• Nenhum resultado encontrado

As consequências do abuso das imunidades parlamentares federais e do fim do foro privilegiado / The consequences of the abuse of federal parliamentary immunities and the end of the privileged jurisdiction

N/A
N/A
Protected

Academic year: 2020

Share "As consequências do abuso das imunidades parlamentares federais e do fim do foro privilegiado / The consequences of the abuse of federal parliamentary immunities and the end of the privileged jurisdiction"

Copied!
23
0
0

Texto

(1)

Braz. J. of Develop., Curitiba, v. 6, n. 7, p. 45014-45036, jul. 2020. ISSN 2525-8761

As consequências do abuso das imunidades parlamentares federais e do

fim do foro privilegiado

The consequences of the abuse of federal parliamentary immunities and the end

of the privileged jurisdiction

DOI:10.34117/bjdv6n7-211

Recebimento dos originais: 03/06/2020 Aceitação para publicação: 09/07/2020

Ana Paula Ignácio Teixeira

Bacharelanda em Direito pela Faculdade Martha Falcão/Wyden E-mail: ana_paula_tx@hotmail.com

Gilmar Madalozzo da Rosa

Mestre em Direito e Doutorando em Direito Constitucional pela Universidade de Fortaleza, Professor na Faculdade Martha Falcão/Wyden.

E-mail: gdr4@hotmail.com

RESUMO

No cenário jurídico atual há ampla discussão das imunidades parlamentares e da prerrogativa de função, com o recente julgamento da Questão de Ordem da Ação Penal nº 937/RJ que restringiu o alcance do instituto e com a tramitação Proposta de Emenda Constitucional nº 10/2013, que visa extinguir as hipóteses de aplicação desta prerrogativa. Nesse sentido, busca-se compreender o uso do instituto da imunidade no âmbito federal, os abusos dessa prerrogativa e o fim do foro privilegiado, tendo em vista que os membros do Congresso Nacional incidem em excessos das prerrogativas. À vista disso, as imunidades parlamentares, em destaque a imunidade material, não excluem a possibilidade de sanções pela via de processo disciplinar, conforme disposto no Regimento Interno da respectiva Casa Legislativa.

Palavras-chave: Imunidades parlamentares. Foro privilegiado. Consequências ABSTRACT

In the current legal scenario, there is a wide discussion of parliamentary immunities and the prerogative of function, with the recent judgment of the Penal Action Order nº 937/RJ that restricted the scope of the institute and with the Proposed Constitutional Amendment nº 10/2013, which seeks to extinguish the hypotheses of application of this prerogative. In this sense, the aim is to understand the use of the immunity institute in the federal scope, the abuses of this prerogative and the end of the privileged forum, considering that the members of the National Congress focus on excesses of prerogatives. In view of this, parliamentary immunities, in particular material immunity, do not exclude the possibility of sanctions by way of disciplinary proceedings, as provided in the Internal Regulation of the respective Legislative House.

(2)

Braz. J. of Develop., Curitiba, v. 6, n. 7, p. 45014-45036, jul. 2020. ISSN 2525-8761

1 INTRODUÇÃO

A Constituição Federal de 1988 confere aos deputados e senadores um conjunto de garantias constitucionais e vedações parlamentares denominadas Estatuto dos Congressistas, que se refere ao regime jurídico diferenciado aplicado aos membros do Congresso Nacional com o fim de garantir o livre exercício das funções com liberdade e independência funcional perante os demais poderes.

Dentre as prerrogativas estão o instituto das imunidades material e formal, bem como o foro por prerrogativa de função que são estabelecidas em razão do cargo ou função desempenhada pelo indivíduo, consideradas como essência da separação dos poderes do Estado Democrático de Direito para a garantia do mandato popular e à defesa do Poder Legislativo.

Observa-se que os congressistas tendem a abusar das imunidades parlamentares ao fazerem pronunciamentos apregoados em ofensas pessoais, via achincalhamentos, impiedosas palavras de baixo calão, ofendendo até mesmo seus pares na tribuna, entretanto, a justificava apresentada a esses abusos é a liberdade de expressão atribuída pela imunidade material.

Ocorre que o instituto da imunidade não apresenta como finalidade a impunidade, assim ainda que haja restrição na responsabilização no âmbito penal, os agentes políticos incidiram nas consequências de seus comportamento e declarações, pois o Código de Ética e Decoro Parlamentar de ambas as Casas Legislativas, impõe ao parlamentar deveres fundamentes, e entre eles está o de exercer o mandato com dignidade e respeito à coisa pública e à vontade popular, agindo com boa-fé, zelo e probidade. Motivo pelo qual excessos e abusos configuram quebra de decoro, puníveis com a perda do mandato.

O escopo do presente trabalho é compreender o uso das imunidades parlamentares no âmbito federal e as consequências dos abusos dessas prerrogativas, principalmente com a violação do Código de Ética e Decoro Parlamentar das respectivas casas do Congresso Nacional e a sistemática do foro privilegiado com a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) nº 10/2013, que visa extinguir o foro por prerrogativa de função, considerando, ainda, os reflexos do julgamento da Ação Penal nº 937/RJ que restringiu o alcance do foro privilegiado.

O tema se mostra relevante ao debate atual, sendo comprovado por dois exemplos distintos: de um lado o Congresso Nacional, com a proposta da Emenda à Constituição (PEC) 10/2013, propõe modificar os arts. 102, 105, 108 e 125 da CF, que extinguirá o foro especial por prerrogativa de função para qualquer autoridade nos crimes comuns, com exceção para os crimes comuns praticados pelo Presidente da República, Presidentes da Câmara e do Senado e Presidente do Supremo Tribunal Federal; de outro, temos as implicações do julgamento no STF da Questão de Ordem (QO) da Ação Penal (AP) nº 937/RJ, que fora julgada no dia 03/05/2018 e restringiu o alcance do foro privilegiado de deputados federais e senadores.

(3)

Braz. J. of Develop., Curitiba, v. 6, n. 7, p. 45014-45036, jul. 2020. ISSN 2525-8761 Diante desse panorama, justifica-se a realização de pesquisa jurídico-social básica descritiva, com o método de abordagem indutivo, utilizando-se a técnica indireta ou não interativa, pois analisou-se a legislação, a jurisprudência e a doutrina acerca do tema relativo aos abusos das imunidades parlamentares e do fim do foro privilegiado.

Para cumprir o propósito do estudo, o presente trabalho foi dividido em cinco seções. A primeira apresenta a origem das prerrogativas na monarquia inglesa e evolução das prerrogativas no decorrer das constituições brasileiras. A segunda expõe as imunidades dos congressistas no sistemática jurídica brasileira atual. A terceira seção retrata o foro privilegiado e as modificações em decorrência do julgamento da QO na AP nº 937/RJ. A quarta seção examina as consequências do abuso das imunidades parlamentares federais. Já a quinta seção mostra as razões que justificam o fim do foro privilegiado, além de exibir o andamento da PEC nº 10/2013 que visa extinguir a prerrogativa em discussão.

2 SÍNTESE HISTÓRICA

As prerrogativas aos parlamentares originaram-se durante a monarquia absolutista inglesa, no século XVII, na qual o rei se declarava como a personificação do estado com poder ilimitado. Nesse cenário, o parlamento, que era represado pelo monarca, clamava por voz, independência e liberdade para representação dos “direitos” da burguesia.

A população burguesa insatisfeita com o poder absolutista exercido de forma unilateral pela figura do rei se revoltou, iniciando a Revolução Francesa, com a instituição da Declaração de Direitos de 1689 (Biff of Rights), que limitava o poder real e peleava pela supremacia do parlamento, com a instauração da monarquia constitucional,

Especificando certos direitos essenciais, o Bill of Rights de 1689 firmou os seguintes princípios: o Rei não pode, sem o consentimento do Parlamento, cobrar impostos, ainda que sob a forma de empréstimos ou contribuições voluntárias; ninguém poderá ser perseguido por haver-se recusado ao pagamento de impostos não autorizados pelo Parlamento; ninguém poderá ser subtraído aos seus juízes naturais o Rei não instituirá, em hipótese alguma, jurisdições excepcionais ou extraordinária, civis ou militares; o Rei não poderá, em caso algum, fazer alojar em casas particulares soldados de terra ou mar etc. (MALUF, 2013, p. 154).

