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Investigação criminal a cargo do Ministério Público

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THIAGO RISSO RODRIGUES

INVESTIGAÇÃO CRIMINAL A CARGO DO MINISTÉRIO PÚBLICO: POSSIBILIDADE OU ILEGALIDADE?

Florianópolis 2009

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INVESTIGAÇÃO CRIMINAL A CARGO DO MINISTÉRIO PÚBLICO: POSSIBILIDADE OU ILEGALIDADE?

Trabalho de Conclusão de Curso apresentado ao Curso de Direito da Universidade do Sul de Santa Catarina, como requisito parcial à obtenção do título de Bacharel em Direito.

Orientadora: Professora Priscila Tagliari

Florianópolis 2009

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THIAGO RISSO RODRIGUES

INVESTIGAÇÃO CRIMINAL A CARGO DO MINISTÉRIO PÚBLICO: POSSIBILIDADE OU ILEGALIDADE?

Esta Monografia foi julgada adequada à obtenção do título de Bacharel em Direito e aprovado em sua forma final pelo Curso de Direito, da Universidade do Sul de Santa Catarina.

Florianópolis, 11de novembro de 2009.

_____________________________________________________ Professora e orientadora Priscila Tagliari

Universidade do Sul de Santa Catarina

_____________________________________________________ Prof.

Universidade do Sul de Santa Catarina

_____________________________________________________ Prof.

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TERMO DE ISENÇÃO DE RESPONSABILIDADE

INVESTIGAÇÃO CRIMINAL A CARGO DO MINISTÉRIO PÚBLICO: POSSIBILIDADE OU ILEGALIDADE?

Declaro, para todos os fins de direitos e que se fizerem necessários, que assumo total responsabilidade pelo aporte ideológico e referencial conferido ao presente trabalho, isentando a Universidade do Sul de Santa Catarina, a Coordenação do Curso de Direito, a Banca Examinadora e o Orientador de todo e qualquer reflexo acerca desta monografia.

Estou ciente de que poderei responder administrativa, civil e criminalmente em caso de plágio comprovado do trabalho monográfico.

Florianópolis, 11 de novembro de 2009.

______________________________________________

(5)

Dedico esta monografia a minha família, que tornou possível a conclusão desta etapa da minha vida, sempre me dando todo suporte necessário para que alcançasse meus sonhos.

(6)

AGRADECIMENTOS

Aproveito a oportunidade para deixar aqui registrado todo meu apreço por aqueles que de uma forma ou de outra influenciaram de modo positivo minha vida, auxiliando, ainda que de forma indireta e pouco perceptível, para nesta etapa ter chego.

Agradeço do fundo de meu coração à minha família, sempre tão presente em minha vida e nunca me deixando sentir sozinho ainda que nas horas mais difíceis.

Agradeço a todos meus amigos, por tornarem minha vida uma experiência ainda mais prazerosa, e por ajudarem-me a ser uma pessoa melhor com sua sinceridade.

Agradeço aos professores que fizeram parte da minha jornada auxiliando para a formação de meu conhecimento.

E finalmente agradeço a Deus, por ter me agraciado com uma vida tão cheia de realizações.

(7)

Os governos passam, as sociedades morrem, mas a polícia é eterna.

(8)

RESUMO

A presente monografia trata sobre a possibilidade de o Ministério Público realizar investigação penal preliminar. Em linhas gerais o que se propõe é um estudo acerca dos argumentos que visam defender a linha proibitiva e a permissiva de tal entendimento. Os defensores da atuação ministerial justificam-na pela maior eficiência do jus puniendi, já seus detratores repudiam o fato de se conceder poder sem limites ao parquet. Constata-se que a lacuna legal existente em nosso ordenamento é a peça-chave que deflagra a discussão, por um lado inexiste dispositivo que vete expressamente tal proceder, e, de outro, tampouco se encontram palavras que autorizem-na. A questão permanece suspensa a espera de uma intervenção legislativa, e, enquanto isso não ocorre, trava-se uma batalha de argumentos na seara doutrinária e jurisprudencial, a qual será minuciosamente detalhada no transcorrer do documento. Por fim, dedica-se algumas páginas aos autores que tem se dedicado ao esquadrinhamento da problemática.

(9)

LISTA DE SIGLAS

CF/88 – Constituição Federal de 1988 CP – Código Penal

CPC – Código de Processo Civil CPP – Código de Processo Penal MP – Ministério Público

(10)

SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO ... 12

2 INVESTIGAÇÃO CRIMINAL ... 15

2.1. ANÁLISE HISTÓRICA DO INSTITUTO DO INQUÉRITO NO BRASIL E NO MUNDO ... 15 2.2. CONCEITO ... 17 2.3. NATUREZA JURÍDICA ... 18 2.4. CARACTERÍSTICAS ... 19 2.4.1. Procedimento Escrito ... 19 2.4.2. Sigiloso ... 20 2.4.3. Obrigatoriedade ... 21 2.4.4. Caráter Inquisitivo ... 22 2.5. POLÍCIA JUDICIÁRIA ... 23

2.6. DISPENSABILIDADE DO INQUÉRITO POLICIAL ... 25

2.6.1. Análise na jurisprudência ... 26

2.7. INQUÉRITOS EXTRAPOLICIAIS ... 27

3 INTERVENÇÃO DO MINISTÉRIO PÚBLICO NA INVESTIGAÇÃO CRIMINAL... 28

3.1. ATRIBUIÇÕES DO MINISTÉRIO PÚBLICO ... 29

3.1.1. Persecução Penal ... 30

3.1.2. Controle Externo da Atividade Policial ... 31

3.2. INVESTIGAÇÃO A CARGO DO MINISTÉRIO PÚBLICO ... 33

3.2.1. Posição Permissiva ... 35

3.2.1.1. Análise jurisprudencial ... 37

3.2.2. Posição Inibidora ... 39

3.2.1.2. Análise jurisprudencial ... 42

4 POSSÍVEIS INOVAÇÕES NO INQUÉRITO ... 43

4.1 O ANTEPROJETO DE LEI DE REFORMA DO CPP ... 44

4.1.1. Concepção ... 45

4.1.2. Particularidades ... 46

4.1.2.1. O Juiz das garantias no PLS n.156/09 ... 46

4.1.2.2. A atuação ministerial no PLS n.156/09 ... 48

(11)

4.2.1. Corrente Pró Investigação pelo MP ... 50

4.2.1. Corrente Contra Investigação pelo MP ... 53

4.3. ASSUNTOS CORRELATOS ... 54

4.3.1. A Crise do Inquérito Policial ... 54

4.3.2. A Criação da Polícia Penal – PEC 308/04 ... 56

5 CONSIDERAÇÕES FINAIS ... 58

(12)

1 INTRODUÇÃO

A presente monografia tem por escopo demonstrar a grande divergência existente no meio jurídico quanto à possibilidade do Ministério Público realizar investigação penal preliminar.

Frente às incertezas existentes no tocante a questão em nosso arcabouço legal, fez-se a decisão pelo estudo do tema. Almeja-se aqui, trazer ao leitor o que de mais recente tem se debatido sobre o tema, agrupando um grande volume de informações dispostas em variadas obras. A construção será feita de forma progressiva, afim de que, até mesmo para aqueles que desconheçam tal problemática, com ela familiarize-se de forma harmoniosa.

A possibilidade jurídica de o órgão ministerial realizar investigações na fase persecutória é vislumbrada por uns e rechaçada por outros. A discussão é majoritariamente constitucional, gravitando em torno de, mais precisamente, dois artigos. Nossa Constituição Federal em seu art.144, parágrafo 1º, inciso IV concede exclusividade à Polícia Federal nas funções de Polícia Judiciária, não agraciando, no entanto, as Polícias Civis com tal prerrogativa. Voltando um pouco na Constituição, em seu art.129, inciso VI, é dado sinal verde para o órgão ministerial requisitar informações em procedimentos administrativos. Cria-se então campo para infindáveis e acaloradas discussões acerca do tema: Pode ou não investigar?

