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A institucionalização das Ciências Biológicas na universidade brasileira: investigando sentidos nas matrizes curriculares de Ciências Naturais e História Natural (1934-1942)

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FACULDADE DE EDUCAÇÃO

PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO

A institucionalização das Ciências Biológicas na universidade brasileira:

investigando sentidos nas matrizes curriculares de Ciências Naturais e

História Natural (1934-1942)

Carla Vargas Pedroso

Niterói, RJ, 2017

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Carla Vargas Pedroso

A institucionalização das Ciências Biológicas na universidade brasileira:

investigando sentidos nas matrizes curriculares de Ciências Naturais e História

Natural (1934-1942)

Tese de doutorado apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade Federal Fluminense, como requisito parcial para obtenção do Grau de Doutora em Educação.

Orientadora Profª. Drª. Sandra Escovedo Selles

Niterói, RJ 2017

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P372 Pedroso, Carla Vargas.

A institucionalização das Ciências Biológicas na universidade brasileira: investigando sentidos nas matrizes curriculares de Ciências Naturais e História Natural (1934-1942) / Carla Vargas Pedroso. – 2017.

259 f. ; il.

Orientadora: Sandra Escovedo Selles.

Tese (Doutorado em Educação) – Universidade Federal Fluminense, Faculdade de Educação, 2017.

Bibliografia: f. 205-227.

1. Ciências Biológicas. 2. História natural. 3. Currículos. 4. Ensino Superior. 5. Universidade de São Paulo. 6. Universidade do Distrito Federal. I. Selles, Sandra Escovedo. II. Universidade Federal Fluminense. Faculdade de Educação. III. Título.

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Carla Vargas Pedroso

A institucionalização das Ciências Biológicas na universidade brasileira:

investigando sentidos nas matrizes curriculares de Ciências Naturais e História

Natural (1934-1942)

Tese de doutorado apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade Federal Fluminense, como requisito parcial para obtenção do Grau de Doutora em Educação. Área de concentração: Ciências, Cultura e Educação.

Aprovada em 31 de dezembro de 2017.

BANCA EXAMINADORA

Sandra Lúcia Escovedo Selles – Universidade Federal Fluminense (UFF) (Presidente)

_______________________________________________________________

Alessandra Schueler - Universidade Federal Fluminense (UFF) (membro titular)

_______________________________________________________________

Ana Cléa Braga Moreira Ayres – Universidade Estadual do Rio de Janeiro (UERJ) (membro titular)

_______________________________________________________________

Daniele Aparecida de Lima Tavares – Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro (UFRRJ) (membro titular)

_______________________________________________________________

Dayse Martins Hora – Universidade Católica de Petrópolis (UCPel) (membro titular)

_______________________________________________________________

Everardo Paiva de Andrade – Universidade Federal Fluminense (UFF) (membro suplente)

_______________________________________________________________

Maicon Jeferson da Costa Azevedo (CEFET) (membro suplente)

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mas sim, se for possível, estimular alguém a pensar por si próprio. Ludwig Wittgenstein (1889-1951, filósofo austríaco)

Dedico este trabalho aos meus pais, Maria e Luiz, e as minhas mães de coração, Mary e Sandra, pelos esforços empreendidos para que eu alçasse voo e alcançasse esse objetivo. Por suportarem as ausências e as chatices e por estarem sempre ao meu lado nessa conquista, a minha sincera gratidão. Sem o apoio de vocês não teria caminhado nesta direção.

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AGRADECIMENTOS

À minha orientadora Sandra Selles pelo apoio, companheirismo e incentivo constantes, pela confiança transmitida desde minha entrada no mestrado, e por tornar os últimos quatro anos mais leves de serem trilhados.

À amigona, Mary Angela Amorim, porque sem você eu jamais teria trilhado este caminho profissional e pessoal, e pelo entendimento de minha ausência ao seu lado nestes seis anos.

Às professoras Dayse Hora e Alessandra Schuller pela leitura e pela generosidade das sugestões, das análises e dos comentários na banca de qualificação, o que me permitiu guiar os rumos deste projeto. Além da disponibilidade e interesse em participar da banca final;

Aos professores e companheiros Ana Ayres, Maicon Azevedo, Daniele Tavares e Everardo Paiva por também aceitarem disponibilizar os seus tempos lendo a tese e participando da banca;

Aos professores com quem tive a grande oportunidade de conviver e conversar nas salas e corredores da Universidade Federal Fluminense, Universidade Federal do Rio de Janeiro e Universidade Estadual do Rio de Janeiro, e que muito contribuíram para a escrita desta tese, especialmente, Ronaldo Rosas, Iolanda Oliveira, Heloisa Vilela, Osmar Fávero, Lisete Jaehn, Sandra Selles, Marco Barzano, Stela Caputo, Nilda Alves e Erica Arantes;

Aos meus colegas de doutorado, especialmente, a Simone Torres, Lisis Fernandes de Oliveira, Benedito Sapane, Paulo Dutra, Mariane Brito, Heitor Collet e Robson Sueth, pelo convívio e camaradagem na realização do curso;

Ao Fabrício Ferreira, a Samantha Brito, a Andressa Maciel, a Maria Fernanda Gonçalves, a Graziella Martins, a Heriédna, e a Suélen Fachini, companheiros e amigos, pelas alegrias de tantos momentos, pelo apoio no enfrentamento das dificuldades, e pela contribuição para que este percurso chegasse ao fim;

Aos meus familiares, Maria, Luis, Claudia, Juraci, Gelci, Roselaine, Helena, pela motivação, pelo apoio, e pela compreensão e paciência no período de realização deste trabalho;

Aos companheiros do grupo de pesquisa Currículo, Docência e Cultura, que atravessaram o meu caminho nesses seis anos, levando um pouco de mim e deixando comigo um pouco de vocês: Almina Mannarino; Ana Cléa Ayres; Antonio Dias Neto; Bruna Giovanelli Dias; Carla Moraes; Cyntia Bastos; Daniele Tavares; Diogo Furieri; Dinah Terra; Edinaldo Medeiros; Everardo Andrade; Franklin Medrado; Graziella Martins; Heriédna Guimarães; José Roberto Bernardo; Juliana Spiguel; Laís Pereira; Lisete Jaehn; Maicon Azevedo; Maína Bertagna Rocha; Maira Figueira; Marco Barzano; Marcus Soares; Mariana Alberti; Mariana Cassab; Mariana Vilela; Marise Amaral; Monica Vasconcelos; Nayara Conceição; Rodrigo Santos; Shaula

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lembrar neste momento.

À Mariana Alberti e a Maíra Figueira pelo apoio e por, em diferentes momentos, contribuírem para a conclusão do projeto final da tese.

À Alessandra Bizerra pela atenção e disponibilidade no empréstimo de referências bibliográficas.

Aos profissionais das instituições em que realizei esta pesquisa, pelo auxilio, pela atenção e pelas conversas que somaram informações: servidores da direção e da secretaria das bibliotecas da Faculdade de Educação e do Instituto de Biociências da UFRGS; servidores da direção dos departamentos do curso de Biologia da UFRGS; servidores da coordenação do arquivo histórico da Reitoria da UFMG; servidores da direção, da secretaria e das bibliotecas central e setorial da Faculdade de Filosofia e Ciências Humanas da UFMG; servidores do Arquivo Nacional no Rio de Janeiro; servidores do Centro de Memória Institucional do ISERJ; servidores do PROEDES/UFRJ; servidores do CPDOC/FGV; servidores do departamento de bibliotecas e documentação e da biblioteca central da UFPR; servidores da direção dos departamentos do curso de Biologia da UFPR; servidores da direção do Instituto de Biociências e da Biblioteca Florestan Fernandes da FFLCH da USP.

Aos servidores da direção e da secretaria da Pós-Graduação e Educação da UFF pela disponibilidade e atenção sempre que necessária;

Ao CNPq pela bolsa concedida, sem a qual, de fato, seria impossível viajar para tantos Estados, na busca constante de reminiscências, e formalizar esta proposta.

