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Anyanwu (O Despertar) : o sistema de desenvolvimento das Nações Unidas e a incorporação da Cooperação Sul-Sul

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UNIVERSIDADE ESTADUAL DE CAMPINAS INSTITUTO DE FILOSOFIA E CIÊNCIAS HUMANAS

PATRICIA NOGUEIRA RINALDI VICTAL

ANYANWU (O DESPERTAR):

O SISTEMA DE DESENVOLVIMENTO DAS NAÇÕES UNIDAS

E A INCORPORAÇÃO DA COOPERAÇÃO SUL-SUL

CAMPINAS 2018

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PATRICIA NOGUEIRA RINALDI VICTAL

ANYANWU (O DESPERTAR)

O SISTEMA DE DESENVOLVIMENTO DAS NAÇÕES UNIDAS

E A INCORPORAÇÃO DA COOPERAÇÃO SUL-SUL

Tese apresentada ao Instituto de Filosofia e Ciências Humanas da Universidade Estadual de Campinas como parte dos requisitos para a obtenção do título de Doutora em Ciência Política.

Orientador: PROF. DR. REGINALDO CARMELLO CORRÊA DE MORAES

ESTE EXEMPLAR CORRESPONDE À VERSÃO FINAL DA TESE DEFENDIDA PELA ALUNA PATRICIA NOGUEIRA RINALDI VICTAL E ORIENTADA PELO PROF. DR. REGINALDO CARMELLO CORRÊA DE MORAES.

CAMPINAS 2018

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UNIVERSIDADE ESTADUAL DE CAMPINAS INSTITUTO DE FILOSOFIA E CIÊNCIAS HUMANAS

A Comissão Julgadora dos trabalhos de Defesa de Tese de Doutorado, composta pelos Professores Doutores a seguir descritos, em sessão pública realizada em 22 de março de 2018, considerou a candidata Patricia Nogueira Rinaldi Victal aprovada.

Prof. Dr. Reginaldo Carmello Corrêa de Moraes Prof. Dr. Sebastião Carlos Velasco e Cruz Prof. Dr. Paulo Cesar Souza Manduca Profa. Dra. Monica Herz

Profa. Dra. Claudia Francisca Fuentes Julio

A Ata de Defesa, assinada pelos membros da Comissão Examinadora, consta no processo de vida acadêmica da aluna.

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AGRADECIMENTOS

Ao Instituto de Filosofia e Ciências Humanas e ao Programa de Pós-Graduação em Ciência Política, pela formação de doutora.

À Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES), pelo financiamento do estágio no exterior – doutorado sanduíche.

Ao Professor Doutor Reginaldo Carmello Corrêa de Moraes, por sua orientação e apoio na realização dessa pesquisa, agradeço seus comentários precisos e construtivos.

Aos Professores Doutores Sebastião Velasco e Cruz, Paulo Cesar Souza Manduca, Monica Herz e Claudia Francisca Fuentes Julio, pelo aceite em fazer parte da banca de avaliação dessa pesquisa.

À Secretaria de Pós-Graduação em Ciência Política, pela ajuda atenciosa em todos os procedimentos necessários.

Ao Ralph Bunche Institute for International Studies, The Graduate Center, City

University of New York, e, em especial, ao Professor Thomas Weiss, por ter aceitado ser meu mentor no período de doutorado sanduíche. Seu apoio foi fundamental para a definição e o desenvolvimento da pesquisa.

Aos demais professores e à equipe do Ralph Bunche Institute: Professora Stephanie Golob, Nancy Okada e Eli Karetny, pela calorosa acolhida.

Às seguintes entidades do SDNU, pelas valiosas contribuições à essa pesquisa: Biblioteca da ONU Dag Hammarskjöld;

Conferência das Nações Unidas sobre Comércio e Desenvolvimento (UNCTAD);

Departamento de Assuntos Econômicos e Sociais (UNDESA) Departamento de Informações Públicas da ONU (UN-DPI);

Escritório das Nações Unidas para a Cooperação Sul-Sul (UNOSSC); Escritório do Enviado Especial para a África;

Fundo das Nações Unidas para a Infância (UNICEF); Fundo Populacional das Nações Unidas (UNFPA); Grupo de Desenvolvimento da ONU (UNDG);

Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD);

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Às Missões Permanentes dos seguintes países, que gentilmente colaboraram com essa pesquisa:

Missão Permanente da Alemanha na ONU; Missão Permanente da Colômbia na ONU; Missão Permanente da União Europeia na ONU; Missão Permanente do Canadá na ONU;

Missão Permanente do Chile na ONU; Missão Permanente do Japão na ONU; Missão Permanente do México na ONU.

Um agradecimento especial à Missão Permanente do Brasil na ONU e aos vários diplomatas brasileiros que me ajudaram a entender melhor a ONU e o tema da Cooperação Sul-Sul.

Às Faculdades de Campinas, agradeço aos diretores Professores João Manuel Cardoso de Mello, Liana Aureliano, Luiz Gonzaga Belluzzo e Rodrigo Sabbatini, pela confiança em meu trabalho. Aos Professores Alessandro Ortuso e Waldir Quadros, e aos demais colegas professores do curso de Relações Internacionais da FACAMP, pela oportunidade constante de ensinar e aprender.

À Mad’leyne Rodrigues e Larissa Maciel, pelo apoio fundamental na transcrição das entrevistas.

Aos amigos que fiz em minha estadia em Nova York:

À Natália Frozel e à Anne Hierro, pelo grupo de estudos regado à bubble

tea e arepas colombianas;

À Paul Celentano e Nina Conelly, por me ambientarem e mostrarem o melhor da cultura nova iorquina;

Às luncheon gals, Sally Sharif, Sarah Shah e Anaïs Wong, pela companhia nos almoços na CUNY.

Às essas mulheres, profissionais e amigas maravilhosas, Talita Pinotti e Roberta Machado. Que sorte a minha de tê-las! Muito desse trabalho devo ao apoio de vocês. Aquele agradecimento de coração.

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Aos meus alunos, que me dão tantas oportunidades de aprender e melhorar. Um agradecimento especial a todos os Famuners.

Aos meus familiares e amigos, será impossível nomear todos, agradeço a compreensão em relação às ausências necessárias para a conclusão dessa etapa e todo o apoio!

Aos meus pais, Dulcineia e Maurício Rinaldi, agradeço, com todo o amor, pelo apoio incondicional para que eu possa realizar meus projetos!

À minha mimã, Sis, Kamila Rinaldi, por ser a melhor amiga, o apoio imprescindível com comidinhas, ballet, filmes e música. Amor de irmã é amor incondicional!

Ao meu parceiro de jornada, Aluísio Victal: concluir essa pesquisa não seria possível sem você, sem sua presença, sem seu apoio nas coisas do dia a dia e sem sua capacidade de tornar os pequenos momentos extraordinários. Você e eu, de mãos dadas, com amor!

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RESUMO

A pesquisa discute o Sistema de Desenvolvimento das Nações Unidas (SDNU) e o processo de incorporação (mainstreaming) da Cooperação Sul-Sul (CSS) como parte regular de seus trabalhos na área do desenvolvimento, cobrindo o período de 1970-2015. A análise considera a história das ideias de desenvolvimento e CSS a partir das negociações políticas que ocorrem na sede na ONU, em Nova Iorque, entre a chamada Primeira ONU (formada por seus Estados-membros) e a Segunda ONU (formada pelos funcionários civis internacionais que trabalham para o Secretariado da organização). Com base na divisão Norte x Sul e nas barreiras atitudinais do Secretariado da ONU, a pesquisa discutirá os seguintes problemas: a incorporação da ideia de CSS no quadro normativo do SDNU; o impacto da incorporação operacional da CSS na governança do SDNU; e o financiamento da integração da CSS no SDNU. Devido ao seu papel em campo, a pesquisa dará destaque à atuação do Programa das Nações Unidas (PNUD) na promoção da CSS.

Palavras-chave: Cooperação Internacional para o Desenvolvimento; Cooperação Sul-Sul; Sistema de Desenvolvimento das Nações Unidas; Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento; Escritório das Nações Unidas para a Cooperação Sul-Sul.

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ABSTRACT

The research discusses the United Nations Development System (UNDS) and the process of mainstreaming South-South Cooperation (SSC) as part of its regular work in the area of development, covering the period of 1970-2015. The study considers the history of the ideas of development and SSC by analyzing political negotiations that occur at the United Nations (UN) Headquarters, in New York, between the so-called First UN (composed by its Member States) and the Second UN (composed by the international civil servants who work for the Secretariat). Based upon the North-South divide and the attitudinal barriers of the Secretariat, the research will discuss the following issues: the incorporation of the idea of SSC in the normative framework of the UNDS; the impact of the operational incorporation of SSC in the governance of the UNDS; and the financing for integrating SSC in the UNDS. Due to its role in the field, the research will highlight the performance of the United Nations Development Programme (UNDP) in the promotion of SSC. Keywords: International Development Cooperation; South-South Cooperation; United Nations Development System; United Nations Development Programme; United Nations Office for South-South Cooperation.

