Repositório Institucional UFC: As aventuras e desventuras de quem faz da vida de cinema a maior diversão

S

imiã o

M

a r t in ia n o

As aventuras e desventuras de quem

fa z da vida de cinema a maior diversão

Simião Martiniano, o camelo de cinema que é "cineastra" , sonha em ser reconhecido e colher os louros da fam a de uma vida de artista.

Entrevista com

Simião Martiniano,

dia 07/07/99.

Produção, redação,

edição e texto final:

G a lc ia n i N e v e s e R ic a rd o C a s tro .

Texto de abertura:

R ic a rd o C a s tro .

Participação:

A m a rílis L a g e .G a lc ia n i N e v e s , G ild ic e lli A le n c a r , G u s ta v o M e lo , Ig o r C â m a ra ,R ic a r d o C a s tro , R ic a rd o S a b ó ia e V iv ia n e L im a .

Foto:

Ig o r C â m a ra

^ a r t e im i t a a v id a . S e f o r a v i d a d e S i m i ã o £ / j M a r t i n i a n o d a S i l v a , p o d e - s e e n t ã o

Sr / d i z e r q u e a a r t e é a v i d a . E s t e a l a g o a n o d e U n i ã o d o s P a l m a r e s , t e r r a d e Z u m b i d o s P a l m a r e s , v e m d i s p u t a n d o c o m o f u n d a d o r d a c i d a d e o p o s t o d e m a is v a l e n t e g u e r r e i r o d a r e g i ã o , n u m a g u e r r a i g u a l . A g u e r r a p a r a s o b r e v i v e r d i g n a m e n t e .

À p r i m e i r a v i s t a , a e s t r a n h e z a é la t e n t e . C o m o p o d e u m c a m e l o d e d i s c o s d e v i n i l q u e r e r f a z e r c i n e m a ? Q u e p e t u l â n c i a é e s t a ? S ã o p e r g u n t a s q u e s ó p o d e m s e r f e i t a s p o r q u e m d e s c o n h e c e o “ c i n e a s t r a ” S i m i ã o , c o m o s e a u t o d e n o m i n a . S i m p l e s m e n t e S i m i ã o n ã o v i v e u m a v i d a , e l e v iv e u m r o t e i r o d e c i n e m a e s c r i t o p o r e l e m e s m o . E n o c i n e m a t u d o , t u d o é p o s s í v e l .

E l e c o n s e g u e c h e g a r a o f i m d o i n f i n i t o e m s u a s a u l a s d e i n t e r p r e t a ç ã o d r a m á t i c a e f a z e q u i p e s d e r e p o r t a g e m d o o u t r o l a d o d o m u n d o o v i s i t a r e m e p e s q u i s a r e m s u a v i d a d e c a m e l o - c i n e a s t a . D o c e n t r o d o R e c i f e p a r a o m u n d o . S ó h á u m p o u c o d e r e s s e n t i m e n t o c o m a a n t a g o n i s t a d e s t a n a r r a t i v a : a f a l t a d e d i n h e i r o .

E s t a d u e l a c o m e l e d e s d e o i n í c i o d e s u a v i d a , d e s d e o i n s e t o q u e t e v e d e c o m e r q u a n d o c r i a n ç a a té a d i f i c u l d a d e p a r a a c h a r p a t r o c i n a d o r e s p a r a o s s e u s f i l m e s . N o e n t a n t o e u c r e i o q u e S i m i ã o , c o m a v i s ã o d o t í p i c o e s p e c t a d o r d e c i n e m a , a c h a e s t a b r i g a a g r a ç a m a i o r d a h i s t ó r i a . A l é m d o q u e , S i m i ã o e s t á g a n h a n d o c o m p e l o m e n o s s e i s p o n t o s d e v a n t a g e m .

E s t e s p o n t o s t ê m n o m e , d u r a ç ã o e lo c a ç ã o . S ã o s e u s s e i s f i l m e s , f r u t o s d a m a i s p u r a p a i x ã o q u e

p o s s a e x i s t i r n e s t e h o m e m d e t a n t o s t a l e n t o s . A l é m d e c a m e l o , S i m i ã o j á f o i p e d r e i r o e , h o j e d i r i g e , r o t e i r i z a , p r o d u z , m o n t a , e d i t a , a t u a , d i v u l g a e e x i b e s e u s f i l m e s . I s t o s ó n a p r i m e i r a p a r t e , d e p o i s d o i n t e r v a l o c o m e r c i a l e l e a i n d a a r r a n j o u t e m p o p a r a f a z e r r a d i o n o v e l a , v i d e o c l i p e s , d a n ç a r e c a n t a r . E s t e L e o n a r d o d a V i n c i m u l t i m i d i á t i c o a i n d a e n c o n t r o u t e m p o p a r a c a s a r e c o n s t i t u i r f a m í l i a . T a m b é m s ã o s e is o s f i l h o s d e o r i g e m o r g â n i c a .

A p e s a r d e t a n t o s f e i t o s e m s u a v i d a , n e n h u m f o i s u f i c i e n t e m e n t e i n d e p e n d e n t e p a r a q u e e l e a l c a n ç a s s e o s u c e s s o e p r i n c i p a l m e n t e o d i n h e i r o a l m e j a d o . F o i c o m o t o d o , a s u a h i s t ó r i a l i t e r a l , q u e m e t a l i n g u i s t i c a m e n t e , a o s e t r a n s f o r m a r e m r o t e i r o d e c i n e m a , h o u v e o c o n h e c i m e n t o d e s t e c i n e a s t a í m p a r . A f a m a j á a p a r e c e u , o d i n h e i r o a i n d a e s t á d e m o r a n d o .

S i m i ã o , a t r a v é s d o d o c u m e n t á r i o “ S i m i ã o M a r t i n i a n o - C a m e l o d e C i n e m a ” , p r o t a g o n i z o u a si m e s m o , e m u m f i l m e q u e n ã o e r a d e l e , n o r o t e i r o q u e m a i s l h e p e r t e n c i a . C l a r a A n g é l i c a , a r e s p o n s á v e l p e l a v i d a d o “ c i n e a s t r a ” c o n t a d a e m m e n o s d e m e ia h o r a , te m t a m b é m o c r é d i t o d e tr a z e r a o c o n h e c i m e n t o d o s p a r t i c i p a n t e s d e s t a r e v i s t a , a s a g a , o u a té m e l h o r , a e p o p é i a d e s t e h o m e m .

Entrevista

Simião Martiniano

Ga l c i a n i -

Bom, vamos começar

a entrevista com seu

SimiãoMarti-niano.

S i m i ã o - C o m m u it o p r a z e r , e s ­ to u a q u i p r a r e s p o n d e r a s p e r g u n ta s q u e to d o s v o c ê s f iz e r e m a m im , n é ?

G a l c i a n i -

Vamos começar?

S i m i ã o - D e n t r o d a ló g i c a d o c i n e m a , e s to u p r o n to p a r a r e s p o n d e r .

G a l c i a n i -

Seu Simião, a sua

infância é marcada por um fato mui­

to triste que fo i quando a sua mãe

fugiu de casa. De antes de ela sair, o

que é que o senhor lembra da sua

infância ? Desse período que ela m o­

rava com vocês, na casa de vocês ?

S i m i ã o - O lh e , n o t e m p o q u e e u ti n h a m in h a m ã e ... C o m id a d e d e c i n - c o a n o s , e l a f u g iu d e c a s a d e i x a n d o c i n c o f il h o s n a p r e s e n ç a d e m e u p a i . .. E , in c lu s iv e , e u e r a u m d o s m a is v e lh o s

(Simião era o filho mais velho).

D u ­ r a n te e s s e te m p o q u e e l a s a iu d e c a s a , e p a s s e i c i n c o a n o s n a c a s a d o m e u p a i , q u a n d o e u c o m p le t e i d e z a n o s f o i q u a n d o e u c o m e c e i a m in h a v id a ta m b é m e s a í d c c a s a f u g id o .

B e m , m a s e s s e p e r í o d o d e q u a n d o m in h a m ã e d e i x o u m e u p ai a t é a m i n h a id a d e d e d e z a - n o s ,

(quando)

e u ta v a n u m a id a d e d e s e is a s e te a n o s , p o r a í a s s i m , h a v i a m u it a n e c e s s i d a d e , m u it a f o m e lá o n d e a g e n t e m o r a v a , o n d e e u n a s c i . E c h e g o u a o p o r t u n i d a d e d a g e n t e c o m e r in s e to . C h e g o u a o p o r t u n i d a d e d a g e n t e c o m e r in s e t o ! A s m in h a s ir m ã s , u m a v e z , e u s a í p r a c a s a d e u m ti o m e u , u m p o u c o d i s t a n t e , eu d i s s e a e la s : “ V ê s e a r r u m a q u a l q u e r c o i s a a í p r a g e n t e f a z e r u m la n c h e m e io - d ia , c o m e r a l g u m a c o i s a ” . A í, m in h a s ir m ã s , d u a s ir m ã s e u m m e n i­ n o , q u e e r a o m a is n o v o , a c h a r a m u m c u r u r u d e b a ix o d e u m m o n tu r o

(mon­

te de lixo)

a o r e d o r d e c a s a . A q u e l e s c u r u r u s d a s c o s t a s b o r d a d a s . P e g a ­ r a m o c u r u r u , t i r a r a m o c o u r o e g u i s a r a m o c u r u r u . C o z i n h a r a m . G u i s a r a m , n ã o , c o z i n h a r a m , p o r q u e n ã o s a b ia m g u is a r . C o z i n h a r a m e m á g u a p u r a e q u e n t e , s ó . C o m e r a m o c u r u r u e d e i x a r a m u n s d o i s o u tr ê s p e d a c i n h o s p r a m i m . q u a n d o e u c h e g a s s e .

