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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE CENTRO DE CIÊNCIAS EXATAS E DA TERRA PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ENSINO DE CIÊNCIAS NATURAIS E MATEMÁTICA

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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE CENTRO DE CIÊNCIAS EXATAS E DA TERRA

PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ENSINO DE CIÊNCIAS NATURAIS E MATEMÁTICA

BÁRBARA FERNANDES COSTA

ENTRE IMAGENS E RELATOS: UM MAPEAMENTO DAS SALAS

MULTISSERIADAS COM O OLHAR PARA O ENSINO DA MATEMÁTICA NO RIO GRANDE DO NORTE – BRASIL

NATAL – RN 2020

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BÁRBARA FERNANDES COSTA

ENTRE IMAGENS E RELATOS: UM MAPEAMENTO DAS SALAS

MULTISSERIADAS COM O OLHAR PARA O ENSINO DA MATEMÁTICA NO RIO GRANDE DO NORTE – BRASIL

Dissertação apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Ensino de Ciências Naturais e Matemática da Universidade Federal do Rio Grande do Norte, como parte dos requisitos para obtenção do título de Mestre em Ensino de Ciências Naturais e Matemática.

Orientadora: Profa. Dra. Liliane dos Santos Gutierre

Banca examinadora:

Professora Liliane dos Santos Gutierre

Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN) Presidente (Orientadora)

Professora Rosilda dos Santos Morais Universidade Federal de São Paulo (UNIFESP)

Examinadora Externa

Professora Claudia Rosana Kranz

Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN) Examinadora Externa ao Programa

NATAL – RN 2020

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Universidade Federal do Rio Grande do Norte - UFRN Sistema de Bibliotecas - SISBI

Catalogação de Publicação na Fonte. UFRN - Biblioteca Setorial Prof. Ronaldo Xavier de Arruda - CCET

Costa, Bárbara Fernandes.

Entre imagens e relatos: um mapeamento das salas

multisseriadas com o olhar para o ensino da matemática no Rio Grande do Norte - Brasil / Bárbara Fernandes Costa. - 2020. 169f.: il.

Dissertação (Mestrado) - Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Centro de Ciências Exata e da Terra, Programa de Pós-Graduação em Ensino de Ciências Naturais e Matemática. Natal, 2020.

Orientador: Liliane dos Santos Gutierre.

1. Matemática - Dissertação. 2. Salas multisseriadas no Rio Grande do Norte - Dissertação. 3. Ensino de matemática -

Dissertação. 4. Livro iconográfico - Dissertação. 5. História da educação matemática - Dissertação. I. Gutierre, Liliane dos Santos. II. Título.

RN/UF/CCET CDU 51

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A todos os professores de Salas Multisseriadas que buscam possibilidades para superar paradigmas e exercer sua profissão de maneira consciente visando a uma educação das crianças.

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AGRADECIMENTOS

A todos aqueles que, direta ou indiretamente, participaram da minha formação acadêmica e da construção deste trabalho, pois não foi fácil chegar aqui e reconheço que sozinha não seria possível.

Aos meus pais, Maristela Aguiar Silva Fernandes e José Joel Alves Fernandes, que foram além do incentivo e motivação e participaram ativamente com seu apoio emocional e embarcaram comigo neste trabalho.

Aos meus filhos, Ábner Fernandes Costa e Pérola Fernandes Costa Freire, que precisaram amadurecer nesse período de dois anos para que eu pudesse estudar.

Aos meus filhos, Enoque Fernandes Costa Freire e Jarede Fernandes Costa, que alegraram e animaram meus dias sombrios.

Aos meus irmãos, Mosíah Silva Fernandes e Wilford Silva Fernandes, que me ajudaram de inúmeras formas.

Às minhas cunhadas, Paula Cavalheiro Fernandes e Amanda Priscilla Marcelino Fonseca Fernandes, que foram fontes de apoio incondicional.

À minha amiga-irmã, Renata Freire de Oliveira, que foi a responsável por eu me inscrever na seleção do mestrado e que, durante todo o percurso, segurou a minha mão e caminhou comigo.

Às minhas amigas, Rebecca Diniz Gomes e Heloíza Fernanda Athayde, por me incentivarem e mostrarem que sempre há uma luz no fim do túnel.

À minha companheira de mestrado Cídia Paula Alves da Costa, ao Gustavo Lucas Silva da Costa e a todos os participantes do Grupo Potiguar de Estudos e Pesquisa em História da Educação Matemática, por sua influência positiva.

A todos os professores de Salas Multisseriadas que entrevistei e que me receberem, sendo receptivos em participar da nossa pesquisa.

Ao meu esposo, Hélio Otávio Costa Neto, cujas palavras me faltam para descrever o amor que sinto por ele e minha gratidão por tudo o que fez e deixou de fazer durante a realização deste trabalho.

À minha orientadora, que será minha eterna professora, Liliane dos Santos Gutierre, por me acolher, por me ensinar, por confiar e por acreditar em mim, mesmo quando eu própria não acreditei; por ela, orei todos os dias.

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A todos os professores e funcionários e à coordenação do Programa de Pós-Graduação em Ensino de Ciências e Matemática da Universidade Federal do Rio Grande do Norte, pelo apoio dado, sempre que necessário.

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Em grande parte dessas pequenas comunidades rurais, as escolas, ofertadas sob a forma do multisseriado, representam a única presença explícita do Estado, materializado como equipamento público capaz de assegurar às populações do campo uma formação plena como ser humano, que tem assegurado o direito de acessar os conhecimentos, a cultura, os valores, a memória coletiva, as inovações do progresso tecnológico e os saberes do mundo do trabalho (HAGE, 2015, p. 18).

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RESUMO

Centrado no estudo de História da Educação Matemática (HEM) e História do Tempo Presente, este trabalho traz um mapeamento das Salas Multisseriadas no Rio Grande do Norte (RN), com um olhar para o ensino de Matemática. As Salas Multisseriadas são salas heterogêneas, formadas a partir da aglutinação de dois ou mais anos escolares (séries), tendo um único professor exercendo a docência, que têm como característica central a diversidade, localizadas em sua maioria nas áreas campesinas. Diante desse contexto, a temática está norteada pela seguinte questão: Que ensino de Matemática está presente nas Salas Multisseriadas do Rio Grande do Norte no triênio 2017-2019? Objetiva mapear o ensino de Matemática nas Salas Multisseriadas do RN e tem como objetivos específicos: dar visibilidade às salas dessa natureza, analisar as práticas do ensino de Matemática presente nas Salas Multisseriadas e elaborar um Livro Iconográfico como Produto Educacional, que possa ser disseminado, analisado e utilizado por outros professores envolvidos com o ensino em espaços formais e não formais. Esta pesquisa tem caráter qualitativo e combinou procedimentos metodológicos distintos para compor os dados analisados; são eles: pesquisa documental, pesquisa de campo, entrevistas semiestruturadas e observação. Entrevistou-se 12 professores que ensinam em Salas Multisseriadas, representando 11 Diretorias Regionais de Educação e Cultura (DIREC), das 16 que existem no estado do RN. Apresenta como resultados o mapeamento do ensino de Matemática nas Salas Multisseriadas, na presença do ensino das quatro operações, do uso do material didático, do uso do Material Dourado, do uso do caderno, da escrita, da leitura, dos jogos, do ensino de Geometria, além de apresentar nos resultados que muitas das práticas presentes no ensino são heranças de práticas passadas de professores que foram naturalizadas dentro da sala de aula. O Produto Educacional dessa pesquisa é um Livro Iconográfico, intitulado Diário de Bordo: uma visita a Salas Multisseriadas no RN, contendo fotografias e trechos das entrevistas. Ele foi apresentado a 41 alunos, da Licenciatura em Matemática – presencialmente – e para alunos da Pedagogia, virtualmente, todos da UFRN, que o avaliaram. Conclui-se que ele teve boa aceitação entre os estudantes a quem foi apresentado, também se percebe uma sensibilização e possível interesse pelo tema proposto. Intenciona-se que esse Produto Educacional, que dá a devida visibilidade que essas salas merecem, sirva como material de pesquisa e estudo para professores em formação inicial e continuada, bem como pesquisadores da área.

Palavras-chave: Salas Multisseriadas no Rio Grande do Norte. Ensino de Matemática. Livro Iconográfico. História da Educação Matemática.

