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Educação e sindicalismo : o discurso sindical no contexto da reestruturação produtiva

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Academic year: 2021

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EVALDO PIOLLI

EDUCAÇÃO E SINDICALISMO:

O Discurso Sindical no Contexto da Reestruturação

Produtiva

Dissertação de Mestrado

apresentada à Faculdade de

Educação da Universidade Estadual

de Campinas

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UNIVERSIDADE ESTADUAL DE CAMPINAS

FACULDADE DE EDUCAÇÃO

DISSERTAÇÃO DE MESTRADO

Título: EDUCAÇÃO E SINDICALISMO: O DISCURSO SINDICAL NO CONTEXTO DA REESTRUTURAÇÃO PRODUTIVA

Autor: EVALDO PIOLLI

Orientador: JOSÉ ROBERTO HELOANI

Este exemplar corresponde à redação final da Dissertação defendida por EVALDO PIOLLI e aprovada pela Comissão Julgadora.

Data: 26/04/2004 Assinatura:... Orientador COMISSÃO JULGADORA:

_________________________________________

_________________________________________

__________________________________________

Fevereiro de 2004

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RESUMO

Este trabalho tem como objetivo reconstruir parte dos discurso sindical emitido pelas centrais sindicais (Confederação Geral dos Trabalhadores – CGT, Central Única dos Trabalhadores – CUT e Força Sindical) ao longo dos anos 90 e início dos anos 00 com o propósito de verificar suas convergências com o discurso do Estado e as confluências de tais discursos com a lógica do capital no contexto da reestruturação produtiva e das políticas neoliberias, um cenário onde o capital busca restabelecer sua hegemonia imprimindo novas formas de racionalização e de controle sobre a força de trabalho e um novo arranjo societal centrado numa regulação pelo mercado. As “inovações” decorrentes de tal processo promovem o isolamento político da classe trabalhadora e inserem novos desafios ao movimento sindical, como o de superar sua crise e ao mesmo tempo responder a novas demandas impostas aos trabalhadores, muitas delas remetidas para a nova institucionalidade da política de emprego em torno da negociação da educação e da formação profissional no âmbito do Plano Nacional de Qualificação Profissional (Planfor). Mas tanto o conteúdo deste plano como também o modelo de gestão pública de forte poder regulatório (um modelo paritário e tripartite que inclui trabalhadores, empresários e governo) presente nas suas diretrizes participam de um projeto mais amplo que visa à inserção do país na lógica do capitalismo globalizado, do qual o movimento sindical, a exemplo de outros momentos do processo de acumulação do capital no Brasil, vem sendo chamado a participar.

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ABSTRACT

The aim of this work is to reconstruct part of the syndical discourse emitted by the syndical headquarters (Confederação Geral dos Trabalhadores - CGT, Central Única dos Trabalhadores - CUT) along the nineties and beginning of the year 2000 with the purpose of verifying their convergences with the discourse of the State and the confluences of such discourses with the logic of the capital in the context of the productive restructuring and neoliberal politics, a scenery where the capital looks for reestablishing hegemony by printing new rationalization and control forms on work force as well as new social arrangements centered in a regulation by the market. The 'innovations' resulting of such a process promote the political isolation of the working class and bring new challenges to the syndical movement as the one of overcoming its crisis and at the same time to answer to new demands imposed to workers, many of them related to the new institutionalism of the job politics around the negotiation of the education and of the professional formation in the extent of the Plano Nacional de Qualificação Profissional (National Plan of Professional Qualification) - Planfor. However as the content of this plan as the model of public administration marked by its strong regulative power (an equalitarian and tripartite model that includes workers, entrepreneurs and government) presents in its guidelines take place in a wider project that seeks the insertion of the country in the logic of the globalized capitalism, in which the syndical movement, identically to other moments of the process of accumulation of the capital in Brazil, has been called to participate.

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À memória de meu pai, Albeque Piolli

(1926 – 2003), com saudade e grande admiração.

À Gisiley e meus filhos Lucas e Pedro.

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AGRADECIMENTOS

Este trabalho não só é parte da minha experiência de vida mas também fruto da colaboração, direta ou indireta, de muitas pessoas que em diferentes momentos ofereceram apoio e compartilharam das minhas reflexões. A elas meus agradecimentos.

Primeiramente ao professor Roberto Heloani pela paciência, dedicação com que conduziu o trabalho de orientação e também pela amizade construída nesse processo.

Aos professores Márcia de Paula Leite, Leila Blass e Odair Saczs, que compuseram a banca de qualificação e a banca examinadora, pelas valiosas observações que permitiram estabelecer melhor os rumos do trabalho.

Aos amigos de sempre, Jurandir Renovatto pela amizade, presença constante e a fundamental contribuição no trabalho de revisão deste texto, e Paulo Roberto de Oliveira _ “caipira”, pelo estímulo e palavras motivadoras.

Aos colegas do grupo de pesquisa e professores da Faculdade de Educação deixo um agradecimento especial pelos bons momentos que compartilhamos.

À minha mãe Irani e toda minha família pelo apoio e o incentivo na trajetória deste caminho.

Enfim, gostaria de finalizar agradecendo a CGT, CUT e a Força Sindical pela atenção e disponibilidade para que este trabalho pudesse ser concretizado.

Meus sinceros agradecimentos.

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SUMÁRIO

Apresentação, 01 Introdução, 03

Capítulo 1. O movimento sindical no Brasil: desenvolvimento e crise contemporânea,17 .

1.1. Industrialização, operários e sindicatos, 18

1.2. Diferentes correntes do movimento sindical até 1930, 24 1.3. Sindicato de Estado (pós-30), 35

1.4. Sindicalismo do anos 80, 48

1.5. A crise do sindicalismo nos anos 90, 51

Capítulo 2. A Reestruturação produtiva e o ideário da qualificação do trabalhador, 59

2.1. Do fordismo à acumulação flexível, 61 2.2. A acumulação flexível e seus efeitos, 67 2.3. O ideário da qualificação do trabalhador, 74

Capítulo 3. Plano Nacional De Qualificação Do Trabalhador – Planfor: conceituação e negociação, 83

3.1. O sistema paritário na institucionalidade do Planfor, 84 3.2. Base conceitual do Planfor, 89

CAPÍTULO 4. Transformações no mundo do trabalho, educação e institucionalidade no discurso sindical, 97

4.1. O discurso da Confederação Geral dos Trabalhadores (CGT), 97 4.1.1. O cenário geral da reestruturação produtiva,97

4.1.2. A educação e a educação profissional, 102 4.1.3. A conceituação relativa à educação, 104 4.1.4. Atuação no âmbito do Planfor, 109

4.1.5. Participação na política pública de emprego: a nova institucionalidade. 114 4.2. O discurso da Central Única dos Trabalhadores (CUT), 117

4.2.1. O cenário geral da reestruturação produtiva, 117 4.2.2. A educação e a educação profissional,121 4.2.3. A conceituação relativa à educação, 129 4.2.4. Atuação no âmbito do Planfor, 133

4.2.5. Participação na política pública de emprego: a nova institucionalidade, 136 4.3. O discurso da Força Sindical (FS), 144

4.3.1. O cenário geral da reestruturação produtiva, 144 4.3.2. A educação e a educação profissional, 150 4.3.3. A conceituação relativa à educação, 153 4.3.4. Atuação no âmbito do Planfor, 156

4.3.5. Participação na política pública de emprego: a nova institucionalidade, 162

Considerações finais, 167 Bibliografia,177

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APRESENTAÇÃO

“[...] ao invés de perguntar como o soberano aparece no topo, tentar saber como foram constituídos, pouco a pouco, progressivamente, realmente e materialmente os súditos, a partir da multiplicidade de corpos, das forças, das energias, das matérias, dos desejos, dos pensamentos, etc. Captar a instância material da sujeição enquanto constituição dos sujeitos [...]” (Foucault, 1979, p. 183).

