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Sumário. Texto Integral. Tribunal da Relação de Évora Processo nº 2234/08-1

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Tribunal da Relação de Évora Processo nº 2234/08-1

Relator: CARLOS BERGUETE COELHO Sessão: 09 Dezembro 2008

Votação: UNANIMIDADE

Meio Processual: RECURSO PENAL Decisão: NEGADO PROVIMENTO

SEGREDO DE JUSTIÇA

Sumário

O art.86º, nº.3, do Código de Processo Penal, no segmento em que prevê que fica sujeita a validação pelo juiz de instrução, a decisão de aplicação ao

processo, na fase de inquérito, do segredo de justiça, não ofende os princípios do Estado de Direito Democrático, consagrados no artigo 2º da CRP e

concretizados nos artigos 32º nº 5 e 219º nº 1 da CRP.

Texto Integral

Acordam, em conferência, na Secção Criminal do Tribunal da Relação de Évora

*

1. RELATÓRIO

Nos autos de inquérito com o nº…, correndo termos nos Serviços do Ministério Público da Comarca de …, o Digno Procurador-Adjunto, por despacho de 09.07.2008, designadamente consignou:

Os factos comunicados pela GNR são indiciariamente subsumíveis ao tipo legal do crime de violência doméstica, pp art.152° n.º 1 al. b) e n.º 2 do Código Penal.

Atenta a determinação efectuada na directiva de 9 de Janeiro de 2008, definida por S. Exª o Conselheiro Procurador Geral da República (circular 1/2008 - DE), onde se refere que “sempre que esteja em causa investigação relativa aos crimes previstos no art.1°, al. j) a m) do CPP (…) o Ministério

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Público determinará, no início do inquérito, a sujeição deste a segredo de justiça...”, nos termos do disposto no art.86° n.º 3 do CPP.

Dado que o crime em investigação nestes autos é punível com pena de prisão até cinco anos, tratando-se, pois, atenta a natureza do bem jurídico pela incriminação de “criminalidade violenta” a que alude o art.1° al. j) do CPP, determino a aplicação aos autos de segredo de justiça.

Impõe o art.86° n.º 3 CPP que esta decisão do Ministério Público seja validada pelo Juiz de Instrução Criminal no prazo de 72 horas.

Assim sendo, ordeno a remessa dos autos à Mma. JIC, promovendo-se que a Mma. JIC se abstenha de proferir decisão no sentido de validação ou da não validação da decisão de submeter o inquérito a segredo de justiça, recusando a aplicação da norma do n.º 3 do art.86º do CPP, por inconstitucionalidade material deste normativo com os fundamentos que se passam a expor (…)

Por sua vez, a Exma. Juiz de Instrução, em 18.07.2008, proferiu despacho, do qual, mormente, resulta:

Por despacho datado de 09 de Julho de 2008, o Digno Magistrado do

Ministério Público determinou a sujeição do presente inquérito a segredo de justiça, por aplicação da directiva de 9 de Janeiro de 2008 emitida pela Procuradoria - Geral da República (Circular 1/2008 - DE).

Na sequência dessa decisão, e tendo por referência o artigo 86.°, n.º 3, do Código de Processo Penal na parte em que exige a validação judicial, requer a abstenção de decisão de validação ou não validação, recusando a aplicação do artigo 86.°, n.º 3, do Código de Processo Penal, por inconstitucionalidade

material deste preceito legal, nos moldes que resume em sede de conclusão do seguinte modo:

I - O acto de validação da decisão do Ministério Público de sujeitar o inquérito a segredo de justiça pelo Juiz de Instrução Criminal traduz uma confusão de funções constitucionais do Ministério Público e do Juiz de Instrução Criminal do inquérito;

II - Tal acto de validação coloca o Ministério Público na acção penal prévia numa relação de subordinação e dependência processual do Juiz de Instrução Criminal;

III - Em consequência, o normativo do artigo 86.°, n.º 3, do Código de

Processo Penal, atinge a estrutura acusatória do processo penal e o estatuto constitucional da Magistratura do Ministério Público, pondo em causa o princípio do monopólio da acção penal pelo Ministério Público e a sua autonomia;

IV - Desta forma atinge a imparcialidade e a função jurisdicional e

consequentemente garantias judiciárias fundamentais do Estado de direito

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democrático;

V - A intervenção do Juiz de Instrução Criminal no acto de sujeição do

inquérito a segredo de justiça não se encontra legitimada por qualquer direito fundamental;

VI - Assim, a norma do artigo 86.°, n.° 3, do Código de Processo Penal viola o disposto nos artigos 2.°, 32.°, n.º 5, e 219.°, n.º 1, da Constituição da

República Portuguesa, pelo que deve ser desaplicada por inconstitucionalidade material.

Os tribunais, sendo independentes e apenas estando sujeitos à lei, não podem, nos feitos submetidos a julgamento, aplicar normas que infrinjam o disposto na Constituição ou os princípios nela consignados (cfr. artigos 203.° e 204.° da Constituição da República Portuguesa).