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ABSTRACT

Centered in the Mathematics Education History and History of Present Time, this work gives a mapping of the Multi Grade Classes from Rio Grande do Norte, focusing on the Mathematics teaching. The Multi Grade Classes are heterogeneous, constituted from the agglutination of two or more school years, having just one teacher, and the main goal is the diversity, located mostly in rural areas. In this context, the theme is guided by the following question: What Mathematics teaching is currently on the Multi Grade Classes in Rio Grande do Norte, during the triennium of 2017 – 2019? As a goal to map the teaching of mathematics in multi graded classes of the Rio Grande do Norte State, and, aiming in giving visibility to classes of this nature, analyze the practices in the present time, and elaborate an Iconographic Book as an Educational Product, that may be disseminated, analyzed and utilized by other teachers involved in the teachings of formal and informal spaces. This research has a qualitative character and combined distinct methodological procedures to compose the analyzed data; which are: documental research, field research, semi structured interviews and observation. Twelve teachers that teaches in the Multi Graded Classes were interviewed, representing 11 Regional Boards of Education and Culture (DIREC), of the 16 existing in the RN State. It shows as results the mapping of the teaching of Mathematics in the Multi Graded Classes, including teaching the four operations, the use of the didactic material, the use of the Golden Bead Material, the use of notebook, writing, reading, games, Geometry teaching, furthermore to show in the results that many of the present practices of the teachings are heritages of old practices from teachers that were naturalized in the classroom. The Educational Product of this research is an Iconographic Book, titled Diary of Board: A visit to the Multi Graded Classes in RN, containing pictures and parts of the interviews. It was presented to 41 students, Mathematics Graduating students – in person – and to Pedagogy students, virtually, all of them from the UFRN which evaluated the book. The book had good acceptance among the students to whom it was presented, there was noticed sensibilization and possible interest regarding the proposed theme. It is intended that this Educational Product, which gives the proper visibility that this classroom deserves, function as a research material to teachers in initial and continued formation, as well as researches in the area.

Palavras-chave: Multi Grade Classes from Rio Grande do Norte. Mathematics Teaching. Iconographic Book.Mathematics Education History.

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LISTA DE FIGURAS

Figura 1 Mapa do Rio Grande do Norte dividido por DIREC... 36 Figura 2 Captura de imagem das telas do Flipsnack mostrando as possibilidades de

acessibilidade ... 87 Figura 3 Captura de tela da imagem da Apresentação do Livro... 97

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LISTA DE QUADROS

Quadro 1 Distribuição por DIREC, Sede, Cidade ... 34

Quadro 2 Distribuição por DIREC, Escola, Visita e Nova Escola ... 38

Quadro 3 Codinomes ... 42

Quadro 4 Codinome e descrição de localização ... 42

Quadro 5 Por Codinome, Tempo de Áudio, Tempo de Transcrição e Número de Páginas . 43 Quadro 6 Perfil dos entrevistados ... 46

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LISTA DE SIGLAS

ATP Assessoria Técnica de Planejamento

BNCC Base Nacional Comum Curricular

CAPES Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior CCET Centro de Ciências Exatas e da Terra

CEB Câmara de Educação Básica

CEE /RN Conselho Estadual de Educação do Rio Grande do Norte CNE Conselho Nacional de Educação

COVID-19 Corona Virus Disease (Doença do Coronavírus) – 2019 DAMI Desenvolvimento e Avaliação de Materiais Instrucionais DIREC Diretoria Regional de Educação e Cultura

DPEC Departamento de Práticas e Políticas da Educação EAEE Equipe Auxiliar Estatísticas Educacionais

ENERA Encontro Nacional dos Educadores e Educadoras da Reforma Agrária

FPE Departamento de Fundamentos e Políticas da Educação GPEP

GETC

Grupo Potiguar de Estudos e Pesquisa em História da Educação Matemática

Grupo de Estudos da Transdisciplinaridade e da Complexidade GPS Global Positioning System

HEM IFRN

História da Educação Matemática

Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Rio Grande do Norte

IHGDRN Instituto Histórico e Geográfico do Rio Grande do Norte INEP Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais LDB

MAT

Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional Departamento de Matemática

MEC Ministério da Educação e Cultura MD Material Didático Manipulativo

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MST Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra PCN Parâmetros Curriculares Nacionais

PDF Portable Document Format

PNAIC Pacto Nacional pela Alfabetização na Idade Certa

PPGECNM Programa de Pós-Graduação em Ensino de Ciências Naturais e Matemática

PRONACAMPO Programa Nacional de Educação do Campo QR CODE Quick Response Code/Código de resposta rápida

RN Rio Grande do Norte

SEEC Secretaria de Estado da Educação, da Cultura, do Esporte e do Lazer SisPacto Sistema Informatizado de Monitoramento

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SUMÁRIO

1 PRIMEIROS PASSOS... 15

1.1 Diferença entre Educação rural e Educação do campo: um referencial legal e teórico... 25 2 ESCOLHENDO O PERCURSO ... 31 2.1 Pesquisa documental ... 31 2.2 Viagem de campo ... 33 2.3 Entrevista ... 40 2.4 Observação ... 44

3 NUANCES E REPRESENTAÇÕES: OS OLHARES PARA AS SALAS MULTISSERIADAS ... 46

3.1 Perfil dos professores entrevistados ... 46

3.2 Trajetória de vida profissional ... 53

3.3 Questões ligadas ao ensino em sala de aula ... 60

3.3.1 Relações entre o professor e a Sala Multisseriada ... 60

3.3.2 Cadê a Matemática que estava aqui? ... 63

4 LIVRO ICONOGRÁFICO: DIÁRIO DE BORDO, UMA VISITA A SALAS MULTISSERIADAS ... 84

4.1 Avaliação do Produto Educacional Presencial ... 93

4.2 Avaliação do Produto Educacional a Distância ... 99

5 CONSIDERAÇÕES FINAIS ... 106

REFERÊNCIAS ... 111

APÊNDICES ... 120

APÊNDICE A – QUADRO DE DISTRIBUIÇÃO DE ESCOLAS POR DIREC... 121

APÊNDICE B – QUADRO: DIREC, PRINT DO SORTEIO, ENDEREÇO... 137

APÊNDICE C - DISTÂNCIAS ENTRE AS CIDADES VISITADAS E A CIDADE DE NATAL, POR ORDEM ALFABÉTICA ... 143

APÊNDICE D – TRAJETO EXECUTADO... 146

APÊNDICE E – AUTORIZAÇÃO DE USO DE IMAGEM... 147

APÊNDICE F – CARTA DE CESSÃO DE ENTREVISTAS... 148

APÊNDICE G – ROTEIRO DAS ENTREVISTAS ... 149

APÊNDICE H – QUESTIONÁRIO DE AVALIAÇÃO DO PRODUTO EDUCACIONAL... 150

APÊNDICE I – TRECHOS DE TRANSCRIÇÕES UTILIZADAS NO LIVRO ICNOGRÁFICO... 154 APÊNDICE J – TABULAÇÃO COMPLETA DA AVALIAÇÃO DO

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PRODUTO EDUCACIONAL (APLICAÇÃO PRESENCIAL) ... 157 APÊNDICE K – DISTÂNCIAS ENTRE AS CIDADES QUE OS PROFESSORES EM FORMAÇÃO MORAM E A CIDADE DE NATAL, POR ORDEM ALFABÉTICA ... 164

APÊNDICE L – ROTEIRO COMPLEMENTAR DAS ENTREVISTAS.. 166

APÊNDICE M – TRANSCRIÇÃO DE TODAS AS RESPOSTAS ABERTAS NO QUESTIONÁRIO APLICADO AOS ALUNOS DO CURSO DE PEDAGOGIA DA UFRN ... 167

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1 PRIMEIROS PASSOS

Iniciaremos apresentando como trilhamos os primeiros passos de nossa pesquisa, com a contextualização, os estudos que fizemos, nossa questão norteadora, os objetivos que traçamos visando direcionar o caminho percorrido. Finalizamos este capítulo com um breve relato do processo constitutivo e dissociativo entre Educação rural e Educação do campo.

A discussão sobre as Salas Multisseriadas nas escolas do campo não é recente, mas, algumas vezes, passa despercebida por alguns setores da sociedade. Foi com surpresa que soubemos de salas dessa natureza, por meio de um dos membros do Grupo Potiguar de Estudos e Pesquisa em História da Educação Matemática (GPEP), que passamos a frequentar após o ingresso no Mestrado Profissional (MP) do Programa de Pós-Graduação em Ensino de Ciências Naturais e Matemática (PPGECNM) da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN).