Com certeza, dar conta, em nossos dias, do universo de questões que envolvem a atuação do movimento sindical, por meio das centrais sindicais (Confederação Geral dos Trabalhadores – CGT, Central Única dos Trabalhadores – CUT e Força Sindical – FS), não é uma tarefa simples em razão dos muitos desdobramentos possíveis. No entanto, sem a pretensão de querer responder à complexidade dos cortes analíticos possíveis, a análise exposta neste trabalho procura reconstruir o discurso sindical ao longo dos anos 90 e início dos anos 2000, expressado diante do conjunto de transformações na esfera do trabalho mas que também se refere aos novos desafios colocados ao movimento sindical, fundamentalmente o de superar sua crise e responder às demandas impostas aos trabalhadores no novo arranjo societal, imprimido pela reestruturação produtiva e pelas reformas neoliberais.

Muitas dessas demandas aparecem colocadas no âmbito da política de emprego principalmente no que se refere à educação e à formação profissional, particularmente dentro do Plano Nacional de Qualificação Profissional (Planfor), foco privilegiado deste trabalho, pela sua institucionalidade (esfera pública) que pressupõe um modelo de gestão paritária e tripartite (trabalhadores, empresários e governo) de forte conteúdo regulatório e pelo ideário, presente em suas diretrizes, do projeto que visa a adequação e inserção do País e dos trabalhadores, pela formação e qualificação, na competitividade da economia globalizada.

Não é novidade, porém, que, a exemplo de outros momentos do processo de acumulação do capital no Brasil, o movimento sindical seja chamado a prestar

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concurso e legitimar um novo modo de regulação e de dominação do capital sobre o trabalho.

A análise, no entanto, procura situar o movimento sindical em meio à ofensiva do capital que, para restabelecer sua hegemonia societal, promove a desestruturação das bases do Estado do Bem-Estar social, modifica o modo de regulação por uma nova regulação centrada no mercado cuja a expressão é o Estado neoliberal que se apresenta forte no estabelecimento de diretrizes econômicas de ajuste fiscal e fraco no campo das políticas públicas. E é justamente sobre a gestão destas que se faz apelo ao princípio da comunidade “para obter cumplicidade e legitimação” através da esfera pública.

A atuação nesse campo pressupõe atores sociais autônomos capazes de confrontarem com os imperativos sistêmicos pelo fortalecimento de estruturas comunicativas (razão comunicativa) frente à penetração contundente dos sistemas e da razão instrumental para aprofundamento de processos democráticos.

Foi com base nesse pressuposto que se construiu o objetivo deste trabalho, qual seja, o de analisar o discurso sindical e as convergências desse com o emitido pelo Estado e suas confluências com a lógica do capital, e apontar para as potencialidades de confrontação do movimento sindical para imprimir processos democráticos e confrontar-se com os imperativos da reestruturação capitalista. Para a consecução desse objetivo foram analisados os discursos que tratam do conjunto de transformações do mundo do trabalho, da educação geral e profissional, bem como sua conceituação e participação no âmbito do Planfor e sobre a nova institucionalidade. Tal análise só foi possível a partir da utilização de fontes documentais diversas (resoluções de congressos e reuniões plenárias, artigos, publicações, etc.) e de entrevistas.

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INTRODUÇÃO

A reestruturação produtiva é um processo que vem se desenvolvendo, em nível mundial, desde o início dos anos 70, e está inserida na lógica do sistema reprodutivo capitalista cujas contradições e impactos envolvem a esfera do político e do econômico. O conjunto de transformações que impõe ao mundo do trabalho, tanto no Brasil como no plano internacional, introduz novas e mais complexas questões sobre a relação capital e trabalho e que precisam ser analisadas.

Os processos de internacionalização introduzem inovações no gerenciamento e controle da força de trabalho e processos produtivos baseados em novas tecnologias. Essa reestruturação também tem seu caráter excludente, pois agrava o desemprego estrutural, precariza o trabalho e segmenta a classe trabalhadora, contribuindo para que as entidades sindicais se ressintam, também, da diminuição do seu poder de resistência, num processo amplo de isolamento político (Santos, 1996). Um processo que se dá a partir das unidades produtivas, pela incorporação de sistemas de organização do trabalho, que impõem mecanismos de controle sutis sobre o trabalhador, pela terceirização e pela implantação de novos sistemas e cadeias produtivas que fragmentam o tecido industrial de base fordista.

O movimento sindical passa a enfrentar novos desafios com a emergência do neoliberalismo no final dos anos 70, pois esse objetiva alterar o modo de regulação pelo Estado para impor uma nova regulação centrada no mercado com a finalidade de restabelecer a hegemonia societal do capital frente às conquistas dos trabalhadores conformadas no Estado do bem-estar social.

Pode-se dizer que o neoliberalismo é a forma pela qual o capital busca responder a sua crise, reafirmando o princípio do mercado sobre o princípio de Estado e da comunidade. Um Estado que se torna mínimo para manutenção e implantação de serviços sociais e forte no estabelecimento de diretrizes econômicas e nas políticas de ajuste fiscal (Santos, 1996; Heloani, 2003).

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No entanto, é sobre a gestão das políticas públicas que o Estado faz apelo ao princípio da comunidade “para obter cumplicidade e legitimação” através da esfera pública (Santos, 1996). O neoliberalismo passa, então, a fundamentar um conjunto de políticas de governo orientadas para a redução do setor público e a flexibilização dos direitos sociais, o que, na verdade, também é uma estratégia de dimensões mundiais que tem no Consenso de Washington, em 1989, seu marco a partir de onde se disseminariam políticas de cunho financeiro “que tornariam exeqüíveis o programa de estabilização e as reformas estruturais sancionadas pelo FMI e o Banco Mundial. O Fundo Monetário Internacional empresta dinheiro a países em dificuldades em troca de adoção de rígidas políticas econômicas; e o Banco Mundial, por sua vez, objetiva financiar projetos sociais de infra-estrutura em países em desenvolvimento” (Heloani, 2003). No Brasil, essas interferências começam nos anos 80 e tornam-se mais agudas na década de 90.

O receituário desse organismo pressupõe o ideário da reforma do Estado e do Estado mínimo, o que inclui a disseminação e a intensificação de formas de gestão compartilhada de serviços sociais originalmente de responsabilidade estatal com a comunidade, representada por entidades do setor privado não-lucrativo, abrangendo, também, o próprio movimento sindical. E a esfera pública, que se eleva a partir daí, quase sempre aparece na forma de novas institucionalidades de forte conteúdo regulatório.

Especificamente no que se refere à educação e à educação profissional a interferência se dá na forma e no conteúdo. Na forma, porque indica modelos de gestão compartilhada, e no conteúdo, porque direciona este para uma “conexão com o novo paradigma produtivo” colocando educação como “estratégica e indispensável para o sucesso da nova ordem de competição internacional”, ou seja, uma abordagem que vê os processos educativos pela ótica do cálculo econômico (Moraes, 2000, p. 5).

Todo esse ideário participa, hoje, da política pública de emprego no Brasil de um modo geral e, mais especificamente, do Plano Nacional de Qualificação do Trabalhador (Planfor), implantado em 1995 e gerido pelo Conselho Deliberativo do Fundo da Amparo ao Trabalhador (Codefat), composto de forma tripartite

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(trabalhadores, empresários e governo) e paritária1. A bancada dos trabalhadores,

dentro desse conselho, está representada pela centrais sindicais (CGT, CUT, Força Sindical e SDS).

O problema, então, seria o de que, ao mesmo tempo em que tem sua representatividade e poder de mobilização afetados pelo processo de reestruturação produtiva, o movimento sindical defronta-se com novos campos de atuação no plano institucional que se referem à gestão de políticas públicas. Ou seja, defronta-se com novas demandas colocadas aos trabalhadores que decorrem do processo de exclusão da reestruturação produtiva e que estão sendo remetidas para negociação no âmbito das políticas públicas em espaços institucionais.

É nesse contexto que a análise do discurso emitido pelas centrais sindicais surge como um importante objeto de estudo sobre o qual se pode analisar como as entidades representativas vêm respondendo a essas demandas, suas convergências com o a visão Estatal e suas confluências com a lógica do capital.

