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A revisibilidade das decisões dos Tribunais de Contas

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UNIVERSIDADE FEDERAL DE SANTA CATARINA CENTRO DE CIÊNCIAS JURÍDICAS

DEPARTAMENTO DE DIREITO CURSO DE GRADUAÇÃO EM DIREITO

CRYSTHIANE MELINA ALVES

A REVISIBILIDADE DAS DECISÕES DOS TRIBUNAIS DE CONTAS

FLORIANÓPOLIS 2012

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CRYSTHIANE MELINA ALVES

A REVISIBILIDADE DAS DECISÕES DOS TRIBUNAIS DE CONTAS

Trabalho de Conclusão submetido ao Curso de Graduação em Direito da Universidade Federal de Santa Catarina, como requisito final à obtenção do título de Bacharel em Direito.

Orientador: Dr. Luis Carlos Cancellier de Olivo

FLORIANÓPOLIS 2012

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UNIVERSIDADE FEDERAL DE SANTA CATARINA CENTRO DE CIÊNCIAS JURÍDICAS

COLEGIADO DO CURSO DE GRADUAÇÃO EM DIREITO

TERMO DE APROVAÇÃO

A presente monografia intitulada “A revisibilidade das decisões dos Tribunais de Contas”, elaborada pela acadêmica Crysthiane Melina Alves, defendida em 03/07/2012, e aprovada pela Banca Examinadora composta pelos membros abaixo assinados, obteve aprovação com nota ____ (_____________), sendo julgada adequada para o cumprimento do requisito legal previsto no artigo 9. da Portaria n. 1886/94/MEC, regulamentado pela Universidade Federal de Santa Catarina, através da Resolução n. 003/95/CEPE.

Florianópolis, 03 de julho de 2012.

________________________________________________ Luis Carlos Cancellier de Olivo

Professor Orientador

________________________________________________ Anna Carolina Faraco

Membro de Banca

________________________________________________ Gustavo Henrique Carvalho Schiefler

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RESUMO

A presente pesquisa visa a apresentar conceitos fundamentais para a compreensão da problemática principal, que tange à possibilidade de revisão das decisões proferidas pelos Tribunais de Contas por parte do Poder Judiciário. Para tanto, foram expostos a temática da separação dos três poderes e sua evolução durante o transcorrer da história, bem como os pontos relevantes atinentes à Administração Pública, quais sejam seus princípios e as formas de controle. Em seguida, procedeu-se à análise dos Tribunais de Contas no Brasil, no que respeita a seu histórico, a sua natureza jurídica, a sua composição e organização, além de esmiuçar suas competências constitucionais mais proeminentes. Foram apresentados ainda os sistemas de jurisdição, com o fito de embasar a análise das três correntes que se delinearam em torno da controvérsia central da pesquisa. Com o mesmo intuito, procedeu-se ao estudo da natureza jurídica das decisões dos Tribunais de Contas, bem como da sua eficácia como título executivo extrajudicial. Por fim, foram apresentadas as visões e entendimentos das três correntes doutrinárias perfilhadas acerca da revisibilidade das decisões dos Tribunais de Contas.

Palavras-chave: Tribunais de Contas, controle externo, Administração Pública,

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO ... 7

1 ASPECTOS CONSTITUCIONAIS ... 9

1.1 A separação dos três poderes ... 9

1.2 A Administração Pública ... 13

1.2.1 Breve análise dos princípios da Administração Pública ... 15

1.3 Controle da Administração Pública ... 20

1.3.1 O controle administrativo ... 23 1.3.2 O controle jurisdicional ... 25 1.3.3 O controle legislativo ... 27 2 OS TRIBUNAIS DE CONTAS ... 29 2.1 Histórico ... 30 2.2 Natureza jurídica ... 33 2.3 Composição e organização ... 36 2.4 Competências ... 37

2.4.1 Parecer prévio sobre as contas do Presidente ... 39

2.4.2 Julgamento das contas dos administradores públicos ... 41

2.4.3 Registro dos atos de admissão e concessão de aposentadoria ... 44

2.4.4 Inspeções e auditorias ... 45

2.4.5 Sustação da execução de ato impugnado ... 47

2.5 Tribunais de Contas nos Estados e Municípios ... 47

3 A REVISIBILIDADE DAS DECISÕES DOS TRIBUNAIS DE CONTAS ... 50

3.1 Jurisdição e sistemas jurisdicionais ... 50

3.1.1 O sistema do Contencioso Administrativo ... 51

3.1.2 O sistema da Jurisdição Una ... 53

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3.3 A eficácia das decisões dos Tribunais de Contas ... 60