Q u a n d o e u c h e g u e i , a m e n in a , a m a is v e l h a , q u e e r a a M a r ia , d is s e : “ S im iã o , n ó s p e g a m o s a q u i u m a j i a . ” Q u e j i a é u m p r a to f i n o h o j e n o s h o té is . É c a r í s s i m o , n é ? “ N ó s te m o s a q u i u m a j i a , q u e p e g a m o s e t a l .. .” “ D o n d e é q u e v o c ê s a c h a r a m e s s a j i a ? ” “ N ã o , f o i a li n o m o n tu r o . “C a - d ê ? E tir a r a m o c o u r o d e l a ? ” “ T ir a m o s , tá a l i, ó .” T a v a n o s o l . E l e s ti r a r a m o c o u r o e e s p a l h a r a m n o s o l p r a s e c a r .

A c h a r a m b o n it o o c o u r o t o d o b o r ­ d a d o . E q u a n d o e u o lh e i o c o u r o d o c u r u r u : “ M e n in a , e v o c ê s c o m e r a m is s o ? I s s o é u m c u r u r u !” A í e l a d is s e : “ A h , p o i s c o m e m o s , e u p e n s a v a q u e e r a u m a j i a . ” E u e s p e r e i e l a m o r r e r a t é , p o r q u e ... M a s o v e n e n o d o c u r u ­ r u é s ó e n t r e a c a r n e e o c o u r o . É u m le ite q u e e l e te m , u m le ite b r a n c o , a q u e le é q u e é o p e r i g o s o , é q u e é o v e n e n o . Q u e o c u r u r u n ã o te m s a n ­ g u e n ã o , s ó te m o l e it e e n t r e a c a r n e e o c o u r o .

Q u a n d o e u c h e g u e i , q u e d e i f é , e u d ig o : “ I s s o n ã o é p o s s í v e l , v o c ê s n ã o c o m e r a m o c u r u r u ! ” “ C o m e m o s , c o m e m o s o c u r u r u . A í d e i x a m o s e s s e p e d a ç o p r a v o c ê . ” “ M a s n ã o é p o s s í v e l ! ” A í e u e n j e i t e i , e n ã o c o m i.

B o m , a í e s p e r e i e l a s a d o e c e r e m , t u d o is s o . M a s n ã o a d o e c e r a m . M a s d e o u tr a s o p o r t u n i d a d e s , ti r a n d o d e s ­ s a c e n a q u e e u ia c o m e r e n ã o c o m i o

c u r u r u , q u e c u c o n h e c i , e n t ã o a c o n ­ t e c e r a m o u t r a s c e n a s h o r r o r o s a s . M o t i v o d e f o m e . A í a g e n t e f a z ia o q u ê ? D e n o ite f a z ia u m f o g o d e m a d e i­ r a , ia a s s a r n a c o z in h a d a c a s a , q u e e r a u m p a i o l c o b e r to d e s a p é , q u e n e m p a i o l d e ín d io , m e s m a c o i s a , a q u e le s p a i ó is d e ín d io . T u d o d e p a l h a s e c a , f e c h a d o a o r e d o r d e p a l h a s e c a , e c o b e r to d e p a l h a t a m b é m . A g e n t e f a z ia o s e g u in te : t i n h a m u i t a c a ti t a , a q u e la s c a ti t in h a s , q u e h o je a i n d a te m n a s c a s a s (

ri),

v á r ia s c a s a s te m . A s c a ­ ti t i n h a s b r a n c a s . A í a g e n t e a r m a v a o a r u t e m a (

espécie de arm adilha

artes anal),

d e p e n e i r a r a f a r in h a n a c a s a d e f a r in h a e p e g a v a a q u e la s c a t i ­ ti n h a s d e b a ix o d o a r u te m a , j u n t a v a d u a s , t r ê s . N ó s j o g á v a m o s u n s p o z i n h o s d e f a r in h a , d e m il h o , q u a l ­ q u e r c o i s a a li. A í, a s c a ti t a e n t r a v a d e n t r o p r a c o m e r . T u d o a r a d o d e f o m e t a m b é m ,

(ri)

E n tã o q u a n d o e l a s e n t r a v a m e u d e r r u b a v a o a r u te m a c o m tr ê s , q u a ­ tr o d e n t r o . E u im p r e n s a v a e l a s a s s im n a te la q u e é b e m f in in h a . A g e n t e im p r e n s a v a e l a s a s s im e p e g a v a e la s ...

" Q u a n d o e u c h e g u e i, q u e

d e i f é , e u d ig o : 'is s o n ã o é

p o s s ív e l, v o c ê s n ã o

c o m e r a m o c u r u r u ! '

'C o m e m o s , c o m e m o s o

c u r u r u . A í d e i x a m o s e s s e

p e d a ç o p r a v o c ê " '

m e ti a a m ã o e p e g a v a , e m a ta v a tu d i- n h o d e b a ix o d o a r u te m a . A li m e s m o n o f o g o , a g e n t e tir a v a o ti ç ã o d o f o ­ g o , a m a d e i r a d o f o g o e f i c a v a a q u e le s b o r r a lh o s , a o n d e ta v a q u e n t e , n o lu g a r d a b r a s a , a í a g e n t e p u n h a á g u a a li d e n tr o d a q u e la b r a s a d o f o g o . Q u a n d o s u b ia a q u e le v a p o r : " x i ii ii i" , a q u e la f u m a c e ir a , n ó s j o g á v a m o s a s c a ti t a s d e n t r o , d a f u m a ç a , j o g a v a a s c a ti t a s d e n t r o e p e g a v a e q u a n d o t i r a v a e l a ta v a to d a d u r i n h a , c h e g a p a r e c i a q u e ta v a ...

(risos).

E l a s f i c a v a m tu d o d u r in h a s . E u p e l a v a t u d i n h o e ti r a v a o c a s c o , b e m a l v in h o , p a r e c i a u m p o r q u in h o p e l a d o v é i , t o d o d u r i n h o . A í e n f i a v a n o e s p e to lá m e s m o , n a m e s m a h o r a , n u m ta lh o d e p a l h a d e c o c o , e n f i a v a c i n c o , s e is . A í n a b r a s a , a li m e s m o n o f o g o , a l i s e n ta d o , tu d i n h o a o r e d o r d o f o g o , a g e n t e f a z i a o e s p e t o , j á f a z ia e r a o c h u r r a s c o d a c a t i t a p r a c o m e r p u r o , p o r q u e n ã o t i n h a c o m o q u e c o m e r , a g e n t e c o m i a p u r o . i s s o e r a f o m e , q u e e r a d e m a i s , e n ­ t e n d e u ?

I g o r -

Mas seu Simião, como

é que era o seu relacionamento

com seu pai, com sua mãe ? Era

um relacionamento bom?

S i m i ã o - A té o te m p o q u e e u c o n h e c i , a t é a m in h a id a d e d e c i n c o a n o s , m in h a m ã e s ó v i v i a c o m i g o n o s q u a r to s , q u e n o c a s o e l a c a r r e g a o s m e n in o s , q u e n e m ín d io , o u n a s c o s ta s o u e n t ã o d e la d o a s s im

(aponta para a pró­

pria cintura

) , e s c r a n c h a d o . E u m e l e m b r o m u it o b e m , q u e e l a g o s ta v a m u it o d e m im , n ã o e r a s ó d e m im , e r a d e t o d o m u n d o .