Essa fase pôs fim a era da monarquia e inaugurou o capitalismo, com a afirmação de direitos fundamentais de primeira geração, que traduzem as liberdades individuais que dizem respeito aos direitos civis e políticos oponíveis perante o Estado. Criaram-se o instituto da imunidade parlamentar com a apregoação do duplo princípio freedom of speach (liberdade da palavra) e freedrom from arrest (imunidade a prisão arbitrária), consagrando a independência para o livre exercício das funções parlamentares sem a imposição de sanções.

(4)

Braz. J. of Develop., Curitiba, v. 6, n. 7, p. 45014-45036, jul. 2020. ISSN 2525-8761 Mais tarde, inspirada por Aristóteles (1998) em sua obra a Política e por John Locke (1998) em o Segundo Tratado Sobre o Governo Civil, já estava sendo idealizada a separação de poderes, que posteriormente foi sistematizada por Montesquieu (2002) em O Espírito das Leis que ao versar sobre a Constituição da Inglaterra consagra três formas de poder existente em cada Estado: o poder legislativo, o poder executivo das coisas que dependem do direito das gentes e o poder executivo daquelas que dependem do direito civil.

Com o primeiro [poder], o príncipe ou o magistrado cria leis por um tempo ou para sempre e corrige ou anula aquelas que foram feitas. Com o segundo, ele faz a paz ou a guerra, envia ou recebe embaixadas, instaura a segurança, previne invasões. Com o terceiro, ele castiga os crimes, ou julga e ao outro simplesmente poder executivo do Estado. (MONTESQUIEU 2000, p.167-168).

Nesse aspecto, Dias e Laurentiis (2012, p. 8) destacam que “o avanço das ideias de Montesquieu está na sugestão de repartir organicamente o poder como forma de garantir a liberdade. Assim, além de propor a distribuição das atividades estatais entre órgãos distintos e independentes entre si” Montesquieu foi além e estabeleceu uma sistemática de contenção do poder com o poder.

Para Barreto e Silva Filho (2003, p. 32 e et seq) a fim de preservar a própria independência autonômica dos poderes do Estado, a concepção de contenção entre os poderes sucedeu “consagrada no art.16 da Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, de 1789, prevê, simultaneamente, a autonomia dos órgãos estatais e o inter-relacionamento de suas atividades, de modo que se possa ter o controle do poder pelo próprio poder”. (apud, DIAS; LAURENTIIS, p. 8).

A estimada independência entre os poderes está consagrada no ordenamento jurídico brasileiro na Carta Magna de 1988, no art. 2º, com a tripartição de poderes, com a seguinte redação: “São Poderes da União, independentes e harmônicos entre si, o Legislativo, o Executivo e o Judiciário”. Exercendo cada Poder as suas funções atribuídas pelo legislador constituinte originário, entretanto sem a atribuição de caráter exclusivo absoluto. “Assim, cada um dos Poderes possui uma função predominante, que o caracteriza como detentor de parcela da soberania estatal, além de outras funções previstas no texto constitucional. São as chamadas funções típicas e atípicas” (MORAES, 2014, p. 429). Utilizando-se assim da contenção de poder pelo poder, denominado checks and balances (sistema de freios e contrapesos).

A separação dos poderes como corolário para a manutenção do Estado Democrático de Direito, bem como a teoria da representação popular, difundiu-se por quase todos os países, utilizando o instituto das prerrogativas como proteção a função desempenhada pelos parlamentares para defender os interesses da população de forma livre e desvinculada de censura por outros poderes.

(5)

Braz. J. of Develop., Curitiba, v. 6, n. 7, p. 45014-45036, jul. 2020. ISSN 2525-8761 2.1 ORIGEM E EVOLUÇÃO DAS PRERROGATIVAS NAS CONSTITUIÇÕES BRASILEIRAS

Na história das constituições brasileiras, o instituto das imunidades esteve abarcado em todas as constituições a datar da Constituição Imperial de 1824 e continuamente nas próximas até a atual Carta Magna de 1988, com o objetivo de garantir a representação popular e a independência dos Poderes.

A Constituição Imperial de 1824 já consagrava as imunidades nas modalidades material e formal, sendo os parlamentares invioláveis pelas opiniões no exercício das funções, assim como a impossibilidade do parlamentar ser preso durante o mandato, salvo em caso de ordem pela respectiva Casa Legislativa do parlamentar, com exceção de flagrante delito de pena capital. No mais, ainda previa a possibilidade de sustação do processo. Nesses termos, era a seguinte redação:

Art. 26. Os Membros de cada uma das Camaras são inviolaveis polas opiniões, que proferirem no exercicio das suas funcções.

Art. 27. Nenhum Senador, ou Deputado, durante a sua deputação, póde ser preso por Autoridade alguma, salvo por ordem da sua respectiva Camara, menos em flagrante delicto de pena capital.

Art. 28. Se algum Senador, ou Deputado fòr pronunciado, o Juiz, suspendendo todo o ulterior procedimento, dará conta á sua respectiva Camara, a qual decidirá, se o processo deva continuar, e o Membro ser, ou não suspenso no exercicio das suas funcções.

Já a Constituição Republicana de 1891, a primeira após a proclamação da república em 1889, marcada pela transição na forma de governo, em seu arts. 19 e 20 continuou com as imunidades parlamentares material e formal, garantindo a inviolabilidade pelas opiniões palavras e votos, tal como não poderiam os parlamentares serem presos ou processados no âmbito penal, sem a prévia autorização da Casa Legislativa, salvo em caso de flagrante de crime inafiançável. Assim, previa textualmente:

Art 19 - Os Deputados e Senadores são invioláveis por suas opiniões, palavras e votos no exercício do mandato.

Art 20 - Os Deputados e Senadores, desde que tiverem recebido diploma até a nova eleição, não poderão ser presos nem processados criminalmente, sem prévia licença de sua Câmara, salvo caso de flagrância em crime inafiançável. Neste caso, levado o processo até pronúncia exclusiva, a autoridade processante remeterá os autos à Câmara respectiva para resolver sobre a procedência da acusação, se o acusado não optar pelo julgamento imediato.

No mesmo sentido, as imunidades material e formal permaneceram na próxima Constituição da República de 1934, com a inviolabilidade por opiniões, palavras e votos, no exercício do mandato legislativo, bem como a impossibilidade de prisão, salvo o flagrante de crime. Na seguinte literalidade dos artigos:

Art 31 - Os Deputados são invioláveis por suas opiniões, palavras e votos no exercício das funções do mandato.

(6)

Braz. J. of Develop., Curitiba, v. 6, n. 7, p. 45014-45036, jul. 2020. ISSN 2525-8761 Art 32 - Os Deputados, desde que tiverem recebido diploma até à expedição dos diplomas para a Legislatura subseqüente, não poderão ser processados criminalmente, nem presos, sem licença da Câmara, salvo caso de flagrância em crime inafiançável. Esta imunidade é extensiva ao suplente imediato do Deputado em exercício.

§ 1º - A prisão em flagrante de crime inafiançável será logo comunicada ao Presidente da Câmara dos Deputados, com a remessa do auto e dos depoimentos tomados, para que ela resolva sobre a sua legitimidade e conveniência e autorize, ou não, a formação da culpa. § 2º - Em tempo de guerra, os Deputados, civis ou militares, incorporados às forças armadas por licença da Câmara dos Deputados, ficarão sujeitos às leis e obrigações militares.

Em 1937 foi outorgada a Constituição que implementava um regime autoritário por Getúlio Vargas, ainda assim, as imunidades foram garantidas aos membros da parlamentos, entretanto de forma diferenciada das constituições anteriores, pois a imunidade material foi instituída de forma limitada, não englobando as hipóteses de difamação, calúnia, injúria ultraje à moral pública ou provocação pública ao crime, permitindo assim a responsabilização do parlamentar. Com a seguinte redação textual:

Art 42 - Durante o prazo em que estiver funcionando o Parlamento, nenhum dos seus membros poderá ser preso ou processado criminalmente, sem licença da respectiva Câmara, salvo caso de flagrante em crime inafiançável.

Art 43 - Só perante a sua respectiva Câmara responderão os membros do Parlamento nacional pelas opiniões e votos que, emitirem no exercício de suas funções; não estarão, porém, isentos da responsabilidade civil e criminal por difamação, calúnia, injúria, ultraje à moral pública ou provocação pública ao crime.

Posteriormente, a Constituição de 1946, nos arts. 44 e 45, restabeleceu a amplitude do instituto da imunidade, nos aspectos material e formal, no art. 44, garantia a inviolabilidade dos Congressistas no exercício do mandato, por opiniões, palavras e votos, e no art. 45 estabelecia que após ato da diplomação até a diplomação seguinte, a impossibilidade da prisão ao parlamente, com a exceção de flagrante delito de crime inafiançável. Bem como o impedimento de não serem processados sem a autorização da Casa.

