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A educação musical como prática educativa emancipatória:

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Academic year: 2022

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José Sérgio Dias

A educação musical como prática educativa emancipatória:

uma análise da Base Nacional Comum Curricular do Ensino Médio

MESTRADO EM EDUCAÇÃO: CURRÍCULO

SÃO PAULO - SP 2022

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A educação musical como prática educativa emancipatória:

uma análise da Base Nacional Comum Curricular do Ensino Médio

Dissertação apresentada ao Programa de Pós- Graduação em Educação: Currículo da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, como exigência parcial para obtenção do título de Mestre em Educação: Currículo, sob a orientação da Profa. Dra. Ana Maria Saul

SÃO PAULO - SP 2022

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FICHA CATALOGRÁFICA

DIAS, José Sérgio. A educação musical como prática educativa emancipatória:

uma análise da Base Nacional Comum Curricular do Ensino Médio. 89 f.

Dissertação (Mestrado em Educação: Currículo) – Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, São Paulo, 2022.

Orientadora: Prof.ª Dra. Ana Maria Saul.

Palavras-chave: educação musical; Base Nacional Comum Curricular; Paulo Freire; práticas de ensino musical; Ensino Médio.

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A educação musical como prática educativa emancipatória: uma análise da Base Nacional Comum Curricular do Ensino Médio

Dissertação apresentada ao Programa de Pós- Graduação em Educação: Currículo da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, como exigência parcial para obtenção do título de MESTRE em Educação: Currículo.

Aprovada em: _____/______/_______

BANCA EXAMINADORA

___________________________________

___________________________________

___________________________________

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Aos estudantes e aos educadores que, cotidianamente, buscam reinventar a escola pública com ousadia e esperança.

Ao mestre Paulo Freire, por inspirar e guiar meu percurso formativo como educador e pesquisador tendo em vista a reinvenção e experimentação de seu legado na atualidade.

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O presente trabalho foi realizado com apoio da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior – Brasil (Capes) – Código de Financiamento 001.

Processo nº 88882.462020/2019-01

This study was financed in part by the Coordenação de

Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior – Brasil (Capes) – Finance Code 001.

Process nº 88882.462020/2019-01

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A Deus, pela vida e pela capacidade de recriar amorosamente o mundo.

À Profª. Drª. Ana Maria Saul, pela sua grande capacidade de compartilhar conhecimentos, estímulo e confiança em mim durante o curso e a orientação desta dissertação. Sua dedicação e exemplo de educadora que vive o que ensina servem de inspiração e encorajamento para levar adiante o legado freireano, esperançando o futuro.

À Profª. Drª. Marina Graziela Feldmann e à Profª. Drª Marta Regina Bruno, pelas valiosas contribuições na qualificação deste trabalho.

Às professoras e professores do Programa de Pós-Graduação em Educação:

Currículo, pelos saberes compartilhados e estímulos.

À amiga de mestrado, Raylane, pela presença carinhosa, atenta e disponível em todos os momentos deste percurso, sobretudo os mais desafiadores.

Ao amigo Raimundo, por ter me impulsionado a dar continuidade aos estudos acadêmicos no Programa de Educação: Currículo, abrindo caminhos em mais uma fase de qualificação profissional.

Ao professor Hugo, pela generosidade em partilhar sua experiência de educação musical que inspirou e viabilizou esta dissertação.

Aos colegas de mestrado pelos momentos de convivência, partilha e conhecimento.

Aos meus pais, José Claudio e Jovina, pela vida e cuidado incondicional. À minha irmã, Gabriela, pelo apoio constante.

A todos, que direta ou indiretamente colaboraram com o meu trabalho.

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“Na verdade, não estou no mundo para simplesmente a ele me adaptar, mas para transformá-lo; se não é possível mudá-lo sem um certo sonho ou projeto de mundo, devo usar toda possibilidade que tenha para não apenas falar de minha utopia, mas para participar de práticas com ela coerentes.”

Paulo Freire

“Se a música não produz carros mais velozes, ela colabora na formação de cabeças pensantes e de indivíduos mais sensíveis à sua condição humana.”

Maria de Lourdes Sekeff Zampronha

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A presente pesquisa analisou a proposta da linguagem artística Música no componente curricular Arte, expresso na Base Nacional Comum Curricular do Ensino Médio (BNCC-EM), tomando como crivo crítico a pedagogia freireana - que tem no horizonte a humanização e a construção de uma sociedade mais justa, democrática e solidária. Paulo Freire, patrono da educação brasileira, é a referência desta pesquisa.

Com abordagem qualitativa, adotamos como procedimentos de investigação a pesquisa bibliográfica e documental, bem como a realização de entrevista semiestruturada. Para responder à questão: Como construir práticas de ensino musical emancipatórias apesar da prescrição expressa na Base Nacional Comum Curricular para o Ensino Médio de um paradigma neotecnicista?, além da análise de documentos, foi apresentado um caso ilustrativo que demonstrou uma prática de educação musical numa escola da rede pública estadual de ensino da cidade de São Paulo. Buscou-se compreender como essa experiência contribuiu para uma educação humanizadora com base nas categorias: diálogo, autonomia e criatividade, conceitos presentes na pedagogia de Paulo Freire, apontando possíveis caminhos para a reorientação de práticas de educação musical nesta etapa da educação básica. Os resultados obtidos demonstraram que a contribuição da música, pautada no diálogo e na valorização da autonomia do educando, auxiliou o desenvolvimento crítico dos estudantes, suscitando neles uma forma ativa, consciente e sensível de estar no mundo. Esta dissertação demonstra a necessidade da arte musical como elemento indispensável para a construção de uma educação emancipatória, comprometida com a transformação do ser humano.

Palavras-chave: educação musical; Base Nacional Comum Curricular; Paulo Freire;

práticas de ensino musical; Ensino Médio.

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This research analyzed the proposal of the artistic language Music in the curricular component Art as described in the Brazilian Common Core Standards for High School.

The analysis was carried out from a critical perspective based on the Freirean pedagogy, which has as its goal the humanization and the construction of a fairer, democratic and solidary society. Paulo Freire, patron of Brazilian education, is the reference for this research. With a qualitative approach, we adopted bibliographic and documentary research as well as semi-structured interviews. In order to answer the question: How to build emancipatory music teaching practices despite the prescriptive orientation and neotechnicist perspective of the Brazilian Common Core Standards for High School?, in addition to the document analysis, we presented an illustrative case which demonstrated a musical education practice taken place in a public school in the city of São Paulo. We sought to understand how this experience contributed to a humanizing education based on the categories: dialogue, autonomy and creativity, concepts present in Paulo Freire's pedagogy, pointing out possible ways for the reorientation of musical education practices at this level of basic education. The results showed that the contribution of music based on dialogue and the appreciation of the student's autonomy helped students' critical development, providing them with an active, conscious and sensitive experience in the world. This dissertation demonstrates the need for musical art as an indispensable element for the construction of an emancipatory education, committed to the transformation of the human being.

Keywords: musical education; Brazilian Common Core Standards for High School;

Paulo Freire; music teaching practices; High School.