M e u p a i , n e s s e te m p o , a g e n t e ia p r a c a s a d e f a r in h a , q u e e l e f a z ia f a r i n h a d e a l u g u e l, c e r t o ? A í, e l e c h a m a v a n ó s p r a a j u d a r , a í e l e m e le v a v a n a s c o s t a s a s s im e s c r a n c h a d o n a s c o s t a s

(bate nos ombros, apon­

tando o local),

e u p a r e c ia u m m a c a - q u in h o n a s c o s t a s d e le , a g a r r a d o . T o d o d i a e l e m e le v a v a p r a e s s a c a s a d e f a r in h a , q u e e r a lo n g e , e r a u m a lé g u a o u e r a d u a s lé g u a s a d i s t â n c i a , e tu d o is s o e u m e le m b r o c o m o s e f o s s e h o ­ j e . H o u v e o u tr a o p o r t u n i d a d e t a m ­ b é m n e s s e p e r í o d o q u e m in h a m ã e d e i x a e u d u r a n t e e s s e s c i n c o a n o s ... E u f u i p r a c a s a d e u m a ti a m i n h a e c h e g u e i lá , e u e r a p e q u e n o e t i n h a u m b a n c o , d e s s e s b a n c o s d e p e l a r p o r c o , c h a m a - s e b a n c o d o in te r io r d e p e l a r p o r c o .

T i n h a u m b a n c o n o te r r a ç o d a c a s a , is s o n u n c a m e s a i d a m e m ó r ia , p o r q u e e s s a s c o i s a s q u e p a s s a r a m c o m ig o , d c c e p ç ã o , e s s a s c o i s a s , e u n u n c a m e e s q u e ç o n a m in h a v id a ... E n tã o e u p e q u e n o , o b a n c o e r a u m

S e q u ê n c ia 1 . T a k e 1 . O a lu n o R ic a r d o C a s tr o v a i a o c e n tr o d e F o rta le z a e c o m ­ p r a u m g r a v a d o r d a m a r c a D ip lo m a t n a b a n c a d e u m c a ­ m e lo d a r u a L ib e - r a t o B a r r o s o , p a r a f a z e r a p r é - e n t r e - v i s t a .

T a k e 2 . A e q u ip e d e p r o d u ç ã o v a i a o R e c ife 2 0 d ia s a n te s d a e n t r e v i s t a p a r a a p u r a r d a d o s d a v i­ d a d e S im iã o M a r ti­ n i a n o , c o m p a s s a ­ g e n s c e d i d a s p e lo S i n d i c a t o d o s J o r ­ n a lis ta s d o C e a r á .

Simião Maríiniano

Entrevista

A l o c a ç ã o d o p r i ­ m e i r o e n c o n t r o c o m o e n tr e v is ta d o é o b o x 4 d o C a m e - ló d r o m o d o R e c ife , n a a v e n i d a D a n ta s B a rr e to . S im iã o n o s e s p e r a s e n ta d o e m u m a e s c a d a , p e r t o d a s u a b a n c a d e d i s c o s .

S e q ú ê n c ia 2 . T a k e 1. P la n o in fin ito . S i­ m iã o e n s i n a t é c n i ­ c a s d e c i n e m a e t e a t r o e d e c o m o c h e g a r a o f im d o i n f i n i t o , n a a c a d e ­ m ia R itm o K e n t, n o b a ir r o d e C a v a le ir o , e m J a b o a t ã o d o s G u a r a r a p e s .

6 6

p o u c o la r g o , e u p e q u e n o , o b a n c o m e io a l to , q u e e r a n a a l tu r a d e u m a p e s s o a p r a d e s p e l a r o p o r c o , n ã o e r a b a i x i n h o , e r a a l to , m a i s o u m e n o s a s s i m

(levanta a mão mostrando a

altura de aproxim adamente um

metro),

a í , e u p r a s u b i r e m c i m a d o b a n c o , b o te i a m ã o p o r c i m a d o b a n ­ c o , a í q u a n d o e u f i z f o r ç a e f i q u e i p e n d u r a d o , o b a n c o v ir o u p o r c i m a d a m in h a p e r n a , e n t ã o e u q u e b r e i o r e j e i t o d o p é

(calcanhar

) , e s s e d a q u i

(mostrou o calcanhar esquerdo).

F u i p r a e s t e i r a e p a s s e i m a is d e tr ê s m e s e s d e s c o n ju n t a d o . E is s o é u m a c o i s a q u e e u n u n c a m e e s q u e c i n e n h u m d i a d a m in h a v id a , e n q u a n to e u t i v e r v id a e u n u n c a m e e s q u e c i d i s s o e e u e r a c r ia n ç a . Q u a l q u e r u m a c r i a n ç a g r a v a . P a s s a p o r d e c e p ç ã o e n u n c a s a i d a s u a m e n te .

I g o r -

Bom, mas uma cena boa...

S i m i ã o - B o m , a c e n a m e l h o r p r a e n c e r r a r e s s a ... Q u a n d o f o i u m d ia , m a c h o , e u e m c a s a , m e u p a i d is s e : “ E u v o u s a ir , e u v o u p r a c a s a d e m e u ir m ã o e t a l ” , d e tio J o ã o , a í f o i e m b o r a , f ic o u o s c i n ­ c o m e n in o s e m c a s a , m e n in o n ã o é g e n t e . A í, e u v o u e c h a m o u m a m e n i n a m in h a , u m a ir m ã m i n h a , a A n g e li ta , q u e e r a e n c o s t a d a d a m a is v e l h a . “ A n g e li ta , v a m o s lá p r a g r o t a

(abertura produzida

pelas enchentes nas ribanceiras

ou margens de um rio).

V a m o s lá p r a g r o t a e t a l . ” A í , t o d o s o s in ­ v e r n o s , e l e s ó m u r c h a o f e ij ã o , e q u a n d o t á n o v e r ã o e l e tá tu d o s e c o , tá d e p e g a r f o g o . A í, f o m o s p r a lá . C h e g a n d o lá , e u d ig o : “ Ó , le v a u m a c a i x a d e f ó s f o r o n o b o l s o . ” Q u e e u f u m a v a , f u m o d e c o r d a , n a q u e la é p o c a .

G a lc ia n i - P e q u e n o ? ! ?

S i m i ã o - E u j á d e s te t a m a n h o

(levantou a mão, mostrando uma

altura de aproximadamente um me­

tro e trinta centímetros

), p e q u e n i­ n in h o , n ó s f u m á v a m o s . A í, p e g u e i a c a i x a d e f ó s f o r o d o b o ls o , c h e g u e i lá e u . .. L á t i n h a u m r i a c h o z i n h o b e m p e q u e n i n i n h o , e s t r c i t i n h o , d a v a u m a v á r z e a m in h a . E u d ig o : “ V a m o s t o ­ c a r f o g o a q u i, p r a q u a n d o o f o g o t i ­ v e r n o t a m a n h o q u e q u e i m a r , n o t a m a n h o q u e d ê o n o s s o r o ç a d in h o , a í e u q u e b r o u m g a l h o d e f u m o b r a - b o , a í d o u u m a p e i a p r a m im , e a i n d a a p a g o o f o g o , n ã o d e i x o o f o g o a u ­ m e n t a r ." A í, tá c e r t o . V ê o p e n s a m e n ­ to d e c r ia n ç a .. . T á c e r to , a í to q u e i f o g o , n e s s e f e ij ã o , ta v a s e c o , p e g a n ­ d o f o g o . Q u a n d o e u to q u e i f o g o , n u m t e m p o a s s i m , m e io v e n t o s o , a í o v e n ­ to f o i q u e i m a n d o d e v a g a r z i n h o , f a ­ z e n d o a q u e l a r o d a , f a z e n d o a q u e la r o d a , a q u e l a r o d a , a q u e l a r o d a . ..

Q u a n d o ta v a a s s i m m a i s o u m e n o s d o t a m a n h o d e s s e p a u

(apontou pa­

ra uma árvore de aproximadamente

três metros

), p o r a li a s s i m

(apontou

para outra árvore que estava a

aproximadamente dez metros de

distância do local da entrevista),

p o r a q u i, o f o g o j á t a v a d e s s a a l t u r a a s ­ s im . E u d ig o : “ A n g e li ta , a g o r a v a m o s a p a g a r o f o g o , q u e j á d á a n o s s a v a r z c a z i n h a ." Q u e é p r a p l a n t a r m e ­ la n c ia , c e r t o , q u e d á n a b e i r a d o r ia c h o . A í, p e g u e i u m r a m o e d e i u m a e la e F iq u e i c o m o u t r o e l a r g a a a p a g a r f o g o . Q u a n d o e u b a t ia n o r a m o a s s im

(mostrou como se estivesse segu­

rando com as duas mãos tentando

apagar o fogo),

n o f o g o , c o m o r a m o d e f u m o b r a b o , a f a ís c a v in h a a g a r r a ­ d a n o r a m o e j o g a v a lá p r a s c o s t a s d a g e n t e , n é ? Q u a n t a s c h i c o t a d a s a g e n ­ t e d a v a , o f o g o p u x a v a , a f a í s c a c a ía lá a t r á s . E lá v a i c e r c a n d o a g e n t e , e a

g e n t e q u a s e m o r r e , e u e e l a . Q u a s e q u e m o r r i a c e r c a d o n o f o g o . Q u e q u a n d o c u i d a m o s d a v id a j á ta v a f o ­ g o a o r e d o r d a g e n t e , p o r to d o c a n t o , p u l a m o s o f o g o n a c a r r e i r a , e n t e n ­ d e u ? V ie m o s e u e e l a p r a c a s a e d e i ­ x a m o s o f o g o r o l a n d o lá .