O objetivo geral do presente estudo é o de, basicamente, realizar uma análise acerca da permissividade da realização de investigações preliminares criminais pelo órgão ministerial, uma vez que tal assunto é alvo de grandes divergências tanto na práxis quanto na teoria jurídica.

No tocante aos objetivos específicos, os quais se fazem necessários para a consecução da meta principal, tem-se a análise jurisprudencial de nossos tribunais, bem como a exposição do pensamento doutrinário acerca do tema. Necessária, também se torna a identificação dos dispositivos legais que se encontram no epicentro de tal discussão, os quais constituem o centro de muitas dúvidas. Finalmente, intenta-se propor argumentos reflexivos colhidos de diversos autores, que visam alavancar, ou sepultar de vez, o sistema contemplativo da investigação a cargo do parquet.

(13)

O inquérito policial é o instrumento por excelência de investigação criminal na fase persecutória, sua finalidade é a de apurar a autoria dos crimes como bem nos informa o art.4º do Código de Processo Penal. No entanto, a falta de recursos – tanto humanos como materiais - destinados aos órgãos policias faz com que, mais das vezes, o processo investigativo a cargo desse organismo fique debilitado.

A questão insurgente da investigação penal preliminar a cargo do MP é assunto de grande importância, nos dias de hoje mais que nunca, para nossa sociedade. O sentimento coletivo de insegurança é latente em todos os cidadãos e o povo tem o desejo de ver um estado mais firme e presente no trato com os infratores. Muitas alternativas têm sido debatidas na área do direito penal para que se ponham fim a estas questões como, por exemplo, a diminuição da idade penal e o aumento do rigor das penas. A investigação deflagrada pelo órgão ministerial é, dentre outras tantas, uma teoria a ser debatida e esmiuçada em prós e contras, afim de que possamos equacionar da melhor forma possível o combate a violência.

No tocante a metodologia utilizada o método será o dedutivo e documental. Tal procedimento afigura-se como o mais adequado para o presente estudo uma vez que para sua consecução serão necessárias análises normativas, doutrinárias e jurisprudenciais.

Assim sendo, para que o leitor possa introduzir-se de forma gradual na problemática, o presente estudo foi sistematicamente dividido em cinco capítulos. Passa-se agora a uma breve análise de cada um deles.

O corrente e primeiro Capítulo nada mais é que a introdução, tratando de forma genérica todo o conteúdo que se fará presente no decorrer do trabalho.

A pesquisa de fato inicia-se no Capítulo 2, o qual versa unicamente sobre a investigação penal preliminar (Inquérito Policial), traçando seu desenvolvimento histórico e definindo conceitos, elementos e características.

No Capítulo 3 a monografia evolui para o cerne de nossas atenções: a atuação do MP no inquérito policial. Neste momento serão exibidas posições favoráveis bem como as contrárias a tal posicionamento. A análise jurisprudencial aqui realizada é de suma importância para que se entenda a profundidade da divergência.

O Capítulo 4 concerne ao futuro de tal discussão. Nele intenta-se propor soluções de modo que, sobrevindo um ou outro entendimento, possa ele

(14)

aperfeiçoar-se dentro de nosso ordenamento. Também serão discutidas questões contemporâneas relacionadas ao tema.

Nas considerações finais objetiva-se uma síntese da massa de informação distribuída ao longo dos capítulos, induzindo o leitor a uma análise crítica, podendo assim, formar livremente seu convencimento sobre a questão.

.

(15)

2 INQUÉRITO POLICIAL

Para que o objetivo do presente trabalho seja alcançado, necessárias se fazem abordagens preliminares dos temas por ele englobados. Comecemos, portanto, pelo estudo do inquérito policial sob todos seus aspectos.

2.1. ANÁLISE HISTÓRICA DO INSTITUTO DO INQUÉRITO NO BRASIL E NO MUNDO

A palavra inquérito por si só já guarda certa semelhança com outra, por bem dizer mais nefasta, que é a da inquisição. A inquisição ou santa inquisição era uma instituição aonde a política e a religião se misturavam de uma forma perturbadora, fazendo com que atrocidades fossem cometidas contra aqueles tidos como “criminosos” aos olhos das autoridades e de Deus.

Para melhor entendermos este funesto período de investigações e punições arbitrárias, Silva1 explica que “O inquisidor era tido como um juiz delegado, uma vez que tinha poder sobre o que lhe foi delegado pelo Papa [...] Toda e qualquer ameaça à fé católica era averiguada pelo Santo Ofício”.

Infelizmente esse período de trevas perdurou por muitos anos, vindo a sacrificar inúmeros inocentes, baseando-se apenas em convicções religiosas e investigações altamente tendenciosas.

No Brasil, para melhor entendermos o surgimento deste procedimento, trazemos o ensinamento de Siqueira2

O inquérito policial não foi contemplado pelas Ordenações Filipinas, nas quais não há distinção entre a polícia judiciária e a preventiva. Nem o Código Penal do Império falava em inquérito, embora mencionasse os

inspetores de quarteirão. Estes não tinham atribuição de elaborar

investigatório policial. Assim, não havia inquérito ou qualquer coisa semelhante a esse nomen júris.Ele surgiu com a Lei 2.033, de 1887, que o

1

SILVA, José Geraldo da. O Inquérito Policial e a Polícia Judiciária. 1ª ed. rev., ampl. e atual. Campinas: Bookseller, 2000, p.21.

2

SIQUEIRA, Galdino. Curso de processo criminal, p.306 apud AQUINO, José Carlos Gonçalves e NALINI, José Renato. Manual de Processo Penal. 2ª ed. rev. e atual. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2005, p.119.

(16)

conceituava como redução a instrumento das diligências necessárias à elucidação do fato infracional e de sua autoria e cumplicidade. Conforme o contido no art. 42 do Decreto 4.824, de 1871, “o inquérito policial compreende todas as diligências necessárias para a verificação da existência do crime, com todas as suas circunstâncias, e para descobrimento de seus autores e cúmplices”.

É perceptível, portanto, a importância de tal instituto. Uma vez que há mais de século existe o interesse de defini-lo como um instrumento na elucidação de crimes.

Muito interessante é também o estudo realizado por Neto3, renomado procurador da república, acerca da evolução histórica deste instituto dentro do ordenamento pátrio, vejamos algumas passagens do artigo de sua autoria:

A história da investigação criminal entre nós talvez comece com as Ordenações Afonsinas (1456). Talvez, porque desde o século 12 o rei legislava em Portugal. Mas o detalhamento da investigação criminal chegou até nós e ficou por mais tempo nas Ordenações Filipinas (1603). Quando em vigor, a investigação criminal se limitava, basicamente, à audiência de testemunhas. Essa investigação criminal, que hoje chamamos inquérito, então se chamava “devassa”. As devassas eram conduzidas pelos juízes (Livro 1, título 65, itens 31 a 72), que podiam ser “de fora” (nomeados pelo rei) ou “ordinários” (eleitos por homens bons moradores de um determinado “concelho”).

Ainda segundo o autor4

Até 1841, portanto, a investigação criminal era feita por juízes: juízes ordinários, na vigência das ordenações, e juiz de paz, de 1832 a 1841. Em 1841, é que os chefes de polícia e seus delegados também passam a fazer investigação. Note-se que é aí que surge a expressão “delegado”, ou seja, o que recebe delegação do chefe de polícia. Mesmo assim, só os desembargadores e os juízes de direito podiam ser chefes de polícia; e só os juízes e cidadãos podiam ser delegados e subdelegados (todos amovíveis e obrigados a aceitar o encargo – Lei 261/1841, art. 2º). Mas a Lei 261 mantinha atribuições policiais com os juízes municipais (art. 17, parágrafo 2º).