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RESUMO

Esta tese investiga a institucionalização do campo de conhecimento de Ciências Biológicas como curso de graduação nas instituições universitárias em sua relação com o contexto brasileiro da primeira metade do século XX. A revisão de literatura mostrou que são poucos os estudos a respeito da história desses cursos e que o tema centralizado na origem deste, do ponto de vista educacional, ainda não se constitui objeto de pesquisas da área de educação e de Ciências Biológicas, tampouco vem ganhando a atenção de historiadores da educação. Assim, fez-se a opção por um estudo de cunho histórico e curricular conduzido por fundamentos epistêmicos de diversas discussões educacionais, tais como a construção social e histórica do currículo, a constituição de disciplinas escolares, a construção do conhecimento escolar, reformas, mudanças e estabilidades curriculares, e a história e cultura das instituições educativas. Defende-se que a efervescência político-econômica, o movimento de otimismo pela educação, o crescimento do espaço e da relevância da ciência para a sociedade brasileira, o fenômeno de institucionalização das universidades públicas, e numa esfera mais ampla, a constante arena de disputa por uma biologia autônoma e unificada, potencializaram a gestação dos primeiros projetos de cursos de Ciências Biológicas no País. As discussões sobre esses fatores foram organizadas sob os auspícios das questões nacionalistas e de modernização do Brasil, que desde o inicio do século XX se enredaram aos mais variados discursos e as mais diversas práticas, dentre elas, as educativas, as científicas e as universitárias. Deste modo, apontamentos a respeito da história da educação brasileira e do desenvolvimento da ciência Biologia são reunidos para desmistificar o processo de oficialização dos cursos de Ciências Biológicas. Ao mesmo tempo, corporificam-se esses pressupostos na análise dos cursos da Universidade de São Paulo e da Universidade do Distrito Federal, no período entre 1934 e 1942. Esses projetos de curso emergiram da análise empírica como fundamentais na compreensão da história das Ciências Biológicas na universidade, por serem os primeiros, por serem usados como referência na criação de outros cursos e pela posição política de suas instituições. Com essa perspectiva, os cursos foram interrogados quanto aos seus contextos internos e relações externas. Nesse caminho, atos legislativos, currículos, atas de reuniões, cartas pessoais, relatórios de atividades, depoimentos de professores e alunos, dentre outros, constituíram o corpus empírico. Na imersão de uma análise entrecruzada, os documentos escritos, orais e iconográficos possibilitaram insurgir interpretações para os princípios e atos que colocaram os projetos de curso em movimento. A partir das análises, compôs-se uma periodização dos cursos de graduação estabelecidos nas universidades brasileiras entre 1934 e 1972, respectivamente, quando a Universidade de São Paulo e a Universidade do Rio de Janeiro oficializam propostas desses cursos, e quando se estabelece o prazo máximo para transformar a denominação de todos os cursos brasileiros de História Natural em Ciências Biológicas (Parecer n.107/70). O segundo momento da investigação focalizou os cursos criados até o ano de 1942, quando, então, ocorre uma discrepância na nomenclatura das Ciências Biológicas ofertadas no ensino secundário e no ensino superior. Assim, questionou-se de que modo os cursos universitários criados a época, tendo como um de seus objetivos a formação dos quadros de atuação no ensino secundário, responderam a essa demanda. Fez-se então uma análise dos projetos de cursos de Ciências Naturais e História Natural da USP e da UDF, buscando compreendê-los a partir da criação dessas instituições, da organização da Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras na USP e da Escola de Ciências na UDF, bem como das aspirações dos sujeitos que participaram de seu cotidiano.

Palavras-chave: Ciências Biológicas. História Natural. Ciências Naturais. Currículo. Ensino Superior. Universidade de São Paulo. Universidade do Distrito Federal.

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ABSTRACT

This thesis investigates the institutionalization of the field of knowledge of Biological Sciences as undergraduate course in universities in its relationship with the Brazilian context of the first half of the twentieth century. The literature review showed that there are few studies about the history of these courses and that the topic centered on the origin of this, from the educational point of view, is not yet the object of research in the area of education and Biological Sciences, nor has it been gaining the attention of historians of education. Thus, it was made the choice of a historical and curricular study led by epistemic foundations of several educational discussions, such as the social and historical construction of the curriculum, the constitution of school disciplines, the construction of school knowledge, reforms, changes and curricular stabilities, and the history and culture of educational institutions. It is argued that the political and economic turmoil, the optimistic movement for education, growth of space and relevance of science to Brazilian society, the phenomenon of institutionalization of public universities, and in a broader sphere, the constant arena of dispute by an autonomous and unified biology, potentiated the gestation of the first projects of Biological Sciences courses in the country. Discussions on these factors were organized under the auspices of nationalist and modernization issues in Brazil, which since the beginning of the twentieth century have become entangled in the most varied discourses and the most diverse practices, among them, educational, scientific and university ones. Thus, notes about the history of Brazilian education and the development of Biology science are gathered to demystify the process of officialization of Biological Sciences courses. At the same time, these assumptions are embodied in the analysis of the courses of the University of São Paulo and the University of the Federal District, in the period between 1934 and 1942. These course projects emerged from the empirical analysis as fundamental in understanding the history of biological sciences at the university, because they are the first, because they are used as a reference in the creation of other courses and by the political position of their institutions. From this perspective, the courses were questioned about their internal contexts and external relations. In this way, legislative acts, curricula, meeting minutes, personal letters, activity reports, teacher and students testimonials, among others, constitute the empirical corpus. In the immersion of a cross-over analysis, the written, oral and iconographic documents made it possible to instigate interpretations for the principles and acts that put the course projects in motion. From the analyzes, a periodization of the undergraduate courses established in the Brazilian universities was compiled, between 1934 and 1972, respectively, when the University of São Paulo and the University of Rio de Janeiro officially make proposals of these courses, and when establishing the maximum term to transform the denomination of all the Brazilian courses of Natural History in Biological Sciences (Opinion n.107 / 70). The second moment of the investigation focused on the courses created until the year 1942, when, then, a discrepancy occurs in the nomenclature of the Biological Sciences offered in the secondary education and in the higher education. Thus, it was questioned how the university courses created at that time, having as one of its objectives the formation of the working cadres in secondary education, responded to this demand. An analysis was made of the Natural Science and Natural History courses at USP and UDF, seeking to understand them through the creation of these institutions, the organization of the Faculty of Philosophy, Sciences and Letters at USP and the School of Sciences In the UDF, as well as the aspirations of the subjects who participated in their daily lives.

Keywords: Biological Sciences. Natural History. Natural Science. Curriculum. Higher Education. University of São Paulo. University of Federal District.

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SUMÁRIO

UNIDADE 1 – O PRESENTE QUE NOS DESLOCA AO PASSADO

1.1 Itinerários da pesquisa ... 11

1.2 Percursos trilhados na definição do objeto de pesquisa... 18

1.3 A respeito dos vestígios ... 26

1.4 Sob os auspícios da literatura educacional ... 31

UNIDADE 2 – SONHANDO COM O FUTURO: alicerces da criação dos cursos universitários de Ciências Biológicas no Brasil 2.1 Em busca de alicerces para construir a nação ... 42

2.2 O otimismo e a modernização pedagógica como aliados no projeto nacionalista ... 54

2.3 A emergência das universidades e suas características ... 70

UNIDADE 3 – O PASSADO É LIÇÃO: a amálgama dos diferentes cursos biológicos brasileiros e a história da área de Ciências Biológicas 3.1 A área de Ciências Biológicas antes da criação de universidades: do espírito científico a produção de sentidos pelas instituições científicas e educacionais... 83

3.2 Os cursos de Ciências Biológicas nas instituições universitárias ... 101

3.3 Produção de sentidos de biologia a partir das matrizes curriculares ... 118

3.4 História e Filosofia das Ciências Biológicas: compreendendo sentidos de Biologia nas alcunhas Ciências Naturais, Ciências Biológicas, Biologia e História Natural... 125

