• Nenhum resultado encontrado

'Apesar das seqüelas isso aqui é show de bola'

N/A
N/A
Protected

Academic year: 2021

Share "'Apesar das seqüelas isso aqui é show de bola'"

Copied!
134
0
0

Texto

(1)

UNIVERSIDADE DO SUL DE SANTA CATARINA TUÍZE HELENA SOARES QUEIROZ

“APESAR DAS SEQUELAS ISSO AQUI É SHOW DE BOLA”: PERCEPÇÃO DE TRABALHADORES DE ENFERMAGEM DE INSTITUIÇÕES PSIQUIÁTRICAS ACERCA DAS CONSEQUÊNCIAS DO EXERCÍCIO DA PROFISSÃO PARA SUA

SAÚDE MENTAL

Palhoça 2011

(2)

TUÍZE HELENA SOARES QUEIROZ

“APESAR DAS SEQUELAS ISSO AQUI É SHOW DE BOLA”: PERCEPÇÃO DE TRABALHADORES DE ENFERMAGEM DE INSTITUIÇÕES PSIQUIÁTRICAS ACERCA DAS CONSEQUÊNCIAS DO EXERCÍCIO DA PROFISSÃO PARA SUA

SAÚDE MENTAL

Pesquisa apresentada na disciplina de Trabalho de Conclusão de Curso - II, do curso de Psicologia, como requisito parcial para a obtenção do título de Psicólogo. Universidade do Sul de Santa Catarina. Núcleo Orientado: Psicologia da Saúde

Orientadora Profª. Nádia Kienen, Dra.

Palhoça 2011

(3)

AGRADECIMENTOS

À Deus, por ter me proporcionado forças por meio da fé a superar todas as barreiras e chegar até aqui,

À minha incansável mãe, que com sua maneira singular e admirável de ser, sempre me incentivou à ir em busca de meus sonhos,

À minha querida Nana, que não mediu esforços para me auxiliar nessa caminhada, À minha vó Nahir, por sua maneira simples de ser que tanto me ensinou e ajudou, À minha tia Naizinha, que sempre acreditou na minha capacidade,

Ao meu pai-avô, que mesmo na ausência física continuou guiando meus passos e apontando o melhor caminho a seguir,

Ao meu pai, que me mostrou pela experiência que tudo na vida pode mudar, Ao meu namorado Gevaert, que colocou mais alegria e amor em minha vida, Aos meus queridos e inseparáveis amigos Suelem e Jeferson, que estiveram ao meu lado nesses cinco anos e dividiram comigo muitas lágrimas e gargalhadas,

As minhas queridas companheiras de orientação de TCC e estágio no CAPS, Doralina, Marli, Ariélly e Ester, pelas infindáveis tardes recheadas de conhecimento e momentos inesquecíveis,

À Carolina, Lúcio, Amanda e Everton, sobreviventes, assim como eu, da turma de 2007.1 noturno,

À minha doce orientadora Nádia, por ter acreditado na minha capacidade, por ter dividido comigo seus conhecimentos e, principalmente por ter sido sempre tão compreensiva e incentivadora, o meu MUITO OBRIGADO!!!

À Ana Lopes e Sérgio Sanceverino, pelas contribuições nesta pesquisa,

Aos demais professores por terem me ensinado tanto, e principalmente à Ana Luz e Lílian que despertaram em mim o interesse pelo Psicodrama,

Aos demais colegas do curso, que de forma direta ou indireta fizeram parte da minha caminhada acadêmica,

À todos os trabalhadores do IPQ, pela forma acolhedora como me receberam e abriram as portas para que essa pesquisa se realizasse, o meu muito obrigado.

Ás minhas colegas de trabalho por terem suportado o meu mal humor e as minhas faltas durante a confecção desta pesquisa.

(4)

É curioso como não sei dizer quem sou. Quer dizer, sei-o bem, mas não posso dizer. Sobretudo tenho medo de dizer, porque no momento em que tento falar, não só não exprimo o que sinto, como o que sinto se transforma lentamente no que eu digo. (Clarice Lispector)

(5)

RESUMO

A saúde mental dos trabalhadores tem sido um assunto bastante discutido no âmbito científico. Alguns autores afirmam que o desgaste emocional gerado pelo trabalho pode se tornar uma ameaça para a saúde mental do trabalhador. A enfermagem é apontada como uma das profissões mais atingidas pelo desgaste físico e mental gerado pelo trabalho. Desta forma, o objetivo desta pesquisa de conclusão de curso, é caracterizar a percepção de trabalhadores de enfermagem de instituições psiquiátricas acerca das consequências do exercício da profissão para sua saúde mental. Desta forma, este estudo buscou evidenciar a percepção de trabalhadores de enfermagem sobre suas condições de saúde mental; sentimentos relatados por trabalhadores de enfermagem decorrentes do exercício da profissão; e tipos de estratégias de enfrentamento que trabalhadores de enfermagem relatam utilizar para lidar com seu trabalho. Quanto ao método, trata-se de um estudo descritivo, de caráter quali-quantitativo. O instrumento de coleta de dados foi um questionário composto por 38 questões, sendo 33 questões fechadas e 5 questões abertas. Participaram deste estudo 48 trabalhadores de enfermagem de nível médio (técnicos e auxiliares de enfermagem). Os sujeitos pesquisados foram selecionados a partir de critérios estabelecidos, como terem mais de 18 anos e trabalharem na instituição psiquiátrica como técnico ou auxiliar de enfermagem. Foi possível perceber com os dados obtidos que os sujeitos pesquisados apontam o estresse como fator de influencia na saúde mental, assim como a sobrecarga de trabalho. Os sentimentos relatados pelos sujeitos pesquisados são na sua maioria positivos em relação ao trabalho, porém foi possível perceber mudanças negativas tais como ansiedade, medo, insegurança e frustração. Os tipos de estratégias de enfrentamento utilizadas pelos sujeitos são na sua maioria focadas na emoção, o que indica que esses sujeitos tem dificuldades em identificar as situações geradores de conflito. Com base nos dados foi possível perceber que ainda que os sujeitos relatarem sentirem-se bem em relação ao trabalho, foram identificados sofrimentos que ainda são poucos percebidos pelos sujeitos. Quanto aos tipos de estratégias utilizadas mais comumente, os dados demonstram dificuldades em identificar situações geradoras de conflitos.

(6)

SUMÁRIO 1 INTRODUÇÃO ... 8 1.1 APRESENTAÇÃO ... 8 1.2 PROBLEMÁTICA E JUSTIFICATIVA ... 9 2 OBJETIVOS ... 15 2.1 OBJETIVO GERAL ... 15 2.2 OBJETIVOS ESPECÍFICOS ... 15 3 FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA ... 16

3.1 HISTÓRIA DO TRABALHO DE ENFERMAGEM ... 16

3.1.1 A enfermagem ao longo da história ... 16

3.1.2 A Enfermagem no Brasil ... 21

3.2 SAÚDE MENTAL DOS TRABALHADORES DE ENFERMAGEM ... 27

3.2.1 Saúde Mental ... 27

3.2.2 Saúde mental dos trabalhadores de enfermagem de saúde mental ... 29

3.2.3 Estratégias de enfrentamento ou coping ... 35

3.3 TRABALHO NO CONTEXTO DO HOSPITAL PSIQUIÁTRICO ... 39

3.3.1 Hospital Psiquiátrico no Brasil: breve histórico ... 39

3.3.2 Modos de trabalho no contexto do hospital psiquiátrico: conseqüências para a saúde mental do trabalhador ... 40

4 MÉTODO ... 46

4.1 TIPO DE PESQUISA ... 46

4.2 PARTICIPANTES ... 46

4.3 INSTITUIÇÃO ONDE FOI REALIZADA A PESQUISA ... 50

4.4 MATERIAIS E EQUIPAMENTOS ... 51

4.5 SITUAÇÃO AMBIENTE ... 51

(7)