O paralelo histórico traçado pelo pesquisador é de grande valia ao passo que, deparando-se com realidade tão distinta da qual se tem hoje é conclusivo observar a evolução de tal instituto.

3

NETO, João Marques Brandão. A história da investigação criminal. 08.2009. Disponível em: <http://www.4shared.com/account/file/149923297/d114a8b8/A_histria_da_investigao_criminal.html>. Acesso em: 15 set. 2009.

4

(17)

2.2 CONCEITO

Como aqui se trata de uma monografia jurídica nada mais justo do que um breve estudo etimológico dos principais termos em questão. Vemos então que “o vocábulo inquérito vem das vozes latinas quaeritare e significa andar sempre em busca. É um substantivo masculino que se traduz no ato ou efeito de inquirir (procurar informações acerca de, indagar, investigar, fazer perguntas).” 5

Uma vez definida a origem do termo analisemos agora o conceito de inquérito policial nas palavras do doutrinador Fernando Capez6

é o conjunto de diligências realizadas pela polícia judiciária para a apuração de uma infração penal e de sua autoria, afim de que o titular da ação penal possa ingressar em juízo [...] Trata-se de procedimento persecutório de caráter administrativo instaurado pela autoridade policial. Tem como destinatários imediatos o Ministério Público, titular exclusivo da ação penal pública [...] e o ofendido, titular da ação penal privada [...] como destinatário mediato tem o juiz, que se utiliza dos elementos de informação nele constantes, para o recebimento da peça inicial e para a formação do seu convencimento quanto a necessidade de decretação de medidas cautelares.

Segundo informa-nos Rangel7 nosso CPP não é claro ao conceituar o inquérito policial e o seu objeto, no entanto é possível valer-se do conceito presente no Código português, o qual informa que “O inquérito policial compreende o conjunto de diligências que visam investigar a existência de um crime, determinar seus agentes e a responsabilidade deles e descobrir e recolher as provas, em ordem a decisão sobre a acusação”8.

Para Marcos Kac9 o inquérito policial nada mais é do que “procedimento administrativo visando dar à acusação lastro mínimo inicial ao exercício da ação penal [...]”

E ainda em Acosta10 temos: “inquérito, in genere, é todo o procedimento legal destinado à reunião de elementos acerca de uma infração penal. É a instrução extrajudicial”

5

AQUINO, José Carlos Gonçalves e NALINI, José Renato. Manual de Processo Penal. 2ª ed. rev. e atual. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2005, p.119.

6

CAPEZ, Fernando. Curso de Processo Penal. 12ª ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2005, p.67. 7

RANGEL, Paulo. Direito Processual Penal. 13ª ed. rev. e atual. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2007, p.66.

8

Código de Processo Penal Português. art.262, item 1 apud RANGEL, Paulo. 2007, p.66 9

KAC, Marcos. O Ministério Público na Investigação Preliminar. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2004, p.106.

(18)

Assim sendo, claro torna-se que tal procedimento tem por escopo dar suporte fático a denúncia a ser oferecida posteriormente pelo órgão ministerial quando fizerem-se necessárias a reunião de tais elementos, pois como posteriormente veremos, o inquérito é prescindível quando o MP já dispõe de elementos suficientes para deflagrar a ação penal.

2.3. NATUREZA JURÍDICA DO INQUÉRITO POLICIAL

A fim de que prossigamos em nosso estudo é de bom alvitre que relembremos as palavras de Rangel11 ao trazer-nos o conceito puro e simples de natureza jurídica:

Muitas vezes, o operador do direito confunde a natureza jurídica de um instituto com seu conceito, este com suas características. Enfim... dar a natureza jurídica de um instituto é [...] enquadrá-lo dentro da ordem jurídica vigente. É perceber sua própria natureza dentro da sistemática em vigor.

Feita esta conceituação passemos então a análise de tal natureza no que concerne ao inquérito policial. Mougenot12 esclarece-nos que “o inquérito policial é procedimento administrativo. Não é processo, porquanto não se constitui em relação trilateral, já que o investigado não é parte do procedimento.”

Tourinho Filho13 discorre com muita propriedade acerca do tema ao dirimir qualquer dúvida acerca de sua natureza

O inquérito policial tem natureza administrativa. São seus caracteres: ser escrito (art.9º do CPP), sigiloso (art.20 do CPP) e inquisitivo, já que nele não há o contraditório. É verdade que o inc. LV do art. 5.º da CF dispõe que “aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são assegurados o contraditório e ampla defesa, com os recursos a ela inerentes”. Nem por isso se pode dizer seja o inquérito contraditório. Primeiro, porque no inquérito não há acusado; segundo porque não é processo [...].

10

ACOSTA, Walter P. O Processo Penal. 1967, p.30 apud SILVA, José Geraldo da. O inquérito

policial e a polícia judiciária. 1ª ed. rev., atual. e ampl. Campinas: Bookseller, 2000, p.55

11

RANGEL, 2007, p.69. 12

MOUGENOT, Edilson. Curso de Processo Penal. 4ª ed. São Paulo: Saraiva, 2009, p.110. 13

TOURINHO FILHO, Fernando da Costa. Manual de Processo Penal. 11ª ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2009, p.69

(19)

A partir destas informações podemos concluir que o inquérito policial é de fato mero procedimento administrativo, e não contemplado pelas garantias inerentes ao processo administrativo.

2.4. CARACTERÍSTICAS DO INQUÉRITO POLICIAL

É certo que, apesar de procedimento unilateral, o inquérito é regulado por vários dispositivos legais do CPP e até da CF/88, conferindo-lhe assim algumas características.

2.4.1. Procedimento escrito

Dispõe o artigo 9º do CPP14 que “todas as peças do inquérito policial serão, num só processado, reduzidas a escrito ou datilografas e, neste caso, rubricadas pela autoridade”. Para Mirabete15 “O inquérito policial é um procedimento escrito, já que destinado a fornecer elementos ao titular da ação penal”.

Rangel16 assevera a real necessidade desta formalidade:

Esta é uma providência que visa a exigir de uma certa forma que as autoridades policiais acompanhem todas as investigações desenvolvidas pelos seus agentes e documentadas nos autos, evitando, por exemplo, a prática comum e ilegal de escrivães de polícia lavrarem o flagrante e depois o delegado assinar.

Através de pequenos detalhes, busca o legislador conferir maior credibilidade ao processo investigativo.

14

BRASIL. Decreto-Lei nº 3.689, de 3 de outubro de 1941. Código de Processo Penal. Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/CCIVIL/Decreto-Lei/Del3689Compilado.htm>. Acesso em: 20 set. 2009.

15

MIRABETE, Julio Fabbrini. Processo Penal. 14ª ed. rev. e atual. São Paulo: Atlas, 2003, p.78. 16

(20)

2.4.2 Sigiloso

O sigilo é característica inerente ao inquérito. O transgressor na maioria das vezes busca encobrir a verdade acerca do ato delituoso, cabe a autoridade competente portanto, meticulosidade e discrição no processo investigatório para que a colheita probatória se faça de modo mais proveitoso possível.

O inquérito policial é ainda sigiloso, qualidade necessária a que possa a autoridade policial providenciar as diligências necessárias para a completa elucidação do fato sem que lhe oponham, no caminho, empecilhos para impedir ou dificultar a colheita de informações com ocultação ou destruição de provas, influência sobre testemunhas etc. (MIRABETE, 2003, p.78)

Com muita ponderação Rosa17 frisa a importância do sigilo nesta fase:

Quanto menor é o numero de pessoas que devem intervir para a descoberta do delito e dos responsáveis pela sua prática, mais fácil se torna a descoberta da verdade. Fato sabido por muitos, em pouco tempo será conhecido por todos. Ora, na generalidade desses casos, os comentários pululam e o crime ocorrido se torna o assunto do dia, de tal forma que, por um lado, ditos comentários prejudicam a ação da autoridade policial com boatos geralmente não conformes à verdade, concorrendo comumente para dificultá-la, ao mesmo tempo que, por outro lado, põem os delinqüentes ao corrente de todos os atos e passos da autoridade, sendo-lhes, portanto, fácil esconder os vestígios do crime e escapar à prisão.