R o l o u tr ê s d i a s d e n t r o d e m a ta v ir g e m . C e r c a , f e i j ã o d e f a z e n d e i r o , d e t u d o . . . C a s a s d e f a z e n d e i r o , q u e i m o u tu d o , o q u e f o i d e p a l h a q u e i m o u tu d o . A m a io r ia d a q u e le s í t io s , a s c a s a s e r a m tu d o d e p a l h a . A r r a s o u tu d o . A té d e r a m p a r t e n a p o l í c i a e m U n i ã o d o s P a l m a r e s

(município do estado de Alagoas)

n a d e l e g a c ia . E o r e s u lt a d o q u e n in g u é m s o u b e q u e m f o i.

O m e u p a i m e d e u lo g o u m a s u r ­ r a , q u a n d o e u c h e g u e i e m c a s a , p o r ­ q u e a m in h a ir m ã d is s e . “ Q u e m fo i q u e to c o u f o g o ? ” A í a m in h a i r m ã fo i e c o n t o u : “ F o i S i m i ã o q u e to c o u f o ­ g o p r a f a z e r u m r o ç a d in h o e p e g o u f o g o e tá d a q u e l e j e i t o . ” A í e l e d is s e : “ V e n h a c á .” F o i u m a p is a q u e e u fu i p r a á g u a d e s a l, e n t e n d e u ? F i q u e i d o e n t e d e s s a p is a , e u d is s e : “ E u m a .”

" A í c h e g a m o s lá ,

a c h a m o s a s f a v in h a s

b o n it in h a s ( ...) a í e u :

'V a m o s s e n ta r a q u i.' A í

s e n te i d e b a ix o d a f a v a e

v a m o s f a z e r o q u e n ã o

p r e s t a d e b a i x o d a f a v a . "

A í . .. q u e i m o u f o g o , p e g o u f o g o , t r ê s d ia s d e f o g o , d e n t r o d a s m a ta s , q u e i m a n d o f a z e n d a , p r i n c i p a l m e n t e f e ij ã o , g e n t e q u e n ã o ti n h a a r r a n c a d o f e ij ã o a i n d a , e n t e n d e u ? E q u a n d o fo i ‘a t a r d e a p o l í c i a f o i lá , a í m e u p a i d is s e : “ O lh a , s a f a d o , s e v o c ê d i s s e r q u e o f o g o s a iu d a q u i, e u m a to v o c ê n o c a c e t e , v iu ? ” A í, p a s s o u u m c a r ã o e m t o d o s n o s s o s ir m ã o s e n o s s o s ir m ã o s n ã o c o n ta r a m n a d a , a t é h o je , n in g u é m s o u b e . A p o l í c i a f o i lá , in v e s ti g o u m e u p a i , tu d i n h o , a f a m í li a , a q u e le s m o r a d o r e s to d i n h o s e n in g u é m s a b e d e o n d e s a iu . A v e r s ã o d a p o lí c ia f o i q u e p a s s o u a l g u m c a ç a d o r p o r a l i, a í to c o u f o g o , j o g o u p o n t a d e c i g a r r o e i n c e n d io u . O r e s u l t a d o f o i e s s e .

G i l d i c e l l i -

Seu Simião, o seu pai

era violento ?

S i m i ã o - E r a p r a f a m íl ia . E r a v i o le n to , c a c h a c e i r o e j o g a d o r . E r a e s s a s tr ê s c o is a s : v io le n to , c a c h a c e ir o

e j o g a d o r .

G a l c i a n i -

Seu Simião, o fa ­

to do seu pai ser violento, como

o senhor disse, com a família fo i

um dos motivos que levaram o

senhor a ir procurar sua mãe?

S i m i ã o - F o i . P o r q u e q u a n d o e u c o m p le t e i d e z a n o s e ta l... A í j á f a z i a c i n c o q u e e l a ti n h a s a íd o . A í p o r c a u s a d e o u t r a tr a g é d ia q u e s e p a s s o u c o m ig o , n a m in h a v id a , f o i o m o ti v o q u e e u s a í , f u g i d e c a s a , d e i x e i to d o s m e u s ir ­ m ã o s , f o i p o r c a u s a d e s s a q u e e u v o u c o n t a r a g o r a .. .

B o m , a í e u ta v a n e s s e m e s m o s ít io . Q u a n d o f o i o u t r o d i a , e u c h a m e i u m a m e n in a , a v iz in h a , e l a e r a d a m in h a id a d e , n é ? A í f o m o s p r o r o ç a d o d e f a v a . F o m o s c a t a r f a v a . M e u p a i d is s e : “ O lh e , e u v o u p r o r io , v o u v e r s e p e g o u m p e i x i n h o c o m o n o m e d e c a r i t o . ” Q u e te m n o p o ç o . “ E u v o u p e g a r u m p e i x i n h o p r a g e n ­ te c o m e r . E v o c ê v a i p r o r o ç a d o , c a ­ t a r f a v a e q u a n d o e u v i e r e u q u e r o a f a v a c o z i n h a d a . E u c h e g o a q u i lá p r a u m a h o r a o u d u a s . E q u a n d o e u v i e r e u q u e r o a f a v a c o z in h a d a ” “ T á c e r ­ to , p a p a i

(imitando voz de crian­

ça

) . ” A í c h a m e i a m e n in a , s e c u t i v e s ­ s e id o s ó , t u d o b e m . M a s c h a m e i a m e n i n a p r a r o ç a e f u i p r a lá.

Entrevista

_{Simião Martiniano}

fic a m o s lá b r i n c a n d o . “ V a m o s b r i n ­ c a r d e m a r i d o c o m m u l h e r .”

(risos)

E e u to d o f a n ta s ia n d o .

I g o r -

E nada de fava!

S i m i ã o - E n a d a . . . A í a g e n t e e s q u e c e u , e lá le m b r o u d e f a v a m a is . Q u a n d o a g e n t e c u i d o u d a v id a j á e r a d u a s h o r a s d a ta r d e . A h o r a lá a g e n t e m a r c a v a p e l o j u m e n t o ,

(risos)

E r a , e r a . A h o r a q u e m d a v a e r a o ju m e n t o . O j u m e n t o o u e n t ã o o s o l, a s o m b r a d a g e n t e . É , a g e n t e só s a b i a q u a n d o e r a m e io - d ia , q u a n d o o s o l a c e r ta v a d e ig u a l c o m a c a b e ç a , tá e n t e n d e n ­ d o ? A s o m b r a ta v a ...

I g o r -

Sem sombra.

S i m i ã o - S e m s o m b r a . E r a m e io - d i a e m p o n t o . Q u a n d o e l a ia s e a f a s ta n d o e r a u m a h o r a , a í ia c o n t a n ­ d o a s s i m , o u e n t ã o o j u m e n t o . P o r ­ q u e o j u m e n t o t o d a h o r a e l e c a n ta , n o s e r tã o , n é ? T o d a h o r a e l e a p it a . A í, q u a n d o d e m o s f é , e r a u m a s d u a s h o r a s . A í: “ V a m o s e m b o r a , M a ­ r i a . ” A í c h e g u e i e m e a s a . Q u a n d o e u c h e g u e i e m c a s a , m e u p a i j á ta v a e m c a s a , m e e s p e r a n d o j á c o m o c i n tu r ã o . A í e le : “ Q u e q u e ta v a f a z e n d o ? ” “ N ã o e u ta v a lá .. . A í e u p e g u e i n o s o n o , m a i s M a r i a .. . E e u m e e s q u e c i d a f a v a . Q u e a g e n t e p e g o u e d o r m i u . .. ” “ D o r m i r o q u e , c a b r a s a f a d o ! ? ! ”

(risos)

E l e ti n h a u m c i n t u r ã o q u e ti n h a q u a s e tr ê s d e d o s a s s i m d e l a r g u r a

(mostrou a largura do

cintocomasmãos).

A q u e l e s c i n - tu r õ e s d e r a b i c h o l a d e c a v a l o , c o m a f i v e l a d e m e ta l . A í m e p e g o u n o c i n t u r ã o , ô r a p a z , m e r e t a l h o u t o d i n h o , v i s s e ? E l e n ã o e s c o l h e u q u a l l a d o d a v a c o m o c i n t u r ã o n ã o , e r a c o m f i v e l a , c o m tu d o . Q u a n d o e l e b a t ia , o s a n g u e e s p ir r a v a . A g e n t e c r i a v a u m a p o r c a , u m a p o r c a b a i é , a q u e l a s p o r c a s b a i x in h a s . B a ié , a g e n t e c h a m a v a p o ­ r c a b a i é . A í, t i n h a u m a t o u c e ir a d e c a j a d i n h o , n o f u n d o d o q u i n t a l , p o r tr á s d a c a s a , q u e a p o r c a s ó d o r m ia d e n t r o d a q u e l a m o i ta . M a s s ó ti n h a o b u r a c o m e s m o d a p o r c a , s ó c a b i a e l a m e s m o ,

(risos)

q u e e l a e n t r a v a e d o r m ia , to d a n o it e d o r m i a n a q u e le b u r a c o .