4.7 PROCEDIMENTOS ... 52

4.7.1 Seleção dos participantes ... 52

4.7.2 Contato com os participantes ... 52

4.7.3 Coleta de dados ... 53

4.7.4 Organização, tratamento e análise de dados ... 54

5 ANÁLISE E DISCUSSÃO DOS DADOS ... 56

5.1 PERCEPÇÃO DOS TRABALHADORES DE ENFERMAGEM SOBRE SUAS CONDIÇÕES DE SAÚDE MENTAL ... 56

5.1.1 Qualidade do sono ... 56

5.1.2 Lazer ... 58

5.1.3 Estresse no trabalho ... 61

5.1.4 Situações estressoras no ambiente de trabalho ... 63

5.1.5 Envolvimento com o trabalho ... 66

5.1.6 Percepção de mudanças de vida ... 71

5.1.7 Adoecimento e afastamento do local de trabalho ... 77

5.1.8 Características do trabalho que interferem na saúde mental dos sujeitos pesquisados ... 80

5.2 SENTIMENTOS RELATOS POR TRABALHADORES DE ENFERMAGEM DECORRENTES DO EXERCÍCIO DA PROFISSÃO ... 85

5.2.1 Realização profissional ... 85

5.2.2 Sentimentos em relação ao trabalho ... 86

5.3 TIPOS ESTRATÉGIAS DE ENFRENTAMENTO QUE OS TRABALHADORES DE ENFERMAGEM RELATAM UTILIZAR PARA LIDAR COM SEU TRABALHO ... 102

6 CONSIDERAÇÕES FINAIS ... 112

7 REFERÊNCIAS ... 118

APÊNDICE ... 123

APÊNDICE A - questionário ... 124

(8)

ANEXO I - Maslach Inventory ... 131 ANEXO II – Comunicação de afastamento de funcionários ... 131

(9)

1 INTRODUÇÃO

1.1 APRESENTAÇÃO

O presente projeto de pesquisa se propõe a caracterizar a percepção de trabalhadores de enfermagem de instituições psiquiátricas acerca das consequências do exercício da profissão para sua saúde mental. Este projeto foi desenvolvido na disciplina de Trabalho de Conclusão de Curso I (TCC I), apresentada na nona fase do curso de Psicologia da Universidade do Sul de Santa Catarina – UNISUL. O projeto de pesquisa em TCC I está vinculado ao Projeto Time da Mente, que faz parte do Núcleo Orientado em Psicologia e Saúde do curso de graduação em Psicologia. O projeto Time da Mente faz parte do estágio curricular obrigatório que ocorre no CAPS II (Centro de Atenção Psicossocial) em Palhoça/SC.

O tema desta pesquisa surgiu do interesse da pesquisadora em conhecer melhor o tema saúde mental em trabalhadores de enfermagem que trabalham em instituições psiquiátricas. O interesse por este tema surgiu a partir da percepção do campo profissional da pesquisadora, que é da área de enfermagem e trabalha em hospital geral, juntamente com os conhecimentos adquiridos sobre saúde mental do decorrer do curso de psicologia. Com a percepção de que há afastamentos e adoecimentos constantes em trabalhadores de saúde da área de enfermagem, a pesquisadora passou a se questionar se este fenômeno é decorrente do exercício da profissão e como isso ocorre em instituições psiquiátricas.

(10)

1.2 PROBLEMÁTICA E JUSTIFICATIVA

O trabalho pode adoecer o trabalhador? Existe relação entre o adoecimento do trabalhador com o local de trabalho? E com o tipo de função que o trabalhador exerce?É possível dizer que o trabalho influencia na saúde do trabalhador? E quando esse trabalho está relacionado com o cuidado de pessoas com transtornos mentais, há influências desse tipo de trabalho sobre a saúde mental do trabalhador? Como trabalham as pessoas em hospitais psiquiátricos? Essas perguntas foram ponto de partida para a elaboração deste projeto de pesquisa. Caracterizar a percepção dos trabalhadores de enfermagem que atuam em hospitais psiquiátricos acerca das consequências do exercício da profissão para sua saúde mental, representa uma maneira de identificar as condições de saúde mental desses trabalhadores, os sentimentos provocados pelo exercício da profissão, as estratégias de enfrentamento que utilizam para lidar com as diversas situações no ambiente de trabalho e as consequências, se houver, da prática profissional para sua saúde mental desses trabalhadores. Porém, à priori, considera-se necessário saber o que são as doenças relacionadas ao trabalho?

As doenças relacionadas ao trabalho ou a profissão são definidas por Bellusci (1996 p. 09) como “aquelas que são causadas pelo trabalho em si ou pelas condições do ambiente no qual se desenvolve”. Nessa perspectiva, Dejours (1994) refere que a saúde mental do trabalhador tem sido um assunto bastante discutido no meio científico. O autor pontua também que o desgaste físico e mental ocasionado pelo trabalho muitas vezes pode gerar um sofrimento significativo no trabalhador de modo que inviabilize sua função. A carga psíquica provocada por um estímulo proveniente do exterior pode gerar um acúmulo de energia psíquica resultando em uma tensão. Desta forma, Dejours (1994) compreende que se o trabalhador não possuir vias de descarga que dêem conta de exteriorizar esta tensão poderá tornar seu ambiente de trabalho desgastante e perigoso para sua saúde mental.

De acordo com Dejours (1994) a relação do homem com o trabalho pode dar origem a uma alta carga de tensão psíquica, em que a dicotomia prazer versus desprazer pode resultar no afastamento do sujeito de seu local de trabalho, bem como estender o sofrimento gerado pelo trabalho para outras instâncias da vida da pessoa. Para o autor, a influência do trabalho sobre o sujeito é descrita como:

(11)

ao trabalhar o sujeito é despossuído do seu corpo físico e nervoso, domesticado e forçado a agir conforme a vontade do outro [...] logo a carga psíquica do trabalho resulta na confrontação do desejo do trabalhador a injunção do empregador contida na organização do trabalho[...] sendo o trabalho um lócus de aprendizado [...] se a renovação do viver junto fracassa, o trabalho pode se tornar um poderosa força de destruição. (DEJOURS, 1994, p. 20).

Em relação às características do trabalho, Dejours (1994, p. 24) afirma que “o trabalho torna-se perigoso para o funcionamento psíquico do trabalhador quando se opõe a sua livre atividade, onde o prazer do trabalho está no resultado da descarga de energia psíquica que a tarefa executada autoriza”. Muitas vezes, o ambiente de trabalho molda o trabalhador às regras da instituição, ignorando sua capacidade de elaboração e decisão da tarefa que esta sendo executada.

Bittencourt (2011) corrobora com Dejours ao afirmar que um dos motivos de sofrimento para os trabalhadores, pode estar relacionado a falta de autonomia, que além de impossibilitar a liberdade e a independência dos profissionais, gera, muitas vezes, um sentimento de falta de controle de suas tarefas. Sobre este tema, Bittencourt (2011) em artigo da revista Psique intitulado: “Estresse, o mal do século”, afirma que sete em cada dez brasileiros reclamam de estresse relacionado ao trabalho, sendo que dentre estes pelo menos três sofrem esgotamento mental e físico intenso decorrente do ambiente profissional. A autora considera que a pouca valorização dos trabalhadores, gera um sentimento de inutilidade, o que torna o trabalho angustiante e desgastante. De acordo com o autor, essa angústia, pode se tornar um fator desencadeante para o sofrimento do trabalhador. O trabalho, pode se tornar assim um ambiente aversivo para a saúde mental dos profissionais, facilitando o desenvolvimento de psicopatologias relacionadas ao exercício da profissão. (BITTENCOURT, 2011).

Esse sofrimento decorrente da falta de autonomia é identificado também na profissão de enfermagem. Hanzelmann e Passos (2010) pontuam que a falta de autonomia é uma das causas que mais gera sofrimento nos trabalhadores de enfermagem, em que sua criatividade e vontade ficam sublimadas por necessidade de cumprir aquilo que foi determinado por outras pessoas. Corroborando com as autoras, Cândido (2004) ressalta que no exercício da enfermagem este sentimento de falta de autonomia profissional pode estar relacionado também com a falta de reconhecimento deste trabalhador por outras profissões vinculadas a área da saúde.

Esta falta de autonomia e reconhecimento dos profissionais de enfermagem perpetua desde a Antiguidade, perpassando pela Idade Média, conforme explica Silva (1986

(12)

apud RIBEIRO, 1996). O autor ressalta que nestes dois períodos a enfermagem era caracterizada como “um trabalho manual não especializado, desprovido de prestigio e poder, sendo exercido principalmente por mulheres, escravos e religiosos”, e era conhecida também como uma extensão da medicina, sendo sua função de auxiliar o médico em suas funções. (RIBEIRO, 1996, p. 55). Para Becker et al. (2008) atualmente, no século XXI, esse processo de trabalho transformou-se e complexificou-se ao longo do tempo, tornando o profissional mais autônomo, embora ainda submetido ao serviço da área médica.