Ainda, o art. 45, trazia em seus parágrafos 1º, 2º e 3º que em se tratando de crime inafiançável, à Casa respectiva seria submetido os autos no prazo de 48 (quarenta e oito horas) para que decida sobre a prisão e autorize ou não a formação de culpa. A deliberação deveria ser sempre pelo voto da maioria dos membros. Já em caso de crime comum fora acrescentado pela Emenda Constitucional nº 9, de 1964 que “se a licença para o processo criminal não estiver resolvida em 120 (cento e vinte) dias, contados da apresentação do pedido, êste será incluído em ordem do dia, para ser discutido e votado, independentemente de parecer”. (BRASIL, 1964).

Nas pressões do regime militar em 1967 foi promulgada a Constituição de 1967, que previa as imunidades material e formal que originalmente foram consagradas no art. 34, prevendo que o parlamentar no exercício das funções era inviolável por suas opiniões, palavras e votos. Não podendo

(7)

Braz. J. of Develop., Curitiba, v. 6, n. 7, p. 45014-45036, jul. 2020. ISSN 2525-8761 serem presos, salvo flagrante de crime inafiançável. Como também a necessidade de licença da Câmara respectiva.

Inovou no parágrafo 2º do aludido artigo ao estabelecer que o prazo para a Casa deliberar sobre o pedido de licença para o processo criminal foi antecipado para 90 (noventa) dias, e caso dentro desse prazo não houvesse a deliberação, o processo seria “incluído automaticamente em Ordem do Dia e nesta permanecerá durante quinze sessões ordinárias consecutivas, tendo-se como concedida a licença se, nesse prazo, não ocorrer deliberação”. (BRASIL, 1967).

No mais, o parágrafo 3º, do artigo 34, disciplina a hipótese de flagrante de crime inafiançável em que os autos deveriam ser remetidos, dentro de quarenta e oito horas, à Câmara respectiva, para que, por voto secreto, resolvesse sobre a prisão e autorizasse, ou não, a formação da culpa.

A Constituição 1967, fora objeto da Emenda nº 1, de 17/10/1969, seguida mais tarde da Emenda nº 11, de 13/10/1978 que alteraram o regime das imunidades, resultando a inviolabilidade por opiniões, palavras e votos, obstante podendo os congressistas serem responsabilizados, no caso de crime contra a Segurança Nacional. Ainda ficou consignada a impossibilidade da prisão parlamentar, “desde a expedição do diploma até a inauguração da legislatura seguinte, os membros do Congresso Nacional não poderão ser presos, salvo flagrante de crime inafiançável, nem processados, criminalmente, sem prévia licença de sua Câmara” (parágrafo 1º, art. 32, EC nº 11, 1978) em que se a Câmara não se pronunciasse sobre o pedido no decorrer de 40 (quarenta) dias seria concedida a licença.

Por fim, a Carta Magna de 1988, posteriormente alterada pela Emenda Constitucional nº 35, de 20/12/2001, consagrou no art. 53, parágrafos 1º, 2º, 3º e 4º, o instituto da imunidade em suas duas modalidades, garantindo a inviolabilidade pelas opiniões, palavras e votos, como também a restrição a prisão aos parlamentares desde a expedição da diplomação, salvo em flagrante de crime inafiançável, em que os autos serão remetidos dentro de 24 (vinte e quatro) horas à Casa respectiva para deliberação sobre a prisão. Ainda regulamentou a possibilidade de sustação da ação penal pela Casa, por maioria de seus membros, apreciando no prazo improrrogável de 45 (quarenta e cinco) horas.

3 IMUNIDADES DOS CONGRESSISTAS

O constituinte originário ao estabelecer um conjunto próprio de funções, deveres, garantias, vedações e impedimentos aos congressistas, reservou um regime jurídico diferenciado denominado Estatuto dos Congressistas, que asseguram aos membros do Poder Legislativo o exercício de suas funções com independência e liberdade, como corolário fundamental da democracia.

(8)

Braz. J. of Develop., Curitiba, v. 6, n. 7, p. 45014-45036, jul. 2020. ISSN 2525-8761 As imunidades são atribuídas aos parlamentares na qualidade de representantes do povo, sendo prerrogativas irrenunciáveis, de forma que são garantias institucionais imanentes ao Parlamento, não conferindo privilégios subjetivos aos seus membros, sendo postas como de ordem pública.

Consubstanciando esse mesmo entendimento, Morais (2014, p. 457) preleciona que “para o bom desempenho de seus mandatos, será necessário que o parlamento ostente ampla e absoluta liberdade de convicção, pensamento e ação, por meio de seus membros, afastando-se a possibilidade de ficar vulnerável às pressões dos outros poderes do Estado”.

Vistas como essência do Estado Democracia de Direito, as imunidades embasam-se em dois fundamentos para essa sistemática constitucional, conforme os ensinamentos de Bastos e Tavares (2000, p. 322, apud TAVARES, 2018, p. 1013):

O escoro, por assim dizer, da perenidade que instituto da imunidade apresenta está, em sua essência, na teoria da separação dos poderes, mais especificamente no que diz respeito a uma de suas regras lapidares, qual seja, a da inafastável independência dos poderes. Por esta fica assegurado que nenhum dos poderes subordina-se a qualquer dos outros dois, em hipótese alguma.

De outro lado, o instituto está ancorado igualmente na teoria da representação popular, no sentido de que um parlamentar, eleito diretamente pelo povo, para cumprir mandato com prazo certo e determinado, não deve ter esse seu mister interrompido por decisão de outro poder, a respeito de circunstâncias que não guardam qualquer relação com o processo pelo qual recebeu o parlamentar a representação do povo. Entende-se que, se tal fosse possível, estar-se-ia indevidamente autorizando a interferência de um poder no pleno funcionamento do outro, impedindo o exercício de uma função recebida diretamente do povo. De fato, uma vez que fosse preso o parlamentar, não poderia este exercer a função para a qual foi aclamado pelo povo e conduzido para o Congresso. Pense-se, sobretudo, na possibilidade das prisões temporárias, preventivas, etc., ou seja, as denominadas prisões processuais.

Ainda, nesse viés, a jurisprudência pátria do Supremo Tribunal Federal consagra o instituto da imunidade parlamentar como de vital importância para a independência da instituição, em razão de conferirem aos parlamentares proteção no exercício de suas funções, contra abusos, ingerência e pressões dos demais poderes, “constituindo-se, pois, um direito instrumental de garantia de liberdade de opiniões, palavras e votos dos membros do Poder Legislativo, bem como de sua proteção contra afastamentos ou prisões arbitrárias e processos temerários”.(Brasil, 2017).

Cabe destacar que o instituto da imunidade parlamentar são classificadas em duas espécies: a material, que consiste na inviolabilidade civil e penal por suas opiniões, palavras e votos, consagrando a liberdade de expressão do agente político; e a formal que está relacionada com a impossibilidade do congressista ser preso, abrangendo a prisão penal e civil, bem como a possibilidade de sustação da ação penal.

(9)

Braz. J. of Develop., Curitiba, v. 6, n. 7, p. 45014-45036, jul. 2020. ISSN 2525-8761 3.1 IMUNIDADE MATERIAL

A imunidade material também comumente chamada de imunidade substancial ou real, está consagrada no art. 53, caput, da Constituição Federal, que promove a supressão da responsabilidade civil, penal, administrativa e política dos Deputados e Senadores por quaisquer opiniões, palavras e votos. Permitindo aos congressistas o exercício das funções parlamentares típicas e atípicas, sem a imposição temerária de processos e sanções.

Nesse viés, cabe trazer à baila o entendimento de Moraes (2014, p. 462):

Em síntese, a imunidade material é prerrogativa concedida aos parlamentares para o exercício de sua atividade com a mais ampla liberdade de manifestação, por meio de palavras, discussão, debate e voto; tratando-se, pois, a imunidade, de cláusula de irresponsabilidade funcional do congressista, que não pode ser processado judicialmente ou disciplinarmente pelos votos que emitiu ou pelas palavras que pronunciou no Parlamento ou em uma das suas comissões.

Importante ressaltar que a imunidade em comento pressupõe dois requisitos para a sua aplicação, quais sejam: primeiro que as opiniões, palavras e votos sejam emitidos no exercício da função parlamentar; segundo, é indispensável o nexo de causalidade entre a manifestação do parlamentar e as funções do cargo, ou seja, que apresente teor político, tema de interesse de setores da sociedade ou debate democrático.

