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Governação Pública na Resposta Social Creche: Estudo dos Acordos de Cooperação entre o Estado e as IPSS do distrito de Setúbal

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Governação Pública na Resposta Social Creche:

Estudo dos Acordos de Cooperação entre o

Estado e as IPSS do distrito de Setúbal

Aluna: Marta de Jesus Carvalho Nunes

Orientadora: Professora Doutora Sandra Isabel Rasteiro Firmino

Dissertação para obtenção de grau de Mestre em Administração Pública

Lisboa

2020

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Governação Pública na Resposta Social Creche:

Estudo dos Acordos de Cooperação entre o Estado e

as IPSS do distrito de Setúbal

Aluna: Marta de Jesus Carvalho Nunes

Orientadora: Professora Doutora Sandra Isabel Rasteiro Firmino

Dissertação para obtenção de grau de Mestre

em Administração Pública

Júri:

Presidente:

Doutor João Manuel Ricardo Catarino, Professor Catedrático do Instituto Superior de Ciências Sociais e Políticas da Universidade de Lisboa;

Vogais:

Doutora Ana Lúcia da Silva Romão, Professora Auxiliar do Instituto Superior de Ciências Sociais e Políticas da Universidade de Lisboa;

Doutora Ana Maria Pereira dos Santos, Professora Auxiliar do Instituto Superior de Ciências Sociais e Políticas da Universidade de Lisboa;

Doutora Sandra Isabel Rasteiro Firmino, Professora Auxiliar do Instituto Superior de Ciências Sociais e Políticas da Universidade de Lisboa, na qualidade de orientadora.

Lisboa

2020

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i

Agradecimentos

À minha orientadora, Professora Doutora Sandra Firmino, expresso a minha profunda gratidão, pela transmissão de conhecimentos, apoio, disponibilidade e rigor que sempre demonstrou.

Agradeço às minha chefias, pelo incentivo para que continuasse este trabalho, quando se afigurava difícil conciliar o estudo com a carreira profissional.

Agradeço à Sílvia Pereira e à Cristina Lira, pelas suas opiniões, pois resultaram em alterações que muito valorizaram o trabalho.

Quero agradecer a todos os entrevistados pelo seu contributo que tornou possível este trabalho.

Por último agradeço aos meus pais pelo incentivo e apoio, pois sem eles não teria sido possível atingir este objetivo.

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ii

Resumo

A presente dissertação, realizada no âmbito do Mestrado em Administração Pública, visa estudar o tipo de mecanismos e estruturas de governação utilizados na prestação de bens e serviços sociais, no âmbito dos acordos de cooperação entre o Estado e as Instituições sem fins lucrativos. Neste estudo, foi considerado o caso específico das Instituições do Distrito de Setúbal, no âmbito da resposta social creche. Ao nível teórico, a investigação recorreu aos conceitos relevantes para a definição dos mecanismos de governação, sobretudo os modelos da Nova Gestão Pública e da Governança, que associámos à governação através dos instrumentos do mercado e das redes, mas não deixando de lado o Modelo Profissional Weberiano, associado ao exercício da hierarquia. Foi utilizada uma metodologia de investigação mista, assente na realização de uma análise documental aos principais documentos normativos, de entrevistas semiestruturadas a dirigentes e técnicos superiores do ISS, I.P. e das instituições sem fins lucrativos, e de um questionário aplicado às instituições sociais que atuam no distrito de Setúbal, com acordos de cooperação. A análise e discussão dos resultados levou-nos a concluir que, embora o discurso dos entrevistados denote uma presença de atributos de “cooperação” na relação entre o Estado e as instituições sem fins lucrativos, o modelo de rede existente não assume uma postura suficientemente colaborativa, sendo a natureza da relação essencialmente formal e contratual, com um processo de controlo bastante centralizado, que o fazem assemelhar à presença de linhas de autoridade hierárquica, fruto da visão da relação como entre “tutela” e “delegado”. No que diz respeito à provisão do bem social creche, com base nas perceções recolhidas, existe uma boa qualidade do serviço prestado. No entanto, destaca-se a necessidade de repensar o atual modelo de financiamento, de forma a assegurar a adequação do custo da resposta social ao tipo de comparticipação realizada e face aos rendimentos das famílias.

Palavras chave: Governação Pública, Estado, Instituições sem fins lucrativos, acordo de cooperação, creche

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iii Abstract

This dissertation, conducted for the Master in Public Administration, aims at examining the type of mechanisms and governance structures to deliver public goods and social services within the cooperation agreements between the State and institutions of the social sector. This study considered the specific case of the institutions of the social sector of the District of Setúbal, with cooperation agreement for the valence of Nursery.

The analysis model is based in the relevant concepts for the definition of Governance models,especially the New Public Management and Governance, that we have linked to government through the market and network instruments not leaving aside the weberian bureaucratic model. associated with hierarchy. It has been conducted a mixed research, using literature review and semi-structured interviews to managers and technical staff of the ISS, I.P. and to the leading members of institutions of the social sector. Analysis and discussion of results led me to the conclusion that the relation between the State and the institutions of the social sector although denote the presence of cooperation atributes the network model does not assume enough collaborative posture being the nature of the relation essentially formal and contractual, with a control process considerable centralized similar to the presence of hierarchy authority as a result of a relation view like” tutelage” and “delegated.” Concerning the provision of the valence of Nursery, based on the collected perceptions exists a good quality of the service. However stand out the need of rethink the atual financing model in order to ensure the adequasy of the valence`s cost according to type of the contribution face to familiy incomes.

Keywords: Public Governance, State, Institutions of the social sector, cooperation agreement, nursery

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iv

Índice

1. Introdução ... 1 1.1.Problema de investigação ... 1 1.2.Objetivos de Pesquisa ... 2 1.2.1.Objetivo principal ... 2 1.2.2. Objetivos secundários ... 2 1.3. Pertinência do Trabalho ... 2 2. Enquadramento teórico-conceptual ... 3 2.1. Modelos de Governação ... 3

2.1.1.Modelo Profissional Weberiano ... 3

2.1.2. Modelo da Nova Gestão Pública (NGP) ... 5

2.1.3. Governança Pública ... 8 2.2. Mecanismos de Governação ... 11 2.2.1. Mecanismo de Hierarquia ... 12 2.2.2. Mecanismo de Mercado ... 13 2.2.3. Mecanismo de Redes ... 15 3.Opções Metodológicas ... 18 3.1.Modelo de Análise ... 18 3.1.1. Questões de investigação………21 3.2. Enfoque Metodológico ... 21

3.2.1. Instrumentos de recolha de dados………22

3.2.2. Recolha de dados………..22

4.Acordos de Cooperação entre o Estado e as IPSS ... 24

4.1. As características institucionais das IPSS em Portugal ... 24

4.2 O papel do Estado ... 26

4.3 Modelo de Cooperação entre o Estado e as Instituições sem fins lucrativos ... 28

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v

5.1. Relação entre as IPSS e o Estado………31

5.1.1. Tipo de relacionamento………31

5.1.2. Caraterização da relação ... 32

5.2. Papel do Compromisso de Cooperação 2017-2018 no reforço da parceria………36

5.2.1. Documento estruturante no processo de cooperação………..36

5.2.2. Definição e cumprimento dos objetivos a alcançar com o Compromisso………37

5.3. Regras existentes nos acordos de Cooperação ... 39

5.3.1. Nível de formalização ... 40

5.3.2. Acesso às respostas sociais ... 40

5.3.3. Forma de financiamento das respostas sociais ... 41

5.4.Avaliação do PROCOOP ... 42

5.5. Modelo de acompanhamento e fiscalização da resposta social creche ... 43

5.5.1.Caraterização da resposta social creche ... 43

5.5.2.Serviços do Estado responsáveis pelo acompanhamento da resposta social ... 44

