender, age, function performed by the form and compositional extension of the form. In relation to the function, the results showed that tal was favored by the solidarity request, the more grammaticalized function, coisa and tudo were favored by the function of category marking, the less grammaticalized. These results point to the possibility of tal be the most grammaticalized form. The variable independent structure of form couldn’t be analyzed because the variant forms have, for the most part, only one or two compositional elements. With regard to gender, women favored coisa and tudo and men favored tal, which may have two explanations. It could be the advance of the grammaticalization of tal led by men or social spread of coisa and tudo led by women. As for age, the results obtained for coisa allow us to assume the possibility of change led

(9)

by the pre-adolescents. In turn, tal may be undergoing change led by adolescents, with the manifestation of a peak of use, although the phenomenon of age grading can’t be excluded. Finally, tudo does not seem to be going through change. There is a polarity in its use: it is favored by the two older age groups and disadvantaged by the two younger age groups. Summarizing, our research describes the behavior of General Extenders in the speech community under analysis.

Keywords: General Extenders; sociolinguistic variation; grammaticalization; ongoing change.

(10)

LISTA DE TABELAS

Tabela 1: Frequência dos Extensores Gerais em Alemão e Inglês (adaptado)...34

Tabela 2: Distribuição total dos Extensores Gerais no inglês de Toronto (adaptado)...39

Tabela 3: Frequência das formas negativas dos Extensores Gerais...64

Tabela 4: Distribuição dos Extensores Gerais em relação à função...73

Tabela 5: Distribuição dos Extensores Gerais em relação às funções sobrepostas...74

Tabela 6: Distribuição dos Extensores Gerais em relação à extensão das formas...76

Tabela 7: Distribuição dos Extensores Gerais em relação ao sexo dos informantes...79

Tabela 8: Distribuição dos Extensores Gerais em relação à faixa etária...82

LISTA DE QUADROS Quadro 1: Apresentação da literatura...54

(11)

SUMÁRIO INTRODUÇÃO...13 1 REFERENCIAL TEÓRICO...20 1.1 Sociolinguística variacionista...20 1.2 Variação discursiva...23 1.3 Mudança linguística...25 1.4 Gramaticalização...28 1.5 Princípios da gramaticalização...29 1.6 Interface variação-gramaticalização...31 2 ESTADO DA ARTE...33 2.1 Overstreet (2005)...33 2.2 Cheshire (2007)...36 2.3 Tagliamonte e Denis (2010)...38 2.4 Pichler e Levey (2011)...42 2.5 Overstreet (2014)...45 2.6 Fernández (2015)...47 2.7 Tagliamonte (2016)...49 2.8 Secova (2017)...51 3 PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS...57

3.1 Delimitação do contexto variável...57

3.2 Organização do corpus e do método de coleta...61

4 ANÁLISES DOS RESULTADOS...66

4.1 Extensão funcional das variantes...66

4.2 Extensão estrutural das variantes...75

4.3 Fatores extralinguísticos...77

4.3.1 Sexo dos informantes...77

4.3.2 Idade dos informantes...80

(12)

5 CONSIDERAÇÕES FINAIS...86

(13)

INTRODUÇÃO

A presente pesquisa tem como foco de estudo a análise de formas variantes discursivo-pragmáticas como ESSAS COISAS, ESSAS COISAS ASSIM, MUITA COISA ASSIM, TAL, E TAL, TUDO, E TUDO, TUDO ISSO, TUDINHO na indicação da função gramatical de extensão geral em um corpus oral, o Banco de Dados FALA-Natal (cf. TAVARES, 2016), composto por entrevistas sociolinguísticas realizadas na comunidade de fala de Natal.

A fim de possibilitar a análise quantitativa, os Extensores Gerais foram separados em três grupos distintos, sendo o primeiro grupo formado pelas variantes que apresentam como núcleo o substantivo coisa, o segundo grupo composto pelas variantes constituídas pelo pronome demonstrativo tal, enquanto o último grupo é formado pelas variantes que têm o pronome indefinido tudo como núcleo. Cada um desses grupos foi tomado como uma variante, o que quer dizer que a variável linguística objeto deste estudo é composta por três variantes, que foram determinadas segundo critérios de definição do contexto variável propostos em pesquisas anteriores que analisaram o uso dos Extensores Gerais em outras línguas, especialmente o inglês. Esses critérios são mais bem discutidos no capítulo referente aos procedimentos metodológicos.

Neste trabalho, busca-se verificar como fatores sociais e linguísticos interferem na construção dos contextos de uso que favorecem cada uma das formas variantes. Abaixo, seguem algumas ocorrências das variantes extraídas do corpus:

(1) Eu nunca fui dessas de cair, me machucar, ir pro médico, ter que costurar,

essas coisas. (BDFN)

(2) Porque é muito difícil ver meu esposo trabalhar sozinho e ter que sustentar aluguel e tudo. (BDFN)

(3) Eu procuro sempre tá na igreja, com meus irmãos e tal. (BDFN)

(4) Falta muita coisa ainda, principalmente ligada na parte da segurança, mas a gente vê que a cidade tá bem arrumadinha, tudinho. (BDFN)

(14)

Os Extensores Gerais se enquadram, originalmente, como formas discursivo-pragmáticas usadas em uma função que pode ser chamada de marcação de categoria1, em que encaminham o ouvinte a interpretar o elemento precedente como um exemplo ilustrativo de um caso mais geral (cf. PICHLER; LEVEY, 2011). No entanto, os Extensores Gerais podem estar envolvidos em um conjunto de mudanças em andamento, associadas com o processo de gramaticalização, levando à ampliação das funções que esses elementos executam no discurso.

Que seja de nosso conhecimento, ainda não existem no Brasil estudos variacionistas referentes à análise dos Extensores Gerais. No entanto, há diversos pesquisadores que abordam esse fenômeno em outros idiomas, principalmente no inglês. Pichler e Levey (2011), em seu estudo sobre a gramaticalização dos Extensores Gerais no nordeste da Inglaterra sugerem que a multifuncionalidade das formas em dados sincrônicos deve ser o resultado de mudanças semântico-pragmáticas graduais, com novas funções desenvolvidas a partir da função referencial de marcação de categoria.

Essa função é dita referencial, pois, ao desempenhá-la, a forma amplia o conceito de um elemento precedente específico ao qual se refere. Nesse caso, segundo Tagliamonte e Denis (2010), Extensores Gerais são anexados a um sintagma com o objetivo de generalizar um conjunto de coisas às quais o referente desse sintagma pertence. Podemos dizer que há relação de hiponímia > hiperonímia: um ou mais termos específicos – hipônimos – são mencionados e o falante espera que o ouvinte infira o termo/categoria mais geral – o hiperônimo.

No inglês, os Extensores Gerais possuem funções interpessoais como requisição de solidariedade, intensificação e hedge de qualidade2 (cf. OVERSTREET, 2014; FERNÁNDEZ, 2015; SECOVA, 2017). Eles também podem desempenhar papéis no plano da organização textual da conversação, indicando o encerramento de tópico discursivo e a entrega de turno, além de atuarem no preenchimento de pausa (cf. PICHLER; LEVEY, 2011).