A hipótese deste trabalho é a de que o discurso do movimento sindical relativo à educação e à educação profissional, que se eleva ao âmbito da institucionalidade, em particular da política pública de emprego, é sinalizador das possibilidades de confrontação e avanços a processos mais democráticos no direcionamento das próprias políticas públicas, nos rumos da reestruturação produtiva e na esfera do Estado de modo mais geral.

Essa é uma tarefa complexa que envolve a análise do discurso no campo da educação e da educação profissional no contexto da reestruturação produtiva, buscando uma compreensão da relação do movimento sindical com os fundamentos sistêmicos do processo de produção e reprodução ampliada do capital, onde essas assumem um papel estratégico. O discurso relativo à educação geral e profissional parece surgir ou modificar-se no âmbito das organizações sindicais segundo uma perspectiva heterônoma2, proveniente do processo de acumulação, mas que se

1 O paritarismo é uma “doutrina política que orienta a participação dos sujeitos sociais e políticos através de suas representações igualmente contempladas, em conselhos e comissões, que tem objetivo de discutir, encaminhar e acompanhar a implementação de políticas públicas e sociais” (Fidalgo e Machado, p. 236).

2

Segundo o Dicionário Houaiss da Língua Portuguesa, o termo heterônomo refere-se ao que está “sujeito a uma lei exterior ou à vontade de outrem [ou] que recebe do exterior as leis reguladoras de sua conduta” (Houaiss, 2001, p. 1.523).

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cristaliza e ganha legitimidade nas parcerias e no intercâmbio que se estabelecem com outros atores sociais no âmbito das políticas públicas.

Não se pretende aqui, contudo, analisar cada uma das ações mas chamar a atenção para um processo que envolve o surgimento de novos imperativos sistêmicos e instrumentais dentro das organizações sindicais, num contexto no qual enfrentam uma crise provocada pelo próprio processo de reestruturação capitalista que coloca novos desafios, como o de manter-se na condição de representante e interlocutor dos trabalhadores.

Essas hipóteses de trabalho serão analisadas à luz do referencial proposto por Habermas, para quem “as utopias centradas na sociedade do trabalho [...], na qual situamos o movimento sindical, [...] estão degradadas pelas relações de corporificação pressupostos da economia” em que as “[...] dimensões da felicidade e da emancipação humana confluíram com aquelas do incremento do poder e da produção da riqueza social que tem no processo de racionalização as condicionantes para a mobilização das energias utópicas” (Habermas, 1987a, p. 114).

Porém, sem entrar nos pressupostos teóricos que envolvem a discussão sobre a centralidade ou não do trabalho, enquanto categoria analítica fundamental da sociedade, a teoria habermasiana é, ao nosso ver, aquela que melhor se aplica aos objetivos pretendidos neste trabalho. Fundamentalmente os aspectos que envolvem o modelo weberiano resgatado por Habermas (1987b) para análise e explicação dos processos de racionalização e burocratização das sociedades modernas são pertinentes ao estudo do sindicalismo no Brasil. Afinal, ele mesmo diz que “o que uma teoria da sociedade pode proporcionar por si mesma se assemelha ao caráter focalizador de lente” (Habermas, 1987b, p. 542).

A teoria da ação comunicativa de Habermas (1987b) faz uma análise da contemporaneidade que afeta as sociedades modernas ocidentais, mais especificamente do processo de racionalização e de complexificação destas. Esse processo leva a uma dominação da interação (mundo da vida sociocultural fundamentado pela razão comunicativa e regido por normas de validade obrigatória) pelos imperativos sistêmicos provenientes da economia e da administração capitalista moderna (razão instrumental ou racionalidade instrumental).

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Para Habermas (1983), é desses processos que resultam os diferentes estágios do direito e da moral, da delimitação do Eu e das imagens do mundo, da formação da identidade dos indivíduos e do coletivo. E é sobre as estruturas que emergem com a sociedade capitalista que se pode ampliar uma esfera pública consensuada, cujo êxito depende da capacidade do “poder social-integrativo da solidariedade” (da esfera do mundo da vida) em deter o grau de deformação neste agir comunicativo provocado pelos imperativos sistêmicos, representados pelo dinheiro e pela administração. Nesse sentido, parece fundamental compreender o papel do movimento sindical e seu potencial de confrontação na esfera pública com os imperativos sistêmicos.

Contudo, o processo de racionalização teria afetado este mundo do trabalho, bem como suas formas de representação, pela colonização desses espaços com seu estatuto científico, que, de maneira ideologizada, dá um refinamento às formas de dominação tradicionais. Os processos de institucionalização delimitam as formas do agir comunicativo, por meio de legitimação ideológica.

Assim podemos afirmar que, no momento atual, parte do discurso sindical em torno de uma política educacional provém do processo de acumulação e reestruturação do capitalismo contemporâneo, que contempla a implantação de novos métodos de produção e de reorganização do trabalho. Ou seja, os imperativos da reestruturação capitalista também colonizam o âmbito das organizações sindicais, através dos princípios legitimadores que envolvem a participação na política pública de emprego. Vale dizer que a nova configuração do capital e os processos participativos no âmbito da “nova institucionalidade” (campo de negociação) que envolvem esta política pública de emprego parecem, também, testar a capacidade de resiliência3 do movimento sindical. E este movimento, como uma saída para sua

crise, pactua ou adota o consenso introduzindo o pacote de conceitos em sua agenda, visando sua legitimação e perpetuação enquanto representante do conjunto dos trabalhadores.

3 Conforme o Dicionário Houaiss da Língua Portuguesa, o termo se refere à “propriedade que alguns corpos apresentam de retomar à forma original após terem sido submetidos a uma deformação elástica [...] ou a [...] capacidade de se recobrar facilmente ou se adaptar à má sorte ou às mudanças [...] capacidade rápida de recuperação” (Houaiss, 2001, p. 2437).

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Oriundos do âmbito de produção, os novos conceitos presentes no discurso4

dominante sobre a educação geral e profissional ganham reconhecimento público. Constituem-se como imperativos sistêmicos que ganham a dimensão pública através do Estado (disseminador) e colonizam os meios de defesa do agir comunicativo – no caso, as entidades sindicais – com seu estatuto científico. Ou seja, a valorização da educação e da educação profissional surge, nesse contexto, em meio ao fetichismo capitalista generalizado que encobre e mascara o quadro perverso da reestruturação capitalista.

Os pressupostos expressados acima parecem bem apropriados para a compreensão do problema proposto neste trabalho. Permite a elucidação e o entendimento da atuação do movimento sindical no Brasil – na sua concepção, ação e forma de negociação da educação profissional – através dos seus diferentes segmentos representados pelas diferentes centrais sindicais. Cabe ressaltar que muitas dessas posturas e propostas para esse problema podem ser explicadas através da gênese desse movimento e no encadeamento histórico que culmina em tal contexto.

A forma como se institui um modelo de sindicalismo burocrático no Brasil por parte do Estado, fundamentalmente a partir de 30, que legitima as reivindicações da classe operária por meio de mecanismos de dominação e repressão, segundo os interesses das classes dominantes, e a confrontação com o surgimento do novo sindicalismo, no final dos anos 70 e início dos anos 80, são exemplos de aspectos históricos que contribuem para tal entendimento. Porém, há que se ressaltar, desde já, que mesmo este novo sindicalismo não se constituiu como uma força contundente capaz de superar o modelo burocrático.

Os vínculos com o aparelho estatal e a forte burocratização são características de um movimento sindical cuja trajetória esteve marcada pela forte repressão, pouca organização nos locais de trabalho e mecanismos de cooptação pelas classes dominantes, os quais serviram como elementos legitimadores dos diferentes momentos do processo de acumulação do capital no Brasil, via ideário da colaboração de classes. A estratégia preferencial sempre foi a da institucionalização e

4 Discurso que procura vincular os processos educativos às demandas do mercado de trabalho, à adaptação do trabalhador ao novo modelo de produção ou ainda como componente da nova produtividade na luta contra o desemprego (Moraes, 2000).

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reconhecimento da reivindicação dos trabalhadores, sendo essa, em tal contexto, a que exige maior intervenção na política de emprego e no sistema de formação do trabalhador.