M a s a m i n h a f e li c id a d e f o i p o r ­ q u e a p o r c a n ã o ta v a n a h o r a . Q u a n d o m e u p a i m e p e g o u d e n t r o d e c a s a , n a s a l a c o m o c i n t u r ã o e e u s a í m e a r r a s ta n d o , e e l e a g a r r a d o c o m ig o p o r a q u i a s s i m

(mostrou pegando na sua

nuca

), a c a m i s a r a s g o u , d e s p r e g o u - s e . A í e u e s c a p u li p e l a p o r t a d a c o ­ z i n h a , a í n ã o te v e o n d e e u c o r r e r e e le a t r á s , c o m o c i n tu r ã o . A í n ã o tiv e d ú v id a , m e s o q u e i n o b u r a c o d a p o r ­ c a . n o c a j a d i n h o , d a m o it a , o n d e a

p o r c a d o r m ia . A í m e s o q u e i lá d e n ­ tr o , e l e m e p u x o u p e l a p e r n a e m e a r r a s t o u p e l o m o c o tó . A í f o i q u e e l e m e d e u , m e c o r to u t o d in h o . A í m e d e s p r e g u e i d a m ã o d e l e , a í c o r r i, q u a n d o e u c h e g u e i c o m o d a q u i p a r a a q u e l a c a s a a l i ,

(apontou uma

arquibancada do parque que esta­

va a aproximadamente quarenta

metros de nós),

a í e u v ir e i p r a tr á s e d is s e p r a e l e : “ M e u p a i , f o i a ú lt i m a v e z q u e m e u p a i d e u e m m im . M a s o m e u p a i n ã o v a i d a r m a is e m m im , n ã o . E u n ã o a p a n h o m a is d o s e n h o r . ”

G a l c i a n i -

O senhor disse isso

pra ele?

S i m i ã o - D i s s e p r a c i e . E e l e d is s e : “ V a i , s a f a d o ! V a i ! G a n h a o m u n d o ! Q u e o m u n d o t e e n s in a . O m u n d o e n s i n a a q u e m t á e r r a d o ! T u n ã o q u e r a p a n h a r d e m im , v a i a p a n h a r d a p o lí c ia , d e q u e m q u e r q u e s e ja d a r u a .” E n te n d e u ? A í, e l e d i s s e q u e o

“ 'V a i, s a f a d o ! V ai! G a n h a

o m u n d o ! Q u e o m u n d o te

e n s in a ( ...) T u n ã o q u e r

a p a n h a r d e m im , v a i

a p a n h a r d a p o lí c ia , d e

q u e m q u e r q u e s e ja d a

r u a .'”

m u n d o m c e n s i n a v a e r c a lm e n t e o m u n d o m e e n s in o u .

R i c a r d o C a s t r o -

Foi no mesmo

dia que o senhor fo i embora?

S i m i ã o - F o i n e s s e d ia . A í n e s s e d ia , e l e s a iu d e ta r d e . N a h o r a q u e e l e s a iu , e u c h a m e i a s m e n in a s e o s m e ­ n in o s . A í a r r u m e i u m s a c o . M o s t r e i a t é u m a f o to p r a v o c ê

(a foto que

Simião refere-se é de uma cena do

film e “Traição no Sertão).

G a l c i a n i -

Mostrou.

S i m i ã o - P r o n to , a q u e le f o i e s ti lo q u e e u s a í. E u b o te i u m b o c a d o d e r o u p a n o s a c o , u m a r e d e v e l h a , e n t e n d c u ? U m p e d a ç o d e to u c in h o d e p o r c o s e c o c o m u m p o u q u i n h o d e f a r i n h a , q u e a g e n t e ti n h a e m c a s a n e s s a é p o c a . P e g u e i u m a p i s t o l a d e d o i s c a n o s , q u e m e u p a i ti n h a , u m a p i s t o l a 3 8 0 . B o te i u m f o i c e z i n h a d e m ã o , q u e e u a n d a v a n a m a ta c o m e l a , tu d o d e n t r o d o s a c o . B o t e i n a s c o s ta s e s a í. M e d e s p e d i d o s m e u s ir m ã o s e d a s m in h a s ir m ã s e s a í, e l e s f ic a r a m tu d o c h o r a n d o n o te r r e ir o .

I n c lu s i v e te m n o f il m e

( “Simião

Martiniano, o camelo de cinema

” ) ,

f ic a r a m t u d o c h o r a n d o , q u a n d o m i ­ n h a m ã e s a iu e q u a n d o e u s a í . S ó q u e n ã o ti n h a o c h o r o d e m im , e u s a in d o d e c a s a , m a s te m o c h o r o p e l a m in h a m ãe.

G a l c i a n i

- O senhor lembra, seu

Simião, o dia que a sua mãe saiu?

S i m i ã o - M e le m b r o . E u a i n d a a v i... A ú l t i m a v e z q u e a v i , e l a ia c o ­ m o d a q u i .. . Q u a s e q u e n e m a v ia , e l a ia s u b in d o u m s e r r o te a s s i m , u m a m e ia la d e i r a , u m a e s p é c i e d e u m c e r c a d o d e g a d o , n é ? I a s u b in d o a s ­ s im , m u it o lo n g e ... A í s ó v im o s q u a n ­ d o e l e v ir o u - s e p r a tr á s , q u a n d o n ó s g r it a m o s e e l a o lh o u p r a tr á s e f e z a s s i m

(acenou).

A m a r í l i s -

Mas o senhor sabia

que ela estava indo embora?

S i m i ã o - N ã o , n ã o ... E l a s a iu d e s u r p r e s a . E l a s a iu e d e i x o u a g e n t e tu d o d o r m in d o , c o m o c o n t a n o f i l ­ m e . E l a s a iu e d e i x o u a g e n t e tu d o

d o r m i n d o . Q u a n d o n ó s a c o r ­ d a m o s , e l a j á d i s t a n t e , j á ia s u m i n d o n o c e r c a d o .

G a l c i a n i -

Quer dizer que

ela nem se despediu de vocês?

S i m i ã o - N ã o , s e d e s p e d i u d a g e n t e d o r m in d o , c o m o te m n o film e .

A m a r í l i s -

Se ela tivesse

chamado, vocês teriam ido com

ela?

S i m i ã o - N ã o , e u a c h o q u e n ã o . P o r q u e a g e n t e g o s t a v a t a n ­ to d o p a i d a g e n t e , a p e s a r q u e e - le e r a u m p o u c o v i o le n to p r a f a m í l i a . M a s a g e n t e g o s t a v a m u it o , g o s t a v a d e to d o s d o is . E n ó s p e n s á v a m o s q u e e l a i a p r a c a s a d e u m a p a r e n te , d e u m a f a m í l i a e ta l e v o lta v a . M a s f o i o c o n t r á r i o , e l a s a iu d e v e z . N ã o v o lt o u m a is , a t é h o je . A í f o i a c o n d i ç ã o e m q u e e u d e p o i s d e d e z a n o s , f u g i d e c a s a ta m b é m

(por

causa)

d e s s a p i s a q u e le v e i

(por conta

do acontecimento do roçado defava).

A í s a í à p r o c u r a d e m in h a m ã e .

V i v i a n e -

Qual fo i a reação do

pai do senhor, quando descobriu que

ela tinha fugido ?

S i m i ã o - E l e n ã o t e v e q u a s e r e a ç ã o n e n h u m a . P o r q u e e l e s a b i a o q u e ti n h a f e i t o c o m e l a . P a s s a v a m f o m e e l a c a f a m í l i a t o d i n h a . E le e r a ta m a n q u e ir o , q u a n d o e l e p e g a v a o d in h e ir o d o ta m a n c o , e l e j o g a v a e c h e g a v a e m c a s a c o m o s a c o a b a n a n ­ d o d o j e i t o q u e s a í a d e c a s a , e n t e n ­ d e u ? À s v e z e s , a g e n t e a d o e c i a , e l e n ã o c o m p r a v a r e m é d io p r a g e n te . E n tã o , e l e ti n h a a s c u l p a s d e l e . .. d e m in h a m ã e t e r d e i x a d o e l e , a g e n t e p e d iu p r a e l e v o l t a r e i r a t r á s d e l a e e l e d i s s e q u e n ã o ia m a is a t r á s d e l a : “ N ã o , v o u e u c r i a r v o c ê s , a t é q u a n d o v o c ê s c r e s c e r e m m a is e u n ã o v o u

S e q u ê n c ia 2 . T a k e 2 . C e n a d o m e trô , s e m c o rte s , d e C a v a le ir o a S o c o r r o , S im iã o d e c l a m a u m t e x t o s o b r e s u a in fâ n c ia e m o s tr a o t e le g r a m a q u e r e c e b e u d e M a r c o M a c ie l, v ic e - p re s id e n te d o B ra s il.