Variantes discursivo-pragmáticas são empregadas estrategicamente como ferramentas por meio das quais o falante sinaliza suas atitudes e organiza o discurso.

1 Função definida por Dines (1980 apud PICHLER, 2010), pioneira na análise dos Extensores Gerais. A

autora nomeou o fenômeno de Tag de Marcação de Categoria e a função desempenhada pelas formas de marcação de categoria.

2 Função definida por Overstreet (2005). Ocorre quando o falante quer apontar falta de comprometimento

(15)

Variantes desse tipo historicamente não tiveram tanto espaço nas discussões da sociolinguística variacionista quanto variantes fonológicas e morfossintáticas, visto que, sendo “marginalizadas como manifestações explícitas de disfluências verbais e falta de articulação, preenchedores verbais sem significado e marcadores de hesitação supérfluos, eram consideradas não merecedoras de investigação linguística”3 (PICHLER, 2010, p.

582).

Entretanto, atualmente há interesse crescente, na sociolinguística variacionista, em abordar variantes discursivo-pragmáticas porque elas foram reconceitualizadas como gramaticais, como “elementos integrais e indispensáveis no núcleo do sistema linguístico” (PICHLER, 2013, p. 7).

Além disso, surgiram propostas metodológicas que facilitam a quantificação da variação discursiva, inclusive no que diz respeito à multifuncionalidade das formas. Uma das estratégias que podem ser adotadas para o estudo da variação discursiva é encapsular “os diferentes significados que os traços discursivo-pragmáticos desenvolvem no curso de sua gramaticalização” (PICHLER, 2010), controlando através de grupos de fatores as funções que as variantes desempenham na amostra de dados.

É essa a estratégia que será adotada nesta pesquisa, com diferenças, porém. Consideramos a função de extensão geral como uma macrofunção que recobre diferentes microfunções – que aqui chamaremos de função; a macrofunção, a título de diferenciação, é referida com letras iniciais maiúsculas. As microfunções que identificamos no corpus são: marcação de categoria, requisição de solidariedade, hedge de qualidade, intensificação e encerramento de tópico, descritas no capítulo quatro. Controlamos essas microfunções através de um grupo de fatores.

Seguindo a mesma perspectiva das pesquisas supracitadas, bem como outras que serão apresentadas no segundo capítulo deste trabalho, esta pesquisa tem como fundamentação teórica a interface variação-gramaticalização, tratando-se de uma abordagem desenvolvida de acordo com os pressupostos da sociolinguística variacionista e do paradigma da gramaticalização, sob o ponto de vista do funcionalismo norte-americano. Essa associação implica em contribuições para ambas as áreas, uma vez que “o tratamento da variação linguística pode ser aprimorado com subsídios vindos de estudos sobre a gramaticalização, assim como a análise do processo de gramaticalização

3 “Marginalized as overt manifestations of verbal dysfluencies and inarticulateness, meaningless verbal

(16)

pode ser enriquecida com informações provenientes de análise variacionistas” (GÖRSKI; TAVARES, 2017, p. 35).

Para o funcionalismo norte-americano, a gramática de um determinado indivíduo tem origem a partir de suas experiências pessoais com as formas que a constituem, sendo a gramática influenciada pelo emprego que se faz dela no dia a dia e pela frequência de uso que se dá a suas formas constituintes (cf. HOPPER, 1998). Essa visão maleável da gramática pressupõe que as línguas estão em constante mudança, sendo a gramaticalização um dos processos envolvidos nessa transição. Nesse sentido, gramaticalização é a mudança por meio da qual “itens e construções lexicais passam, em certos contextos linguísticos, a servir a funções gramaticais e, uma vez gramaticalizados, continuam a desenvolver novas funções gramaticais” (HOPPER; TRAUGOTT, 2003, p. 1). Esse processo abrange alterações das formas envolvidas em vários níveis: fonológico, morfossintático, semântico e pragmático.

Já a sociolinguística variacionista defende que a língua apresenta variabilidade de uso em todos os níveis, ou seja, os usuários da língua realizam escolhas entre dois os mais sons, palavras ou expressões. Para essa teoria, do ponto de vista social, a língua é vista como elemento essencial na identificação de grupos e na demarcação de diferenças sociais na comunidade, e do ponto de vista linguístico, como um sistema heterogêneo (cf. GÖRSKI et al., 2003). Assim, pesquisas variacionistas objetivam identificar casos de variação e explicar como e porque eles existem (cf. TAVARES, 2013).

Que seja de nosso conhecimento, não foram realizadas pesquisas sobre os desenvolvimentos diacrônicos que levaram ao uso de COISA, TAL e TUDO como indicadores de extensão geral, portanto não há como estipular qual dessas formas é a mais antiga no desempenho da função sob enfoque. Assim, hipóteses ligadas à possibilidade de uma forma mais antiga na indicação de extensão geral estar mais avançada em seu processo de gramaticalização do que as formas mais recentes não podem ser testadas.

É viável, porém, mediante a análise de fatores comumente ligados ao avanço da gramaticalização, observar se, sincronicamente, uma das formas parece estar mais avançada que as demais. Para tanto, selecionamos dois fatores, a extensão funcional e extensão estrutural. Selecionamos também dois fatores sociais, o sexo e a idade.

Nossa pesquisa tem como objetivo geral descrever e analisar a variação discursivo-pragmática entre formas variantes compostas pelos elementos nucleares COISA, TAL e TUDO na indicação da função gramatical de extensão geral na comunidade de fala de Natal.

(17)

Temos os seguintes objetivos específicos:

(i) Averiguar se uma das formas variantes está em estágio mais avançado de gramaticalização que as demais no que se refere à extensão funcional.

(ii) Verificar se uma das formas variantes está em estágio mais avançado de gramaticalização que as demais no que se refere à extensão formal.

(iii)Avaliar se uma das formas variantes está em estágio mais avançado de mudança que as demais no que se refere ao sexo e à idade dos falantes.

As hipóteses, por sua vez, encontram-se relacionadas a cada um dos objetivos específicos:

(i) Quanto mais gramaticalizado estiver o Extensor Geral, maior será o seu emprego em funções diferentes da marcação de categoria, que é a função menos gramaticalizada dentre as desempenhadas pelos Extensores Gerais (CHESHIRE, 2007; PICHLER, 2010).

(ii) Quanto mais gramaticalizado estiver o Extensor Geral, menor ele será em termos de extensão formal (AIJMER 2002; CHESHIRE, 2007; TAGLIAMONTE; DENIS, 2010).

(iii) Mulheres lideram cerca de 90% das mudanças linguísticas conhecidas (TAGLIAMONTE, 2012), ou seja, são responsáveis pela substituição de um termo comum na comunidade de fala por um termo relativamente novo. Então é possível que, caso seja identificada uma forma variante com gramaticalização mais avançada que as demais em termos de extensão funcional e extensão formal, as mulheres façam maior uso dessa forma. Indivíduos mais jovens tendem a ser líderes de mudança (LABOV, 2008[19721], então é possível que eles estejam na liderança no uso da forma variante mais gramaticalizada.