3.4 Atuação jurisdicional sobre as decisões dos Tribunais de Contas ... 61

3.4.1 Impossibilidade de revisão ... 61

3.4.2 Revisibilidade adstrita aos casos de ilegalidade ... 63

3.4.3 Revisibilidade ilimitada ... 64

3.5 A coisa julgada administrativa ... 66

CONCLUSÃO ... 69

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INTRODUÇÃO

O Estado brasileiro apresenta uma estrutura de controle da Administração Pública arranjada de forma complexa. Controle, consoante explica Cicco Filho (2007), exige, assim como o regime democrático, um grau de desenvolvimento da sociedade e dos agentes da Administração para alcançar seu escopo, evoluindo de modo permanente, como num ciclo de realimentação constante: democracia – controle – democracia.

A Constituição institui, em seu art. 70, que cada Poder deve criar órgão próprio de controle interno. No que respeita ao controle externo, este fica a cargo Poder Legislativo, que o exerce com a assistência dos Tribunais de Contas – que foram institucionalizados na Constituição de 1891.

Desta forma, os Tribunais de Contas se alocam na estrutura do Estado brasileiro como órgãos de auxílio ao Poder Legislativo no controle externo da Administração Pública. A Constituição Federal dispõe acerca dos Tribunais de Contas no capítulo reservado ao Poder Legislativo, na seção destinada à fiscalização contábil, financeira e orçamentária (do artigo 70 ao artigo 75).

As contas governamentais e o controle da gestão pública constituem matéria sempre atual, recorrente nos debates modernos acerca das formas de fiscalizar o tratamento que órgãos públicos dão aos ativos financeiros. Ademais, recursiva também é a efetivação dos direitos fundamentais nos julgados, quer judiciais, quer administrativos. A pesquisa, ao elucidar questões atinentes à revisibilidade das decisões dos Tribunais de Contas, dará conta de aclarar questões cotidianas, como a possibilidade de “efetivação da justiça” no julgamento das contas públicas, bem como a possibilidade de que se adentre o âmbito jurisdicional.

O estudo, permeando tópicos fundamentais como a composição das Cortes de Contas, suas competências, organização, histórico e composição, tem o escopo de analisar se as decisões dos Tribunais de Contas são passíveis de revisão pelo Poder

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Judiciário. Para tanto, debate-se acerca da natureza de tais decisões – se jurisdicionais ou administrativas. Por fim, apresentam-se as três correntes que se perfilham em relação à controvérsia: a primeira, que veda qualquer possibilidade de revisão, uma outra que admite a revisão apenas nos casos de ilegalidade no julgamento das contas, e a terceira, que defende a revisibilidade plena das decisões dos Tribunais de Contas por parte do Poder Judiciário.

A pesquisa tem o fim de estabelecer uma conclusão teórico-científica atinente à discussão acerca da revisibilidade das decisões dos Tribunais de Contas, dando especial relevo à corrente que inadmite a revisão, bem como às correntes que, malgrado admitirem a revisibilidade pelo Poder Judiciário de tais decisões, não convergem quanto à possibilidade de limitação do exercício jurisdicional.

A pesquisa será desenvolvida empregando-se o método dedutivo. A pesquisa se caracterizará como exploratória, a fim de proporcionar um maior aprofundamento no tema e fornecer base conceitual de modo a assegurar que o estudo não seja maculado por compreensões inadequadas acerca da matéria que examina.

Quanto ao procedimento técnico utilizado nesta etapa, a pesquisa exploratória assumirá a forma de pesquisa bibliográfica, método que se apresenta mais compatível com os objetivos aqui propostos e mais viável em virtude de sua ampla cobertura.

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1 ASPECTOS CONSTITUCIONAIS

A separação dos poderes estatais é um mecanismo clássico de organização e limitação do poder político, e consiste em impedir que todas as funções sejam concentradas em uma única estrutura organizacional, produzindo um sistema que permite que o poder controle o próprio poder. (JUSTEN FILHO, 2009).

Historicamente, a separação dos poderes se mostrou como a forma mais estável de limitação da atuação do estado. Nos dias de hoje, os mecanismos de controle da Administração Pública surgem como uma nova conformação de controle da atuação estatal, que visa a proteger os interesses dos indivíduos, dando forma à supremacia do interesse público sobre o privado.