É na década de 90 que se consolidam e acirram os processos de racionalização e de burocratização. Como observa Ianni (1996), nesse período há um aprofundamento dos processos de burocratização envolvendo instituições públicas, empresas, sindicatos, igrejas que se organizam cada vez mais com base na razão instrumental segundo os princípios da produtividade, lucratividade, da qualidade e, por que não dizer, da eficácia, como bem coloca Habermas.

A forma totalitária desses processos, que se traduz em concepções e ações no campo educativo, penetra de forma preocupante o seio do movimento sindical, tornando-o um elemento-chave na nova configuração do capital e parte integrante e legitimadora dos novos processos de dominação e de acumulação.

Contudo, Habermas aponta uma alternativa como contraposição à lógica sistêmica (razão instrumental) que coloniza o movimento sindical e as esquerdas de um modo geral, que é a luta pelo fortalecimento do agir comunicativo (razão comunicativa), ou seja, dos processos de integração que compõe o mundo da vida, para fazer frente à penetração cada vez mais contundente dos sistemas regidos por meios como o dinheiro e a administração. Ele propõe uma razão comunicativa ampliada numa esfera pública para fundamentar uma vontade democrática. No entanto, aponta que o problema fundamental reside em como os potenciais auto-organizativos poderão desenvolver-se nessa esfera pública autônoma, onde os imperativos voltados aos valores de uso possam submeter ao seu controle os imperativos sistêmicos. E diz:

“[...] Não consigo imaginar que isto seja possível sem a abolição gradual do mercado de trabalho capitalista e sem um enraizamento democrático radical dos partidos e suas esferas públicas [...]” (Habermas, 1987c, p. 107).

O que Habermas (1987a) espera é que diante dos processos de racionalização, em que imperam os sistemas orientados pela razão instrumental, apareçam atores

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sociais – no caso, ele aponta para os “novos movimentos sociais” – capazes desse enfrentamento no âmbito da esfera pública estruturada nas sociedades burguesas.

Para Habermas (1983), mesmo que nas sociedades modernas se constitua uma identidade reflexiva “fundada na consciência de se ter oportunidades iguais e gerais para tomar parte nos processos de comunicação”, esta se expressa na “forma de uma identidade própria da comunidade dos que formam, discursiva e experimentalmente, o seu saber relacionado à identidade através de projeções de identidades concorrentes entre si, isto é, na memória crítica da tradição ou estimuladas pela ciência, pela filosofia e pela arte” (Habermas, 1983, p. 103).

Portanto, após este contraponto sugerido pela teoria habermasiana, o desafio fundamental deste trabalho foi o de verificar o grau de autonomia possível e as potencialidade deste movimento sindical, a partir do campo em que se discute a questão da educação e da educação profissional, de enfrentamento e contraposição aos processos de monetarização e de burocratização da sociedade dirigida pela razão instrumental.

Assim, com o propósito de responder ao problema aqui proposto, pensou-se em cinco diferentes etapas.

No Capítulo 1, foi feita uma breve construção histórica do sindicalismo no Brasil, sua constituição e formação em diferentes etapas do processo de acumulação do capital, seus vínculos com o aparelho estatal, sua burocratização e os diferentes meios de cooptação pela presença marcante do ideário do espírito de colaboração de classes, pela institucionalização da reivindicação da classe trabalhadora ou mesmo pela repressão às organizações de modo mais abrangente e nos locais de trabalho. A forte presença de tais relacionamentos fez com que nem mesmo o nascimento do novo sindicalismo, no final dos anos 70, os movimentos grevistas da década de 80 e o processo constituinte fossem capazes de superar completamente os limites dessa estrutura sindical. A análise prossegue procurando demonstrar os aspectos da crise do movimento sindical nos anos 90, verificada pela queda do seu poder regulatório e seu isolamento político, decorrentes do processo de reestruturação produtiva e das reformas neoliberais e os novos desafios e demandas no âmbito das políticas públicas de emprego e particularmente na educação e na formação profissional colocadas na esfera pública.

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No Capítulo 2, mesclou-se uma abordagem sobre as mutações na esfera do trabalho com uma sobre os novos mecanismos de dominação do capital sobre o trabalho. Essas transformações na esfera produtiva, com o propósito de reduzir custos e aumentar os lucros, constituem uma resposta do capital à sua crise, e fazem parte de um complexo que engloba uma reorganização política e ideológica que se estende à esfera do Estado através de um conjunto de políticas neoliberais. Ainda nessa etapa analisaremos novos conceitos no campo educativo que emergem deste processo de transformação e que tem sua origem no campo da produção e das novas formas de dominação do capital sobre o trabalho. Conceitos como o de competências e empregabilidade que, carregados de ideologia, além de buscar uma nova atitude mental para ampliar ganhos de produtividade, individualizam e culpabilizam o trabalhador pelo seu desemprego.

No Capítulo 3, realizou-se uma análise da “nova institucionalidade” da política pública de emprego e do Plano Nacional de Qualificação do Trabalhador (Planfor), cuja novidade está no modelo de gestão pública tripartite e paritária na esfera do Conselho Deliberativo do Fundo de Amparo ao Trabalhador (Codefat) e na inclusão de novos atores sociais, sobretudo o movimento sindical, como partícipe. É feita uma análise da estrutura paritária através do seu funcionamento, representatividade, poder regulatório e sua efetividade. Buscou-se também discutir os elementos de natureza conceitual norteadores do Planfor e seus vínculos com o ideário, disseminado ao longo dos anos 90, da “modernização” e da inserção do País no âmbito da economia globalizada. Um entendimento fundamental para os objetivos deste trabalho que visa analisar as convergências do discurso sindical com o do Estado, e presentes no âmbito da política pública e com a lógica do capital.

O Capítulo 4 apresenta a análise do discurso sindical com o propósito de compreender a percepção deste em seus variados segmentos, representados pelas centrais sindicais (CGT, CUT e Força Sindical), relativos às transformações do mundo do trabalho, educação geral e profissional, conceituação, participação no âmbito do Planfor e sobre a nova institucionalidade. Nesta etapa procurou-se verificar as convergências desse discurso, assim como suas mudanças ao longo do período analisado, com o emitido pelo Estado e as confluências com a lógica do capital sendo essas, em nosso contexto, atreladas ao ideário racionalmente planejado do Estado e do capital que visa a inserção do País no jogo da competitividade

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internacional. Buscou-se compreender pelos diferentes discursos a autonomia do movimento sindical frente aos imperativos da reestruturação produtiva confrontados na esfera pública.

Por último, nas Considerações Finais, é apresentada uma síntese do discurso das três centrais sindicais e suas modificações ao longo do período analisado, em seus aspectos mais relevantes da aproximação ou distanciamento com o discurso do Estado e do capital, assim como, também, procurou-se discutir o papel do movimento sindical frente aos limites e possibilidades das negociações na esfera pública, as possibilidades de intervenção no modo de regulação da educação e da educação profissional, nos rumos da reestruturação produtiva, na gestão democrática das políticas públicas e na democratização do próprio Estado.

Procedimentos metodológicos

O empreendimento na fase exploratória da pesquisa recaiu sobre duas fases fundamentais:

Pesquisa documental

Constou de um amplo levantamento de documentos, relativos ao período analisado, em cada uma das entidades, tais como: decisões de reuniões plenárias, resoluções de congresso, bases e diretrizes relativas à política educacional e formativa, materiais de divulgação, publicações.

Entrevistas

Outra parte dos esforços, na fase exploratória da pesquisa, esteve concentrada na realização de entrevistas semi-estruturadas em cada uma das entidades sindicais selecionadas. Essas entrevistas foram coletadas entre janeiro e abril de 2003, tendo por informantes os responsáveis pela gestão e realização dos programas de educação profissional em parceria com o Planfor.

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Seguindo o critério já apresentado no item anterior, tivemos como informantes dois coordenadores técnicos (CUT e FS) e um terceiro que também acumula a função de dirigente político (CGT). No caso específico da CUT, consta também uma entrevista com um ex-dirigente que por muito tempo se ocupou da discussão dentro da entidade.