Se uma das variantes for favorecida por funções diferentes da marcação de categoria e por estruturas de menor extensão, será considerada mais gramaticalizada que as demais sincronicamente, restando a estudos diacrônicos a comprovação ou não dessa possibilidade. Também será tomado como indício de maior gramaticalização o favorecimento de uma das variantes pelas mulheres e por indivíduos mais jovens.

Com o intuito de verificar o comportamento dos Extensores Gerais na comunidade de fala natalense, o corpus, como mencionado anteriormente, é composto por entrevistas

(18)

sociolinguísticas realizadas com indivíduos capazes de representar a comunidade de fala da cidade de Natal. Esses indivíduos foram divididos de acordo com o sexo e em quatro faixas etárias distintas. Desenvolvida como ferramenta facilitadora na captação de dados, a entrevista sociolinguística é amplamente empregada em estudos variacionistas, independente da natureza da variável em análise (cf. MILROY; GORDON, 2003).

Apesar de os primeiros estudos variacionistas envolvendo variáveis discursivo-pragmáticas terem sido realizados, no Brasil, em meados dos anos 1990 (cf. GÖRSKI; VALLE, 2016), não dispomos ainda de estudos que analisem o comportamento variável na codificação de extensão geral. Desse modo, unindo a sociolinguística variacionista e a gramaticalização, a presente pesquisa, em um trabalho pioneiro referente ao português brasileiro, analisa a variação no emprego dos Extensores Gerais em um corpus de fala. Para isso, foi eleita a comunidade de fala de Natal, o que traz um perfil inovador ao estudo, uma vez que são poucas as pesquisas variacionistas que investigam o dialeto natalense.

Outra relevância de pesquisas como esta é que, além de possibilitar o conhecimento científico de determinadas características da língua em uma comunidade de fala específica, também permite estudos comparativos entre comunidades de falas distintas, dentro e fora do país.

Esta dissertação é estruturada em quatro capítulos. No primeiro, Referencial

teórico, apresentamos o referencial teórico adotado nesta pesquisa, uma interface

variação-gramaticalização. Tratamos da sociolinguística variacionista, dando ênfase para a variação discursiva, caso do fenômeno aqui analisado. Em seguida, abordamos o processo de gramaticalização, destacando conceitos e proposições fundamentais para o desenvolvimento desta pesquisa. Concluímos o capítulo expondo vantagens que a interface variação-gramaticalização traz para a investigação de fenômenos variáveis.

O segundo capítulo, Estado da arte, destina-se a apresentar os resultados de pesquisas anteriores sobre o uso dos Extensores Gerais. Estas pesquisas analisam o fenômeno em idiomas distintos: inglês norte-americano, inglês britânico, alemão, francês e espanhol. Dentre elas encontram-se: (i) trabalhos que buscam comparar o uso das formas em idiomas distintos, como Overstreet (2005) e Secova (2017); (ii) estudos que objetivam averiguar se o processo de gramaticalização está envolvido nas mudanças funcionais sofridas pelas formas ao longo do tempo, como Cheshire (2007), Tagliamonte e Denis (2010), Pichler e Levey (2011) e Overstreet (2014).

No terceiro capítulo, Procedimentos metodológicos, sintetizamos o percurso metodológico da pesquisa. Primeiramente, delimitamos o contexto variável

(19)

caracterizando as variantes que compõem o fenômeno em análise. Em seguida apresentamos a constituição do corpus, os procedimentos empregados na coleta dos dados, bem como os grupos de fatores sociais e linguísticos contemplados na análise dos dados.

O capítulo seguinte, Análise dos dados, traz a descrição e interpretação da influência que os grupos de fatores função, extensão formal, sexo e idade exercem sobre o emprego dos Extensores Gerais na comunidade de fala de Natal. Os padrões de distribuição das formas variantes ao longo desses grupos de fatores serão relacionados ao processo de gramaticalização para a identificação de formas mais e menos avançadas no processo de mudança.

(20)

1 REFERENCIAL TEÓRICO

Este capítulo tem como objetivo delinear o referencial teórico da pesquisa. Para tanto, apresentamos a sociolinguística variacionista, com ênfase para a variação discursiva, em associação com os processos de gramaticalização, sob uma perspectiva funcionalista.

1.1 SOCIOLINGUÍSTICA VARIACIONISTA

Surgida nos Estados Unidos, a partir dos estudos do linguista William Labov sobre a modalidade oral do inglês em meados da década de 1960, a sociolinguística variacionista rompeu com as concepções dominantes da época ao tratar da relação entre estrutura linguística e estrutura social. Esse é

o ramo da linguística que estuda as principais características da língua em equilíbrio entre si – estrutura linguística e estrutura social; significado gramatical e significado social – essas propriedades da linguagem que requerem referência a fatores externos (sociais) e internos (sistêmicos) em sua explicação (TAGLIAMONTE, 2006, p. 5).

O objeto de estudo da sociolinguística variacionista é a língua em condição real de uso. Por conseguinte, para observar, descrever e analisar uma língua, o pesquisador deve investigar uma comunidade de fala, que é constituída por um conjunto de pessoas que compartilham inúmeras normas linguísticas. De acordo com Labov (2008 [1972]), uma comunidade de fala não pode ser entendida como um grupo de falantes que usam as mesmas formas; “ela é mais bem definida como um grupo que compartilha as mesmas normas a respeito da língua” (cf. LABOV, 2008 [1972]).

Seguindo a mesma concepção de Labov (2008 [1972]) porém buscando aprofundá-la, Guy (2001 apud COELHO, et al., 2015) formulou uma definição para comunidade embasada em três pontos: os falantes devem compartilhar traços linguísticos que sejam diferentes de outros grupos; deve ter uma frequência alta de comunicação entre si; e devem ter as mesmas normas e atitudes em relação ao uso da linguagem (cf. GYU, 2001 apud COELHO, et al., 2015).

Como esta pesquisa é pioneira na abordagem aos Extensores Gerais na fala de Natal, a análise que adotamos é a que toma como fonte de dados a comunidade de fala ampla de Natal e que tem como objetivo apresentar as primeiras generalizações sobre os usos de Extensores Gerais nessa comunidade. Para aprofundamento de resultados aqui

(21)

obtidos, estudos futuros podem recorrer a redes sociais e/ou comunidades de prática. Não recomendamos a realização desse tipo de estudo sem primeiro obterem-se os padrões de distribuição geral das variantes em uma comunidade de fala, com o intuito de possibilitar o estabelecimento de relações entre o comportamento de grupos menores e o padrões geral da comunidade de fala, para poder explicar esses padrões de modo mais refinado e para poder diferenciar o que é específico aos grupos menores e o que é característico da comunidade de fala mais ampla.

A rede social de um indivíduo é o conjunto de relações que esse indivíduo mantém com outros em diferentes contextos (família, escola, trabalho, lazer). As redes podem ser densas, com maior número de contatos com indivíduos internos ao grupo, ou frouxas, com contato intenso também com indivíduos externos ao grupo (cf. MILROY, 2003).

A comunidade de prática é um agrupamento de indivíduos menor que o de uma rede social. Esses indivíduos são reunidos em torno de um empreendimento comum (cf. MEYERHOFF, 2006). Cada indivíduo é entendido como “agente articulador de uma variedade de modos de participação em diferentes comunidades de prática (ECKERT; MCCONNEL-GINET, 2010 [1992], p. 103). Como exemplos de comunidades de prática já estudadas, temos yuppies em Beijin (China), gays e adolescentes em escolas (ECKERT, 2012).

