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Sumário. Texto Integral. Tribunal da Relação do Porto Processo nº

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Tribunal da Relação do Porto Processo nº 0250620

Relator: FONSECA RAMOS Sessão: 13 Maio 2002

Número: RP200205130250620 Votação: UNANIMIDADE

Meio Processual: APELAÇÃO.

Decisão: CONFIRMADA A DECISÃO.

DIREITO DE PROPRIEDADE RESTITUIÇÃO DE IMÓVEL

COMODATO REQUISITOS

Sumário

I - Demonstrado pelo autor o seu direito de propriedade, o réu só pode evitar a restituição da coisa desde que demonstre que tem sobre ela outro qualquer direito real que justifique a sua posse ou que a detém por virtude de direito pessoal bastante.

II - São essenciais à caracterização de um contrato como de comodato o carácter gratuito, a temporalidade e o dever de restituição.

Texto Integral

Acordam no Tribunal da Relação do Porto

António ... e mulher, Maria R..., intentaram, em 12.7.2001, pelo

Tribunal Judicial de ... – acção declarativa de condenação, com processo sumário, contra:

António Manuel ... e Maria ...

Pedindo que se reconheça que são legítimos proprietários do imóvel que

identificam no art.1º da petição inicial e a condenação dos Réus na restituição imediata do rés-do-chão de tal imóvel.

Para tanto, alegam que o mesmo está descrito a seu favor na competente conservatória do registo predial e, ainda, factos subsumíveis ao instituto da usucapião.

Alegaram, ainda, que os Réus ocupam o rés-do-chão e que se recusam a proceder à sua entrega.

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Citados os Réus contestaram, invocando a existência de um contrato de arrendamento, celebrado verbalmente.

Concluíram pedindo pela improcedência da acção.

Responderam os Autores, a fls. 44, negando a existência de qualquer contrato de arrendamento.

Concluíram como na petição inicial.

***

A final foi proferida sentença que julgou a acção procedente, e:

a) - Declarou que os Autores António ... e mulher, Maria R..., são titulares do direito de propriedade sobre o prédio descrito na Conservatória do Registo Predial sob o n.º ..., do Livro ... - “Casa de dois pavimentos, destinada a habitação e terreno a logradouro”, com a área coberta de 70m2 e descoberta de 231,7m2, sito na Rua ..., freguesia de ..., concelho de ..., inscrito na matriz sob o art. ...;

b) Condenou os Réus a restituir imediatamente o rés-do-chão do imóvel identificado na alínea anterior;

***

Inconformados recorreram os RR. que, alegando, formularam as seguintes conclusões:

1ª- O Ré celebrou com seu pai, ora Autor, um contrato verbal de arrendamento no ano de 1989 relativo ao rés-do-chão do prédio em lide;

2ª- Face às relações de parentesco (pai e filho) não exigiu este qualquer documento comprovativo de quitação da renda mensal estipulada;

3ª- De toda a prova produzida é manifesto que só a carreada pelos RR. e

respeitante aos seus vizinhos, é que merece credibilidade e permite ajuizar do pretendido contrato de arrendamento;

4ª- Apesar das dificuldades sentidas pelos RR. no que toca à prova que se lhes impunha, é manifesto que esta se fez inelutavelmente no sentido da existência de um contrato verbal de arrendamento;

5ª- Donde, a ocupação que os RR. vêm fazendo é lícita;

6ª- Não lhes assistindo a obrigação de entregar o fogo em lide;

7ª- Ao decidir como decidiu o Julgador, não atingiu a pretendida Justiça.

Nestes termos deverá ser concedido provimento ao Recurso, revogando-se a Sentença em crise, e, em consequência, absolvendo-se os RR. do pedido, assim, se fazendo a esperada e merecida Justiça.

Os AA. contra-alegaram, pugnando pela confirmação do Julgado.