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LISTA DE IMAGENS, FIGURAS, GRÁFICOS E

QUADROS

IMAGENS

Imagem 1 – Embaixador Adebo (esq.) cumprimenta o Secretário-Geral U Thant (centro) na presença do artista Bem Enwonwu (dir.) ... 23 Imagem 2 – Estátua Anyanwu, de Ben Enwonwu ... 24

FIGURAS

Figura 1 – Emblema da Conferência das Nações Unidas sobre Cooperação Técnica entre Países em Desenvolvimento (1978) ... 113 Figura 2 – Tendência do financiamento total das atividades operacionais para o

desenvolvimento da ONU (recursos centrais e especificados, 1995-2014) ... 337 Figura 3 – Cota parte do comércio Sul-Sul no comércio global (1980-2011, em

porcentagem) ... 343 Figura 4 – Comparação entre os recursos do PNUD e da SU-SSC (2002-2010, em US$ 100 milhões de dólares para o PNUD e US$ milhões de dólares para a SU-SSC) ... 357 Figura 5 – Contribuições financeiras para o Fundo IBAS (em US$ dólares) ... 369 Figura 6 – Implementação financeira dos projetos do Fundo IBAS (em US$ dólares) 370

GRÁFICOS

Gráfico 1 – Qual seriam os impactos positivos das potências emergentes no SDNU quando comparadas aos países desenvolvidos?... 256 Gráfico 2 – Avaliação dos escritórios nacionais do PNUD sobre o progresso da CSS 289 Gráfico 3 – Contribuições voluntárias para o PNUD, por categoria de países (1960-1969, em porcentagem) ... 307 Gráfico 4 – Contribuições voluntárias para o PNUD, por categoria de países (1970-1978, em porcentagem) ... 312 Gráfico 5 – Contribuições para o SDNU* para o financiamento das atividades

operacionais para o desenvolvimento (1996-1999, em milhões de dólares) ... 326 Gráfico 6 – Alocações anuais de recursos do PGTF (1990-1999, em milhares de

dólares) ... 330 Gráfico 7 – Modalidades de financiamento não-central para as atividades operacionais para o desenvolvimento da ONU (2014, em porcentagem) ... 339 Gráfico 8 – Contribuições por tipos de doadores estatais (2013) ... 341

(12)

Gráfico 9 – Recursos concessionais para a Cooperação (2006-2013, em bilhões de dólares) ... 346 Gráfico 10 – Gastos e contribuições especificadas do PNUD (2006-2014, em bilhões de dólares) ... 356 Gráfico 11 – Recursos da SU-SSC e do UNOSSC (2001-2017, em US$ milhões de dólares) ... 358 Gráfico 12 – Recursos centrais da SU-SSC/do UNOSSC (2001-2011, em US$ milhões de dólares)... 359 Gráfico 13 – Recursos centrais da SU-SSC/UNOSSC por plataforma de ação (2005-2017, em US$ milhões de dólares) ... 360 Gráfico 14 – Contribuições para o Fundo das Nações Unidas para a Cooperação Sul-Sul (2004-2015, em US$ milhões de dólares) ... 363 Gráfico 15 – Recursos especificados da SU-SSC/UNOSSC por plataforma de ação (2005-2017, em US$ milhões de dólares) ... 364 Gráfico 16 – Contribuições dos Estados-membros do G-77 para o PGTF (2000-2015, em US$ milhares de dólares) ... 367 Gráfico 17 – Aprovação orçamentária do Fundo IBAS por região geográfica (2015, em porcentagem) ... 371 Gráfico 18 – Aprovação orçamentária do Fundo IBAS por área temática (2015, em porcentagem) ... 372

QUADROS

Quadro 1 – Papeis do SDNU na promoção da CSS ... 175 Quadro 2 – Ideias mobilizadas no BAPA e no Resultado de Nairóbi ... 181 Quadro 3 – Categoria e número de funcionários da SU-TCDC ... 216 Quadro 4 – Utilização de especialistas dos PEDs nos programas de cooperação técnica para o desenvolvimento da ONU (1983-1986)... 221 Quadro 5 – Contratação de empresas dos PEDs nos programas de cooperação técnica para o desenvolvimento da ONU (1983-1986)... 222 Quadro 6 – Resultados do desempenho da SU-SSC na implementação do Terceiro Quadro de Cooperação para a CSS (2005-2007) no PNUD ... 241 Quadro 7 – Incorporação da CSS nos UNDAFs a presença de pontos focais nos

escritórios nacionais ... 245 Quadro 8 – Avaliação dos coordenadores residentes acerca da contribuição do PNUD para a CSS (2003-2007) ... 246

(13)

Quadro 9 – Avaliação dos coordenadores residentes sobre a eficácia da SU-SSC em

integrar a modalidade em seu país, no PNUD e em outras agências da ONU ... 247

Quadro 10 – Número de funcionários da SU-SSC em 1998 e 2007 ... 248

Quadro 11 – Participação nos encontros do HLC-SSC (1997-2010) ... 260

Quadro 12 – Número de funcionários da SU-SSC, 1998-2010 ... 267

Quadro 13 – Ações prioritárias em nível global de integração da CSS no SDNU – Área de Avaliação (Assessment) ... 274

Quadro 14 – Ações prioritárias em nível global de integração da CSS no SDNU – Área de Integração... 275

Quadro 15 – Ações prioritárias em nível global de integração da CSS no SDNU – Área de Monitoramento do Progresso ... 277

Quadro 16 – Pesquisa sobre o envolvimento dos países e da ONU no apoio à CSS ... 286

Quadro 17 – Áreas de apoio da ONU para a promoção CSS (em número de respostas) ... 287

Quadro 18 – Tipos de instrumentos de financiamento do SDNU ... 301

Quadro 19 – Financiamento do EPTA, 1951 e 1956 ... 304

Quadro 20 – Alocação dos recursos do PNUD por agência executora (1967-1977, por porcentagem... 313

Quadro 21 – Uso das IPFs para o financiamento da CTPD (1985-1986, em milhões de dólares) ... 318

Quadro 22 – Uso das IPFs para o financiamento da CTPD (1987-1988, em milhares de dólares) ... 319

Quadro 23 – Recursos para o projeto “Promoção de ações orientadas para as atividades de CTPD” (1983-1984) ... 320

Quadro 24 – Gastos com CTPD por 12 entidades do SDNU (1985, em porcentagem) 322 Quadro 25 – Alocação anual dos recursos do PGTF (1987-1989, em milhares de dólares) ... 324

Quadro 26 – Uso dos IPFs do PNUD em CTPD (1989-1990, em milhares de dólares) ... 328

Quadro 27 – Recursos alocados para a SU-TCDC no Primeiro Quadro de Cooperação para a CTPD (1992-1996) ... 329

Quadro 28 – Contribuições de Estados-membros para o PGTF (1998-1999) ... 331

Quadro 29 – Co-financiamento de projetos entre o PGTF e outras instituições (1987-1996) ... 332

(14)

Quadro 31 – Tipos de instrumentos de financiamento da CSS ... 348 Quadro 32 – Orçamento das atividades e projetos de cooperação triangular (2012-2015, em US$ dólares) ... 354 Quadro 33 – Co-financiamento de projetos entre o PGTF e outras instituições (1997-2012) ... 368

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LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS

AAA Agenda de Ação de Accra

AGNU Assembleia Geral das Nações Unidas

AOD Assistência oficial ao desenvolvimento (do inglês, Official

Development Assistance)

BAPA Plano de Ação de Buenos Aires para a Promoção e a Implementação da Cooperação Técnica entre Países em Desenvolvimento (do inglês, Buenos Aires Plan of Action for Promoting and

Implementing Technical Cooperation among Developing Countries)

BICS Brasil, Índia, China e África do Sul

BRICS Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul

CAD-OCDE Comitê de Assistência ao Desenvolvimento da Organização para a Cooperação Econômica e Desenvolvimento (do inglês

Development Assistance Committee)

CEPAL Comissão Econômica da ONU para a América Latina (de 1948 a 1983); e Comissão Econômica da ONU para a América Latina e o Caribe (a partir de 1984).