5.5.3. Serviços do Estado responsáveis pela fiscalização da resposta social ... 45

5.5.4. Atribuição de responsabilidades a cada Serviço ... 45

5.5.5 Acompanhamento da resposta social creche ... 46

5.6. Atual quadro regulatório ... 47

5.6.1. Legislação emitida ... 47

5.6.2. Avaliação dos instrumentos ... 48

5.6.3. Aplicação dos mecanismos ... 48

5.7. Provisão do bem social creche através dos acordos de cooperação ... 50

5.7.1. Qualidade do serviço prestado ... 50

5.7.2. Grau de cobertura da resposta social ... 51

5.7.3. Comparticipação atribuída ... 52

5.7.4.Modelo de financiamento………53

5.7.5.Seleção dos utentes……….54

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Conclusão………61 Bibliografia………65

Anexos

Anexo A – Questionário Anexo B - Guião de entrevista

Anexo C- Matriz de Codificação Inicial dos Dados

Anexo D – Grelhas de análise de conteúdo (Quadros I a VII) Quadro I - Relação entre as IPSS e o Estado

Quadro II - Compromisso de Cooperação 2017-2018 no reforço da parceria Quadro III - Regras existentes nos acordos de Cooperação

Quadro IV - Avaliação do PROCOOP

Quadro V - Modelo de acompanhamento e fiscalização da resposta social creche Quadro VI - Atual quadro regulatório

Quadro VII - Provisão do bem social creche através dos acordos de cooperação Anexo E – Análise de dados do Questionário

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Índice de Figuras

Figura 1 – Modelo de Análise...19

Índice de Tabelas Tabela 1 – Elementos chave da NGP……….6

Tabela 2 – Processo de transformação nos mecanismos de governação………9

Tabela 3 – Comparação entre Mecanismos de Governação……….11

Tabela 4 – Codificação das entrevistas……….23

Tabela 5 – Tipo de Relacionamento………31

Tabela 6 – Tipo de Relacionamento: natureza contratual………..32

Tabela 7 – Relação vertical com controlo centralizado……….33

Tabela 8 – Principais Focos de conflito/tensão………..34

Tabela 9 – Relação de Complementaridade……….35

Tabela 10 – Cumprimento dos Objetivos do Compromisso 2017-2018………38

Tabela 11 – Principais vantagens do PROCOOP……….42

Tabela 12 – Principal Limitação/Insuficiência do PROCOOP……….42

Tabela 13 – Atribuição de responsabilidades a cada serviço………46

Tabela 14 – Reforço dos Mecanismos existentes……….49

Tabela 15 – Criação de Novos Mecanismos……….50

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1

1. Introdução

1.1. Problema de investigação

O presente trabalho de dissertação incide no estudo do tipo de mecanismos e estruturas de governação utilizados na prestação de bens e serviços sociais, no âmbito dos acordos de cooperação entre o Estado e as Instituições Particulares de Solidariedade Social (IPSS). A transição das formas mais tradicionais de governação hierárquica para a governação em rede poderá ser vista como o resultado da própria transformação do Estado. A tradicional estrutura hierárquica, como forma de coordenação de atividades foi quebrada, dando origem à criação de parcerias entre o setor público e o setor privado e a um novo papel para as organizações não lucrativas (Araújo 2005).

O mercado social é partilhado por entidades lucrativas e organizações sem fins lucrativos, sendo a intervenção do Estado efetuada maioritariamente através das IPSS, com a celebração dos acordos de cooperação.

Em Portugal, o Estatuto das IPSS e as caraterísticas dos acordos de cooperação assinados entre estas e o Estado parecem ter acentuado a tendência para estas organizações se concentrarem em determinadas áreas de atuação e serviços prestados, nomeadamente no setor da Segurança Social e Formação Profissional, da Saúde e da Educação.

As IPSS têm, como obrigação inerente ao seu âmbito de atuação e serviços prestados, o dever de cumprir os normativos existentes. Como tal, em função dos acordos e contratos assinados com o Estado, são obrigadas a prestar serviços aos cidadãos nas condições previamente acordadas.

De acordo com a Lei de Bases da Economia Social (LBES), está previsto que as organizações do Terceiro Setor assegurem “os necessários níveis de qualidade, segurança e transparência aos seus membros utilizadores e beneficiários” (artigo 8º da Lei n.º 30/2013, de 8 de maio). Por um lado, o Estado assegura o financiamento da resposta social, via acordo de cooperação; por outro lado, as IPSS comprometem-se a seguir uma série de procedimentos, sendo a ação fiscalizadora realizada pelo Estado.

De entre as áreas de atuação abrangidas pelos acordos de cooperação, entre o Estado e as IPSS, o nosso estudo irá incidir sobre a área de Infância e Juventude, mais concretamente na resposta social de creche.

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2 Face a estas considerações, definimos como pergunta de partida para a presente investigação: Como se define a resposta social de tipo creche no que se refere à eficácia dos mecanismos e estruturas de governação adotados?

1.2.Objetivos de Pesquisa

1.2.1.Objetivo principal

 Analisar a eficácia existente nos acordos de cooperação entre o Estado e as IPSS, na resposta social Creche, ao nível dos instrumentos de governação adotados.

1.2.2. Objetivos secundários

 Estudar a evolução do papel do Estado no domínio da cooperação com as IPSS, no âmbito dos contratos estabelecidos para a oferta da resposta social Creche;

 Caraterizar os acordos de cooperação como instrumento/mecanismo de governação pública;

 Verificar de que forma o Estado exerce a fiscalização e garante a coordenação da política pública ao nível da resposta social Creche;

 Compreender se a provisão do bem social creche está a ser assegurado de forma eficaz, através dos acordos de cooperação.

1.3. Pertinência do Trabalho

Na elaboração do presente trabalho, estiveram motivações profissionais e académicas. Ao nível académico esperamos poder preencher a lacuna existente, nos estudos de investigação sobre a matéria em análise, contribuindo para um maior conhecimento sobre os acordos de cooperação entre o Estado e as Instituições sem fins lucrativos na resposta social creche, ao nível dos instrumentos de governação adotados. A nível internacional, verifica-se a existência de vários contributos científicos, acerca do estudo dos contratos estabelecidos entre o Estado e as instituições sem fins lucrativos, tendo em vista a provisão de bem públicos (veja-se: Jupp 2008, Eggers 2008 e Shergold 2008).

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3 Relativamente à realidade portuguesa, embora tenhamos localizado alguns estudos que abordam a temática dos mecanismos de governação entre o Estado e as instituições sem fins lucrativos (Ferreira 2009 e Almeida 2011) não conseguimos localizar um estudo específico para a resposta social creche. Acresce-nos mencionar que a análise efetuada, ao recair apenas sobre o Distrito de Setúbal, possibilita a análise, a um nível microssocial, do papel das instituições sem fins lucrativos, no processo de produção do bem social, pelo que nos parece que este trabalho tem relevância sobretudo porque acrescenta conhecimento sobre uma realidade empírica, ainda desconhecida de sobremaneira.

O quarto capítulo apresenta a investigação empírica, apresentando a contextualização e enquadramento legal, no âmbito dos acordos estabelecidos entre o Estado e as instituições sem fins lucrativos para a resposta social creche. No capítulo cinco, os resultados são analisados e interpretados, com vista a responder às questões de investigação.

Por último, apresentam-se as principais conclusões do estudo, uma reflexão sobre as limitações da presente investigação e sugerem-se pistas para investigação futura.

2. Enquadramento teórico-conceptual

2.1. Modelos de Governação

2.1.1.Modelo Profissional Weberiano

O modelo burocrático ou profissional weberiano consolidou-se após a segunda guerra mundial e predominou nas Administrações Públicas de vários países até finais dos anos noventa (Araújo 2007).