S e q u ê n c ia 2 . T a k e 3. E x t e r n a : R e f e r ê n ­ c ia s e x p líc ita s d e lo ­ c a ç ã o d o s film e s d o “ c i n e a s t r a ” S im iã o . S u b in d o o m o r r o c o m a e s t á t u a d e N o s s a S e n h o r a d o P e r p é tu o S o c o r r o à d ir e it a d o v í d e o .

Sirnião Martiniano

_Entrevista

A e q u i p e c h e g a à c a s a d e S im iã o n o a l t o J a r d i m Q u i - t a n d i n h a , n ú m e r o 6 2 . P la n o s d e d e ta ­ lh e n a p e q u e n a e a c o n c h e g a n te c a s a b r a n c a . S im iã o i n ­ s i s t e p a r a q u e o s e x a u s t o s a l u n o s p e r n o i t e m .

P a ra a ju d a r a e q u ip e c o n h e c e r m a is u m c a p í t u lo d a h is tó r ia d e S im iã o , a r o t e i ­ r i s t a e d i r e t o r a d o c u r t a “ S im iã o M a r ­ t i n i a n o , o c a m e l o d e c i n e m a ” , C l a r a A n g é li c a f o i e n t r e ­ v i s t a d a .

6 8

m a is a t r á s d e l a . ” E p o r is s o f ic o u , e d e p o i s d e s s e te m p o d e d e z a n o s , e u f u g i à p r o c u r a d e l a e c h e g u e i n a u s i ­ n a , c h e g u e i n a c i d a d e C o l ó n i a d e L e o p o l d i n a

(município cio estado de

Alagoas),

q u e é n a d i v i s a d e A la g o a s c o m P e r n a m b u c o . A í, e u s o u b e d e u m a ig r e ja , q u e te m n o f i lm e

( “A

mulher e o mandacaru”)

ta m b é m ... R i c a r d o C a s t r o -

Quanto tempo

o senhor levou pra chegar até essa

cidade?

S i m i ã o - E u p a s s e i o d i a to d o ... d o r m i n a U n i ã o d o s P a lm a r e s . E d e U n i ã o d o s P a l m a r e s p r a e s s e s í ti o q u e e u m o r a v a , q u e e u f u g i, e r a m tr ê s lé g u a s . E u a n d e i tr ê s lé g u a s d e p é s , s a í d e m e i o - d i a e c h e g u e i d e n o it e j á n a c i d a d e d e U n iã o d o s P a l m a r e s .

I g o r -

O que é que o senhor pen­

sava saindo de casa, nesse cami­

nho?

S i m i ã o - O lh a , o q u e e u p e n s a v a e r a a c h a r m i n h a m ã e e f i c a r c o m e l a a t é o r e s t o d a v id a .

V i v i a n e -

O senhor tinha o

paradeiro dela? Tinha pistas?

S i m i ã o - E u ti n h a u m a p is ta q u e e l a t a v a n a c i d a d e d e C o l ó n ia d e L e o p o l d i n a , e r a q u a s e u m a s d e z lé g u a s d e U n i ã o d o s P a lm a r e s p r a e s s a c i d a d e d e C o l ó n i a d e L e o p o l d i n a , q u e j á f i c a a q u i , n o E s t a d o d e A l a g o a s c o m P e r ­ n a m b u c o , n a d iv is a , n é ? A í e u s o u b e , fo i a t r a v é s d e u m x a n - g o z e i r o

(pessoa que realiza ce­

rimonias religiosas

afro-bra-sileiras

J, u m e s p i r i t i s m o , q u e e le b a i x o u o e s p í r i t o lá n a c a s a d e m e u p a i. A í e l e d is s e q u e e s s a m in h a m ã e , a e s p o s a d e l e , s e e n c o n t r a v a n a c i d a d e d e C o l ó n i a d e L e o p o l d in a . A g o r a e l a e r a p r o s ti tu t a , o e s p í r i t o d i s s e m a is is s o , q u e e l a e r a p r o s t i ­ t u t a , n e s s a c i d a d e d e C o l ó n i a d e L e o p o l d in a . A í fo i o m o t i v o q u e e u f i q u e i c o m a q u i l o g r a v a d o , a í j á s a í n e s s e te m p o d e a c h a r e l a n e s s a c id a d e . Q u a n d o e u c h e g u e i o p a d r e m e d is s e q u e e l a ti n h a f a le c id o u m a n o a t r á s .

I g o r -

De doença venérea?

S i m i ã o - É d o e n ç a v e n é r e a , e la t i n h a m o r r i d o . A í o p a d r e m e le v o u n e s s e d i a p r a c a s a d e l e , f i q u e i n a c a ­ s a d e l e . N o o u tr o d ia , e l e ti n h a u m c o n t a t o c o m o c a p i t ã o q u e e r a o c a p i t ã o d e c a m p o q u e m e c r io u t a m ­ b é m .. . N o o u t r o d i a n ó s n o s e n ­ c o n t r a m o s c o m o c a p i t ã o , q u e ia p r a e s s a c i d a d e d e C o l ó n i a d e L e o p o l d i­ n a , a í a g e n t e e n c o n t r o u c o m e l e j á n a e n t r a d a d a r u a . O c a p it ã o p e r g u n to u q u e m e r a e u . E u ta v a c o m o c a b e l o g r a n d e , a s s a n h a d o , t o d o s u jo , p a r e ­ c i a u m n o je n to , c o m o d iz a h is t ó r ia . O c a b e l o d e s s e t a m a n h o a s s i m

(mos­

tra como era o cabelo alto e cheio le­

vando as mãos à cabeça).

A í o q u e a c o n te c e é q u e o c a p it ã o p e r g u n to u d e o n d e e u e r a , q u e m e r a , s e ti n h a p a i ... A í o p a d r e d i s s e q u e n ã o , q u e a m i n h a m ã e ti n h a m o r r i d o e e u tin h a f u g id o d e c a s a , m o r a v a m u it o l o n g e e j á f a z i a u m d ia e m e io q u e ta v a a n ­ d a n d o , v ia ja n d o .

I g o r -

E quando o senhor soube

que a sua mãe tinha morrido, o que

o senhor pensou em fazer?

S i m i ã o - O q u e e u ia f a z e r .. . E u p e n s a v a e m f i c a r m e s m o n o m e io d o m u n d o , e n ã o v o l t a r p r a c a s a , t r a b a l h a r . P a s t o r a r b o i n a q u e l e s e n g e n h o s , c a r r e g a r tij o lo , t r a b a l h a r n a s o la r i a s , e n q u a n t o o c a p i t ã o n ã o m e c h a m o u p r a i r m o r a r n a c a s a d e le .

I g o r - A

4as não pensava em ir pra

uma cidade maior, não?

S i m i ã o - N ã o , n ã o , n ã o ... N u n c a p e n s e i n is s o . S ó e m tr a b a l h a r , v iv e r d o t r a b a lh o . A í o q u e a c o n t e c e u q u e

m i n h a m ã e m o r r e u , e u f i q u e i p e ­ r a m b u l a n d o , o c a p i t ã o m e a c o lh e u . P a s s e i o i t o a n o s n a c a s a d e s s e c a p i ­ tã o . A m in h a s a í d a ta m b é m d a c a s a d o c a p i t ã o f o i u m a d e c e p ç ã o q u e h o u v e e n t r e m im e o c u n h a d o d o c a ­ p itã o , q u e e r a u m r a p a z ta m b é m d e j á c o m d e z o it o a n o s e e u t a m b é m .

E le é a t é a s s im c o m o

vocè (apon­

ta para o aluno Ricardo Castro),

g a - le g a d o a s s i m t a m b é m , s a b e , m e s m o f í s i c o . C h a m a v a - s c L u ís . E s s e c a m a ­ r a d a d e p o i s q u e o c a p it ã o c a s o u - s e , a í s ó q u e r i a v i v e r n a c a s a d o c a p i ­ tã o , n a c a s a g r a n d e . A í e l e n ã o s e d a ­ v a b e m c o m ig o . M a s c o m o c o l e g a , e le ti n h a q u e a c e i t a r m e s m o , q u e eu e r a o f i l h o d e c r i a ç ã o d o c a p it ã o . A e m p r e g a d a d o c a p i t ã o g o s t a v a m u it o d e m im , s ó q u e a e s p o s a d o c a p it ã o n ã o g o s t a v a e n e m e l e t a m b é m , o c u ­ n h a d o .