***

Colhidos os vistos legais, cumpre decidir tendo em conta a seguinte matéria de facto:

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1) Descrito na Conservatória do Registo Predial sob o n.º ..., do Livro ...., a favor dos Autores encontra-se o seguinte prédio: “casa de dois pavimentos, destinada a habitação e terreno a logradouro”, com a área coberta de 70m2 e descoberta de 231,7m2, sito na Rua ..., freguesia de ..., concelho de ..., inscrito na matriz sob o art. .... - (alínea a) da matéria assente);

2) O prédio identificado no número anterior foi construído pelos Autores, tendo estes outorgado escritura de compra e venda com Bernardino ... e mulher, Alcina ... em 22.03.72 - (alínea b) da matéria assente);

3) Os Autores há mais de 30 anos que, à vista e com o conhecimento de toda a gente e sem a oposição de quem quer que seja, vêm fruindo o referido prédio, na convicção séria e fundamentada de que são os únicos e legítimos

beneficiários dessa fruição e de que não prejudicam ninguém - (alínea c) da matéria assente);

4) Os Réus vivem no rés-do-chão do imóvel identificado no número 1) - (alínea d) da matéria assente);

5) Em meados de 1987, os Autores permitiram que o Réu e respectiva

companheira, se abrigassem no rés-do-chão do prédio identificado no número 1 - (facto 1º);

6) O mencionado no número anterior sucedeu porque o Réu solicitou aos Autores que lhe fosse permitido instalar-se temporariamente no referido rés- do-chão juntamente com a sua companheira e com a filha de ambos - (facto 2º);

7) De modo a lá pernoitarem até que lhes fosse entregue uma habitação que já haviam arrendado na freguesia de ... - (facto 3º);

8) Os Réus acederam certos de que a situação apenas perduraria durante uns meses - (facto 4º);

9) Os Autores realçavam o carácter provisório e a obrigação dos Réus entregarem o rés-do-chão em causa - (facto 5º);

10) Não obstante os Réus terem sido instados pelos Autores, por diversas vezes, para procederem à entrega do aludido rés-do-chão sempre se recusaram a fazê-lo - (facto 7º);

Dá-se por integralmente reproduzido o teor de fls. 37 – fotocópia de Guia de Depósito de Renda – assinada pela Ré, em 7.4.2000, depositando na CGD- Porto, a quantia de 20.000$00, “relativa a renda do prédio sito na R. ..., [...]

por o senhorio não passar recibos de quitação”.

Fundamentação:

A questão objecto do recurso, delimitada pelo teor das conclusões dos

recorrentes, consiste em saber se a ocupação que os RR. fazem do rés-do-chão do imóvel identificado, é lícita, por ter sido celebrado com os AA. recorridos, um contrato verbal de arrendamento.

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Nas alegações os RR. aludem à “falta de credibilidade das testemunhas” dos AA., identificando-as e aludindo aos depoimentos que prestaram – que foram gravados – mas, nas conclusões, não versam qualquer pedido de reapreciação da prova o que sempre estaria fora de questão pelo facto de não terem dado cumprimento cabal ao preceituado no art. 690º- A, nº1 a) do Código de Processo Civil e nº2 na redacção do DL. 183/2000, de 10.8.

Com efeito, o recorrente impugnante da decisão proferida sobre a matéria de facto, “deve obrigatoriamente especificar, sob pena de rejeição quais os

concretos pontos de facto que considera incorrectamente julgados”.

Não tendo os recorrentes feito expressa menção concreta de que quesitos deveriam merecer resposta diversa da que foi dada pela instância recorrida, não pode conhecer-se da eventual pretensão de alteração da matéria de facto.

Entremos, então, na apreciação do objecto do recurso:

Atenta a causa de pedir e os pedidos formulados a acção intentada pelos AA. é uma acção de reivindicação- art. 1311º do Código Civil.

Com efeito, alegaram a violação do seu direito de propriedade sobre o rés-do- chão ocupado pelos RR., ocupação que entendem ser abusiva.

Os RR. contrapuseram que ocupam tal local ao abrigo, de um contrato de arrendamento celebrado verbalmente e que, consequentemente, ocupam com justo título.

Nas acções de reivindicação a causa de pedir é complexa, consistindo no acto ou facto jurídico de que deriva o direito de propriedade, e a posse ou detenção abusiva da coisa reivindicada, por terceiro.

Dispõe o art. 1311º do Código Civil:

“1. O proprietário pode exigir judicialmente de qualquer possuidor ou detentor da coisa o reconhecimento do seu direito de propriedade e a consequente restituição do que lhe pertence.

2. Havendo reconhecimento do direito de propriedade, a restituição só pode ser recusada nos casos previstos na lei”.

“I – A acção de reivindicação desdobra-se em dois pedidos: um, o do

reconhecimento do direito de propriedade; o outro, o da restituição da coisa.