De acordo com Eliassen e Sitter (2008), as caraterísticas fundamentais do modelo de organização weberiano podem ser resumidas a cinco pontos principais:

1. Organização hierárquica e distribuição da autoridade, em que a responsabilidade máxima se situa no topo;

2. As competências assentam em regras formais e o poder discricionário é estritamente regulado. As leis administrativas estabelecem procedimentos e parâmetros para o uso de sanções;

3. Divisão especializada do trabalho;

4. A Administração Pública opera de acordo com regras processuais escritas, bem definidas e transparentes;

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4 5. Os funcionários públicos são recrutados a tempo inteiro.

Stoker (2006:45) é mais elucidativo quanto à natureza da relação de trabalho entre os funcionários e a Administração Pública. Deste modo, acrescenta que estes são nomeados com base no mérito, sendo que o seu sistema de carreira enfatiza a continuidade e a progressão no longo-prazo.

Weber defendeu uma conceção instrumentalista (funcional e orgânica) da Administração relativamente ao poder político, sustentando que este exerce a sua atividade recorrendo à força material (coação) através de um aparelho administrativo de tipo burocrático e hierárquico (organização de forma piramidal) e servindo-se de instrumentos de regulação jurídica (Carapeto 2014).

Segundo Bilhim (2013:41), “Em Weber encontra-se a definição mais completa de burocracia, enquanto organização que realça a precisão, a velocidade, a clareza, a regularidade, a fiabilidade e a eficiência, conseguidas através da criação da divisão do trabalho, da hierarquia de poderes, regras e regulamentos detalhados”.

Weber insiste em que a burocracia é potencialmente superior aos sistemas baseados na autoridade carismática ou na autoridade tradicional. Todavia, para que tenha sucesso, é necessária a existência de regras formais (cf. Rocha 2013).

De acordo com Araújo (2007), o modelo Weberiano enfatiza o controlo hierárquico, o qual permite abordar vários problemas associados com a produção e fornecimento de bens e serviços. A principal vantagem reside na sua capacidade de gerir fluxos de informação num sistema centralizado de comunicação. Por outro lado, a sua estabilidade garante a continuidade da atividade administrativa mesmo em situações de instabilidade política. O modelo de governação que assenta nos princípios organizacionais weberianos tem sido alvo de várias críticas. Eliassen e Sitter (2008:97) referem que o modelo weberiano assumiu um certo grau de homogeneidade na prestação de serviços públicos e que os seus princípios centralizadores focados nos procedimentos formais, no controlo da legalidade, transparência, linhas claras na responsabilidade política e prestação de contas, podem não ter o mesmo grau de importância em todos os casos de prestação de serviços públicos. Conforme a área em que é prestado o serviço público, assim podem surgir outras preocupações mais importantes, como por exemplo, na área da educação, onde poderá ser dada uma maior importância ao

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5 foco da academia, à existência de autonomia local e à consulta e participação dos trabalhadores no processo.

Na opinião de Ferraz (2013), o alargamento das funções do Estado para as áreas sociais, tendo em vista a resolução de problemas mais complexos nas sociedades contemporâneas, não se coaduna com o modelo organizacional burocrático, o qual assenta em procedimentos rígidos e numa hegemonia de rotinas e procedimentos valorizando sobretudo processos. Caso o contexto deixe de ser previsível, as normas e procedimentos que haviam sido definidos, deixam de fazer sentido e geram as chamadas “disfunções burocráticas”.

Para Merton (1957), os aspetos negativos da burocracia derivam essencialmente de causas estruturais, nomeadamente a sua devoção para com as regras, a qual leva a que estas se transformem em valores absolutos, o que face a contextos especiais e não previsíveis irá interferir na capacidade de resposta por parte daqueles que elaboraram as normas gerais. Consequentemente, os princípios fundamentais, identificados no modelo weberiano, como geradores de eficiência, perante situações específicas, podem produzir ineficiência. O autor identificou as seguintes disfunções na burocracia (1957:111-4):

 Sobrevalorização dos meios em desfavor dos fins da organização. Os trabalhadores públicos tendem a perder de vista as finalidades públicas para que foi criada a organização que integram, face ao imperativo de cumprimento de regras;

 Excesso de formalismo na forma escrita domina a burocracia;  Resistência à mudança;

 Despersonalização do relacionamento com dificuldade no atendimento aos cidadãos e conflitos com o público;

 Centralização da autoridade manifestada através de sinais de autoridade.

2.1.2. Modelo da Nova Gestão Pública (NGP)

Segundo Carvalho (2001:46), a “ideologia, mudança cultural ou estilo de gestão, de seu nome

managerialism, refletiu-se nas últimas décadas num movimento de reforma e modernização

administrativa que perpassou pelos vários países da OCDE – a New Public Management, cuja denominação em português se convencionou por Nova Gestão Pública (NGP) ”.

O núcleo da NGP é a combinação dos mecanismos de mercado e de ideias e técnicas de gestão do setor privado, aplicados quer à reforma institucional (através da introdução dos

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6 mecanismos de mercado), quer à reforma administrativa (através do melhoramento da gestão, tendo como objetivos fundamentais a redução da despesa pública, o reforço da responsabilidade e a satisfação do consumidor) (Carapeto 2014).

A NGP tem a sua origem no que Hood (1991) denomina por “um casamento de dois diferentes conjuntos de ideias. De um lado, perfila-se a nova economia institucional; por outro, apresentam-se as ondas sucessivas de administrações de tipo empresarial no setor público” (p.5).

Para Hood (1991), a NGP apresenta os seguintes elementos-chave:

O recurso à contratação e às agências para o fornecimento de serviços públicos permitiu a clarificação das atividades de natureza política e das atividades de natureza executiva, bem como a definição de mecanismos de controlo dos resultados (Araújo 2013).

A adoção da NGP significa a reconfiguração da Administração Pública, no que alguns autores apelidaram uma transformação do Estado Burocrático para um Estado Managerial. Esta mudança não significa que o Estado tenha abandonado as políticas sociais, mas estas deixam, em grande medida, de ser implementadas pelas organizações públicas. Por outras palavras, estabelece-se uma separação entre financiamento e prestação e adquire expressão o Estado Regulador (Rocha 2013).

Tabela 1- Elementos chave da NGP

Doutrina Significado Justificação

Gestão Profissional atuante. Controlo ativo, visível, discricionário, existe "liberdade para gerir".

Accountability exige uma atribuição de

responsabilidade às ações e não à difusão de poder.

Padrões e Medidas de

desempenho explicitas.

Definição de objetivos, metas e indicadores de sucesso, de preferência expressos em termos quantitativos.

Accountability exige uma clara definição

de objetivos. Maior ênfase no controlo de

resultados.

Alocação de recursos e renumerações ligadas à medida da performance; Quebra da burocracia centralizada.

Necessidade de enfatizar resultados em vez de procedimentos.

Tendência para a desagregação de unidades.

Quebra das unidades monolíticas, operando em uma única linha orçamental.

Necessidade de separar a provisão e os interesses da produção; Ganhos de eficiência na utilização de contratos. Tendência para uma maior

competição.

Mudança para a utilização de contratos e procedimentos concursais.

Rivalidade é a chave para custos baixos e padrões de qualidade.

Ênfase nos estilos de gestão praticados no setor privado.

Maior flexibilidade na contratação e utilização de prémios.

Necessidade de utilização de ferramentas de gestão privadas no setor publico.

Maior ênfase na disciplina e parcimónia na utilização de recursos.

Redução dos custos diretos e aumento da disciplina laboral.

Necessidade de controlar a procura de recursos no setor público e "fazer mais com menos".

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7 As relações entre o poder político e as estruturas responsáveis pela produção/prestação de bens e serviços públicos reduziram-se significativamente, passando a efetuarem-se preferencialmente com recurso a contratos. A utilização da contratação e outros mecanismos de mercado alteraram o fornecimento de bens pelo Estado através do recurso a agentes privados do terceiro setor e do setor lucrativo. Esta nova relação que se estabeleceu foi regulada através de um equilíbrio entre legislação do governo e forças do mercado (Araújo 2007).