A í a g e n t e g o s t a v a d e j o g a r a q u e ­ le j o g o d e r o l e t a n o t e r r a ç o d a c a s a g r a n d e . U m t e r r a ç o m u it o a l t ã o e c o m p r i d o , e a g e n t e ia j o g a r r o le t a c o m a q u e l a s p r a t a s d e c r u z a d o a n ti g a s , n ã o s e i s e v o c ê s c o n h e c e r a m ,

" E u p e n s a v a e m f i c a r

m e s m o n o m e io d o

m u n d o , e n ã o v o lt a r p r a

c a s a , tr a b a lh a r . P a s to r a r

b o i n a q u e le s e n g e n h o s ,

c a r r e g a r ti jo lo , tr a b a lh a r

n a s o la r ia s ( ...) "

a i n d a h o j e e m m u s e u a i n d a e x is te . A g e n t e c h a m a v a q u a t r o c e n t o s r e is , a - q u e l a s m o e d a s d e p r a t a . A í n u m j o g o , n o m e io d o j o g o e u g a n h e i a p a r a ­ d a . .. q u e a g e n t e b o t a v a o d in h e ir o a s s i m n u m a tá b u a c o d i n h e i r o ia , i a , ia r o d a v a e c a í a , a í o o u tr o j o g a v a , s e f i c a s s e m e n o s d e u m p a l m o d e u m a p r a o u tr a , e r a q u e m g a n h a v a a p r a ta , n é ?

A í e u g a n h e i , m e ti a m ã o n o d in h e ir o . Q u a n d o e u b o t e i a m ã o e m c i m a d a m o e d a , o c a r a p is o u e m c i m a d a m in h a m ã o . E u a r r a s t e i a m ã o , q u a n d o e u a r r a s t e i a m ã o , e l e d is s e q u e o d i n h e i r o e r a d e l e , q u e e u n ã o t i n h a g a n h a d o , a í f ic o u a d is c u s s ã o . E u c o m e l e , t e r m in o u a g e n t e e n t r a n ­ d o n a ta p a , q u a n d o e l e m e d e u u m ta b e f e , q u e e u c a í, p r i m e i r o e l e d e u e m m im . E u c a í , a í e le p u x o u u m p u n h a l e f o i c r a v a r o p u n h a l e m c i ­ m a d e m im , n o t e r r a ç o d a c a s a g r a n ­ d e . A q u e l e s p u n h a i z i n h o s p e ­ q u e n o s , a s m u lh e r e s é q u e g o s ­ ta m d e u s a r . N a q u e l a c p o c a , a s m u lh e r e s d a r u a g o s t a v a m d e u - s a r a q u e l e s p u n h a i z i n h o s p e ­ q u e n o s .

A í q u a n d o e le b a t e u a m ã o n o p u n h a l , c u m e le v a n te i. M e ti o s p é s , q u a n d o e u m e ti o s p é s , e le m e te u o p u n h a l . A í e u la r g u e i u m p é n a m u n h e c a d e l e a s s i m , o p u ­ n h a l v o o u f o r a . E u p e g u e i o p u ­ n h a l e fu i e m c i m a d e l e . Q u a n d o e u fu i e m c i m a d e l e , a e s p o s a d o c a p i t ã o v iu a b r ig a , a í fo i n a g a ­ v e t a d o p e n t e a d o r d o q u a r t o d o c a p i t ã o , p u x o u o r e v ó lv e r . E s s e r e v ó l v e r , e l a ti n h a u m e e l e ti n h a o u tr o . E l a p u x o u o r e v ó l v e r e c h e g o u e m c i m a d e m im e b o to u o r e v ó lv e r , n a h o r a q u e e u ia m a t a r o ir m ã o d e l a . E la b o to u o r e v ó l v e r d i z e n d o q u e s e e u m a t a s s e o ir m ã o d e l a e l a a t ir a v a e m m im t a m b é m , e u m o r r i a ta m b é m . A í p a r e i. P a r e i . E la p e d i u a a r m a , e u e n t r e g u e i. A í q u a n d o o c a p i tã o c h e g o u d e n o it e , e l a c o n t o u a h i s t ó r i a to d a e r r a d a . D is s e q u e e u li n h a in v e n ta d o a b r ig a , d a d o n o ir m ã o d e l a , c u n h a d o d e l e e f o i a m a i o r b r i g a d a n a d a , q u e e u t i n h a f e i t o c o m o ir m ã o d e l a . A í o c a p i t ã o n ã o a c r e d it o u , p o r q u e f a z ia o i t o a n o s q u e e u v i v i a n a c a s a d o c a p i t ã o , e o c a p i t ã o n u n c a ... h o u v e n e n h u m a q u e i x a d e m im , n ã o r e c e b e u n e n h u m a q u e i x a d e m im . N ã o v i v ia n a r u a e t a l , n ã o v iv ia m e ti d o n o m e io d a r u a c o m m e n in o d e r u a d e m a n e ir a a lg u m a .

E n tre v ista S im iã o M a rtin ia n o

te m n o r o m a n c e ( M in h a v id a é um r o m a n c eJ, n a q u e la c e n a . “ E u n ã o p o s s o m a is f ic a r a q u i, p o r q u e se eu f ic a r, o u e u o u o se u c u n h a d o v a i se a c a b a r. P o rq u e e le m e ju r o u d e m e p e g a r e m tr a iç ã o , m e d a r u m a p u n h a ­ la d a n a tr a iç ã o .” A í e u d ig o : “ B o m , o j e ito é e u c a ir f o r a .” P o rq u e o c a ra é c u n h a d o d o c a p itã o e e le n ã o ia d e i­ x a r d e ir n a c a s a d o c u n h a d o p ra v is i­ ta r a ir m ã d e le . E p o r is s o e u m e d e s p e d i d o c a p itã o . O c a p itã o q u a s e c h o r a , p e d iu p o r tu d o q u e e u n ã o sa ís se . E u d ig o : “ V o u , c a p itã o . V o u , p o r q u e e u n ã o p o s s o m a is f ic a r a q u i. m e d e s c u lp e . O s e n h o r fo i m e lh o r d o q u e m e u p a i, f e z o q u e p ô d e p o r m im e e u ta m b é m m o r ro a g r a d e c e n d o o s e n h o r e s s a o p o r tu n id a d e q u e o s e ­ n h o r m e d e u , m a s te n h a p a c iê n c ia . E u v o u c u id a r d a m in h a v id a . E u j á so u u m r a p a z , j á p o s s o m e m a n te r s o z i­ n h o p o r m in h a c o n ta .” A í q u a n d o eu sa í, p e g u e i o p a u - d e - a r a r a e v im "a q u i" p ra R e c ife . F o i a q u e le p a u - d e - a r a r a d o T u c a A n d ra d a ( a to r q u e f e z u m a p a r tic ip a ç ã o n o c u r ta “ S im iã o M a rti n ia n o , o c a m e lo d e c in e m a ” ) ...

Igor

- P ro P a r a n á ?

S im iã o - É.

Ricardo Sabóia

- S e u S i ­ m iã o , d e p o is q u e o s e n h o r f o i e m b o r a d a f a z e n d a o s e n h o r c h e g o u a v o lta r ?

S i m i ã o - N ã o , n ã o v o lte i m a is , n ã o . A té h o je .

Ricardo Castro - E lá

n a f a ­ z e n d a , o s e n h o r fa z ia o q u ê ? O s e n h o r e s tu d a v a ...

S im iã o - E u e s tu d a v a , o c a p itã o m e b o to u n u m a e s c o la , s ó q u e eu n ã o ia, e u n ã o a p r o v e ite i o te m p o . E le m e d e u u m a g r a n d e c h a n c e d ’e u e s tu d a r , m a s e u p e g u e i lo g o p ra n a ­ m o r a r c o m a p r o fe s s o r a , q u e e r a b e m n o v in h a , f ilh a d o a d m in is t r a d o r . C h a m a v a - s e L u r d e s. E u , c o m o filh o d o c a p itã o , a n d a v a to d o b o n itin h o , p a re c ia g e n te . A í a m e n in a (ri) a o in v é s d e m e e n s in a r , a g e n te n a m o r a ­ va.

Viviane

- O c a p itã o e a e s p o sa n ã o tin h a m o u tr o s f i l h o s ?

Simião

- N ã o , n ã o tin h a , n ã o . E le e r a c a s a d o d e n o v o . E le c a s o u - s e d e ­ p o is q u e e u t a v a ... j á tin h a s e te a n o s q u e e u ta v a n a c a s a d e le fo i q u a n d o e le c a s o u -s e . E le v iv ia m a is a v e lh in h a , a d o n a Z e f in h a , q u e e r a a e m p re g a d a . E s s a e ra a m in h a m ã e d e c ria ç ã o .

Gaiciani

- S e u S im iã o , a í o s e ­ n h o r f o i e m b o ra , te n to u p e g a r o p a u -d e - a r a r a p r o P a ra n á . F iz e r a m o s e n h o r d e s c e r d o p a u d e a ra ra e o s e n h o r f o i p a r a r e m R e c ife , o q u e f o i q u e o s e n h o r c o m e ç o u a f a z e r p r a tr a b a lh a r e p r a v iv e r?