A autonomia do profissional de enfermagem pode variar de acordo com a categoria, já que o exercício da profissão de enfermagem está subdividido em quatro diferentes categorias profissionais conforme a Lei n° 7.498, de 25 de junho de 1986. Esta lei decreta que: respeitados os graus de habilitação, é privativo de Enfermeiro, Técnico de Enfermagem, Auxiliar de Enfermagem e Parteiro e só será permitido ao profissional exercer sua atividade com inscrição no Conselho Regional de Enfermagem da respectiva Região. (BRASIL, 1986).

Com base nesta subdivisão, parece que a maneira como um profissional desta área percebe seu ambiente de trabalho pode variar de acordo com sua categoria profissional. Isto significa que uma enfermeira nem sempre irá identificar os mesmos fatores estressantes num ambiente de trabalho que um técnico ou auxiliar, por exemplo, visto que dentre as quatro categorias a execução de tarefas é diferente. (CÂNDIDO, 2004).

Conforme Hanzelmann e Passos (2010) o desgaste físico e mental pode estar presente em qualquer tipo de trabalho diferenciando-se apenas na intensidade, uma vez que algumas tarefas exigem mais esforço, concentração e organização do que outras. Neste sentido, no exercício da profissão de enfermagem, “a forma como o trabalho é organizado e as condições em que ele é executado são que determinam o tipo de desgaste ao qual o trabalhador estará submetido”. (CÂNDIDO, 2004 p. 02).

Desta forma, para Menezes e Silva (2008), a enfermagem está dentre as categorias das profissões que mais são atingidas pelo desgaste físico e mental causado pelo trabalho, por ser uma profissão que lida diretamente com o sofrimento e as dores dos pacientes. E é devido a natureza de seu trabalho que segundo as autoras, esta profissão, é uma das mais suscetíveis à esgotamento profissional e transtornos mentais.

Os trabalhadores de enfermagem, de acordo com Cândido (2004), formam dentro de uma instituição hospitalar o maior grupo de trabalho, sendo que suas funções são fundamentais para o funcionamento desta instituição. Para o autor a enfermagem é uma das categorias profissionais da área da saúde, que está mais ligada aos cuidados do paciente, visto

(13)

que seu trabalho em equipe, se dá de forma continua e ininterrupta, 24 horas por dia. Ainda neste sentido, o autor aponta que “as relações entre médicos e enfermeiros são em nossa realidade, formadas por uma estrutura de poder rígida, onde os primeiros são colocados numa posição de suposto saber”.(CÂNDIDO, 2004, p. 10). Corroborando com essa afirmação, Santos (1992 apud CÂNDIDO, 2004 p.12) pontua que:

os médicos assumem a posição de “senhores do saber” e os profissionais de enfermagem se submetem “humildemente” às ordens recebidas para desempenharem tarefas consideradas periféricas e enfadonhas [...] onde não é permitido espaço para questionar, discutir e analisar junto ao médico o andamento do serviço em prol do paciente [...] tornando os enfermeiros e auxiliares totalmente desinteressados e sem autonomia.

A importância de se pesquisar sobre a saúde mental dos trabalhadores de enfermagem, surge a partir de duas correntes disciplinares descritas por Cândido:

[...] a primeira é a abordagem do estresse ocupacional, definido como um processo de perturbação ocasionado pela mobilização excessiva de energia adaptativa do individuo diante das solicitações do meio e, a segunda é a perspectiva da psicopatologia do trabalho, sob a ótica do inconsciente individual e coletivo. (CÂNDIDO, 2004 p. 02).

Relacionado ao estresse ocupacional na categoria de enfermagem, Lauret e Trindade (2010) compreendem que os trabalhadores de saúde são os mais acometidos por adoecimentos relacionados ao trabalho, em que fatores comprometedores podem variar desde o ambiente de trabalho até ao sistema em que estão inseridos, como também a percepção do sujeito sobre seu compromisso com a profissão. A percepção do sujeito sobre os fatores de trabalho que podem influenciar na sua saúde mental varia de acordo com a categoria conforme visto anteriormente. Neste sentido Hanzelmann e Passos (2010) descrevem em sua pesquisa que o ambiente de trabalho, junto com a falta de material e o excesso de trabalho decorrentes da falta de pessoal é apontando com um fator influenciador do esgotamento profissional por técnicos e auxiliares de enfermagem, sendo que estes fatores não são apontados da mesma forma por enfermeiros.

Muitas pesquisas já foram realizadas com ou sobre trabalhadores de enfermagem (LAURET e TRINDADE, 2010; HANZELMANN e PASSOS, 2010; MENEZES e SILVA, 2008; RIBEIRO et al. 2008; FERRER, 2007; SOUSA, 2007; CÂNDIDO, 2004; entre outros), relacionadas ao estresse ou esgotamento (por exemplo: SILVA e MENEZES, 2008; CÂNDIDO, 2004; LAUTERT e TRINDADE, 2010) destes profissionais. Porém a maior parte

(14)

das pesquisas foram realizadas com trabalhadores de hospitais gerais (CÂNDIDO, 2004; PASSOS;HANZELMANN, 2010) ou atenção básica (SILVA;MENEZES, 2008; LAUTERT; TRINDADE, 2010; ARANHA;SIVA, 2003) havendo um número ainda pequeno de pesquisas com trabalhadores de instituições psiquiátricas, sobretudo realizadas pela área da Psicologia. Sendo assim, esta pesquisa torna-se relevante, também, por buscar levantar novos dados sobre a percepção de trabalhadores de enfermagem que atuam em instituições psiquiátricas acerca das consequências do exercício da profissão para sua saúde mental. Para a Psicologia o resultado obtido pela execução desta pesquisa é importante para a compreensão da influência do exercício da profissão de enfermagem em instituições psiquiátricas sobre o trabalhador, a partir da perspectiva psicológica, considerando que há poucos autores desta área que se dedicaram ao tema. (LOPES, 2002; RAMMINGER, 2002 e 2005; MAGNUS, 2009).

Lopes (2002) aponta que dentre os profissionais de um hospital psiquiátrico, na qual ocorreu sua pesquisa, dos trabalhadores que se aposentaram por invalidez, 70,7% foram por motivo de transtornos mentais. A autora ainda chama atenção para que dentre este número, 46,34% das aposentadorias por invalidez com diagnóstico de transtornos mentais, foram de trabalhadores de enfermagem.

Com base neste número, que é bastante significativo, parece que esta pesquisa pode contribuir para a compreensão do fenômeno que ocorre nas instituições psiquiátrica. Parece ser importante ampliar o conhecimento sobre esse fenômeno, de modo que possa ser possível compreender o modo de adoecimento do trabalhador de enfermagem. Considerando que o hospital psiquiátrico é um local de recuperação de saúde mental, estaria esta instituição vivenciando uma contradição em seu objetivo?

No âmbito social podemos dizer que esta pesquisa pode se tornar relevante de modo que seus dados possam contribuir para a formulação, de projetos de prevenção em saúde mental para trabalhadores de saúde mental. Considerando que a doença mental é um dos motivos pelo qual o trabalhador de enfermagem mais se afasta de seu ambiente de trabalho, dados que possibilitem uma intervenção precoce pode auxiliar a diminuir assim o número de afastamentos e aposentadorias por invalidez destes trabalhadores.

O trabalhador de enfermagem, antes de pertencer a uma categoria de trabalho, pertence a uma sociedade. Dejours (1994) afirma que o sofrimento decorrente do trabalho pode se estender para os outros âmbitos da vida do sujeito. Desse modo parece ser importante avaliar as condições de saúde mental dos trabalhadores de enfermagem, já que as decorrências

(15)

do trabalho, pode influenciar em sua vida fora da instituição, trazendo prejuízos para suas relações sociais.

Parece haver uma escassez de pesquisas com trabalhadores de hospitais psiquiátricos e um número mais significativo de pesquisas com trabalhadores de serviços de atenção básica em saúde mental, já que este é o modelo que está se tentando implantar na contemporaneidade. A instituição psiquiátrica, é compreendida como um local de sujeitos com sofrimento psíquicos graves que estão institucionalizados, ou seja, que moram nos manicômios.(ENGELMAN, 2003). Para a autora, este modelo hospitalocêntrico passa por um processo de desconstrução desde a Reforma Psiquiátrica em 80/90, tentando reconstruir a cidadania historicamente negada aos “loucos” e substituir os hospitais psiquiátricos por serviços de assistência aos usuários e seus familiares junto à comunidade.