CEPD Cooperação Econômica entre Países em Desenvolvimento

CNS Cooperação Norte-Sul

CSS Cooperação Sul-Sul

CTPD Cooperação Técnica entre Países em Desenvolvimento

DAD Diretório de Assistência ao Desenvolvimento (do inglês

Development Assistance Directorate)

DAG Grupo de Assistência ao Desenvolvimento (do inglês Development

Assistance Group)

DCD Diretório de Cooperação para o Desenvolvimento (do inglês

Development Co-operation Directorate)

DCF Fórum sobre Cooperação para o Desenvolvimento (do inglês,

Development Cooperation Forum)

ECA Comissão Econômica para a África (do inglês Economic

(16)

ECOSOC Conselho Econômico e Social das Nações Unidas

ECWA Comissão Econômica para a Ásia Ocidental (do inglês, Economic

Commission for Western Asia)

EPTA Programa Expandido de Assistência Técnica para o

Desenvolvimento Econômico dos Países Subdesenvolvidos (do inglês, Expanded Programme of Technical Assistance for

Economic Development of Under-developed Countries)

ESCAP Comissão Econômica e Social para a Ásia e o Pacífico (do inglês,

Economic and Social Commission for Asia and the Pacific)

FAO Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura (do inglês, Food and Agriculture Organization)

FMI Fundo Monetário Internacional

G-20 Grupo dos Vinte

G-77 Grupo dos Setenta e Sete

GATT Acordo Geral de Tarifas e Comércio (do inglês, General Agreement

on Tariffs and Trade)

GSSD-Academy Academia Global de Desenvolvimento Sul-Sul (do inglês, Global

South-South Development Academy)

GSSD-Expo Expo Global de Desenvolvimento Sul-Sul (do inglês, Global

South-South Development Expo)

HLC-SSC Comitê de Alto Nível para a Cooperação Sul-Sul (do inglês,

High-Level Committee on South-South Cooperation)

HLC-TCDC Comitê de Alto Nível para a Revisão da Cooperação Técnica entre os Países em Desenvolvimento (do inglês, High-Level Committee

on Technical Cooperation among Developing Countries)

IBAS Índia, Brasil e África do Sul

IED Investimentos externos diretos

INRES Sistema de Informação de Referência (do inglês, Information

Referral System)

IPFs Estimativas de Volume de Recursos (do inglês, Indicative Planning

Figures)

JICA Agência Japonesa de Cooperação Internacional do Japão (do inglês,

(17)

JUSCANZ Japão, Estados Unidos, Canadá, Austrália e Nova Zelândia MIST México, Indonésia, Coreia do Sul e Turquia

MNA Movimento dos Não-Alinhados

NOEI Nova Ordem Econômica Internacional

OCDE Organização para a Cooperação Econômica e Desenvolvimento

ODMs Objetivos de Desenvolvimento do Milênio

ODS Objetivos de Desenvolvimento Sustentável

OIC Organização Internacional do Comércio

OIs Organizações Internacionais

OIT Organização Internacional do Trabalho

OMC Organização Mundial do Comércio

OMS Organização Mundial da Saúde

ONU Organização das Nações Unidas

ONUDI Organização das Nações Unidas para o Desenvolvimento Industrial OPEP Organização dos Países Exportadores de Petróleo

OTAN Organização do Tratado do Atlântico Norte

PDs Países desenvolvidos

PEDs Países em desenvolvimento

PGTF Fundo Fiduciário Pérez Guerrero para a Cooperação Técnica e Econômica entre Países em Desenvolvimento/ Cooperação Sul-Sul (do inglês, Pérez Guerrero Trust Fund)

PIB Produto interno bruto

PNUD Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento

QCPR Revisão Política Compreensiva Quadrienal (do inglês, Quadrennial

Comprehensive Policy Review)

SDNU Sistema de Desenvolvimento das Nações Unidas

SPR Recursos para Programas Especiais (do inglês, Special Programme

Resources)

SS-GATE Sistema Global de Intercâmbio de Ativos e Tecnologia Sul-Sul (do inglês, South-South Global Assets and Technology Exchange) SUNFED Fundo Especial das Nações Unidas para o Desenvolvimento

Econômico (do inglês, Special United Nations Fund for Economic

(18)

SU-SSC Unidade Especial para a Cooperação Sul-Sul (do inglês, Special

Unit on South-South Cooperation)

SU-TCDC Unidade Especial para a Cooperação Técnica entre os Países em Desenvolvimento (do inglês, Special Unit on Technical

Cooperation among Developing Countries)

TCPR Revisão Política Compreensiva Trienal (do inglês, Triennial

Comprehensive Policy Review)

TODA ODA total (do inglês, Total Official Development Assistance) UNBISnet Sistema de Informações Bibliográficas das Nações Unidas (inglês,

United Nations Bibliographic Information System).

UNCTAD Conferência das Nações Unidas sobre Comércio e

Desenvolvimento (do inglês, United Nations Conference on Trade

and Development)

UNDAF Quadro de Ajuda ao Desenvolvimento das Nações Unidas (do inglês, United Nations Development Assistance Framework) UNDG Grupo de Desenvolvimento das Nações Unidas (do inglês, United

Nations Development Group)

UNESCO Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura

UNFPA Fundo Populacional das Nações Unidas

UNICEF Fundo das Nações Unidas para a Infância

UNOPS Escritório das Nações Unidas de Serviços para Projetos (do inglês,

United Nations Office for Project Services)

UNOSSC Escritório das Nações Unidas para a Cooperação Sul-Sul (do inglês,

United Nations Office on South-South Cooperation)

UNRRA Administração das Nações Unidas para Auxílio e Reabilitação (do inglês, United Nations Relief and Rehabilitation Administration) WIDE Rede de Informação para o Desenvolvimento (do inglês, Web of

(19)

SUMÁRIO

PRÓLOGO ... 23

INTRODUÇÃO ... 25

I. Recorte do objeto e objetivos ... 26

II. Problematização e conceitos centrais ... 29

III. Hipóteses e embasamento teórico ... 44

IV. Metodologia de pesquisa ... 48

PARTE 1 - O DESPERTAR DO SUL ... 52

A incorporação da ideia de Cooperação Sul-Sul no Sistema de Desenvolvimento das Nações Unidas ... 52

CAPÍTULO 1 - O PAPEL DAS IDEIAS NA COOPERAÇÃO INTERNACIONAL PARA O DESENVOLVIMENTO E AS ORIGENS DA IDEIA DE CSS NA ONU ... 54

1.1. As ideias e as decisões dos Estados-membros na Primeira ONU ... 55

1.2. As ideias e os arranjos de implementação da Segunda ONU ... 58

1.3. A ONU como um ator intelectual ... 62

1.4. Origens: a ideia de ajuda externa ao desenvolvimento, a consolidação do Terceiro Mundo e o papel da ONU (anos 1950-1960)... 64

1.4.1. A dádiva como razão de ser da cooperação internacional para o desenvolvimento: o contexto da Guerra Fria e o processo de descolonização ... 65

1.4.2. A ONU, o desenvolvimento e a criação das atividades de assistência técnica ... 69

1.4.3. O Espírito de Bandung ... 78

1.4.4. As demandas de desenvolvimento do Terceiro Mundo na ONU .. 83

1.4.5. A criação do PNUD ... 89

CAPÍTULO 2 – A EMERGÊNCIA E CONSOLIDAÇÃO DA IDEIA DE COOPERAÇÃO TÉCNICA ENTRE PAÍSES EM DESENVOLVIMENTO COMO UMA NOVA DIMENSÃO DA COOPERAÇÃO TÉCNICA TRADICIONAL DA ONU (ANOS 1970-1980) ... 95

2.1. Origens: a Nova Ordem Econômica Internacional e a ideia da CTPD 96 2.2. As primeiras iniciativas desenvolvidas pelo SDNU nos anos 1970: a ideia de CTPD como uso das capacidades nacionais ... 102

2.3. A Conferência de Buenos Aires e seu Plano de Ação: ideia de autossuficiência nacional e coletiva ... 108

2.3.1. Preparação para a Conferência ... 108

2.3.2. As negociações em Buenos Aires ... 111

2.3.3. O conteúdo do Plano de Ação de Buenos Aires (BAPA) ... 118

(20)

CAPÍTULO 3 – A IDEIA DE COOPERAÇÃO SUL-SUL E SUA

INCORPORAÇÃO NO SISTEMA DE DESENVOLVIMENTO DAS NAÇÕES UNIDAS (ANOS 1990-2000) ... 133

3.1 A cooperação entre os países em desenvolvimento na era da

globalização: as Novas Direções (1995) ... 134 3.1.1 Novas Direções: a ideia de integração entre a cooperação técnica e a cooperação econômica entre os países em desenvolvimento e o papel dos países-pivô ... 141 3.2 As chamadas potências emergentes e o redespertar da Cooperação Sul-Sul nos anos 2000 ... 146

3.2.1 A incorporação da CSS no SDNU entre 2000 a 2006 ... 152 3.3 A reação dos países desenvolvidos: os princípios da eficácia da ajuda

158

3.4 A Conferência de Alto Nível da ONU sobre Cooperação Sul-Sul e o Resultado de Nairóbi: as ideias atuais de Cooperação Sul-Sul ... 163