Poder-se-ia perguntar aonde se encontra o princípio da publicidade em meio a este sigilo. Salles Junior18 nos lembra que tal princípio se harmoniza unicamente com o Processo Penal, aonde é peça chave para garantia da ampla defesa, não se afinando, todavia, com o caráter inquisitivo do inquérito.

Finalmente para Capez19 tal sigilo não se estenderia nem para o representante do MP, como para o magistrado. E no tocante ao procurador, este também poderia consultar os autos do inquérito desde que não fosse decretado judicialmente o sigilo, caso em que não estaria habilitado para acompanhar os atos procedimentais.

17

ROSA, Borges da. Processo Penal Brasileiro apud PEDROSO, Fernando de Almeida. Processo

Penal O Direito de Defesa: Repercussão, Amplitude e Limites. 3ª ed.rev., atual. e ampl. São

Paulo: Revista dos Tribunais, 2001, p.60. 18

SALLES JUNIOR, Romeu de Almeida. Inquérito Policial e Ação Penal. 7ª ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: Saraiva, 1998, p.6.

19

(21)

2.4.3. Obrigatoriedade

Em relação a obrigatoriedade afirma Mougenot20 “obrigatoriedade decorre da redação do art.5º do CPP21, que determina o seguinte: ‘Nos crimes de ação pública o inquérito policial será iniciado’, não deixando margem, portanto, para a discricionariedade da autoridade policial”.

Tal posicionamento é unívoco entre todos os doutrinadores.

Tourinho Filho22 une-se a tal raciocínio ao dizer que, uma vez ciente a autoridade policial de que em sua circunscrição houve uma prática delituosa, deverá ela prontamente instaurar inquérito, sob pena de infringir o disposto no art.319 do CP, uma vez que a sua instauração é um dever jurídico decorrente do princípio da obrigatoriedade do processo, o qual encontra no inquérito sua fase informativa.

A respeito da negativa de sua instauração, ainda o autor23conclui com perspicácia:

O Estado tem interesse irrefragável em punir todos aqueles que cometerem infrações, e, por isso, seus agentes, no campo da persecução, não podem negligenciar, pois, do contrário, conceder-se ia à Autoridade Policial uma espécie de poder de indultar.

A deflagração compulsória da atividade investigativa de delitos é de interesse, portanto, não apenas da Autoridade Policial e tampouco apenas um desejo do Estado em punir, a real força motriz intrínseca a tal atividade é a proteção do bem estar coletivo.

20

MOUGENOT, 2009, p.105. 21

BRASIL. Decreto-Lei nº 3.689, de 3 de outubro de 1941. Código de Processo Penal. Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/CCIVIL/Decreto-Lei/Del3689Compilado.htm>. Acesso em: 20 set. 2009.

22

TOURINHO FILHO, Fernando da Costa. Processo Penal. 27ª ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2005 v.1, p.221.

23

(22)

2.4.4. Caráter inquisitivo

O caráter inquisitivo diz respeito a uma peculiaridade dentro de nosso ordenamento legal. Tal característica é aceita por não tratar-se o inquérito de processo, mas mero procedimento. Não obstante seja permitida a assistência de um advogado ao investigado, este não fará sua defesa, uma vez que inexiste contraditório na fase de inquérito, ainda que lhe sejam permitidas a requisição de diligências e a indicação de testemunhas.24

A respeito de tal característica, Capez25 traz a baila o seu entendimento:

Caracteriza-se como inquisitivo o procedimento em que as atividades persecutórias concentram-se nas mãos de uma única autoridade, a qual, por isso, prescinde, para a sua atuação, da provocação de quem quer que seja, podendo e devendo agir de ofício, empreendendo, com discricionariedade, as atividades necessárias ao esclarecimento do crime e da sua autoria. É característica oriunda dos princípios da obrigatoriedade e da oficialidade da ação penal. É secreto e escrito, e não se aplicam os princípios do contraditório e da ampla defesa, pois, se não há acusação, não se fala em defesa. Evidenciam a natureza inquisitiva do procedimento o art. 107 do Código de Processo Penal, proibindo a argüição de suspeição de autoridades policiais, e o art.14, que permite à autoridade policial indeferir qualquer diligência requerida pelo ofendido ou indiciado (exceto o exame de corpo de delito, à vista do disposto no art.184) [...]

Com extrema lucidez Pedroso26, em seu trabalho sobre o direito de defesa dentro do Processo Penal, adverte que o fato de conceder-se direito de defesa em sede de inquérito não teria outro resultado senão o de conturbá-lo, gerando danos processuais futuros. Ainda acrescenta o autor27 “o caráter inquisitivo do inquérito deve ser preservado, para que dessa sua natureza decorra, como consectário lógico e sempre que necessário à elucidação do fato ou à conveniência da sociedade, o sigilo das investigações”.

Os julgados, por fim, sacramentam a importância de tal característica:

24 SILVA, 2000, p.41-42. 25 CAPEZ, 2005, p.73. 26

PEDROSO, Fernando de Almeida, Processo Penal O Direito de Defesa: Repercussão,

Amplitude e Limites, 3ª ed. rev. atual. e ampl. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2001, p.59.

27

(23)

PRINCÍPIOS DO CONTRADITÓRIO E DA AMPLA DEFESA NO INQUÉRITO POLICIAL. INEXISTÊNCIA: “[...] Os princípios do contraditório e da ampla defesa não se aplicam ao inquérito policial, que é mero procedimento administrativo de investigação inquisitorial” (STJ, 5ª T., rel. Min. Gilson Dipp, j. 27-5-2003, DJ, 4 ago. 2003, p.327)

Concluí-se, portanto, que apesar de freqüentemente criticado por inúmeros advogados criminalistas, o inquérito policial é elaborado dentro de um sistema inquisitorial.

2.5. POLÍCIA JUDICIÁRIA

Polícia, do grego politeia, que significa “administração da cidade. Fleury28 nos elucida acerca dos diferentes tipos que dispomos em nosso sistema:

Segundo o ordenamento jurídico do País, à Polícia cabem duas funções: a administrativa (ou de segurança) e a judiciária [...] com a segunda, de

caráter repressivo, após a prática de uma infração penal recolhe elementos

que o elucidem para que possa ser instaurada a competente ação penal contra os autores do fato.

Percebemos, portanto, que a polícia judiciária nada mais é do que aquela responsável pelo inquérito policial. Corrobora Silva29com este entendimento:

“Não obstante o nome polícia judiciária, ela não exerce a atividade jurisdicional, atuando exclusivamente no inquérito policial, que fornecerá ao Ministério Público os elementos que lhe permitirão a propositura da competente ação penal”.

Acerca de sua origem, Neto30 auxilia-nos com o brilhante artigo que redigiu sobre o assunto:

A polícia judiciária é criada no Brasil em 1842 (Regulamento 120). Mas a investigação continua a se chamar “auto de corpo de delito” e “formação da culpa” (art. 198) e pode ser conduzida pela polícia ou pelos juízes municipais (art. 262). O inquérito policial, com a conformação mais próxima da que hoje é conhecida, surge no Brasil em 1871 (Decreto 4.824). Sua definição aparece no art. 42, era atribuição da polícia, mas as autoridades judiciárias poderiam nele interferir. Ou seja: continuava a não ser monopólio da polícia e, sim, do Judiciário. Mesmo assim, seu destinatário era o promotor público (art.44), também considerado uma autoridade judiciária.