A NGP está associada a uma série de reformas estruturantes nas Administrações Públicas. No entanto, a adoção das ideias e técnicas associadas a este modelo de governação, não tem sido linear, o que conduziu à existência de várias abordagens. Eliassen e Sitter (2007:101) identificam três elementos principais nas tendências reformadoras da NGP:

 Reorganização do Setor Público, através da descentralização do poder decisório pelas unidades públicas, transferindo o poder para os gestores de cada unidade administrativa, com a intenção de separar o decisor político do prestador do serviço;

 Promover a competição dentro do Setor Público ou através da competição direta entre os fornecedores públicos e privados;

 Alterações nas configurações organizacionais e novas técnicas de gestão.

Como problema de fundo da NGP, Peters e Pierre (1998:230) identificam a introdução de uma dimensão competitiva em áreas do setor público, pois as organizações públicas nunca foram projetadas para aquele objetivo, mas sim para assegurarem a legalidade e a igualdade. Um problema associado à mudança da cultura organizacional é frequentemente mais difícil de resolver do que uma alteração da estrutura organizacional.

Stoker (2006:55-6) identifica os seguintes problemas principais associados à NGP:

 Gestão focada no cumprimento de objetivos e não nas exigências políticas. Os políticos fixam os objetivos, mas estes são normalmente negociados com os gestores;

 Orientada para o mercado e cliente, onde os cidadãos são reduzidos a consumidores, não podendo questionar os objetivos do fornecimento dos serviços, mas apenas a comentar a sua qualidade. Como resultado, a NGP evidencia uma

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8 forte preocupação com os ganhos de eficiência e com a maximização do valor do dinheiro;

 Redução da importância do papel da experiência e capacidade profissional, através da transferência do poder dos profissionais para o comando estratégico da organização.

2.1.3. Governança Pública

O conceito de governança tem diferentes significados para diferentes autores.

Para Rhodes, governança representa: “uma mudança no significado de governo, referindo-se a um novo processo de governação; ou a uma condição alterada da regra ordenada; ou um novo método pelo qual a sociedade é governada” (citado por Rodrigues 2013:104).

Existem pelo menos seis definições distintas de governança: como Estado Mínimo; como Governança Corporativa; como Nova Governança; como “Boa Governança”; como Sistema Sócio Cibernético; e como Redes auto-organizadas (Rhodes 2000).

Kooiman (2000, 2003) distingue entre formas de Governança que vão desde o Governança Hierárquica e “Co-Governança”, envolvendo combinações de atores públicos e privados, até à Auto Governança (Eliassen & Sitter 2008).

No caso da conceptualização de governança como redes, uma multiplicidade de atores interage e participa nos processos de conceção e implementação em redes de políticas públicas (Rodrigues 2013).

De acordo com Rhodes (1996), as redes (networks) partilham as seguintes caraterísticas de governação:

 Interdependência entre organizações públicas, privadas e voluntárias;  Interações contínuas entre os membros da rede;

 Interações do tipo da teoria de jogos, baseado na confiança e reguladas através das regras do jogo acordadas entre os participantes da rede;

 Elevado grau de autonomia em relação ao Estado.

Kickert, Klijn e Koppenjan (1997) evidenciam o potencial para a inovação nas “redes de políticas” (policy networks), que ligam políticas públicas no seu contexto estratégico e institucional, concentrando-se no tipo e natureza das relações desenvolvidas por atores

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9 públicos, semipúblicos e privados. Esta nova forma de governação promove a cooperação entre os participantes dentro da estrutura de relacionamentos interorganizacionais.

Assiste-se a um esforço de coordenação entre as várias organizações que fornecem serviços públicos numa tentativa de obter maior integração da atividade das mesmas. Esta nova fase de mudança da Administração Pública, centrada na introdução de novos mecanismos de coordenação, teve reflexo em três áreas importantes das organizações: na forma de trabalho em equipa; na forma como as organizações prestam contas do trabalho feito (accountability) e nas formas de fornecimento de serviços públicos (Araújo 2013).

À unidade do Estado produtor e distribuidor de serviços públicos sucedeu-lhe uma diversidade de operadores com diferentes naturezas jurídicas e missões. O Estado cedeu o seu lugar único a uma miríade de operadores de tal forma que o Estado já muitas vezes nem é o ator mais importante na rede de relações institucionais (Bilhim 2013).

Uma outra dimensão de governança em rede, abordada por autores como Shergold (2008) e Jupp (2008) é a governança colaborativa. De modo a melhorar os processos e resultados de governação (desenvolvimento e execução da política publica), é essencial a colaboração entre a diversidade de partes interessadas, as quais possuem diferentes graus de influência, autonomia e capacidade, bem como diferentes interesses, expetativas e valores (Shergold 2008).

De acordo com Shergold (2008), os mecanismos de governação passam por um processo de transformação, que vão desde o comando até à colaboração.

Tabela 2 – Processo de transformação nos mecanismos de governação

Comando: Processo com controlo centralizado, com linhas de autoridade hierárquica. Coordenação: Processo coletivo de tomada de decisão, imposto às instituições participantes. Cooperação: Processo de partilha de ideias e recursos, para benefício mútuo.

Colaboração: Processo de criação partilhada, negociado entre instituições autónomas.

Fonte: Shergold (2008: 20).

Para O`Flynn (2008), o aumento do interesse pela governança colaborativa pode ser resumido a três proposições-chave:

 A colaboração como forma de encorajar a confiança e reduzir conflitos;  A colaboração para “abrir” as competências distintivas de outros setores;

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10  A colaboração como meio de uma abordagem transformacional na melhoria dos

serviços prestados.

O setor público continua no centro da governança em rede, o qual mantem um vasto poder, devido à sua capacidade de gestão de recursos, à sua experiência e conhecimento, à sua autoridade legislativa e regulatória e ao controlo financeiro exercido através dos contratos e subsídios atribuídos. O processo de colaboração continua a refletir uma relação hierárquica entre os vários atores, através de uma estrutura imposta pela Administração Pública (Shergold 2008).

Kooiman (2003) defende que as linhas divisórias entre os setores público e privado se estão a tornar cada vez mais fluídas e os interesses não são apenas públicos ou privados, já são frequentemente partilhados. A tomada de consciência sobre a necessidade de cooperar com outros atores sociais não converteu as intervenções governamentais tradicionais em obsoletas. Simplesmente ocorreu uma crescente consciencialização, não só das limitações da tradicional ordem e controlo público como mecanismo de governação, mas também da necessidade de um maior número de abordagens de modo a dar resposta aos problemas sociais. Também para Jupp (2008) os serviços públicos podem beneficiar com o processo de colaboração com instituições do Terceiro Setor. Referindo que os contratos estabelecidos com instituições não lucrativas, podem gerar serviços mais eficazes e eficientes, do que aqueles gerados unicamente através da competição.

Diversos autores procuraram face à emergência deste modelo compará-lo à NGP. Deste modo, enquanto a NGP se baseia na reorganização, regulação, contratos e incentivos, a Governança baseia-se num conjunto mais amplo de instrumentos de política.

Na opinião de Bovaird e Löffler (2003:11), os domínios da NGP e da Governança Pública estão separados, mas interligados. Um é percursor do outro e devem coexistir e trabalhar em conjunto, através de mecanismos apropriados. No entanto, quando são interpretados de pontos de vista divergentes, podem ser detetadas as contradições entre os dois modelos. Ao escrever do ponto de vista da Governança, Rhodes (1996:663-4), identifica quatro fraquezas da NGP: estar concentrado nos três ‘Es’ - economia, eficiência e eficácia e na maximização do valor do dinheiro; obsessão pelos objetivos; ênfase nos resultados e não nos processos; contradição entre competição e coordenação, devido a um baixo nível de

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11 interdependência entre os vários atores que tem como resultado a falta de confiança necessária para desenvolver um equilíbrio nas negociações.