Como Grupo, estudamos questões pertinentes à História da Educação Matemática (HEM), com interesse em difundir que as práticas educativas em Matemática têm história e que há modificações na Matemática ensinada nas escolas, em diferentes tempos e lugares (GUTIERRE, 2016b). Dessa forma, o GPEP

[...] tem a intenção mais forte de reconstituir historicamente o cenário educacional matemático, de instituições e de pessoas que ensinaram Matemática no nordeste brasileiro, em especial no Rio Grande do Norte, ou de pessoas que participaram de movimentos metodológicos e curriculares dessa disciplina, além de recuperar a formação e as práticas daqueles que ensinavam matemática nesses Estados (GUTIERRE, 2016b, p. 19).

Assim, compreendemos que a História da Educação Matemática visa:

Compreender as alterações e permanências nas práticas relativas ao ensino e à aprendizagem de Matemática; a estudar como as comunidades se organizam no que diz respeito à necessidade de produzir, usar e compartilhar conhecimentos matemáticos e como, afinal de contas, as práticas podem – se é que podem – nos ajudar a compreender, projetar, propor, avaliar as práticas do presente (GARNICA; SOUZA, 2012, p. 40).

Levando em consideração os diferentes tempos, e a necessidade de também “compreender, projetar, propor, avaliar as práticas do presente”, sugeridas por Garnica e Souza (2012, p. 40), privilegiamos a História do Tempo Presente, pois concordamos com Castanho (2011, p. 23) quando afirma que “o tempo presente é histórico e objeto de conhecimento

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histórico, à condição de que o historiador reconheça, sob a superfície agitada da vida atual, toda a herança do passado”.

Maynard (2015, p. 285) afirma que “a diferença entre os que trabalham com História do Tempo Presente em relação a outros historiadores é que nós produzimos uma História cujo passado ainda não tem um futuro”. Ele explica que:

Então, a História do Tempo Presente, na minha concepção, é uma perspectiva histórica que trabalha, considera, concebe esses processos inconclusos e atua numa espécie de paridade entre uma visão estrutural, mas ao mesmo tempo considerando as ações humanas individuais, sem que caiamos numa espécie de personalismo. Não se trata disso, mas ela preocupa‐se em recuperar as experiências dos indivíduos, se pensarmos dentro de um universo globalizado (MAYNARD, 2015, p. 285).

Levando em consideração os aspectos da História do Tempo Presente, que pode caminhar lado a lado com a História da Educação Matemática, acabamos fazendo um jogo de sentidos com a palavra presente, que ora assume a tarefa de demarcar o tempo histórico da pesquisa, o triênio 2017-2019, ora assume o sentido de existência, que o ensino de Matemática existe dentro da sala de aula Multisseriada no nosso estado. Isto posto, encerramos a justificativa pela escolha de nosso tempo histórico com Lohn e Campos (2017, p. 106), que dizem:

De uma narrativa de mortos, passa-se a uma tentativa de compreender os vivos em seu tempo, em suas experiências. Ao buscar processos em momento e trajetórias não encerradas, a História do Tempo Presente é uma história da vida e do existir (LOHN; CAMPOS, 2017, p. 106)

Diante desse contexto favorável e partilhando de um interesse em comum sobre a existência das Salas Multisseriadas, o ponto de partida em nossa jornada foi a seguinte questão: “Como se dá, ou como se deu, o ensino de Matemática no Rio Grande do Norte (RN)?”. E partindo dessa questão nosso estudo foi realizado. No transcorrer que a dissertação foi apresentada no Exame de Qualificação, em maio de 2020, foram incorporadas sugestões pertinentes para o bom desenvolvimento e finalização da pesquisa. Dentre elas a mudança do título, que originalmente era “Ensino de Matemática em Salas Multisseriadas no Rio Grande do Norte: reunindo vidas e contando histórias por meio de um Livro Icnográfico”, a mudança da questão, e ainda o aprimoramento dos objetivos geral e específicos, que serão elencados, mais à frente nesta introdução. Em virtude do que foi mencionado, a temática de nossa pesquisa

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está sendo agora norteada pela seguinte questão: Que ensino de Matemática está presente nas Salas Multisseriadas do RN?

Entendemos a Matemática como atividade humana com sua forma particular de organização dos objetos e eventos no mundo (CARRAHER; SCHLIEMANN, 1991, p. 13). Ela está presente em contextos sociais dos alunos, dos professores, da escola e da sociedade em que vivemos, enquanto compramos, vendemos, medimos, cortamos, corrigimos, dividimos, pesamos, e o fazemos de diversas maneiras. “Isto significa que, na prática, a matemática é também uma forma de atividade humana, não necessariamente guiada pelas leis que estabeleceu enquanto ciência” (FUHR; CAMPOS, 2017, p. 79). A sala de aula, enquanto reflexo da sociedade, proporciona o encontro entre a Matemática organizada pela comunidade científica, ou seja, a formal, e a Matemática como atividade humana, a que praticamos no dia a dia, e que os alunos trazem com seus conhecimentos prévios e vivências (CARRAHER; SCHLIEMANN, 1991, p. 12).

Embora reconheçamos o avanço em pesquisas educacionais direcionadas ao ensino da Matemática e sua História, percebemos que pouco se estuda a respeito desse ensino em escolas situadas nas zonas rurais, e, principalmente, em Salas Multisseriadas, que é o objeto de nosso estudo. Arroyo, Caldart e Molina (2009) discorrem que, das pesquisas relacionadas às questões do campo, apenas 1% tem a educação escolar no meio rural como objeto de pesquisa. E que existe sim, um silenciamento e desinteresse sobre o rural. Não foram encontrados dados, com relação à preocupação específica ao ensino de Matemática nas Salas Multisseriadas no Rio Grande do Norte. Com o intuito fazer um levantamento de literatura, em âmbito nacional, referente ao ensino da Matemática nas Salas Multisseriadas no RN, além do estudo de Arroyo, Caldart e Molina, realizamos um trabalho de busca das produções científicas acerca do tema. O primeiro site de busca utilizado foi o Portal de Periódicos, da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES), por ser

[...] uma biblioteca virtual que reúne e disponibiliza a instituições de ensino e pesquisa no Brasil o melhor da produção científica internacional. Ele conta com um acervo de mais de 45 mil títulos com texto completo, 130 bases referenciais, 12 bases dedicadas exclusivamente a patentes, além de livros, enciclopédias e obras de referência, normas técnicas, estatísticas e conteúdo audiovisual (CAPES, 2008, p. 1).

O referido portal oferece aos usuários as seguintes modalidades de busca: por assunto, por periódico, por livro e por base. As buscas realizadas para este estudo foram na modalidade

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por assunto. A escolha se justifica na intenção de pesquisar de maneira abrangente as produções referidas ao tema. Depois desse mapeamento geral, realizado mediante uma leitura flutuante1 focada no título, autores, resumo e sua devida referência, realizamos uma seleção da seguinte forma: 1 – Por ter como objeto de estudo as Salas Multisseriadas; 2 – Que abordasse a Educação Matemática; 3 – Local da pesquisa; pois nossa intenção foi estudar os trabalhos que se remetiam ao Nordeste brasileiro. Nesse sentido, as palavras-chave usadas no processo de busca foram: Salas Multisseriadas, Educação Matemática e Rio Grande do Norte, especificamente. Assim, lançamos primeiro as palavras-chave Salas Multisseriadas, e encontramos dezessete arquivos do tipo artigo. Desses, dois eram iguais, e outros dois eram sobre administração. Totalizando quatorze artigos que falam, ou abordam em algum aspecto, sobre as Salas Multisseriadas, no Brasil e internacionalmente.

Desses quatorze artigos, três apontavam a Educação Matemática sob algum aspecto. Barreto, Mesquita e Silva (2017) pesquisaram o período de tempo correspondente de 1930 a 1961, e como se dava o ensino de ler, escrever e contar nas escolas primárias do médio sertão sergipano. O segundo artigo, de Melo e Souza (2013), embora tenha localizado de maneira geral o ensino de Matemática no contexto das Salas Multisseriadas e caracterizado a educação no campo, tinha como foco de estudo o Projeto Escola Ativa2:

[...] um programa do governo Federal que objetiva construir uma proposta de educação para as classes multisseriadas, através de uma série de elementos e instrumentos de caráter pedagógico, social e de gestão da escola. Possui como estratégias o investimento na formação de infraestrutura das escolas e no oferecimento de meios e instrumentos pedagógicos para escolas multisseriadas (PEA, 2008, p. 3).