(…)

O normativo que se pretende ver desaplicado, por ser contendor com parâmetros fundamentais, vem previsto no artigo 86.°, n.º 3, do Código de Processo Penal, na redacção dada pela Lei n.º 48/2007, de 29 de Agosto, e preceitua do seguinte modo: «Sempre que o Ministério Público entender que os interesses da investigação ou os direitos dos sujeitos processuais o

justifiquem, pode determinar a aplicação ao processo, durante a fase de inquérito, do segredo de justiça, ficando essa decisão sujeita a validação pelo juiz de instrução no prazo máximo de setenta e duas horas».

Constitui um elemento integrador do novo paradigma introduzido com a reforma do processo penal operada pela referida lei no que ao regime do segredo de justiça concerne.

Assim, a regra da publicidade do processo penal, sob pena de nulidade (cfr.

artigo 86.°, n.º 1, do Código de Processo Penal) passou a aplicar-se à fase de inquérito, com duas excepções: quando o juiz de instrução, mediante

requerimento do arguido, do assistente ou do ofendido e ouvido o Ministério Público, determinar, por despacho irrecorrível, a sujeição do processo,

durante a fase de inquérito, a segredo de justiça, quando entenda que a publicidade prejudica os direitos daqueles sujeitos ou participantes

processuais (cfr. artigo 86.°, n.º 2, do Código de Processo Penal) ou quando o juiz de instrução validar a decisão do Ministério Público que determinar a aplicação do segredo de justiça ao processo, durante a fase de inquérito, sempre que entender que os interesses da investigação ou os direitos dos sujeitos processuais o justifiquem (cfr. artigo 86.°, n.º 3, do Código de Processo Penal).

Muito embora a intervenção do juiz de instrução não tenha um sentido

unívoco numa e noutra excepção, já que na primeira relevam os interesses dos sujeitos ou participantes processuais (como a defesa do seu bom nome e da

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reserva da vida privada) e na segunda, aquando da validação da decisão do Ministério Público, relevam os interesses da investigação ou os interesses dos sujeitos processuais (preponderando ainda o exercício do direito de defesa do arguido na decisão de levantamento do segredo de justiça a que alude o artigo 86.°, n.º 5, do Código de Processo Penal), parece que o seu fundamento,

inerente à função de “juiz das liberdades”, surte associado aos valores que mais recentemente têm vindo a justificar o segredo de justiça.

Se este tradicionalmente visava a garantia da eficácia da investigação criminal, a imparcialidade do processo e do julgamento e a preservação da vida privada do arguido (que se presume inocente até trânsito em julgado da condenação), com o debate que se gerou na comunidade jurídica, é justificado de modo mais intenso com a defesa da reserva da vida privada, do bom nome e da reputação dos ofendidos, arguidos ou outros intervenientes no processo crime e, bem assim, com a necessidade de garantir o respeito do princípio da presunção de inocência do arguido (artigo 32.°, n.º 2, da Constituição da República Portuguesa).

(…)

Por um lado, «A regra da publicidade constitui assim uma forma de assegurar a plena e ampla autenticidade e independência dos intervenientes processuais arguidos, ofendidos, assistentes - que, cobertos por ela, podem acompanhar, vigiando, a forma como o tribunal se comporta na administração da justiça; e este, por seu turno, ganha força para poder «impor» as decisões que toma»

(M. Simas Santos e M. Leal - Henriques, Código de Processo Penal Anotado, I volume, 2.a edição, 2003, Rei dos Livros, página 452). Este princípio, como visto, sofreu um alargamento para as fases preliminares do processo, em parte como reflexo da mediatização da sociedade e de a mesma ter determinado que o acompanhamento dos casos em apreciação na Justiça não se satisfaça já apenas com o espaço da audiência de julgamento e, em parte, como

decorrência das novas leituras em termos da conformação das garantias de defesa potenciadas pelo processo e do papel que a publicidade e o acesso ao conteúdo do mesmo podem desempenhar na estruturação dessas garantias e tendo surgido como um dos corolários do Estado de Direito no que se refere à administração da Justiça, com repercussão directa na conformação das

garantias de defesa do arguido, trata-se de um princípio que encontra a sua justificação última na necessidade de fiscalização e controlo da actividade dos tribunais pelos cidadãos, e no reforço da legitimidade e do acatamento das decisões destes (veja-se o Parecer do Conselho Consultivo da Procuradoria- Geral da República, de 28 de Fevereiro de 2008, a propósito da aplicação do regime processual penal do segredo de justiça ao processo contra-

ordenacional, n.º convencional PGRP00002941, in www.pgr.pt).

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(…)

Por outro lado, ao segredo de justiça vem a ser atribuída uma dupla função de tutela: por um lado, de valores tributários de direitos individuais fundamentais do cidadão arguido; por outro lado, de protecção da eficácia da investigação (M.Simas Santos eM. Leal- Henriques, loc. cit., página 461).

(…)

O segredo de justiça, de regra passa a excepção, e assume na sua

fundamentação equilíbrios diversos relativamente à anterior versão do código:

o relevo das exigências de investigação face à tutela da imagem do arguido e dos interesses com ela conexos é claramente reduzido (conforme se aduz no mencionado Parecer do Conselho Consultivo da PGR).