A coleta das entrevistas ocorreu nas instalações de cada uma das organizações obedecendo a um agendamento prévio. Contudo, alguns aspectos precisam ser ressaltados sobre as condições em que foram coletadas as entrevistas: 1) o agendamento das entrevistas foi difícil em razão dos compromissos e responsabilidades dos informantes, cuja dinâmica de trabalho envolve viagens constantes; 2) foi um período em que todas as entidades também estavam envolvidas nos preparativos dos seus congressos (CUT e CGT) e reunião plenária (FS); 3) o ambiente nas instituições era de muita apreensão e expectativas em relação às possíveis mudanças no direcionamento do Planfor, fundamentalmente nos pontos que envolvem a renovação dos convênios para execução de cursos. Em duas das entidades, vários membros das equipes técnicas e funcionários administrativos contratados para execução do Plano estavam sendo desligados.

Mesmo considerando os fatores acima, o material coletado constitui uma importante fonte para a consecução dos objetivos deste trabalho. Todo o material impresso foi selecionado e classificado, inicialmente, de forma temática com o propósito de facilitar a análise posterior.

Fase de análise dos dados

Encerrada a fase de coleta de dados, passou-se a uma análise aprofundada das entrevistas, de forma repetida e detalhada, através do método qualitativo da “análise de conteúdo” conforme Bardin (1977). Dentro do conjunto de técnicas, a análise de conteúdo é a mais antiga e a mais utilizada, sendo assim descrita pelo autor:

“Funciona por operação de desmembramento do texto em unidades, em categorias segundo reagrupamentos analíticos. Entre as diferentes possibilidades de categorização, a investigação dos temas, ou análise temática, é rápida e eficaz na

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condição de se aplicar a discursos diretos (significações manifestas) e simples” (Bardin, 1977, p. 153).

Para Minayo (1992), a análise de conteúdo está em justamente descobrir os núcleos de sentido que compõem uma comunicação cuja presença signifique alguma coisa para o objetivo analítico visado. Desse modo, ela pode ser encarada como um conjunto de técnicas de análise que visa obter, por meio de procedimentos sistemáticos e objetivos de descrição do conteúdo das mensagens, indicadores quantitativos e qualitativos que permitam a inferência de conhecimentos relativos às condições de produção e recepção dessas mensagens.

Assim, pode-se inferir e compreender aspectos relativos a cultura, mudança de valores, atitudes, etc., pelo conteúdo da comunicação em suas diferentes formas de expressão. Com relação aos objetivos propostos para este trabalho, o material de análise são os documentos emitidos pelas centrais sindicais e as entrevistas coletadas junto aos responsáveis pela execução dos planos de educação profissional.

A proposta metodológica de Bardin apresenta as três seguintes etapas: “pré-análise; exploração do material; tratamento dos dados obtidos e interpretação”. A partir da leitura atenta das entrevistas e levando em consideração os objetivos do estudo e as questões teóricas apontadas, ordena-se e classifica-se o conteúdo do texto final em categorias analíticas (decomposição do texto).

Bardin (1977) propõe um roteiro básico que consiste da: preparação dos dados para a análise; transcrição dos discursos obtidos; ordenação dos dados obtidos através de definição prévia de categorias; classificação dos dados obtidos através de aspectos sobre os quais se deseja analisar o conteúdo; análise com base em núcleos temáticos ou categorias de análise5.

Especificamente no que se refere à análise das entrevistas, como primeiro tratamento adotamos os princípios da pesquisa quantitativa, como forma de verificar a freqüência de determinados conteúdos emitidos pelos sujeitos. Contudo, como se trata de um procedimento de análise qualitativa, demos ênfase ao conteúdo subjacente ao que está sendo manifesto. De acordo com a indicação de Minayo

5 Bardin (1977) aponta duas unidades básicas: a unidade de registro, que se refere aos elementos obtidos através da decomposição do texto; e a unidade de contexto, que significa precisar o contexto do qual faz parte a mensagem.

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(2000, p. 76) nosso intuito foi o de buscar as “ideologias, tendências e outras determinações características dos fenômenos que estamos analisando”.

Seguindo esses princípios, o conjunto de informações coletadas na forma de documentos e entrevistas resultou em três grandes categorias analíticas comuns a todas as centrais, fato que possibilitou uma visão global da percepção de entidade sindical em nosso contexto. Foram elas: visão global sobre o processo de transformações no mundo do trabalho; visão geral sobre a educação e a educação profissional (conceituação); e, finalmente, participação institucional (negociação).

Num segundo momento essas categorias iniciais foram sendo subdivididas ou mesmo reorganizadas, num processo de refinamento da análise do discurso, o que veio a resultar em cinco tópicos comuns a todas as centrais e que permitiram o estudo comparado, proposto como objetivo do trabalho.

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CAPÍTULO 1. O MOVIMENTO SINDICAL NO BRASIL: DESENVOLVIMENTO E CRISE CONTEMPORÂNEA.

Em breves palavras pretendemos demonstrar, nesta etapa do trabalho, à luz dos pressupostos teóricos explicitados na etapa anterior, algumas das fases do desenvolvimento do sindicalismo no Brasil. A preocupação que norteou a construção deste capítulo foi a de apontar como o processo de institucionalização dos sindicatos e, porque não dizer, do conflito de classes veio legitimar o processo de acumulação do capital em diferentes contextos históricos. Entre os principais momentos destacamos o ideário da conciliação de classes presente no Estado Novo (1937) e no regime militar (1964), ou ainda no período populista (1945-64), quando o movimento sindical mesmo utilizando-se da greve como instrumento de luta se vincula à política de massas do nacionalismo e do reformismo.

Desse modo, sem a pretensão de fazer uma abordagem histórica aprofundada do movimento sindical no Brasil – que envolveria várias facetas –, o trabalho que segue busca compreender os aspectos das limitações e os mecanismos de controle das organizações dos trabalhadores que, nos quadros da sociedade capitalista contemporânea, tornam-se mais complexos e sutis.

Nos anos 90 o processo de reestruturação produtiva e um conjunto de medidas neoliberais que se firmam no Brasil representam uma estratégia racionalmente concebida pelo capital de um novo modelo de acumulação que tem como meta promover a inserção competitiva do país no cenário internacional. Esse ideário participa do conjunto de políticas setoriais e públicas, entre as quais destacamos as políticas compensatórias de emprego, incluindo o Plano Nacional de Qualificação (Planfor).

Ao mesmo tempo em que a reestruturação produtiva transforma e fragmenta as bases do movimento sindical lançando-o numa crise marcada pelo enfraquecimento da sua representatividade e poder de pressão, as políticas neoliberais promovem mudanças no papel do Estado – elemento conciliador e controlador dos gastos públicos –, que resultaram na ampliação da esfera pública em torno da gestão das políticas públicas. Surgem espaços de negociação institucional

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entre os quais destaca-se a Política Pública de Emprego, onde está colocada a discussão sobre a educação geral e profissional.

1.1. Industrialização, operários e sindicatos

O primeiro ponto a destacar é o da formação do proletariado, ocorrido a partir dos últimos anos do século XIX, ligado ao processo de expansão da lavoura cafeeira. Até esse período vigoravam as figuras do senhor e do escravo, mas aos poucos vai dando lugar a do patrão e do trabalhador assalariado.

Não cabe aqui uma análise detalhada sobre os fatores que determinaram o surgimento da indústria no Brasil e sua concentração geográfica no vetor sudeste e principalmente em São Paulo. Contudo, como observa Cano (1998), foi a lavoura do café e o surgimento de um complexo cafeeiro que possibilitou o processo de acumulação de capital durante todo o período anterior à crise de 1930. Esse complexo tem como característica o desenvolvimento das relações capitalistas de produção e a formação de um complexo econômico caracterizado por uma rede de serviços e empreendimentos complementares que fomentou um processo de acumulação diversificada principalmente em São Paulo.

Além disso, São Paulo aparece como o espaço privilegiado para o desenvolvimento da indústria no Brasil, pois registrava a existência de relações de produção com base no trabalho assalariado que ocorre de forma concomitante à ocupação do interior pela expansão da malha ferroviária, cujo efeito foi gerar uma rede de cidades interligadas entre si e com a capital facilitadora da integração do mercado regional.