UNIDADE 4 – E A HISTÓRIA CONTINUA... Projetos de cursos de graduação em Ciências Biológicas: o caso da USP e da UDF 4.1 Da criação da USP a organização da Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras ... 135

4.2 Do curso de Ciências Naturais ao curso de História Natural da USP ... 147

4.3 Da criação da UDF a organização da Escola de Ciências ... 174

4.4 Do curso de História Natural e de Ciências Naturais a extinção da UDF ... 181

UNIDADE 5 – CONSIDERAÇÕES FINAIS ... 197

Referências bibliográficas ... 206

Anexos ... 228

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UNIDADE 1 – O PRESENTE QUE NOS DESLOCA AO PASSADO

1.1 ITINERÁRIOS DA PESQUISA

[...] se isso lhe serve de consolação, que se antes de cada ato nosso nos puséssemos a prever todas as consequências dele, a pensar nelas a sério, primeiro as imediatas, depois as prováveis, depois as possíveis, depois as imagináveis, não chegaríamos sequer a mover-nos de onde o primeiro pensamento nos tivesse feito parar. Os bons e os maus resultados dos nossos ditos e obras vão-se distribuindo, supõe-se que de uma forma bastante uniforme e equilibrada, por todos os dias do futuro [...] (SARAMAGO, 1998, p.68)

Os pensamentos disponíveis no livro “Ensaio sobre a cegueira”, de José Saramago, lembrou-me que a idealização desta pesquisa vai além das explicações científicas, dos apontamentos da literatura da área de educação e de biologia, ou da relevância social do objeto de estudo, porque foi antes de tudo um projeto que acabou sendo concebido primariamente dentro de escolhas pessoais. Uma vez que toda história pode ser contada por diferentes versões, incluindo-se mais ou menos detalhes, e, ao mesmo tempo, enfeitiçada pelas últimas discussões do grupo de pesquisa “Currículo, Docência e Cultura” a respeito das histórias de vida de professores, faço a opção de iniciar expondo como e porque minha trajetória se engendra no diagrama da tese e, ao mesmo tempo, configura a forma pela qual construí sentidos sobre o passado dos cursos de biologia.

A realidade é que nunca pensei em fazer um estudo sobre a história das Ciências Biológicas. Formei-me em Licenciatura em Ciências Biológicas na Universidade Federal de Santa Maria (UFSM), e no inicio do curso me inseri nos projetos do Núcleo de Educação em Ciências (NEC/UFSM) e do Grupo de Estudo e Pesquisa sobre Educação em Biologia: articulando formação inicial e formação continuada (GEPEB/UFSM), coordenado pela professora Mary Angela Amorim, a qual me apresentou e me envolveu nessa novidade, a época, tal área de educação.

De tudo que aprendi no âmbito dos cursos de graduação e de especialização, nos projetos de pesquisa e extensão, e nas aulas dadas na educação básica e no pré-vestibular da UFSM1, nada teve ligação direta, em termos de pesquisa, com o que vim a ter contato na

1

Participei dos projetos Ações Pedagógicas Inovadoras e Espaços de Formação em Educação Científica, Tecnológica, Matemática e Ambiental (APIEF), Ampliando a concepção de conteúdos de ensino mediante a resolução de problemas (ACOCERP), Linguagem e Formação de Conceitos: Implicações para o Ensino de Ciências Naturais (LFC) e Programa Institucional de Bolsa de Iniciação à Docência – Ensino de Ciências, todos voltados ao ensino em ciências e biologia. Lecionei nas escolas Escola Municipal Julio do Canto, Escola Estadual de Educação Básica Professora Margarida Lopes, Colégio Estadual Manoel Ribas e Pré-Vestibular Popular da UFSM – PRAXIS.

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Universidade Federal Fluminense. Mas de fato foi justamente esse pequeno detalhe, ou seja, o contato com esses distintos ambientes e a constatação que dentre as possibilidades de me envolver com novidades na área de educação na cidade, eu havia esgotado as de meu interesse, que me movimentou de Santa Maria (RS) para Niterói (RJ). Motivou-me a opção de estudar com Sandra pelas suas preferências de estudo. Seguindo seus passos teria a possibilidade de fazer leituras de temas já discutidos em Santa Maria, mas sob o prisma mais amplo que o da educação em ciências. Poderia ampliá-los sob as contribuições das questões curriculares e, ao mesmo tempo, sem perder o contato com a minha área de formação.

Ao chegar para realizar o mestrado em educação na UFF, com Sandra, descobri que dentro das variedades de estudos curriculares o grupo de pesquisa “Currículo, Docência & Cultura - (CDC/FE/UFF)”, se apoiara na lente histórica. Aos poucos meu projeto de mestrado foi peregrinando e aliando-se a esse mundo do fazer histórico, e assim foi sendo construída minha dissertação sobre “A construção sociohistórica do curso de Ciências Biológicas da UFSM: da História Natural às Ciências Biológicas (1965-1973)”. Sem que eu tivesse previsto, como saldo da minha presença na UFF surgiu a oportunidade de realizar o doutorado, ampliando o olhar para além do curso de Ciências Biológicas da UFSM.

Deste modo, o presente estudo tem por objetivo compreender o processo histórico de institucionalização dos cursos de graduação em Ciências Biológicas nas universidades brasileiras, em perspectivas históricas e curriculares. Assim sendo, esse trabalho se inscreve como obra sobre a ciência Biologia e seus desdobramentos na área de Educação.

Constata-se uma mínima produção sobre esse assunto no campo biológico brasileiro, pois as produções existentes2 se atêm, de modo geral, a uma visão holística dos cursos de graduação, isto é, enfatizando fatos pontuais, descobertas históricas, ou ainda, personagens mais importantes envolvidos na história institucional. Por sua vez, o campo da História (especialmente, a História da Educação e a História da Ciência) tem se interessado pelos estabelecimentos de ensino superior e pela oficialização das ciências sociais, da história e da geografia, mas raramente tem se ocupado da história da institucionalização das ciências naturais ou exatas no contexto da graduação (FERREIRA e AZEVEDO, 2013). Por um lado, parece eximir-se de fazê-la pelo distanciamento em relação às especificidades da área biológica. Por outro, cultiva algumas pesquisas contemplando outros enfoques de objeto de estudo como as questões da estruturação dessa ciência ao longo do tempo: concepções gerais

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Tomita (1990), Haddad (2006) e Uliana (2012) são alguns estudos que comentam sobre o inicio dos cursos de Ciências Biológicas no Brasil. Neves (2010) trata sobre as linhas de pesquisa (historiográfica, específica a área do curso e filosófica) que tem se dedicado a investigar áreas específicas.

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que se evidenciam nas instituições educativas (por exemplo, perspectiva antropológica nos museus de História Natural); balizas holísticas de compreensão da história biológica (modernização da Biologia em contraposição a sua antecessora História Natural); lutas travadas em torno da sua organização institucional (a Biologia nos currículos escolares); etc.

Tal quadro, dentre outras questões, demonstra que se tem questionado pouco as características próprias da ciência Biologia no cotidiano das instituições que a produz, divulga e perpetua, além de sugerir a necessidade de estudos que alcancem esse questionamento por meio de uma compreensão sobre a expansão dessa ciência no Brasil articulado as conjunturas históricas do País e do entendimento da filosofia e história da Biologia.

Nesse sentido, a presente produção tem por desafio materializar reflexões sobre a institucionalização dos cursos de Ciências Biológicas ancoradas em discussões da história da educação brasileira, da história do currículo e da história da ciência Biologia. Tal discriminação é essencial para estipular as ferramentas teórico-metodológicas, compreendendo que a proposta de investigação está se identificando com as produções dos campos da História e da Educação, com autoridades para a realização e validação das pesquisas que se debruçam em construir uma narrativa histórica de determinado fato ou objeto, e que focalizam a análise de processos educativos. Nesse sentido, a presente pesquisa, apesar de estar relacionada ao campo da Biologia, é de cunho histórico e educacional.