Os referidos autores analisaram os Cadernos de Ensino-Aprendizagem com o objetivo de identificar como os conteúdos de Língua Portuguesa e Matemática propostos para o 5º ano do Ensino fundamental foram considerados. Embora eles participem do Grupo de Estudos da Transdisciplinaridade e da Complexidade (GETC) do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Rio Grande do Norte (IFRN), em nenhum momento abordaram o contexto específico do ensino da Matemática nas Salas Multisseriadas do Rio Grande do Norte, uma vez que focaram em analisar os cadernos de ensino.

1 É denominada “leitura flutuante” o primeiro contato do leitor com os documentos que serão utilizados na pesquisa, a fim de obter “impressões e orientações” a respeito dos mesmos (BARDIN, 1977).

2 O Programa Escola Ativa foi substituído pelo Programa Escola da Terra, abrangendo, além das Salas Multisseriadas, as escolas quilombolas. Mais informações na nota de rodapé 29.

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O terceiro artigo foi produzido por Silva e Garnica (2015), que apresentaram e analisaram narrativas que, em seu conjunto, permitiram atribuir significado a concepções e práticas atualmente vigentes, relacionadas ao ensino e à aprendizagem de Matemática nos Anos iniciais, em escolas do Estado de Santa Catarina.

No mesmo portal de busca, durante a pesquisa foram adicionadas as palavras-chave Salas Multisseriadas à Educação Matemática, esses foram os resultados obtidos: dos cinco artigos listados, todos já tinham aparecido na primeira busca, sendo dois os mesmos artigos, um não tratava de Educação Matemática e os outros três foram os supracitados. Posteriormente, pesquisamos pelas palavras-chave: Salas Multisseriadas, Educação Matemática e Rio Grande do Norte, juntas, percebemos que o acréscimo das palavras-chave Rio Grande do Norte não trouxe nenhum artigo diferenciado dos anteriormente citados, apenas colocou em primeiro item o resultado o artigo intitulado: “Educação do Campo e o Programa Escola Ativa: Elementos Históricos, Conceituais e Pedagógicos”, de Melo e Souza (2013), que foi escrito pelo grupo de estudos do IFRN já citado.

Ainda com o objetivo de mapear os estudos referentes ao tema proposto, pesquisamos no Repositório3 Institucional da Universidade do Rio Grande do Norte (UFRN), por tratar-se do repositório da universidade à qual o nosso Programa (PPGECNM) de mestrado está vinculado. O processo aconteceu com as mesmas palavras-chave, a relembrar: Salas Multisseriadas, Educação Matemática e Rio Grande do Norte. Encontramos duas dissertações, que selecionamos primeiramente pelo título. Eis a primeira: “A escola rural e o desafio da docência em salas multisseriadas: o caso do Seridó norte-rio-grandense”, de Diva Maria Medeiros (2010). Esse estudo se volta para a compreensão do exercício da docência das professoras e demais profissionais cujas funções estão direcionadas às escolas rurais multisseriadas, e serviu de parâmetro para a nossa discussão do conceito do que é uma Sala Multisseriada.

A segunda dissertação que encontramos tem como título “Escola ativa como semeadora de sonhos nas turmas multianuais: representações das(os) professoras(es) da microrregião de Mossoró-RN”. Foi escrita por Márcia Maria Avelino Dantas (2010) e teve como objetivo apreender as representações sociais de Escola Ativa por professoras(es) para compreender em que medida essas representações influenciam na aceitação e utilização das estratégias do programa. A pesquisadora percebeu e analisou, também, os diversos fatores relacionados à

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gestão, acompanhamento e necessidades formativas dos(as) docentes como alternativas para tornar tal ação significativa.

Conjuntamente, encontramos a tese de Márcio Adriano de Azevedo (2010), com o título “Avaliação do Programa Escola Ativa como política pública para escolas do campo com turmas multisseriadas: a experiência em jardim do Seridó/RN (1998-2009)”. Teve como objetivo desenvolver uma avaliação de implementação do Programa Escola Ativa como política pública para escolas do campo com turmas multisseriadas em Jardim do Seridó/RN (1998-2009), focando nas dimensões ambiente físico-escolar, formação, acompanhamento e aplicação didática da metodologia. Quando adicionada a palavra-chave Salas Multisseriadas à Matemática, ou Educação Matemática, ou ainda, Rio Grande do Norte, o resultado das buscas não sofreu alterações, mostrando apenas o resultado anterior. Adicionamos só a palavra-chave Matemática, ou ensino de Matemática, uma infinidade de monografias, dissertações e teses, aparecem como resultado da busca, mas numa pesquisa pelos títulos, nenhuma apareceu sendo direcionada às Salas Multisseriadas. Numa busca com as palavras-chave invertidas, apareceu a dissertação de Francisca Vandilma Costa (2005), “Pedagogia de projetos e etnomatemática: caminhos e diálogos na zona rural de Mossoró – RN”. Um estudo aprofundado não foi necessário, pois, em primeira análise, o seu público-alvo foi uma turma de 6ª série, com 31 alunos, na Escola Municipal Sindicalista Antônio Inácio, na comunidade de Barrinha. Mesmo sendo uma escola da zona rural do município de Mossoró, não é especificado que é uma Sala Multisseriada.

Por fim, realizamos uma busca seguindo o mesmo procedimento, das buscas anteriores, primeiro com as palavras-chave Salas Multisseriadas e Educação Matemática, no Google Acadêmico, pois é um dos repositórios de maior acesso e de conhecimento de pesquisadores. Um trabalho se destacou pelo título: “Educação Matemática em Escolas Multisseriadas do Campo”, de Fernanda Wanderer (2016). Ela apresenta resultados de uma pesquisa desenvolvida com o propósito de analisar o Programa Escola Ativa (PEA), examinando os jogos de linguagem da Educação Matemática. Embora seja um estudo relevante feito no Rio Grande do Sul, ele não aborda diretamente o ensino da matemática nas Salas Multisseriadas, pois seu foco de análise é

[...] constituído pelos Cadernos da área da Matemática do PEA endereçados aos alunos do 1º ao 5º ano do Ensino Fundamental (BRASIL, 2010b, 2010c, 2010d, 2010e, 2010f), pelo Caderno com orientações pedagógicas utilizado pelo professor (BRASIL, 2010g) e por narrativas de cinco

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‘professoras-21

multiplicadoras’ que participaram dos módulos de Capacitação promovidos por pesquisadores da Universidade Federal do Rio Grande do Sul em parceria com a Secretaria de Educação do Estado do RS (WANDERER, 2016, p. 338). Mesmo com o título tão próximo à temática aqui proposta, quando estudamos e buscamos pontos que convergem, não os encontramos, pois tem um objetivo bem distinto do que propomos. Diante de tudo que destacamos, nos unimos a Arroyo, Caldart e Molina (2009), quando discorrem que, das pesquisas relacionadas às questões do campo, apenas 1% tem a educação escolar no meio rural como objeto de pesquisa. Mostramos com o levantamento realizado, que, embora existam alguns estudos que apontem para as Salas Multisseriadas, ou falem sobre o ensino de Matemática, não existe, até o momento, pesquisa específica aliando o ensino de Matemática em salas dessa natureza em nosso estado.

Para não trazer apenas pontos convergentes com nosso entendimento, trazemos Hage (2015, p. 16), que discorda, pelo menos em parte, desse argumento de que não existe pesquisa na área das Salas Multisseriadas:

Pretendemos com o livro desmistificar um discurso muito popularizado de que não há pesquisa, estudos, diagnósticos e propostas de intervenção que abordem a realidade das escolas rurais multisseriadas em nosso país, ainda que tenhamos que reconhecer que esses estudos e propostas ainda são insuficientes face às demandas e urgências que envolvem essa problemática (HAGE, 2015, p. 16)

Devemos notar que a referida citação aborda apenas aos estudos realizados em Salas Multisseriadas, e não a uma realidade mais específica como a nossa temática, e que ele reforça que embora eles existam, são insuficientes devido às demandas e urgências dessa problemática (HAGE, 2015). Em virtude do que já foi mencionado e ancorados em nosso levantamento de literatura, podemos inferir que precisamos de mais estudos referentes ao ensino da Matemática nas Salas Multisseriadas, e que é urgente essa produção.