28

FLEURY FILHO, 1990 apud MIRABETE, 2003, p.74 29

SILVA, 2000, p.52. 30

(24)

A definição de polícia judiciária por Capez31 é relevante para a nossa compreensão do tema: “função auxiliar a justiça [...] atua quando os atos que a polícia administrativa pretendia impedir não foram evitados. Possui a finalidade de apurar as infrações penais e suas respectivas autorias, a fim de fornecer ao titular da ação penal elementos para propô-la”.

No âmbito estadual tal atividade é desenvolvida pelas polícias civis, já no âmbito federal é tarefa da polícia federal. Atribuições estas definidas por nossa CF/88, art.14432:

Art. 144. A segurança pública, dever do Estado, direito e responsabilidade de todos, é exercida para a preservação da ordem pública e da incolumidade das pessoas e do patrimônio, através dos seguintes órgãos: I - polícia federal;

II - polícia rodoviária federal; III - polícia ferroviária federal; IV - polícias civis;

V - polícias militares e corpos de bombeiros militares.

§ 1º A polícia federal, instituída por lei como órgão permanente, organizado e mantido pela União e estruturado em carreira, destina-se a:(Redação dada pela Emenda Constitucional nº 19, de 1998)

I - apurar infrações penais contra a ordem política e social ou em detrimento de bens, serviços e interesses da União ou de suas entidades autárquicas e empresas públicas, [...]

IV - exercer, com exclusividade, as funções de polícia judiciária da União.

§ 4º - às polícias civis, dirigidas por delegados de polícia de carreira, incumbem, ressalvada a competência da União, as funções de polícia judiciária e a apuração de infrações penais, exceto as militares.

É perceptível o tratamento diferenciado dado a Polícia Federal e as Polícias Civis. No âmbito da União, a Polícia Federal exerce, com exclusividade, essa função (art.144, parágrafo 1º, inciso IV, CF). No âmbito dos Estados, incumbe à Polícia Civil, como regra, a apuração das demais infrações penais (art.144, parágrafo 4º, CF) 33

Bem vemos, portanto, que existe grande diferença entre o que é regra e o que é exclusividade, pois como bem nos informa o ditado popular que para toda regra há uma exceção. Aqui esta lógica encontra campo e aperfeiçoa-se nas palavras de Noronha34, ao lembrar-nos que “autoridades outras que não as policiais

31

CAPEZ, 2005, p.68. 32

BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituiçao.htm>. Acesso em: 01 out. 2009.

33

DEMERCIAN, Pedro Henrique e MALULY, Jorge Assaf. Curso de Processo Penal. 2ª ed.São Paulo: Atlas, 2001, p.71.

34

NORONHA, E. Magalhães. Curso de Direito Processual Penal. 28ª ed. atual. São Paulo: Saraiva, 2002, p.22.

(25)

podem elaborar inquéritos, como as sanitárias, nos delitos contra a saúde pública [...], as administrativas, nos delitos contra a Administração Pública [...]”.

Este breve estudo sobre aquilo que conhecemos como polícia judiciária é de grande valia ao passo que nos ajuda a transcender o raciocínio pouco arejado de acharmos ser sua a exclusividade na apuração delituosa.

2.6. DISPENSABILIDADE DO INQUÉRITO

Como já visto até agora, o inquérito policial tem por escopo a reunião de informações com a finalidade de embasar o titular da ação penal para o ingresso em juízo. No entanto, existem situações onde não existe a necessidade de apuração de maiores informações e a feitura de um inquérito seria inócua. Sobre a dispensabilidade do inquérito, com maestria nos ensina Capez35 (2005, p.76):

O inquérito policial não é fase obrigatória da persecução penal, podendo ser dispensado caso o Ministério Público ou ofendido já disponha de suficientes elementos para a propositura da ação penal (CPP, arts.12, 27, 39, §5º, e 46, §1º). [...] O titular da ação penal pode abrir mão do inquérito policial, mas não pode eximir-se de demonstrar a verossimilhança da acusação, ou seja, a justa causa da imputação, sob pena de ver rejeitada a peça inicial. Não se concebe que a acusação careça de um mínimo de elementos de convicção.

Corroborando ainda com este entendimento Tourinho Filho36 relembra que “o inquérito policial é peça meramente informativa [...] desde que o titular da ação penal [...] tenha em mãos as informações necessárias [...] é evidente que o inquérito será perfeitamente dispensável”.

35

CAPEZ, 2005, p.76. 36

TOURINHO FILHO, Fernando da Costa. Processo Penal. 31ª ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2009, v.1, p.208.

(26)

2.6.1 Análise na jurisprudência

Acerca da dispensabilidade do inquérito nossos tribunais mantêm o mesmo e correto posicionamento, como podemos conferir:

EMENTA: PENAL. PROCESSUAL PENAL. MINISTÉRIO PÚBLICO: INVESTIGAÇÃO: INQÚERITO POLICIAL. CRIME DE DISPENSA IRREGULAR DE LICITAÇÃO. LEI 8.666/93, art. 24, XIII, art. 89, art. 116. I. - A instauração de inquérito policial não é imprescindível à propositura da ação penal pública, podendo o Ministério Público valer-se de outros elementos de prova para formar sua convicção. II. - Não há impedimento para que o agente do Ministério Público efetue a colheita de determinados depoimentos, quando, tendo conhecimento fático do indício de autoria e da materialidade do crime, tiver notícia, diretamente, de algum fato que merecesse ser elucidado. [...]37

E, ainda:

INQUÉRITO. DISPENSABILIDADE (STJ): “[...] É imprópria a alegação de inépcia da exordial acusatória, sob o fundamento de que não estaria firmada em procedimento investigatório que indicasse a participação do paciente nos atos delituosos, se demonstrado o elo entre as condutas dos denunciados, inclusive em relação ao paciente, havendo a descrição dos atos praticados por cada um, o que resultou na acusação pela prática dos delitos de receptação e formação de Quadrilha. O Órgão Ministerial não é vinculado a existência do procedimento investigatório policial – o qual pode ser eventualmente dispensado para a propositura da ação pena [...]l” 38

É, portanto, cediço, no entender, inclusive, das mais altas instâncias julgadoras, que a investigação preliminar é dispensável para a propositura da ação penal. Contanto, é claro, que disponha o MP de lastro probatório mínimo para embasar a denúncia.

37

BRASIL. Supremo Tribunal Federal. INQ 1957/PR. Pleno. Autor: Ministério Público Federal. Indiciados: André Zacharow e outros. Relator: Min. Carlos Velloso. Julgado em 11.05.2005. Publicado

em 11.11.2005. Disponível em

http://www.stf.jus.br/portal/jurisprudencia/listarJurisprudencia.asp?s1=RTJ,%2076/741&base=baseAc ordaos. Acesso em 15 set. 2009.

38

BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. RHC 12.308 / ES. Quinta Turma. Recorrente: Francisco de Assis Araújo Herkenhoff. Recorrido: Tribunal de Justiça do Estado do Espírito Santo. Relator: Min. Gilson Dipp. Julgado em 21.02.2002. Publicado em 08.04.2002. Disponível em

https://ww2.stj.jus.br/websecstj/cgi/revista/REJ.cgi/IMGD?seq=81285&nreg=200101972358&dt=8/4/2 002&formato=PDF. Acesso em 15 set. 2009.

(27)

2.7. INQUÉRITOS EXTRAPOLICIAIS

Para aclararmos a existência desta outra espécie de inquérito, é mister que transcrevamos na íntegra o conteúdo do parágrafo único do artigo 4º do CPP39, in verbis:

Art. 4º A polícia judiciária será exercida pelas autoridades policiais no território de suas respectivas circunscrições e terá por fim a apuração das infrações penais e da sua autoria.

Parágrafo único. A competência definida neste artigo não excluirá a de autoridades administrativas, a quem por lei seja cometida a mesma função.