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APRESENTAÇÃO ... 13

INTRODUÇÃO ... 15

1 A EDUCAÇÃO MUSICAL NA BASE NACIONAL COMUM CURRICULAR DO ENSINO MÉDIO: (DES)CONTINUIDADES ... 22

1.1 O ensino de música na educação básica: uma breve trajetória ... 22

1.2 O percurso da BNCC – As bases da base ... 26

1.3 O lugar da Arte e da Música na BNCC ... 30

1.4 Implicações da BNCC na formação e na atuação dos professores de Arte/Música ... 35

2 A EDUCAÇÃO MUSICAL COMO DIMENSÃO DA HUMANIZAÇÃO ... 40

2.1 Educação bancária ou humanizadora? ... 40

2.2 O papel humanizador da arte na educação ... 42

2.3 A educação musical emancipatória pressupõe o diálogo ... 47

2.4 A educação musical emancipatória promove a autonomia ... 50

2.5 A educação musical emancipatória requer criatividade ... 51

2.6 O educador como artista ... 53

3 REIVENTANDO A EDUCAÇÃO MUSICAL NA PERSPECTIVA FREIREANA ... 56

3.1 O diálogo como condição para a construção de conhecimento ... 59

3.2. A autonomia como exercício crítico permanente ... 62

3.3. A criatividade como forma ativa, consciente e sensível de estar no mundo ... 64

CONSIDERAÇÕES FINAIS ... 67

REFERÊNCIAS ... 71

APÊNDICE A ... 80

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Figura 1 – Trama conceitual freireana de uma educação emancipatória...47

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ABdC Associação Brasileira de Currículo

ABEM Associação Brasileira de Educação Musical

ANPED Associação Nacional de Pós-graduação e Pesquisa em Educação BDTD Biblioteca Digital Brasileira de Teses e Dissertações

BID Banco Interamericano de Desenvolvimento BNCC Base Nacional Comum Curricular

CEB Câmara de Educação Básica (CEB) CNE Conselho Nacional de Educação

DCNEM Diretrizes Curriculares Nacionais do Ensino Médio EM Ensino Médio

FAEB Federação de Arte-educadores do Brasil FLADEM Fórum Latinoamericano de Educação

IDEB Índice de Desenvolvimento da Educação Básica IMSJT Instituto Meninos de São Judas Tadeu

LDB Lei de Diretrizes e Bases Nacionais MEC Ministério da Educação

OCDE Organização para Cooperação de Desenvolvimento Econômico PCN Paramentos Curriculares Nacionais

PISA Programa Internacional de Avaliação de Estudantes PNE Plano Nacional de Educação

SEDUC Secretaria da Educação do Estado de São Paulo SEMA Superintendência de Educação Musical e Artística

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APRESENTAÇÃO

No processo de aprendizagem, só aprende verdadeiramente aquele que se apropria do aprendido, transformando-o em apreendido, com o que pode, por isto mesmo, reinventá-lo; aquele que é capaz de aplicar o aprendido- apreendido a situações existenciais (FREIRE, 1983, p. 16).

O interesse pelo tema de minha dissertação surgiu, primeiramente, por meio do questionamento sobre o ensino-aprendizagem de Arte no Ensino Médio, ainda durante meus tempos de estudante na escola pública. Naquele momento, entre os anos 2005 a 2008, em minha experiência, percebia que o ensino de música estava praticamente ausente do currículo praticado e, quando aparecia, era subordinado a um aspecto meramente utilitário e acessório, sem vinculação com a vida.

Nesse mesmo período, deu-se meu encontro com a música pela participação no grupo de cantores e instrumentistas que animavam as celebrações litúrgicas numa igreja católica localizada na periferia da cidade de São Paulo. Até então, não sabia tocar nenhum instrumento ou entoar uma melodia. Aos poucos, fui aprendendo as primeiras notas e percebendo o valor da música ao estabelecer novas relações humanas.

Assim, ao cursar o Ensino Médio, sentia a ausência da música nas aulas de Arte e me questionava sobre como eu poderia contribuir nesse aspecto, de modo que a experiência vivida na igreja pudesse ser concretizada na sala de aula e aplicada a situações existenciais. Esse desejo me impulsionou a escolher ser educador e a ingressar num curso de formação de professores.

Após ter concluído o curso de licenciatura em Letras, comecei a atuar no Ensino Médio na Rede Pública Estadual de ensino. Em minha prática docente cotidiana, fui aprendendo, dia após dia, por meio da relação com os educandos, qual era o efetivo papel do educador para a superação das situações-limite enfrentadas por eles, bem como suas necessidades concretas, buscando promover um olhar crítico sobre elas.

Além disso, procurei perceber suas demandas e refletir sobre como a Arte poderia contribuir na emancipação dos jovens para “ser mais”, percebendo a força hegemônica do ensino tecnicista onde, muitas vezes, a dimensão humana e transformadora da educação ficava em segundo plano. Nesse percurso, identifiquei a dificuldade de educadores e educandos em trabalhar a linguagem musical dentro da área do conhecimento Linguagens e suas tecnologias, prescrito na Base Nacional Comum Curricular (BNCC).

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Dessa forma, ingressei no curso de licenciatura em Música a fim de aprimorar meus conhecimentos na área e de atuar nos diversos contextos culturais e na comunidade. Essa experiência acadêmica me fez enxergar novas perspectivas para o ensino da música como prática educativa transformadora, fazendo com que os estudantes participem do mundo de forma crítica.

No mestrado em Educação: Currículo na PUC/SP, deu-se meu encontro mais sistematizado com o educador Paulo Freire. Durante as aulas, pude contemplar a grandeza de seu pensamento e, a partir dele, ressignificar toda a minha prática pedagógica na busca de reinventar seu legado na atualidade. Senti-me impulsionado a concretizar uma possível mudança do rumo da educação básica brasileira valorizando a Arte e, mais especificamente, a Música em suas dimensões artística, cultural, social e política.

Desse modo, almejo com esta dissertação aprofundar as concepções de educação musical no quadro da educação crítica, contribuindo com reflexões que possibilitem a construção/reconstrução de uma prática de ensino da música capaz de formar educandos criativos e críticos.

Além disso, pretendo fazer indicações para a formação inicial e continuada dos professores, de modo que eles possam trabalhar na direção da reorientação da educação musical nas propostas curriculares e nas escolas.

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INTRODUÇÃO

Uma das funções mais importantes da música é ser guia da evolução da humanidade, em permanente interação com o meio, o indivíduo, a comunidade (ZAMPRONHA, 2007, p.171).

A presente pesquisa, nomeada A educação musical como prática educativa emancipatória: uma análise da Base Nacional Comum Curricular do Ensino Médio, realizou-se ao longo do curso no Programa de Pós-Graduação em Educação:

Currículo, na Pontifícia Universidade de Católica de São Paulo.

Diante das rápidas transformações enfrentadas pela sociedade brasileira em todas as áreas, em especial na educação, surge a necessidade da compreensão da música e de seus processos de ensino e aprendizagem tendo em vista seu importante papel na formação do ser humano.

Durante as últimas décadas, registra-se um aumento significativo de estudos e pesquisas que versam sobre a importância da arte e da música na escola, promovendo reflexões sobre seus modos de implantação, de seu ensino e de sua prática.

É bastante visível que, mesmo que a literatura em Educação tenha disposto de vários referenciais sobre a temática da educação musical, são percebidos poucos avanços no nível de qualidade do ensino-aprendizagem dos estudantes, bem como na reflexão dos educadores sobre suas práticas, tendo em vista a formação de indivíduos responsáveis por si e pelos outros, livres e autônomos para atuarem de forma crítica no mundo.

Desta forma, colocamos em realce a educação musical na educação básica que, ligada aos hábitos, condutas e visões de mundo da sociedade, requer constante reflexão e discussão, sobretudo para que se compreenda o seu lugar primordial no sistema educacional e sua potencialidade como ampla ferramenta de conhecimento e transformação do ser humano.

As legislações que acompanham o desenvolvimento do sistema educacional brasileiro, sempre atreladas ao contexto histórico, político e econômico, permitem compreender a multiplicidade e complexidade da educação musical para propor o debate acerca de novas propostas na formação dos estudantes para a sociedade.

Nesse sentido, nossa pesquisa concentra-se na compreensão de educação musical presente na BNCC do Ensino Médio (BNCC-EM), homologada em 2018 com

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a finalidade de orientar a formulação dos currículos dos sistemas e das redes escolares de todo o Brasil ao longo das etapas e modalidades da educação básica, indicando as competências e habilidades a serem desenvolvidas com os estudantes ao longo do aprendizado.