Em oposição aos silêncios acadêmicos, tínhamos como objetivo geral de pesquisa construir um estudo historiográfico acerca do ensino de Matemática em Salas Multisseriadas no Estado do RN e, como objetivos específicos: analisar as mudanças e continuidades na prática do ensino de Matemática ao longo do tempo, por meio dos documentos pesquisados; perceber indícios das visões que os professores possuem sobre o ensino de Matemática e elaborar um Livro Iconográfico como Produto Educacional, que possa ser disseminado, analisado e utilizado

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por outros professores envolvidos com o ensino em espaços formais e não formais. Esse Produto é requerido pelo programa do Mestrado Profissional, do qual fazemos parte.

Como falamos anteriormente, atendendo às sugestões pertinentes dos membros da banca no Exame de Qualificação, esses objetivos foram aprimorados, e temos como objetivo geral mapear o ensino de Matemática nas Salas Multisseriadas do RN, e, como objetivos específicos: dar visibilidade às Salas dessa natureza, analisar as práticas do ensino de Matemática presente nas Salas Multisseriadas e elaborar um Livro Iconográfico como Produto Educacional, que se manteve.

Consideramos nosso objeto de estudo pertinente por ser um elemento que pode, provavelmente, contribuir para uma educação básica mais equilibrada, do ponto de vista de dar uma visibilidade a essas salas, da mesma maneira que se dá a devida visibilidade das salas seriadas, com possibilidades de superação de preconceitos e paradigmas. Isso se deve ao fato de que assumimos como compromisso social registrar o ensino de Matemática presente a partir do que acontece nas Salas Multisseriadas do Rio Grande do Norte.

Temos consciência da tarefa hercúlea a que nos propomos, diante da complexidade exigida pelo contexto educacional e pelas próprias exigências da pesquisa em si, que, no nosso caso, envolveu longos deslocamentos causados pelas viagens que fizemos. No entanto, também temos esse compromisso social e a compreensão de que alguém precisa começar, e é com essa disposição que seguimos adiante. Para sintetizar o espírito de nossa justificativa, acrescentamos as palavras poéticas de Azevêdo (2018, p. 19), quando explica e lembra que:

A opção em adentrar na pesquisa e no contato com a Educação do campo não é resultado de escolhas movidas por critérios acadêmicos ou longinquamente pessoais; é, antes, a expressão de uma identificação com os deserdados do mundo, cuja origem se perde nos confins da alma, desdizendo as supostas neutralidades científicas e objetividades desalmadas (AZEVÊDO, 2018, p. 19).

Juntamo-nos então a esse grupo, que se identifica com os deserdados do mundo4, e nos dispomos a estudar e a relatar o ensino de Matemática presente nessas salas, guardado nas memórias dos professores, nos espaços, nos cadernos, que precisa ser contado e valorizado.

Para tanto, é pertinente definirmos o que é uma Sala Multisseriada e o contexto em que se insere dentro da dicotomia Educação rural e Educação do campo. Quando falamos que

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estamos estudando o ensino de Matemática em Salas Multisseriadas, o primeiro questionamento que nos fazem é: o que é uma Sala Multisseriada? Quantas salas com essa organização de ensino existem? Depois que explicamos em linhas gerais, perguntam: é permitido por lei? E seguem-se mais perguntas do tipo: como o professor faz para dar conta de ensinar crianças em fases tão distintas de aprendizagem? Também nos fizemos esses mesmos questionamentos, em vários momentos de nossa pesquisa, principalmente este último.

Convém apontar que o termo Classe Multisseriada se apresenta em documentos do Censo disponibilizados para consulta pela Equipe Auxiliar de Estatísticas Educacionais da Secretaria Estadual de Educação e Cultura do Rio Grande do Norte (EAEE/SEEC – RN). Nos documentos disponibilizados foram encontrados diversos relatórios, intitulados Sinopse Estatística: Ensino Regular de 1° Grau. O mais antigo datado de 1984, publicado em 1986. Essa foi uma série de documentos expedidos, também nos anos seguintes, pela Secretaria de Estatística da Educação e Cultura (SEEC), sob a direção do então Ministro da Educação, Jorge Konder Bornhausen, e tendo como diretor da SEEC Maurício de Pinho Gama, com o objetivo de divulgar os dados com algum tipo de tratamento, para pessoas que não fossem tão familiarizadas com a estatística bruta, de forma a facilitar o entendimento e uso dos dados educacionais “[...] tanto às esferas mais especializadas do planejamento setorial e da comunidade acadêmica, quanto as que se valem de seus dados como instrumentos auxiliar de outros métodos de observação social” (BRASIL, 1986, p. 2). Nesse primeiro documento, organizado por número de turmas por dependência administrativa (federal, estadual, municipal ou particular) segundo a unidade da federação (estado) e localização (urbana e rural), vimos que no Brasil no ano de 1984, existiam 138.099 Classes Multisseriadas localizadas na zona rural, sendo 7.473 em zonas urbanas. No Rio Grande do Norte somavam 27.038 salas dessa natureza, sendo 38 em zonas urbanas. No Brasil, de acordo com o Censo 2017, existem 97,5 mil5 turmas do Ensino Fundamental nessa situação.

No Rio Grande do Norte existiam 1.279 Salas Multisseriadas no ano de 2017, 1.181 no ano de 2018, e 1.265 no ano de 2019, de acordo com os dados da Equipe Auxiliar de Estatísticas Educacionais da Secretaria Estadual de Educação e Cultura do Rio Grande do Norte (EAEE/SEEC – RN).

Ao estudarmos essa problemática, encontramos algumas definições que coexistem. Medeiros (2010) as define como salas que compreendem alunos de diferentes comunidades, 5 Disponível em: https://www.todospelaeducacao.org.br/conteudo/perguntas-e-respostas-o-que-sao-as-classes-multisseriadas

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séries, idades, aprendizagem e níveis de conhecimento. Hage (2014, p. 1173) traz o termo unidocente como um elemento diferenciador, focando no professor:

Essas escolas reúnem estudantes de várias séries e níveis em uma mesma turma, com apenas um professor responsável pela condução do trabalho pedagógico, sendo, portanto, unidocentes e diferenciadas da grande maioria das escolas urbanas, onde os estudantes são enturmados por série e cada turma possui o seu próprio professor (HAGE, 2014, p. 1173).

Deparamo-nos com o termo multianual, para nós, recente, mas discutido há uns dez anos. Sobre isso, Dantas (2009, p. 23) justifica a escolha de sala multianual para a mesma forma organizacional de ensino que Sala Multisseriada,

[...] considerando as Resoluções de nº 03 de 03 de agosto de 2005, do CNE6,

e a de nº 01 de 09 de novembro de 2005, do Conselho Estadual de Educação do Rio Grande do Norte (CEE /RN), além do Decreto Estadual nº 18.838 de 27 de janeiro de 2006, que dispõem sobre a organização do Ensino Fundamental, em 09 anos, com adoção da nomenclatura Anos Iniciais do 1º ao 5º e Finais do 6º ao 9º ano de escolaridade. Isso justifica a opção de usar a expressão multianual com o mesmo sentido que lhe confere a lei, mantendo uma sincronia semântica, não apenas com a legislação em vigor, mas também com a nomenclatura que ela utiliza no conjunto de textos e documentos ligados ao Ensino Fundamental em nove anos (DANTAS, 2009, p. 23). Para nosso trabalho, optamos por utilizar o conceito de Salas Multisseriadas, uma vez que, mesmo com a mudança das nomenclaturas (séries por anos) na legislação supracitada, ele faz sentido e continua aparecendo em estudos recentes, pois ninguém discorda de que, optando-se ou não pelo optando-seu uso, a expressão tornou-optando-se parte de um vocabulário que pode optando-ser mobilizado por pesquisadores da área (BARROS, 2016).

Enfim, podemos dizer que as Salas Multisseriadas são salas heterogêneas, formadas a partir da aglutinação de dois ou mais anos escolares (séries), tendo um único professor exercendo a docência, que têm como característica central a diversidade, localizadas em sua maioria nas áreas campesinas.

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1.1 Diferença entre Educação rural e Educação do campo: um referencial legal e teórico

Durante o andamento de nossa pesquisa e, posteriormente, na apresentação do projeto7, sentimos uma necessidade pungente de nos determos nos estudos relativos à Educação rural e à Educação do campo. Já na escrita do projeto, tentamos diferenciar esses dois campos de ideias, de maneira incipiente, e, neste momento, objetivamos desenvolvê-los e discuti-los de forma a deixar claro nosso posicionamento. Em consequência disso, foi preciso revisar nossa bibliografia, de modo a acrescentar estudos que, ao mesmo tempo, ampliassem e aprofundassem o que nos propomos a fazer.