Convém ressaltar que nem sempre esse foi o entendimento do Supremo Tribunal Federal, a jurisprudência firmada era que em caso de ofensas irrogadas em plenário, a imunidade material era absoluta, sendo indispensável a comprovação de nexo de causalidade com o mandato Entretanto, a alteração jurisprudencial se deu em junho de 2016, quando a 1ª Turma, por maioria dos votos, recebeu a denúncia pelo crime de incitação ao crime de estupro, e parcialmente, a queixa-crime quanto ao delito de injúria, contra o atual Presidente da República Jair Bolsonaro, a época Deputado Federal, por palavras proferidas no recinto da Câmara dos Deputados.

O STF, entendeu in casu que mesmo o parlamentar estando no recinto da Casa Legislativa, ocasião em que o Deputado concedia entrevista ao Jornal Zero Hora, por não estar no exercício da atividade parlamentar, não atrai a imunidade material, porquanto as manifestações foram inusuais ao mandato legislativo, pois “o fato de o parlamentar estar em seu gabinete no momento em que concedeu a entrevista é fato meramente acidental, já que não foi ali que se tornaram públicas as ofensas, mas sim através da imprensa e da internet”. (BRASIL, 2016a).

Entretanto, deve-se aguardar o julgamento definitivo da Ação Penal supracitada para concretização da alteração do entendimento jurisprudencial, de modo que a imunidade material somente possa abranger os comportamentos dos congressistas quando evidenciado que o ato tem nexo de causalidade com a atividade parlamentar.

(10)

Braz. J. of Develop., Curitiba, v. 6, n. 7, p. 45014-45036, jul. 2020. ISSN 2525-8761 No mais, cabe destacar que a prerrogativa atinge o parlamentar mesmo com o fim do mandato, em relação a condutas do decorrer do exercício da função e que tenha conexão com as atividades desempenhas.

3.2 IMUNIDADE FORMAL

A imunidade formal é uma prerrogativa processual constitucional, que garante ao parlamentar a impossibilidade de sofrer privações de liberdade, ou seja, há um impedimento para a decretação de sua prisão, de forma que o congressista não pode ser preso ou permanecer preso, bem como a possibilidade de sustação do processo penal em trâmite contra ele. A imunidade em comento divide-se em imunidade relativa a prisão (freedom from arrest) e imunidade relativa ao processo.

Quanto, a imunidade relativa à prisão, incide diretamente em vedar a aplicação das prisões de natureza penal, civil e processual ao congressista. Entretanto, excepcionalmente, este poderá ser preso em flagrante delito de crime inafiançável, com apreciação da respectiva Casa Parlamentar no prazo de vinte e quatro horas para que por maioria de seus membros decidir sobre manutenção ou não da prisão (art. 53, § 2, CF).

Embora, a imunidade abranja as prisões em sentido amplo, destaca-se que em caso de sentença condenatória que imponha ao parlamentar o cumprimento de pena privativa de liberdade não há aplicabilidade da imunidade formal.

Isso porque no contexto normativo delineado pela Constituição, a garantia jurídico-institucional da imunidade parlamentar formal relativa à prisão não obsta, observado o devido processo legal, a execução das penas privativas da liberdade definitivamente impostas a um Congresso Nacional. Reforçando essa tese, a Corte determinou, em 19.12.2018, o “imediato início” do cumprimento da pena imposta pelo tribunal ao Deputado Federal Paulo Maluf (PP-SP) na AP 863. Como a pena imposta ultrapassa o prazo de 120 dias de prisão (foi de 7 anos, 9 meses e 10 dias) e o regime inicial é fechado (sem possibilidade de saída durante o dia para trabalhar), a sentença também determinou a perda do mandato de Deputado (por força do art. 55, III, c/c o § 3º) e ordenou que a Câmara fosse comunicada. (MASSON, 2018, p. 794).

De outro giro, a imunidade relativa ao processo concerne a possibilidade da Casa Legislativa a que o parlamentar pertença sustar o andamento da ação penal a qualquer momento antes da decisão final pelo STF (art. 53, § 3, CF). Além disso, o requerimento de sustação deve ser solicitado por um partido político com representação na respectiva Casa Legislativa, posteriormente a Casa terá impreterivelmente 45 (quarenta e cinco) dias para decidir acerca da sustação (art. 53, § 4, CF). Outrossim, a suspensão da ação penal também suspende a prescrição, enquanto durar o mandato (art. 53, § 5, CF).

Urge salientar que o marco inicial para a incidência da imunidade é a diplomação, de modo que os crimes praticados antes da diplomação não serão atingidos pela imunidade parlamentar,

(11)

Braz. J. of Develop., Curitiba, v. 6, n. 7, p. 45014-45036, jul. 2020. ISSN 2525-8761 seguindo o processo o trâmite regular, sem a possibilidade de restrição à prisões e de sustação do processo. Permanecendo a prerrogativa enquanto durar o mandato.

4 FORO ESPECIAL POR PRERROGATIVA DE FUNÇÃO DOS CONGRESSISTAS

O foro especial por prerrogativa de função ou foro privilegiado é uma prerrogativa de ordem constitucional prevista no art. 53, § 1º, CF, que em razão do patamar político dos cargos ocupados no Legislativo pelos deputados federias e senadores, garantem o funcionalismo pleno do Congresso Nacional, sem interversões ou pressões externas populares e políticas.

Nessa diapasão, são os ensinamentos de Masson (2018, p. 807):

Tendo em conta a acentuada relevância que certos cargos e funções públicas encerram para a estrutura republicana erigida no texto constitucional, o legislador constituinte originário tratou de edificar um regramento de foros especiais para o processamento e julgamento daquelas autoridades que os ocupam. A finalidade é evitar, tanto quanto possível, decisões prolatadas sob forte pressão externa ou influências pelos constrangimentos da proximidade. Pareceu ao legislador constituinte que esses embaraços ficariam tanto menores quanto mais afastados estivessem os órgãos julgadores da dominação local e quanto mais experientes fossem os seus componentes. Nessa perspectiva, delegou a órgãos colegiados do Poder Judiciário a tarefa de avaliar as infrações penais cometidas pelas mais representativas autoridades integrantes do Estado.

Posto isso, o foro privilegiado garante que os Deputados Federais e Senadores desde a diplomação serão submetidos a julgamento perante o Supremo Tribunal Federal. Abrangendo exclusivamente a esfera penal, de modo que as esferas cível e administrativa, são de competência do órgão jurisdicional de primeira instância.

De acordo com Távora e Alencar (2017, p. 427), a competência ratione personae em razão do foro privilegiado permite “enaltecer a função desempenhada”, que possui uma garantia dúplice,

que, de um lado, tem um caráter favorável ao acusado (outorga a ele o direito de ser julgado por órgão coletivo, que tem menor chance de ser objeto de constrangimentos por terceiros que o juízo singular) e, de outros, manifesta-se contra o réu (eis que também é menor o risco de coação efetuada pelo próprio réu relativamente a um órgão judicial coletivo, que a um órgão singular).

Apesar da garantia bilateral apresentada por Távora e Alencar, o risco de pressões externas sempre esteve presente, estando impregnada no sistema jurídico brasileiro, desde os tempos mais remotos até hodiernamente. De modo que a possível hipótese de manipulação da justiça não justifica a permanência do foro privilegiado.

O que causa perplexidade na sociedade é o fato de que a primeira condenação pelo STF a um parlamentar no exercício do cargo ocorreu tardiamente em 2010, o até então deputado federal José Gerardo (PMDB-CE). Seguida de outras condenações que atingiram deputados e ex-deputados.

(12)

Braz. J. of Develop., Curitiba, v. 6, n. 7, p. 45014-45036, jul. 2020. ISSN 2525-8761 (SYLVIO COSTA, 2011). O que gera o sentimento de impunidade, em razão da morosidade na tramitação da ação penais perante a Suprema Corte.

Contribuindo para esse sensação de impunidade, tem-se que o tempo médio na tramitação de uma ação penal perante o STF é de 1.536 dias, ou seja, 2 anos e quatro meses, segundo dados do Projeto Supremo em Números, da Fundação Getúlio Vargas (FGV). Deve-se ainda levar em consideração que o combate à corrupção aumenta consideravelmente os processos de competência dos Tribunais Superiores, o que consequentemente aumenta a média de tempo de julgamento das ações. (CHICO LEITE, 2017).