Como assim, atribui a lei ao juiz de instrução o dever de ponderar o conflito, quando exista, e dar prevalência aos interesses que julgue mais relevantes, não podendo olvidar os elementos do segredo que servem objectivamente os interesses comuns, no caso da excepção do n.º 2 do artigo 86.° do Código de Processo Penal, e o de ponderar, os direitos dos sujeitos processuais ou os interesses da investigação face à determinação pelo Ministério Público da sujeição do inquérito ao segredo de justiça, no caso do n.º 3 do mesmo artigo 86.°.

Nesta hipótese, que é a que nos ocupa, é certo que a validação/não validação da decisão do Ministério Público pelo Juiz de Instrução pode colidir com a função processual do segredo de justiça e com o equilíbrio desenhado no código nas relações entre as duas autoridades judiciárias e respectivas funções constitucionais (cfr. artigo 219.° da Constituição da República

Portuguesa), sendo o modelo processual acolhido no Código de Processo Penal de 1987 de matriz essencialmente acusatória, integrado por um princípio da investigação, em que a separação material e funcional entre acusação

(Ministério Público) e julgamento (Juiz) é praticamente absoluta.

Na realidade, sendo a “validação” sinónimo de «Acção ou resultado de legitimar, tornar válido um acto, um documento» e “validar” sinónimo de

«Provar ou confirmar que é verdadeiro ou que está correcto; fazer a validação de alguma coisa; autenticar, confirmar, legitimar» (in Dicionário da Língua Portuguesa Contemporânea, Academia das Ciências de Lisboa, II Volume, Verbo, 2001, página 3699), o que parece resultar do normativo do artigo 86.°, n.º 3, do Código de Processo Penal, é uma exigência de intervenção e de

ponderação dos mesmos critérios (interesses da investigação e direitos de sujeitos processuais) ao Ministério Público e ao Juiz de Instrução, sendo o acto de validação deste requisito de validade e eficácia da decisão daquele, quando são magistraturas autónomas que actuam numa relação de equiordenação, que implica, por um lado, que «o juiz de instrução não pode ordenar ao

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Ministério Público o sentido em que deve exercer as suas competências, designadamente a acção penal» e, por outro lado, que «o Ministério Público, apesar de através da sua iniciativa definir o objecto e os limites da decisão judicial, não pode prescrever os respectivos termos ou aplicar medidas que afectem direitos, liberdades e garantias (que são uma matéria de exclusiva competência judicial)» (vide Paulo Dá Mesquita, in “Direcção do Inquérito Penal e Garantia Judiciária”, Coimbra Editora, 2003, página 171 e 172).

Todavia, é o compromisso entre a estrutura acusatória e o princípio da investigação que explica a principal antinomia estatutária do Ministério Público, que por um lado, deve agir vinculado a critérios de objectividade (exercer a acção penal orientada pelo princípio da legalidade democrática), traducentes na busca da maior igualdade de armas entre a acusação e a defesa, mesmo numa fase em que o princípio do contraditório não vale e em que aquele actua com efectiva direcção e domínio, como é a fase de inquérito, e, por outro lado, deve participar na execução da política criminal, nos termos da lei e com salvaguarda da sua autonomia e estatuto próprio, encerrando a sua actividade um carácter polifuncional e uma dimensão política (que explica a emissão de directivas de execução de objectivos de política criminal, como a que foi aplicada neste processo), sendo, não uma parte (o processo penal não é um processo de partes), mas também um sujeito processual que deve

deduzir e sustentar efectivamente a acusação (artigo 53.º, n.º 2, alínea c), do Código de Processo Penal).

Ao sentido e fundamento da decisão do Ministério Público de sujeitar o inquérito ao regime de segredo de justiça não será alheia a apontada antinomia, incumbindo ao Juiz de Instrução intervir como a entidade

equidistante, o garante dos direitos fundamentais ordenadores da regra da publicidade do processo e, bem assim, da determinação do segredo de justiça, sendo diferenciada, pois, a perspectiva com que cada um intervém no mesmo processo decisório.

Como assim e à semelhança de outras decisões do Ministério Público que dependem da apreciação do Juiz de Instrução para produzirem os seus efeitos, como é o caso da concordância relativamente à suspensão provisória do

processo, prevista no artigo 281.º, n.ºs 1, e 5, do Código de Processo Penal, o acto de validação do Juiz de Instrução previsto no artigo 86.º, n.º 3, do Código de Processo Penal, não encerra, em nosso entender e com respeito por opinião contrária, qualquer confusão de funções constitucionais, nem colide com

qualquer garantia do Estado de Direito Democrático.