3.4.1 O Resultado de Nairóbi ... 167 3.5 O Quadro de Diretrizes Operacionais sobre o Apoio das Nações Unidas à Cooperação Sul-Sul e Triangular (2012) e a inclusão da

modalidade na Agenda 2030 ... 172 CONSIDERAÇÕES PARCIAIS DA PARTE I ... 179 PARTE 2 - O LUGAR DO SUL AO SOL ... 183 O impacto da Cooperação Sul-Sul na governança do Sistema de Desenvolvimento das Nações Unidas ... 183

CAPÍTULO 4 – O CONCEITO DE GOVERNANÇA DO SDNU E O LUGAR DA CSS ... 184

4.1 O conceito de governança global ... 185 4.2 O (não)-papel da ONU na governança econômica global e as

mudanças na área da cooperação internacional para o desenvolvimento .. 187 4.3 A governança do SDNU ... 192 4.4 A governança do SDNU para a CSS ... 198 CAPÍTULO 5 – AS FASES DA GOVERNANÇA DO SDNU E A

INCORPORAÇÃO OPERACIONAL DA CSS ... 205 5.1 Fase 1 – As origens funcionalistas da governança do SDNU (1945-1950) 206

5.2 Fase 2 – A consolidação da estrutura nacional de governança do SDNU e as barreiras atitudinais à integração da CTPD (1960-1980) ... 207

5.2.1 A governança do SDNU para a CTPD nos anos 1970:

estabelecimento de pontos focais e procedimentos para o uso da CTPD nos programas de cooperação técnica ... 209 5.2.2 A governança do SDNU para a CTPD nos anos 1980: enfrentando as barreiras atitudinais ... 214

(21)

5.2.2.2. PNUD ... 219

5.2.2.3. Pontos focais das entidades do SDNU ... 223

5.3 Fase 3 – A descentralização e fragmentação da governança do SDNU e as tentativas de padronização sistêmica da CTPD (1990 aos dias atuais) 226 5.3.1 As Diretrizes Revisadas para a Revisão de Políticas e Procedimentos relativos à CTPD (1997 e 2003) ... 229

5.3.2 A relação entre o PNUD e a SU-TCDC e os Quadros de Cooperação para a CTPD (1997-1999; 2001-2003; 2005-2007) ... 234

5.3.2.1 Primeiro Quadro de Cooperação para a CTPD (1997-1999) . 234 5.3.2.2 Segundo Quadro de Cooperação para a CTPD (2001-2003) . 236 5.3.2.3 Terceiro Quadro de Cooperação para a CSS (2005-2007) .... 239

5.3.2.4 Quarto Quadro de Cooperação para a CSS (2009-2011) ... 242

5.3.3 A avaliação do PNUD sobre sua contribuição para a integração da CSS (1996-2007) ... 243

CAPÍTULO 6 – AS LACUNAS DA GOVERNANÇA DO SDNU PARA A INCORPORAÇÃO DA CSS (2008-2015) ... 249

6.1 Lacunas de conhecimento ... 250

6.2 Lacunas normativas ... 255

6.3 Lacunas institucionais ... 264

6.4 Lacunas políticas ... 270

6.4.1 A coordenação sistêmica da CSS por meio da Revisão Política Compreensiva Trienal/Quadrienal ... 271

6.4.2 Quadro de Diretrizes Operacionais sobre o Apoio das Nações Unidas à Cooperação Sul-Sul e Triangular (2012) ... 273

6.4.3 Quadro Estratégico do UNOSSC (2014- 2017) ... 278

6.4.4 Planos Estratégicos do PNUD (2008-2011 e 2014-2017)... 281

6.4.5 Estratégia do PNUD para Acelerar a Cooperação Sul-Sul e Triangular para o Desenvolvimento Sustentável (2016) ... 282

6.5 Lacunas de cumprimento (compliance) ... 285

CONSIDERAÇÕES PARCIAIS DA PARTE II ... 291

PARTE 3 – A GRADUAÇÃO DO SUL? ... 294

O financiamento da integração da Cooperação Sul-Sul no SDNU ... 294

CAPÍTULO 7 – A ESTRUTURA DE FINANCIAMENTO DO SDNU E O FINANCIAMENTO DA CSS (1945-1990) ... 296

7.1 A estrutura de financiamento do SDNU ... 297

7.2 A criação dos primeiros instrumentos de financiamento da cooperação técnica para o desenvolvimento na ONU (1945-1960) ... 303

7.3 A crise financeira do SDNU e o estabelecimento dos instrumentos de financiamento da CTPD (1970-1980) ... 308

7.3.1. A questão do financiamento da CTPD no BAPA (1978) ... 314

7.3.2. As tentativas de sistematização do financiamento do SDNU para a CTPD nos anos 1980 ... 316

(22)

7.3.2.1 O uso das IPFs ... 316 7.3.2.2 Recursos para Programas Especiais ... 319 7.3.2.3 Uso dos recursos pelas entidades do SDNU ... 320 7.3.2.4 Fundo Fiduciário Pérez Guerrero para a Cooperação Técnica e Econômica entre Países em Desenvolvimento (PGTF) ... 323 7.4 A descentralização do financiamento do SDNU e da CTPD (1990)

325

7.4.1 O financiamento da CTPD nos anos 1990 ... 327 7.4.1.1 A especificação de recursos centrais do PNUD para a CTPD 327 7.4.1.2 Os recursos da SU-TCDC: o Primeiro Quadro de Cooperação para a CTPD e o Fundo Fiduciário para a Cooperação Sul-Sul ... 328 7.4.1.3 Medidas para a expansão dos recursos do PGTF ... 330 CAPÍTULO 8 – OS CHAMADOS DOADORES EMERGENTES E O

FINANCIAMENTO DA CSS NOS ANOS 2000 ... 334 8.1 O financiamento do SDNU nos anos 2000 ... 335 8.2 Os doadores emergentes e os tipos de financiamento da CSS ... 341 8.2.1 A ascensão do Sul ... 342 8.2.2 Doadores emergentes e o financiamento da CSS ... 345 8.2.3 Tipos de instrumentos de financiamento da CSS ... 347 8.3 A reação do CAD-OCDE: cooperação triangular, eficácia da ajuda e graduação dos doadores emergentes ... 350 8.4 O financiamento do SDNU destinado à CSS ... 355 8.4.1 Recursos centrais ... 359 8.4.2 Recursos especificados: Fundo das Nações Unidas para a

Cooperação Sul-Sul ... 362 8.4.3 Recursos Especificados: Fundo Fiduciário Pérez Guerrero (PGTF)

367

8.4.4 Recursos especificados: Fundo IBAS para o Alívio da Pobreza e da Fome 368

CONSIDERAÇÕES PARCIAIS DA PARTE III ... 374 CONSIDERAÇÕES FINAIS ... 378 Para ver a Cooperação Sul-Sul, é necessário sair de Nova York ... 378 ANEXO – TRANSCRIÇÃO DA ENTREVISTA COM DIPLOMATA BRASILEIRO ... 423

(23)

PRÓLOGO

Em um dia de curso na sala do Conselho Econômico e Social, na sede Organização das Nações Unidas (ONU), por ocasião de meu doutorado sanduíche na cidade de Nova York, ao passar pelo corredor entre a sala do Conselho de Segurança e do Conselho de Tutela me deparei com uma enorme estátua de bronze, de uma mulher lânguida. Na inscrição: “Presenteada pelo Governo e pelo Povo da República da Nigéria”.

Ao final do dia, fui até o Centro de Informações Públicas da ONU, e solicitei o guia de presentes dados à organização, que fica disponível para a consulta de visitantes. Eis que me deparei com a história de Anyanwu, que muito refletia o espírito da pesquisa que fui realizar nessa jornada:

Em 5 de outubro 1966, na sede da ONU, em Nova York, o Embaixador nigeriano Simeon Olaosebikan Adebo presenteou o então Secretário-Geral das Nações Unidas, U Thant, com uma estátua de bronze intitulada Anyanwu (O Despertar), criada pelo renomado escultor e artista nigeriano Ben Enwonwu.

Imagem 1 – Embaixador Adebo (esq.) cumprimenta o Secretário-Geral U Thant (centro) na presença do artista Bem Enwonwu (dir.)

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Anyanwu é uma das maiores obras de Enwonwu, por mesclar as tradições estéticas da tribo Edo-Onitsha (da qual o artista descendia) com as formas de representação e técnicas plásticas ocidentais. A escultura de bronze, de quase 2 metros, apresenta uma mulher graciosamente vestida com trajes reais e adornada com joias. Sua postura imponente remete à uma representação simbólica do despertar do sol (THE BEN ENWONWU FOUNDATION, 2014; OKEKE-AGULU, 2016).