Apesar do modelo atual de desinstitucionalização se contrapor ao modelo hospitalocêntrico, ainda assim essas unidades se mantêm presentes na atualidade e o trabalho de enfermagem vinculado a essas raízes. (BECKER et al., 2008). Compreendendo o hospital psiquiátrico como uma instituição de recuperação e/ou manutenção da saúde mental, não podemos deixar de considerar as pessoas que ali trabalham como sujeitos merecedores de um olhar mais atento para sua saúde mental, já que estes profissionais estão em contato direto com pacientes, muitas vezes, em estado mental muito grave o que pode tornar o hospital psiquiátrico um ambiente de trabalho insalubre.

Compreender como os profissionais de enfermagem lidam com pacientes psiquiátricos, como circulam neste ambiente, e, como se reestruturam a partir dessas experiências, pode ser um ponto importante para elaborar estratégias de prevenção do adoecimento mental destes trabalhadores. Diante do exposto surge a seguinte pergunta de pesquisa: Qual a percepção de trabalhadores de enfermagem que atuam em instituições psiquiátricas acerca das consequências do exercício da profissão para sua saúde mental?

(16)

2 OBJETIVOS

2.1 OBJETIVO GERAL

 Caracterizar a percepção de trabalhadores de enfermagem que atuam em instituições psiquiátricas acerca das consequências do exercício da profissão para sua saúde mental.

2.2 OBJETIVOS ESPECÍFICOS

 Identificar a percepção de trabalhadores de enfermagem sobre suas condições de saúde mental;

 Identificar os sentimentos relatados por trabalhadores de enfermagem decorrentes do exercício da profissão;

 Identificar os tipos estratégias de enfrentamento que os trabalhadores de enfermagem relatam utilizar para lidar com seu trabalho.

(17)

3 FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA

3.1 HISTÓRIA DO TRABALHO DE ENFERMAGEM

3.1.1 A enfermagem ao longo da história

Para compreendermos um pouco sobre a profissão de enfermagem torna-se imprescindível entender como surgiu a profissão, como ela se define, as transformações que ocorreram ao longo do tempo e as influências de cada época sobre sua constituição. Desta forma será apresentado aqui um breve histórico da profissão de enfermagem pontuando os acontecimentos mais importantes de cada período.

Conforme aponta Ellis e Hartley (1998 p. 14) “a enfermagem é uma profissão difícil de ser definida, já que as próprias enfermeiras não concordam com uma definição única”. Porém as autoras, citando Henderson (1966), referem-se a uma definição que é a mais aceita pela enfermagem quanto a sua definição.

A função única da enfermeira é assistir o individuo, doente ou sadio, no desempenho daquelas atividades que contribuem para a sua saúde ou recuperação (ou para sua morte tranquila) que ele seria capaz de realizar por si próprio, caso tivesse a força necessária, o desejo ou o conhecimento. E deve fazê-lo de tal modo a auxiliá-lo a adquirir a independência o mais rápido possível. (HENDERSON, 1966 apud ELLIS e HARTLEY, 1998 p. 15).

Quanto ao princípio da profissão de enfermagem, sua história tem inicio incerto, pois há poucos registros do exercício desta profissão na Idade Antiga. Os poucos escritos que se tem sobre enfermeiras e cuidado com enfermos são por vezes fragmentados e pouco significativos. Este dado talvez se explique pelo fato de que quase todos os registros de acontecimentos importantes na história tenham sido escritos por sujeitos do sexo masculino, que priorizavam os acontecimentos notáveis e importantes ao invés de acontecimentos cotidianos. (LUNARDI, 1998).

(18)

O período cristão, que foi marcado pela influência dos pensamentos de Cristo na história da humanidade, teve um importante significado para a enfermagem segundo Donahue:

A história da enfermagem se converte em uma constante com o advento do cristianismo. Os documentos pré-cristãos sobre a enfermagem são fragmentários e dispersos, entretanto a referência a esta disciplina desde os tempos dos primeiros trabalhadores cristãos até a atualidade são contínuos. A doutrina do Cristo do amor e da fraternidade não só transformou a sociedade como além disso deu lugar ao desenvolvimento da enfermagem organizada, consequência direta deste ensinamentos, traduzia o conceito de altruísmo puro introduzido pelos primeiros cristãos. (DONAHUE, 1993 apud LUNARDI, 1998, p. 22).

A profissão de enfermagem é geralmente associada ao “ato de cuidar”, concepção essa presente desde o cristianismo, época em que o papel da enfermeira ou “cuidadora da vida” era desempenhado por mulheres denominadas diaconisas. As diaconisas eram geralmente mulheres solteiras ou viúvas que não possuíam um lugar definido na sociedade e se dedicavam a ir às casas dos enfermos e levar alimentos, ensinamentos religiosos e esmolas. Caracterizavam-se ainda por sua doçura, bondade, paciência, abnegação e compaixão pelos pobres e doentes. (LUNARDI, 1998).

No que diz respeito a Idade Antiga, Geovanini et al. (1995) apontam três momentos significativos na prática de enfermagem. O primeiro momento é chamado pelos autores de “práticas de saúde instintivas”, onde a mulher é a grande precursora do atendimento às necessidades da raça humana, sendo responsáveis pelo cuidado de crianças, velhos e doentes, pautadas apenas pelo instinto do cuidado ao outro, que adquiriam com a maternidade.

O segundo momento, segundo os autores, é denominado “as práticas de saúde mágico-sacerdotais”. Neste momento a saúde era vinculada à religião, milagres e crença de que os espíritos trevosos eram os causadores dos males do corpo. Desta forma, as pessoas procuravam os templos religiosos para se livrar dos sofrimentos do corpo por meio de cerimônias e rituais de sacrifício de animais. A crença mística sobre as doenças do corpo justificava-se pela convicção de que:

A cura era um jogo entre a natureza e a doença, e o sacerdote nesta luta desempenhava o papel de intérprete dos deuses e alienado da natureza contra a doença. Quando o doente se recuperava, o fato era tido como milagroso. Se morria,

(19)

era por ser indigno de viver, ou seja, havia total isenção de responsabilidade do sacerdote nos resultados das ações de saúde. (GEOVANINI et al., 1995, p.07).

O terceiro momento ocorre no final do século V antes de Cristo e é chamado por Giovanini et al. (1995 p. 08) de “as práticas de saúde no alvorecer da ciência”. Neste momento inicia o processo científico em saúde e o cuidado do corpo. O pensamento científico neste período era pautado em “estudar o homem como um fim em si mesmo, deixando de lado a idéia de qualquer intenção divina nos negócios humanos”. (p. 08). A Grécia é considerada o país que mais evoluiu em saúde neste período devido à figura de Hipócrates que propôs uma nova concepção em saúde. Apesar dos muitos avanços deste período, há uma lacuna na história da saúde devido ao incêndio na biblioteca de Alexandria onde muitos documentos foram queimados, deixando assim uma “falta” informações quanto a prática de saúde. (GEOVANINI et al., 1995).

Os conhecimentos em saúde continuaram em avanço na Idade Média, onde a prática de caridade aos doentes era incentivada pela Igreja como forma de praticar a caridade e cumprir as leis do Cristo. (LUNARDI, 1998). Nos primeiros séculos da Idade Média a enfermagem, que ainda não possuía esta denominação, passou também a atrair mulheres de posição social elevada. Sob influência da Igreja, o trabalho de enfermagem é associado a divindade, sendo exercido também por mulheres da nobreza buscando pagar seus pecados e alcançar a purificação e salvação, já que este era um “trabalho de Deus”. A obediência e a humildade também aparecem como características das enfermeiras neste período que “renunciavam as vaidades e aos luxos por opção de atenção aos pobres e desvalidos, enquanto penitência pelas faltas anteriores”. (LUNARDI, 1998 p. 28).

Porém entre os séculos XIV e XVI, Ellis e Hartley (1998) apontam uma mudança no papel da mulher decorrente do movimento religioso iniciado na Alemanha por Martin Lutero, A Reforma, que resultou na revolta contra a supremacia do papa e a formação de igrejas protestante, onde:

A Igreja Protestante, que se posicionava pela liberdade religiosa e de pensamento, não garantiam muita liberdade a mulher. Uma vez incentivadas pela igreja e encorajadas a fazer atividades de caridade, as mulheres eram consideradas subordinadas aos homens. Seu papel estava definido dentro dos limites do lar; suas obrigações eram cuidar das crianças e da casa. O trabalho em hospitais não atraia mais as mulheres de berço elevado. O cuidado nos hospitais foi relegado às mulheres “incomuns”, um grande grupo que compreendia prisioneiras, prostitutas mulheres que sustentavam sua própria vida com ordenados eram forcadas a trabalhar como serventes domésticas; embora a enfermagem fosse considerada um serviço doméstico, não era um serviço desejável. O pagamento era pouco, as horas eram

(20)

longas, e o trabalho estressante. A enfermeira era considerada a mais subalterna das serventes. (ELLIS; HARTLEY, 1998, p. 32).