Sem questionar a investigação (e o papel do Ministério Público enquanto titular da acção penal), a sujeição de processo ao segredo de justiça deve, assim, ser abordada casuisticamente (como a lei processual penal exige) e no

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caso de se afirmar a necessidade processual de aplicação de tal regime, a compreensibilidade da intervenção do juiz de direitos, liberdades e garantias alcança-se da noção de que o segredo de justiça não pode eliminar as

garantias de defesa do arguido. Trata-se de questão que contende com direitos fundamentais, que, como tal, legitima a intervenção provocada, típica e

excepcional do Juiz de Instrução, funcionando, também nesta sede, a regra de controlo dos direitos, liberdades e garantias individuais, transversal ao

sistema processual penal português.

Por conseguinte, em nosso entender e sem prejuízo de melhor opinião, a norma do artigo 86.º, n.o 3, do Código de Processo Penal, admite ainda uma interpretação conforme à Constituição da República Portuguesa, quando exige a validação judicial de uma decisão do Ministério Público de determinação do segredo de justiça ao processo com base nos interesses da investigação, servindo a indicação e fundamentação destes, não para o juiz elaborar um qualquer juízo de oportunidade ou de relevância, mas para alcançar o grau de lesão que para eles implicará a publicidade dos autos de tal modo legitimador da aplicação do regime excepcional do segredo de justiça e constrangedor dos direitos de defesa do arguido, sem perder de vista, porém, que o tempo do contraditório no processo penal é diferido, vigorando de pleno apenas em fases processuais subsequentes.

(…)

Termos em que, com a fundamentação atrás exposta, decido não declarar inconstitucional a norma prevista no artigo 86.º, n.º 3, do Código de Processo Penal, e, em consequência, determino a sua aplicação ao presente processo.

(…) ao abrigo do disposto no artigo 86.°, n.º 3, in fine, do Código de Processo Penal, na sua actual redacção, não se valida a decisão do Ministério Público de sujeição do presente inquérito ao regime do segredo de justiça.

Notifique.

Devolva.

Inconformado com tal despacho, o Ministério Público interpôs recurso, formulando as conclusões:

1. A decisão recorrida, ao aplicar o preceito do artigo 86º nº 3 do CPP, violou os princípios do Estado de Direito Democrático consagrados no artigo 2º da CRP e concretizados nos artigos 32º nº 5 e 219º nº 1 da CRP.

2. A estrutura acusatória do processo penal - artigo 32º nº 5 - é garantida pela consagração, na CRP e no Estatuto do Ministério Público, da autonomia,

defesa da legalidade democrática, e monopólio da acção penal por esta Magistratura - artigo 219º nº 1 - e pela separação funcional entre

Magistraturas e fases processuais.

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3. Tal estrutura e estatuto constitucional do Ministério Público são violados ao sujeitar a um acto de validação, pelo JIC, de uma decisão do Ministério

Público, como se efectuou nos presentes autos, na medida em que implica que o JIC se sobreponha ao titular do inquérito, mediante uma intervenção não justificada pela defesa de direitos fundamentais, colocando em causa a imparcialidade do Juiz e a independência entre Juiz de Instrução, Juiz de Julgamento e Ministério Público.

4 - O Ministério Público, como Magistratura vinculada a princípios da

legalidade e objectividade, é também garante dos direitos fundamentais dos cidadãos, ponderando necessariamente os direitos do arguido e restantes sujeitos processuais e os interesses da investigação, aquando da determinação da sujeição do processo a segredo de justiça.

5 - A intervenção do JIC consagrada no artigo 86º nº3 do CPP, é destituída de fundamento, pois o direito ao bom nome poderá ser defendido, e o direito ao contraditório exercido, em fase processual posterior ao inquérito, onde vigora em pleno a regra da publicidade, ao que acresce que o direito ao bom nome já resulta protegido com a sujeição do inquérito a segredo de justiça, carecendo igualmente de justificação a intervenção do JIC sempre que, como nestes autos, ainda não há arguido constituído.

6 – Na fase do inquérito, o direito à segurança, em nome do qual a

comunidade conferiu ao Estado, através do Ministério Público, os poderes de investigação e repressão criminal, exige que o direito à informação tenha que ser comprimido.

Termos em que se entende que a decisão recorrida deve ser substituída por outra, que declare a inconstitucionalidade do artigo 86º nº 3 do CPP, por violação dos artigos 2º, 32º nº 5 e 219º nº 1 da Constituição da República Portuguesa, e, em consequência, se abstenha de proferir decisão de validação ou não validação da determinação do Ministério Público de sujeitar o presente inquérito a segredo de justiça, deste modo fazendo Vossas Excelências Justiça.

O recurso foi admitido por despacho de fls.46, tendo, ainda, sido sustentado o decidido por despacho de fls.47.

Neste Tribunal da Relação, a Digna Procuradora-Geral Adjunta emitiu douto parecer, de fls.52/53, no sentido de ser negado provimento ao recurso,

designadamente fundamentando:

(…)

Ao contrário do que se sustenta no recurso, a intervenção do JIC no acto de sujeição do inquérito a segredo de justiça é legitimada pelo direito à tutela

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efectiva, consagrado no n.º 1 do art.º 20.°, e pelo princípio das garantias de defesa no processo penal, consagrado no n.º 1 do art.º 32.°, ambos da CRP.