As discussões a respeito da influência de fatores sociais na mudança linguística remontam do século XIX, quando Whitney (1901 apud LABOV, 2008 [1972]) já afirmava que a fala não pertence a um indivíduo, mas aos membros da sociedade. Buscando fazer uma análise baseada na interação entre língua e sociedade, a sociolinguística variacionista defende que “a base do conhecimento intersubjetivo na linguística tem de ser encontrada na fala – a língua tal como usada na vida diária por membros da ordem social” (LABOV, 2008 [1972], p. 13). A língua, que era (e ainda é) vista, pela abordagem teórica dominante da época, a gerativista, como um sistema estável e homogêneo, passa a ser vista como socialmente dinâmica, apresentando variabilidade de uso em todos os níveis. Ou seja, a língua é “um sistema ordenadamente heterogêneo em que a escolha entre alternativas linguísticas acarreta funções sociais e estilísticas, um sistema que muda acompanhando as mudanças na estrutura social” (WEINREICH; LABOV; HERZOG, 2006, p. 99).

Sob essa perspectiva, pesquisas variacionistas voltam-se a casos de variação para explicar as motivações de sua existência. A variação, embora seja inerente à língua, não ocorre de modo aleatório, por isso pode ser sistematizada e analisada quantitativamente

(22)

(cf. COELHO et al., 2015). Na verdade, “um dos principais objetivos da sociolinguística variacionista é a descoberta dos padrões de distribuição das formas variantes” (TAVARES, 2013, p. 29), possibilitando que fatores condicionadores de natureza social, estilística e linguística sejam relacionados ao uso dessas formas.

Para que um estudo variacionista seja implementado, deve-se considerar como objeto de investigação a variável linguística, que é o conjunto das diferentes formas que representam o mesmo significado/função (cf. TAGLIAMONTE, 2012). Essas formas são chamadas de variantes. A questão da função desempenhada pelos Extensores Gerais é abordada no terceiro capítulo.

A variável linguística é um conceito que foi desenvolvido por Labov (1963,1966) inicialmente para satisfazer a pesquisa variacionista de fenômenos fonológicos. Para que formas fossem consideradas variantes de um mesmo fenômeno, era necessário haver entre elas equivalência semântica. Entretanto, à medida que os estudos variacionistas avançaram, pesquisadores, incluindo começaram a investigar a variação em níveis mais altos da língua e o critério da equivalência semântica deixou de ser compatível na definição de algumas variáveis. Variáveis discursivas, incluindo os Extensores Gerais analisados nesta pesquisa, estão inclusas nesses fenômenos que não se encaixam no parâmetro da equivalência semântica. Isso será retomado na próxima seção.

Em busca da sistematização e análise quantitativa da variação, as pesquisas sociolinguísticas relacionam as formas concorrentes a grupos de fatores motivadores, linguísticos, estilísticos e sociais. Neste estudo, consideramos dois grupos de fatores de natureza social, sexo e idade, e dois grupos de fatores de natureza linguística, a função desempenhada pelas formas variantes e sua extensão formal.

(23)

1.2 VARIAÇÃO DISCURSIVA

Variantes discursivas são empregadas estrategicamente como ferramentas por meio das quais o falante sinaliza suas atitudes e organiza o discurso. Desse modo, são essenciais na interação social. A respeito dessas variantes, Cheshire (2016, p. 252) salienta:

Elas nos permitem sinalizar a estrutura do nosso discurso enquanto falamos, por exemplo, marcando o fim do discurso relatado. Elas também ajudam a organizar a tomada de turnos, mostrando que aceitamos o turno ou que concluímos nosso turno e, às vezes, como queremos que nossa oração seja compreendida. Eles marcam entendimentos compartilhados assumidos entre os falantes, mostram nossa atitude em relação ao que dizemos, e podem ser usados como preenchedores para ganhar tempo quando planejamos e produzimos nosso discurso.

Quando se considera a exigência de equivalência semântica, o enquadramento de fenômenos discursivos no conceito de variável linguística não é uma tarefa simples. Sobre essa questão, Pichler (2013) afirma que variantes discursivas são semanticamente esvaziadas e apresentam características sintáticas opcionais, o que dificulta a identificação das não ocorrências e, assim, respeitar o princípio da contabilidade, uma vez que, de acordo com esse conceito, o pesquisador deve identificar todas as variantes da categoria funcional visada e anotar as ocorrências reais e potenciais de cada variante.

No que diz respeito aos Extensores Gerais, Dines (1980), em estudo pioneiro, propôs substituir a condição da equivalência semântica pela de comparabilidade funcional entre as formas, uma vez que os Extensores Gerais têm a função comum de marcar o elemento precedente como um membro de uma categoria. A autora pontua que “variáveis podem ser postuladas com base em funções comuns no discurso [o que] não exclui a possibilidade de igualdade semântica existente entre as variantes, mas remove a necessidade dessa igualdade” (DINES, 1980 apud TERKOURAFI, 2011, p. 354). Entretanto, de acordo com pesquisas mais recentes (cf. OVERSTREET, 2005; CHESHIRE, 2007; TAGLIAMONTE; DENIS 2010, entre outras), essa não é a única função exercida pelos Extensores Gerais.

De acordo com Pichler (2010), a circunscrição da variável linguística com base na semelhança estrutural entre as variantes é a melhor forma de lidar com a complexidade da variação discursiva, uma vez que esse método possibilita uma delimitação mais precisa do conjunto de variantes.

(24)

Posteriormente, Pichler (2013) aprimora a sua proposta da equivalência estrutural, substituindo-a pela de equivalência derivacional, que leva em conta camadas polissêmicas das variantes discursivas em dados sincrônicos ao mesmo tempo em que garante que haja algo em comum entre elas. Variantes discursivas agrupadas segundo essa perspectiva são derivadas de uma mesma cadeia linear.

Essa modalidade de delimitação do contexto variável apresenta vantagens na investigação de fenômenos discursivos, pois “delimita a análise a um conjunto finito de variantes derivadas da mesma fonte; e conduz uma investigação de acordo com o princípio da contabilidade” (PICHLER, 2013, p. 31).

Entretanto, alguns pesquisadores têm abordado a variação discursiva adotando tanto o viés da função quanto o da similaridade estrutural (ou equivalência derivacional, em alguns casos) com o intuito de garantir uma delimitação mais completa do contexto variável. Para Waters (2016, p. 43):

Um exame mais detalhado do recente trabalho quantitativo de variação, entretanto, demonstra que a necessidade putativa de escolher entre a função e a forma, ou seja, considerar apenas uma ou outra, não é refletida em todos os estudos e a consideração da função e da forma na definição de variáveis discursivo-pragmáticas não é apenas comum, na maioria das análises de variação, mas é de fato necessária para algumas análises.