S im iã o - E u p e g u e i u m o u tr o c a m in h ã o d e u m m a tu to q u e tr a b a ­ lh a v a b o ta n d o c a n a n a u sin a , e le c a r ­ re g a v a le n h a e c a n a n o e n g e n h o q u e o c a p itã o m e c r io u . E u o c o n h e c ia , e le ta v a aq ui n o C a b o (m u n ic íp io d o e sta do d e P e r n a m b u c o ). A í e u p e rg u n te i o n d e e le m o ra v a , e le d is s e : “ A h , eu m o ro e m C a v a le ir o ( b a ir r o d e J a -b o a tã o d o s G u a r a r a p e s , c id a d e d a zo n a m e tr o p o lita n a d o R e c ife ) ." E u d ig o : “ O q u e é q u e eu fa ç o p r a ir p ra R e c ife ? Q u e d a q u i e u ia p ro P a r a n á , m a s a p o líc ia d e s c e u d e z p e s s o a s , e e u fu i u m d o s q u e f iq u e i a q u i. O q u e é q u e e u f a ç o p ra c h e g a r e m R e c if e ? ” A íe le ; “ V a i a í e m m e u c a m in h ã o . V a ­ m o s e m b o r a p ra lá .”

A í s a í d e lá, d e n o ite n e s s e c a ­ m in h ã o d e s s e c a ra , d o v e lh o , c h a m a ­ v a - s e J o ã o B a b ã o . E r a u m v e lh o m e io g o r d o a s s im ( u s a a s m ã o s p a r a d e s c r e v e r a g o r d u r a d e J o ã o B a ­

"(...) o p o v o c o m

p re g u iç a , se h a b itu a

n a q u ilo , a p e d ir, se v ic ia e

p a s s a a v id a n a q u ilo , p ra

n ã o tra b a lh a r, c o m

p re g u iç a d e tra b a lh a r."

b ã o ), m e io p re to , to d o d e s b o c a d o , d a v a c a d a p a la v rã o d a n a d o (R is o s) .

M a s e le n ã o c o n fio u e m m im d ’eu f ic a r n a c a s a d e le , n ã o . E u a c h o q u e c o m m e d o q u e d e n o ite e u r o u b a s s e q u a lq u e r c o is a e g a n h a s s e o m u n d o . E le m c d e u a c a r r o c e r ia d o c a m in h ã o e u m a lo n a q u e c o b r ia a c a r g a . N o c a m in h ã o m e sm o , e le m a n d o u c o b r ir a c a r ro c e r ia e n f ia n d o d o is p a u s a s ­ sim ( u s a n d o a s m ã o s p a r a m o s tr a r c o m o o s p a u s e s ta v a m ), u m n a f re n ­ te o u tr o a trá s e f a z ia a c a s a , c h a m a ­ v a - s e c h a lé .

A í f iq u e i m o r a n d o a li tr ê s m e se s d e b a ix o d a q u e le c a m in h ã o . N o c u rta - m e tr a g e m ( uS im iã o M a r tin ia n o , o c a m e lo d e c in e m a ") n ã o é e m c im a d o c a m in h ã o , b o ta r a m n o f ilm e q u e fo i n o q u in ta l d a c a s a , n ã o e ra . F o i c m c im a d a c a r ro c e r ia d o c a m in h ã o . A í e u p a s se i trê s m e se s, o q u e e ra q u e e u f a z ia ? E u p e s c a v a siri lá n a p o n te d o P in a (b a ir r o d o R e c ife ), p o r q u e n ã o tin h a s e rv iç o e só ta v a lá n a c a s a d o h o m e m se m c o m e r . O h o m e m d e u só a d o r m id a , q u e e u ta v a p a ra d o . A í e u f iq u e i p e g a n d o siri n a p o n te d o

P in a . E u p e g a v a u m je r e r é ( a p a r e ­ lh o s p a r a a p e s c a d e c a m a rõ e s, s i ­ ris, p itu s e p e i x e s m iú d o s, e q u e é u m a e s p é c ie d e re d e p r e s a a u m s e m ic ír c u lo d e m a d e ir a ) e f a z ia a q u e ­ le je r e r é d e e s to p a , c h a m a v a - s e p u ç á . A r r u m a v a a q u e le s m iú d o s d e g a lin h a , lá n o M e rc a d o S ã o J o s é

( tr a d ic io n a l m e r c a d o n o c e n tr o d e R e c ife ), f a z ia a q u e le s m o lh o s d e tr i­ p a d e g a lin h a e b o ta v a n o je r e r é d e n ­ tro d a m a ré , e m c im a d a p o n te c o m a c o rd a . Q u a n d o h a v ia á g u a lá e m b a ix o o s s ir is c a ia m tu d o e m c im a , q u a n d o e u a v a n ç a v a a s s im e r a m c in c o , se is s ir is d e n tro d o je r e r é , e r a só p e g a n d o e d e s p e ja n d o d e n tr o d a la ta . N o o u ­ tro d ia a la ta j á ta v a c h e ia . A í e u ia n o o u tr o d ia c o z in h a r, d e n tr o d a la ta m e s m o , fa z ia u m fo g o d e le n h a e c o z in h a v a e b o ta v a n a c a b e ç a q u a n ­ d o e s fr ia v a , b o ta v a n a c a b e ç a e s a ia v e n d e n d o n a s b u tiq u e s lá e m A fo g a ­

d o s (b a ir ro d o su b ú rb io de R e c ife )

Ricardo Castro

- O s e n h o r n ã o c o m ia n ã o ?

Simião

- C o m ia ta m b é m e v e n d ia e p a s s a v a d o is , trê s d ia s s e m p e s c a r e m e s u s te n ta n d o d a q u e ­ le siri q u e eu p e g a v a , é o n d e e u d ig o q u e m u ita g e n te h o je , v e jo r a p a z s o lte ir o , n o v o , p e d in d o e s m o la p a r a c o m e r n u m a c a p ita l c o m o R e c ife e o u tr a s c a p ita is p o r a í, c o m ta n to s s ir is n a m a ré , c o m ta n to c a r a n g u e jo , ta n to a r a ­ tu , c o m o d iz a h is t ó r ia , tu d o q u a n to é d e p e ix e ... Q u a n to c u s ta u m s ir i? S e f o r u m siri m o le é um re a l n o s b a r e s e se f o r u m siri d u ­ ro é c in q u e n ta c e n ta v o s . Q u e r d iz e r , é o p o v o c o m p r e g u iç a , se h a b itu a n a q u ilo , a p e d ir, se v ic ia e p a s s a a v id a n a q u i lo , p r a n ã o t r a b a l h a r , c o m p r e g u iç a d e tra b a lh a r.

Igor

- M a s o s e n h o r d e p o is c o ­ m e ç o u c o m o e m p r e g o d e p e d r e ir o , n é ?

Simião

- É , d e p o is d e s s a s p e s ­ c a s q u e e u fiz n a m a ré , a í c o m trê s m e s e s m a is o u m e n o s, e u a rru m e i u m e m p re g o d e a ju d a n te d e p e d re ir o , lá n o B a rr o n o R e c ife , a r r u m e i, a í s a í d a c a sa d e s se h o m e m e fiq u e i tr a b a lh a n ­ d o e m o ra n d o n a m e s m a c o n s tr u ç ã o , q u e e u ta v a c o n s tr u in d o . O d o n o d a c o n s tru ç ã o m e d e u lo g o u m a g a r a ­ g e m . D is se : “ Ó , tu fic a a q u i, te m u m c a r ro m e u a q u i n a g a r a g e m , m a s tu d o r m e a q u i n a g a ra g e m , p e lo m e n o s te c a b e e o c a r r o e tu p a s s a u m a v is ta a í n a c o n s tru ç ã o ” . “ T á c e r to .” E le m e p a g a v a m a is c a r o d o q u e o s o u tr o s a ju d a n te s , p o r q u e e u fic a v a c o m o v ig ia d e n o ite , d o r m in d o e c o m o v ig ia d e n o ite n a g a ra g e m d e le .

A m a r ílis - S e u S im iã o , o s e n h o r p a s s o u ta n ta d ific u ld a d e q u a n d o sa iu

S e q u ê n cia 3. T a k e 1. O s a lu n o s d a e q u ipe d e p ro d u ç ã o d e v o ­ ra m to d o o e s to q u e d e c o m id a d a c a s a d e tia C ila , q u e os a b r ig o u c a r i n h o ­ s a m e n te d u ra n te o s 3 d ia s na c id a d e do R e c ife .

F o rta le z a , 6 d e j u ­ lh o d e 1 9 9 9 , v in te d ia s d e p o is . S e ­ q u ê n c ia 4 . T a k e 1. C o m o s e m p r e e le ­ g a n te , c o m s u a s in v a r iá v e is m a n g a s c o m p rid a s e c a lç a s d e lin h o , S im iã o a t e r r is s a .