A opção por investigar os primórdios do curso de Ciências Biológicas se deve em parte ao fato de a literatura, referente ao percurso desta ciência em instituições de pesquisa e ensino, evidenciar que as investigações têm se interessado mais pelo estudo das disciplinas Ciências3, Biologia e História Natural na educação básica4, e menos por cursos de Ciências Naturais, História Natural, Ciências5 e Ciências Biológicas no ensino superior, sobretudo em perspectivas históricas6.

3 Considerou-se a disciplina escolar Ciências neste caso, porque, embora, ela seja composta pela integração da Física,

da Química, da Geologia, da Astronomia e da Biologia, este último campo tem primazia na definição dos conteúdos de Ciências nas escolas. Macedo e Lopes (2002, p.92) sugerem que isto ocorre porque “a biologia supostamente daria mais respostas a questões práticas do mundo natural. [Também porque] a biologia se constitui como ciência mais completa e complexa [...], portanto, a única das três que exigiria a incorporação dos saberes das outras duas.” Para Mayr (2005), essa prioridade da Biologia decorre dela ser uma ciência única, distinta das Ciências Exatas, mas que é (ou está muito próxima de ser) o cerne de todas essas áreas do saber, já que é na Biologia que elas se unificam resultando nos fundamentos da dinâmica do ser vivo.

4 Algumas referências a respeito de pesquisas que investigam as disciplinas de Ciências, Biologia e Historia

Natural na educação básica: Wortmann (1999); Lopes (2000); Moreira e Ferreira (2001); Macedo e Lopes (2002); Ferreira (2005); Selles e Ferreira (2005); Ferreira e Selles (2008); Cassab (2011); Santos e Selles (2011).

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Na metade da década de 1960 e na década de 1970, o CFE instituiu os Pareceres n.38/65 e Parecer n.1.687/74 (Resolução n.30/74), que fixou o currículo mínimo e a duração dos cursos de Licenciatura Curta (ou de 1º Ciclo). Estes, de modo geral, tinham por objetivo formar docentes polivalentes, isto é, habilitados para ministrar aulas de Ciências Naturais, Biologia, Física, Química e Matemática,suprir a insuficiência de professores, gerada pela expansão da escolarização obrigatória de quatro para oito anos, e atender à reivindicação de vagas no ensino superior, com uma formação rápida e menos custosa ao Estado (LIMA-TAVARES, 2006).

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Esta concepção é corroborada por estudos curriculares que afirmam:

São pouco numerosos os estudos sobre currículos no ensino superior. Enquanto os currículos dos demais graus de ensino têm sido com frequência objetos da atenção dos pesquisadores, ainda carecemos de investigações que nos permitam melhor compreender a especificidade e a complexidade envolvidas no processo de planejar e desenvolver currículos na universidade. (MOREIRA, 2005, p.1)

Aliado a isso, destacam-se os estudos como os de Azevedo (1955), Schwartzman (1979), Ferri e Motoyama (1979), Fernandes (2000), dentre outros, que têm como foco o desenvolvimento histórico das Ciências no Brasil, no qual se incluem as Ciências Biológicas, mas em perspectivas que não contemplam plenamente as dimensões educacionais. Por outro lado, esses estudos acadêmicos e outros que têm se debruçado sobre questões relacionadas à formação docente também têm evidenciado pouca preocupação com as discussões sobre os sentidos de biologia impressos na prática educativa das diferentes instituições educativas. Considerando que as instituições incorporam esses sentidos de formas distintas, independente das denominações que um curso venha a ter, busca-se entender a trajetória da ciência Biologia em cursos de graduação denominados por Ciências Biológicas refletindo sobre quais sentidos tencionaram e se materializaram nesse processo de constituição.

Não menos importante, cabe sinalizar que, a participação nas disciplinas ofertadas na Pós-Graduação em Educação da UFF, o desenvolvimento de minha dissertação de mestrado7, e a inserção no grupo de pesquisa Currículo, Docência e Cultura (CDC/FE/UFF), mediante as leituras e discussões de textos, assim como da produção de pesquisas pelos colegas de grupo, evidenciou que embora a legislação, ao longo dos anos, tenha gerado mudanças na denominação da disciplina escolar Biologia e do curso de Ciências Biológicas (e consequentemente, nos seus currículos), o processo de constituição da Biologia em instituições de ensino e de formação docente é complexo, pois se encontra entrelaçado a fatores que não se reduzem à epistemologia desta ciência (AYRES, 2005, 2006; CASSAB, 2011; ESPINOZA, 2011; LIMA-TAVARES, 2006, 2011; MORAES, 2011; SANTOS, 2013a; SPIGUEL, 2013; PEDROSO, 2013; MARTINS, 2013).

6 Algumas referências a respeito de pesquisas que tem por objetivo investigar cursos de História Natural,

Ciências Biológicas e Ciências no ensino superior: Wortmann (1994; 1996); Pereira (1996); Silva (2003); Martines (2005); Ayres (2006); Lima-Tavares (2006; 2011); Viana (2010); Pedroso (2013).

7 Na dissertação de mestrado intitulada “A construção sociohistórica do curso de Ciências Biológicas da UFSM:

da História Natural às Ciências Biológicas (1965-1973)”, procurei compreender que concepções de Biologia foram negociadas no processo de constituição dos primeiros currículos do curso de Ciências Biológicas da Universidade Federal de Santa Maria (RS). Precisamente, o foco do estudo recaiu na mudança de História Natural para Ciências Biológicas,

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Parte-se do pressuposto que, embora, as denominações Ciências Naturais, História Natural e Ciências Biológicas carreguem significados definidos, o percurso de origem e a consolidação em distintos estabelecimentos de nível superior pode gerar qualificações aos termos e as práticas científicas e educativas desenvolvidas. Esses novos sentidos não estão, necessariamente, explícitos ou previstos na predefinição dos termos, tampouco se reduzem a mera estipulação de diretrizes nacionais, ou de grupos em posições avantajadas de poder.

Ao mesmo tempo, ganha força a ideia de que a construção das Ciências Biológicas no Brasil é um caso autóctone, ou seja, não se limita à simples transferência de movimentos biológicos de outros países, mas se constrói em articulação as peculiaridades sociais, políticas, econômicas, científicas, educacionais da nação brasileira em dado período histórico. Ressalta-se, portanto, a necessidade e a relevância de investigar a trajetória dos primeiros cursos de modo não isolado, ou puramente dando centralidade ao componente biológico. A intenção é compreender como as continuidades, rupturas e ambigüidades que ocorrem no interior da instituição universitária, bem como seus entrelaçamentos com processos externos ao estabelecimento, orientaram a constituição dos cursos de Ciências Biológicas no país.

Nesse sentido, a organização da tese iniciou com esta Unidade 1, intitulada “O presente

que nos desloca ao passado”, que busca situar o trabalho realizado, questionando porque e

como o presente alimentou a necessidade de olhar o passado. De posse desta perspectiva, a Unidade 01 também contempla as questões mobilizadas, o recorte do objeto e os objetivos traçados em prol do entendimento da história desses cursos, além do corpus empírico disponível nos dias atuais para a realização do estudo. Ancorada nas reflexões sobre abordagens mesoanalíticas (REVEL, 1998), os documentos escritos, orais e iconográficos foram investigados considerando a potência da inter-relação entre condicionantes macro e microssociais. A investigação foi realizada coligindo tanto fontes primárias produzidas no período em estudo, quanto fontes secundárias advindas de obras educacionais, científicas e de divulgação que se referem aos cursos, as instituições, e a história das cidades que as abarcam.

Para olhar o objeto de estudo de forma integralizada se fez necessário recorrer à interlocução entre diversos campos teórico-metodológicos. Com este entendimento, na Unidade 01, são apresentados os referenciais que sustentam a investigação, dos quais se destacam as discussões sobre construção social e histórica do currículo (Ivor Goodson), constituição de disciplinas escolares (Ivor Goodson; Lucíola Santos, Circe Bittencourt; Dominique Juliá), construção do conhecimento escolar (Alice Lopes, Elisabeth Macedo, Jean-Claude Forquin, Yves Chevallard), reformas, mudanças e estabilidades curriculares (Ivor

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Goodson, Thomas Popkewitz), história e cultura das instituições educativas (Justino Magalhães, Antonio Viñao Frago, André Chervel; Jean-Claude Forquin), dentre outros.