De modo que a sistema atual do foro privilegiado causa inquietações e questionamentos por múltiplos grupos da sociedade, entre eles, os civis, juristas, magistrados e até mesmo entre os políticos por atribuir a um grupo seleto, ocupantes de cargos específicos, tratamento diferenciado com prerrogativas que ferem o ordem constitucional, em relevo, o princípio constitucional da isonomia.

Em contraposição, tem-se aqueles que defendem a manutenção do foro privilegiado por entenderem que a prerrogativa é uma preservação imanente ao cargo, sendo imprescindível ao irrestrito exercício das funções. De forma que “o julgamento por um colegiado robustece o sentido de imparcialidade nos julgamentos dessas pessoas, porquanto as instâncias superiores estão mais distantes das paixões e revoltas populares” guardando maior segurança jurídica aos parlamentares. (AGUIAR e OLIVEIRA, 2017, p. 125).

Tourinho Filho (2013, p. 179/180) indaga: seria uma vantagem concedida a alguns em detrimento de outros? Um privilégio, enfim? A resposta de ambos questionamentos é negativa, pois é uma garantia que visa proteger um interesse geral, no intuito de garantir uma melhor justiça penal.

É verdade que a Lei Maior, no art. 5º, caput, estabelece que “todos são iguais perante a lei”. Sendo, como efetivamente são, esse direito concedido a tais pessoas não conflitaria com a igualdade? Obviamente não. Não se trata de um privilégio, o que seria odioso, mas de uma garantia, de elementar cautela, para amparar, a um só tempo, o responsável e a Justiça, evitando, por exemplo, a subversão da hierarquia, e para cercar o seu processo e julgamento de especiais garantias, protegendo-os contra eventuais pressões que os supostos responsáveis pudessem exercer sobre os órgãos jurisdicionais inferiores. (TOURINHO FILHO, 2013, p. 180).

Consubstanciando os questionamentos acerca do instituto enfrentamento pela Suprema Corte, o Senado Federal, em recente pesquisa publicada em abril de 2017, constatou que 54.990 autoridades são detentoras do foro especial, sendo que 38.431 são originária na Constituição Federal e 16.559 das Constituições Estaduais. (CALVANTE FILHO e LIMA, 2017, p. 30).

Posto isso, é clarividente, que a competência ratione personae é assimétrica no sistema penal brasileiro, sendo desarrazoável a permanência do instituto de forma ampla, pois atualmente é sinônimo de imupunidade, e manipulação da justiça, devendo levar-se em consideração os preceitos

(13)

Braz. J. of Develop., Curitiba, v. 6, n. 7, p. 45014-45036, jul. 2020. ISSN 2525-8761 constitucionais impostos pelo constituinte originário, em destaque o princípio da igualdade, em que “todos são iguais perante a lei” (art. 5º, caput, CF), não devendo ser concedido privilégios em razão da função pública.

4.1 O JULGAMENTO DA QUESTÃO DE ORDEM DA AÇÃO PENAL Nº 937/RJ COM NOVA INTERPRETAÇÃO A SISTEMÁTICA DO FORO PRIVILEGIADO

A Ação Penal (AP) nº 937/RJ, em trâmite perante o Supremo Tribunal Federal, em que consta como réu o Deputado Federal Marcos da Rocha Mendes, pelo crime de captação ilícita de sufrágio – corrupção eleitoral, praticado nas eleições de 2008, época em que era candidato a prefeito, foi um caso emblemático e decisivo para a Corte. Um processo com mutação de competência ratione personae constante, passando pelas diversas instâncias de jurisdição.

Na análise detida dos autos da AP 937/RJ, verifica-se que esta se iniciou perante o Tribunal Regional Eleitoral do Rio de Janeiro – TRE/RJ (2013), pois ao ser denunciado o réu ocupava o cargo de prefeito em Cabo Frio, fazendo gozo da prerrogativa de função. Com o fim do mandato, o TRE/RJ declinou a competência para a 256ª Zona Eleitoral do Rio de Janeiro. Em seguida, o TRE, em habeas corpus, anulou o recebimento da denúncia e atos posteriores, visto que, à época o réu não ocupava mais o cargo que lhe atribuía a competência ratione personae ao TRE. De forma que a denúncia fora novamente recebida (2014) pela 256ª Zona Eleitoral.

Após o encerramento da fase de instrução, com a apresentação de alegações finais, perante a Justiça Eleitoral de 1ª Grau, o réu com um vida política ativa, foi diplomado como deputado federal (10/02/2015) como primeiro suplente, ocasião em que a 256ª Zona Eleitoral declinou a competência para o Supremo Tribunal Federal, em que Marcos da Rocha Mendes assumiu o cargo de deputado federal, em razão do afastamento dos deputados eleitos. Entretanto, após assumir e se afastar do cargo como suplente por diversas ocasiões, foi efetivado (13/09/2016), ocupando a vaga do Deputado Eduardo Cunha, que perdeu o cargo.

Repetidamente, com o fim da fase de instrução e a inclusão do processo na pauta de julgamento do STF, o réu novamente eleito para ocupar o cargo de prefeito da cidade de Cabo Frio, o que o levou a renunciar ao mandato como Deputado Federal para assumir ao novo mandato na prefeitura (01/01/2017). O que em tese prática ocasionaria outra vez o deslocamento de competência para a TRE/RJ.

Pois bem. Diante do cenário excêntrico, enfrentado na ação penal em comento, o Relator Ministro Luís Roberto Barroso suscitou uma Questão de Ordem (QO) com duas propostas, com a seguintes teses vencedoras, por maioria dos votos:

(14)

Braz. J. of Develop., Curitiba, v. 6, n. 7, p. 45014-45036, jul. 2020. ISSN 2525-8761 (i) O foro por prerrogativa de função aplica-se apenas aos crimes cometidos durante o exercício do cargo e relacionados às funções desempenhadas; e (ii) Após o final da instrução processual, com a publicação do despacho de intimação para apresentação de alegações finais, a competência para processar e julgar ações penais não será mais afetada em razão de o agente público vir a ocupar outro cargo ou deixar o cargo que ocupava, qualquer que seja o motivo (BRASIL, 2018).

Antes do supracitado julgamento que fora concluído em 03/05/2018, os Deputados Federais e Senadores, detinham um foro amplo, que a partir da expedição do diploma até o termino do mandato, submetiam-se a julgamento perante o Supremo Tribunal Federal por crimes de qualquer natureza, ao qual não era relevante se o crime foi cometido antes ou após a diplomação, bem como se ocorreu no exercício da função ou fora desta.

Como o novo entendimento entabulado, em Questão de Ordem, o foro por prerrogativa de função passou a ter uma modelagem restritiva, abrangendo somente os crimes que forem praticados durante o exercício do cargo e em razão dele.

Desse modo, as infrações de natureza comum cometidas durante o mandato, mas que não apresenta conexão com o cargo e a função desempenhada pelo parlamentar, não serão abrangidas pelo foro privilegiado e serão submetidas a julgamento perante o juiz de primeiro grau. Ao passo, que se o processo estiver em andamento perante o STF e o deputado federal ou senador deixar de ocupar o cargo por renúncia, cessação ou qualquer motivo, estando encerrada a fase de instrução e publicado o despacho para intimação das partes apresentarem as alegações finais, a competência não sofrerá modificação, permanecendo competente o STF.

O STF, com a competência originaria para o julgamento dos Deputados Federais e Senadores e, por consequência, enfrentava uma crise em meio a exorbitante quantidade de ações penais em trâmite na Corte, gerando ineficiência no sistema penal, e contrariando os preceitos constitucionais da duração razoável do processo, probidade e moralidade.

Situação em que os próprios parlamentares contribuem para o cenário de balbúrdia, pois, em diversas ocasiões os parlamentares chegaram ao extremo de renunciaram ao cargo para que cessasse a competência do Supremo, ocasionando o deslocamento da ação penal para o juízo de primeiro grau.

Diante do cenário enfrentado pelo STF, se ansiava em estabelecer um critério objetivo em que a competência do órgão julgador não sofreria modificação em razão da renúncia do cargo, não reeleição ou pelo termino do mandato, e ainda, e em meio a um clamor popular pela revisão jurídica do instituto do foro privilegiado, a Suprema Corte atribuiu novo entendimento ao foro por prerrogativa de função no julgamento da Questão de Ordem (QO) da Ação Penal (AP) nº 937/RJ.