Tagliamonte (2016), em sua análise sobre os Extensores Gerais em dialetos conservativos, segue essa perspectiva e identifica as variantes usando uma combinação entre o modelo funcional e o estrutural. A autora defende que esse método de delimitação da variável é necessário, visto que, “à medida que a pesquisa sobre Extensores Gerais se expandiu, os limites do que pode ser tratado como um Extensor Geral se ampliou para abranger formas adicionais e, em alguns casos, funções adicionais” (TAGLIAMONTE, 2016, p. 116).

Em nossa pesquisa, a variável Extensão Geral é definida de acordo com o critério de equivalência funcional das variantes, mas também considera o critério de equivalência estrutural, questão retomada no capítulo 4.

(25)

1.3 MUDANÇA LINGUÍSTICA

Além de analisar fatores motivadores da variação entre formas, os estudos desenvolvidos sob a perspectiva da sociolinguística variacionista buscam compreender e explicar a evolução linguística por meio dos fenômenos variáveis. Segundo Weinreich, Labov e Herzog (1963, p. 188), “nem toda variabilidade e heterogeneidade na estrutura linguística envolve mudança, mas toda mudança envolve variabilidade e heterogeneidade”.

As variantes podem coexistir de modo estável na indicação de uma determinada função ou uma das variantes pode estar em processo de eliminação da outra(s) variante(s), o que é característico de mudança em andamento.4 Outro tipo de mudança também pode ser investigada sob um olhar variacionista. Trata-se daquela denominada por Labov (2008 [1972]) de mudança em tempo real, que envolve o rastreamento do processo histórico de mudança em diferentes épocas da língua.

Para Labov (2008 [1972]), estudar a mudança em andamento, por meio dos processos de variação, é um meio de capturar a evolução da língua, e, para isso, é necessário levar em consideração o princípio da uniformidade que garante que “os mesmos mecanismos que operaram para produzir as mudanças em larga escala do passado podem ser observados em ação nas mudanças que presentemente ocorrem à nossa volta” (LABOV, 2008 [1972], p. 192).

O sistema linguístico está em constante processo de desenvolvimento e, por isso, é comum que estejam sempre emergindo inovações na língua. Ao buscar indícios de mudança na língua, os estudos variacionistas podem seguir uma perspectiva de análise em tempo real ou uma perspectiva de análise em tempo aparente, envolvendo dados de épocas passadas e/ou dados atuais, respectivamente. Ao realizar um estudo em tempo real, o pesquisador deve observar dados extraídos da comunidade de fala em dois pontos distintos no tempo. Qualquer diferença entre esses dois recortes deve ser entendida como mudança. (cf. LABOV, 1994). Na outra concepção, a de um estudo em tempo aparente,

4 Mudança em andamento, também denominada mudança em progresso e mudança em curso, refere-se a uma situação sincrônica em que existe correlação significativa entre a idade dos informantes e o fenômeno variável averiguado, observando-se diferenças nas frequências das variantes entre falantes mais jovens e mais velhos, o que é denominado por Labov (2008 [1972]) de mudança em tempo aparente.

(26)

os dados empregados na análise são provenientes de diferentes faixas etárias e, caso sejam encontradas distinções de emprego das formas entre essas faixas, o pesquisador deve investigar se é uma situação de mudança em andamento ou gradação etária (cf. LABOV, 1994).

A gradação etária acontece quando informantes de diferentes idades empregam a língua de modo diferente pelo fato de estarem em diferentes estágios de suas vidas (cf. TAGLIAMONTE, 2012). Esses informantes usam traços de fala apropriados a sua idade, sem que essas particularidades estejam presentes nas demais faixas etárias da comunidade – se estiveram, serão de baixa recorrência. Ou seja, “se os indivíduos mudam seu comportamento linguístico ao longo de suas vidas, mas a comunidade como um todo não muda, o padrão pode ser caracterizado como gradação etária” (LABOV, 1994, p. 84). Nesse caso não há mudança linguística, mas uma variação estável.

Em estudos desenvolvidos sob a perspectiva do tempo aparente, a fim de diferenciar casos de mudança em curso dos casos de gradação etária, o pesquisador deve considerar o comportamento das variantes em relação aos demais fatores controlados na pesquisa. Para que haja mudança, os demais fatores devem apresentar resultados na mesma direção da idade. Nesse sentido:

Quaisquer outras escalas crescentes ou decrescentes resultantes da distribuição de fatores linguísticos e sociais podem auxiliar no mapeamento da mudança em progresso, pois o aumento de frequência de uma das variantes em um ou mais ambientes pode estar sinalizando sua extensão para um maior número de setores do sistema linguístico e/ou da comunidade de fala (TAVARES, 2014, p. 130).

Labov (2001) propôs os seguintes princípios gerais de mudança linguística:

Princípio 1:

“A mudança linguística que se origina em um grupo social central, localizado no interior da hierarquia socioeconômica” (LABOV, 2001, p. 188).

Princípio 2:

“Para as variáveis sociolinguísticas estáveis, as mulheres apresentam uma taxa menor de variantes estigmatizadas e uma taxa maior de variantes de prestígio do que os homens” (LABOV, 2001, p. 266).

Princípio 3:

“Na mudança linguística from above, as mulheres adotam formas de prestígio em uma taxa mais alta do que os homens” (LABOV, 2001, p. 274).

(27)

Princípio 4:

“Na mudança linguística from below, as mulheres usam frequências maiores de formas inovadoras do que os homens” (LABOV, 2001, p. 292).

Mudança linguística from below (mudança por disseminação) e mudança linguística from above (mudança por difusão), para Labov (1994), estão acima e abaixo do nível de consciência social, relacionando-se também com posições na hierarquia social. Desse modo, “alguns traços estereotipados são muito estigmatizados. [...] Outros têm prestígio variável, positivo para algumas pessoas e negativo para outras” (LABOV, 1994, p. 361).

Sendo assim, essa mudanças referem-se à natureza e à origem da mudança que está em andamento. A mudança linguística que começa e se espalha dentro do próprio sistema linguístico, que é mudança tida como normal, é denominada de mudança linguística from below (também conhecida como mudança por disseminação) (cf. TAGLIAMONTE, 2012). A mudança denominada de mudança linguística from above (também conhecida como mudança por difusão), ao contrário da anterior, tem sua origem fora do sistema linguístico (cf. TAGLIAMONTE, 2012).

Nossa pesquisa segue uma perspectiva de análise em tempo aparente, uma vez que não há dados disponíveis na comunidade de fala de Natal que possibilitem uma investigação em tempo real. Na análise da distribuição etária dos falantes, avaliamos a possibilidade de uma mudança estar em andamento, bem como a possibilidade de que essa distribuição revele gradação etária.

(28)

1.4 GRAMATICALIZAÇÃO

O linguista francês Antoine Meillet foi, provavelmente, o criador do termo “gramaticalização”. Foi ele quem primeiro reconheceu a importância do processo de gramaticalização para a investigação da mudança linguística. Além disso, Meillet foi também o primeiro linguista a dedicar um estudo exclusivo para essa área (cf. HOPPER; TRAUGOTT, 2003). A definição dada pelo autor diz que gramaticalização é “a atribuição de características gramaticais a uma palavra anteriormente autônoma” (MEILLET, 1912

apud HOPPER; TRAUGOTT, 2003, p. 19).