A Reforma, de acordo com Geovanini et al. (1995, p.13) “teve grande repercussão sobre a enfermagem, já que estava agregada a prática religiosa”. Para os autores, o efeito mais importante deste movimento foi a Inquisição, que resultou na perseguição e queima de bruxos, feiticeiras e mulheres curandeiras, culminando assim no “fechamento de vários hospitais cristãos e a expulsão das religiosas que cuidavam dos enfermos, sendo substituídas por mulheres de baixo nível moral”. (p. 14).

Com o fechamento dos hospitais, o local passa a ser um “depósito de doentes, onde homens, mulheres e crianças coabitam o mesmo espaço, amontoados em leitos coletivos”. (GEOVANINI et al., 1995, p. 14). Diante deste quadro:

As pseudo-enfermeiras desenvolviam tarefas essencialmente domésticas, recebendo um parco salário e uma precária alimentação, por um período de 12 a 48 horas de trabalho ininterruptos. [...] a posição considerada inferior da mulher na sociedade contribuíram para o desprestígio da Enfermagem, durante o período compreendido entre os séculos XVI e XVII, caracterizando a sua fase de decadência [...] essa fase tempestuosa que significou uma grave crise para a enfermagem permanece por muito tempo, onde só no limiar do capitalista, é que alguns movimentos reformadores que partiram principalmente de iniciativas religiosas e sociais tentam melhorar as condições do pessoal a serviço do hospital. (GEOVANINI et al., 1995, p. 14).

A mudança do período tempestuoso da enfermagem, intitulado por Ellis e Hartley (1998) de “Os anos negros da enfermagem” ocorrerá somente na Idade Moderna. Neste período, ocorre um avanço na medicina que “reorganiza os hospitais a partir de um posicionamento médico refletindo na disciplina da enfermagem, que ressurge da fase sombria que estava até então”. (GEOVANINI et al., 1995, p. 16).

Nesta nova fase de reorganização hospitalar, a enfermagem ganha novo espaço, exercendo também tarefas burocráticas e administrativas que passam a ser atribuídas ao enfermeiro, que:

nesse processo se distância progressivamente da assistência direta ao doente e [...]. Embora o poder disciplinar, no novo hospital, seja confiado ao médico, ele passará a delegar o exercício das funções controladoras do pessoal de enfermagem ao enfermeiro que, imbuído da falsa convicção de participar da esfera dominante, será subutilizado em beneficio da manutenção da ordem e da disciplina, indispensáveis à preservação do monopólio do poder institucional. (GEOVANINI et al., 1995 p. 17).

(21)

É neste cenário de mudanças para a profissão de enfermagem que surge uma das figuras mais marcantes da história dessa profissão: Florence Nightingale. Não há como falar de enfermagem sem mencionar o papel importante desempenhado por Florence na sistematização da enfermagem como profissão. (LUNARDI, 1998).

De acordo com Lunardi (1998) Florence “desde cedo manifestou seu desejo de dedicar-se a enfermagem e ao cuidado de doentes, conforme escritos encontrados em seu diário aos dezessete anos”. (p. 38). Em 1851 iniciou seus estudos e em 1853 começou a trabalhar num comitê de “estabelecimento para senhoras durante as doenças” ampliando assim seu conhecimento sobre hospitais e reforma em enfermagem, onde passou a verificar a necessidade de treinamento para as enfermeiras. (ELLIS; HARTLEY, 1998).

Em 1854 é convidada a trabalhar no auxilio de soldados no hospital de militares durante a Guerra na Criméia. (GEOVANINI et al., 1995). Ao retornar da guerra, Florence já era considerada uma autoridade em cuidados hospitalares, reconhecida por suas impressionantes conquistas, porém toda essa dedicação acabou comprometendo sua própria saúde, sendo que na época suscitou a hipótese de sua doença ser uma neurose. (ELLIS; HARTLEY, 1998).

Após a recuperação de sua saúde, Florence passa a se dedicar a criação de escolas de enfermagem, onde lutou para que as escolas fossem dirigidas por enfermeiras, e não por médicos. Desta forma fundou a Escola Nightingale, na Inglaterra, onde seu objetivo maior era “a formação de enfermeiras hospitalares, enfermeiras distritais para os doentes pobres e enfermeiras para o ensino”. (LUNARDI, 1998 p. 43).

Ellis e Hartley (1998) apontam os princípios básicos para a criação das escolas de enfermagem de acordo com Florence:

as enfermeiras deveriam ser treinadas em hospitais associados com escolas médicas organizadas para este propósito; as enfermeiras deveriam ser cuidadosamente selecionadas e deveriam residir em casa de enfermeiras que deveriam moldar e formar a disciplina de caráter; a matrona da escola deveria ter a autoridade final sobre o currículo, o dia-a-dia e outros aspectos da escola; o currículo deveria incluir ambos material teórico e experiências praticas; os professores seriam pagos pela sua instrução e seriam mantidos registros sobre estudantes que seriam obrigados a assistirem aas aulas e submeter-se a provas orais, escrever artigos e manter diários. (ELLIS;HARTLEY, 1998 p. 36 ).

Para as autoras Ellis e Hartley (1998), fica evidente de que toda essa habilidade e agilidade para elaborar e sistematizar idéias, fez de Florence um marco na enfermagem como profissão. Geovanini et al. (1995, p. 18) corroboram com essa afirmação dizendo que a

(22)

capacidade de Florence em “observações sistematizadas, registros estatísticos, extraídos de sua própria experiência pratica no cuidado aos doentes”, fez dela uma pessoa revolucionaria para seu tempo, sendo que sua teoria embasa os estudos de enfermagem como profissão até os dias de hoje.

Foi a partir da teoria de Florence que a enfermagem se subdividiu em categorias dentro da própria profissão:

As escolas nigthingaleanas formavam duas categorias distintas de enfermeiras: as ladies que procediam da classe social mais elevada e que desempenhavam funções intelectuais, representadas pela administração, supervisão, direção e controle dos serviços de enfermagem; e as nurses que pertenciam aos níveis sociais mais baixos e que, sob a direção das ladies, desenvolviam o trabalho manual da enfermagem. A divisão social procedeu a divisão técnica. (GEOVANINI et al., 1995 p. 18).

Foi com base neste modelo das escolas nigthingaleanas que surgiram as subdivisões da enfermagem em 1986, as quais se mantém até os dias de hoje. É dividida em quatro categorias: enfermeiro, técnico em enfermagem, auxiliar de enfermagem e parteira, conforme a Lei n° 7.498, de 25 de junho de 1986. (BRASIL, 1986).

Para Lunardi (1998) Florence foi o marco da enfermagem como profissão na Europa que teve seu inicio em 1853. No Brasil, o desenvolvimento da profissão de enfermagem inicia somente em 1922 como aponta Rizzotto (1999), com a criação da Escola de Enfermagem Anna Nery, assunto que será abordado no subcapítulo a seguir.

3.1.2 A Enfermagem no Brasil

A história da enfermagem no Brasil está relacionada ao período colonial e à chegada dos europeus na costa brasileira.(GERMANO, 1985). A autora ao falar deste período em relação a enfermagem, remete-se a chegada dos jesuítas e a mudança dos costumes da população indígena presentes no Brasil naquele momento. Esta mudança, citada pela autora, contribui para “a degradação da cultura, a mortalidade infantil e o aparecimento e disseminação de novas doenças”. (p. 22).

(23)

Geovanini et al. (1995) corrobora com Germano ao falar que, com a exploração das riquezas naturais, o Brasil passou a abrigar além de colonizadores europeus, escravos africanos. Com a chegada destes povos, segundo o autor, o aparecimento de doenças infecto-contagiosas tornaram-se epidemias que resultaram na extinção dos nativos. Ainda segundo os autores, a falta de um profissional qualificado que pudesse dar conta de atender os doentes fez com que surgisse o “curandeirismo”, praticado por leigos baseados nos conhecimentos empíricos da época.

A primeira forma de assistência aos doentes foi realizada pelos próprios índios, por meio de rituais praticados por feiticeiros e pajés das tribos. Essa tarefa, à posteriori, passou a ser executada por jesuítas que vieram para o Brasil com a colonização, passando a seguir para a responsabilidade de religiosos, voluntários e escravos. (GERMANO, 1985).