(15)

Braz. J. of Develop., Curitiba, v. 6, n. 7, p. 45014-45036, jul. 2020. ISSN 2525-8761 1. (...) omissis

2.Impõe-se, todavia, a alteração desta linha de entendimento, para restringir o foro privilegiado aos crimes praticados no cargo e em razão do cargo. É que a prática atual não realiza adequadamente princípios constitucionais estruturantes, como igualdade e república, por impedir, em grande número de casos, a responsabilização de agentes públicos por crimes de naturezas diversas. Além disso, a falta de efetividade mínima do sistema penal, nesses casos, frustra valores constitucionais importantes, como a probidade e a moralidade administrativa.

3.Para assegurar que a prerrogativa de foro sirva ao seu papel constitucional de garantir o livre exercício das funções – e não ao fim ilegítimo de assegurar impunidade – é indispensável que haja relação de causalidade entre o crime imputado e o exercício do cargo. A experiência e as estatísticas revelam a manifesta disfuncionalidade do sistema, causando indignação à sociedade e trazendo desprestígio para o Supremo.

A própria Corte reconheceu a ineficácia da abrangência ampla do instituto do foro privilegiado, em frente da função de juiz natural desempenhada no sistema penal que deve adequar-se continuamente a verdadeira realidade da sistemática do jurídico atual, passando a realizar um interpretação restritivas de suas competências como garantia do princípio basilar do estado democrático de direito.

O Ministro Luís Roberto Barroso, em seu voto na AP nº 937, assumiu que a disfucionalidade da competência ratione personae desvirtua o verdadeiro papel do Tribunal, que é o de corte suprema, e não o de um tribunal criminal comum de primeiro grau. Sendo os tribunais superiores, como o STF, concebidos para o contemplar teses jurídicas, e não para o julgamento de fatos e provas. Até mesmo pelo fato do juiz de primeiro grau ter afinidade para a conduzir a instrução processual, “tanto por estar mais próximo dos fatos e das provas, quanto por ser mais bem aparelhado para processar tais demandas com a devida celeridade, conduzindo ordinariamente a realização de interrogatórios, depoimentos, produção de provas periciais, etc”. (BRASIL, 2018)

No mais, com a mutação constitucional do julgamento da QO AP nº 937 que se restringiu a abrangência do foro privilegiado, com aplicação imediata vários processos em trâmite no STF foram remetidos para o juízo de primeira instância por não abarcar os novas parâmetros estabelecidos. Dissipando a crise moral enfrentada pelo Suprema Corte aos olhos dos cidadãos comuns e reduzindo significativamente os números de processos em trâmite na Corte.

5 AS CONSEQUÊNCIAS DO ABUSO DAS IMUNIDADES PARLAMENTARES FEDERAIS

A vasta gama de prerrogativas atinentes aos parlamentares para a garantia do exercício da função com liberdade e autonomia, “com respeito à diversidade de ideias e aos direitos da maioria e das minorias” apresenta como contrapartida a responsabilidade dos parlamentares em frente a atitudes abusivas como essência dos regimes democráticos e republicanos. (DIAS e LAURENTIIS, 2012, p. 17).

(16)

Braz. J. of Develop., Curitiba, v. 6, n. 7, p. 45014-45036, jul. 2020. ISSN 2525-8761 Muito embora, o instituto da imunidade restrinja o alcance do Poder Judiciário na espera penal e cível, não há caracterização de impunidade absoluta, de forma que haverá a incidência do poder disciplinar pela própria casa legislativa conforme disciplinado pelos Regimentos Internos para a correção eventuais excessos e abusos praticados por seus membros.

Com a autonomia e independência institucional em frente aos outros poderes, as Casas Legislativas, por intermédio do Conselho de Ética e Decoro Parlamentar apurará os abusos das prerrogativas, implicando sanções, conforme disciplina a Constituição Federal: “Art. 55. (...) §1º. É incompatível com o decoro parlamentar, além dos casos definidos no regimento interno, o abuso das prerrogativas asseguradas a membros do Congresso Nacional ou a percepção de vantagens indevidas.”

No âmbito do Congresso Nacional, ambas as casas legislativas, Câmara dos Deputados e o Senado Federal possuem o Código de Ética e Decoro Parlamentar que integra o Regimento Interno, estabelecendo as regras de decoro que orientam a conduta dos parlamentares com deveres institucionais, vedações, o processo disciplinar e as condutas puníveis.

Entretanto, mesmo diante da ampla proteção jurídica em defesa do abuso das imunidades, os parlamentares utilizam-se do instituto da imunidade de forma errônea para encobrir abusos, fazendo manifestações de má-fé com palavras de baixo calão, até mesmo excedendo o bom sendo e ofendendo seus pares, atos classificados como atentatórios ao decoro, configurando abuso da imunidade material.

A esse propósito, o Regimento Interno da Câmara dos Deputados em seu artigo 244, assevera que: “Art. 244. O Deputado que praticar ato contrário ao decoro parlamentar ou que afete a dignidade do mandato estará sujeito às penalidades e ao processo disciplinar previstos no Código de Ética e Decoro Parlamentar, que definirá também as condutas puníveis.”

Já no Código de Ética e Decoro Parlamentar da Câmara dos Deputados no capítulo II – Dos deveres fundamentais, dos atos incompatíveis e dos atos atentatórios ao decoro parlamentar - preceitua os deveres fundamentais do Deputado no art. 3º, que merece ser destacado os incisos II, III, IV e VII:

Art. 3º São deveres fundamentais do Deputado:

I – promover a defesa do interesse público e da soberania nacional;

II – respeitar e cumprir a Constituição Federal, as leis e as normas internas da Casa e do Congresso Nacional;

III – zelar pelo prestígio, aprimoramento e valorização das instituições democráticas e representativas e pelas prerrogativas do Poder Legislativo;

IV – exercer o mandato com dignidade e respeito à coisa pública e à vontade popular, agindo com boa-fé, zelo e probidade;

(17)

Braz. J. of Develop., Curitiba, v. 6, n. 7, p. 45014-45036, jul. 2020. ISSN 2525-8761 VII – tratar com respeito e independência os colegas, as autoridades, os servidores da Casa e os cidadãos com os quais mantenha contato no exercício da atividade parlamentar, não prescindindo de igual tratamento;

(grifo nosso)

Ainda, o artigo 5º do supracitado Código de Ética corrobora com a seguinte disciplina:

Art. 5º Atentam, ainda, contra o decoro parlamentar as seguintes condutas, puníveis na forma deste código:

I – perturbar a ordem das sessões da Câmara dos Deputados ou das reuniões de Comissão; II – praticar atos que infrinjam as regras de boa conduta nas dependências da Casa; III – praticar ofensas físicas ou morais nas dependências da Câmara dos Deputados ou desacatar, por atos ou palavras, outro parlamentar, a Mesa ou Comissão ou os respectivos Presidentes;

(...) omissis

Nos mesmos moldes do art. 55, da CF, o Código de Ética da Câmara dos Deputados no art. 4º, determina que “Constituem procedimentos incompatíveis com o decoro parlamentar, puníveis com a perda do mandato: I – abusar das prerrogativas constitucionais asseguradas aos membros do Congresso Nacional.”

No mesmo sentido, estabelece do Código de Ética e Decoro Parlamentar do Senado Federal:

Art. 2º São deveres fundamentais do Senador:

I - promover a defesa dos interesses populares e nacionais;

II - zelar pelo aprimoramento da ordem constitucional e legal do País, particularmente das instituições democráticas e representativas, e pelas prerrogativas do Poder Legislativo; III - exercer o mandato com dignidade e respeito à coisa pública e à vontade popular; (...) omissis

Além disso, semelhante ao art. 4 do Código de Ética da Câmara dos Deputados, o Senado Federal traz explicito que os abusos das prerrogativas são atitudes incompatíveis com a ética e o decoro parlamentar, in verbis:

Art. 5º Consideram-se incompatíveis com a ética e o decoro parlamentar:

I - o abuso das prerrogativas constitucionais asseguradas aos membros do Congresso Nacional (Constituição Federal, art. 55, § 1°).

(...) omissis

Art. 11. Serão punidas com a perda do mandato: (...) omissis

II – a prática de qualquer dos atos contrários à ética e ao decoro parlamentar capitulados nos arts. 4º e 5º (Constituição Federal, art. 55).

O abuso das imunidades parlamentares é considerado grave e a consequência é mais rígida prevista no ordenamento dentre as hipóteses de sanções aplicadas aos membros do Poder Legislativo, pois o parlamentar que incorrer em abusos das prerrogativas asseguradas constitucionalmente perderá o mandato, que será regulado por processo disciplinar iniciado perante o Conselho de Ética e Decoro Parlamentar da respectiva Casa, por provocação da Mesa ou de partido político representado no

(18)

Braz. J. of Develop., Curitiba, v. 6, n. 7, p. 45014-45036, jul. 2020. ISSN 2525-8761 Congresso Nacional. Observa-se que a provocação da Mesa poderá ser decorrente do recebimento de representação popular contra o congressista. E seguira um procedimento especial disciplinado no Regimento Interno.