Na BNCC-EM, a música (ao lado das linguagens artísticas: Artes Visuais, Dança e Teatro) é tratada como “unidade temática” dentro do componente curricular Arte (que, por sua vez, tornou-se subordinado à área de Linguagens e suas Tecnologias, com Língua Portuguesa, Inglês e Educação Física). Essa versão está amplamente fundamentada na Reforma do Ensino Médio, Lei n. 13.415, de 2017 (BRASIL, 2017a) que, ao modificar a Lei de Diretrizes e Bases (LDB) de 1996, estabelece itinerários formativos que os estudantes poderão construir, sendo obrigatórias somente as disciplinas de Língua Portuguesa e Matemática no decorrer dos três anos. Assim, o componente Arte, incorporado nesses percursos eletivos, poderá se dissolver entre as grandes áreas de conhecimento da última etapa do ensino básico.

Assumimos como quadro teórico da pesquisa a pedagogia crítica transformadora consagrada por Paulo Freire, considerando que a obra do autor

“funciona como uma espécie de consciência crítica, que nos põe em guarda contra a despolitização do pensamento educativo e da reflexão pedagógica” (NÓVOA, 1998, p. 185) por meio da reflexão e da denúncia de situações desumanizadoras e do anúncio de ações compromissadas de transformação.

Considerando a obrigatoriedade de implementar a BNCC-EM, esta pesquisa propõe-se a investigar se, com essa legislação, a prática da educação musical pode ser reorientada, no sentido de concretizar os princípios da pedagogia freireana que tem no horizonte a humanização e a construção de uma sociedade mais democrática, justa e solidária. Assim, cabe a seguinte questão: Como construir práticas de ensino musical emancipatórias, embora exista uma prescrição na Base Nacional Comum Curricular para o Ensino Médio que expressa um paradigma neotecnicista?

Tal pergunta levou-nos a propor como objetivo geral deste estudo: Analisar a proposta da linguagem artística Música no componente curricular Arte,

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expresso na Base Nacional Comum Curricular (BNCC) do Ensino Médio tomando como crivo crítico elementos da pedagogia freireana1.

Como objetivos específicos, propomos:

a) Investigar se os conceitos de emancipação e humanização, fulcro da proposta de Paulo Freire, estão presentes na BNCC-EM, na perspectiva de orientar o ensino musical;

b) Apresentar e analisar uma prática de educação musical em uma escola pública como um caso ilustrativo, buscando identificar possibilidades e limites para uma educação emancipadora;

c) Apontar possíveis caminhos para a reorientação de práticas de educação musical no Ensino Médio a partir do pensamento freireano.

Segundo Gainza (2011), a música é uma experiência multidimensional, um direito humano, que deveria estar ao alcance de todas as pessoas, desde seu nascimento e por toda a vida, bem como uma ferramenta privilegiada de intervenção social.

Desse modo, compreende-se que os saberes da arte musical como prática educativa na escola são adquiridos e construídos na relação com as experiências humanas, transcendendo a mera experiência sensorial e proporcionando um conhecimento que não tem um fim em si mesmo, ao favorecer o desenvolvimento de sentidos e significados por meio da proposição de novas formas de sentir e pensar e ao guiar os sujeitos para a leitura plástica, poética e expressiva do mundo.

(ZAMPRONHA, 2007)

Entretanto, tendo em vista a potencialidade e a vitalidade desses saberes que se produzem, se articulam e se mobilizam na reflexão e ação da prática educativa a partir do pensamento freireano, inscreve-se este estudo nos parâmetros da investigação qualitativa. Assim, tendo como objeto de estudo a arte musical como prática educativa em sentido emancipatório, optamos por encaminhar nosso estudo por meio da pesquisa qualitativa, bibliográfica e documental, por compreender que seus princípios convergem para o propósito pretendido neste estudo.

A abordagem de pesquisa qualitativa, como a palavra sugere, partilha:

1 A utilização do adjetivo “freireano” e suas flexões, assumidos nesta pesquisa, é uma questão de preferência, pela compreensão de que a manutenção da grafia integral do sobrenome do autor destaca com mais vigor a proveniência, a origem das produções, ou seja, o pensamento de Freire (SAUL; SAUL, 2013).

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o pressuposto básico de que a investigação dos fenômenos humanos, sempre saturados de razão, liberdade e vontade, estão possuídos de características específicas: criam e atribuem significados às coisas e às pessoas nas interações sociais e estas podem ser descritos e analisados, prescindindo de quantificações estatísticas (CHIZZOTI, 2006, p. 29).

Segundo Lakatos e Marconi (2003, p. 183) a pesquisa bibliográfica “não é mera repetição do que já foi dito ou escrito sobre certo assunto, mas propicia o exame de um tema sob novo enfoque ou abordagem, chegando a conclusões inovadoras.”

Assim, pretendemos entrar em contato com a obra de Paulo Freire e de estudos correlatos que discutem a música como dimensão da humanização.

Intentamos, também, a realização de pesquisa documental na BNCC-EM para averiguar se nela estão presentes, explícitas ou subjacentes, as concepções freireanas de educação emancipatória. Tal modalidade de pesquisa se faz importante, pois não somente responde a um problema, mas proporciona uma ampliação da visão desse problema (GIL, 2002).

Ainda acerca da pesquisa documental, Lüdke e André colocam que:

Os documentos constituem também uma fonte poderosa de onde pode ser retirada evidências que fundamentem afirmações e declarações do pesquisador. Representam ainda uma fonte “natural” de informações. Não são apenas uma fonte de informação contextualizada, mas surgem num determinado contexto e fornecem informações sobre esse mesmo contexto (LÜDKE; ANDRÉ, 2003, p. 39).

A fim de analisar uma prática de educação musical com potencialidade de desenvolver uma educação emancipatória, numa escola da rede pública estadual da cidade de São Paulo, realizamos uma entrevista semiestruturada com o propósito de reunir os aspectos que entendemos ser expressivos dessa realidade, considerando o contexto e os objetivos da pesquisa.

Segundo Manzini (1991):

[...] a entrevista semiestruturada está focalizada em um assunto sobre o qual confeccionamos um roteiro com perguntas principais, complementadas por outras questões inerentes às circunstâncias momentâneas à entrevista. Para o autor, esse tipo de entrevista pode fazer emergir informações de forma mais livre e as respostas não estão condicionadas a uma padronização de alternativas (MANZINI, 1991, p. 1540).

O emprego da entrevista em nosso estudo objetiva identificar nas atividades educativas musicais, bem como na prática do ensino musical propriamente dita, elementos que possam sinalizar uma abertura para a concretização de princípios e

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práticas de concepção educativa emancipatória. De acordo com Duarte (2004, p. 215),

“as entrevistas são fundamentais quando se precisa/deseja mapear práticas, crenças, valores e sistemas classificatórios de universos sociais específicos, mais ou menos bem delimitados” E, ainda:

[...] se forem bem realizadas, elas permitirão ao pesquisador fazer uma espécie de mergulho em profundidade, coletando indícios dos modos como cada um daqueles sujeitos percebe e significa sua realidade e levantando informações consistentes que lhe permitam descrever e compreender a lógica que preside as relações que se estabelecem no interior daquele grupo (DUARTE, 2004, p. 215).

Ao realizar a busca por trabalhos sobre a temática em questão que pudessem cooperar no desenvolvimento desta pesquisa, foram selecionados estudos correlatos relacionados às produções científicas disponíveis na base de dados Biblioteca Digital Brasileira de Teses e Dissertações (BDD) por meio de combinações com as seguintes palavras-chave: “Base Nacional Comum Curricular”, “Ensino Médio”, “Escola Pública”,

“Educação musical” e “Paulo Freire” e em descritores que pudessem melhor delimitar o tema de pesquisa.