(…)

Com a redacção dada ao CPP pela Lei 48/2007, de 29/8, a regra passou a ser a da publicidade do processo mesmo na fase de inquérito, em atenção à garantia dos direitos de defesa do arguido. E, sendo assim, os casos em que vier a ser determinado o segredo de justiça (quando prevalecer o interesse da eficácia da investigação criminal, ou os direitos dos sujeitos processuais o justifiquem), constituirão uma restrição ou limitação ao direito de defesa, concretizando-se então a sua garantia na possibilidade de recurso. Parece-nos por conseguinte justificar-se a intervenção do Juiz de Instrução a fim de, judicializando a

decisão de sujeitar o inquérito a segredo, garantir a possibilidade de recurso.

Por outro lado, não se vê que daqui resulte subordinação ou dependência processual do M.ºP.º em relação ao JIC, antes complementaridade, uma vez que na hipótese em causa não pode este determinar a sujeição do inquérito a segredo de justiça (decisão que compete ao M.ºP.º), e sempre poderá o M.ºP.º recorrer, caso seja proferida decisão de não validação.

Consequentemente inexiste confusão funcional uma vez que é o M.ºP.º, como titular da acção penal, a decidir o segredo de justiça na fase de inquérito, através de despacho devidamente fundamentado, de facto e de direito, nos termos dos arts. 86.° n.º 3, e 97.° n.ºs 3 e 5, do CPP.

(…)

Cumprido o nº.2 do art.417º do Código de Processo Penal (doravante designado por CPP), não foi apresentada qualquer resposta.

Por despacho de fls.68, determinou-se que o recurso fosse julgado em conferência, atento o disposto no art.419º, nº.3, alínea b), do CPP, na sua actual redacção introduzida pela Lei nº.48/2007, de 29.08.

Colhidos os vistos legais e tendo os autos ido à conferência, cumpre apreciar e decidir.

*

2. FUNDAMENTAÇÃO

O objecto do recurso define-se pelas conclusões que o recorrente extraiu da respectiva motivação, sem prejuízo das questões de conhecimento oficioso, de harmonia com o disposto no art.412º, nº.1, do CPP e conforme jurisprudência fixada pelo acórdão do Plenário da Secção Criminal do STJ nº.7/95, de 19.10, publicado in D.R. I-A Série de 28.12.1995.

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Assim, no caso vertente, reside em apreciar se, segundo a perspectiva do recorrente, o despacho recorrido deveria ter-se abstido de pronunciar-se quanto à validação da determinação em sujeitar o processo a segredo de justiça, por via do disposto no art.86º, nº.3, do CPP, por entender que este preceito legal, nesse segmento, é inconstitucional, em violação dos arts.2º, 32º, nº.5, e 219º, nº.1, da Constituição da República Portuguesa (CRP).

A motivação do recurso assenta, no essencial, no entendimento de que a intervenção judicial, validando, ou não, a determinação do Ministério Público em aplicar ao processo, em fase de inquérito, o segredo de justiça, prevista na parte final desse art.86º, nº.3, do CPP, atenta contra os indicados normativos constitucionais, fundamentalmente, contendendo com a estrutura acusatória do processo penal e com o estatuto do Ministério Público.

Ora, a Lei 48/2007 introduziu significativas alterações ao regime do segredo de justiça.

Já da Proposta de Lei nº.109/X, que a antecedeu, e da Exposição de Motivos respectiva, isso era visível, aí constando mormente que:

Consagra-se com maior amplitude o princípio da publicidade. Assim, no decurso do inquérito, o Ministério Público pode determinar a publicidade -

«externa» - mediante requerimento ou com a concordância do arguido, se a cessação do segredo não prejudicar a investigação e os direitos de sujeitos e vítimas. No entanto, se o arguido requerer a publicidade e o Ministério

Público a não conceder, cabe ao juiz decidir, por despacho irrecorrível, sobre a continuação ou a cessação do segredo. Durante a instrução, já só o arguido se pode opor à publicidade (artigo 86.º). Mas também o «segredo interno» é restringido. No âmbito do inquérito é facultado o acesso aos autos ao arguido, ao assistente e ao ofendido, ressalvadas as hipóteses de prejuízo para a

investigação ou para os direitos dos participantes ou das vítimas. Também nesta hipótese, cabe ao juiz de instrução criminal a última palavra no caso de o Ministério Público não facultar o acesso aos autos. Findos os prazos do inquérito, o arguido, o assistente e o ofendido podem consultar todos os elementos do processo, a não ser que o juiz de instrução determine, no

interesse da investigação, um adiamento pelo período máximo e improrrogável de 3 meses (artigo 89.º).

Aliás, a formulação legal do actual 86º do CPP foi, até, mais longe (comparativamente com essa Proposta de Lei) na consagração legal da

publicidade, como regra, mesmo na fase de inquérito – seu nº.1, -, embora com as limitações constantes dos seus nºs.2, 3 e 7.