Pelo explanado, evidencia-se que a sistemática das imunidades conferidas aos congressistas não exclui a possibilidade de sanção pela via de processo disciplinar pelo abuso das imunidades, dessa feita um congressista que ofender a honra de um de seus pares no calor da discussão política, a depender do caso concreto, pode ser excluída a responsabilização na esfera penal e cível, no entanto responderá processo administrativo disciplina, que se for condenado culminará na perda do mandato legislativo por quebra de decoro.

6 FIM DO FORO PRIVILEGIADO COM A PROPOSTA DE EMENDA À CONSTITUIÇÃO Nº 10/2013

Diante do cenário político caótico vivenciado pela sociedade brasileira, com ânsia pela restrição das benesses estendidas aos agentes políticos, tramita no Congresso Nacional a Proposta de Emenda Constitucional nº 10/2013, com origem no Senado Federal pelo Senador Álvaro Dias, que pretende alterar os arts. 102, 105, 108 e 125 da Constituição Federal para extinguir o foro especial por prerrogativa de função para qualquer autoridade nos crimes comuns.

Nas razões que justificaram apresentação da Proposta de Emenda tem-se como argumento central o princípio da isonomia, que vivenciada no atual Estado Democrático de Direito não há circunstâncias que permitem a manutenção do foro privilegiado em crimes comuns praticados pelos agentes políticos, incorrendo em privilégios injustificáveis.

Com base no princípio republicano da igualdade, preleciona Aguiar e Oliveira (2018, p. 128):

É certo que o fundamento da igualdade permite o tratamento desigual, quando necessário, para a materialização da letra da lei. Contudo, “privilégios odioso” não devem prevalecer para proteger membros da legislativo, executivo e judiciário em ação que não coadunam com a função exercida.

Não se justificando a aplicação do foro privilegiado em crimes comuns, pois não havendo pertinência e conexão com o mandato, resta desfigurada a finalidade vital da prerrogativa que tem como premissa basilar a garantia do mandato popular e o livre funcionamento e independência dos poderes.

Durante a tramitação da proposta no Senado Federal, o relatório apresentado à Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania pelo Relator Senador Randolfe Rodrigues defendeu o fim do foro privilegiado, enfatizando que “a singularidade do processo-crime não pode servir de disfarce para a impunidade: seus instrumentos legítimos não podem ser convolados em abuso de direito, para

(19)

Braz. J. of Develop., Curitiba, v. 6, n. 7, p. 45014-45036, jul. 2020. ISSN 2525-8761 franquear a impunidade a malfeitores, em especial quando o que está em jogo é a Coisa Pública”. (BRASIL, 2016b).

Ainda, o Senador aponta que o fim do foro privilegiado não oferece afronta ou vulnerabilidade a separação de poderes, pois os agentes políticos não sofreram opugnações temerárias por outros agentes, por três motivos, primeiro para a instauração de processo criminal tem que estar presentes requisitos mínimos de culpabilidade; segundo, há meios processuais administrativos para inibir eventuais abusos e incorreções das autoridade, bem como uma ampla gama de recursos para corrigir eventuaisdecisões injustas ou facciosas no curso dos processos criminais; e terceiro o instituto das imunidades que protege os agentes nas suas funções. (BRASIL, 2016b).

A proposto iniciou-se no Senado Federal sob o nº 10/2013, aprovada pela Casa em 2017, em dois turnos de votação, que põe fim ao foro especial para os crimes comuns, entretanto, a extinção foro privilegiado não atingirá os políticos do alto escalão, o Presidente e o Vice Presidente da República, o Presidente do Supremo Tribunal Federal, o Presidente do Senado Federal e o Presidente da Câmara dos Deputados. A proposta seguiu para a Câmara dos Deputados sob o nº 333/2017, onde já foi apreciada pela Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania, e pela Comissão Especial, estando pronta para votação no plenário da Câmara dos Deputados.

7 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Como garantia da atividade representativa popular, as prerrogativas originaram-se como ferramenta para defender os interesses sociais e a autonomia do parlamento sem intervenções e pressões externas, entretanto com a evolução e ampliação do instituto, a disfucionalidade das prerrogativas se tornaram cada vez mais evidente, principalmente com a deflagração de esquemas de corrupção nos últimos anos, como mensalão e a lava jato.

Com o passar dos anos, a sociedade observou a ineficácia da sistemática atual das imunidades e do foro privilegiado, instaurando-se uma crise política com provocações e pressões populares para restrições e extinções das benesses aos agentes políticos. Nesse cenário, a figura do Supremo Tribunal Federal decaía ao descrédito como órgão máximo do Poder Judiciário, pois a alta demanda processual contribuía para a impunidade.

Nesse viés, a própria Corte reconheceu a ineficácia do foro privilegiado com a realidade jurídica atual no julgamento da Questão de Ordem da Ação Penal nº 937, momento em que o STF restringiu o alcance da prerrogativa aos crimes conexos com o mandato e fixou um marco temporal como limite para o deslocamento de competência em razão do agente, em que com o fim da instrução processual a competência para julgar e processar a ação penal não sofrerá mutação.

(20)

Braz. J. of Develop., Curitiba, v. 6, n. 7, p. 45014-45036, jul. 2020. ISSN 2525-8761 Observou-se que por vezes os congressistas incidem em abusos e excessos, contrariando os preceitos constitucionais, os bons costumes e a moral. Hipóteses em que invocam as imunidades para encobrir comportamentos errôneos. Apesar das imunidades abarcarem somente atos e dizeres que apresentem conexão com o mandato, nem sempre permitem a responsabilizam adequada aos agentes políticos.

Entretanto, a imunidade não acarreta absoluta impunidade, pois apesar do instituto restringir o alcance no âmbito judiciário, não exclui a incidência do poder disciplinar, regido pelo Regimento Interno da respectiva Casa Legislativa para a correção eventuais excessos e abusos praticados por seus membros. De modo que o abuso das prerrogativas pelos parlamentares federais tem consequências, sendo a mais rígida a perda do mandato popular, nos ditames da Constituição e do Código de Ética e Decoro Parlamentar das Casas.

Assim, concluiu-se que na concepção do Estado atual, o instituto da imunidade parlamentar deve ser revisto, permanecendo somente a imunidade material, tendo em vista que é a única que se coaduna com os ditames do Estado democrático de Direito, na garantia do livre exercício do mandato. Ainda levando em consideração que os eventuais excessos nas opiniões, palavras e votos são incompatíveis com o decoro parlamentar, incidindo em processo disciplinar administrativo, podendo ser penalizado com a perda do mandato.

Já a imunidade formal deve ser extinta em suas duas modalidades, tendo em vista que não atende sua finalidade precípua de representação popular e bom desempenho das funções, pois não vislumbra ser a imunidade sinônimo de impunidade, de modo que o agente político não ficará vulnerável frente aos outros poderes, pois existem requisitos mínimos para a instauração de processo penal que são imprescindíveis para a formação de culpa.

Outrora, no que concerne ao foro privilegiado, conclui-se que esta prerrogativa não se coaduna com os ditames da democracia e com o princípio constitucional da isonomia, devido a sua ampla extensão, devendo ser extirpada do ordenamento jurídico brasileiro, nos moldes da PEC nº 10/2013.

REFERÊNCIAS

AGUIAR, Júlio César de; OLIVEIRA, João Paulo Lacerda. O Fim do Foro Especial por

Prerrogativa de Função. Revista de Informação Legislativa: RIL, v. 55, n. 217, p. 115-134,

jan./mar. 2018. Disponível em

<https://www12.senado.leg.br/ril/edicoes/55/217/ril_v55_n217_p115.pdf>. Acesso em: 17 fev. 2019.

(21)

Braz. J. of Develop., Curitiba, v. 6, n. 7, p. 45014-45036, jul. 2020. ISSN 2525-8761 ARISTÓTELES. A política. Tradução de Roberto Leal Ferreira. 2. ed. São Paulo: Martins Fontes, 1998.

BRASIL. Congresso Nacional. Câmara dos Deputados. Regimento interno da Câmara dos

Deputados [recurso eletrônico]: aprovado pela Resolução n. 17 de 1989 e alterado até a Resolução

n. 27, de 2018. 19. ed. Brasília: Câmara dos Deputados, Edições Câmara, 2018. (Série legislação; n. 281 e-book). Disponível em: < https://livraria.camara.leg.br/regimento-interno-da-camara-dos- deputados-espiralhttps://livraria.camara.leg.br/regimento-interno-da-camara-dos-deputados-espiral >. Acesso em: 14 mar. 2019.