É, portanto, no parágrafo único do supracitado artigo que reside a possibilidade de serem realizados inquéritos por outras “autoridades administrativas”, como bem descreve o dispositivo.

Tourinho Filho40 em seu Código de Processo Penal Comentado, ao tratar do dispositivo em tela nos lembra de alguns inquéritos que não se encontram a cargo da polícia judiciária. Tais como os inquéritos parlamentares que ficam a cargo das comissões parlamentares de inquérito e o inquérito civil, sob a responsabilidade do MP. Este último, segundo o autor, “apura responsabilidade por danos causados ao meio ambiente, ao consumidor, a bens e direitos de valor artístico, estético, histórico, paisagístico, visando a propositura da ação civil pública (lei 7.347/85)”.

Não prenderemos nossa atenção nesses procedimentos uma vez que não se afiguram como objeto do estudo em questão, valendo apenas salientar que a atividade investigativa não é algo estranho ao MP, ao menos na esfera cível.

39

BRASIL. Decreto-Lei nº 3.689, de 3 de outubro de 1941. Código de Processo Penal. Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/CCIVIL/Decreto-Lei/Del3689Compilado.htm>. Acesso em: 20 set. 2009.

40

TOURINHO FILHO, Fernando da Costa. Código de Processo Penal Comentado. 12ª ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2009, v.1, p.36.

(28)

3 INTERVENÇÃO DO MINISTÉRIO PÚBLICO NA INVESTIGAÇÃO CRIMINAL

No capítulo anterior foram vistos os atributos da investigação criminal sob todos seus aspectos. Passaremos agora no presente capítulo a aprofundar o estudo, aproximando-nos do objeto da monografia.

A intervenção ministerial no inquérito pode ser vista sob duas diferentes formas. A primeira diz respeito a uma intervenção já praticada e imune a qualquer divergência, referente a uma das atribuições constitucionalmente definidas ao parquet. A CF/88 em seu art.129, inciso VIII41 é clara:

Art. 129. São funções institucionais do Ministério Público:

VIII - requisitar diligências investigatórias e a instauração de inquérito policial, indicados os fundamentos jurídicos de suas manifestações processuais;

É de notável certeza, portanto, que ao MP são conferidos poderes de intervir no inquérito policial por meio de requisição de novas diligências, contanto que embase seu pedido em fundamentos inteligíveis do ponto de vista jurídico.

Neste sentido, preleciona Mirabete42

A polícia é [...] órgão auxiliar da Justiça e [...] deve [...] “realizar as diligências requisitadas pelo juiz ou pelo Ministério Público” (CPP art.13, inc.II). As requisições, que podem ser apresentadas à autoridade policial a qualquer momento, antes, durante ou após o inquérito, são ordens a que ela está obrigada a atender, ainda quando não lhe pareçam adequadas. Somente quando forem ilegais haverá oportunidade para a recusa ao cumprimento das requisições.

Encontra-se cediça na doutrina, portanto, esta forma de ingerência do parquet no inquérito policial

A outra hipótese aludida é a de uma intervenção mais contundente, qual seja a possibilidade do órgão ministerial assumir as rédeas do processo investigatório, tendo assim controle absoluto sobre a investigação realizada pela polícia judiciária, ou até mesmo realizar a investigação por conta própria.

Tourinho Filho43 alerta que “está sendo grande o movimento proporcionado pelo MP no sentido de que se lhe reconheça o direito de proceder a

41

BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituiçao.htm>. Acesso em: 05 out. 2009.

42

(29)

investigações”. E, justamente esta é hipótese em que se concentrarão os esforços para dirimir as dúvidas que pairam sobre sua possibilidade.

Passemos então a um estudo breve acerca das atribuições conferidas ao MP por nosso ordenamento jurídico, a fim de checar o cabimento de tal posicionamento.

3.1 ATRIBUIÇÕES DO MINISTÉRIO PÚBLICO

Em vários diplomas legais são possíveis encontrar incumbências do parquet, tais como no CPP, CF/88, Lei Orgânica do Ministério Público (Lei 8.625/93), entre outros. As atribuições que tocam ao órgão ministerial são de ampla abrangência, e, portanto, aquelas que de certa forma guardam relação com o tema estudado serão o foco de nossas atenções.

A nova Carta Constitucional de 5 de outubro de 1988 alterou substancialmente a instituição do Ministério Público, dando-lhes contornos até então ignorados, fazendo-o guardião da ordem jurídica, do regime democrático e dos interesses sociais e individuais indisponíveis, incumbindo-lhe, ainda, de zelar pelos poderes constituídos e pela regular fiscalização da correta aplicação da lei.

Assim, conceitos tradicionais referentes à investigação penal e, por conseqüência, do andamento do processo investigatório que pode ser dado atualmente no processo penal brasileiro, também foram modificados. Incorporou em seu artigo 129, incisos I, IV e VIII, da Carta Magna, a previsão de privatividade da ação penal por parte do Ministério Público, o controle externo da atividade policial exercida pela instituição.44

Vemos então que o MP tornou-se um órgão ainda mais atuante dentro de nossa sociedade a partir da promulgação da CF/88, além de zelar por interesses do povo e atuar como fiscal da lei, ainda é o promotor da pretensão punitiva do Estado.

43

TOURINHO FILHO, 2005, p.284. 44

KAC, Marcos. O ministério Público na Investigação Penal Preliminar. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2004, p.164.

(30)

3.1.1. Persecução Penal

Tal prerrogativa deriva dos mais ancestrais conceitos de contrato social idealizados por pensadores como Rousseau, Locke, Hobbes e outros. Por meio do Contrato Social firmado entre súditos (povo) e soberano (Estado), confere-se um direito de punir (ius puniendi) ao Estado, o qual funciona como instrumento de controle social e preservação da ordem.

Lima45 entende que “Desobedecida a norma incriminadora, o Estado exerce o direito-dever de punir, passando a pretensão punitiva a ter no jus puniendi o seu elemento intersubjetivo”. Na mesma esteira Mossin46: “Praticado o fato criminoso, o direito de punir estatal se transfere do plano abstrato ou hipotético para o concreto e efetivo, nascendo para o Estado o dever de impor a sanctio legis ao transgressor da norma proibitiva”.

É a atribuição por excelência do MP, uma vez que lhe é concedida por via do art.129, inciso I da CF/88 a titularidade da ação penal.

Infomar-nos Náufel47 em seu léxico jurídico que:

Persecução: Do Latim persecutio, persecutionis, significa literalemnte

perseguição. Na linguagem jurídica, é o procedimento necessário para a

investigação dos fatos, comissivos ou omissivos, de instrumentos e documentos, cujo resultado conduza à aplicação de normas legais para tornar efetiva a proteção de direitos ou interesses subjetivos, ou a aplicação de penas ou medidas de segurança àqueles que cometam delitos ou revelem periculosidade.

Após uma leitura atenta da definição de persecução dada pelo autor, é possível destrinchá-la em dois momentos: o da investigação e o da ação penal. Desta forma, a persecutio criminis consiste em todos os atos investigativos e processuais que tem por escopo a efetivação do direito de punir do Estado.

O raciocínio básico, portanto, é o de que: na fase investigatória a persecutio criminis é realizada pela polícia judiciária, e quando da ação penal a atribuição é do órgão ministerial. Tal lógica, no entanto, se vê esvaziada nas

45

LIMA, Marcellus Polastri. Ministério Público e Persecução Criminal. 4ª ed. rev., atual. e acresc. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2007, p.53.

46

MOSSIN, Heráclito Antônio. Curso de Processo Penal. 2ª ed. São Paulo: Atlas, 1998, v.1, p.150. 47

NAUFEL, José. Novo Dicionário Jurídico Brasileiro. 9ª ed. rev. atual. e ampl. Rio de Janeiro: Forense, 1997, p.657.