Sem prejuízo do reparo que possa tal alargamento merecer, ao ponto de ter derrogado o secretismo que, em geral, era entendido como justificado na fase

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de inquérito, por compreender esta o conjunto de diligências que visam investigar a existência de um crime, determinar os seus agentes e a

responsabilidade deles e descobrir e recolher as provas, em ordem à decisão sobre a acusação (art.262º, nº.1, do CPP), dúvida não se coloca de que, a partir das alterações introduzidas pela Lei Constitucional nº.1/97, de 20.09, o segredo de justiça passou a ter consagração constitucional, segundo o art.20º, nº.3, da CRP – A lei define e assegura a adequada protecção do segredo de justiça -, configurando-o como meio de “acesso ao direito e de tutela

jurisdicional efectiva”, que, segundo Gomes Canotilho e Vital Moreira, in

“Constituição da República Portuguesa Anotada”, Coimbra Editora, 2007, volume I, a pág.414, (…) funciona simultaneamente como meio de protecção da investigação penal e da tutela do segredo (…) Ao constitucionalizar o segredo de justiça, a Constituição ergue-o à qualidade de bem constitucional, o qual poderá justificar o balanceamento com outros bens ou direitos, ou, até, a restrição dos mesmos.

Na verdade, como se consignou no acórdão do Tribunal Constitucional

nº.428/2008, de 12.08, acessível em www.tribunalconstitucional.pt/acordaos:

(…)

A regulação do segredo de justiça em processo penal – quer na vertente

interna, respeitando aos participantes processuais directamente envolvidos na concreta relação processual, quer na vertente externa, reportado à

generalidade das pessoas, estranhas a essa relação processual - convoca, com particular acuidade, “a tarefa de concordância prática das finalidades,

irremediavelmente conflituantes, apontadas ao processo penal: a realização da justiça e a descoberta da verdade material, a protecção perante o Estado dos direitos fundamentais das pessoas e o restabelecimento, tão rápido quanto possível, da paz jurídica posta em causa pelo crime e a consequente

reafirmação da validade da norma violada (MARIA JOÃO ANTUNES, “ O segredo de justiça e o direito de defesa do arguido sujeito a medida de coacção”, em Liber Discipulorum para Jorge de Figueiredo Dias, Coimbra, 2003, pp. 1237-1268.

Num processo penal constitucionalmente conformado, como o português,

“numa estrutura acusatória integrada pelo princípio da investigação”, a necessidade de harmonização das apontadas finalidades justifica soluções diferenciadas consoante as fases por que se desenrola o processo, tendo em conta o diferente peso relativo que lhes deve ser atribuído em cada uma delas, compreendendo-se uma evolução em que o predomínio do princípio do

segredo sobre o princípio da publicidade, típico da fase preliminar da

investigação, vá gradualmente evoluindo para o predomínio do princípio da publicidade, típico da fase da audiência de julgamento (…)

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Porém, nem num extremo nem no outro do iter processual, o princípio

dominante, seja ele o do segredo ou o da publicidade, tem valor absoluto (…).

Conforme Frederico de Lacerda da Costa Pinto, in “Segredo de Justiça e acesso ao Processo”, em “Jornadas de Direito Processual Penal e Direitos Fundamentais”, coordenação científica de Maria Fernanda Palma, Coimbra 2004, pág.71, A vigência do segredo de justiça nas fases preliminares do processo penal é plurisignificativa no plano axiológico: trata-se, por um lado, de um mecanismo destinado a garantir a efectividade social do princípio da presunção de inocência do arguido, durante fases processuais que ainda estão cronologicamente distantes do julgamento (…); num outro plano, é uma forma de garantir condições de eficiência da investigação e de preservação de

possíveis meios de prova, quer a prova obtida quer a eventual prova a obter;

finalmente, como variante específica deste último aspecto, o segredo de justiça pode assumir igualmente uma função de garantias para pessoas que intervêm no processo – em particular as vítimas e as testemunhas – que, doutra forma, poderiam ficar numa fase preliminar do processo expostas a retaliações e vinganças de arguidos ou pessoas que lhes sejam próximas.

Deste modo, resulta pacífico que não só interesses subjacentes à investigação, mas também à potencial lesão de direitos fundamentais justificará, ou não, a sujeição de determinado processo, mesmo que ainda em inquérito, ao segredo de justiça, o que, aliás, não é colocado em causa pelo recorrente.

Todavia, sendo o processo penal caracterizado pela sua estrutura acusatória (art.32º, nº.5, da CRP), a qual se reconduz, como refere o recorrente, a que, no plano material, se distinga claramente entre investigação, acusação e julgamento e, no plano subjectivo, à diferenciação entre juiz de instrução e juiz julgador e entre ambos e o órgão acusador, isso não significa, contudo, que ao juiz de instrução não possa ser atribuída a competência exclusiva para praticar, ordenar ou autorizar determinados actos na fase de inquérito

(arts.268º e 269º do CPP) ou, como exemplificadamente se assinalou no despacho recorrido, a concordância exigida em sede de determinação da suspensão provisória do processo (art.281º, nº.1, do CPP), embora essa fase seja dirigida pelo Ministério Público (arts.53º, nº.2, alínea b), e 263º, nº.1, do CPP), orientado por critérios de legalidade e objectividade, característicos da sua autonomia constitucionalmente reconhecida (arts.1º e 2º do Estatuto do Ministério Público, aprovado pela Lei nº.60/98, de 27.08, e 219º, nºs.1 e 2, da CRP).