______. Constituição (1834). Constituição Política do Império do Brazil: outorgada em 25 de março de 1824. Disponível em:

<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/Constituicao24.htm>. Acesso em: 16/03/2019.

______. Constituição (1891). Constituição da República dos Estados Unidos do Brasil: promulgada em 24 de fevereiro de 1891. Disponível em:

<http://www.planalto.gov.br/CCivil_03/Constituicao/Constituicao91.htm>. Acesso em: 16/03/2019.

______. Constituição (1934). Constituição da República dos Estados Unidos do Brasil: promulgada em 16 de julho de 1934. Disponível em:

<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/Constituicao34.htm>. Acesso em: 17/03/2019.

______. Constituição (1937). Constituição dos Estados Unidos do Brasil: outorgada em 10 de novembro de 1937. Disponível em:

<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/Constituicao37.htm>. Acesso em: 17/03/2019.

______. Constituição (1946). Constituição dos Estados Unidos do Brasil: promulgada em 18 de setembro de 1946. Disponível em:

<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/Constituicao46.htm>. Acesso em: 17/03/2019.

______. Constituição (1967). Constituição da República Federativa do Brasil. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/Constituicao67.htm>. Acesso em: 17/03/2019.

______. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil: promulgada em 5 de outubro de 1988, com as alterações adotadas pelas Emendas constitucionais nº 1/1992 a 95/2016, pelo Decreto legislativo nº 186/2008 e pelas Emendas constitucionais de revisão nº 1 a 6/1994. 51. ed. Brasília: Câmara dos Deputados, Edições Câmara, 2017. 116 p. (Séries textos básicos; n. 139 papel).

______. Emenda Constitucional nº 1, de 17 de outubro de 1969. Disponível em:

<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/Emendas/Emc_anterior1988/emc01-69.htm>. Acesso em: 17/03/2019.

______. Emenda Constitucional nº 11, de 13 de outubro de 1978. Disponível em:

<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/Emendas/Emc_anterior1988/emc11-78.htm>. Acesso em: 17/03/2019.

______. Senado Federal. Relatório Legislativo apresentado à Comissão de Constituição,

(22)

Braz. J. of Develop., Curitiba, v. 6, n. 7, p. 45014-45036, jul. 2020. ISSN 2525-8761 novembro de 2016b. Disponível em: <

https://legis.senado.leg.br/sdleg-getter/documento?dm=3961650&disposition=inline#Emenda6>. Acesso em: 17/03/2019.

______. Superior Tribunal Federal. Ação Penal: 937/ RJ. Relator: Ministro Roberto Barroso, Data do Julgamento: 03/05/2018, Data da Publicação: Diário de Justiça: 10/12/2018. STF, 2018.

Disponível em: <https://portal.stf.jus.br/processos/detalhe.asp?incidente=4776682>. Acesso em: 26 fev. 2019.

______. Supremo Tribunal Federal. Inquérito nº 3.932/DF. Relator: Ministro Luiz Fux. Data do Julgamento: 21/06/2016, Data da Publicação: 30/06/2016a. Disponível em:

<http://redir.stf.jus.br/paginadorpub/paginador.jsp?docTP=TP&docID=11627210>. Acesso em: 27 fev. 2019.

______. Senado Federal. Proposta de Emenda à Constituição nº 10/2013. Senado Federal. Atividade Legislativa, 13 mar. 2013. Disponível em:

<https://legis.senado.leg.br/sdleg-getter/documento?dm=3961507&ts=1547923242787&disposition=inline>. Acesso em: 17/03/2019.

______. Resolução nº 2º de 1993. Institui o Código de Ética e Decoro Parlamentar do Senado Federal. Brasília: Senado Federal, 2009. Disponível em:

<https://www.senado.gov.br/senadores/novaLegislatura/Codigo_Etica.pdf>. Acesso em: 31 maio 2017.

______. Supremo Tribunal Federal. Medida Cautelar em Mandado de Segurança nº35265/DF. Relator: Ministro Alexandre de Moraes, Data do Julgamento: 17/10/2017, Data de Publicação: Diário de Justiça Eletrônico nº 238 19/10/2017. JusBrasil, 2017. Disponível em:

<https://stf.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/511521637/medida-cautelar-em-mandado-de-seguranca-mc-ms-35265-df-distrito-federal-0012148-6120171000000?ref=serp>. Acesso em: 10 fev. 2019.

CAVALCANTE FILHO, J. T. & LIMA, F. R. Foro, Prerrogativa e Privilégio (Parte 1): Quais e

quantas autoridades têm foro no Brasil? Brasília: Núcleo de Estudos e Pesquisas/

CONLEG/Senado, Abri/2017 (Texto para Discussão nº 233). Disponível em: <

https://www12.senado.leg.br/publicacoes/estudos-legislativos/tipos-de-estudos/textos-para-discussao/td233>. Acesso em: 05 mar. 2019.

LEITE, Chico. 128 anos de repulsa ao foro privilegiado. Congresso em Foco. 2017. Disponível em:

<https://congressoemfoco.uol.com.br/opiniao/colunas/128-anos-de-repulsa-ao-foro-privilegiado/>. Acesso em: 24 mar. 2019.

DIAS, Roberto; LAUTENTIIS, Lucas de. Imunidades parlamentares e abusos de direitos: uma

análise da jurisprudência do Supremo Tribunal Federal. Revista de Informação Legislativa:

RIL, v. 49, n. 195, p. 07-24, jul./set. 2012. Disponível em:

<https://www2.senado.leg.br/bdsf/bitstream/handle/id/496594/000966843.pdf>. Acesso em: 11 nov. 2018.

LOCKE, John. Segundo Tratado sobre o governo civil. In:__. Dois tratados sobre o governo. Tradução de Julio Fischer. São Paulo: Martins Fontes, 1998.

MALUF, Salid. Teoria Geral do Estado. 31. ed. São Paulo: Saraiva, 2013.

(23)

Braz. J. of Develop., Curitiba, v. 6, n. 7, p. 45014-45036, jul. 2020. ISSN 2525-8761 MONTESQUIEU. O Espírito das Leis. Apresentação Renato Janine Ribeiro; Tradução Cristina Muracho. São Paulo: Martins Fontes, 2000.

MORAES, Alexandre de. Direito Constitucional. 30. ed. São Paulo: Atlas, 2014.

COSTA, Sylvio. Apoio massivo ao fim do foro privilegiado. Congresso em Foco, 2011.

Disponível em: <https://congressoemfoco.uol.com.br/especial/noticias/apoio-massivo-ao-fim-do-foro-privilegiado/>. Acesso em: 24 mar. 2019.

TAVARES, André Ramos. Curso de Direito Constitucional. 16. ed. São Paulo: Saraiva Educação, 2018.

TÁVORA, Nestor; ALENCAR. Rosmar Rodrigues. Curso de Direito Processual Penal.12. ed. Salvador: JusPODIVM, 2017.

Referências

Documentos relacionados

didático e resolva as ​listas de exercícios (disponíveis no ​Classroom​) referentes às obras de Carlos Drummond de Andrade, João Guimarães Rosa, Machado de Assis,

• Finalizando, conclui-se que o modelo desenvolvido no presente estudo permitiu caracterizar e distinguir as empresas prestadoras de serviço florestal, pois a definição

No município de Santa Maria todos os imóveis prediais cujo valor venal for inferior a 10.000 UFM dez mil Unidades Fiscais do Município serão isentos do pagamento do Imposto

Assim, dada a riqueza temática identificada na discussão sobre a relação entre as disciplinas de Estudos da Tradução e Literatura Comparada, a qual pode ser desdobrada

Considerando um conjunto de 21 tipos de rochas utilizadas como revestimento e subdivididas em quatro conjuntos por afinidade da composição mineral (rochas carbonáticas,

O clima é um dos fenômenos decisivos no controle da dinâmica natural terrestre, pois influencia em intensidades distintas o ciclo hidrológico, as estratégias reprodutivas e as

Sujeito histórico e de direitos que, nas interações, relações e práticas cotidianas que vivencia, constrói sua identidade pessoal e coletiva, brinca, imagina, fantasia,

Benlanson (2008) avaliou diferentes bioestimulantes, (produtos à base de hormônios, micronutrientes, aminoácidos e vitaminas), confirmando possuir capacidade