(31)

palavras de Lima48 pois “apesar da forma mais comum de investigação ser o inquérito policial, procedimento a cargo da Polícia Judiciária, esta não é exclusividade deste órgão, pois [...] não existe exclusividade para a apuração de crimes”.

Veremos a seguir que tal ilação encontra suporte dentro do ordenamento jurídico pátrio.

3.1.2. Controle Externo da Atividade Policial

Sobre o instituto do controle externo valemo-nos das sábias palavras de Jardim49:

Temos asseverado [...] que o verdadeiro Estado de Direito não pode prescindir de mecanismos de controle de seus órgãos públicos. Este controle deve ser efetivado seja pelas instituições da sociedade civil, de forma difusa, seja pelos próprios órgãos estatais. [...] Note-se, outrossim, que a experiência tem demonstrado que o controle interno, embora útil e até mesmo necessário, não é suficiente. É preciso criar mecanismos de fiscalização externa, vale dizer, fiscalização a ser efetivada por órgãos não pertencentes à instituição controlada

A CF/88 no artigo que trata das atribuições do órgão ministerial (art.129), mais precisamente em seu inciso VII50, estabelece que ao MP incumba o controle externo da polícia judiciária na forma disposta em Lei Complementar.

A Lei Complementar nº 75/9351 foi editada com o intuito de regular a organização, as atribuições e o Estatuto do Ministério Público da União. O controle externo da atividade policial referido no supracitado dispositivo constitucional foi regulado nos termos de alguns de seus artigos, vejamos:

Art. 3º O Ministério Público da União exercerá o controle externo da atividade policial tendo em vista:

a) o respeito aos fundamentos do Estado Democrático de Direito, aos objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil, aos princípios

48

LIMA, 2007, p.54. 49

JARDIM, Afrânio Silva, Direito Processual Penal, 11ª ed. rev. e atual. Rio de Janeiro: Forense, 2005, p.325.

50

BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituiçao.htm>. Acesso em: 06 out. 2009.

51

BRASIL. Lei Complementar nº 75, de 20 de maio de 1993. Dispõe sobre a organização, as atribuições e o estatuto do Ministério Público da União. Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/LEIS/LCP/Lcp75.htm>. Acesso em: 06 out. 2009.

(32)

informadores das relações internacionais, bem como aos direitos assegurados na Constituição Federal e na lei;

b) a preservação da ordem pública, da incolumidade das pessoas e do patrimônio público;

c) a prevenção e a correção de ilegalidade ou de abuso de poder; d) a indisponibilidade da persecução penal;

e) a competência dos órgãos incumbidos da segurança pública.

Art. 9º O Ministério Público da União exercerá o controle externo da atividade policial por meio de medidas judiciais e extrajudiciais podendo: I - ter livre ingresso em estabelecimentos policiais ou prisionais;

II - ter acesso a quaisquer documentos relativos à atividade-fim policial; III - representar à autoridade competente pela adoção de providências para sanar a omissão indevida, ou para prevenir ou corrigir ilegalidade ou abuso de poder;

IV - requisitar à autoridade competente para instauração de inquérito policial sobre a omissão ou fato ilícito ocorrido no exercício da atividade policial; V - promover a ação penal por abuso de poder.

Art. 10. A prisão de qualquer pessoa, por parte de autoridade federal ou do Distrito Federal e Territórios, deverá ser comunicada imediatamente ao Ministério Público competente, com indicação do lugar onde se encontra o preso e cópia dos documentos comprobatórios da legalidade da prisão.

Em síntese a Constituição atribuiu à polícia a função de investigar as infrações penais, mas, seguindo tendência universal, previu o seu controle pelo MP e, por outro lado, restringiu em parte seus poderes de polícia [...]52

Ao referir-se a parte da Lei Orgânica do MPU que se refere ao controle externo, Kac53 é crítico:

[...] A legislação foi tímida demais para quem pretende ver a atividade policial cada vez mais desenvolvida a ponto das investigações penais darem frutos profícuos ao deslinde da autoria dos diversos delitos.

O legislador infraconstitucional limitou-se a definir mecanismos de controle de legalidade da atividade policial, sem contudo penetrar no cerne da questão que é a atividade policial em si mesma o mais importante.

Vemos então que, na visão do autor, apesar de regulada constitucionalmente a prerrogativa, o legislador além de protelar sua regulamentação para lei superveniente, quando da edição desta foi brando por demais ao não permitir um controle mais maciço por parte do MP.

No entanto para Rangel54 “a regra constitucional do controle externo da atividade policial é um reforço ao sistema acusatório, pois deixa nítido e claro que ao

52

FERNANDES, Antonio Scarance. Processo Penal Constitucional. 3ª ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2002, p.254.

53

KAC, 2004, p.159. 54

(33)

MP é endereçada a persecutio criminis, afastando o juiz de qualquer ingerência na produção de provas”

Podemos, portanto, concluir que a atribuição constitucionalmente conferida ao MP do controle externo da atividade policial não se coaduna com a prerrogativa deste órgão de deflagrar investigações criminais autônomas, mas confere-lhe tão somente o status de fiscalizador das atividades policiais.

Desta forma, o intuito do presente título é apenas o de informar o leitor acerca da proximidade já existente e sedimentada entre MP e Polícia, abrindo assim terreno para uma discussão mais contemporânea, qual seja uma maior ingerência do MP na investigação criminal, e que será discutida a partir deste ponto na presente monografia.

3.2. INVESTIGAÇÃO A CARGO DO MINISTÉRIO PÚBLICO

O presente título é de suma importância para a compreensão do objetivo desta compilação. O estudo que fora realizado até então, é de grande valia para que possamos entender a coerência jurídica de ambos os posicionamentos, uma vez que, a atenção despendida no tema aqui estudado, justifica-se pela existência de entendimentos divergentes acerca da questão.

Tucci55 não poderia ser mais assertivo nas palavras exordiais do brilhante trabalho que realizou sobre o tema: “Tem-se tornado cada vez mais intenso e vibrante, nos dias em que vivemos, o debate acerca da realização da investigação criminal pelo Ministério Público”. É justamente esta afirmação que faz jus à relevância que os operadores jurídicos, mais precisamente os da seara do direito penal, dão ao tema.

A linha que divide os posicionamentos opostos é tênue, por isso não é difícil encontrarmos conceituados doutrinadores em lados diametralmente opostos. A exegese legal base de ambos os pensamentos é invariavelmente sistemática, tricota e amarra diferentes diplomas legais e vale-se, por vezes, de princípios e outros institutos jurídicos para ver triunfar sua face da verdade.

55

TUCCI, Rogério Lauria. Ministério Público e Investigação Criminal. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2004, p.11.

(34)

Mougenot56 alerta acerca da complexidade da questão:

Há relevante controvérsia doutrinária e jurisprudencial acerca da possibilidade de que o órgão do Ministério Público –promotor ou procurador – conduza por conta própria (ao largo da atividade policial) um procedimento de investigação criminal, já que, ao contrário dos casos de investigação civil [...], a investigação criminal não encontra fundamento constitucional expresso.

As discussões concernentes ao tema, via de regra, são acaloradas. Peguemos, por exemplo, determinado autor conceituado na literatura processual penal. No capítulo de seu manual em que tratar sobre inquérito policial é provável que se encontre algo sobre o tema, e ele ali estará disposto com tamanha clareza lógica, que, acaso seja a primeira vez em que o incauto leitor depara-se com tal problemática, passará ele a acreditar ser o tema livre de questionamentos, uma vez que os argumentos encontrados em qual seja o posicionamento adotado, estará repleto de justificativas persuasivas.