Nos estudos mais recentes, a concepção de gramaticalização ainda conserva esse caráter de aquisição de propriedades gramaticais, e a expressão pode ser entendida como etapas por meio das quais os itens que compõem a língua se tornam mais gramaticais. Para Hopper e Traugott (2003, p. 1), a gramaticalização “refere-se àquela parte do estudo da mudança linguística que se preocupa em demonstrar como itens lexicais e construções passam, em certos contextos linguísticos, a servir a funções gramaticais ou como itens gramaticais desenvolvem novas funções gramaticais”.

A gramaticalização envolve diferentes processos de mudança. Heine e Kuteva (2007) destacam os seguintes: (i) extensão, pela qual a forma é ampliada a novos contextos de uso, adquirindo, assim, novos significados gramaticais (reinterpretação induzida pelo contexto); (ii) dessemantização (desbotamento semântico), pela qual a forma sofre perda (ou generalização) de significado referencial; (iii) decategorização, pela qual a forma tem alteradas propriedades morfossintáticas típicas de seu uso lexical ou de seu uso em outra função gramatical prévia; (iv) erosão (redução fonética), pela qual a forma tem diminuída a sua substância fonética. Essas mudanças, segundo Cheshire (2007), não ocorrem necessariamente na mesma velocidade. Nas palavras de Brinton e Traugott (2005, p. 100), a “gramaticalização é gradual no sentido de que ela não é instantânea e se desenvolve em passos bem pequenos e tipicamente sobrepostos, intermediários e, às vezes, indeterminados.”

Traugott (1982) propõe que a gramaticalização se desenvolve em um percurso de subjetivização crescente composto pelas seguintes etapas: ideacional > textual > interpessoal. Nesse percurso, significados referenciais (objetivos, extralinguísticos) dão origem a significados ligados à articulação textual, que, por sua vez, dão origem a significados ligados a expressividade e atitude.

(29)

Traugott e Köning (1991) assim refinam o percurso de subjetivização crescente: (i) situação descritiva externa > situação interna (avaliação, percepção, cognição); (ii) situação externa ou interna > situação textual; (iii) situação textual > estado de crença subjetiva do falante.

Posteriormente, Traugott (2003) e Traugott e Dasher (2005) acrescentam uma etapa pela qual a forma passa de significados subjetivos a significados intersubjetivos, o que representa a divisão da função interpessoal em dois componentes: o subjetivo, com orientação para o falante, e o intersubjetivo, com orientação para o ouvinte.

Dois processos de mudança semântica estariam na origem desses significados: (i) a subjetivização, pela qual “expressões passam a codificar significados baseados na avaliação do falante sobre o estado de coisas em discussão” (TRAUGOTT, 2010, p. 107), e a (ii) intersubjetivização, pela qual ocorre “o desenvolvimento de significados que sinalizam que o falante reconhece a “face” e o ponto de vista do ouvinte” (cf. TRAUGOTT, 2010, p. 107).

1.5 PRINCÍPIOS DA GRAMATICALIZAÇÃO

Hopper (1991) propõe cinco princípios de gramaticalização – estratificação, divergência, especialização, persistência e decategorização – capazes de diagnosticar o surgimento de formas gramaticais, além de identificar diferentes graus de gramaticalização em formas já gramaticais. Por conferirem aos elementos analisados o status de “mais” ou “menos” gramaticalizados, esses princípios acentuam o caráter gradual da gramaticalização (cf. GONÇALVES; CARVALHO, 2007).

Estratificação é o princípio que trata da coexistência de camadas dentro de um mesmo domínio funcional. Como consequência da mobilidade gramatical, novas camadas estão surgindo continuamente e “à medida que isso acontece, as camadas mais antigas não são necessariamente descartadas, mas podem permanecer para coexistir e interagir com as camadas mais novas” (HOPPER, 1991, p. 22). Isso acontece devido à lentidão na substituição das formas antigas pelas mais recentes e, em alguns casos, essa substituição nunca chega a acontecer. Segundo Hopper (1991), essas camadas podem se especializar para itens lexicais particulares, classes particulares de construções ou registros sociolinguísticos. Além disso, as camadas também podem ser reconhecidas como alternativas "estilísticas".

(30)

A divergência trata dos casos de gramaticalização em que a forma original, mesmo depois de sofrer a mudança, ainda se conserva como um elemento lexical autônomo e, desse modo, pode sofrer as mesmas mudanças que qualquer outro item lexical.

O princípio da especialização relaciona-se à redução no número de formas disponíveis na indicação de uma determinada função. Essa redução acontece à medida que uma das opções de codificação passa a ser mais empregada, adquirindo um significado mais geral. A especialização de uma forma na indicação de uma função é indício de um elevado estágio de gramaticalização dessa forma.

Há casos de especialização em que as formas concorrentes adquirem significados mais particulares, ou até mesmo passam a ser empregadas em contextos distintos peculiares. Tendo isso em vista, Tavares (2014) propõe a especialização por especificação, uma vez que, nesses casos, as formas não se especializam de modo generalizado. Ou seja, “nenhuma forma seria excluída ou generalizada para cobrir todas as funções pertinentes a um domínio particular, mas cada uma seria empregada em certas funções e/ou contextos particulares pertinentes ao domínio” (TAVARES, 2014, p. 109).

Quanto ao princípio da persistência, Hopper (1991) afirma que, ao passar pelo processo de gramaticalização, desde que seja gramaticalmente viável, algumas formas podem conservar alguns traços semânticos da forma original e isso pode resultar em restrições sintáticas no uso da forma gramaticalizada. Nesse caso, “espera-se que uma forma seja polissêmica, e que um ou mais de seus significados reflitam traços anteriores, capazes de interferir no modo como é utilizada pelos usuários atuais da língua” (TAVARES, 2014, p. 109).

O último princípio proposto por Hopper (1991) é o da decategorização, segundo o qual as formas em processo de gramaticalização tendem a perder ou neutralizar as marcas que caracterizam as formas plenas como nomes e verbos, passando a assumir características mais gramaticalizadas. Ou seja, “as formas que sofrem gramaticalização tendem a perder ou neutralizar os marcadores morfológicos e os privilégios sintáticos característicos das categorias plenas nome e verbo, e a assumir atributos característicos de categorias secundárias como adjetivos, particípios, preposição etc.” (HOPPER, 1991, p. 22).

Os processos de mudança abordados na subseção 1.4 e os princípios de gramaticalização apresentados na seção 1.5 são mobilizados para a explicação dos resultados obtidos nesta pesquisa.

(31)

1.6 INTERFACE VARIAÇÃO-GRAMATICALIZAÇÃO

Há pesquisadores afiliados à sociolinguística variacionista que vêm recorrendo à gramaticalização, de um ponto de vista funcionalista, em suas pesquisas. Essa interface possibilita ao pesquisador alcançar resultados apurados a respeito da variação, pois a análise da gramaticalização “permite a elaboração de explicações mais refinadas para os padrões sincrônicos de distribuição de variantes discursivas cuja origem histórica reside em processos de gramaticalização” (TAVARES, 2017, p. 188).