Na Unidade 2, intitulada “Sonhando com o futuro: alicerces da criação dos cursos de

Ciências Biológicas no Brasil” busca-se mostrar que a pretensão pelo progresso da nação

brasileira estabeleceu metas em diferentes frentes de ação. Nesse sentido, discutem-se os aspectos contextuais relacionados ao período de 1930 e inicio dos anos de 1940, que de modo geral, incidem e extrapolam as questões internas as universidades. Teve-se em vista que a emergência dos referidos cursos ocorreu no estabelecimento de relações entre a ebulição da vida em sociedade próprias do referido período histórico, o movimento de otimismo educacional e científico e a consolidação das instituições universitárias. Assim, esta seção faz um pequeno retorno ao contexto mais amplo demonstrando como esses elementos se transformaram, se adequaram e ganharam ressonância no plano nacionalista pelo progresso do Brasil. Após a abertura do capítulo com uma breve abordagem sobre os elementos políticos, econômicos, sociais e as correntes ideológicas que caracterizam o momento, passa-se a análise de como o campo educacional respondeu a essas demandas.

No encaminhamento da discussão educacional, situa-se a emergência das Faculdades de Filosofia, primeiramente, como um subproduto das transformações na sociedade brasileira. Em seguida, a discussão dessa unidade no seio das universidades brasileiras é pensada em termos da opção de estrutura adotada considerando os exemplos das instituições universitárias francesa e alemã. Por fim, discute-se a profissionalização da ciência brasileira a partir dos seus percalços na sociedade. Concentra-se no papel desempenhado no âmbito dos planos nacionalistas, nas práticas e no espírito científicos exercitados, nas transformações assumidas em prol do seu progresso, e nos sujeitos que faziam a ciência movimentar-se.

A Unidade 3 denominada “O passado é lição: a amálgama dos diferentes cursos

biológicos e a história da área de Ciências Biológicas” dá mais um passo em direção aos

portões das histórias dos cursos de graduação, adentrando-as. Partindo do pressuposto que a ciência não surge quando se oficializam os cursos de Ciências Biológicas, inicialmente, a investigação conteve-se nas instituições científicas e educacionais anteriores aos cursos de graduação. Em seguida, realiza-se um duplo movimento de ida e volta. Deu-se espaço, primeiramente, a um breve relato das histórias individuais dos primeiros cursos de Ciências Biológicas (da Universidade do Rio de Janeiro, da Universidade de Porto Alegre, da Universidade do Paraná, da Universidade de Minas Gerais e da Universidade do Brasil). Em um segundo momento, os particulares compõem o conjunto por meio da análise de suas denominações e de suas matrizes curriculares produzidas ao longo dos seus anos de vida. Por

(17)

fim, a busca de sentidos de biologia na amálgama das histórias desses cursos brasileiros é complementada pela discussão dos conceitos empregados na definição dessa área científica ao longo da interpretação de sua história mundial.

As evidências da Unidade 03 geram a chave de leitura da Unidade 04, “E a história

continua... Projetos de cursos de graduação em Ciências Biológicas: o caso da USP e da UDF”. Essas instituições emergiram da análise empírica como centrais na compreensão da

história das Ciências Biológicas na universidade, por serem as primeiras a ofertar cursos biológicos, serem usadas como referência na criação de outros cursos no país e pela posição política que assumiram no contexto nacional da época. Assim, focalizando seus sujeitos, seus objetivos, locais de funcionamento, propostas curriculares, dentre outros fatores, investigamos mais detalhadamente seus cotidianos no período entre 1934 e 1942.

Na Unidade 05, produzimos alguns apontamentos sobre a institucionalização das Ciências Biológicas na universidade brasileira pela retomada das noções centrais de cada unidade, e através das convergências e divergências nos projetos da USP e da UDF.

Por fim, cabe informar que ao me referir, de modo geral, aos cursos de graduação em Ciências Biológicas, a partir de então, será usada a designação Ciências Naturais e/ou História Natural, considerando que apenas estas duas denominações existiram no período de interesse da pesquisa. Apenas quando me referir a ciência em si, eu empregarei os termos Biologia, ou Ciências Biológicas.

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1.2. PERCURSOS TRILHADOS NA DEFINIÇÃO DO OBJETO DE PESQUISA

A ideia proposta por Costa (2002, p.11) de que “quando se formula um problema de pesquisa, inventa-se também um peculiar caminho para procurar, produzir e propor alternativas de resposta” ganhou um sentido especial no desenvolvimento desta pesquisa. Se, de modo geral, os trabalhos sobre currículos do ensino superior são pouco numerosos, conforme mencionado na Introdução, os trabalhos que se dedicam a investigar os sentidos impressos nos currículos de cursos de graduação são ainda mais escassos.

Nesse sentido, a primeira ação foi produzir reflexões preliminares a respeito da natureza do objeto de estudo e de sua complexidade. Situou-se como horizonte a busca por compreender o processo de institucionalização da área de Ciências Biológicas na universidade brasileira, numa perspectiva histórica. Considerando que o estabelecimento dos cursos de graduação desta área ocorre a partir da década de 1930, no mesmo período de criação do que hoje entendemos por instituições universitárias, as seguintes indagações foram propostas:

(i) Que forças convergem para a institucionalização dos cursos de Ciências Biológicas em nível superior no Brasil?

(ii) Que tendências/tradições biológicas e pedagógicas nortearam o estabelecimento das Ciências Biológicas na academia?

(iii) Como se caracterizava o saber biológico no âmbito acadêmico?

(iv) Que tendências biológicas se desenvolveram e/ou se consolidaram por meio da criação desses cursos no país?

(v) Que projeto(s) de curso estava(m) em disputa e influenciou(aram) o delineamento das primeiras matrizes curriculares?

(vi) Que fatores internos e externos aos primeiros cursos de Ciências Biológicas concretizaram determinado(s) projeto(s) de curso?

(vii) Como estes fatores tensionam os processos de mudança e de estabilidade curricular?

Considerando estas questões, a presente pesquisa tem por objetivos:

(i) identificar quais foram os primeiros cursos de Ciências Biológicas no Brasil, estabelecendo uma linha cronológica;

(ii) mapear as tendências biológicas que caracterizam os referidos cursos, estabelecendo nexos de aproximação e distanciamento entre os mesmos;

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(iii) contextualizar e problematizar histórica e socialmente, os sentidos biológicos evidentes nas propostas curriculares e práticas biológicas realizadas no cotidiano desses cursos e suas relações com as complexas e amplas demandas conjunturais da época;

(iv) historicizar as trajetórias desses cursos constituindo um relato que situe suas particularidades e, ao mesmo tempo, esclareça e desmistifique a oficialização das Ciências Biológicas no ensino superior e suas conexões com o contexto científico mais amplo e com o cenário brasileiro da primeira metade do século XX.

Além de delimitar questões orientadoras para adentrar a pesquisa, tornou-se desafio delinear o período de análise. Saviani (2011, p.12) salienta que a periodização, enquanto uma exigência de compreensão do objeto, é uma questão teórica que se põe para o pesquisador ao enfrentar a tarefa de organizar os dados visando a explicar os eventos constitutivos do fenômeno investigado. Para tanto, o problema do investigador consiste em definir onde fazer os cortes de modo a atender o objeto de estudo: “como dar conta das descontinuidades na continuidade dos acontecimentos”. Deste modo, para realizar os cortes que atendam a problematização anunciada torna-se relevante identificar as categorias que guiam o estudo.

No caso da presente pesquisa, os cortes na periodização residem em torno de elementos da trajetória da Universidade, como datas de origem das instituições e de seus cursos de graduação, além de legislações referentes a eles, e também de fatos referentes ao próprio desenvolvimento do campo das Ciências Biológicas no Brasil.