Não obstante, a exigência de intervenção, no inquérito, do juiz de instrução, para validação de uma decisão do Ministério Público, prevista naquele nº.3 do art.86º, nº.3, do CPP, é vista pelo recorrente como consubstanciando

concorrência funcional e contrariando aquela autonomia e, mesmo, de

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sobreposição decisória, não justificada, no seu entender, pelas garantias de defesa do arguido, onde inclui o direito ao bom nome, o direito ao

contraditório e o direito à informação.

Desde logo, cumpre notar que a validação em apreço pelo juiz de instrução se restringe àquela matéria atinente à determinação do segredo de justiça, e não também a qualquer outra que seja respeitante à natureza e à finalidade do inquérito, não se imiscuindo, nem contendendo, por isso, com o exercício da acção penal e com as diligências que lhe sejam pertinentes, estes,

manifestamente, da exclusiva competência do Ministério Público.

Por seu lado, a decisão do Ministério Público, apesar de condicionada a posterior validação pelo juiz de instrução, é assumida na sua plenitude e em observância das funções respectivamente atribuídas, sem que o papel do último possa exceder a ponderação dos vários interesses que, em concreto, se apresentarem, perante a relevância e consequências próprias do segredo de justiça, sendo-lhe vedada qualquer outra análise para além da estritamente decorrente das implicações do segredo de justiça, enquanto garante das restrições de direitos fundamentais, as quais, inerentes a toda a investigação criminal, devem ser limitadas ao necessário, nos termos do art.18º, nº.2, da CRP.

Na decisão de que o inquérito fique coberto pelo segredo de justiça, vários direitos e interesses podem conflituar com a eficácia da investigação,

nomeadamente, a honra, a segurança e a reserva da vida privada, não só do arguido, mas também de outros intervenientes processuais, sendo certo que, nos termos do art.202º, nº.2, da CRP, a sua defesa é reservada aos tribunais, o que, encontrando-se os autos em fase dirigida pelo Ministério Público, explica a necessidade de intervenção, como garante, de um juiz.

Como se assinalou no Parecer do Conselho Consultivo da PGR nº.121/80, de 23.07.1981, publicado em “Pareceres, Procuradoria-Geral da República “, vol.VII, a págs.47 e segs. (citado no Parecer do Conselho Consultivo da PGR nº.84/2007, publicado no DR II Série de 07.04.2008), O segredo de justiça em processo penal, serve assim, variados interesses, alguns em notória tensão dialéctica: o interesse do Estado na realização de uma justiça isenta e independente, poupada a intromissões de terceiros, a especulações sensacionalistas ou a influências que perturbem a serenidade dos

investigadores e dos julgadores; o interesse de evitar que o arguido pelo conhecimento antecipado dos factos e das provas, actue de forma a perturbar o processo, dificultando o apuramento daqueles e a reunião destas, senão mesmo subtrair-se à acção da justiça; o interesse do mesmo arguido em não ver publicamente revelados factos que podem não vir a ser provados sem que com isso se evitem graves prejuízos para a sua reputação e dignidade; enfim o

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interesse de outras partes no processo, designadamente os presumíveis ofendidos, na não revelação de certos factos prejudiciais à sua reputação e consideração social.

É nesta vertente dos variados interesses que em geral se deparam que deve ser entendida, e é plenamente justificada, a validação pelo juiz de instrução da decisão de sujeitar o processo ao segredo de justiça, com vista à sua adequada ponderação que em concreto deva merecer.

Também, segundo Paulo Dá Mesquita, in “Direcção do Inquérito Penal e Garantia Judiciária”, Coimbra Editora, 2003, pág.117, “À luz das categorias garantia e controlo o juiz de instrução na fase de inquérito tem uma natureza monofuncional, com efeito, esse órgão não controla o exercício da acção penal mas é um garante de liberdades, avalia judicialmente as iniciativas do

Ministério Público que atingem as liberdades fundamentais do indivíduo

visado pelo inquérito, quer dizer a liberdade pessoal e patrimonial (que podem ser limitadas por medidas de coacção e medidas de garantia real) e a

liberdade moral (a reserva de comunicações, correspondência e domicílio) quando estas possam ser atingidas por procedimentos adoptados na função de recolha de fontes de prova”.

Por seu lado, no que concerne às alegadas concorrência e sobreposição

funcionais, não se divisa que alguma razão o recorrente tenha, na medida em que não fica minimamente beliscada a autonomia do Ministério Público

relativa à decisão por que enverede, sendo-lhe, aliás, garantida a

susceptibilidade de recurso do despacho do juiz (contrariamente ao que acontece no caso em que a sujeição do processo a segredo de justiça seja requerida pelo arguido, pelo assistente ou pelo ofendido, a que alude o nº.2 do art.86º do CPP), bem como a intervenção deste não contende, bem pelo

contrário, com a estrutura acusatória do processo penal.