No levantamento das produções, foram feitas diversas buscas com descritores diferentes para ter acesso a trabalhos que dialogassem com a educação musical em diferentes aspectos, que são explicitados a seguir:

Partindo do descritor “educação musical na escola pública”, selecionou-se a pesquisa Políticas públicas educacionais: prática musical na escola pública paulista, de Leila Guimarães, que discute o papel do ensino da música nos diferentes períodos históricos, a partir da promulgação da primeira Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional. Além disso, versa sobre a arte na educação brasileira, enfocando a prática musical nas escolas de ensino fundamental no qual se faz um histórico da educação musical no Brasil, considerando a visão de alguns educadores por meio de entrevistas com professores de Artes da rede pública estadual e municipal de São Paulo para se chegar a um provável panorama da prática musical na rede pública do Ensino Fundamental e Médio nos últimos anos.

Ao utilizar os buscadores “educação musical no ensino médio”, selecionou-se a pesquisa Aula de música e escola: concepções e expectativas de alunos do Ensino Médio, de Cristina Bertoni dos Santos, que busca compreender as relações que permeiam as concepções e expectativas de alunos do Ensino Médio a respeito da aula de música na escola, examinando suas concepções e significados atribuídos aos

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processos de ensino e aprendizagem musical e à aula de música no espaço escolar.

Para tanto, analisa as falas dos estudantes que permitiram perceber que a música tem sentido para eles e que a aula de música na escola é reconhecida como um espaço/momento de aprendizagens específicas relacionadas à música, contribuindo para o desenvolvimento do sujeito no sentido amplo.

Ao buscar “educação musical na BNCC”, elegeu-se a pesquisa Configurações do ensino de música frente ao componente curricular Arte: um estudo com professores de Música da Educação Básica, de André Rangel de Carvalho, que propõe a compreensão sobre qual o lugar da música na aula de Arte e no currículo escolar.

Além disso, busca refletir sobre a atuação dos professores de música nas aulas de Arte e como esses estão interpretando e aplicando a BNCC em suas práticas pedagógicas, oferecendo pistas que contribuam com a formação de professores de música para a atuação na educação básica frente aos desafios impostos pelo componente curricular Arte.

Por fim, ao buscar por “educação musical e Paulo Freire”, encontrou-se a tese de Doutorado Tecendo Cidadania no Território da educação Musical: A experiência do Programa Guri Santa Marcelina, de Marta Regina Pastor Bruno, a qual analisa a contribuição da aliança do trabalho social com a educação musical como prática de um currículo orientado nos preceitos de Paulo Freire, trazendo embasamento teórico para pensar a educação musical no sentido emancipatório. Esse trabalho, tomado como referência para a presente discussão, ao utilizar um espaço educativo não- formal regido sob os princípios da educação popular, serve como inspiração para uma educação musical transformadora no ensino regular.

A partir desse levantamento, nosso estudo pretende dar continuidade às discussões sobre a importância da arte e da música na escola, especialmente na última etapa da educação básica, sob a perspectiva crítica, tendo em vista a formação de educandos criativos e autônomos. Outrossim, aspira oferecer contribuições aos professores, responsáveis pelo componente curricular Arte, de modo que, apesar da obrigatoriedade da BNCC, possam reorientar suas práticas no sentido emancipatório.

A fim de compilar os resultados do estudo desenvolvido nesta pesquisa, este escrito será estruturado em três capítulos, precedidos pela Apresentação, por esta Introdução, e seguidos pelas Considerações finais.

O primeiro capítulo, A educação musical na Base Nacional Comum Curricular do Ensino Médio: (des)continuidades, traça uma breve trajetória do ensino de música

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na educação básica brasileira por meio das legislações existentes até chegar na BNCC, focalizando a situação da Arte/Música nesses documentos e refletindo sua incidência na formação e na atuação dos educadores.

No capítulo A educação musical como dimensão da humanização, são apresentados os referenciais freireanos para pensar a educação musical como prática educativa emancipatória ao utilizar as categorias de análise (processos humanizadores): diálogo, autonomia e criatividade.

No terceiro capítulo, Reinventando a educação musical na perspectiva freireana, examinaremos os fundamentos do ensino de música para estudantes do Ensino Médio presentes na BNCC, apresentando e analisando uma prática bem sucedida em uma escola pública como um caso ilustrativo no qual foram buscados elementos que pudessem apontar possíveis caminhos para a reorientação de práticas de educação musical na referida etapa da educação básica, a partir do pensamento de Paulo Freire.

Encerramos o trabalho tecendo as Considerações Finais, demonstrando a importância de se reinventar o legado de Paulo Freire apesar da BNCC, apontando caminhos para a construção de práticas de ensino musical transformadoras.

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1 A EDUCAÇÃO MUSICAL NA BASE NACIONAL COMUM CURRICULAR DO ENSINO MÉDIO: (DES)CONTINUIDADES

É preciso que a educação esteja - em seu conteúdo, em seus programas e em seus métodos - adaptada ao fim que se persegue: permitir ao homem chegar a ser sujeito, construir-se como pessoa, transformar o mundo, estabelecer com os outros homens relações de reciprocidade, fazer a cultura e a história (FREIRE, 1980, p. 39).

1.1 O ensino de música na educação básica: uma breve trajetória

Faz-se necessário conhecer a trajetória do ensino de música na educação básica brasileira por meio das legislações existentes no intuito de compreender esse percurso e debater novas propostas na formação dos estudantes para a sociedade.

Nesse sentido, revisitar processos históricos permite reconhecer o importante papel da educação musical, bem como sua multiplicidade e complexidade.

No século XIX, precisamente no ano de 1851, por meio do decreto nº 630 de 17 de setembro, encontrou-se pela primeira a vez a menção ao ensino de música, tendo sua normatização três anos depois, em 1854, pelo Decreto Lei nº 1.331-A, que previa noções de música e exercícios de cantos para os estudantes do segundo grau.

Após a conclusão, poderiam optar pela instrução Pública Secundária, que englobava também o ensino de música, apesar de ter como foco as letras (GREZELI;

WOLFFENBÜTTEL, 2021).

Ao ser instaurada a República, em 1890, uma nova reforma educacional é efetivada por meio do Decreto nº 981, que estende o ensino de música, naquele momento intitulado Elementos de Música, a todas as faixas etárias e aos estudantes mais novos do primeiro grau, inclusive. Além disso, estabeleceu orientações sobre a formação específica para professores que fossem lecionar a partir do segundo grau.

Ao adentrar o século XX, no ano de 1931, por meio do decreto nº 19.890, ocorreu uma notável mudança no ensino de música, que passou a se chamar Canto Orfeônico, marcado por práticas grupais de canto. O maestro Heitor Villa-Lobos foi o grande expoente dessa prática de educação musical, defendendo uma música genuinamente brasileira com viés nacionalista, utilizando-se do folclore para propagação de suas concepções musicais2. É importante destacar que, em 1932,

2 Segundo Fuks (1991, p. 120), os objetivos do canto orfeônico eram, “segundo Villa-Lobos, desenvolver, em ordem de importância: 1º - a disciplina; 2º - o civismo e 3º - a educação artística.”

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Villa-Lobos assumiu a Superintendência de Educação Musical e Artística (SEMA) na função de diretor, que tinha por objetivo a orientação, planejamento e desenvolvimento do estudo da música nas escolas em todos os níveis. Dez anos depois, em 1942, houve a criação do Conservatório Brasileiro de Canto Orfeônico – formação dos professores para ministrar a disciplina de Canto Orfeônico no Brasil até o início da década de 1960. Tal estratégia foi considerada efetiva tendo em vista o baixo investimento que a prática do canto coral apresenta, além de democratizar o contato com as aulas de música no país na tentativa da formação uma identidade nacional.