Imagem 2 – Estátua Anyanwu, de Ben Enwonwu

Fonte: ONU/Michos Tzovaras

O presente foi dado à ONU em comemoração aos 6 anos de independência da Nigéria, com o objetivo de representar as aspirações de autonomia e liderança global do país recém independente. Além disso, a estátua ganhou simbolismo internacional: uma representação da emergência das nações que, desde os anos 1960, iriam se identificar como o Terceiro Mundo e travar uma luta política por uma ordem global mais justa e inclusiva.

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INTRODUÇÃO

Uma das maiores contribuições da Organização das Nações Unidas (ONU) em seus mais de 70 anos de existência refere-se ao seu papel no debate sobre a promoção do desenvolvimento. Sua importância vai desde a definição de conceitos e normas internacionais, passando pela negociação de agendas globais de desenvolvimento, e, principalmente, por sua capacidade de forjar compromissos e consensos entre os Estados-membros.

A ONU não é uma organização monolítica, e apresenta diferentes camadas e dimensões. Por isso, no debate sobre o desenvolvimento, nem sempre a organização se posicionou em conformidade com os interesses das grandes potências que a criaram. Pelo contrário, em vários momentos de sua história, articulou mecanismos normativos e institucionais para atender às demandas dos países em desenvolvimento (PEDs), como é o caso de seu apoio na promoção da Cooperação Sul-Sul (CSS).

A CSS é uma modalidade de cooperação entre os países em desenvolvimento que emergiu nos anos 1960, e envolve projetos de cooperação técnica e econômica orientados por uma abordagem horizontal. Na CSS, todos os elementos (inputs) são oriundos de PEDs, como o uso de especialistas, serviços e equipamentos; e a transferência e compartilhamento de conhecimentos, soluções, competências e tecnologia.

Desde a década de 1970, a ONU – e mais especificamente, o Sistema de Desenvolvimento das Nações Unidas (SDNU), composto pelas agências e pelos fundos e programas da ONU dedicados à promoção do desenvolvimento – deu suporte normativo, institucional, operacional e financeiro para que os PEDs pudessem aprofundar seus laços de Cooperação Sul-Sul por meio do intercâmbio de soluções para seus problemas de desenvolvimento.

Entretanto, o apoio do SDNU à CSS ao longo das décadas foi muito mais declaratório do que operacional; muito mais ad hoc e calcado em iniciativas individuais do que em um processo sistematizado de apoio. Isso porque o trabalho da organização na área da cooperação internacional para o desenvolvimento foi historicamente definido pela lógica da Cooperação Norte-Sul (CNS), isto é, de transferência de recursos, tecnologias e políticas de desenvolvimento dos PDs para os PEDs, fazendo a ponte entre os países doadores e os países recipiendários.

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Já a CSS exigiria que o SDNU trabalhasse de maneira diferente da que estava acostumada, a partir de uma lógica horizontal de cooperação. O sistema teria que dar o suporte para que os próprios PEDs encontrassem as soluções de desenvolvimento mais adequadas a seus respectivos contextos, e ao longo das décadas de 1980-1990, fazer essa transição enfrentou várias dificuldades ideacionais, organizacionais e financeiras.

Com a nova projeção da CSS nos anos 2000, a partir da liderança política e do crescimento econômico das chamadas potências emergentes – como China, Brasil, Índia e África do Sul – houve uma revitalização do debate sobre como o SDNU poderia dar um suporte mais apropriado à cooperação entre os países em desenvolvimento. Esse debate ficou conhecido no interior da organização como o processo de incorporação, ou integração (do inglês, mainstreaming) da CSS aos trabalhos regulares do SDNU, sendo esse o objeto de estudo dessa pesquisa. Nos itens a seguir, serão apresentados o recorte do objeto de pesquisa e seus objetivos; a problematização e os conceitos centrais; as hipóteses e o embasamento teórico; e a metodologia de pesquisa.

I. Recorte do objeto e objetivos

Essa pesquisa tem por objeto o SDNU e o processo de incorporação (mainstreaming) da CSS aos seus trabalhos regulares. O conceito de incorporação (ou integração) é muito importante para o SDNU, pois trata-se de um mecanismo criado para que o sistema possa se adaptar e se tornar responsivo à novas demandas, agendas e modalidades de cooperação1.

De acordo com a ONU, “incorporação (mainstreaming) significa transformar uma ideia em prática, ao integrá-la em tudo o que a organização faz. Mas, para fazer isso, há a necessidade de ferramentas, orientação, monitoramento contínuo e uma estratégia abrangente, com objetivos claros e marcos de referência para sua realização” (UNITED NATIONS DEVELOPMENT PROGRAMME, 2013 a, p. 27, tradução nossa2). No caso

1 Na ONU, a questão da incorporação (mainstreaming) teve sua origem nos anos 1990 com a agenda de

gênero da organização, mas o termo foi progressivamente sendo utilizado para se referir à incorporação de novos temas e agendas.

2 Do original: “Mainstreaming means making an idea practical by integrating it into everything the

organization does. But to do this, there is a need for tools, guidance, continuous monitoring and an overarching strategy with clear objectives and benchmarks for achievement” (UNITED NATIONS DEVELOPMENT PROGRAMME, 2013 a, p. 27).

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específico da CSS, integrar a modalidade ao SDNU envolve “(...) avaliar as políticas e práticas corporativas atuais, conscientizar os funcionários sobre os benefícios da CSS e, quando necessário, iniciar atividades de desenvolvimento de capacidades” (UNITED NATIONS DEVELOPMENT PROGRAMME, 2013 b, p. 39, tradução nossa3).

A pesquisa se inicia no período de 1970, quando a discussão sobre a modalidade é introduzida pela primeira vez como um item da agenda da ONU. E vai até 2015, quando a CSS é identificada como um meio de implementação da Agenda 2030 para o Desenvolvimento Sustentável, a mais recente agenda global que orientará, nos próximos 15 anos, as ações da ONU no campo do desenvolvimento.

Em relação ao conteúdo da análise, o processo de integração da CSS contempla o engajamento do SDNU em dois tipos de atividades: as atividades promocionais da CSS; e as atividades operacionais de CSS.

As atividades promocionais são voltadas para a divulgação e conscientização da CSS em todas as partes do SDNU. Buscam identificar o potencial, colocar as partes interessadas em contato e coletar, processar e disseminar informações sobre a CSS. Para que isso ocorra, as atividades promocionais envolvem a realização de workshops, seminários e programas de informação; e atividades de curta duração, como projetos piloto, melhores práticas e treinamentos.

Já as atividades operacionais são aquelas realizadas em campo. Fazem referência aos projetos e programas de desenvolvimento realizados pelas agências e pelos fundos e programas que compõem o SDNU e que contém como elementos a troca e o compartilhamento de recursos e capacidades técnicas entre dois ou mais PEDs, em bases horizontais. Para que isso ocorra, a CSS deve ser incluída no desenho, na execução e implementação dos programas nacionais.

A escolha do tema e do objeto de pesquisa se justifica pelo esforço de complementar a história intelectual da ONU na área do desenvolvimento, enfatizando a contribuição dos PEDs nesse processo. A CSS é uma parte pequena da cooperação internacional para o desenvolvimento e das atividades operacionais para o desenvolvimento da ONU, e também não é a modalidade dominante, nem em volume de recursos nem em número de projetos. Enquanto os doadores tradicionais de assistência oficial ao desenvolvimento despenderam quase US$ 140 bilhões em 2014, o montante

3 Do original: “(…) assessing the current corporate policies and practices, raising the awareness of staff

about the benefits of SSC and where necessary embark into capacity development activities” (UNITED NATIONS DEVELOPMENT PROGRAMME, 2013 b, p. 39).

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que os PEDs destinaram ao financiamento da CSS foi de um pouco mais de US$ 20 bilhões no mesmo ano (UNITED NATIONS ECONOMIC AND SOCIAL COUNCIL, 2016, p. 4). Já em relação ao número de projetos, em 2015, o Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD) desenvolveu 470 iniciativas em que a CSS era o meio de implementação, em contraste com o total dos 4.347 projetos conduzidos pela agência (UNITED NATIONS DEVELOPMENT PROGRAMME, 2015).

Mas, a despeito de seu menor volume relativo, a CSS é, sem dúvidas, uma modalidade em ascensão, e que está ocupando um espaço de destaque nos debates do SDNU sobre a promoção do desenvolvimento. Por isso, é importante sistematizar o conhecimento que organização desenvolveu nessa área, em um período de quarenta anos, utilizando duas perspectivas: política e sistêmica.

Política, porque o enfoque será nas negociações políticas entre os Estados-membros, com a participação dos funcionários da organização, para definir os quadros normativos e estratégicos que orientam essa incorporação. Esses quadros são estabelecidos por meios de documentos oficiais da ONU, como resoluções, decisões, diretrizes operacionais e quadros estratégicos.