Deste modo, a pesquisa começou com a identificação dos cursos criados entre 1934 e 1972. Estas balizas temporais foram fixadas previamente devido ao grande valor de tais datas para o campo de Ciências Biológicas. Em 1934, ocorre a criação da Universidade de São Paulo (USP), que é a primeira instituição a ofertar o curso de Ciências Naturais8. Já o ano de 1972, é o prazo máximo para as instituições de ensino superior se adequarem ao Parecer n.107, de 1970 (WORTMANN, 1996). Este dispositivo estabeleceu a denominação atual do curso como Ciências Biológicas, prevendo duas modalidades, a Licenciatura e o Bacharelado (modalidade Biomédica), e novas matrizes curriculares. Alegou-se que o curso de História Natural estava ultrapassado, e que a Licenciatura e o Bacharelado em Ciências Biológicas e a

8

Reconhece-se que a Universidade do Rio de Janeiro foi a primeira proposta de universidade duradoura no país, conforme será abordado na Unidade 2, e que elaborou uma proposta de curso de Ciências Naturais. No entanto, a USP foi a primeira universidade que realmente fez funcionar um curso de Ciências Naturais.

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Licenciatura Curta em Ciências9 possibilitavam uma formação mais adequada às necessidades da época. A partir da identificação, foi construída uma linha cronológica, observando a data de origem dos cursos.

Em seguida, tentamos estabelecer um recorte mais adequado para o desenvolvimento da tese observando os resultados da primeira etapa. Esse segundo momento da investigação focalizou os cursos criados até o ano de 1942, quando, então, ocorre uma discrepância na nomenclatura das Ciências Biológicas entre o ensino secundário e o ensino superior. O ano de 1942 tornou-se relevante para lapidar o recorte temporal, pois é nessa data que são aprovadas pelo então Ministro da Educação Gustavo Capanema, as Leis Orgânicas do Ensino Secundário - Decreto-lei n. 4.244, de 09 de abril de 1942 – (BRASIL, 1942a), que definiram a oferta da disciplina escolar Biologia, em detrimento da História Natural, em vigor desde o Decreto n.19.890, de 18 de abril de 1931, que instituiu a Reforma do Ensino Secundário pelo Ministro Francisco Campos (BRASIL, 1931d). No Quadro 01 segue um esquema das mudanças entre essas duas reformas:

RE F O RM AS ED UCAC IO N AIS 1931: REFORMA DO ENSINO SECUNDÁRIO (Francisco Campos)

Nível de ensino Oferta para Disciplinas científicas

Ciclo Fundamental

- Ciências Físicas e Naturais - Física

- Química

- História Natural

Ciclo

Complementar

Direito - Biologia Geral Medicina/ Odontologia/ Farmácia - Física - Química - História Natural Engenharia/ Arquitetura - Física - Química - História Natural 1942: LEIS ORGÂNICAS DO ENSINO (Gustavo Capanema)

Nível de ensino Oferta para Disciplinas científicas

1º Ciclo - Ginasial - Ciências Naturais

2º Ciclo Curso Clássico - Física - Química - Biologia Curso Científico - Física - Química - Biologia

Quadro 01: Mudanças no Ensino Secundário entre a Reforma Campos (BRASIL, 1931d) e a Reforma Capanema (BRASIL, 1942a).

Fonte: Dados organizados a partir de Romanelli (2010)

9

Na metade da década de 1960 e na década de 1970, o CFE instituiu os Pareceres n.38/65 e Parecer n.1.687/74 (Resolução n.30/74), que fixou o currículo mínimo e a duração dos cursos de Licenciatura Curta (ou de 1º Ciclo). Estes, de modo geral, tinham por objetivo formar docentes polivalentes, isto é, habilitados para ministrar aulas de Ciências Naturais, Biologia, Física, Química e Matemática,suprir a insuficiência de professores, gerada pela expansão da escolarização obrigatória de quatro para oito anos, e atender à reivindicação de vagas no ensino superior, com uma formação rápida e menos custosa ao Estado (LIMA-TAVARES, 2006).

(21)

A opção por pautar o estudo pela disciplina escolar Biologia decorre do fato de esta apresentar-se consolidada há mais tempo que os cursos de graduação, e a formação de professores para atuar no ensino secundário ser uma das finalidades da formação em nível superior, podendo, portanto, ter sido um elemento motivador nas transformações que passaram os cursos de Ciências Biológicas nesse momento embrionário. Com essa opção, objetivou-se questionar como e porque os cursos universitários criados a época com a finalidade de formar quadros docentes para as escolas responderam a essa demanda.

Inicialmente, sem conhecimento da existência de alguma pesquisa que tratasse sobre a origem dos cursos de Ciências Biológicas no país, o primeiro procedimento foi verificar se existiam estudos sobre o tema e, ao mesmo tempo identificar os primeiros cursos. Para tanto, foram elaboradas duas frentes de ação10: levantamento bibliográfico em dissertações e teses; e mapeamento dos cursos de graduação existentes no Brasil e seus perfis, a partir das dissertações e teses encontradas e da consulta a dados dos cursos na internet.

Com relação à primeira ação, recorremos à fonte documental, tendo como material empírico o livro “35 anos da produção acadêmica em Ensino de Biologia no Brasil: catálogo

analítico de dissertações e teses (1972-2006)”, de Paulo Teixeira (2012), disponível de modo

impresso, e também on-line11 na página da Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia (UESB). Este livro se tornou um material ideal para o levantamento bibliográfico, pois se constitui num amplo inventário de resumos de teses e dissertações publicadas em diversos bancos de dados (Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior/CAPES, Centro de Documentação em Ensino de Ciências/CEDOC, Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Educação/ANPEd, sites de Programas de Pós-Pós-Graduação), o que garantiu uma variedade de materiais à pesquisa.

Para analisar essa fonte foram realizados dois procedimentos. Primeiramente, de posse do livro em versão online, buscaram-se teses e dissertações relacionadas ao objetivo da pesquisa por meio de palavras-chave. Dos 474 resumos apresentados no livro, selecionaram-se 229, de acordo com as selecionaram-seguintes palavras-chave: História Natural-5; Ciências Biológicas-111; Ensino Superior-5; História-47; Currículo-61. Em um segundo momento, mediante a leitura na íntegra dos resumos, mapearam-se apenas os trabalhos que traziam contribuições para refletir sobre a trajetória das Ciências Biológicas no Ensino Superior, e que se

10 Este momento da pesquisa contou com a participação da acadêmica Mariana Alberti do curso de Ciências

Biológicas da UFF, bolsista de IC no projeto da orientadora, e participante do grupo de pesquisa Currículo, Docência e Cultura (CDC/FE/UFF).

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enquadravam na periodização de 1934 até 1972. Assim, a partir da leitura do livro foram selecionados 17 resumos, sendo 5 de teses e 12 de dissertações (Gráfico 1).

Gráfico 01: Quantidade de dissertações e teses selecionadas ao longo dos diferentes critérios de seleção. Fonte: Dados da pesquisa realizado no livro Teixeira (2012).

Em síntese, não foram encontrados pesquisas que tenham como objeto de estudo a perspectiva desenvolvida na tese, o que atesta seu caráter original12. Os poucos resumos de dissertações e teses encontradas foram selecionadas por se aproximarem da perspectiva da pesquisa. De modo geral, esses materiais consistiam em estudos de casos de cursos específicos de graduação em Ciências Biológicas, tendo como foco: i. a avaliação dos cursos; ii. a análise de reformas curriculares; iii. a investigação das matrizes curriculares em articulação com diretrizes nacionais para o Ensino Superior, ou para a formação de professores; e para diagnosticar o perfil de acadêmico/especialista/professor que os cursos estão formando. É necessário observar que esses poucos materiais encontrados, nos auxiliaram no próximo passo da pesquisa, que foi estabelecer os primeiros cursos, seus anos de fundação e seus perfis.