No ano de 1961, por meio da Lei de Diretrizes e Bases da Educação n.º 4.024 (BRASIL, 1961), o Canto Orfeônico deu lugar à disciplina de Educação musical, que perdurou durante 10 anos, quando foi instituída a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional nº 5.692, de 1971, gerada sob o regime militar e que retirou a educação musical do currículo escolar, sendo essa substituída pela atividade educativa Educação Artística, que passou a incluir as linguagens artísticas: música, artes plásticas, artes cênicas e desenho (Parecer nº1284/73). A Lei 5692/71, que promoveu a reforma do ensino de primeiro e segundo grau, acompanhou uma tendência tecnicista desencadeada pela influência do mercado de trabalho na educação. Naquela época, também foi criado o curso de Licenciatura em Educação Artística ou licenciatura curta, que consistia na formação polivalente do professor de Arte. Após o término do curso, era possível cursar a licenciatura plena com habilitação específica em Artes Plásticas, Desenho, Artes Cênicas ou Música. Dessa forma, houve um esvaziamento da presença de profissionais de educação musical nas escolas (HENTSCHKE; OLIVEIRA, 2000). Segundo Grezeli e Wolffenbüttel (2021):

Essa proposta fez com que alguns professores de música se afastassem do contexto escolar, buscando o trabalho em conservatórios ou escolas especializadas em música. Desse modo, a relação com o conhecimento musical perdeu o seu acesso democrático, tornando, de certo modo, mais difícil o acesso a este conteúdo. Portanto, entende-se ter ocorrido a perda de um valioso espaço conquistado pela educação musical nas escolas durante 120 anos, ou seja, desde o Decreto n.º 630, de 1851, ainda durante o Império, um retrocesso sem precedentes sobre o ensino de música na história da educação (GREZELI; WOLFFENBÜTTEL, p. 8, 2021).

Percebe-se, no entanto, que a música, nesse período não consegue adentrar significativamente no espaço escolar, e a prática da Educação Artística, diferente de

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escola para escola, termina sendo dominada pelas artes plásticas, embora, reiteradamente, atreladas a uma prática polivalente (FERRAZ; SIQUEIRA, 1987).

No ano de 1996, foi sancionada a Lei de Diretrizes e Bases da Educação (LDB) nº 9.394, orientando que “o ensino de Arte, especialmente em suas expressões regionais, constituirá componente curricular obrigatório da Educação Básica de forma a promover o desenvolvimento cultural dos alunos” (BRASIL, 1996, art. 26). Nota-se que a denominação “Educação Artística” é substituída por “Ensino de Arte”, cujas possibilidades de disciplinas ofertadas poderiam ser Artes Visuais, Dança, Teatro ou Música. Dessa forma, o texto da referida lei não especificava as linguagens artísticas mencionadas, apenas informava que a Arte é um componente curricular obrigatório.

Assim, os docentes atuariam em uma dessas disciplinas na escola considerando sua formação profissional (BRASIL, 1996).

Nesse sentido, o Ministério da Educação (MEC) elaborou a partir do ano de 1997 os Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN) para o Ensino Fundamental e Médio. Esses documentos consistem em diretrizes que objetivam orientar os educadores a partir da normatização de aspectos essenciais referentes a cada disciplina. Os Parâmetros Curriculares Nacionais, embora não possuam caráter obrigatório, constituem o primeiro documento oficial de orientação curricular em nível nacional sob o vigor da LDB de 1996 e orientaram as ações do Ministério da Educação, bem como as práticas pedagógicas, avaliações e investimentos no ensino básico.

No Ensino Médio, a Arte, disciplina contida na área de Linguagens, Códigos e suas tecnologias, integra a Base Comum e não possui uma proposta específica nos PCN (BRASIL, 1998, 1999), mas tem a intenção de dar “continuidade aos conhecimentos de arte desenvolvidos na educação infantil e fundamental em música, artes visuais, dança e teatro” (BRASIL, 1999). A respeito das habilidades e competências da linguagem musical e sua contribuição no desenvolvimento dos estudantes, o documento versa que:

[...] construindo sua competência artística nessa linguagem, sabendo comunicar-se e expressar-se musicalmente, o aluno poderá, ao conectar o imaginário e a fantasia aos processos de criação, interpretação e fruição, desenvolver o poético, a dimensão sensível que a música traz ao ser humano (BRASIL, 1998, p. 80).

(26)

Em relação ao tratamento das várias linguagens artísticas, as decisões ficavam sob responsabilidade de cada estabelecimento de ensino. Essa flexibilidade buscava abranger os diversos contextos escolares do Brasil, fato que, no entanto, dava margem para que as escolhas das unidades escolares não contemplassem todas as linguagens (PENNA, 2012).

Ao adentrar o século XXI, houve um grande esforço de artistas, educadores musicais e associações, como a ABEM (Associação Brasileira de Educação Musical) no sentido de aprimorar a legislação, considerando a música como componente curricular nas escolas. Tal esforço, resultou na aprovação da Lei n.º 11.769, de 2008, que alterou o Art. 26 da LDB 9.394, de 1996 estabelecendo que: “§ 6º A música deverá ser conteúdo obrigatório, mas não exclusivo, do componente curricular de que trata o

§ 2o deste artigo (NR)” (BRASIL, 2008).

Não obstante, a mesma legislação recebeu o veto ao Art. 2º, que versava sobre a obrigatoriedade da formação específica do educador musical, contrapondo-se à própria LDB (9394/96), que garantia a formação plena em licenciatura para atuar na Educação Básica. Assim, para ministrar as aulas de música não seria necessário um profissional específico da área. Como consequência disso, observa-se uma diversidade de níveis de formação dos profissionais, inclusive, sem formação acadêmica ou oficial, dos músicos brasileiros ligados ao ensino de música nas escolas.

Admite-se a relevância da Lei nº 11.769 de 2008 para o ensino de música nas escolas básicas do Brasil. No entanto, por não ser apresentada como um componente curricular específico, mas somente como conteúdo obrigatório, abriu-se espaço para discussões diversas e acentuadas sobre o papel que a música poderia ter no ambiente escolar (SOUTO; WOLFFENBÜTTEL; PIMENTEL, 2019).

Em 2016, o Ministério da Educação, por meio do Conselho Nacional de Educação (CNE) e da Câmara de Educação Básica (CEB), apresentou a normatização para o ensino de Música com a Resolução n.º 2, que “Define Diretrizes Nacionais para operacionalização do ensino de Música na Educação Básica”

(Resolução CNE/CEB nº 2/2016) (BRASIL, 2016) com a seguinte finalidade:

Art. 1º Esta Resolução tem por finalidade orientar as escolas, as Secretarias de Educação, as instituições formadoras de profissionais e docentes de Música, o Ministério da Educação e os Conselhos de Educação para a operacionalização do ensino de Música na Educação Básica, conforme

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definido pela Lei nº 11.769/2008, em suas diversas etapas e modalidades.

(BRASIL, 2016).

É importante destacar que na resolução nº 2 de 2016 há uma orientação sobre a formação específica do educador para as aulas de música na escola:

V - organizar seus quadros de profissionais da educação com professores licenciados em Música, incorporando a contribuição dos mestres de saberes musicais, bem como de outros profissionais vocacionados à prática de ensino (BRASIL, 2016, p. 1).

Tal orientação está em consonância com a meta 15 do Plano Nacional de Educação:

Garantir um regime de colaboração entre a união, estados, distrito federal e os municípios que todos os professores da educação básica possuam formação específica de nível superior, obtida em curso de licenciatura na área do conhecimento em que atuam (BRASIL, 2010, p. 88).