Mais tarde, diante do número crescente de doenças, é que surge a Enfermagem. O início da prática de enfermagem ocorre por volta de 1543, juntamente com a abertura das primeiras Casas de Misericórdia. Essas Casas foram fundadas, em princípio, para atender órfãos e pobres da época. Neste período, a enfermagem tinha uma função prática, de cunho empírico, sendo seu objetivo muito mais curativo do que preventivo. (GERMANO, 1985).

As primeiras Casas de Misericórdia surgiram primeiramente em Santos seguidas pelo Rio de Janeiro. O modelo predominante das Casas era assistencial e não possuíam fins lucrativos. As tarefas de enfermagem eram executadas, neste momento, principalmente por escravos homens. (GEOVANINI et al., 1995; GERMANO, 1985).

Com a fundação das Casas de Misericórdia muitos religiosos europeus passaram a vir para o Brasil, e na medida em que iam chegando eram encarregados de administrar as casas conforme aponta Germano (1985). De acordo com a autora:

O sentimento de religiosidade entre os primeiros a exercerem a enfermagem muito marcou seu espírito até hoje, haja visto que o discurso ideológico difundido por escolas, serviços e pela própria Revista Brasileira de Enfermagem sobre as qualidades inerentes ao bom profissional; aparecem como características de primeira ordem, a obediência, o respeito à hierarquia, a humildade, o espírito de servir, entre outras. (GERMANO, 1985 p. 24).

O ensino de enfermagem no Brasil ocorre somente a partir de 1832, de acordo com Pires et al. (2010). Os autores pontuam que neste ano, “institucionaliza-se a formação de parteiras por meio de cursos anexos a Escola de Medicina”.(p. 12). Mais tarde, em 1890, ainda segundo os autores, surge a “primeira escola de formação de pessoal de enfermagem denominada Escola Profissional de Enfermeiros e Enfermeiras do Hospício Nacional de

(24)

alienados”.(p. 12). Posteriormente, em 1908, é fundada a Cruz Vermelha, sendo que em 1916 é fundada a Escola Prática de Enfermeiras da Cruz Vermelha. (PIRES et al., 2010).

Neste mesmo período, meados do século XIX, alguns nomes marcaram a história da enfermagem brasileira. Dentre eles será citado aqui o de Ana Justina Ferreira Néri, considerando seu papel fundamental na enfermagem brasileira como profissão com a fundação da escola de enfermagem, a qual leva seu nome, “Escola de Enfermagem Anna Néry”, em 1922, (GERMANO, 1985; GEOVANINI et al, 1995; RIZZOTTO, 1999).

A Escola de enfermagem Anna Néry reformulou todo o modelo da enfermagem como profissão no Brasil. Sua prática passou a ser mais ser mais desenvolvida intelectualmente, e o perfil da enfermeira brasileira elitizado. (GEOVANINI et al., 1995). Sobre este novo modelo de enfermagem, os autores apontam que, a escola, com o apoio da política da época, passou a selecionar mulheres jovens de classe social elevada. Os autores ressaltam ainda que a escola justificativa o processo seletivo afirmando que as “novas enfermeiras” passariam a executar tarefas mais complexas, e necessitavam desse modo de maior nível intelectual.

Corroborando com o autor acima, Rizzotto (1999) afirma que:

O processo de seleção das alunas, nessa escola, em consonância com seus objetivos, era rígido e elitista. O primeiro regimento interno, da Escola de Enfermagem Anna Néry, exigia que das alunas a apresentação de certificado de exames preparatórios de Português, Aritmética, Francês, Inglês, Geografia e História do Brasil, Física, Química e História Natural; ou diploma de Escola Normal ou curso oficial equivalente. Exigia ainda, idade entre 20 e 35 anos; atestado médico que comprovasse suas perfeitas condições de saúde físicas e mentais; atestado de boa conduta e, a situação civil de solteira, viúva ou separada legalmente do marido. Por essas exigências podemos inferir que não eram muitas as mulheres brasileiras que atendiam a todos esses requisitos; não há duvida de que falar duas línguas estrangeiras e ter cursado uma Escola Normal eram privilégios de um grupo muito restrito. (RIZZOTTO, 1999 p. 52).

A autora aponta ainda que, Ana Néri se baseou nos princípios da escola nightingaleana para elaborar os critérios de seleção das candidatas brasileiras aspirantes a enfermeiras. (RIZZOTTO, 1999).

Além dos princípios da escola nightingaleanos, para Germano (1985), Ana Néri se baseava em seu próprio pensamento de que para ser enfermeira era necessário ser “abnegada, obediente e dedicada”. Para a autora esse pensamento parece ser um dos motivos pelo qual “os enfermeiros enfrentam sérias dificuldades de ordem profissional, desde longas jornadas de trabalho, salários baixos, e autonomia frágil”. (p. 26).

(25)

Segundo Rizzotto (1999) o modelo da escola nightingaleana muito influenciou no ensino de enfermagem no Brasil. Devido a esta influência, segundo a autora, em 1931, a Escola de Enfermagem Anna Nery ficou instituída como escola padrão, onde seu modelo de ensino deveria ser seguido para as demais escolas que já existiam e as que ainda seriam criadas. A autora enfatiza ainda que como forma de garantir o cumprimento dos princípios nightingaleanos, a escola foi dirigida por enfermeiras americanas durante alguns anos. Posteriormente, as alunas que se destacassem durante o curso receberiam uma bolsa de estudos da Fundação Rockfeller nos Estados Unidos. Sendo que ao retornarem para o Brasil deveriam ocupar os cargos exercidos pelas enfermeiras americanas.

O modelo de ensino em enfermagem nesta época, de acordo com Rizzotto (1999), seguia o modelo biomédico americano. Esse modelo justificava-se pela escassez de material sobre enfermagem em língua portuguesa, sendo que a maior parte dos livros tive que ser traduzida do inglês para o português. (RIZZOTTO, 1999).

Devido a esse modelo biomédico, que se postergou por décadas, Ellis e Hartley (1998) pontuam que ainda na década de 1970, as enfermeiras eram vistas como “parte de uma trama de fundo do hospital para os personagens médicos, cujas carreiras eram vistas como as mais importantes e que pontuavam alto em atitudes tais como inteligência, racionalidade, agressão, auto-confiança e altruísmo”. (p. 37). Rizzotto (1999, p. 57) corrobora com essa idéia ao afirmar que “embora a profissão de enfermeira fosse destinada a elite de mulheres brasileiras, há um limite imposto tanto no que se refere ao acesso ao conhecimento, quanto ao papel de submissão que desempenhariam em relação a medicina”.

No Brasil, a enfermagem passa a ser subdividida em categorias a partir de 1936, baseado no modelo americano que subdividiu a profissão em classes como as nurses e as ladies. Desta forma, neste mesmo ano, é criado em Belo Horizonte o primeiro curso de Auxiliares de Enfermagem, na Escola Carlos Chagas, fundado por Lais Netto dos Reis. (GEOVANINI et al., 1995; PIRES et al., 2010).

Para Silva (1989), outro fato importante na história da enfermagem como profissão no Brasil, foi o surgimento da categoria de técnico de enfermagem em 1966. Para a autora, esta subcategoria surge devido ao fortalecimento do ensino profissionalizante de nível médio da época. Pires et al. (2010) pontuam que o curso de técnico de enfermagem foi oferecido inicialmente pela Escola de Enfermagem Anna Nery.

Outros aspectos importantes sobre a história da enfermagem no Brasil são pontuados por Pires et al. (2010):

(26)

fundação da Associação Nacional de Enfermeiras Diplomadas (ANED) em 1926, onde em 1954 passa a se chamar Associação Brasileira de enfermagem (ABEn), nome que permanece até hoje; Primeira Revista Brasileira da Área de Enfermagem (ANNAES) em 1932, onde em 1954 passa a se chamar revista Brasileira de Enfermagem; em 1932 é fundado o Sindicato Nacional dos enfermeiros da Marinha Mercante, e em 1933 é fundado o Sindicato de enfermeiros terrestres, em 1945, este sindicato passou a ser chamado de Sindicato dos enfermeiros e Empregados em Hospitais e Casa de Saúde; em 1976 é fundado o sindicato dos Enfermeiros do Rio Grande do Sul, e em 1987 é criada a Federação Nacional dos Enfermeiros; o primeiro curso de mestrado no Brasil é criado em 1972 pela Escola Anna Nery e o primeiro curso de doutorado em enfermagem ocorre em 1981mediante esforços das escolas de enfermagem da Universidade de São Paulo e a de Ribeirão Preto. (PIRES et al., 2010, p. 14-15).