2.2. Mecanismos de Governação

Atualmente existe uma pressão sobre o Estado de maneira a aplicar um conceito adequado de boa governação, que reúna simultaneamente valores de eficiência, legitimidade, equidade e coesão social. Não se trata de escolher o melhor mecanismo de governação, mas sim de conseguir a melhor combinação possível, que contribua para um maior valor acrescentado para o serviço público (Tenbensel 2005).

A cada modelo de gestão pública está associado um mecanismo de governação, os quais podem ser agrupados em: mecanismos de hierarquia, mecanismos de mercado e mecanismos de redes (Verhoest et al. 2014).

O mecanismo de hierarquia implica a produção de bens e serviços através de interações de autoridade, operacionalizadas em regras e planeamento, estabelecidos no seio de organizações burocráticas. No mecanismo de mercado, a coordenação entre instituições é baseada na competição e trocas entre os atores. Por sua vez, no mecanismo de redes, a governação toma a forma de cooperação, sendo as relações estabelecidas com base no reconhecimento mútuo de interdependência, confiança e responsabilidade de cada um dos atores (Verhoest et al. 2014).

Hierarquia Mercado Redes

Base Conceptual

Relações de

Emprego Contrato Complementaridade

Meios de Comunicação Rotinas Formais Preço Relacionamento

Métodos de Resolução de Conflitos

Admistrativo;

Supervisão Tribunal

Normas de Reciprocidade

Grau de Flexibilidade Baixa Alta Média Alta

Grau de Compromisso entre as partes Médio Alto Baixo Médio Alto

Clima Burocrático, Formal Competição Benefícios Mútuos

Agentes Dependentes Independentes Interdependentes

Base Teórica

Burocracia Weberiana

Novo Institucionalismo

económico Teoria das Redes Fonte: Adaptado de Powell (1990:300)

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12

2.2.1. Mecanismo de Hierarquia

Segundo o mecanismo de hierarquia, as organizações são estruturadas conforme os princípios da organização hierárquica, assentes na autoridade e no seguimento de regras com base legal, as quais se revelam mais adequadas em gerir uma grande diversidade de pessoas, mesmo que dispersas por uma vasta área geográfica. A força das organizações hierárquicas reside na sua fiabilidade, ou seja, a capacidade de produzir um largo número de bens e serviços, assegurando a sua qualidade e a sua capacidade em reportar a forma como os recursos foram utilizados (Powell 1990).

A Administração Pública é tradicionalmente caraterizada por organizar a sua estrutura de acordo com o modelo weberiano, assente numa separação vertical das tarefas e autoridade, controlo hierárquico, regulamentos internos, estabilidade, carreira e neutralidade. Por estas caraterísticas, entende-se, normalmente, que esta estrutura está adequada às funções do governo (Araújo 1998).

É um mecanismo associado à autoridade, assente na distribuição de responsabilidades e no estabelecimento de linhas diretas de controlo. Podem ser utilizados, tanto os instrumentos de gestão (estruturas formais de comunicação de tipo top-down ou relatórios financeiros de controlo de resultados), como instrumentos estruturais (mudanças organizacionais, coordenação e monitorização e relações claras e diretas em matéria de responsabilidade e controlo). O controlo é exercido a priori, com o intuito de verificar a conformidade da ação com o cenário previsto e pré-estabelecido. (Verhoest et al. 2014).

De acordo com Araújo (2000), o mecanismo de governação hierárquico apresenta, como a limitação à inovação, uma cultura mais centrada no procedimento do que no desempenho, falta de responsabilização e transparência.

As soluções de coordenação hierárquica sofrem de limitações que podem prejudicar a sua eficiência, nomeadamente quando são confrontadas com flutuações pronunciadas na procura de determinado bem ou serviço ou perante alterações imprevisíveis no mercado (Powell 1990).

Para Eggers (2008), o mecanismo de governação hierárquico está em declínio, provocado pela necessidade de resolução de problemas sociais complexos impulsionado por novas ferramentas que permitem a criação de respostas inovadoras. O foco central não está na

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13 organização de pessoas e programas, mas na gestão dos recursos, tendo em vista a produção de valor público.

Apesar das críticas ao mecanismo de governação hierárquico, Kooiman sugere que a governança hierárquica não desapareceu das sociedades contemporâneas, mas tem antes sofrido alterações e redefinições (citado por Rodrigues 2013:110).

Também Verhoest et al. (2014) defendem que o mecanismo de hierarquia é um recurso fundamental para as instituições governamentais lidarem com os seus problemas de gestão interna. A dificuldade reside em encontrar meios para equilibrar a justa autonomia das organizações públicas com as necessidades do Estado de forma coerente e coordenada.

2.2.2. Mecanismo de Mercado

O conceito de governação como mercado e a adoção de ferramentas de gestão privada para solucionar os problemas de eficiência está associado ao desenvolvimento do modelo da Nova Gestão Pública. Assim, o mecanismo de governação hierárquico foi alterado para novas formas de coordenação, assentes na contratação. Esta nova forma de atuação é justificada pela existência de maior responsabilização, fornecimento de produtos e serviços com menor custo e maior qualidade (Araújo 2000).

Segundo Powell (1990), o mecanismo de mercado potencia uma maior liberdade de escolha, flexibilidade e oportunidade por parte dos consumidores. A comunicação é feita de forma simples e rápida e pressupõe a disponibilidade de informação a todos os atores envolvidos, os quais procuram a maximização da sua utilidade, através de estratégias individuais.

A coordenação pelo mercado não proporciona uma linha clara e direta de responsabilidades, como aquela que é baseada no princípio de hierarquia. No âmbito do mercado, a assunção de responsabilidades é, geralmente, assumida na base da elaboração de contratos escritos. Também a divisão entre quem planeia e quem executa introduz problemas na definição de responsabilidades. De forma a superarem-se os problemas de coordenação e as dificuldades dos atores participantes na prestação do serviço, recorre-se à regulação para detalhar as condições do contrato e controlar a sua correta aplicação (Rodrigues 2011).

De acordo com Araújo (2000), a manutenção de uma concorrência genuína e a rivalidade nos contratos é difícil, principalmente para evitar a associação de empresas privadas e a possível corrupção na escolha de propostas. Por outro lado, para muitos serviços, especialmente os

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14 serviços sociais, não existem verdadeiros mercados, essencialmente pela inexistência adequada de oferta e a ausência de competitividade num mercado limita o benefício económico que a contratação poderia proporcionar.

Na utilização de mecanismos de mercado não quer dizer que o Estado se demita da sua função, o que importa é que a concorrência pode trazer melhores resultados de eficiência, independentemente de ser o Estado ou agentes privados, a produzir bens e serviços. O Estado altera o seu papel, atuando como moderador das relações estabelecidas com agentes privados, de forma a conseguir fornecer políticas que melhor sirvam a população (Chhotray & Stoker 2009). O Estado atua também como regulador da atividade privada que gere serviços públicos e da própria atividade pública que funciona num regime competitivo. O controlo exercido é do tipo ex post exercido pelos fatores preço e concorrência (Rodrigues 2011). Na opinião de Rhodes (1996), a concorrência ao nível dos preços é a chave para serviços eficientes e de maior qualidade.

O mecanismo de governação de mercado é o resultado da interação de três fatores (Verhoest et al. 2014:19):

 Auto coordenação “horizontal” entre as instituições do setor público e os restantes membros no mercado, através das forças de preços, concorrência, oferta e procura;  As entidades governativas são responsáveis pelo planeamento e controlo;

 O controlo é exercido principalmente ex post pelas instituições do setor público. A estrutura administrativa emergente da abordagem baseada no mercado realça o crescente número de pequenas estruturas agindo de uma forma autónoma e quase-autónoma. Laking (citado por Araújo 2013:96) identifica alguns problemas resultantes da fragmentação da Administração Pública, nomeadamente:

 O risco de as agências não colaborarem em objetivos importantes que sejam comuns;  Perda de controlo sobre as atividades das agências;

 Abdicação da responsabilidade política;

 Evasão a regras gerais de pessoal e orçamentais;  Exposição a riscos financeiros;

 Oportunidades de clientelismo político e a corrupção.