1.1 A separação dos três poderes

O princípio da separação de poderes remonta a Aristóteles e ainda encontra sugestão em John Locke e Rousseau. Os três conceberam uma doutrina de separação de poderes que, posteriormente, em termos diversos, veio a ser definida e divulgada por Montesquieu. (AFONSO DA SILVA, 2008)

De acordo com o que relata Bobbio (1980), Aristóteles, em sua obra A Política, apresentou a teoria clássica das seis formas de governo. Sua teoria era simples e concisa. Para o grego, existem três constituições retas: o reino (o monarca governa para o bem público), a aristocracia (os poucos governam em favor do interesse geral) e a politia (a massa governa visando o benefício público) – na sua obra Ética a Nicômaco, Aristóteles denomina a politia de timocracia. Para estas formas, existem as três constituições degeneradas de cada uma, que, respectivamente, são: a tirania (o monarca governa em favor de si), a oligarquia (visa o interesse dos ricos) e a democracia (visa o interesse dos pobres).

O critério para a hierarquia aristotélica das formas de governo é que a forma pior é a degeneração da forma melhor, de modo que as degenerações são cada vez menos

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graves. Desse modo, a ordem fica assim estabelecida: reino, aristocracia, politia, democracia, oligarquia, tirania. As formas boas são aquelas em que os governantes visam o interesse comum, e as más, aquelas em que os governantes visam o interesse próprio. Esta é a razão pela qual os indivíduos se organizam em cidades, para viver bem, visando o interesse comum.

A idéia da separação dos três poderes tem sua origem no conceito aristotélico de constituição mista, uma vez que somente a fusão entre a forma oligárquica e a forma democrática seria capaz de proporcionar estabilidade a um governo. A combinação entre a oligarquia e a democracia exprime o meio-termo das formas de governo. Bobbio (1980) cita o próprio Aristóteles:

Se é exata a definição da ética segundo a qual a vida feliz é aquela que se desenvolve de acordo com a virtude e sem impedimento, e se a virtude está no meio-termo, a vida mediana é necessariamente a melhor, desde que se trate dessa mediania que é acessível a todos. (p. 53)

Sob uma visão mais moderna e semelhante a que temos hoje, Locke ordenou os poderes em executivo e legislativo. Bobbio (1997) ensina que: “diz-se habitualmente que o Estado tem três poderes: Legislativo, Judiciário e Executivo. Todavia, para Locke, considerado muitas vezes, erroneamente, como o pai da teoria dos três poderes, os poderes são apenas dois”.

O ponto de partida do pensamento político de Locke é sua concepção de estado de natureza e de lei natural, esboçados no Segundo Tratado sobre o Governo Civil, datado de 1690. Locke entende o poder político como oriundo dos dois poderes pertencentes ao homem no seu estado natural e não como poder originário. Desta forma, embora faça alusão a três poderes (legislativo, executivo e federativo), Locke classifica-os essencialmente em dois: o legislativo e o executivo. No que respeita ao poder judiciário, este não toma forma de poder autônomo, não se distingue claramente e parece estar contido no poder executivo, o qual se ocupa da integral administração das leis. (GOUGH, 1992 apud ALBUQUERQUE, 2001)

Martins da Costa (2000) ressalta que, para Locke, o poder legislativo é supremo. Dele derivam os demais poderes e a ele são subordinados. Em relação ao poder

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executivo, este encontra sua competência na aplicação das leis. Locke ainda concebe o poder federativo, que é distinto e não pode ser dissociado do poder executivo. Cabe ao poder federativo a administração do relacionamento da comunidade com as comunidades estrangeiras, além da formação de alianças e decisões sobre a guerra e a paz.

Com uma concepção antiabsolutista do poder, explica Albuquerque (2001), o núcleo da filosofia política lockeana está no enfraquecimento da soberania absoluta do monarca (summa potestas). Desse modo, o poder do rei, que outrora reunia as três funções estatais, agora é restrito tão-somente ao poder executivo. Assim, o poder de elaborar leis e o poder de executá-las se encontram em mãos distintas, não havendo mais lugar para um poder monocrático.

Fica evidente a intenção de impedir a arbitrariedade no exercício do poder, respaldada por toda a experiência histórica. Nas palavras de Locke (1994),

pode ser muito grande para a fragilidade humana a tentação de ascender ao poder, não convém que as mesmas pessoas que detêm o poder de legislar tenham também em suas mãos o poder de executar as leis, pois elas poderiam se isentar da obediência às leis que fizeram, e adequar a lei a sua vontade. (p. 170)

É, todavia, Montesquieu o responsável pela inserção do poder de julgar dentre os poderes fundamentais do Estado, delineando os contornos da acepção mais difundida da separação dos poderes. (MALDONADO, 2003)