Como ponto de partida para nossa discussão, trouxemos Caldart (2009, p. 40), que afirma: “Educação do campo não é Educação rural, com todas as implicações e desdobramentos disso em relação a paradigmas que não dizem respeito e nem se definem somente no âmbito da educação”.

A Constituição é a lei suprema de um país – recebendo então a denominação de Carta Magna. Trata-se de um documento que contém o conjunto de regras de governo, estabelecendo o ordenamento jurídico de uma nação8. A Educação rural está prevista desde a Constituição de 1934, no artigo 121, que promove o amparo ao trabalhador na cidade e nos campos, cujo inciso 4 determina:

4º - O trabalho agrícola será objeto de regulamentação especial, em que se atenderá, quanto possível, ao disposto neste artigo. Procurar-se-á fixar o homem no campo, cuidar da sua Educação rural e assegurar ao trabalhador nacional a preferência na colonização e aproveitamento das terras públicas (BRASIL, 1934, p. 16).

Percebemos, ao ler o inciso, que a Educação rural tinha como objetivos a contenção do movimento migratório e o aumento da produtividade no campo, estando estritamente vinculada,

7 O projeto de pesquisa foi intitulado O ensino de Matemática em salas multisseriadas do Rio Grande do

Norte: reunindo imagens e registrando histórias. A defesa do projeto, requisito obrigatório no PPGECNM,

aconteceu no dia 15 de março de 2019, às 14h, no anfiteatro B, do Centro de Ciências Exatas e da Terra (CCET) da UFRN.

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no texto, à área econômica, sem um interesse social pela educação. Ocorre que, no Título V, dedicado à Família, à Educação e à Cultura, consta o Capítulo 2, que é relacionado à Educação e à Cultura, a Educação rural se restringe a um parágrafo único: “Para a realização do ensino nas zonas rurais, a União reservará, no mínimo, vinte por cento das cotas destinadas à educação no respectivo orçamento anual” (BRASIL, 1934, p. 17). Então, as duas menções feitas nessa Carta Magna são estritamente ligadas à economia, não tendo uma intenção educativa mais abrangente.

Na Constituição de 1937, o artigo 121 é substituído, e a redação anterior nem é mencionada, fazendo-nos crer no possível esquecimento da Educação rural. Um artigo encontrado, que menciona a Educação rural de alguma forma, foi o 132, que versa:

O Estado fundará instituições ou dará o seu auxílio e proteção às fundadas por associações civis, tendo umas e outras por fim organizar para a juventude períodos de trabalho anual nos campos e oficinas, assim como promover-lhe a disciplina moral e o adestramento físico, de maneira a prepará-la ao cumprimento dos seus deveres para com a economia e a defesa da Nação (BRASIL, 1937, p. 13).

Esse silenciamento não foi novidade, uma vez que, as primeiras Constituições de 18249 e 189110, “sequer mencionavam educação das populações pobres que viviam nas fazendas ou sítios, trabalhando na agropecuária, na extração vegetal, mineral, na caça ou na pesca” (AZEVEDO; QUEIROZ, 2015, p. 61).

De acordo com o Parecer CNE/CEB11 nº 36/2001, o que se seguiu nos textos constituintes posteriores foram espaços em que, ora a Educação rural era silenciada, ora mencionada em relação com as empresas “industriais e comerciais” que seriam responsáveis por ministrar, em “cooperação, a aprendizagem de seus trabalhadores menores” (SOARES, 2001, p. 10). No entanto, excluem-se dessa obrigatoriedade as empresas agrícolas, o que denota o desinteresse do Estado pela aprendizagem rural, pelo menos a ponto de emprestar-lhe status constitucional (SOARES, 2001).

A educação como direito de todos e como dever do Estado é a grande novidade da Carta Magna de 198812,

9 Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/Constituicao24.htm Acesso em: 07 maio 2019.

10 Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/Constituicao91.htm Acesso em: 07 maio 2019.

11 Câmara de Educação Básica.

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[...] transformando-a em direito público subjetivo independentemente dos cidadãos residirem nas áreas urbanas ou rurais. Deste modo, os princípios e preceitos constitucionais da educação abrangem todos os níveis e modalidades de ensino ministrados em qualquer parte do país (SOARES, 2001, p. 10). Mesmo que não abrangesse especificamente a Educação rural em seu texto, a garantia de uma educação para todos abriu caminho para que as Constituições Estaduais e a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB) tratassem dessa modalidade de ensino.

No que tange à LDB, também podemos percorrer toda uma trilha de silêncios e delegação de responsabilidade para a iniciativa privada. A Lei nº 4024, de 20 de dezembro de 1961, tem como objetivos para a Educação rural a adaptação do homem ao meio e o estímulo a vocações e a atividades profissionais por meio de instituições educativas orientadas para isso, por meio de formação dos educadores, relegando a responsabilidade do ensino às empresas industriais, comerciais e agrícolas.

Na Lei nº 5.692, de 11 de agosto de 1971, vemos uma Educação rural que resvala na educação profissional. Quando trata da formação do profissional da educação com o ajustamento às diferenças culturais, prevendo a adaptação do período de férias escolares à época do plantio e colheita de safras, relacionando ao trabalho do aluno no campo, esse sistema serviu de parâmetro para a organização do trabalho do professor, não apresentando indicações de uma preocupação maior com a educação.

A mudança significativa desse contexto se revelou após a promulgação da Constituição de 1988, com a Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996, considerada um marco na Educação rural, pois dispõe sobre regulamentação nessa área:

Art. 28. Na oferta de educação básica para a população rural, os sistemas de ensino promoverão as adaptações necessárias à sua adequação às peculiaridades da vida rural e de cada região, especialmente: I – conteúdos curriculares e metodologias apropriadas às reais necessidades e interesses dos alunos da zona rural; II – organização escolar própria, incluindo adequação do calendário escolar às fases do ciclo agrícola e às condições climáticas; III – adequação à natureza do trabalho na zona rural (BRASIL, 1996, p. 6). Também vemos nesse texto a concepção de uma Base Nacional Comum disposta no artigo 26 (BRASIL, 1996, p. 5), bem como a possibilidade da existência das Classes Multisseriadas como modalidade de ensino, no artigo 23.

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Art. 23. A educação básica poderá organizar-se em séries anuais, períodos semestrais, ciclos, alternância regular de períodos de estudos, grupos não seriados, com base na idade, na competência e em outros critérios, ou por forma diversa de organização, sempre que o interesse do processo de aprendizagem assim o recomendar (BRASIL, 1996, p. 4).

Para nós, essa é uma discussão pertinente, uma vez que mostra como o Estado, ao longo do tempo, não percebeu as necessidades da Educação rural como processo de desenvolvimento de modo a atender aos anseios da população rural integralmente, respeitando suas características culturais. Tal realidade fomentou muita luta da população campesina no sentido de superar essa visão. É por isso que Caldart (2009, p. 40) afirma categoricamente que “Educação do campo não é Educação rural”.

É de suma importância trazer as contribuições de estudiosos sobre o tema para nos ajudarem a ampliar o nosso entendimento sobre o breve panorama por nós delineado. Melo (2011) afirma que a Educação rural nasceu da necessidade de o capital ensinar e formar o aluno, tornando-o um agricultor voltado para um modo de ser. Santos e Miranda (2017, p. 136) complementam:

A Educação rural foi criada com base nos interesses do capital, é fruto dos interesses deste, ou seja, pela busca do desenvolvimento do capitalismo no campo, e não no interesse em buscar o desenvolvimento e a melhoria da qualidade de vida das pessoas que vivem no campo. O novo modelo de negócio que tem como base a industrialização, neste caso o agronegócio, é o agente que leva os Estados a formularem políticas educativas ‘em resposta à demanda de uma força de trabalho qualificada tanto na indústria quanto na agricultura’ (SANTOS; MIRANDA, 2017, p. 136).

Como já vimos, a Educação rural foi se estabelecendo sem uma participação efetiva dos sujeitos que dela faziam parte e, nesse contexto, nasce a Educação do campo, buscando uma superação da Educação rural por meio das lutas sociais com vistas a uma educação que privilegia seus conhecimentos, seu contexto histórico-social:

Construída através de movimentos populares, organizados por movimentos de camponeses, onde lutam por uma educação escolar que articula o trabalho produtivo com a educação escolar, ambos baseados no princípio da cooperação e alicerçada na solidariedade daqueles que vivem no campo (SANTOS; MIRANDA, 2017, p. 137).