No mesmo ano, por meio da Lei nº13.278 de 2016, houve a alteração do parágrafo 6º da LDB nº 9.394 de 1996 (BRASIL, 1996) que incluiu as artes visuais, a dança e o teatro enquanto linguagens que constituirão, junto à música, o ensino de Arte, estando inseridos na área das Linguagens, Códigos e suas Tecnologias. A Lei também determinou o prazo de cinco anos para que a nova orientação se concretizasse nas escolas.

A versão final da BNCC correspondente às etapas da Educação Infantil e do Ensino Fundamental foi homologada em 2017, definindo o conjunto orgânico e progressivo de aprendizagens essenciais que todos os alunos devem desenvolver ao longo das etapas e modalidades da educação básica. (BRASIL, 2017b) Assim, veremos como foi o seu processo de elaboração, culminando na homologação da 3ª versão do documento referente ao Ensino Médio em 2018:

1.2 O percurso da BNCC – As bases da base

Segundo Macedo (2014), a discussão sobre a elaboração de uma base comum em nível nacional não é recente no Brasil, remontada desde os anos 1980. Dessa forma, a LDB promulgada em 1996 propõe a construção de uma base nacional comum:

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Art. 26. Os currículos da educação infantil, do ensino fundamental e do ensino médio devem ter base nacional comum, a ser complementada, em cada sistema de ensino e em cada estabelecimento escolar, por uma parte diversificada, exigida pelas características regionais e locais da sociedade, da cultura, da economia e dos educandos (BRASIL, 1996).

A proposição da construção de uma base nacional comum se associou à discussão sobre diretrizes curriculares em nível nacional, tendo como referência a própria LDB (MACEDO, 2014). No Art. 9º, vê-se a incumbência da união que deverá:

IV - estabelecer, em colaboração com os Estados, o Distrito Federal e os Municípios, competências e diretrizes para a educação infantil, o ensino fundamental e o ensino médio, que nortearão os currículos e seus conteúdos mínimos, de modo a assegurar formação básica comum (BRASIL, 1996).

Nesse sentido, coube ao Conselho Nacional de Educação (CNE), criado em 1995 com o objetivo de determinar “normativas, deliberativas e de assessoramento ao Ministro de Estado da Educação e do Desporto” (BRASIL, 1995, artigo 7º), o estabelecimento dessas competências e diretrizes que garantissem uma formação básica comum.

Assim, em 1996, o Ministério da Educação (MEC) enviou ao Conselho Nacional de Educação (CNE) a versão final dos Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN). O Conselho, por sua vez, recusou a proposta pelo nível de detalhamento que possuía e elaborou diretrizes mais gerais, conservando os PCN como alternativa curricular não obrigatória (MACEDO, 2014).

As Diretrizes Nacionais Curriculares eram mais abrangentes, pois iriam sistematizar princípios e diretrizes gerais da educação básica que aparecem na LDB de 1996, traduzindo-se em orientações para subsidiar a formulação, execução e avaliação dos projetos políticos pedagógicos das escolas tendo em vista assegurar a formação básica comum nacional. Segundo Del-Ben (2020), já havia uma Base Nacional Comum que está na LDB e em outras orientações curriculares. Tais documentos não faziam referência a uma Base Nacional Comum Curricular, mas a uma Base Comum que serviria de apoio para Estados e Municípios constituírem seus currículos (DEL-BEN, 2020).

Então, o que justificaria a criação de uma Base Nacional Comum Curricular?

Segundo Macedo (2014), “vivia-se, em meados da década de 1990, o auge da definição de políticas educacionais nacionais marcadas por intervenções

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centralizadas no currículo, na avaliação e na formação de professores” (MACEDO, 2014, p. 1533).

Sendo assim, havia uma demanda de diferentes setores da sociedade que vinculavam a qualidade da educação a currículos centralizados ou à padronização curricular. Foi o que ocorreu em diversos países em contextos distintos, cujas razões para a criação de uma base curricular comum são variadas e estão atreladas às circunstâncias sociopolíticas, econômicas e sociais (MACEDO, 2014).

Del-Ben (2020) salienta que a Base surgiu da demanda de governos que defendem uma política educacional neoliberal ao propor uma perspectiva de educação seletiva e minimalista para aqueles que irão exercer trabalhos simples durante toda a vida, priorizando a educação básica, restringindo-se às necessidades básicas de aprendizagem onde, segundo Girotto (2018, p. 25), “valores como individualismo, competitividade, meritocracia, empreendedorismo, protagonismo passam ser os principais referentes”.

Conjuntamente, agentes sociais privados entram no cenário da educação, procurando intervir nas políticas públicas educacionais na intenção de obter maior controle sobre os currículos (MACEDO, 2014). Esses agentes estavam antenados ao cenário desenhado pela Organização para Cooperação e Desenvolvimento (OCDE), entidade que indica ao ambiente empresarial os locais mais atrativos de investimentos no setor privado.

Tendo como suporte o Programme for International Student Assessment (PISA) e pesquisas comparativas, as políticas educacionais foram integrando as diretrizes da OCDE que, ao possuir uma avaliação internacional, começou a exigir um currículo que legitimasse essa avaliação como forma de “ranquear” países que estabelecessem padrões curriculares a fim de permitir um desempenho mensurável e satisfatório (CURY; REIS; ZANARDI, 2018).

Foi nesse contexto que as noções de habilidade e competência ganham força, justamente por estarem de acordo com os ditames desses organismos internacionais que atendem aos critérios do ingresso ao mercado de trabalho,

dando ao processo educativo um caráter cada vez mais utilitário, sendo que a validade de um dado conhecimento não é mais encontrado em si mesmo, mas na capacidade que tem de possibilitar aos indivíduos maior acúmulo de capital humano e, consequentemente, maior capacidade de competição e

“empregabilidade” (GIROTTO, 2018, p. 26).

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No Brasil, o movimento Todos pela Educação, fundado em 2006, tem coordenado a ação dos empresários no campo da educação. Tem como apoiadores, mantenedores e parceiros como a Fundação Bradesco, Itaú Social, Fundação Lemann, Instituto Unibanco, Instituto Natura, Rede Globo, Fundação Roberto Marinho, Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID), Fundação Santillana, Fundação Victor Civita, entre outros (TODOS PELA EDUCAÇÃO, 2018).

No Plano Nacional de Educação (PNE), previsto na Lei nº 13.005 de 2014 (BRASIL, 2014), há a reiteração da necessidade de elaboração de uma base nacional comum. O documento define que: “União, Estados, Distrito Federal e Municípios [devem pactuar] [...] a implantação dos direitos e objetivos de aprendizagem e desenvolvimento que configurarão a base nacional comum curricular do ensino fundamental” (meta 2). Além disso, a relaciona a outras metas que tratam da universalização do ensino fundamental, da avaliação, do IDEB (meta 7) e da formação docente (meta 15).

Nesse contexto, em 2015, a base começou a ser debatida e escrita com a participação de vários especialistas de diferentes áreas do conhecimento com o objetivo de estruturar um documento único que abrangesse as especificidades de cada área. Porém, esse percurso foi se modificando e seguindo outros caminhos.

Diversas entidades representativas apresentaram posições contrárias ao estabelecimento de uma Base Nacional Comum Curricular como a Associação Brasileira de Currículo (ABdC) e a Associação Nacional de Pós-graduação e Pesquisa em Educação (ANPED) que, inclusive, elaboraram o ofício nº 01/2015/GR. 1. No documento intitulado “Exposição de Motivos sobre a Base Nacional Comum Curricular”, a comunidade científica afirma sua insatisfação com seu processo de elaboração, feito de forma enviesada, apressada e desrespeitosa à diversidade do povo brasileiro. Além disso, critica a visão homogênea dos estudantes bem como a destituição da liberdade de atuação dos professores em sala de aula, o que pode acarretar a desumanização do trabalho docente (ANPED; ABDC, 2015).