II – Demonstrado pelo autor o seu direito de propriedade o réu só pode evitar a restituição da coisa desde que demonstre que tem sobre ela outro qualquer direito real que justifique a sua posse ou que a detém por virtude de direito pessoal bastante.”- Ac. do STJ, de 26.4.1994, CJSTJ, 1994, II, 63.

Os apelantes não questionaram serem os AA. os donos do imóvel reivindicado.

Alegaram, para justificar a posse que exercem sobre parte do imóvel reivindicado, a existência de um contrato de arrendamento celebrado, verbalmente, em 1989.

De forma alguma lograram fazer a prova da existência de tal contrato, como

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lhes competia, dado tratar-se de matéria de excepção que constituía seu ónus de prova –art. 342º, nº2, do Código Civil.

O que se provou foi que os AA. consentiram que os RR., em 1987, se instalassem, temporariamente, no identificado rés-do-chão, ocupação que duraria alguns meses. Os RR., apesar de instados diversas vezes, pelos AA., a entregar o rés-do- chão, recusaram-se a fazê-lo.

O contrato celebrado entre as partes é um contrato de comodato - art. 1129º do Código Civil - que a lei define assim:

“Comodato é contrato gratuito pelo qual uma das partes entrega à outra certa coisa móvel ou imóvel, para que se sirva dela com a obrigação de a restituir”.

Normalmente, na base do contrato de comodato, empréstimo, estão relações de cortesia, de gentileza, marcadas pela disponibilidade gratuita, concedida pelo dono da coisa.

Por isso, a expressiva definição constante das Ordenações (Livro I, Título III) –“É chamado comodato porque se dá para cómodo e proveito somente do que recebe a cousa”.

Como observam os Professores Pires de Lima e Antunes Varela, in "Código Civil Anotado", vol. II, 3ª edição, em anotação àquele normativo:

“...Tal contrato apesar de gratuito, não deixa em regra de ser bilateral imperfeito: o contrato envolve obrigações, não só para o comodatário, mas também para o comodante.

Não há, porém, entre umas e outras a relação de interdependência e reciprocidade que, através do sinalagma, define os contratos bilaterais ou sinalagmáticos (perfeitos)... não há assim uma obrigação autónoma ao lado da entrega da coisa: a entrega é que é feita sob o signo da temporalidade”:

São essenciais à caracterização de um contrato como de comodato: o carácter gratuito, a temporalidade e o dever de restituição –cfr. Ac. desta Relação de 14.4.97, in CJ 1997, Tomo II, pág. 215.

O Conselheiro Dr. Rodrigues Bastos, em anotação ao art. 1137º do Código Civil, in “Notas ao Código Civil”, vol. IV, pág. 250/251 pondera:

- “Não se tendo estipulado prazo certo para a restituição, o comodato considera-se convencionado pelo tempo necessário a fazer-se o uso para o qual a coisa foi comodatada.

Se a duração do contrato não foi expressamente convencionada, nem foi determinado o uso a dar à coisa comodada, o comodatário é obrigado a restituí-la logo que lhe seja exigida”.

Defende este tratadista, e igual entendimento resulta do Ac. do STJ, de 29.9.93, in CJSTJ, 1993, Tomo III, pág.45, que o art. 1137º, nº2, do Código Civil consagra a figura do precarium, que, no dizer do Conselheiro Rodrigues Bastos (local citado) “ é o comodato sem determinação de data, expressa ou

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tácita, que no direito romano se não considerava verdadeiro comodato”, conservando o concedente do uso o direito de cessação do contrato “ad nutum”.

Ora, no caso em apreço, tendo a ocupação sido concedida por alguns meses, em meados de 1987, de há muito os RR. deveriam ter entregue aos AA. o rés- do-chão que têm desde aí ocupado.

A recusa de restituição carece de fundamento legal, não provado que foi pelos RR. qualquer relação jurídico contratual que legitimasse a ocupção, “in casu”, alegado contrato de arrendamento.

Decisão:

Nestes termos, acorda-se em negar provimento ao recurso, confirmando-se a sentença recorrida.

Custas pelos RR., sem prejuízo do apoio judiciário com que litigam.

Porto, 13 de Maio de 2002

António José Pinto da Fonseca Ramos José da Cunha Barbosa

José Augusto Fernandes do Vale

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