Como a busca em dissertações e teses foi insuficiente, partimos para o site do Ministério da Educação (HTTP//:emec.mec.gov.br), onde estão registrados as instituições de ensino

12 Realça-se que temos conhecimento de estudos, como os de Azevedo (1955), Schwartzman (1979), Ferri e

Motoyama (1979), Fernandes (2000), dentre outros, que têm como foco o desenvolvimento histórico das Ciências no Brasil, no qual se incluem as Ciências Biológicas, mas em perspectivas que não contemplam plenamente as dimensões educacionais. Além disso, foram encontrados, na internet, estudos que comentam de forma breve sobre fatos da história dos cursos de Ciências Biológicas, mas não discutem a institucionalização do projeto desse curso no Brasil, por exemplo, a de Leahy (1984), Tomita (1990), Haddad (2006), Uliana (2012), Araújo, Toledo e Carneiro (2015). No entanto, estas não se constituem em dissertações e teses, e se limitam a apresentar dados sobre os cursos do ponto de vista legislativo, ou apenas contando a história de um curso, tangenciando assim os objetivos da presente proposta de pesquisa.

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superior e seus cursos. Ao realizar a busca de cursos pelas palavras-chave ‘História Natural’ e ‘Ciências Biológicas’, foram encontrados 1147 cursos cadastrados. A seguir, buscamos informações sobre o ano de origem de cada curso nos sites das distintas instituições, crivando para a próxima etapa, apenas os cursos criados no período entre 1934 e 1972. No referido período, identificamos 21 instituições públicas de ensino superior com cursos de Ciências Biológicas, conforme indica a Figura 01:

Figura 01: Linha cronológica sobre a origem dos cursos de Ciências Biológicas nas instituições públicas de ensino superior13 no Brasil, no período de 1934 até 1972. Fonte: Dados da pesquisa.

Considerando que, a época do período de coleta de fontes para a pesquisa, muitas instituições ainda não dispunham de sites e documentos com informações atualizadas sobre a história dos seus cursos, destaca-se que os dados consultados até a finalização da tese, permitiram estipular datas “prováveis” de criação destes cursos, que são as demonstradas na Figura 01. Explicita-se que em alguns casos as datas se referem a origem dos mesmos em termos legislativos, mas não em termos de funcionamento, e em outros casos marcam o ano que entraram em atividade.

De posse da linha do tempo, e tendo aplicado o segundo crivo, ou seja, a seleção dos cursos de Ciências Biológicas criados entre 1934 e 1942, o número de instituições que atendem aos critérios da pesquisa foi reduzido a seis: Universidade de São Paulo; Universidade do Distrito Federal; Universidade do Brasil (antiga Universidade do Rio de

13

Nome atual das instituições com cursos de CB criados entre 1934 e 1972, conforme ordem cronológica demonstrada na Figura 01: Universidade de São Paulo (USP); Universidade do Distrito Federal (UDF, extinta); Universidade Federal do Rio Janeiro; Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS); Universidade Federal do Paraná (UFPR); Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG); Universidade Federal da Bahia (UFBA); Universidade Federal de Pernambuco (UFPE); Universidade Federal do Pará (UFPA); Universidade Federal do Mato Grosso (UFMT); Universidade Federal do Espírito Santo (UFES); Universidade Federal de Santa Maria (UFSM); Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF); Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro (UFRRJ); Universidade Federal de Uberlândia (UFU); Universidade Federal do Ceará (UFC); Universidade Federal Rural de Pernambuco (UFRPE); Universidade Federal de São Carlos (UFSCAR); Universidade Estadual de Londrina (UEL); Universidade Federal de Viçosa (UFV); Universidade Federal de Sergipe (UFS).

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Janeiro); Universidade Federal do Rio Grande do Sul; Universidade Federal do Paraná e Universidade Federal de Minas Gerais.

Ao definir as instituições foco, fomos atrás de informações e materiais sobre as mesmas e sobre os seus cursos de Ciências Biológicas nas respectivas unidades. A instabilidade no período inicial dos cursos das referidas instituições transpareceu na construção da linha do tempo, o que acarretou mudanças. Isto decorreu do fato de encontrar informações pouco detalhadas nos sites das instituições e em outros que se referiam as mesmas e aos seus cursos de graduação. Por exemplo, alguns sites informavam como data de criação do curso o ano em que ele, na verdade, havia começado suas atividades, isto é, quando houve o primeiro vestibular, formação de turma e frequência ativa de alunos. Mas, em alguns casos, o curso já havia sido previsto legalmente em anos anteriores, inclusive com proposta de matriz curricular, porém não havia entrado em funcionamento por carência de infraestrutura e contratação de docentes para as diversas áreas, ou até chegou a funcionar, mas seu alvará de funcionamento emitido pelo Ministério da Educação ainda estava em tramitação.

Deste modo, descobriu-se que o curso da UFRGS iniciou suas atividades em 1942, mas sua primeira grade curricular já tinha sido prevista desde 1938. O curso da UFPR foi proposto em 1942, mas só iniciou em 1943. O curso da UFMG, que teria começado em 1946, no momento de origem da Universidade de Minas Gerais, na verdade, origina-se no seio de uma faculdade particular posteriormente incorporada à universidade, portanto, sua proposta já havia sido anunciada desde 1942. Há de se destacar também a Universidade do Rio de Janeiro, que apresenta uma proposta de curso em 1934, mas que só entra em funcionamento quando esta já se chama Universidade do Brasil, em 1939. E por fim destacam-se as várias mudanças que a UDF passou. Em 1935, foi oficialmente criada pelo Decreto n. 5.513/4.4.1935 (DISTRITO FEDERAL, 1935), em 1938, passa por uma reorganização decorrente do Decreto n. 6.215/21.05.1938 (DISTRITO FEDERAL, 1938), e em 1939, é extinta, e seus professores e alunos incorporados à recém-criada Faculdade Nacional de Filosofia (FNFi) da Universidade do Brasil (UB), que se tornou padrão para todas as instituições congêneres pelo Decreto n. 1.190/4.4.1939 (BRASIL, 1939). No decorrer da pesquisa haverá tentativas de compreender como se caracteriza essa passagem do curso de História Natural da UDF para a UB, no entanto, neste momento, frisamos a opção por tratá-los como dois cursos distintos, pois as instituições não se caracterizaram como continuação uma da outra.

Com essas descobertas, a linha cronológica com relação ao marco de 1942 segue da seguinte forma:

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ANO INSTITUÍÇÃO SITUAÇÃO DO CURSO

1934 Universidade do Rio de Janeiro (URJ) Previsto em lei. 1934 Universidade de São Paulo (USP) Inicia atividades. 1935 Universidade do Distrito Federal (UDF) Inicia atividades. 1938 Universidade do Distrito Federal (UDF) Reorganização da UDF. 1938 Universidade de Porto Alegre (UPA) Previsto em lei. 1939 Universidade do Brasil (UB, padrão nacional) Inicia atividades. 1942 Universidade de Porto Alegre (UPA) Inicia atividades. 1942 Universidade de Minas Gerais (UMG) Inicia atividades. 1942 Universidade de São Paulo (USP) Reorganização da USP. 1942 Universidade do Paraná (UPR) Previsto em lei

1943 Universidade do Paraná (UPR) Inicia atividades.

Quadro 02: Cronologia sobre a origem dos cursos de Ciências Biológicas nas instituições públicas de ensino superior no Brasil, no período de 1934 até 1942. Fonte: Dados da pesquisa.

Ponderando esses avisos, em síntese, ressalva-se que as informações impressas na primeira linha cronológica (1934-1972) foram essenciais para o desenvolvimento das próximas etapas da pesquisa, mas que, no entanto, apresentam dados aproximados sobre as instituições e seus cursos, servindo assim, apenas, como parâmetro inicial para futuras pesquisas.