Para rapidamente entendermos o quão distantes encontram-se alguns doutrinadores sobre o tema, poderíamos, por exemplo, de um lado citar Lima57 ao dizer que: “Obviamente, não sendo a Polícia Judiciária detentora de exclusividade na apuração de infrações penais, deflui que nada obsta a que o MP promova diretamente investigações próprias para elucidação de delitos.” E em contraponto o pensamento mordaz de Tucci58 ao referir-se a alguns membros do MP “ávidos de promoção pessoal e de publicidade, e até mesmo desprezando inafastáveis valores éticos, assumirem a condição de inquisidores, travestindo-se de “investigadores””

Nunca é demais relembrar que a proposta desta monografia é justamente trazer a luz tais divergências afim de que o leitor, ao final, possa compreender que nosso sistema legal carece de objetividade ao tratar do tema. Passemos então a análise das diferentes correntes de pensamento.

56 MOUGENOT, 2009, p.140. 57 LIMA, 2007, p.82. 58 TUCCI, 2004, p.78 e 79.

(35)

3.2.1. Posição Permissiva

Esta corrente doutrinária não vê óbices para que o órgão ministerial deflagre a investigação criminal por conta própria.

Para uma melhor visão acerca de tal posicionamento, Kac59 nos lembra que

Nos países com legislação investigativa mais avançada, a investigação preliminar é conduzida pelo Ministério Público. É inaceitável que nos dias de hoje no Brasil a investigação fique a cargo exclusivo da Autoridade Policial, seja ela estadual ou federal, sem que haja qualquer ingerência do destinatário final do lastro probatório mínimo na fase pré-processual a permitir a correta formação da opinio delicti e consequentemente a deflagração da persecutio criminis in judictio.

É anseio mais do que merececido de parcela significativa da sociedade que o Ministério Público tome as rédeas da investigação penal (mediante seleção de casos) para que os procedimentos possam, de alguma maneira, ser notabilizados por sensível melhora e que a ação penal a ser posteriormente proposta não esteja quase sempre fadada ao insucesso.

Para o autor, portanto, é importante que ao Ministério Público se conceda tal poder para que o êxito da ação penal seja certo, uma vez que a instrução probatória realizada a cargo do órgão ministerial seria feita com maior atenção.

Na mesma esteira, Fernandes60 salienta que a tendência do MP aproximar-se cada vez mais da investigação criminal é fato evidente a nível mundial, citando o exemplo de Portugal e Itália. Relembrando também que nosso ordenamento jurídico positivo encontra entraves sobre esse poder concedido ao promotor por falta de previsões específicas.

Os argumentos que dão base a tal modo de pensar são inúmeros. A convicção dos doutrinadores que assim pensam baseia-se em alguns mais importantes, vejamos:

Mazzilli61 tece comentários sobre o artigo 129 da CF/88, diploma este que tornou vasta a atuação do órgão ministerial, conferindo-lhe inúmeras novas atribuições: 59 KAC, 2004, p.166. 60 FERNANDES, 2002, p. 255. 61

(36)

No inciso VI do art.129, cuida-se de procedimentos administrativos de atribuição do Ministério Público – e aqui também se incluem investigações destinadas à coleta direta de elementos de convicção para a opinio delicti: se os procedimentos administrativos de que cuida este inciso fossem apenas em matéria cível, teria bastado o inquérito civil de que cuida o inc.III (...) Mas o poder de requisitar informações e diligências não se exaure na esfera cível, atingindo também a área destinada a investigações criminais.

O artigo em questão versa justamente sobre as funções institucionais do MP, é clara, portanto, a abordagem feita pelo ilustre autor no sentido de que, a omissão, intencional ou mero desleixo, dá vazão à interpretação pela corrente permissiva da autoridade ministerial frente a procedimentos a serem realizados na fase pré-processual.

A mesma interpretação do supracitado dispositivo legal-constitucional é dada por Fernandes62, de forma que

Já se tem sustentado que pode o promotor de justiça, com base no art.129, VI, da Constituição Federal, realizar atividades próprias de investigação. Consta nesse inciso que é função do Ministério Público expedir notificações e requisitar informações e documentos para instruir procedimentos administrativos de sua competência. Entende-se, então, que se abrangem, entre tais procedimentos, os procedimentos de investigação criminal. Ainda, essa atuação seria autorizada pelo art.26, I, alíneas a e b, II, da Lei Orgânica Nacional do Ministério Público, que possibilita ao membro da instituição instaurar procedimentos administrativos, expedir notificações, requisitar informações, exames periciais e documentos de autoridades, órgãos e entidades da administração direta ou indireta, bem como de entidades privadas.

A fundamentação legal para este raciocínio não chega a ser explícita, mas é no mínimo aceitável e inteligível do ponto de vista jurídico, uma vez que já foi visto em secção anterior do presente estudo que a natureza jurídica do inquérito é justamente a de procedimento administrativo.

Corroborando com esta tese Aquino e Nalini63 esboçam a analogia de que “retirar daquele que é o senhor da ação penal pública o direito de investigar é como proibir os congressistas de legislar.”

Ainda neste mesmo compasso, e complementando o panorama sobre a questão, são dignas de transcrição as palavras de Souza64:

62 FERNANDES, 2002, p. 254 e 255. 63 AQUINO e NALINI, 2005, p.123. 64

SOUZA, Alexander Araújo. O promotor de Justiça investigador e a teoria das provas ilícitas,

Revista do Ministério Público, n.17/31, Rio de Janeiro, 2003, p.31-33 apud TUCCI, Rogério Lauria. Ministério Público e Investigação Criminal. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2004, p.18.

(37)

[...] a atividade investigatória preliminar levada a cabo pela polícia é instrumental à atividade ministerial, e não um fim em sim mesmo. Por esse motivo, e por deter o monopólio do exercício do direito de ação, deve-se possibilitar ao Ministério Público, de maneira ampla, realizar investigação autônoma à policial. Cuida-se, deveras, de um poder que se encontra

implícito na função acusatória que foi conferida constitucionalmente ao

Ministério Público. E seria realmente absurdo que este ficasse atrelado apenas ao que se apura (ou ao que se consegue ou ao que se quer apurar) em sede policial. Equivaleria a colocar em patamar mais elevado o titular do inquérito, em notável detrimento do titular de direito de ação penal[...]

Na visão do autor65 também existiriam óbices e dificuldades quase intransponíveis quando da apuração de crimes cometidos pelos próprios agentes policiais ou até mesmo por governantes e administradores públicos, os quais se encontram numa hierarquia com poder de mando sobre a corporação policial.

“Em suma, a possibilidade de investigação levada a efeito pelo MP, embora conte com inúmeros críticos e detratores é uma realidade em nosso ordenamento e tem assento na própria CF”.66

3.2.1.1. Análise Jurisprudencial

A jurisprudência sobre o tema é vasta e muito interessante, dadas as divergências de entendimento pelos eméritos julgadores acerca da questão.

No sentido permissivo temos um julgamento de habeas corpus pelo Tribunal de Justiça de São Paulo67:

“[...] Nessa perspectiva, a investigação realizada pelo Ministério Público não se contrapõe ao artigo 144, parágrafo 1.º, da Constituição Federal, mas se harmoniza com o artigo 129, I, dela própria, autorizando sua disciplina pela legislação inferior, como forma de viabilizar o constitucionalmente previsto. Se a polícia por qualquer razão, não procede a uma adequada investigação é lícito ao Ministério Público fazê-lo [...]”;

65

SOUZA, Alexander Araújo de. 2003 apud TUCCI, Rogério Lauria, 2004, p.18. 66

DEMERCIAN, Pedro Henrique e MALULY, Jorge Assaf. Curso de Processo Penal. 2ª ed. São Paulo: Atlas, 2001, p.105.

67

BRASIL. Tribunal de Justiça de São Paulo. HC 394.150-3/5. Terceira Câmara Criminal. Impetrante: Antônio Cláudio Mariz de Oliveira. Paciente: Ronan Maria Pinto. Relator Des. Walter de Almeida Guilherme. Julgado em 05.11.2002. Publicado em 14.02.2003. Disponível em

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