Seguindo numa linha cronológica, pode-se afirmar que o “último” grande marco na historia da enfermagem como profissão foi a criação do Projeto de Profissionalização dos Trabalhadores da Área de Enfermagem (Profae) em 1999. A criação deste programa ocorreu, segundo dados do Ministério da Saúde, pela existência da prática de enfermagem sem aperfeiçoamento técnico. (BRASIL, 2003). Cabe lembrar que até o ano de 1999, havia uma “quantidade expressiva de trabalhadores em exercício nas ações de enfermagem sem escolaridade básica e de baixa renda, desta forma, impedindo ou dificultando o acesso aos cursos de formação profissional ofertados pelo mercado educativo”.(BRASIL, 2003).

Em Santa Catarina, segundo último senso realizado em 2011, existem hoje registrados no Conselho Regional de Enfermagem, aproximadamente 8.670 enfermeiros; 9.468 auxiliares de enfermagem; e 24. 348 técnicos de enfermagem.(COREN/SC, 2011). Pode-se perceber que o número de técnicos de enfermagem é maior do que as outras duas categorias juntas. Esse número se justifica, de acordo com o site do Ministério da Saúde, pela “profissionalização em grande escala dos trabalhadores da área da saúde de nível médio, especificamente os auxiliares e técnicos de enfermagem, [que] teve início com o Profae em 1999 pela portaria 1262/GM”. (BRASIL, 2003, s/p).

Ainda de acordo com o site do Ministério da Saúde, atualmente, “a Área de enfermagem corresponde a 49,6% do Setor Saúde, enquanto que a soma de todas as especialidades médicas somam 30,3%”. Com base nesse numero calcula-se que existam hoje cerca de 1,4 profissional de enfermagem por leito hospitalar e que 57% da área da enfermagem é composta por trabalhadores de nível médio, ou seja, auxiliares e técnicos. (BRASIL, 2003)

De acordo com os dados anteriormente citados, pode-se perceber uma grande mudança na área da enfermagem como profissão. Sua história baseada nos princípios do curandeirismo e da religião, se desenvolve ao longo dos anos e se consolida como uma

(27)

ciência e uma profissão. Como ciência, porque sua prática, que antes era calcada no empirismo, hoje é pautada em estudos científicos; e como profissão porque deixou de ser uma ocupação para se tornar uma profissão pautada em princípios éticos e legais.

É notável também que houve um crescimento ainda mais evidente da categoria de técnicos em enfermagem. Esse aumento significativo ocorreu devido a valorização das profissões de nível médio conforme exposto acima. Contudo, diante de toda essa expansão da profissão como área de conhecimento e atuação, verifica-se um aumento de doenças mentais relacionadas ao exercício da profissão de enfermagem. Autores como Bittencourt (2011) e Hanzelmann e Passos (2010) apontam que os trabalhadores de saúde, principalmente da área de enfermagem de nível médio, estão entre as categorias de profissões que mais são acometidas por doenças relacionadas ao trabalho. Será que a prática de enfermagem faz adoecer? Há relação entre o adoecer no trabalho com a profissão de enfermagem? Como trabalham os profissionais de enfermagem de instituições psiquiátricas? Que aspectos são peculiares desta profissão que influenciam no adoecimento destes trabalhadores? Será que o cuidar do outro faz com que os trabalhadores de enfermagem esqueçam de cuidar de si? Como está a saúde mental dos trabalhadores de enfermagem? Trataremos de discutir esses aspectos no capitulo a seguir.

(28)

3.2 SAÚDE MENTAL DOS TRABALHADORES DE ENFERMAGEM

Neste capitulo serão delineados alguns aspectos sobre a saúde mental dos trabalhadores de enfermagem. Porém, para falar sobre a saúde mental desses trabalhadores, consideramos necessário, como ponto de partida, definir o que será considerado como conceito de saúde mental. Também será parte constituinte deste capitulo, aspectos relativos às estratégias de enfrentamento e os tipos utilizados em relação as dificuldades encontradas no ambiente de trabalho.

3.2.1 Saúde Mental

Ribeiro (1996) aponta que o conceito de saúde mental vem sendo formulado gradativamente ao longo dos anos, afastando-se assim, cada vez mais, dos conceitos tradicionais ligados à psiquiatria tradicional e chegando a um campo multidisciplinar. Desta forma, o autor destaca que há uma variedade de conceitos sobre saúde mental, propostos por diversos autores. Em seu livro intitulado “Saúde Mental”, o autor cita alguns autores que definem saúde mental:

Hilgard e Atlinson dizem que saúde mental é a ausência de doença mental, a um estado caracterizado por ajustamento, orientação produtiva e entusiasmo; Cabral e Nick dizem que é um estado relativamente constante da pessoa emocionalmente bem ajustada, com gosto pela vida, capacidade comprovada de auto-realização e de autocrítica objetiva, ou seja, é um estado positivo e não a mera ausência de distúrbios mentais; Chaplin define como um estado de boa adaptação, com uma sensação de bem-estar, prazer de viver e a sensação de que o individuo esta a exercitar seus talentos e aptidões. (RIBEIRO, 1996, p. 13).

Neste sentido, Agassi (2009) em sua pesquisa, ao examinar os conceitos de saúde mental, chega à conclusão de que “embora os conceitos de saúde e doença mental sejam bastante investigados, não há uma definição precisa sobre o que é saúde mental e o que é doença mental”. (p. 50). A autora também ressalta que a concepção de uma definição de saúde e doença mental envolve a participação de profissionais distintos, entre eles os da

(29)

Psicologia, portanto a variedade de conceitos se dá pela diferença dos fenômenos estudados por cada área.

Corroborando com Agassi, Ribeiro (1996) aponta para a relação de várias ciências e profissões que compõem a saúde mental. Desta forma, para se formar um conceito único sobre saúde mental, é necessário uma afinidade entre oito áreas profissionais diferentes relacionadas à saúde: neurologia, psiquiatria, psicologia, pedagogia, enfermagem, terapia ocupacional, serviço social e medicina.

Pode-se perceber, e de acordo com Ribeiro (1996) e Agassi (2009), que não há um consenso na definição de saúde mental. Diante desta “falta” de clareza na definição de saúde mental, Agassi (2009) levanta uma série de questionamentos sobre esta problemática. A autora questiona que na falta de um conceito claro e que dê conta da amplitude do tema analisado, como podem os profissionais de saúde intervirem em saúde mental se ainda não se sabe definir o que é saúde mental? Neste sentido, a autora sugere:

Um conceito formulado levando em consideração um sujeito que não é compartimentalizado em mente e corpo e que não é utópico parece ser o mais adequado para embasar a prática de profissionais da área da saúde e sua formação, conceito este que não foi identificado na literatura. (AGASSI, 2009, p. 57).

A autora também questiona que embora o conceito da OMS se baseie num “completo bem-estar biopsicossocial”, e que o ideal preconizado nos dias de hoje seja o olhar amplo sobre o individuo, considerando estes três aspectos pré-definidos pela OMS, as intervenções ainda são dicotomizadas no que se refere ao cuidar do corpo e o cuidar da mente. Neste sentido, a autora ressalta que a falta de intervenções que considere o sujeito em sua totalidade, talvez, seja o motivo pela qual não se chega há uma única definição.

Deste modo, parece que não há um consenso de conceito sobre saúde mental. Esta dificuldade talvez se explique pela complexidade do termo, assim como a dificuldade de um consenso entre as áreas de conhecimento que envolvem tal definição.Desta forma, como não é possível encontrar um único conceito para definir saúde mental, iremos nos basear no conceito de saúde mental apresentado pelo dicionário de psicologia da Associação americana de Psicologia:

Estado de espírito caracterizado por bem-estar emocional, bom ajustamento comportamental, relativa liberdade de ansiedade e de sintomas incapacitantes, e uma capacidade de estabelecer relacionamentos e de lidar com as demandas e estresses comuns da vida. (VANDENBOS, 2010, p. 826).

(30)

Sendo assim, ao analisar os dados a serem encontrados nesta pesquisa estaremos pautados nesta definição.

3.2.2 Saúde mental dos trabalhadores de enfermagem de saúde mental

A saúde mental dos trabalhadores de instituições psiquiátricas, de acordo com Ramminger (2005), passa a ser pensada na II Conferência Nacional de Saúde Mental, realizada em 1992. Para a autora, esta conferencia foi a primeira a abordar temas sobre os trabalhadores de saúde mental. No relatório dessa conferência, pode-se encontrar capítulos como: “Dos trabalhadores da saúde, organização do trabalho e pesquisa; direitos trabalhistas; direitos civis etc...”. (BRASIL, 2002 p. 46).