E sistêmica, porque a análise irá considerar as decisões tomadas nas instâncias decisórias de mais alto nível na governança da organização. As decisões de alto nível são sistêmicas porque elas definem mandatos que devem guiar os trabalhos de todas as demais entidades do SDNU, e devem ser incorporadas em todos os seus níveis.

Ao optar pela perspectiva política e sistêmica, alguns aspectos deixarão de ser contemplados pela pesquisa. Em primeiro lugar, não será feita uma discussão de como a CSS se tornou um item da agenda de política externa dos países em desenvolvimento4.

Como o objeto de estudo é o SDNU e a incorporação da CSS, o posicionamento dos países será discutido a partir da disputa de ideias e do conflito de interesses que ocorre no espaço multilateral da ONU. Assim, ao invés da análise ser feita da perspectiva de política externa de um ou outro país, ela terá como enfoque o contexto particular de negociações no interior da ONU, problematizando como as posições individuais e coletivas dos Estados-membros são canalizadas no ambiente específico de uma organização internacional de cooperação.

4 Há vários trabalhos relevantes que cumprem esse propósito. Por exemplo, cf. Chaturvedi et al., 2012, que

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Em segundo lugar, a pesquisa não fará estudos de caso mostrando a operacionalização dos projetos de CSS em diferentes áreas e países, nem uma análise técnica do desenho de projetos e as vantagens e dificuldades de operação em campo. Por isso, não discutirá se a CSS, em campo, efetivamente traz benefícios mútuos ou se reproduz algumas das práticas dos doadores tradicionais. Indubitavelmente esse é um tema relevante, mas não faz parte do escopo dessa pesquisa. Ao invés dos estudos de caso, serão analisadas as avaliações realizadas pelas entidades do SDNU acerca de seus resultados em campo, pois esses são os documentos considerados na tomada de decisão dos Estados-membros em âmbito sistêmico. Dentre essas avaliações, a de mais destaque é a do PNUD, que historicamente é a entidade do SDNU mais envolvida com a promoção da CSS em âmbito sistêmico. Assim, a perspectiva sistêmica implica que a análise das negociações será feita com o enfoque de Nova York, isto é, da sede da ONU.

O principal objetivo dessa pesquisa é o de analisar como a incorporação da CSS ao SDNU é um processo político polêmico, pois tenciona vários problemas em relação às ideias e interesses dos Estados-membros e da burocracia da ONU na área do desenvolvimento. A pesquisa busca entender o sentido de integrar a CSS ao SDNU e os entraves a esse processo. Diferentemente de outras áreas que passaram pelo processo de integração no SDNU – como gênero, direitos humanos e sustentabilidade ambiental – a CSS não é um tema, mas uma modalidade específica de implementação de projetos na área da cooperação para o desenvolvimento. Isso torna sua incorporação mais complexa, ao exigir do SDNU uma mudança em relação ao seu paradigma atual de desenvolvimento, como será apresentado a seguir nessa introdução.

Por fim, a pesquisa destina-se principalmente às partes envolvidas no trabalho da ONU na área da CSS, como diplomatas, funcionários da organização, especialistas e consultores, uma vez que a pesquisa apresenta os principais elementos que serão discutidos nas negociações preparatórias para a Conferência de Alto Nível da ONU sobre a Cooperação Sul-Sul, que será realizada em 2019, em Buenos Aires.

II. Problematização e conceitos centrais

A pesquisa foi desenvolvida a partir de alguns conceitos centrais, que serão apresentados a seguir: o Sistema de Desenvolvimento das Nações Unidas e as atividades operacionais para o desenvolvimento; a cooperação internacional para o desenvolvimento

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e suas modalidades de Cooperação Norte-Sul e Cooperação Sul-Sul; as diferenças e as relações entre a chamada Primeira ONU, marcada pelo conflito Norte x Sul; e a chamada Segunda ONU, marcada pelas barreiras atitudinais; e as instâncias decisórias do SDNU referentes à incorporação da CSS.

O Sistema de Desenvolvimento das Nações Unidas e as atividades operacionais para o desenvolvimento

O Sistema de Desenvolvimento das Nações Unidas (SDNU) é responsável pelas atividades da organização atreladas ao pilar do desenvolvimento5. Atualmente, é

composto por mais de 30 entidades, dentre elas, fundos, programas, escritórios e agências especializadas, além de comissões e organizações de pesquisa e treinamento que dão suporte às atividades em campo.

Juntas, essas muitas partes do sistema executam as chamadas atividades operacionais para o desenvolvimento. Essas atividades envolvem todas as ações em campo destinadas à promoção do desenvolvimento sustentável e que não se confundem com assistência humanitária. As atividades operacionais para o desenvolvimento correspondem aproximadamente a 60% do gasto total anual da ONU e empregam a maior parte dos funcionários em tempo integral – da sede aos escritórios nacionais –, por volta de 50 mil pessoas (BROWNE; WEISS, 2013, p. 2).

Mas as ações do SDNU não são exatamente coesas e coordenadas, como o termo sistema pode dar a entender. Isso porque a estrutura da ONU de promoção do desenvolvimento foi sendo historicamente construída em partes, a partir de duas características. A primeira é a proliferação de várias entidades independentes (e uma infinidade de siglas para denominar cada uma delas), separadas por uma divisão funcional do trabalho. A segunda característica é sua coordenação descentralizada, baseada em uma governança de dois níveis: o nível sistêmico dos órgãos decisórios (AGNU e ECOSOC) e o nível específico das agências (por meio de seus Conselhos Executivos). Além disso, a governança do SDNU também envolve o nível nacional, por meio de mecanismos de coordenação política entre governos e os chefes das entidades da ONU, que fazem arranjos definidores das prioridades em campo a partir dos escritórios nacionais.

5 Os trabalhos da ONU são divididos em três pilares. Além do desenvolvimento, há o pilar da paz e

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A cooperação internacional para o desenvolvimento e suas modalidades: a Cooperação Norte-Sul e a Cooperação Sul-Sul

A cooperação internacional para o desenvolvimento é definida como as interações intencionais e coordenadas entre os Estados para atingir objetivos comuns na área do desenvolvimento. A cooperação internacional para o desenvolvimento apresenta três características:

i) Seu objetivo central é apoiar as prioridades nacionais e internacionais de promoção do desenvolvimento, por meio da redução das desigualdades econômicas e sociais entre os países ricos e os países pobres;

ii) As ações coletivas são necessariamente discriminatórias a favor dos PEDs, isto é, deliberadamente criam oportunidades de desenvolvimento para esses países. Por isso, elas não são orientadas para o lucro, e sim para remover as barreiras existentes na promoção do desenvolvimento;

iii) O sucesso da cooperação internacional para o desenvolvimento é mensurado por sua capacidade de construir capacidades nos PEDs e garantir o controle nacional desses países sobre seu desenvolvimento (ALONSO; GLEENIE, 2015, pp. 1-2).

Em termos concretos, a cooperação internacional para o desenvolvimento pode envolver várias atividades operacionais, como a promoção do comércio, a transferência líquida de recursos para os PEDs, o financiamento e a implementação de grandes projetos de infraestrutura, etc. No caso do SDNU, sua área de especialização foi a cooperação técnica para o desenvolvimento, relacionada à transferência de conhecimentos técnicos e à construção de capacidades. A cooperação técnica envolve o recrutamento e a oferta de pessoal qualificado; a realização de treinamentos e transferência tecnologia; a contratação de equipamentos; a oferta de serviços de consultoria e planejamento; e a realização de pesquisas de viabilidade, estudos pré-investimento e apoio institucional.

O envolvimento da ONU na cooperação técnica para o desenvolvimento data desde sua criação, em 1945, para dar suporte à chamada Cooperação Norte-Sul (CNS). Os primeiros mecanismos do SDNU foram criados justamente para atender aos interesses das políticas externas dos países industrializados em prestar ajuda (aid) aos países não-industrializados (e, naquele momento, recém-independentes em sua maioria), por meio da transferência líquida de recursos, chamada de assistência oficial ao desenvolvimento (AOD).

(32)

A CNS, também chamada de cooperação técnica tradicional, está baseada em um paradigma verticalizado, que parte dos países doadores e chega aos países recipiendários. Nessa modalidade, o SDNU seria a responsável por fazer a ponte institucional entre essas duas partes e coordenar os projetos de cooperação técnica em campo. A AOD era então alocada pela ONU para a construção de capacidades nos países recipiendários, por meio de estudos de viabilidade de obras de infraestrutura, da implementação de técnicas produtivas em setores como agricultura e indústria, da organização de sistemas públicos, como saúde e educação, de treinamentos de funcionários e técnicos, etc.