O Rio de Janeiro, que até 1920 respondia pela maior concentração operária do país, pela decadência da sua produção cafeeira e também da do Vale do Paraíba e do sul de Minas Gerais, passa a ser superado pelo estado de São Paulo. Para Fausto (1977) o não surgimento de uma economia capitalista nessas regiões impediu que se continuasse uma das fontes básicas de acumulação industrial; ao mesmo tempo que a crise da região fluminense redundaria no encolhimento do mercado de consumo, agravado com a perda progressiva do mercado paulista.

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Mas é na Região Sudeste, principalmente no eixo Rio–São Paulo, que se consolida a maior concentração operária e industrial do País na primeira metade do século XX. Descreve Simão (1981, p. 20):

“Outro aspecto deste esboço a destacar consiste na distribuição territorial da indústria e da população operária. Neste meio século, a Região sudeste do Brasil vem encabeçando o crescimento industrial do país, contando com mais da metade dos estabelecimentos e da mão-de-obra ocupada. Os censos de 1907 e 1950 registravam, em todo o território nacional, 3 mil a 90 mil estabelecimentos, tocando ao sudeste respectivamente, 51 e 55% daqueles números. Maior tem sido a percentagem do operariado, cabendo à citada região 52% da mão-de-obra arrolada na primeira data e 67% da recenseada na segunda, que montava então a 1.200.000 operários. A concentração da indústria e do proletariado no sudeste apresenta-se mais expressiva, quando se considera que os estabelecimentos, em sua maioria, não se dispersavam por toda região, localizando-se apenas na parte que segue ou ladeia o eixo São Paulo–Rio de Janeiro”.

Uma característica do proletariado de São Paulo, em vista da sua grande importância para o estudo do movimento operário, se refere à questão da composição étnica do contingente de assalariados, no qual distinguem-se, de um lado, estrangeiro e seus descendentes e, de outro, pessoas oriundas da mais antiga população nacional. Pois esse é um dos elementos importantes para análise dos processos de nacionalização da mão-de-obra na indústria durante os governos populistas e seus impactos na organização sindical, que pretendemos abordar mais adiante, fundamentalmente a partir dos anos 40.

Segundo os censos de 1890 e 1940, o número de habitantes do estado de São Paulo passou de 1.384.753 habitantes para 7.180.316 habitantes. “Registrou-se um aumento de 64,8% na década de 1890, que se elevou mais de 100% no primeiro vintênio deste século, caindo para 56,4% no seguinte. A maior quantidade de imigrantes entrada em São Paulo ocorreu entre 1887 e 1900 com 909.417 trabalhadores, chegando a 584.322 entre 1921 e 1934, caindo para 4.737, entre 1941 e 1945” (Simão, 1981, p. 24). A queda verificada no fluxo de imigração pode ser atribuída, principalmente após 1930, à crise da expansão cafeeira, às dificuldades opostas à imigração no período entre guerras, ao excedente de mão-de-obra e aos

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atos governamentais relativos à arregimentação de trabalhadores (Simão, 1981, p. 24).

Muitos imigrantes que entraram no país para trabalhar na cafeicultura não se fixaram na zona rural devido principalmente às próprias condições de trabalho nas fazendas ou às novas oportunidades que surgiam nos centros urbanos. A constante mobilidade dos colonos pode ser considerada como uma forma de resistência à opressão nas fazendas. Já em 1920, os 200 mil imigrantes do município de São Paulo, contando metade de italianos, representavam 1/3 da população local e 1/5 dos estrangeiros existentes no estado.

O operariado de origem estrangeira irá predominar nos quadros das indústrias paulistas até a década de 1930, quando o governo federal passa a tomar medidas protetoras da mão-de-obra nacional, que é a lei dos 2/36 que, ao lado das medidas

restritivas do período entre guerras, irá provocar transformações neste perfil dos trabalhadores. As novas políticas de arregimentação da mão-de-obra coincidem com o incremento da indústria e da mobilidade demográfica interna. Com isso, verificou-se particularmente depois da Segunda Guerra Mundial um crescimento da participação da mão-de-obra nacional nas atividades urbanas assalariadas. Esse movimento é observado tanto no âmbito do estado de São Paulo como também no de outros estados. “Embora sempre se registrasse a entrada de trabalhadores de outros Estados, esta foi insignificante até a década de 1920, quando, em crescendo, suplantou a imigração propriamente dita no decênio de 1930” (Simão, 1981, p 30).

Embora tenha se desenvolvido dentro de uma região dominada pela cafeicultura, ao longo do processo a indústria teve sua posição alterada dentro do quadro econômico geral, transitando, em decorrência da queda do comércio internacional, a uma posição relevante no centro da estrutura econômica. Esse é um resultado de pressões da burguesia industrial junto ao governo para elevação das tarifas aduaneiras, o que impactou, nos anos 20, em mais “concentração e centralização do capital, justificado por permitir o barateamento da produção e a massificação do consumo” (Heloani, 1997, p. 74).

6 Decreto n. 1942, de 12-12-1930 –segundo ela todas as empresas urbanas devem contar com a referida taxa de brasileiros no conjunto de seu pessoal

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Ao longo da década de 20, o parque industrial se moderniza com a importação de máquinas e implementos. Contudo, observa Heloani (1997) que os investimentos em capital fixo não elevaram a produtividade. E exemplifica com o caso da indústria têxtil “cujo o número de teares e fusos cresceu na ordem de 40%, enquanto a produção evoluiu aproximadamente 3%” (Heloani, 1997, p. 73). Era necessário buscar fundamentação para efetivar a dominação e disciplinar a mão-de-obra, dentro e fora do espaço fabril, com os princípios da conciliação de classes.

O fordismo, em virtude do seu apelo de intensificação da gestão disciplinar do trabalho e da verticalização da produção, foi utilizado como suporte ideológico desse modelo de concentração de capital. Pois,

[...] adequou-se muito bem aos objetivos de elevar o controle sobre o trabalho por parte das indústrias paulistas. A disciplina dos ritmos de trabalho poderia controlar o desempenho do trabalhador em virtude da mecanização dos meios de transportes entre um posto de trabalho e outro.

[...] outro aspecto de interesse em relação ao fordismo consistia no disciplinamento da força de trabalho fora do espaço da fábrica. As experiências de controle sobre o lazer dos trabalhadores, como o

dopolavoro na Itália, representavam uma alternativa interessante

de dominação sobre as atividades políticas após a jornada de trabalho. Boas leituras, jogos agradáveis, comedimento moral e assistência social deveriam ser os mecanismos de docilização e educação dos operários” (Heloani, 1997, p. 74).

É interessante verificar que, da mesma forma que nos Estados Unidos, onde as experiências fordistas não admitiam uma legislação trabalhista, a burguesia paulista tem um posicionamento contrário à introdução de uma legislação trabalhista em 1926. Porém, em razão das inúmeras pressões do proletariado, essa burguesia abandona a “via norte-americana (Estado liberal) para adotar as experiências italianas e alemãs (Estado corporativista) [...]”, conforme um ideário que orientava a sociedade para o “bem-comum” estruturado com base no taylorismo e na racionalização alemã (Heloani, 1997, p. 74-5).

Os aspectos do quadro econômico e demográfico do processo de industrialização contribuíram com elementos indicadores dos processos que envolvem o movimento operário e o sindicalismo neste contexto. Assim, conforme

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“tenham sido as características quantitativas e qualitativas do parque industrial, variaram o grau e forma de vinculação dos assalariados no plano econômico. Ainda acompanhando a lenta ascensão do setor urbano na estrutura econômica, o sindicato de empregados, o patronato e o Estado alteraram suas posições recíprocas em face do próprio processo de industrialização” (Heloani, 1997, p. 34).

Os processos que envolvem a mobilização e organização dos trabalhadores (o nascimento das organizações sindicais de trabalhadores) vinculam-se, num primeiro momento, a duas posições antagônicas: a obtenção de melhorias das condições de vida material representada pelas concepções mutualista e socialista; ou a transformação do sistema de relações de produção presentes na concepção anarquista. Os empresários, por outro lado, atrelam a questão do desenvolvimento social ao progressivo desenvolvimento da indústria, exigindo do Estado medidas de proteção.