Em 2016, o contexto político, com o impeachment3 da então presidente Dilma Rousseff, movido, segundo Santos (2019), pela “necessidade de substituição de um

3 O processo foi iniciado em dezembro de 2015 pelo então presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha, a partir de pressupostos de denúncia por crime de responsabilidade fiscal, embora não houvesse nada comprovado. Encerrou-se o processo em agosto de 2016 com a cassação do mandato de Dilma.

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governo constituído legal e democraticamente por um chefe de estado que atendesse de forma mais solícita às exigências do capital com vistas à superação de sua crise.”

Nesse cenário, é que as políticas públicas da educação se mostram ancoradas, claramente, no tecnicismo e gerencialismo de caráter meritocrático e excludente, embasando-se nos discursos de liberdade de escolha e de igualdade de oportunidades (CURY; REIS; ZANARDI, 2018).

Sendo assim, a primeira versão com a proposta preliminar da BNCC foi apresentada em setembro de 2015 e a segunda em maio de 2016. A versão final do documento para a etapa do Ensino Médio foi homologada em 14 de dezembro de 2018. Conforme Santos (2019), essa versão homologada possui forte ruptura com o trabalho que estava sendo realizado por meio de mudanças consideráveis e discussões acentuadas a respeito de seus aspectos formais e de conteúdo. Vale ressaltar que o processo de construção da Base ocorreu sem participação maciça da sociedade onde, segundo Peroni, Caetano e Lima (2017) houve “um esvaziamento da participação, autonomia e transparência dos sistemas e as políticas de educação são impressas de cima para baixo, de fora para dentro” (PERONI; CAETANO; LIMA, p.422, 2017).

1.3 O lugar da Arte e da Música na BNCC

Nesta última versão da BNCC-EM, o componente curricular Arte torna-se subordinado à área de Linguagens, perdendo seu aspecto de área de conhecimento específico ao dar “ênfase às práticas expressivas pouco contextualizadas, tendo como foco o direcionamento no fazer, desprezando a sua dimensão crítica e conceitual”

(PERES, 2017, p. 27).

Observa-se um significativo avanço obtido por meio da Lei nº 11.769 de 2008, que dispõe sobre a obrigatoriedade da Música como conteúdo obrigatório, mas não exclusivo da educação básica, que, posteriormente, foi atualizada com a Lei nº 13.278 de 2016, mais completa, que abrange todas as linguagens artísticas (Artes Visuais, Dança, Música e Teatro) no componente curricular Arte. Entretanto, a BNCC desconsidera essa legislação ao diminuir os vastos campos de conhecimento referentes a cada linguagem artística, cada qual com sua especificidade, reduzindo- os na forma de “unidades temáticas”.

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Ainda que, na BNCC, as linguagens artísticas das Artes Visuais, da Dança, da Música e do Teatro sejam consideradas em suas especificidades, as experiências e vivências dos sujeitos em sua relação com a Arte não acontecem de forma compartimentada ou estanque (BRASIL, 2017b, p. 194).

Conforme as proposições da ABEM (2016, p. 4), “cada uma das linguagens artísticas tem características de componentes curriculares, pelo fato de possuírem especificidades distintas que necessitam de professores com formação específica para atendê-las adequadamente.” Ao considerar as linguagens artísticas como subcomponentes fragmentados, acaba-se por “legitimar a visão distorcida referente ao ensino de Arte, construída ao longo da história” (ABEM, 2016, p. 4-5).

A versão homologada da BNCC do Ensino Médio está largamente fundamentada na Reforma do Ensino Médio, Lei n. 13.415, de 2017 (BRASIL, 2017a) que, ao modificar a LDB de 1996, estabelece itinerários formativos que os estudantes poderão construir. Assim, as disciplinas, como estão postas atualmente, seriam incorporadas nesses percursos por meio de práticas e estudos tendo somente os componentes de Língua Portuguesa e Matemática como obrigatórios no decorrer dos três anos do Ensino Médio:

Art. 36. O currículo do ensino médio será composto pela Base Nacional Comum Curricular e por itinerários formativos, que deverão ser organizados por meio da oferta de diferentes arranjos curriculares, conforme a relevância para o contexto local e a possibilidade dos sistemas de ensino, ensino, a saber:

I - linguagens e suas tecnologias;

II - matemática e suas tecnologias;

III - ciências da natureza e suas tecnologias;

IV - ciências humanas e sociais aplicadas;

V - formação técnica e profissional.

[...] A critério dos sistemas de ensino, poderá ser composto itinerário formativo integrado, que se traduz na composição de componentes curriculares da Base Nacional Comum Curricular - BNCC e dos itinerários formativos, considerando os incisos I a V do caput (BRASIL, 2017a).

Na BNCC-EM, não há orientações a respeito dos conteúdos a serem trabalhados a cada ano, afirmando que “os currículos das escolas serão compostos pela BNCC e pelos itinerários formativos que serão ofertados pelas escolas” e

“deverão ser organizados por meio da oferta de diferentes arranjos curriculares, conforme a relevância para o contexto local e a possibilidade dos sistemas de ensino”

(BRASIL, 2018).

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A legislação que regulamenta os itinerários formativos por meio da lei 13.415 e das Diretrizes Curriculares Nacionais do Ensino Médio (DCNEM/18) não assegura a obrigatoriedade dos sistemas de ensino a ofertarem todas as áreas específicas de conhecimento. Assim, caberá ao estudante a escolha por áreas flexíveis do currículo.

Carvalho et al. (2017) afirma que tal reforma adquire potencial destrutivo no público brasileiro pela ausência de um sistema de educação nacional que ofereça o mínimo de unidade ao promover a fragmentação identitária do Ensino Médio.

Cesar Callegari, sociólogo e ex-presidente da comissão encarregada em analisar a BNCC do Ensino Médio, no Conselho Nacional da Educação (CNE), ressalta:

No documento preparado pelo MEC, com exceção de língua portuguesa e matemática (que são importantes, mas não as únicas), na sua BNCC desaparece a menção às demais disciplinas cujos conteúdos passam a ficar diluídos no que se chama de áreas do conhecimento. Sem que fique minimamente claro o que deve ser garantido nessas áreas. Contudo, sabemos que os direitos de aprendizagem devem expressar a capacidade do estudante de conhecer não só conteúdos, mas também de estabelecer relações e pensar sobre eles de forma crítica e criativa. Isso só é possível com referenciais teóricos e conceituais. Ao abandonar a atenção aos domínios conceituais próprios das diferentes disciplinas, a proposta do MEC não só dificulta uma visão interdisciplinar e contextualizada do mundo, mas pode levar à formação de uma geração de jovens pouco qualificados, acríticos, manipuláveis, incapazes de criar e condenados aos trabalhos mais simples e entediantes, cada vez mais raros e mal remunerados4.

Neste contexto, corre-se o grande perigo do componente Arte, em especial a música, dissolver-se entre as grandes áreas de conhecimento do Ensino Médio, tornando-se, segundo Peres (2017), “apenas uma disciplina que ajudará na compreensão dos conteúdos de Língua Portuguesa ou Literatura, sendo negligenciados seus conteúdos próprios” (PERES, 2017, p. 30-31).

Iavelberg (2018, p. 75) observa que “na BNCC há maior diferença de extensão entre o componente Arte e os demais componentes e áreas, sendo Língua Portuguesa e Matemática os mais privilegiados”. Além disso, a autora pondera que essa

“descontinuidade denota uma desvalorização da Arte no currículo escolar e está relacionada à exclusão do componente das avaliações de aprendizagens dos sistemas de ensino” (IAVELBERG, 2018, p. 76).

4 Disponível em: https://www.epsjv.fiocruz.br/carta-aos-conselheiros-do-conselho-nacional-de- educacao-cesar-callegari-renuncia-a-presidencia-da. Acesso em: 10 jan. 2022.