Peters e Pierre (1998) referem que, embora a ideia de competição como mecanismo para incrementar a eficiência do serviço público traga vantagens, nomeadamente a criação de

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15 mercados internos e a introdução de novas práticas no funcionamento interorganizacional, podem desenvolver novas fontes potenciais de gastos de recursos, ao mesmo tempo que eliminam outros problemas. Alguns mercados internos induzem as organizações a fornecer serviços em excesso, a partir da altura em que a procura não é definida pelo consumidor, mas sim pelo prestador.

2.2.3. Mecanismo de Redes

O mecanismo de redes está assente na reciprocidade e na interdependência entre os vários intervenientes. A coordenação só acontece após um processo de interação e de partilha de valores e informação, com os intervenientes da rede a abdicar de parte da sua autonomia na medida em que tal resultará em benefício mútuo. As ações individuais que apenas possam beneficiar um dos intervenientes minam a confiança mútua e reduzem o nível de eficiência da

network (Araújo 1998).

Para Agranoff e McGuire (1999), a rede é definida como arranjos interorganizacionais para resolver problemas que não podem ser abordados facilmente através de uma única organização.

A alteração de uma estrutura hierárquica para uma estrutura de rede constituiu uma importante mudança na governação. A abordagem top-down na implementação e controlo das políticas alterou-se, dando lugar à clara separação entre a formulação das políticas e a sua implementação. Um modelo de governação assente na teoria das redes implica um novo paradigma, uma vez que exige um processo de negociação e mediação, no lugar da aplicação de leis (Araújo 1998).

A confiança existente entre os intervenientes de uma rede pode resultar de uma tradição de cooperação que reconhece que a reciprocidade é mutuamente benéfica e permite alcançar mais facilmente objetivos comuns (Powell 1990). Para Klijn (2010), a governação através de uma rede, representa o centro da conceção e implementação de políticas públicas, através de uma teia de relações entre atores públicos, privados e sociedade civil. O verdadeiro impacto, da confiança, no funcionamento de uma rede, reside nos benefícios para a cooperação entre os atores e no aumento do fluxo de informação, de modo a atingirem-se soluções inovadoras. Assim, ao invés de assumir uma atitude competitiva, onde a relação é assumida como resposta às ameaças dos outros agentes, o modelo de redes assume uma postura mais colaborativa, aproveitando sinergias e partilhando recursos e riscos. Podemos concluir que existem três

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16 pilares fundamentais que caraterizam uma rede: confiança, reciprocidade e colaboração (Rodrigues, Araújo & Tavares 2010).

De acordo com Rhodes (1996), a participação nas redes permite aos cidadãos ter algum controlo sobre as políticas públicas, pelo que representam um desafio que obriga a que o Estado se adapte, procure novas formas de cooperação e passe a assumir a figura de facilitador. O Estado assume-se como mediador entre as partes, isto é, o elemento que facilita e integra a ação conjunta, o seu papel é o de promover relações interorganizacionais, em vez de controlar as suas ações (Rodrigues 2009).

No entanto, apesar das vantagens apontadas às redes, Milward e Proven (1998) referem que um problema critico, que afeta particularmente as redes estabelecidas entre as instituições não lucrativas e o setor público, reside na importância dada à eficácia global da rede, por parte dos financiadores, dos responsáveis políticos e dos serviços públicos, em detrimento do impacto da rede nas organizações individuais envolvidas no processo.

Kickert (1997 trad. Martinez 2005) reconheceu grande parte das críticas efetuadas ao mecanismo de redes, destacando as seguintes (p.25):

 Participar nas redes implica negociar e chegar a compromissos e logo os objetivos nem sempre são atingidos;

 Os procedimentos estabelecidos e os interesses implicados podem bloquear as soluções para novos problemas, bem como para a implementação de novas medidas políticas;

 Os processos políticos podem não ser transparentes. A interação informal, as estruturas de consulta complexas e a sobreposição das posições administrativas tornam impossível determinar quem é o responsável por cada decisão;

 A insuficiente legitimidade democrática, decorrente da interação entre os funcionários e representantes de grupos de interesses privados, outros órgãos públicos e as organizações implementadoras.

Segundo Rhodes, o mecanismo de redes (2000), é mais eficaz e desenvolve-se em condições onde o mecanismo de hierarquia e de mercado falharam, nomeadamente (p.83):

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17  Junta os decisores políticos e as agências de implementação, aumentando deste modo

a troca de informação e conhecimento disponíveis;

 Junta vários atores no processo de negociação da política, aumentando a aceitação da mesma, bem como a probabilidade do seu cumprimento;

 Aumenta os recursos disponíveis através da formulação de políticas em conjunto, com os vários setores (público, privado e voluntário).

Para Kooiman (2003), a remodelação das atividades estatais e a tomada de consciência sobre a necessidade de cooperar com outros atores sociais, não converteu as intervenções governamentais tradicionais em obsoletas, simplesmente foi criada uma crescente consciencialização, não só das limitações da tradicional ordem e controlo público como mecanismo de governação, como também a necessidade de resposta a problemas sociais que requerem um maior número de abordagens e de instrumentos.

Também para O’Toole, (2005:258) as ações dirigidas à criação de confiança, ao desenvolvimento de normas, da reciprocidade e outras formas de incrementar o dinamismo das redes em cenários para programas públicos, podem ser não só elementos possíveis como também essenciais à Administração Pública.

“Se a competência nos preços é o mecanismo central de coordenação do mercado e as ordens administrativas o são para a hierarquia, então são a confiança e a cooperação as que articulam centralmente as redes” (Frances citado por Rhodes 1996:659).

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3.Opções Metodológicas

3.1.Modelo de Análise

O modelo de análise da investigação, no âmbito da relação entre o Estado e as IPSS, irá assentar nos conceitos relevantes para a definição dos modelos de governação, sobretudo a Nova Gestão Pública e Governança, que iremos associar à governação através dos instrumentos do mercado e das redes, não deixando de lado o Modelo Profissional Weberiano, associado ao exercício da hierarquia.

O nosso estudo visa, deste modo, caraterizar a resposta social de tipo creche no que se refere aos mecanismos e estruturas de governação adotados (hierarquia, mercado e redes).Ao longo da história da Administração Pública, as reformas ou as mudanças no sistema administrativo estão associadas a diferentes modelos de gestão pública que, por sua vez, estão associados às mudanças no modelo de Estado (Araújo 2007).

O tradicional e mais simples modelo hierárquico é atualmente desafiado por mecanismos de governação mais complexos: (a) mecanismos de mercado assentes em ambiente de concorrência; e, mecanismos de rede, baseados em princípios de partilha de informação, recursos e no estabelecimento de parcerias (Araújo 2005).