A interface variação-gramaticalização acrescenta benefícios teóricos tanto para os estudos variacionistas quanto para os estudos sobre a gramaticalização. A sociolinguística variacionista proporciona uma investigação mais profunda dos processos de gramaticalização, posto que considera na análise todas as formas que exercem dada função, enquanto “a gramaticalização é geralmente interpretada – e estudada – como o conjunto de mudanças envolvidas na associação de uma forma com um novo significado ou função (presumivelmente mais gramaticais), minimizando ou mesmo ignorando o papel de outras camadas que coexistem nesse contexto” (POPLACK, 2011, p. 176). Isso gera uma visão parcial do processo de gramaticalização. A esse respeito, Görski e Tavares (2017, p. 39) salientam que “alterações nos padrões de uso de uma das formas podem influenciar os padrões de usos das demais”, o que possivelmente afetará o processo de gramaticalização de cada forma.

Além disso, a análise multivariada empregada pela pesquisa variacionista permite a identificação de alterações tênues nos padrões de variação das formas, sejam essas alterações diacrônicas ou sincrônicas, o que pode ser indício de avanço no processo de gramaticalização das variantes. Ou seja, “se elas estiverem passando por expansão de contexto de uso, análises multivariadas detalhadas poderão servir de diagnóstico para identificação dessas expansões” (GÖRSKI; TAVARES, 2017, p. 40).

Por sua vez, os estudos sobre gramaticalização beneficiam a investigação da variação linguística por possibilitar ao pesquisador a identificação da origem de cada forma variante que compõe uma variável linguística, e também por possibilitar a proposição de hipóteses diacrônicas testáveis sincronicamente. Segundo Görski e Tavares (2017, p. 39), padrões de distribuição das formas variantes “podem ser distintos porque as formas derivaram de diferentes fontes e/ou porque passaram por diferentes processos de gramaticalização”.

(32)

Ademais, ao trabalhar na interface variação-gramaticalização, o pesquisador pode circunscrever a variável linguística através de uma perspectiva estrita, o que requer que as variantes desempenhem a mesma função. Todavia, o pesquisador também pode optar por uma perspectiva mais ampla, levando em conta as diferentes etapas do percurso de gramaticalização das formas envolvidas.

Esta pesquisa é fundamentada teoricamente na interface variação-gramaticalização, considerando que “fatores semânticos e pragmáticos condicionadores da variação discursiva são frequentemente correlacionados ao processo de gramaticalização [...] que pode fundamentar explicações não apenas para a origem da variação, mas também para padrões de distribuição sincrônica das variantes” (TAVARES, 2017, p. 189).

O próximo capítulo apresenta pesquisas que se empenharam em investigar o uso dos Extensores Gerais em idiomas como inglês e espanhol.

(33)

2 ESTADO DA ARTE

Embora não houvesse, até o momento, no Brasil, estudos que se dedicassem a análise da variação no emprego dos Extensores Gerais, essas formas começaram a ser analisadas no inglês, segundo uma perspectiva variacionista, desde 1980, quando Dines (1980) questionou a extensão do conceito de variável linguística para a investigação de fenômenos não fonológicos. A autora propôs substituir a obrigação da equivalência semântica por uma comparabilidade funcional entre as formas e ilustrou sua proposição por meio da análise da variação nos Extensores Gerais.

A partir desse estudo pioneiro, uma série de pesquisas com dados de diferentes línguas seguiu o mesmo trajeto, buscando explicar como ocorre e o que motiva a variação no emprego das variantes na indicação de extensão geral.

Este capítulo sintetiza alguns estudos que objetivaram examinar o uso dos Extensores Gerais no inglês norte-americano, inglês britânico, alemão, francês e espanhol, todos sob a ótica da sociolinguística variacionista, e alguns deles constituindo uma interface com a gramaticalização, interface também adotada por nós. Os trabalhos são listados a seguir segundo uma ordem cronológica.

2.1 OVERSTREET (2005)

Overstreet (2005) apresenta uma análise comparativa entre Extensores Gerais produzidos por falantes em dois idiomas distintos, inglês e alemão. O objetivo da autora é comparar a frequência e a distribuição das formas, bem como encontrar similaridades e diferenças nas funções pragmáticas desempenhadas por cada forma em ambas as línguas. A autora acredita que esse tipo de estudo, que envolve comparação entre idiomas, pode ajudar os pesquisadores a definir com mais precisão as funções centrais das expressões pragmáticas analisadas, além de auxiliar no desenvolvimento de uma metalinguagem adequada para descrevê-las.

Nessa pesquisa, são empregados dois corpora coletados pela própria autora, sendo o primeiro constituído por 10 horas de conversação realizada entre 18 pessoas da mesma família e amigos. Os participantes têm entre 23 e 64 anos e são nativos de variadas partes dos Estados Unidos. O segundo corpus utilizado na pesquisa é constituído por 14 horas de conversação realizada entre 20 pessoas da mesma família e amigos. Nesse corpus, os participantes têm entre 20 e 56 anos e são nativos de diversas partes da Alemanha.

(34)

Seguindo o modelo tradicional de configuração dos Extensores Gerais (conjunção + frase nominal), Overstreet (2005) elege as variantes a serem comparadas por meio de suas características formais. No Inglês, há duas modalidades possíveis de Extensores Gerais, a primeira correspondendo às formas iniciadas com and (Extensores Gerais adjuntivos) e a segunda às formas iniciadas com or (Extensores Gerais disjuntivos). De modo semelhante, no alemão, também há duas modalidades possíveis de variantes, os iniciados com und (Extensores Gerais adjuntivos) e os iniciados com oder (Extensores Gerais disjuntivos).

Contudo, apesar de as variantes apresentarem similaridade formal, elas não são idênticas. Segundo a autora, ao considerar as formas mais frequentes em cada idioma é perceptível que, enquanto no alemão as formas disjuntivas e adjuntivas recebem o mesmo complemento so (und so / oder so), no inglês há um comportamento diferente, uma vez que cada forma recebe um complemento distinto, sendo stuff mais empregado em formas adjuntivas (and stuff) e something mais empregado em formas disjuntivas (or something).

Tabela 1: Frequência dos Extensores Gerais em Alemão e Inglês English (10 h)

and all 3

and all that stuff 4

and blah blah blah 4

and everything 12

and stuff 29

and things like that 3

or anything 19

or something 42

or something like that 4

or what 4 or whatever 16 Total adjunctive 67 Total disjunctive 89 Total 156 German (14 h) und so 32 und so weiter 3

und was weiß ich 3

und (so’n) Zeug 3

und solche Sachen 3

und alles Mo¨gliche 3

und so was 3

(35)

oder so was 19

oder was weiß ich 10

Total adjunctive 57

Total disjunctive 90

Total 147

Fonte: Overstreet (2005, p. 1848)

No que se refere à função, Overstreet (2005) identificou sete aplicações em comum entre os Extensores Gerais realizados no inglês e no alemão. As formas iniciadas com and e und aparecem em quatro contextos diferentes indicando: (i) intersubjetividade, quando o falante faz suposições de que o interlocutor compartilha com ele experiências ou conhecimentos a respeito de determinado assunto; (ii) requisição de solidariedade, quando o falante objetiva testar a compreensão do ouvinte em relação ao que está sendo dito; (iii) iconicidade, quando o falante emprega formas compostas ou duplica a forma utilizada para indicar que “muito mais” poderia ser dito; e (iv) avaliação, quando o falante deseja indicar que o “o algo mais” que poderia ser dito tem pouca importância no diálogo.