Admitindo o recorrente que ao juiz de instrução seja conferida a intervenção quando exista perigo de lesão de direitos fundamentais, extrai, porém, a

conclusão de que, na situação atinente à decisão acerca do segredo de justiça, em inquérito, não existirá fundamento para a defesa dos direitos que indicou.

Ora, quanto à tutela do direito ao bom nome, não se discute que esta não seja devidamente ponderada pelo Ministério Público aquando da prolação da sua decisão, nem o despacho recorrido o afirma.

Só que o recorrente entende que, ao determinar o segredo de justiça, esse interesse, bem como a imagem e a reserva da intimidade da vida privada do arguido, ficarão desde logo salvaguardados, no que incorre no vício de apenas o reportar ao arguido e não a outros intervenientes processuais a que também se destina a decisão, fazendo uma interpretação que, embora se admitindo como tendencialmente correcta (de que o juiz, na fase de inquérito,

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normalmente não exerça critério diferenciador do decidido pelo Ministério Público), redunda como restritiva e que, por si só, não tem virtualidade para, no segmento sob censura, concluir que seja este contrário à Constituição.

O mesmo se diga quanto ao direito ao contraditório e ao direito à informação, os quais, se é verdade que, na fase de inquérito, estão tendencialmente

comprimidos, não é menos real que, pela sua própria natureza, porque correlacionados com as garantias de defesa do art.32º, nº.1, da CRP, mais justificam que os objectivos de investigação atinentes à necessidade de sujeição do processo a segredo de justiça sejam, nessa vertente de

conflitualidade com aquelas, devidamente salvaguardados pela intervenção de validação pelo juiz de instrução.

Esta constitui, mesmo, também para o Ministério Público, uma garantia da legalidade da decisão, que não pode ser vista com o sentido que o recorrente lhe atribui, como se essa intervenção do juiz de instrução se substituísse à sua e tivesse idêntica finalidade.

A alegação de que o preceito, nesse segmento, viola o art.2º da CRP (Estado de direito democrático) não encontra apoio, já que, por um lado, a intervenção do juiz se destina efectivamente à preservação da garantia de direitos

fundamentais e, por outro, articula-se com a definição legal dos seus poderes funcionais, bem distintos das atribuições do Ministério Público, além que a protecção de direitos, liberdades e garantias, em que se inclui a tutela

jurisdicional efectiva, é em si mesma condição e parte da noção abrangente de Estado de direito, isto é, caracterizado pela sujeição dos poderes a princípios e a regras jurídicas previa e perfeitamente definidos, salvaguardando os

cidadãos contra a prepotência, o arbítrio e a injustiça.

Também, não contende com a estrutura acusatória do processo (art.32º, nº.5, da CRP), antes, a reforça, na medida em que não deixa apenas na decisão do órgão acusador a apreciação de matéria que se repercute em vários direitos e de diversos intervenientes processuais.

Identicamente, as funções e o estatuto do Ministério Público (art.219º, nº.1, da CRP), como se deixou vertido, não são postergados através dessa

intervenção do juiz de instrução, dada a exclusiva finalidade que esta última prossegue e a separação de funções que, assim, permanece respeitada.

Com efeito, afigura-se que o recorrente oferece uma perspectiva de análise que afinal consubstancia uma visão minimalista da garantia constitucional que ao segredo de justiça foi conferida, sem a adequada compreensão dos

interesses que encerra.

A enunciação maximizante do direito de defesa tem que ser compreendida como uma manifestação qualificada do direito a tutela jurisdicional efectiva (art.20º da CRP), na qual se inclui a garantia da ponderação dos interesses

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conflituantes que em matéria do segredo de justiça se divisam, no sentido de concretização da concordância prática das finalidades do processo penal, desde a realização da justiça e a descoberta da verdade material à protecção dos direitos dos cidadãos.

A par de todas as considerações expendidas, acolhe-se inteiramente a desenvolvida fundamentação vertida no despacho sob censura, a qual dispensa, por isso, outros esclarecimentos.

Inexiste, pois, fundamento para que a Exma. Juiz de Instrução devesse ter entendido como inconstitucional a sua intervenção de validação da decisão do Ministério Público em sujeitar o inquérito a segredo de justiça, prevista no nº.3 do art.86º do CPP e, assim, para que não devesse ter-se pronunciado nesse âmbito (arts.203 e 204º da CRP).

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3. DECISÃO

Em face do exposto e concluindo, decide-se:

- negar provimento ao recurso interposto pelo Ministério Público e, consequentemente,

- manter o despacho recorrido, que não declarou inconstitucional o art.86º, nº.3, do CPP, no segmento em que prevê que fica sujeita a validação pelo juiz de instrução, a decisão de aplicação ao processo, na fase de inquérito, do segredo de justiça e, por isso, se pronunciou acerca da mesma.

Sem custas, por delas o recorrente estar isento.

Évora, 09.12.2008.

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Elaborado informaticamente, em processador de texto, e integralmente revisto pelo Relator.

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(Carlos Jorge Viana Berguete Coelho)

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(Frederico João Lopes Cebola)

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