Antes da apresentação das questões de investigação, apresentamos aqui o modelo de análise de forma esquemática:

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19 De acordo com o modelo de análise, passamos a enunciar os conceitos fundamentais que serão trabalhados:

 Instrumentos de Governação Pública – Mecanismos associados ao exercício da governação pública, que adquirem importância diversa, conforme as caraterísticas principais do exercício da gestão pública. A transição das formas tradicionais de governação hierárquica para a governação em rede é vista como o resultado das próprias transformações do Estado. Atualmente, são reconhecidos três diferentes instrumentos de governação: hierarquia, mercado e redes.

o Hierarquia: Mecanismo assente na definição de regras e objetivos, distribuição de tarefas, atribuição de responsabilidades e controlo direto. A Administração Pública é tradicionalmente caraterizada por organizar a sua estrutura de

Modelos de Governação Pública

Figura 1 – Modelo de Análise. Fonte: Elaboração própria

Modelo Profissional Weberiano Principal Instrumento de governação: Hierarquia Modelo da Nova Gestão Pública Principal Instrumento de governação: Mercado C Contrato Modelo Governança Pública Principal Instrumento de governação: Redes

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20 acordo com o modelo weberiano, assente numa separação vertical das tarefas e autoridade.

o Mercado: A introdução deste mecanismo na Administração Pública alterou a noção de serviço público, bem como a natureza dos agentes com responsabilidades ativas na produção de bens e serviços para a comunidade. Instrumento de governação baseado num contrato, onde o Estado fica com a responsabilidade de financiar o bem ou serviço e transfere a responsabilidade de produção a uma empresa pública, privada ou para instituições sem fins lucrativos.

o Redes: Surge como uma alternativa ao modelo hierárquico e produtor de bens e serviços públicos, fornecendo os referidos bens e serviços, numa ação conjunta de vários atores, ou seja, em parceria, com base na confiança e colaboração.

 Cooperação entre o Estado e as IPSS no exercício da Ação Social - o mercado social é partilhado por entidades lucrativas e organizações sem fins lucrativos. Para uma melhor qualidade de vida, existem falhas de mercado que têm que ser colmatadas pelo Estado, tendo em conta que estamos a falar de bens coletivos considerados de mérito. A intervenção da Estado é feita, maioritariamente, através das IPSS, com a celebração dos acordos de cooperação.

o Acordo de Cooperação: contrato escrito através do qual, nos termos do regime da cooperação, se estabelece uma relação jurídica, com vista ao desenvolvimento de uma determinada resposta de apoio social, entre as Instituições sem Fins Lucrativos que as prosseguem e os Centros Distritais do Instituto da Segurança Social (ISS, I.P.), que as apoiam técnica e financeiramente (DDSP-UCRS 2013).

o Contrato de atribuição: o cocontratante privado obtém uma situação de vantagem própria, mediante uma contrapartida. Os acordos de cooperação entre o Estado e as IPSS encaixam neste tipo de contrato administrativo (Andrade 2010).

 Resposta social creche: tem como destinatários as crianças até aos três anos de idade. Foi criada com objetivo de partilhar responsabilidades com a família, no processo

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21 evolutivo da criança, proporcionando-lhe, durante o tempo de afastamento familiar, um ambiente de bem-estar. Visa também despistar a inadaptação ou deficiência, contribuindo para um encaminhamento adequado, assim como prevenir e compensar falhas culturais e sociais, sentidas no ambiente familiar (Portaria n.º 262/2011, de 31 de agosto).

3.1.1.Questões de investigação

A pergunta de partida anteriormente apresentada será desenvolvida através da resposta às seguintes questões de pesquisa:

 Como se definem os acordos de cooperação, no fornecimento da resposta social Creche, ao nível dos mecanismos de governação pública adotados (hierarquia, mercado e redes)?

 De que forma exerce o Estado a coordenação e fiscalização da resposta social Creche?  A provisão do bem social Creche está a ser assegurada de forma eficaz, através dos acordos de cooperação? Conseguirá o Estado garantir a prestação do bem social Creche através de uma resposta que cumpra objetivos definidos?

3.2. Enfoque metodológico

No presente estudo, optámos por um estudo de caráter misto, embora de natureza predominantemente qualitativa. De acordo com Quivy & Compenhaudt (1998), o tipo de investigação qualitativa permite uma análise mais aprofundada, o que permite desbravar novas pistas de estudo. Contudo, o recurso a dados quantitativos foi um complemento importante. A premissa central da abordagem metodológica mista é a possibilidade de a combinação dos resultados obtidos fornecer uma melhor compreensão do problema em estudo (Creswell & Clark 2007).

A nossa investigação incide no caso de estudo dos acordos de cooperação para a resposta social creche acompanhados pelo Centro Distrital de Setúbal.

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22

3.2.1. Instrumentos de recolha de dados

Para a recolha de dados, utilizámos três instrumentos distintos: a análise documental, o questionário e a entrevista semiestruturada.

A análise documental incidiu sobre grande variedade de documentos, desde Relatórios, minutas de acordos de cooperação, Guiões Técnicos, legislação, entre outros, que serviram essencialmente para a caraterização da resposta social Creche.

Num segundo momento, adotámos, como instrumento de recolha de informação, um inquérito por questionário online, que foi enviado por correio eletrónico às instituições sem fins lucrativos que prestam a resposta social Creche no distrito de Setúbal (um universo de cerca de 137 instituições, de acordo com listagem extraída do site da Carta Social). Com a realização deste inquérito procurou-se levantar alguns aspetos dos acordos de cooperação na opinião dos dirigentes das IPSS. O questionário (que se apresenta no Anexo A) foi elaborado através do Google Forms, tendo sido disponibilizado um link para as instituições acederem ao mesmo e procederem ao seu preenchimento, no período de março a maio de 2018. No entanto, a taxa de retorno foi reduzida (23 respostas), pelo que se optou por não dar destaque a esses resultados, limitando-nos a efetuar uma apresentação dos dados por frequências absolutas às perguntas que integravam o questionário.

Por último, recorreu-se à entrevista semiestruturada como principal instrumento de recolha de dados. Com base no modelo de análise, construiu-se o guião de entrevista (Anexo B), de modo a conhecermos as diferentes perspetivas dos atores envolvidos, desde a entidade responsável pela tutela e financiamento dos acordos de cooperação (ISS, I.P), até às entidades parceiras (IPSS). A opção por esta técnica prendeu-se com o caráter versátil da mesma, passível de ser aplicada em múltiplos contextos e de dar maior relevo ao que o entrevistado tem para transmitir, sem perder o foco e garantindo a comparabilidade das entrevistas. Também permite encontrar pistas e resultados que os dados quantitativos à partida não permitiriam obter (Quivy & Compenhaudt 1998).

3.2.2. Recolha de dados

As entrevistas foram semiestruturadas e tiveram uma duração média de 60 minutos. Procurou-se realizar entre sete a nove entrevistas, abrangendo dirigentes e técnicos superiores do ISS, I.P. e das instituições sem fins lucrativos. No entanto, apenas nos foi possível realizar, com sucesso, sete das entrevistas programadas.

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23 As entrevistas foram registadas em áudio, com prévio consentimento dos entrevistados e depois transcritas (Anexo F). Posteriormente, foram remetidas aos entrevistados para revisão e eventual retificação.

De modo a salvaguardar o anonimato de cada um dos entrevistados foi atribuído um código a cada entrevista, conforme se explicita em baixo:

Tabela 4 – Codificação das entrevistas.

Série Data Entrevista Entrevistado Grupo Interesse

E1 01/03/2019 Diretora Núcleo Centro Distrital Segurança Social de Setúbal E2 01/03/2019 Diretora Unidade Centro Distrital Segurança Social de Setúbal E3 16/03/2019 Técnica Superior Centro Distrital Segurança Social de Setúbal E4 27/03/2019 Dirigente Instituições sem fins lucrativos

E5 05/04/2019 Dirigente Instituições sem fins lucrativos E6 11/04/2019 Dirigente Instituições sem fins lucrativos E7 03/05/2019 Diretor Unidade Serviços Centrais do ISS,IP E8 Não realizada Diretora Unidade Serviços Centrais do ISS,IP

Fonte: autoria própria

Após a recolha de dados, procedeu-se à análise de conteúdo das entrevistas, que se pretendeu de cariz essencialmente qualitativo. Bardin (2008) considera três fases distintas da análise de conteúdo: pré-análise, exploração do material e tratamento dos resultados, inferência e interpretação.