As formas iniciadas com or e oder, segundo a autora, foram utilizadas de três modos distintos indicando: (i) hedge, quando o falante quer apontar falta de comprometimento ou incerteza sobre o que está sendo dito; (ii) ausência de cortesia, quando o falante emprega os Extensores Gerais para indicar falta de comprometimento com o que está sendo dito e, além disso, sugerir alternativas possíveis; e (iii) ênfase, quando o falante objetiva estimular uma resposta a um determinado questionamento.

Na análise dos dados, Overstreet (2005) também encontrou funções que não apresentaram equivalência entre os idiomas. Apenas no inglês os interlocutores aplicaram Extensores Gerais com o objetivo de intensificar alguma informação, ao mesmo tempo em que solicitavam concordância do ouvinte a respeito de um julgamento sobre o assunto em questão. E apenas no alemão algumas variantes foram usadas com o objetivo de mostrar que o conteúdo de uma oração é potencialmente impreciso e que a precisão não é importante.

(36)

2.2 CHESHIRE (2007)

Conceituando Extensores Gerais como uma classe de expressões que, tipicamente, ocorrem na posição final da oração e que apresentam a estrutura básica de conjunção (and e or) somada a uma frase nominal, Cheshire (2007) busca analisar se o processo de gramaticalização leva à mudança estrutural das formas e se todas as formas são afetadas pela gramaticalização na mesma medida. Além disso, a autora objetiva ampliar a compreensão dos significados e funções dos Extensores Gerais, mostrando que, dentre todas as possíveis aplicações das formas, não há uma função principal desenvolvida por elas.

Os dados analisados na pesquisa foram extraídos de 96 entrevistas realizadas com adolescentes de 14 e 15 anos de idade. Essas entrevistas ocorreram nas cidades inglesas de Hull, Milton Keynes e Reading, e os informantes foram divididos de forma igualitária entre cada cidade, o que resulta em 32 entrevistas para cada localidade. Além disso, os adolescentes foram classificados de acordo com o tipo de escola que frequentavam: 16 entrevistas foram realizadas em escolas voltadas para a classe alta e 16 em escolas voltadas para a classe trabalhadora. Os entrevistadores gravaram oito homens e oito mulheres em cada escola e essas gravações ocorreram em dois momentos distintos, sendo o primeiro uma entrevista face-a-face com o pesquisador, e o segundo momento diálogos entre pares de amigos. Os fatores sociais controlados nessa pesquisa foram o sexo, a classe social e a localização geográfica.

De um modo geral, os informantes de todas as cidades apresentaram um maior uso das variantes iniciadas com and, as adjuntivas. Ao analisar separadamente as formas adjuntivas, a autora verificou que and that foi a forma mais empregada por adolescentes da classe trabalhadora nas três cidades, enquanto os adolescentes das classe média, em todas as cidades, preferiram and stuff. Entre as formas disjuntivas, or something predominou na fala dos adolescentes nas cidades de Reading e Milton Keynes, entretanto na cidade de Hull, os adolescentes da classe trabalhadora preferiram o emprego de or

summat. Para Cheshire (2007), a diferença entre classes sociais no emprego das formas

adjuntivas pode indicar que elas estão funcionando como um indicador social. Segue, abaixo, alguns exemplos de uso das formas:

(37)

Você pode simplesmente pegar um ônibus e entrar direto em Hull e esse tipo de coisa.

b) Uh I cook occasionally on weekends and things.

Eu cozinho ocasionalmente nos fins de semana e coisas/e tal.

c) They’re probably more into like Indie music and stuff like that.

Elas, provavelmente, são mais como a música Indie e coisas assim.

No que se refere à gramaticalização, Cheshire (2007) avaliou como o processo de gramaticalização influenciou no emprego das formas. A autora fundamenta-se no fato de que em uma construção que está passando pelo processo de gramaticalização, palavras que antes eram separadas podem passar a ser armazenadas e processadas como uma frase pré-fabricada, sua hipótese é de que as formas curtas and stuff, and things, and everything e or something derivaram de formas mais longas tais como and stuff/things/everything

like that e or something like that, o que caracteriza um processo de redução fonética. Os

resultados mostraram que, com exceção de and things na cidade de Hull, a frequência dos Extensores Gerais pode ser interpretada como uma possível redução fonética em andamento, uma vez que as formas reduzidas foram empregadas significativamente mais que as formas longas.

Ao analisar o uso dos Extensores Gerais, de acordo com Cheshire (2007), o pesquisador deve esperar que o nome núcleo dos Extensores Gerais que não sofreram processo de gramaticalização apresente as mesmas características sintáticas e semânticas que o substantivo precedente ao qual está vinculado anaforicamente. Caso não haja essa compatibilidade sintática e semântica, significa que a forma passou ou está passando por um processo de decategorização. A autora observou que, embora todas as variantes mais frequentes pareçam estar sofrendo decategorização, há algumas formas, como and that,

and everything e or something, que parecem estar em um estágio mais avançado quanto

à decategorização em todas as cidades, uma vez que foram empregadas com diferentes tipos de precedentes, inclusive frases nominais e adjetivos.

Cheshire (2007) menciona que algumas pesquisas anteriores, como a de Dines (1980), apontaram que o papel principal dos Extensores Gerais era levar o ouvinte a entender que o elemento precedente a ele, e ao qual estava vinculado, era um exemplo ilustrativo de uma categoria mais geral. Porém, com o avanço do processo de decategorização, o vinculo semântico e sintático entre o Extensor Geral e seu referente enfraqueceria, levando a uma mudança semântica. Quanto a essa questão, Cheshire

Referências

Documentos relacionados

Página TABELA 30 - Tempos de indução, manutenção e retorno, em minutos, das concentrações mais indicadas, em mg/L, para sedação e anestesia, de girinos de rã- touro

Este trabalho buscou, através de pesquisa de campo, estudar o efeito de diferentes alternativas de adubações de cobertura, quanto ao tipo de adubo e época de

Preliminarmente, alega inépcia da inicial, vez que o requerente deixou de apresentar os requisitos essenciais da ação popular (ilegalidade e dano ao patrimônio público). No

17 CORTE IDH. Caso Castañeda Gutman vs.. restrição ao lançamento de uma candidatura a cargo político pode demandar o enfrentamento de temas de ordem histórica, social e política

O enfermeiro, como integrante da equipe multidisciplinar em saúde, possui respaldo ético legal e técnico cientifico para atuar junto ao paciente portador de feridas, da avaliação

(Pensamento Político). A primeira, e mais importante consequência decorrente dos princípios até aqui estabelecidos, é que só a vontade geral pode dirigir as forças do Estado de

Deste modo, o adequado zoneamento e sua observância são fundamentais para a conciliação da preservação ou conservação de espécies, hábitats e paisagens dentre outras e

?Vítimas expostas ao Estireno líquido, com roupas ensopadas, oferecem risco de contaminação secundária ?O Estireno é irritante para o trato respiratório.. ?O tratamento