Apesar da importância da AOD para acelerar o desenvolvimento, desde os anos 1960 os PEDs apresentam três críticas à CNS, e utilizaram-se da estrutura da ONU para vocalizar suas visões e demandas. Primeiramente, porque a concessão da AOD é vinculada (tied) à compra de bens e serviços e ao uso de especialistas e profissionais dos países doadores, reforçando a dependência econômica em relação aos PDs e elevando os custos da cooperação. Em segundo lugar, devido às condicionalidades políticas e econômicas impostas para o dispêndio da ajuda, que estabelecem determinados alinhados políticos (como no caso do conflito bipolar) ou a necessidade de reformas liberalizantes (como no período pós-Guerra Fria). Em terceiro lugar, as soluções de desenvolvimento transferidas aos PEDs geralmente vêm em pacotes prontos, com soluções emuladas da realidade dos PDs, e, por isso, têm pouca eficácia diante dos contextos históricos e de desenvolvimento tão diferentes entre PDs e PEDs.

Como alternativa à cooperação tradicional, a Cooperação Sul-Sul (CSS) é uma modalidade na qual dois ou mais PEDs concertam esforços de desenvolvimento por meio do uso de serviços, equipamentos e especialistas originários de países em condições históricas e de desenvolvimento semelhantes. Ao invés do paradigma verticalizado entre doadores e recipiendários, a CSS é conduzida por uma perspectiva horizontal, de reciprocidade e mútuo-benefício, com projetos personalizados à realidade em campo. A modalidade é, portanto, guiada pelos seguintes princípios: “(...) respeito pela soberania nacional, apropriação nacional e independência, igualdade, não-condicionalidade, não interferência nos assuntos domésticos e benefício mútuo” (UNITED NATIONS GENERAL ASSEMBLY, 2009 a, p. 2, tradução nossa6).

6 Do original: “(…) respect for national sovereignty, national ownership and independence, equality,

non-conditionality, non-interference in domestic affairs and mutual benefit” (UNITED NATIONS GENERAL ASSEMBLY, 2009 a, p. 2).

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É importante diferenciar as relações Sul-Sul – isto é, o quadro mais geral de contatos, intencionais ou não-intencionais, entre os PEDs – da CSS, que é uma modalidade da cooperação internacional para o desenvolvimento, e, por isso, engloba as três características apresentadas anteriormente. Também é necessário distinguir as duas sub-modalidades de CSS: a Cooperação Técnica entre os Países em Desenvolvimento (CTPD) e a Cooperação Econômica entre os Países em Desenvolvimento (CEPD). Apesar de serem modalidades complementares, a CTPD é voltada para o uso de bens, serviços, tecnologias, consultores e técnicos oriundos dos PEDs; já a CEPD refere-se à promoção do comércio exterior, dos investimentos e das relações financeiras e monetárias entre os PEDs.

Desde os anos 1970, o SDNU passou a formalmente apoiar a promoção da CSS como parte de suas atividades operacionais para o desenvolvimento e, com a liderança dos PEDs, os primeiros quadros normativos e estratégicos foram criados para tanto. Mas até 1995, a promoção da CSS no âmbito do SDNU era exclusivamente vinculada à CTPD. A partir de então, iniciou-se um esforço de integrar as duas sub-modalidades, até que, em 2004, o SDNU passou a usar o termo CSS para se referir a ambas, a CTPD e a CEPD, em conjunto. Porém, na prática, os esforços do sistema ainda são prioritariamente voltados para a promoção da CTPD.

A Primeira ONU e a Segunda ONU

O processo de integração da CSS nos trabalhos regulares do SDNU é historicamente permeado por tensões e conflitos em dois âmbitos: o da chamada Primeira ONU, formada pelos Estados-membros dessa organização; e o da chamada Segunda ONU, referente aos funcionários do Secretariado que fazem a gestão dos diferentes órgãos, agências, fundos, escritórios e programas responsáveis por projetos na área de desenvolvimento.

A relação entre essas Duas ONUs é muitas vezes ignorada por aqueles que têm um olhar de fora da organização, mas ela é central e muito palpável na vivência prática e nas negociações que ocorrem em Nova York. Essa distinção foi feita pela primeira vez por Inis Claude (1996, p. 290) e depois explorada por Weiss et al. (2009 a, p. 125) no

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bojo do Projeto sobre a História Intelectual da ONU7. As Duas ONUs não se tratam de

dois entes que se somam, mas sim dois aspectos, ou duas identidades, de uma organização complexa. Ao mesmo tempo, embora as duas ONUs sejam mutuamente dependentes, elas possuem mandatos, funções e capacidades distintas e complementares8.

A Primeira ONU é formada pelo conjunto de seus 193 Estados-membros, signatários da Carta de São Francisco. Trata-se de uma organização intergovernamental na qual os Estados-membros são os únicos responsáveis por sua existência, e, por isso, dotados de poder de tomada de decisão (CLAUDE, 1996, p. 291). Na Primeira ONU, o desenvolvimento e a efetivação do quadro multilateral dependem prioritariamente da vontade política dos Estados, uma vez que não há nenhuma instância supranacional capaz de impor-lhes as decisões.

Cada Estado-membro é representado na ONU por uma delegação, formada por um conjunto de delegados, que são os diplomatas ou outros funcionários nacionais indicados para representar os interesses nacionais na organização. É importante diferenciar a figura institucional do delegado da do diplomata. Quando o representante faz uso da palavra como delegado, ele expressa oficialmente a política externa de seu país; por sua vez, quando se posiciona apenas como diplomata, ele é identificado por sua profissão, que é um funcionário de carreira. Por isso, o diplomata é uma pessoa que possui convicções e ideias pessoais. Muito embora esses papeis se confundam na prática, nessa pesquisa, a distinção entre delegado e diplomata é usada, respectivamente, para identificar a posição oficial de um representante de Estado e as habilidades e crenças pessoais desse representante.

7 O Projeto sobre a História Intelectual da ONU (em inglês, United Nations Intellectual History Project –

UNIHP) foi coordenado pelos professores Thomas G. Weiss, Louis Emmerij e Richard Jolly, do Ralph Bunche Institute for International Studies (Graduate Center – City University of New York). De 1999 a 2010, o projeto dedicou-se a reconstituir a contribuição da ONU no campo das ideias. Ao identificar a ONU como ator intelectual, as publicações do projeto ressaltam como ideias geradas em diferentes áreas dessa organização ganharam tração em seu bojo institucional (UNITED NATIONS INTELLECTUAL HISTORY PROJECT, 2011).

8 É importante notar que Claude (1996) usa a expressão Primeira ONU para o Secretariado e Segunda ONU

para os Estados-membros. Porém, Weiss et al. (2009 a) decidem por inverter as expressões, para enfatizar o caráter intergovernamental da organização. Aqui, concordamos com a inversão feita pelos autores, por entender ser mais lógico que os Estados-membros sejam a Primeira ONU. Weiss et al. também adicionam uma Terceira ONU, que envolve a atuação de atores que não são formalmente membros ou funcionários da ONU, mas que influenciam e afetam seus trabalhos, como os consultores e especialistas, as organizações da sociedade civil e as instituições do mercado. Nessa pesquisa, a atuação da Terceira ONU será analisada apenas indiretamente, por meio da contribuição de certos acadêmicos ao debate, uma vez que o cerne do processo de incorporação da CSS se dá a partir da relação entre a Primeira ONU e a Segunda ONU.

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A dinâmica da Primeira ONU depende da articulação entre as diferentes posições dos Estados-membros. Por isso, uma particularidade das negociações é o foco no consenso, ou seja, a busca pela adoção de resoluções sem voto (embora nem sempre isso seja possível). O consenso não deve ser confundido com unanimidade, e ele é perseguido pelos Estados não por razões idealistas, mas pragmáticas: como as resoluções decididas pela Primeira ONU não são legalmente vinculantes, o consenso é a única forma de garantir que haverá uma mínima observância, por parte de todos os Estados-membros9,

do conteúdo recomendado nos documentos aprovados.

Já a Segunda ONU difere-se da Primeira quanto à sua composição: conforme definido pelo Capítulo XV da Carta de São Francisco, ela é formada pelo Secretariado, que é o corpo burocrático da organização, sob coordenação e direção do Secretário-Geral (ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS, 1945). Trata-se de um serviço civil internacional independente, que tem a obrigação profissional de colocar-se como neutro em relação às pressões dos diferentes Estados-membros. Os princípios de neutralidade e independência invocam o idealismo que marca a atuação do Secretariado, uma vez que sua ação deve ser voltada ao provimento de bens coletivos internacionais. Dag Hammarskjöld, o primeiro Secretário-Geral da ONU, manifestou esse espírito independente da Segunda ONU em seu famoso discurso em Oxford, em 1961:

A independência e o caráter internacional do Secretariado requerem não apenas a resistência às pressões nacionais em relação aos funcionários, mas também – e isso era mais complexo – a implementação independente de decisões políticas controversas, de maneira plenamente consistente com a responsabilidade exclusivamente internacional do Secretário-Geral (HAMMARSKJÖLD, 1961, p. 342, tradução nossa10).