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1.3. A RESPEITO DOS VESTÍGIOS

Os caminhos para adentrar-se numa instituição são inúmeros. Há, como em edifícios, subterrâneos, alicerces, porões, portas, janelas, sótãos, telhados, chaminés... O desafio é entrar na instituição. [...] Posso chegar à instituição pela legislação educacional, pelo seu currículo, pelo seu quadro de alunos, pela proposta pedagógica, pela sua cultura manifesta, pelos trabalhos escolares, pela arquitetura do prédio, pelos professores que dela participaram, pelos ex-alunos, pelo mobiliário, pelas memórias, pela historiografia preexistente ou por arquivos e fontes múltiplas (escritas, orais, imagens, sons e outras). O que me dá o passaporte de ingresso é o conjunto de fontes que levanto, critico e seleciono, e nenhum tipo de fonte deve ser interditado. (SANFELICE, 2007, p.77)

A primeira busca de materiais identificou cinco instituições de interesse da pesquisa. A partir de então, foi necessário entrar em contato com as universidades indo até elas presencialmente, para obter acesso aos documentos históricos. Esta etapa vem se mostrando complexa e difícil por diferentes razões, dentre as quais se destaca: 1. Algumas instituições não mantiveram armazenados todos os materiais da época de interesse da pesquisa; 2. Quando esses materiais históricos existem, estão dispersos por diferentes setores das instituições, pois ao longo dos anos, elas passaram por modificações em suas estruturas organizacionais, o que levou a separações dos documentos segundo interesses diversos 3. Quando esses materiais históricos existem, muitos não estão em locais de livre acesso, e/ou tampouco organizados, e/ou em bom estado de conservação.

Dentre os locais consultados constam:

 Secretaria do curso de Ciências Biológicas e do Instituto de Biociências da USP;

 Biblioteca setorial do Instituto de Biociências e da Faculdade de Filosofia da USP;

 Secretaria do curso de Ciências Biológicas da UFMG;

 Acervo histórico da Reitoria da UFMG;

 Biblioteca central da UFMG;

 Biblioteca setorial e direção da Faculdade de Filosofia da UFMG;

 Arquivo histórico da Faculdade de Filosofia da UFPR;

 Secretaria e Departamento do curso de Ciências Biológicas da UFPR;

 Centro de Memória do Instituto Superior de Educação do Rio de Janeiro (ISERJ);

 Arquivo Nacional do Rio de Janeiro;

 Programa de Estudos e Documentação Educação e Sociedade (PROEDES/UFRJ);

 Centro de Pesquisa e Documentação de História Contemporânea do Brasil da Fundação Getúlio Vargas (CPDOC/FGV)

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 Secretarias do curso de Ciências Biológicas, do Instituto de Biociências, e dos Departamentos de Zoologia, Botânica e Genética da UFRGS;

 Biblioteca central, biblioteca setorial do Instituto de Biociências e biblioteca setorial da Faculdade de Filosofia da UFRGS.

A partir do contato com essas unidades tem sido possível acessar documentos diversos. Segundo Bravo (1991), são documentos todas as realizações produzidas pelo homem que se mostram como indícios de sua ação e que podem revelar suas ideias, opiniões e formas de atuar e viver. Dentro dessa concepção, os seguintes documentos compõem as fontes primárias: dispositivos legais sobre o Ensino Superior e sobre os cursos de Ciências Naturais/História Natural; documentos administrativos das instituições que se referem indiretamente aos cursos, tais como atas, portarias, boletins, organogramas, discursos de aula inaugural, etc; e documentos que se referem diretamente aos cursos de Ciências Naturais/História Natural, como matrizes curriculares, anotações dos professores, livros, reformas curriculares, diários de aula, fotografias de laboratórios, cartas, etc, provindos das instituições ou de arquivos pessoais.

Ao conjunto empírico primário da pesquisa adicionam-se as fontes secundárias como livros sobre a história de cada universidade, relatórios de atividades de institutos posteriores as Faculdades de Filosofia, depoimentos de discentes e docentes obtidos através de entrevistas realizadas em momento histórico posterior e com outras finalidades, relatórios e produções de professores, dentre outros. Estas fontes foram essenciais ao desenvolvimento da pesquisa, por trazer algumas reflexões prévias do assunto, ao mesmo tempo em que, por vezes, traziam em seu corpo fontes primárias na íntegra, que não foram encontradas nas buscas iniciais.

O tratamento dos materiais coletados não foi de sobreposição ou de preferência de uma fonte em detrimento de outra, mas ocorreu através da articulação das informações obtidas, pois assim foi possível evitar um estudo reducionista do ambiente universitário. Isto é, a tentativa foi de ir às fontes não como formas de obtenção direta de respostas sobre a criação dos cursos, mas como vestígios constituídos de partes da realidade da vida desses cursos, e que permitem compreender essa institucionalização à medida que não se busca a sua essência, mas as relações que estabelece com a história da educação, da ciência, do mercado de trabalho, das profissões, etc. A leitura das fontes em conjunto e de modo entrecruzado é essencial, segundo Ragazzini, para a qualidade da pesquisa. Para este autor (2001, p.21):

Existem fontes específicas para o estudo de um autor, de um professor excepcional. Existem fontes para o estudo de uma instituição local, uma escola, um lugar, um ambiente. Na história local e específica de uma escola, estão dispostos todos os

(28)

problemas conexos à história desse local, não obstante eles ganhem significação somente quando colocados em contraste com outros locais e com o abstrato médium de referência, que é à história nacional.

A análise balizou-se também no pressuposto de que as fontes escritas, orais e iconográficas14 têm potencialidades e fragilidades de uso. Esta consideração permitiu trabalhar com a ideia de que para uma frutífera análise entrecruzada desses vestígios era necessário mais que conhecer quem, como e quando produziu as fontes, considerar suas características próprias e submetê-las a interrogatórios de possibilidades.

Com base nisso, os documentos escritos, que até os primeiros trinta anos do século XX, eram considerados os documentos confiáveis, foram observados quanto a análise que se fez do conteúdo da escrita. Por vezes, por exemplo, a escrita do autor em um documento permite certa interpretação que vai além do que ele quis dizer, pode representar a legitimação de uma retórica, pode ser restrita em relação a um fato mais amplo que o sujeito queria detalhar, mas não “achou as palavras” certas para proferir, ou até mesmo, ter uma intencionalidade só explícita quando se sabe onde o documento foi publicado e/ou armazenado. Ponderou-se, portanto, que o documento escrito representa já uma interpretação de eventos reais elaborada por seu autor e, portanto, não deve ser encarado como uma descrição objetiva e neutra dos fatos.

Julga-se também que esses documentos assumem novos significados, muitas vezes não previstos nos investimentos do poder, pelo autor, ou nos ditames da organização da instituição, quando manuseados e postos em prática pelos seus sujeitos (VIDAL, 2007). Nesse sentido, é preciso estar atento ao que adverte Saviani (1987, p.134): “não é suficiente ater-se à “letra da lei”, às exposições de motivos [...] é fundamental conhecê-los e captar o significado de certas medidas, como parte de uma realidade concreta, permeada de contradições e de fontes inspiradoras e legitimadoras”.

No caso das fontes iconográficas, em que se fez uso de fotografias como elementos para desenvolver a pesquisa, levou-se em conta que elas não são um “espelho do real”, nem simplesmente uma redução e distorção de cenas como se denunciou no final do século XIX, na imprensa e no senso comum. Materializam-se como um registro do visível, fornecem fragmentos de realidade, diferindo de outros tipos de iconografia como pinturas, desenhos, gravuras e ilustrações, já que captam dados da realidade apreendida, que podem ser lugares,

14 Utilizou-se a denominação descrita em KOSSOY (2001, p.65-72). Para o autor, quanto a natureza das fontes

existem: fontes escritas (documentos escritos com informações transmitidas sob a forma original, manuscrita, impressa, ou de reprodução); fontes iconográficas (documentos visuais, imagens, desenhos e fotografias); fontes orais (depoimentos e entrevistas obtidos pela oralidade e em diálogo com um entrevistador); e fontes-objetos que abrangem todos os vestígios materiais que sobreviveram à ação do tempo (por exemplo, monumentos).

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