No período situado até 1930, cujo marco é a Revolução de 30, o Estado veio dando apoio e incremento à cafeicultura suprindo-a de força de trabalho e controlando a produção a fim de valorizar o produto no mercado externo. A partir dessa data, com queda do comércio mundial fundamentalmente no período entre guerras, adota medidas para incrementar e incentivar a indústria ampliando sua participação na economia. O Estado, além de ter que responder pelas demandas do setor agrário, passa a assumir as funções de planejador, controlador e de empreendedor das atividade industriais. Isso impactou em mudanças significativas também na forma de exercício desse poder, que passa a contar com estruturas racionalmente concebidas para um novo modo de acumulação.

Simão (1977, p.38) coloca que se deve considerar que esse fato representou, nas condições do atual período econômico, não só a dilatação do poder já anteriormente apropriado pelo Estado, mas, “principalmente, o desenvolvimento da nova concepção do exercício deste poder, emergente na última fase daquele período industrial”.

Contudo é preciso destacar que as reivindicações das normas de regulação do trabalho resultaram na ampliação da própria experiência social dos assalariados no processo de crescimento da economia urbana. Muitos dos estabelecimentos industriais não eram especialmente construídos para tal finalidade e estavam

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instalados em locais adaptados, com falta de condições higiênicas e sanitárias e uma regulação dos salários e da jornada de trabalho, sem se falar da extrema exploração do trabalho de mulheres e crianças.

“[...] as queixas referentes às condições de trabalho provinham, na sua grande maioria, das mulheres que representavam uma parcela significativa do contingente de trabalhadores desse segmento industrial (58%). Tal fato não se dava por acaso, pois as mulheres, juntamente com os menores, constituíam o setor mais desorganizado do mercado de trabalho [...]” (Heloani, 1997, p. 78).

Cabe aqui ressaltar que, antes de discutir, de forma aprofundada, as questões relativas às condições de trabalho nos estabelecimentos, será tarefa deste estudo refletir como, dessas condições, decorrem a participação do Estado e do sindicato.

Simão (1981) observa que a remuneração dos trabalhadores era feita dentro da conjuntura do mercado de trabalho, segundo os cálculos de cada empregador, sem que fosse estabelecido um salário mínimo por força de lei, ou mesmo regras de proteção ao trabalho nas fábricas. Ao analisar os primeiros conflitos coletivos este autor coloca que:

“O crescimento da indústria e dos serviços de transporte, o aumento da população assalariada e sua relativa concentração em alguns pontos do Estado, as condições de trabalho e de vida material do proletariado concorriam para encaminhar crescentes parcelas de trabalhadores a novas experiências coletivas de ação econômica-social. Dentre elas destacam-se os ensaios no sentido de levar a greve a transpor o âmbito do estabelecimento para o setor profissional e do quadro econômico geral. Se de um lado se davam conflitos restritos até mesmo de uma seção da empresa, de outro, ocorrem greves generalizadas, que constituíram as primeiras experiências no plano de organização desse tipo de ação coletiva” (Simão, 1981, p. 99).

A questão social relacionada às condições de vida dos trabalhadores urbanos ganha dimensão pública muito em função dos movimentos grevistas entre os anos 1917 e 1919. Em julho de 1917 verificou-se a paralisação total de todas as atividades econômicas da capital de São Paulo e de algumas localidades vizinhas, após o que o movimento ganha dimensões e atinge o interior do estado orientado pelo Comitê de

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Defesa Proletária (CDP). Ao mesmo tempo, no Rio de Janeiro, cerca de 50 mil operários entram em greve e fazem passeatas pela cidade entrando em choque com tropas policiais.

Na medida em que a indústria começa a ganhar importância evidencia-se uma nova situaçãode desprivatização e institucionalização das relações de produção, que, como já dissemos, partiu da própria experiência social dos trabalhadores no processo de crescimento da economia urbana, o que para tanto se faz necessário compreender as diferentes concepções e diferentes projetos ideológicos que precederam a 1930.

1.2. Diferentes correntes do movimento sindical até 1930

A apregoada hegemonia do anarquismo nos meios operários é contestada por Carone (1984). Segundo ele, a hegemonia no movimento operário até os anos 20 era mantida pelas diversas modalidades de socialismo reformista, pouco discutido, mas fundamental para entendermos o sucesso de Vargas junto ao operariado. “A presença desse contingente organizado e a pressão da massa operária visando a usufruir as garantias estipuladas pela lei ajudam a entender a impossibilidade vivida pelos setores mais combativos em manter as entidades fora do sindicalismo oficial” (Frederico, 1994, pp. 63-4). Destacam-se aí também as correntes conservadoras católicas que muito influíram também nos meios operários.

As várias correntes presentes no movimento operário até a década de 1930 demonstram que as lutas e conflitos não ocorriam de forma linear. A política de cooptação do Estado e as divergências da classe operária quanto às formas de luta nos dão a idéia de que o conflito capital/trabalho estava baseado em estratégias distintas as quais procuraremos resgatar nesta etapa do trabalho.

É nos primeiros anos da industrialização que surgem várias correntes sindicais no Brasil, principalmente nos grandes centros industriais como Rio de Janeiro e São Paulo (até 1930) e também as concepções que seriam hegemônicas com a criação dos mecanismos de controle sindical do Estado a partir de então.

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Como aponta Fausto (1977), desde os fins do século XIX até os anos 1920, três correntes tiveram influência no movimento operário: o anarquismo, o socialismo reformista e o trabalhismo.

Socialismo reformista, positivismo e trabalhismo

Essas correntes, principalmente os trabalhistas, prevaleceram dos fins do século XIX ao início do XX, cedendo, em seguida, lugar para o anarquismo. Porém, a atuação e o discurso dos trabalhistas têm características bastante significativas, a saber: uma política de colaboração de classes; conquista de direitos; concordância com a dependência do Estado e a presença de alguns setores da burguesia propensos a uma aliança com a classe operária. Esses empreenderam diversas tentativas para a formação de um Partido Operário mas não obtiveram êxito, principalmente em função do papel secundário da indústria na economia no período pré-30. Eram correntes que combatiam as idéias anarquistas.

O estudo de Campos (1988) mostra que muitas dessas concepções brotaram das diferentes posições no seio da própria burguesia industrial, marcada, de um lado, por aqueles que defendiam a repressão sistemática ao movimento operário, e, de outro, pelos trabalhistas e reformistas que defendiam a regulação através da criação de uma legislação social e trabalhista. A posição dos trabalhistas, na Câmara dos Deputados, girava em torno das preocupações e possibilidade da contenção e esvaziamento das agitações operárias.

As propostas dos trabalhistas e reformistas residiam sobre a regulamentação do trabalho da mulher e do menor, jornada de oito horas, criação de creches nas indústrias, criação de um órgão regulador das questões trabalhistas como o Departamento Nacional do Trabalho, a regulamentação do direito de greve, etc. O propósito era bastante claro, o de sanar a questão social e ao mesmo tempo desmobilizar o operariado mais radical.

Campos (1988, p. 65) destaca que “o fundamental a reter do discurso dos trabalhistas na câmara é que ele abre um papel de mediação ao Estado e, como mediador, de agente histórico. Um agente que teria a função de solucionar as tensões

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existentes entre o capital e o trabalho, isto é, retirar do recinto da fábrica e dos bairros operários, os conflitos mais gritantes”. E, mais adiante, a autora continua:

"De modo geral, a protelação da adoção da legislação trabalhista, cuja a implantação vai sendo ensaiada lentamente pela década de vinte até sua imposição, juntamente com a estrutura sindical corporativista dos anos Vargas, foi alimentada por um Estado altamente repressivo e uma burguesia que se constituía de forma forte e ágil o suficiente para criar estratégias capazes de desbaratar sistematicamente as manifestações organizadas dos trabalhadores” (Campos, 1988, p. 67).

Importante também foi a influência dos positivistas (positivismo), que logo após a Proclamação da República já formulavam propostas de direitos sociais, em oposição ao “liberalismo do século XIX, basedas no idealde relações de suposta igualdade entre o capital e o trabalho confrontadas no mercado(Fausto, 1977).