A responsabilidade central da Segunda ONU é a de servir a Primeira ONU, que é a principal beneficiária das diferentes atividades conduzidas pelo Secretariado. Porém, isso não significa que a Segunda ONU careça de certa autonomia. Ela está atrelada aos anseios dos Estados-membros, mas tem personalidade jurídica própria e existe como uma entidade separada deles. Os funcionários da ONU – e, em especial, os chefes executivos

9 Essa afirmação é mais flexibilizada em relação ao Conselho de Segurança, cujas resoluções têm caráter

legalmente vinculante, conforme define o Artigo 25 da Carta de São Francisco (ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS, 1945). Porém, no âmbito da AGNU e do ECOSOC, órgãos nos quais o tema da CSS é tratado, suas decisões apresentam apenas caráter recomendatório.

10 Do original: “The independence and international character of the Secretariat required not only resistance

to national pressures in matters of personnel, but also – and this was more complex – the independent implementation of controversial political decisions in a manner fully consistent with the exclusively international responsibility of the Secretary-General” (HAMMARSKJÖLD, 1961, p. 342).

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– participam ativamente das decisões, ao apresentar e discutir propostas com os Estados-membros, desenhar programas e implementar decisões. E, mesmo com o princípio de neutralidade, os funcionários também podem tomar decisões que sejam alinhadas mais às ideias e aos interesses de alguns grupos de países do que de outros (WEISS et al., 2009 a, pp. 126-127).

Em suma, as duas ONUs ocupam papeis inversos, por isso complementares: na Primeira ONU, o Secretariado trabalha para os Estados-membros; na Segunda ONU, os Estados-membros apoiam o trabalho do Secretariado. Por conta disso, a avaliação dos sucessos e dos fracassos da ONU depende da relação entre essas partes. Em relação à Primeira ONU, os sucessos e fracassos dependem da vontade política e da articulação dos grupos políticos diante do quadro multilateral de cooperação. Para a Segunda ONU, os sucessos e fracassos dependem da habilidade dos funcionários civis internacionais em fazer uso dos meios de implementação disponíveis e de sua liderança e influência para alterar os possíveis resultados, incluindo a posição dos Estados-membros. Mas, obviamente, é comum a Primeira ONU culpa a Segunda ONU pelos erros políticos da organização, e vice-versa (WEISS; DAWS, 2008, pp. 16-17).

As relações entre as Duas ONUs são complexas e sobrepostas, e apresentam entraves e problemas específicos – porém complementares – no caso da incorporação da CSS, como será discutido a seguir.

O debate sobre a incorporação da CSS na Primeira ONU: o conflito Norte x Sul

A pesquisa irá apresentar como o debate entre os Estados-membros sobre a incorporação da CSS aos trabalhos regulares do SDNU é caracterizado pelo histórico conflito Norte x Sul. Essa expressão teve origem na Guerra Fria e até hoje é utilizada para expressar as diferentes visões, entre os países desenvolvidos e os países em desenvolvimento, sobre a cooperação internacional para o desenvolvimento.

Embora os léxicos Norte e Sul evoquem uma categoria geográfica, na prática eles fazem pouca referência a isso. Na Primeira ONU, esses termos são usados para distinguir politicamente o grau desenvolvimento dos países. De acordo com Weiss (2009 a, p. 272), embora imprecisos, os termos Norte e Sul continuam até hoje sendo usados, pela Primeira ONU, como expressões políticas porque eles são mais sutis do que as expressões “país industrializado/não-industrializado” ou “país rico/pobre”.

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Os países do Norte são os países desenvolvidos (PDs), com um elevado PIB per capita e com um processo avançado de industrialização. Já os países do Sul são os países em desenvolvimento (PEDs), com médio/baixo PIB per capita e com um significativo nível de pobreza. São países que possuem um passado colonial e um grau de industrialização intermediário, baixo ou inexistente.

Politicamente, é prerrogativa soberana dos Estados-membros da ONU definir seu

status em relação ao grau de desenvolvimento. A Assembleia Geral das Nações Unidas (AGNU) e o Conselho Econômico e Social das Nações Unidas (ECOSOC) apenas formalmente classificam os países que compõem o grupo denominado países menos desenvolvidos, com o objetivo de definir políticas específicas para os países mais pobres e vulneráveis11.

O chamado Norte, composto por países desenvolvidos, está estrategicamente organizado no Comitê de Assistência ao Desenvolvimento da Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico (OCDE). Criado em 1961, o CAD-OCDE é composto pelos 29 maiores doadores de AOD. A partir do status e da estrutura de uma organização internacional garantida pela OCDE, o CAD articula conceitos, metodologias e arcabouços políticos conjuntos para o dispêndio da ajuda. A cooperação internacional para o desenvolvimento promovida pelo comitê está baseada no paradigma Norte-Sul, e sua visão de desenvolvimento envolve quatro pilares: promover a confiança nas instituições do mercado; equilibrar as finanças públicas por meio da promoção da governança; desenhar estratégias de crescimento baseadas na inovação e na sustentabilidade ambiental; e garantir às pessoas a capacitação necessária para um aumento da produtividade (ORGANISATION FOR ECONOMIC CO-OPERATION AND DEVELOPMENT, 2018).

Embora o CAD-OCDE defina as visões comuns sobre a cooperação internacional para o desenvolvimento, seus países-membros estão organizados e representados por grupos regionais e políticos diferentes na ONU. Dentre eles estão: o Grupo dos Estados da Europa Ocidental e outros; a União Europeia; os Países Nórdicos; e o JUSCANZ (Japão, Estados Unidos, Canadá, Austrália e Nova Zelândia). Mas, para os fins dessa pesquisa, esses grupos serão aglutinados sob a categoria de CAD-OCDE.

11 Os países menos desenvolvidos compõem um grupo de aproximadamente 50 países que possuem níveis

extremamente baixos de PIB per capita, e apresentam condições de extrema vulnerabilidade econômica e social.

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Já os PEDs são frouxamente articulados pelo Grupo dos Setenta e Sete (G-77), uma coalizão política criada em 1964 para coordenar suas posições nas negociações sobre desenvolvimento na ONU. O G-77 não é uma organização internacional formalizada como a OCDE, e possui apenas um Secretariado, composto pelos próprios Estados-membros e auxiliado pelos funcionários da ONU.

A criação do G-77 é reflexo de dois movimentos embrionários de organização política dos PEDs em âmbito internacional: a Conferência de Bandung, de 1955, e o Movimento dos Não-Alinhados (MNA), de 1961, quando foi criada a categoria do Terceiro Mundo. Ao incorporar as antigas colônias africanas e asiáticas recém-independentes, e, mais tarde, os países latino-americanos, o Terceiro Mundo buscou desvencilhar a promoção de seu desenvolvimento do sistema bipolar de alianças da Guerra Fria. Para isso, estimulou novas formas de cooperação entre os PEDs – a chamada Cooperação Sul-Sul – segundo uma visão de desenvolvimento baseada nos princípios de independência política, de luta pelo direito de buscar uma inserção internacional autônoma dos interesses estrangeiros e de promoção da industrialização via planejamento e intervenção econômica estatal.

Com o fim da Guerra Fria, o termo Terceiro Mundo foi substituído pela expressão Sul Global para se referir aos interesses coletivos dos PEDs. Mas o G-77 conservou a posição política do Terceiro Mundo, composta, por um lado, de uma crítica à dependência e ao assistencialismo por parte dos PDs sobre seu desenvolvimento; e, por outro, uma perspectiva grociana, ao basear suas demandas nos princípios de solidariedade e justiça internacionais.

Nota-se que as categorias Norte e Sul são políticas, e não “científicas”. Por isso, o CAD-OCDE e o G-77 não são grupos coesos, e existem diferenças importantes entre os próprios membros de cada grupo. Por exemplo, dentro do CAD existe uma divisão importante entre os doadores escandinavos, que fazem contribuições para o SDNU seguindo a meta estabelecida pela ONU de 0,7% do PIB em AOD, e sem especificar o uso dos recursos; e os estadunidenses, britânicos, franceses e canadenses, cujas doações historicamente não atingem essa meta e são em sua maioria especificadas para as áreas de interesse de suas políticas externas. Por isso, os escandinavos são muito mais simpáticos às críticas que os PEDs fazem ao uso especificado dos recursos e às condicionalidades dos projetos de CNS.

No G-77, as assimetrias entre seus 134 participantes são ainda mais gritantes, devido aos diferentes níveis de desenvolvimento. Nota-se especialmente a diferença entre

Referências

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