Numa primeira fase, com base na transcrição das entrevistas e pela revisão da literatura, definiram-se as dimensões de análise. Numa segunda fase, efetuou-se a categorização dos dados, tendo sido criados os níveis nos quais serão caraterizadas as unidades de análise (Sampieri 2006). As categorias e subcategorias criadas, de base temática, surgiram com base na literatura e encontram-se ilustradas na Matriz de Codificação Inicial dos Dados (Anexo C). Por último, no âmbito da análise de conteúdo (Anexo D), as entrevistas foram sistematizadas em unidades de registo, as quais se encontram dividas pelos Quadros I a VII.

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24

4. Acordos de Cooperação entre o Estado e as IPSS

4.1. As características institucionais das IPSS em Portugal

A regulamentação das IPSS, nos termos constitucionalmente previstos, só veio a ter lugar com o respetivo Estatuto aprovado pelo Decreto-Lei n.º 519-G2/79 de 29 de Dezembro. As IPSS foram assim caraterizadas (artigo 1.º):

 Como instituições sem finalidade lucrativa;  Criadas por iniciativa particular;

 Com o propósito de dar expressão organizada ao dever moral de solidariedade e de justiça entre os indivíduos;

 Com o objetivo de facultar serviços ou prestações de segurança social.

A forma de cooperação entre o Estado e as IPSS foi regulamentada1 no ano seguinte à

publicação do Estatuto, tendo tornado os acordos de cooperação um instrumento obrigatório para a atribuição de subsídios às instituições, acentuando-se, deste modo, a natureza contratual das relações de cooperação entre as IPSS e o Estado.

Estabelecia-se no Estatuto que as instituições “fazem parte do sistema de segurança social referido no art.º 63º da Constituição, pelo que são reconhecidas, valorizadas e apoiadas pelo Estado que as orienta e tutela, as coordena e subsidia, estando ainda representadas em todos os escalões da estrutura de participação do sistema” (art.º 2º).

Previu-se que as instituições revestissem qualquer das seguintes formas: associações de solidariedade social, irmandades da Misericórdia, cooperativas de solidariedade social; associações de voluntários de ação social, associações de socorros mútuos e fundações de solidariedade social (Amaral 1996:566).

Com a revisão da Constituição da República Portuguesa de 1982, foi novamente alterada a redação do n.º 3 do artigo 63.º, passando a ser definidos de forma expressa “quais” os objetivos de segurança social passíveis de prossecução por parte daquelas instituições. Em 1983, foi publicado o novo Estatuto das IPSS através do Decreto-Lei nº 119/83, de 25 de fevereiro.

Esta alteração do conceito das IPSS teve implicações na própria estruturação do diploma, nomeadamente no capítulo da tutela do Estado, desde logo porque a tutela deixou de competir

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25 exclusivamente ao Ministério dos Assuntos Sociais, pelo que as referências àquele ministério foram substituídas por referências ao “ministério da tutela” (Amaral 1996:570).

Com a entrada em vigor do Estatuto das IPSS de 1983, mantêm-se o esquema de cooperação entre o Estado e as IPSS, a estabelecer mediante acordos.

De acordo com a Lei de Bases da Segurança Social de 1984 (Lei n.º 28/84, de 14 de agosto), o Estado apoia e valoriza as instituições particulares de solidariedade social e outras de reconhecido interesse público, sem carácter lucrativo, que prossigam objetivos de solidariedade social (n.º 1 do artigo 32º).

Neste período, as normas reguladoras dos acordos de cooperação vieram a ser alteradas pelos Despachos Normativos n.º 118/84, de 8 de junho, e n.º 12/88, de 12 de março e, posteriormente, e pelo Despacho Normativo n.º 75/92, de 20 de Maio, o último ainda em vigor na presente data. Estas normas regulam os acordos de cooperação, que visam definir os termos da comparticipação do Estado às instituições para as despesas correntes de funcionamento dos serviços e equipamentos sociais.

A revisão constitucional de 1989 envolveu uma nova alteração ao n.º 3 do artigo 63º, afastando a perspetiva de mera “permissão” de existência das IPSS, passando a afirmar-se como o “direito à constituição”. A consagração deste direito é bastante relevante e consistiu num momento de reforço do papel destas instituições na prossecução de objetivos de segurança social, estabelecendo as bases necessárias para a assinatura do Pacto de Cooperação para a Solidariedade Social, em dezembro de 1996 (Joaquim 2015).

Os subscritores do Pacto comprometeram-se a formalizar um “modelo de relacionamento” entre o Estado e as IPSS, nomeadamente através da celebração dos acordos de cooperação anuais (Joaquim 2015).

No ano de 2000, foram aprovadas as bases gerais do Sistema de Solidariedade e Segurança Social (Lei n.º 17/2000, de 8 de agosto), a qual entrou em vigor três anos e meio após a assinatura do Pacto de Cooperação para a Solidariedade Social, no qual estava prevista uma “revisão global da legislação aplicável às IPSS”. Contudo, essa revisão legislativa não se concretizou até à atualidade (Joaquim 2015).

Passados apenas dois anos, entrou em vigor a Nova Lei de Bases do Sistema de Solidariedade e de Segurança Social (Lei n.º 32/2002, de 20 de dezembro), estabelecendo, no seu artigo 5º,

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26 que, a par das instituições públicas, designadamente autarquias, o Sistema de Ação Social poderia ser igualmente desenvolvido por instituições particulares sem fins lucrativos.

Em 2007, foram aprovadas as bases gerais do Sistema de Segurança Social (Lei n.º 4/2007, de 16 de janeiro), as quais estão atualmente em vigor, estabelecendo, no seu artigo 31º (Desenvolvimento da Ação Social), que a “ação social é desenvolvida pelo Estado, pelas autarquias e por instituições privadas sem fins lucrativos, de acordo com as prioridades e os programas definidos pelo Estado (…) ”.

As sucessivas leis de bases deixam transparecer que a estruturação das relações entre o Estado e as IPSS se faz segundo o princípio institucional da subsidiariedade. Apesar de só muito recentemente se ter tornado explícito nos textos legais, mais especificamente, na Lei de Bases da Segurança Social, o princípio da subsidiariedade2 parece ter estado sempre presente na

estruturação das relações entre Estado e IPSS (Ferreira 2008).

4.2 O papel do Estado

O modelo de relação entre o Estado e as IPSS, tal como foi inicialmente concebido em 1979 pelo Decreto-Lei n.º 519-G2/79 (estabelece o regime jurídico das IPSS), desenvolve-se em torno dos seguintes princípios (artigo 5.º):

 Liberdade de associação;

 Responsabilidade social das instituições perante o Estado e os beneficiários, segundo o qual os interesses dos utentes se sobrepõem aos da Instituição;

 Cooperação interinstitucional e das instituições com os serviços públicos;

 Integração no Sistema de Segurança Social, o que implica o cumprimento, por parte das instituições, das orientações definidas para o sistema e a não discriminação dos cidadãos em função de ideologia, política, racial ou outro;  Reconhecimento do caráter privado, de onde resulta o respeito pelo Estatuto da

instituição, mas também o reconhecimento que os apoios públicos se destinam a reforçar os recursos próprios da IPSS.

2 Segundo o artigo 11º da lei de bases de 2007, o princípio da subsidiariedade “assenta no reconhecimento do

papel essencial das pessoas, das famílias e de outras instituições não públicas na prossecução dos objetivos da segurança social, designadamente no desenvolvimento da ação social.”

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Tabela 1- Elementos chave da NGP
Tabela 3. Comparação entre Mecanismos de Governação
Figura 1 – Modelo de Análise. Fonte: Elaboração própria Modelo Profissional Weberiano Principal Instrumento de governação:  Hierarquia Modelo da Nova Gestão Pública Principal Instrumento de governação: Mercado C Contrato  Modelo   Governança Pública Princi
Tabela 4 – Codificação das entrevistas.
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