Sobre a organização do trabalho, o relatório da conferência, em seu capítulo 7, dispõe sobre “programas de educação em saúde mental para os trabalhadores do SUS” propondo “mudanças nas agências formadoras de trabalhadores de saúde, introduzindo temas de saúde mental e saúde coletiva nos diversos cursos, e estágios acadêmicos nas redes pública e privada de saúde”. (BRASIL, 1992). Para que houvesse um aprimoramento contínuo dos trabalhadores de saúde mental, o relatório propõe “um espaço para a atualização, dentro da carga horária do trabalhador, no sentido de manter contato dos profissionais com as suas entidades, rompendo assim com a alienação”.(p. 20/21).

Ainda no capítulo VII do relatório, sobre a organização do trabalho em saúde mental, é possível encontrar alguns pontos que enfatizam esse novo olhar, ou cuidado, com os profissionais de saúde mental:

Propiciar que as associações populares e profissionais lutem juntas por condições e organização de trabalho adequadas e coerentes com as mudanças na atenção à saúde mental, e direcionadas à construção da cidadania dos pacientes e dos profissionais; melhorar as condições de trabalho, possibilitando o exercício ético da profissão; criar e implantar imediatamente o Plano de Cargos, Carreira e Salários em todos os níveis (União, estados e municípios), de caráter abrangente e multiprofissional, garantindo-se a isonomia salarial e de carga horária; garantir a participação paritária e representativa dos profissionais de saúde na elaboração do Plano de Cargos, Carreira e Salários nos níveis federal, estadual e municipal; criar o regime jurídico único, respeitando as autonomias e o já definido na Constituição Federal. (BRASÍLIA, 1992, p. 21).

(31)

De acordo com Ramminger (2005), os profissionais da saúde mental são muitas vezes institucionalizados no seu modo de viver e trabalhar. Em relação a isto, no capitulo 10 do relatório da II Conferência Nacional de Saúde Mental, o qual dispõe sobre os direitos dos trabalhadores de saúde mental, é possível encontrar a elaboração de alguns itens significativos referentes à saúde mental do trabalhador de saúde mental:

diminuição do tempo de exposição dos trabalhadores às condições de fadiga e tensão psíquica, através da diminuição das jornadas de trabalho e do aumento do período de tempo livre (folgas e férias), de acordo com a natureza das atividades; períodos de descanso durante a jornada cotidiana, destinados também a permitir a preservação da atividade mental autônoma; tais intervalos deverão ser em número e duração suficientes para tais finalidades, em conformidade com as necessidades determinadas pela carga de trabalho exigida em cada posto, evitando as patologias do tipo Lesões por Esforços Repetidos (LER); em se tratando de atividades reconhecidas como especialmente desgastantes do ponto de vista psíquico, diversificar estas atividades; para a prevenção da fadiga mental será obrigatória, sempre que solicitada pelos trabalhadores a formação de grupos de avaliação dos condicionantes de fadiga e de tensão psíquica;a duração normal do trabalho, para os empregados que trabalham em regime de turnos alternados e para os que trabalham em horário fixo noturno, não poderá exceder 35 horas semanais. (BRASIL, 1992, p. 27).

É possível perceber que na II conferência houve uma preocupação com a saúde mental dos trabalhadores de saúde. Quando é afirmado, por exemplo, que será diminuído o tempo de exposição dos trabalhadores às condições de fadiga e tensão psíquica, logo se pressupõe que o trabalho em saúde mental é gerador de fadiga e tensão psíquica. Da mesma forma quando é pontuado que o trabalhador de saúde mental devera ter horário de descanso durante o turno de trabalho para a “preservação da atividade mental autônoma”, parece que esta querendo se dizer que o trabalho em saúde mental influencia na atividade psíquica do trabalhador. Sendo assim, considera-se relevante investigar se há tensão psíquica provocada pelo trabalho, como os trabalhadores de enfermagem percebem isso? Que estratégias eles utilizam para lidar com essa tensão?

Além disso, o Relatório sugere, como rede de apoio, a criação de Centros de Referência em Saúde do Trabalhador, para auxiliar o trabalhador de saúde mental em momentos onde o trabalho passa a ser alienante e causador de sofrimento psíquico. Recomenda também que a doença mental necessita ser considerada como doença do trabalho, sempre que houver comprovação de que o trabalho contribuiu para o processo de desencadeamento de transtornos mentais. (BRASIL, 1992).

Podemos concluir, a partir do exposto acima, que a saúde dos trabalhadores de saúde mental até o momento da II Conferência Nacional de Saúde Mental, não era um tema

(32)

mencionado. Ramminger (2005) afirma que na I Conferência Nacional de Saúde Mental, o tema sobre esses trabalhadores não chegou a fazer parte dos assuntos em discussão. Porém a autora ressalta que posteriormente, na III Conferência Nacional de Saúde Mental, que ocorreu em 2001, o tema foi efetivamente abordado, principalmente no que se refere a “trabalhador da saúde, na saúde mental”.

Na III Conferência Nacional de Saúde Mental, cujo tema era “Cuidar sim, excluir não”, dentre vários temas abordados, aparece uma preocupação com a saúde do trabalhador da saúde. (BRASIL, 2002). No que se refere à saúde do trabalhador, foram abordados temas como a política de recursos humanos, que além de capacitar os profissionais de saúde mental deve também garantir uma qualificação continua desses trabalhadores; remuneração adequada ao serviço prestado e superação da gestão verticalizada; questões de segurança sobre a saúde e saúde mental dos trabalhadores com ênfase na preocupação especifica com a saúde mental dos trabalhadores de saúde mental. (RAMMINGER, 2005; BRASÍLIA, 2002).

Mas porque se passou a pensar na saúde mental dos trabalhadores da saúde? Para Alves (2005, p. 59) o “contato contínuo com fenômenos amplos e complexos como a dor psíquica, constitui um aspecto diferenciador da pratica dos profissionais de saúde mental” podendo gerar, por consequência, o sofrimento. O autor, citando Schmidt (2003), fala sobre a diversidade de pessoas atendidas pelos trabalhadores de saúde. Cada pessoa atendida trás consigo uma gama de experiências e condições de vida que demandam intervenções intensas. Essas demandas, de certo modo, acabam repercutindo nos cuidadores, fazendo-os experiênciar sentimentos de limitações e fragilidades, provocando assim, sofrimento e dor.

Em pesquisa realizada por Silva e Menezes (2008), com agentes comunitários de saúde, os autores apontam que 24,1% dos entrevistados apresentaram síndrome do esgotamento profissional ou Síndrome de Burnout, sendo que a prevalência de transtornos mentais comuns foi de 43,3%. Os autores ainda ressaltam que diante deste numero elevado é necessário haver estratégias de intervenção no cotidiano desses trabalhadores, de modo a prevenir o adoecimento, assim como as investigações sobre o esgotamento de profissionais de saúde decorrentes do trabalho merece novas investigações.

Lautert e Trindade (2010) também pesquisaram a Síndrome de Burnout em equipes de atenção básica de Santa Maria. A pesquisa contou com 86 participantes que incluía: médico, agentes comunitários de saúde, técnicos em enfermagem, enfermeiro, odontólogo e auxiliar de odontólogo. As autoras apontam que dentre estes 86 sujeitos, 6

Referências

Documentos relacionados

Nos olhos, mais precisamente na mácula, a luteína e zeaxantina formam o Pigmento Macular (PM) que atua como um filtro de luz (solar e artificial), com pico de absorção de 460nm

Este trabalho se propõe a investigar as relações entre o jornalismo, a literatura e o cinema por meio da análise da obra O que é isso, companheiro?, de Fernando Gabeira (1979) e a sua

BB divulga a MPE Week para mais de 20 milhões de clientes nos canais próprios, mídias e redes sociais.. BB conecta os clientes MPE aos

Concentração de determinada substância, acima da qual podem ocorrer alterações prejudiciais à qualidade do solo e da água subterrânea VALOR DE PREVENÇÃO -

Assim, com o aprofundamento e a apreciação das perspectivas educacionais, esta estratégia não apenas vai contribuir para uma estruturação inter-pessoal

Ou talvez você tenha apenas reservado um tempo para se sentar e refletir sobre a Mensagem, para chegar um pouco mais perto daquilo que satsang significa para você, para mergulhar

Em nosso espaço de coworking, localizado no Brooklin, você encontrá uma variedade de pensadores inovadores, focados em seus trabalhos e em metas para alcançar o sucesso.. Com

Todos os dados coletados serão excluídos de nossos servidores quando você assim requisitar ou quando estes não forem mais necessários ou relevantes para oferecermos