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Logo na introdução da área de Linguagens e suas Tecnologias, o texto do documento se refere à Arte como “área do conhecimento humano que contribui para o desenvolvimento da autonomia reflexiva, criativa e expressiva dos estudantes, por meio da conexão entre o pensamento, a sensibilidade, a intuição e a ludicidade.”

Outrossim, afirma que é “na aprendizagem, na pesquisa e no fazer artístico que as percepções e compreensões do mundo se ampliam” (BRASIL, 2018).

Chama a atenção o uso das expressões: “sensibilidade”, “intuição”, “ludicidade”

e “fazer artístico” que, segundo Peres (2017), configuram-se como práticas expressivas individualizadas de cunho meramente estético, desconsiderando a dimensão crítica e conceitual da Arte.

De acordo com Pedrosa (2011), considerar a arte como conhecimento implica a obtenção de informações sobre o contexto cultural em que a obra foi realizada, sua história e seus elementos formais que integram a produção artística. Afinal, somente os sentimentos, paixões e sensações são insuficientes para promover um conhecimento amplo.

A competência 6 da área de Linguagens e suas Tecnologias sugere ao estudante: “Apreciar esteticamente as mais diversas produções artísticas e culturais, considerando suas características locais, regionais e globais.” (BRASIL, 2018, p. 482) Assim, diante da grande produção sobre as dimensões sociais, culturais e políticas da Arte, considerou-se somente a dimensão estética.

Ao tratar especificamente da música, veremos como ela aparece no texto da BNCC do Ensino Médio. A ABEM ao refletir sobre o ensino de música descrito no documento na referida etapa da Educação Básica diz que:

As direções para a implementação e o desenvolvimento do ensino de música no ensino médio, conforme aponta a terceira versão da BNCC, são alarmantes, pois são apenas 15 o número de ocorrências do termo “Música”

na BNCC-EM. Dessas, são apenas 4 menções a respeito de como a subárea pode ser tratada na educação básica (ABEM, 2018).

Perante as possibilidades de interligação das áreas de conhecimento, o texto traz o termo “musicalidades”, apresentando-o como uma possibilidade descontextualizada que se articula entre as áreas do conhecimento ligadas aos

“núcleos de criação artística” que:

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desenvolvem processos criativos e colaborativos, com base nos interesses de pesquisa dos jovens e na investigação das corporalidades, espacialidades, musicalidades, textualidades literárias e teatralidades presentes em suas vidas e nas manifestações culturais das suas comunidades, articulando a prática da criação artística com a apreciação, análise e reflexão sobre referências históricas, estéticas, sociais e culturais (artes integradas, videoarte, performance, intervenções urbanas, cinema, fotografia, slam, hip hop etc.) (BRASIL, 2018, p. 472).

Ainda que a noção de pluralidade esteja apontada, é somente na proposta de Núcleos de Criação que a música é mencionada de forma vaga e aleatória num contexto pouco propositivo, desvalorizando-a em sua singularidade, reduzindo-a a um meio de entretenimento.

A música, segundo o documento, é parte integrante da manifestação juvenil.

Localizada dentro das linguagens artísticas, no campo da vida pessoal, aponta para a habilidade de:

(EM13LP20) Produzir, de forma colaborativa, e socializar playlists comentadas de preferências culturais e de entretenimento, revistas culturais, fanzines, e-zines ou publicações afins que divulguem, comentem e avaliem músicas, games, séries, filmes, quadrinhos, livros, peças, exposições, espetáculos de dança etc., de forma a compartilhar gostos, identificar afinidades, fomentar comunidades etc (BRASIL, 2018, p. 502).

Ela também está presente em um dos parâmetros para a organização/progressão curricular no campo artístico-literário:

Diversificar, ao longo do Ensino Médio, produções das culturas juvenis contemporâneas (slams, vídeos de diferentes tipos, playlists comentadas, raps e outros gêneros musicais etc.), minicontos, nanocontos, best-sellers, literatura juvenil brasileira e estrangeira, incluindo entre elas a literatura africana de língua portuguesa, a afro-brasileira, a latino-americana etc., obras da tradição popular (versos, cordéis, cirandas, canções em geral, contos folclóricos de matrizes europeias, africanas, indígenas etc.) que possam aproximar os estudantes de culturas que subjazem na formação identitária de grupos de diferentes regiões do Brasil (BRASIL, 2018, p. 514).

A habilidade relacionada a esse parâmetro destaca uma concepção rasa e limitada do fazer artístico musical, reduzido à “participação de eventos” “socialização de produção individualizada” e “interpretação de obras de outros”:

(EM13LP46) Participar de eventos (saraus, competições orais, audições, mostras, festivais, feiras culturais e literárias, rodas e clubes de leitura, cooperativas culturais, jograis, repentes, slams etc.), inclusive para socializar obras da própria autoria (poemas, contos e suas variedades, roteiros e microrroteiros, videominutos, playlists comentadas de música etc.) e/ou interpretar obras de outros, inserindo-se nas diferentes práticas culturais de seu tempo (BRASIL, 2018, p. 515).

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Assim, salienta Del-Ben (2016, p. 5), que “enfatizar a experiência estética traz o risco de enfatizar também a relação do sujeito individual com a obra, e não a relação entre pessoas, mediada pela obra.”

Obra pode ser reduzida a “coisa”. O uso da expressão “obra” sugere ênfase no produto, a valorização da produção do artista. Não há produto sem processos a ele subjacentes, mas, como, na educação básica, o que se busca é a formação de sujeitos, parece-me que a ênfase deveria estar nos processos, nas ações e interações que levam à “produção do produto”. Na escola, o protagonismo é dos estudantes, e não dos artistas e sua produção.

O que se busca é a formação de sujeitos, e não a formação de público. É preciso ampliar e aprofundar o repertório de experiências, e não necessariamente o repertório de obras (DEL-BEN, 2016, p. 5-6).

Segundo Peres (2017), a concepção de Arte contida na BNCC não contém a preocupação de oferecer aos estudantes um entendimento mais sólido sobre os conteúdos do processo artístico. Assim, terão uma formação cerceada que não contribuirá para o aprofundamento da dimensão crítica da Arte e da sociedade.

1.4 Implicações da BNCC na formação e na atuação dos professores de Arte/Música

A formação e a atuação dos professores de Arte foram duramente atingidas pela dissolução das linguagens artísticas (Artes Visuais, Música, Teatro e Dança) na área de Linguagens, comprometendo a conquista dos docentes de Arte em licenciaturas específicas. Dessa maneira, centros universitários, faculdades e universidades do Brasil foram diretamente afetados, pois essa dissolução ofereceu abertura para que profissionais licenciados em outras áreas pudessem lecionar, como ocorria no período da Ditadura Militar5 (PERES, 2017).

Conforme as Diretrizes Nacionais para a operacionalização do ensino de Música na Educação Básica:

5 De maneira geral, entre os anos 70 e 80, os antigos professores de Artes Plásticas, Desenho, Música, Artes Industriais, Artes Cênicas e os recém-formados em Educação Artística viram-se responsabilizados por educar os alunos (em escolas de ensino médio) em todas as linguagens artísticas, configurando-se a formação do professor polivalente em Arte. Com isso, inúmeros professores deixaram as suas áreas específicas de formação e estudos, tentando assimilar superficialmente as demais, na ilusão de que as dominariam em seu conjunto. A tendência passou a ser a diminuição qualitativa dos saberes referentes às especificidades de cada uma das formas de arte e, no lugar destas, desenvolveu-se a crença de que bastavam propostas de atividades expressivas espontâneas para que os alunos conhecessem muito bem música, artes plásticas, cênicas, dança, etc. (BRASIL, 1997, p. 24).

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