No mesmo ano em que se instaurava a República, no mês de dezembro de 1889, o Apostulado Positivista formularia e encaminharia ao governo provisório um projeto com várias considerações e propostas a cerca da melhoria das condições dos operários. Fausto (1977, p. 50) diz que,

“[...] Precedido de uma série de considerações acerca do salário, das relações entre capital e trabalho, o projeto propunha entre outros pontos: a suspensão do pagamento por tarefa e a divisão do trabalho em duas partes, sendo uma fixa e outra variável de acordo com a produtividade; sete horas de trabalho diário, descanso dominical e nos dias de festa nacional, além de quinze dias de férias anuais; salário enfermidade correspondente à parte fixa das remunerações; garantia de permanência no emprego após sete anos de serviço, permitida a demissão somente através de processo que demonstre infração prevista no regulamento e para a qual comine tal pena; aposentadoria por invalidez ou por atingir mais de 63 anos [...]”.

Outras propostas também constam do projeto que não teve andamento e foi motivo de divergência entre o apostulado e o governo. Conforme salienta Fausto (1977) os positivistas viriam a perder terreno na esfera ideológica e importância política ao longo da Primeira República, ficando restritos a pequeno grupo do apostulado.

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A Igreja católica também se apresentou como uma força conservadora junto ao movimento operário, pois, na fase inicial da industrialização, visando contribuir para a preservação da ordem social e do privatismo patronal, no estabelecimento das condições de trabalho, adotou o mutualismo como forma sucedânea da greve para propiciar melhorias de condições de vida aos trabalhadores, reivindicando melhorias das condições de trabalho através de acordos pacíficos com o patronato e da aprovação de leis sobre a matéria e rejeitando a técnica dos conflitos coletivos de trabalho. A. Simão (1981, p. 110) nos traz um trecho da deliberação do Congresso do Centro Operário Católico Metropolitano de 1920, onde se comunicava como sendo contrário a uma greve ocorrida naquela ano:

“O Centro Operário Católico Metropolitano, em assembléia geral realizada com a presença de representantes de todas as comissões distritais e centros confederados, votou a seguinte moção: os operários católicos hipotecam incondicional apoio a todas as classes conservadoras, na emergência atual, e declaram-se ao lado do governo para a repressão do anarquismo, protestando contra as ligas que decretaram pseudo greve de solidariedade com elementos perigosos que só prejudicam o operariado”.

A Igreja, contudo, irá logo em seguida apoiar uma maior intervenção do Estado nas relações de trabalho, chegando a influenciar nas medidas e no ideário que se fizeram presentes na Era Vargas. A influência das encíclicas Papal Rerum Novarum em 1891 e a Quadragésimo Anno (1931) ficam bastante evidenciada no conjunto de medidas adotadas no período pós-307 com a acentuação da presença e

interferência do Estado na produção econômica e na relação capital trabalho. Farias (1998) aponta que a encíclica Rerun Novarum foi lançada num contexto de declínio da concepção liberal, quando a Igreja Católica passou a abandonar sua postura anterior de recusa do mundo moderno iniciando uma aproximação com o Estado e as instituições civis, “organizando um novo modo de ser, baseado na convivência, na divisão de funções e na colaboração com estas instituições. Já a encíclica Quadragésimo Anno, que ocorre num contexto de maior intervenção do Estado, vê este com um papel cada vez mais ativo, a tudo ordenando e controlando, uma proposta organicista e corporativa que abre brecha para a concepção fascista. O

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autor analisa o documento colocando que este prega a completa reformulação das instituições estatais orientadas pelo liberalismo (Farias, 1998, p. 169).

Cabe aqui ressaltar que, segundo o autor, o documento irá dizer que o Estado, orientado pelo liberalismo, aboliu as organizações intermediárias da sociedade e que seria preciso refundá-las, para que auxiliassem o Estado na tarefa de ordenação social. O interessante é que para a igreja estas instituições não deveriam ser absorvidas pelo Estado, que precisariam ter vida livre. No entanto, caberia àquele estabelecer claramente uma ordem hierárquica entre as várias instâncias organizativas, garantindo sua autoridade. Com isso, deveria o “Estado atender ao seu primeiro objetivo no mundo moderno, ou seja acabar com a luta de classes ao estabelecer uma harmonização entre as diversas profissões, numa política de colaboração de classes” (Farias, 1998, p. 173).

Alguns “elementos estranhos” tiveram presença constante e também tentaram organizar o operariado: os militares. A atuação desses grupos atinge seu clímax com a ruptura de Prestes e o posterior surgimento de facções tenentistas integradas na Aliança Nacional Libertadora (ANL). A disposição era de tornar a classe operária um aliado ou mesmo um ator do jogo político ligado à situação específica das Forças Armadas e de setores da classe média no sistema de dominação oligárquica (aliança para baixo).

Essas correntes limitadas ao ideário da colaboração de classes e de proteção do Estado, sobretudo os trabalhistas, predominaram no Rio de Janeiro, o que, segundo Fausto (1977), se explica por duas circunstâncias: pela maior presença de nacionais na composição de classe, mais receptivos a um tipo de política que se coadunava com as velhas relações tradicionais e paternalistas; e pelo papel de alguma importância correspondente ao núcleo estatal de serviços, em especial na área de navegação e ferrovias. O “campo de possibilidades de ação do tipo trabalhista era relativamente maior que no setor industrial” (Fausto, 1977, p.52) O autor destaca, como já anotamos, a presença de setores médios mais contestadores e a presença de trabalhadores de setores estratégicos da própria relação entre trabalhadores e Estado. Reivindicações operárias onde predominava o “interesse público” (Fausto, 1977, p. 52). Havia maior possibilidade de se obter aumentos salariais junto ao Estado, apesar da pouca flexibilidade, do que junto aos patrões do setor industrial que se apresentavam mais inflexíveis.

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“O Estado oligáquico deixou apenas uma estreita faixa de possibilidades de obtenção de algumas vantagens corporativas: ao mesmo tempo, tendeu sempre a adotadar uma atitude de força quando a colaboração se rompia e as greves surgiam em uma área estratégia do setor agro-exportador” (Fausto, 1977, pp. 52-3).

Precursores da burocracia sindical, os trabalhistas chegaram a participar do I Congresso Operário (1906), onde predominaram as posições anarquistas, e, defendendo uma política de colaboração da classe operária com outros setores sociais, lançaram propostas de apoio eleitoral a candidatos reformistas e manifestaram também muitas ressalvas a eficácia das greves como estratégia de luta. Os trabalhistas chegaram a apoiar a candidatura de Hermes da Foncesca à Presidência da República em 1909 e a organizar um Congresso Operário em 1912, que ficou conhecido como o “congresso pelego” pelo conjunto de posições, pela ausência dos anarquistas e pela presença de “elementos estranhos” à classe operária a exemplo do tenente Mário Hermes Filho, filho do presidente da República, e que, eleito deputado pela Bahia, se dizia defensor dos interesses dos proletários no Congresso Nacional. O “congresso pelego” foi liderado por Pinto Machado e teve como objetivo elaborar um conjunto de propostas para que o deputado apresentasse ao Parlamento. Houve também a pretensão, por parte desses grupos, de se criar a Confederação Brasileira do Trabalho (CBT), para a qual o próprio Pinto Machado foi eleito secretário.

Como assinala Fausto (1977), o conteúdo das reivindicações de 1912 coincidia em muitos pontos com o das reivindicações dos anarquistas: oito horas de trabalho, limitação do trabalho de mulheres e menores, descanso semanal, indenização por acidentes, pagamento por semana, melhoria das condições de higiene. Contudo, as posições em torno dos objetivos da organização dos trabalhadores e dos instrumentos para conquistar as reivindicações eram bastante distintas.

As posições do congresso pelego começam a marcar postura de rejeição às teses da ação da classe operária para encerrá-la no campo corporativo, da melhoria econômica, da elevação social, intelectual e moral da classe, não se ocupando de doutrinas “internacionalistas, antimilitares e anticlericais, nem do problema da organização da propriedade”(Fausto, 1977, p.56). Para esses a conquista dos direitos

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