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Como sintetizar anos de discussões e debates relacionados não só ao conceito da Educação do campo, como a suas aspirações e conquistas? Da maneira mais fácil, do início: no

Dicionário do Campo, lemos que o

[...] surgimento da expressão Educação do campo pode ser datado. Nasceu primeiro como Educação Básica do Campo no contexto de preparação da I Conferência Nacional por uma Educação Básica do Campo, realizada em Luziânia, Goiás, de 27 a 30 de julho 1998. Passou a ser chamada Educação do campo a partir das discussões do Seminário Nacional realizado em Brasília de 26 a 29 de novembro 2002, decisão posteriormente reafirmada nos debates da II Conferência Nacional, realizada em julho de 2004 (CALDART, 2012, p. 260).

Caldart (2012) explica que as discussões de preparação para I Conferência supracitada tiveram origem um ano antes, no primeiro Encontro Nacional dos Educadores e Educadoras da Reforma Agrária (ENERA). Esse evento foi uma resposta a um desafio dado por algumas entidades ao Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), organizador do referido encontro, que teve como objetivo realizar uma discussão “mais ampla sobre a educação no meio rural brasileiro” (CALDART, 2012, p. 260). O debate foi panejado para ter encontros estaduais e posteriormente um nacional, dinâmica que possibilitou envolver toda a esfera de sujeitos possível, de modo a garantir uma ampla participação dos envolvidos, uma vez que esse era o objetivo do movimento. Nesses encontros, também definiram os argumentos que justificavam o “batismo” do que viria a simbolizar uma ideia antagônica à Educação rural:

Utilizar-se-á a expressão campo, e não a mais usual, meio rural, com o objetivo de incluir no processo da conferência uma reflexão sobre o sentido atual do trabalho camponês e das lutas sociais e culturais dos grupos que hoje tentam garantir a sobrevivência desse trabalho (KOLLING; NERY; MOLINA, 1999, p. 26 apud CALDART, 2012, p. 260).

Essa conjuntura política em ebulição teve uma aplicação prática efetiva na luta por escolas, não só as de educação infantil, mas também de universidades, e se estendeu pela transformação da realidade educacional específica das áreas da Reforma Agrária. Além disso, o que não se percebeu na época é que esse conceito não estaria ligado apenas ao ambiente educativo, mas se mostraria também como virada de mesa de um modelo econômico vigente. Como vimos, a Educação rural ficou estritamente atrelada aos interesses do capital e a Educação do campo, aos interesses sociais.

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Reconhecemos que, talvez, ainda encontremos escolas inseridas na perspectiva da Educação rural, mas numa busca do que pode vir a ser uma Educação do campo; transformação pela qual lutamos. Ocorre que, apesar da realidade que se nos apresenta, o que nos move em nossa escolha nesse embate, não só de ideias, mas de interesses políticos, é que nos encaixamos no paradigma da Educação do campo.

Para além do posto até aqui, com a finalidade de situar o leitor na compreensão deste estudo, apresentamos, agora, a organização do trabalho. No segundo capítulo, traçamos os caminhos metodológicos que tornaram possível a escrita desta historiografia. No terceiro capítulo, descrevemos alguns indícios de como se dá/deu o ensino de Matemática nas Salas Multisseriadas do RN. O quarto capítulo traz, de forma detalhada, os motivos que nos levaram a escolher o Livro Iconográfico como um Produto Educacional, além de informações de como ele foi produzido, para quem o destinamos e como foi realizada sua avaliação.

Por fim, apresentamos nossas considerações finais, com a escrita que configurou os relatos deste estudo, além de todas as referências utilizadas para a execução deste trabalho, bem como os apêndices e anexos.

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2 ESCOLHENDO O PERCURSO

A metodologia de nossa pesquisa representa o caminho que traçamos para obter dados que provavelmente responderão, ou não, às nossas questões. É o caminho percorrido e implica um processo de construção, um movimento que o pensamento humano realiza para compreender a realidade social (GONSALVES, 2003). Em nosso trabalho, realizamos uma combinação com diferentes procedimentos metodológicos: pesquisa documental, pesquisa de campo, entrevistas e observações, como fontes para obter dados. Assim, no decorrer deste capítulo, descreveremos como fizemos as escolhas para esse percurso e como o realizamos.

2.1 Pesquisa documental

O primeiro passo que demos para trilhar o caminho de nossa pesquisa foi o de procurar documentos que pudessem embasar, ilustrar e até corroborar o nosso tema. Segundo Lüdke e André (2018, p. 45), a “pesquisa documental pode constituir uma técnica valiosa de abordagem de dados qualitativos, seja complementando as informações obtidas por outras técnicas, seja desvelando os aspectos novos de um tema ou problema”.

Essa etapa foi realizada com o olhar ingênuo de pesquisadores iniciantes e com o ânimo, também característico desse momento de deslumbramento com o mundo da pesquisa. Segundo Bacellar (2005, p. 23), é “o destino de muitos jovens profissionais que ingressam nos cursos de Pós-Graduação em História” (no nosso caso, em História da Educação Matemática, não foi diferente) adentrar no mundo dos arquivos. Depois das orientações iniciais com a orientadora, ficou decidido que procuraríamos fotos, artigos de jornais, documentos escolares nos arquivos disponíveis na cidade de Natal/RN, na ânsia de achar uma raridade que se referisse ou elucidasse as práticas escolares nas Salas Multisseriadas.

Alguns arquivos dos mais conhecidos na cidade do Natal são o Instituto Histórico e Geográfico do Rio Grande do Norte (IHGDRN) e o Arquivo Público do Estado do Rio Grande do Norte. Com relação ao primeiro, sabemos que são “instituições responsáveis pelos acervos documentais que guardam grande parte das fontes de história colonial, imperial e republicana brasileira” (ARAÚJO; SILVA, 2012, p. 68) e têm como finalidade e missão: “Coligir, metodizar, arquivar e publicar os documentos e tradições, que lhe forem possível obter, pertencentes à história, geografia, arqueologia e etnografia, principalmente do Estado, e à língua de seus indígenas, desde a época do descobrimento do Brasil” (ESTATUTO DO INSTITUTO

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HISTÓRICO E GEOGRÁFICO DO RIO GRANDE DO NORTE, 1903, p. 9 apud ARAÚJO; SILVA, 2012, p. 68). Esse importante acervo é a mais antiga entidade cultural do Rio Grande do Norte, fundado em Natal no dia 29 de março de 1902, abrigando uma coleção museológica, documental e bibliográfica referente à história e à cultura do Rio Grande do Norte, e também é conhecido pelos potiguares13 como Casa da Memória (IHGDRN, 2019).

Com relação ao segundo acervo a que nos referimos, sabemos que dispõe, para consulta presencial, de jornais diversos: A República (a partir de 1912); Diário Oficial do Estado (1960-1997); Tribuna do Norte (1979-1996); Diário de Natal e O Poti (1979-(1960-1997); legislação do Brasil e do RN (a partir de 1982); Mensagens de presidentes de Província e Governadores (a partir de 1847); Acervo do DOPS: fichas e dossiês (a partir de 1935); acervo fotográfico diverso; biblioteca com autores do RN; entre outros.

É pertinente esclarecer o que entendemos por arquivos públicos:

Trata-se de uma documentação geralmente volumosa e, por vezes, organizada segundo planos de classificação, complexos e variáveis no tempo. Ainda que seja dita pública, nem sempre é acessível. Esse tipo de arquivos compreende comumente: os arquivos governamentais (federais, regionais, escolares ou municipais), os arquivos do estado civil, assim como alguns arquivos de natureza notarial ou jurídica (CELLARD, 2008, p. 297).

Munidos com luvas e máscaras (BACELLAR, 2005, p. 54) e muito ânimo, escolhemos um dia14 e fomos ao IHGRN, o qual se encontrava fechado para pesquisadores naquele momento, depois nos dirigimos ao Acervo Público. Quando lá chegamos, um senhor nos atendeu e explicou que o acervo estava de mudança para outro endereço. Logo, nossa entrada para pesquisar não foi permitida.

Em consequência disso, restou-nos concordar com Cellard (2008, p. 297) quando disse que “ainda que seja dita pública, nem sempre é acessível”. Esses desafios não foram encarados com desânimo, mas como impulso para a criatividade e novas formas de olhar e procurar os documentos necessários. Como alternativa, fomos aos arquivos da Secretaria de Estado da Educação, da Cultura, do Esporte e do Lazer (SEEC/RN), onde encontramos alguns documentos importantes para nossa análise, como as Sinopses Estatísticas, referentes às décadas de 1980 e 1990.

13 Potiguar é uma denominação dada a quem nasce no estado do Rio Grande do Norte. 14 Fomos no dia 02 de outubro de 2018.

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Na SEEC/RN, fomos prontamente atendidos pela Equipe Auxiliar Estatísticas Educacionais (EAEE) e pela Assessoria Técnica de Planejamento (ATP), que nos direcionaram para uma sala anexa, onde estavam enfileiradas grandes prateleiras de ferro, nas quais estavam estatísticas datadas, a partir dos anos 1970, organizadas por décadas. Tivemos outros encontros com a referida equipe, sendo o segundo no final do ano de 201815, para que pudessem nos disponibilizar dados censitários das escolas que tinham Salas Multisseriadas no RN em 2017, ano anterior ao nosso ingresso no Programa de Pós-Graduação. O terceiro encontro aconteceu no primeiro semestre do ano de 201916, e com ele tivemos a oportunidade de obter os dados censitários do ano 2018, ano em que ingressamos no Programa.

Para além dos documentos escritos, guardados nos arquivos poeirentos, propusemo-nos a realizar entrevistas, entendendo que o depoimento oral também é considerado um documento. Le Goff (1996, p. 10) mostra uma ampliação da “área de documentos, que a história tradicional reduziu aos textos e aos produtos de arqueologia”, chegando a considerar, já em seus estudos, que os documentos podem abranger a palavra, o gesto, sendo os arquivos orais considerados textos e documentos.

Pierron (2010, p. 125) também aponta que “arquivos, documentos, monumentos, vestígios e testemunhos são várias formas de acesso a um mundo que não existe mais e do qual eles conservam, de maneira mais ou menos fiel, o indício”. Então, procedemos de modo a buscar, seja por meio dos documentos escritos, seja dos documentos orais, indícios desse mundo do ensino de Matemática nas Salas Multisseriadas potiguares.

Portanto, antes de descrever como realizamos as entrevistas, detalharemos como ocorreu nossa visita de campo, por ser o caminho que fizemos ao longo da pesquisa. Nesse sentido, é importante ratificar que primeiro fizemos a pesquisa documental, depois fomos a campo e, durante a pesquisa de campo, realizamos as entrevistas e as observações.

2.2 Viagem de campo

Como descrever o longo caminho percorrido até chegarmos de fato à nossa pesquisa de campo e, consequentemente, às entrevistas e às observações? Esse planejamento foi efetuado detalhadamente, foi pensado, repensado, escrito, reescrito, tivemos idas e vindas em todo o

15 Dia 09 de outubro de 2018. 16 Dia 14 de maio de 2019.

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processo, foram realmente percursos que fomos aprendendo a trilhar. Nosso esforço é que este relato esteja claro, para que todos consigam visualizar e seguir conosco à medida que este capítulo seja desenvolvido e, principalmente, entenderem como realizamos nosso mapeamento. Com a planilha de Matrícula das Salas Multisseriadas, que foi gentilmente cedida pela ATP/SEEC/RN, com o quantitativo das escolas que tinham Salas Multisseriadas em nosso estado no ano de 2017, ficamos impressionados com o número total: existiam, nesse ano, 1.279 Salas Multisseriadas no RN. Como faríamos uma representação justa de um número tão grande de salas? Mesmo com muito esforço, não teríamos como, na condição de pesquisadores, percorrermos todas. No entanto, ao analisarmos a planilha, percebemos que esta era dividida por Diretorias Regionais de Educação e Desporto (DIRED)17, então pensamos: por que não visitar ao menos uma escola em cada DIREC18, já que cada Diretoria é responsável pelo ensino de um grupo de cidades, e, nessa escola, entrevistar um professor? Assim, não demonstraríamos preferência e ainda garantiríamos uma representatividade com equidade entre todas as instituições. Além disso, indo a cada DIREC, também garantiríamos uma representatividade regional do estado como um todo. Todavia, com isso, surgiu o questionamento: como se daria a escolha das escolas?

Apoiados nessa decisão, organizamos um quadro que nos ajudou a visualizar as DIREC, as sedes e as suas respectivas cidades, com o ano base de 2017.

Quadro 1 – Distribuição por DIREC, Sede, Cidade

DIREC SEDE CIDADES

DIREC 1 Natal Extremoz, Macaíba, Natal, São Gonçalo do Amarante. DIREC 2 Parnamirim Arez, Baía Formosa, Canguaretama, Goianinha, Monte

Alegre, Nísia Floresta, Parnamirim, São José de Mipibu, Tibau do Sul, Vera Cruz, Vila Flor.

DIREC 3 Nova Cruz Brejinho, Espírito Santo, Januário Cicco, Jundiá, Lagoa d’Anta, Lagoa de Pedras, Lagoa Salgada, Montanhas, Monte das Gameleiras, Nova Cruz, Passa e Fica, Passagem, Pedro Velho, Santo Antônio, São José do Campestre, Serra de São Bento, Serrinha, Várzea.

17 Essas Diretorias Regionais de Educação e Desporto são chamadas Diretorias Regionais de Educação e Cultura (DIREC), de acordo com a Lei Complementar n° 522, de julho de 2014. Assim, chamaremos por DIREC, como manda a lei.

18 A saber: 1ª DIREC – Natal; 2ª DIREC – Parnamirim; 3ª DIREC – Nova Cruz; 4ª DIREC – São Paulo do Potengi; 5ª DIREC – Ceará Mirim; 6ª DIREC – Macau; 7ª DIREC – Santa Cruz; 8ª DIREC – Angicos; 9ª DIREC – Currais Novo; 10ª DIREC – Caicó; 11ª DIREC – Assu; 12ª DIREC – Mossoró; 13ª DIREC – Apodi; 14ª DIREC – Umarizal; 15ª DIREC – Pau dos Ferros; 16ª DIREC – João Câmara.

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DIREC SEDE CIDADES

DIREC 4 São Paulo do Potengi

Barcelona, Bom Jesus, Caiçara do Rio do Vento, Ielmo Marinho, Presidente Juscelino, Riachuelo, Ruy Barbosa, Santa Maria, São Paulo do Potengi, São Pedro, São Tomé. DIREC 5 Ceará-Mirim Ceará-Mirim, Maxaranguape, Pureza, Rio do Fogo, São

Miguel do Gostoso, Taipu, Touros.

DIREC 6 Macau Alto Rodrigues, Guamaré, Macau, Pendências.

DIREC 7 Santa Cruz Campo Redondo, Coronel Ezequiel, Jaçanã, Japi, Lajes Pintadas, Santa Cruz, São Bento do Trairi, Sítio Novo, Tangará.

DIREC 8 Angicos Afonso Bezerra, Bodó, Lajes, Pedro Avelino, Santana dos Matos.

DIREC 9 Currais Novos Acari, Carnaúba dos Dantas, Currais Novos, Equador, Florânia, Parelhas, São Vicente.

DIREC 10 Caicó Caicó, Jardim de Piranhas, Jucurutu, Ouro Branco, São Fernando, São José do Seridó.

DIREC 11 Assu Assu, Augusto Severo, Carnaubais, Ipanguaçu, Itajá, São Rafael, Triunfo Potiguar.

DIREC 12 Mossoró Areia Branca, Baraúna, Governador Dix-Sept Rosado, Grossos, Mossoró, Serra do Mel, Tibau, Upanema.

DIREC 13 Apodi Apodi, Caraúbas, Felipe Guerra, Itaú, Rodolfo Fernandes, Severiano Melo.

DIREC 14 Umarizal Almino Afonso, Antônio Martins, Frutuoso Gomes, Janduís, João Dias, Lucrécia, Martins, Messias Targino, Olho-d’Água do Borges, Patu, Rafael Godeiro, Serrinha dos Pintos, Umarizal.

DIREC 15 Pau dos Ferros Alexandria, Coronel João Pessoa, Doutor Severiano, Encanto, José da Penha, Luís Gomes, Major Sales, Marcelino Vieira, Paraná, Pau dos Ferros, Pilões, Portalegre, Rafael Fernandes, Riacho de Santana, São Francisco do Oeste, São Miguel, Tenente Ananias, Venha-ver.

DIREC 16 João Câmara Jandaíra, João Câmara, Pedra Grande, Pedra Preta, Poço Branco, São Bento do Norte.

Fonte: elaborado pela pesquisadora (2019).

Também buscamos a organização espacial das DIREC, por meio do mapa do RN (Ver Figura 1, a seguir).

Referências

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