Quando, na mesma pessoa ou no mesmo corpo de Magistratura, o poder legislativo é reunido ao executivo, não há liberdade. Porque pode temer-se que o mesmo monarca ou mesmo o senado faça leis tirânicas para executá-las tiranicamente. Também não haverá liberdade se o poder de julgar não estiver separado do legislativo e do executivo. Se estivesse junto com o legislativo, o poder sobre a vida e a liberdade dos cidadãos seria arbitrário: pois o juiz seria o legislador. Se estivesse junto com o executivo, o juiz poderia ter a força de um opressor. Estaria tudo perdido se um mesmo homem, ou um mesmo corpo de principais ou nobres, ou do povo, exercesse estes três poderes: o de fazer as leis; o de executar as resoluções públicas; e o de julgar os crimes ou as demandas dos particulares. (MONTESQUIEU, 2000, p. 167-168)

Já sob a influência do Liberalismo, Montesquieu propôs a separação dos três poderes como forma de limitar a atuação do Estado, de maneira que a estrutura estatal

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funcionasse para que o poder fosse um freio ao poder, limitando-se o poder pelo próprio poder (CLARAMUNT, 2009). Além da proteção da liberdade individual, a separação dos três poderes majorava a eficiência do Estado, uma vez que cada órgão do governo se especializaria em determinada função. Dando amparo à liberdade individual e desenvolvendo a eficiência do Estado, a teoria de Montesquieu atenuava cristalinamente o absolutismo dos governos.

Conforme preleciona Afonso da Silva (2008), a separação dos três poderes teve positivação nas Constituições das ex-colônias inglesas na América, concretizando-se em definitivo na Constituição dos Estados Unidos de 1787. Com a revolução francesa, a tripartição tornou-se um dogma constitucional, a ponto de o artigo 16 da Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão de 1789 enunciar que “toda sociedade na qual a garantia dos direitos não está assegurada, nem a separação de poderes estabelecida, não tem constituição.”

Atualmente, no direito pátrio, o princípio da divisão de poderes é um dos princípios fundamentais que a Constituição Federal inscreve. Consta de seu artigo 2º que são poderes da União, independentes e harmônicos entre si, o Legislativo, o Executivo e o Judiciário. Tal separação encerra, em verdade, um desdobramento das funções do poder estatal (ou poder político) – que é uno, indivisível e indelegável. (AFONSO DA SILVA, 2008)

Hoje o princípio não figura mais aquela rigidez de outrora. A ampliação das atividades do Estado contemporâneo impôs nova visão da teoria da separação de poderes e novas formas de relacionamento entre os órgãos legislativo e executivo e destes com o judiciário, tanto que atualmente se prefere falar em colaboração de poderes, que é característica do parlamentarismo, em que o governo depende da confiança do Parlamento (Câmara dos Deputados), enquanto, no presidencialismo, desenvolveram-se as técnicas da independência orgânica e harmonia dos poderes. (AFONSO DA SILVA, 2008, p. 109)

Moraes (2010) corrobora esta idéia. Segundo o autor, o Direito Constitucional contemporâneo, embora permaneça na tradicional linha da tripartição de poderes, já entende que esta fórmula, se interpretada com rigidez, torna-se imprópria para um Estado que assumiu a missão de fornecer bem-estar a seu povo, devendo, assim, destacar as funções estatais, dentro de um mecanismo de controles recíprocos,

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chamado de "freios e contrapesos" (checks and balances). Aos três poderes do Estado, a Constituição Federal confiou parcela da autoridade soberana do Estado, garantindo-lhes autonomia e independência.

Em relação à independência e harmonia dos três poderes, características preceituadas na Carta Magna, Francisco Neto (2003) explica que o poder de soberania, intrinsecamente, é uno e individual. Ele se manifesta através dos três órgãos estatais formalmente separados, que encerram três manifestações distintas do poder soberano. Dessa forma, os três poderes não podem ser independentes no sentido literal da palavra, já que devem ser harmônicos e coordenados entre si. Cada um, na esfera de sua função particular, exerce a totalidade do poder, compondo uma unidade. Um poder, isoladamente, sem a correção e a integração dos dois outros, não conseguiria expressar o poder soberano. Por isso mesmo, a divisão formal e funcional do poder estatal repele o sentido literal de independência. Os três poderes apenas são independentes no sentido de que se organizam e se subordinam mutuamente com a precípua finalidade de compor os atos de manifestação da soberania nacional, realizando o ideal de contenção do poder pelo poder.

As interferências de um poder no outro buscam estabelecer o equilíbrio necessário à realização do bem da coletividade, de forma que são indispensáveis para evitar o arbítrio e o desmando de um em detrimento do outro e especialmente dos governados. A harmonia entre os poderes não significa nem o domínio de um pelo outro nem a usurpação de atribuições, mas a constatação de que, entre eles, há de haver consciente cooperação e controle mútuo para evitar distorções e desmandos (AFONSO DA SILVA, 2008). A separação dos três poderes se mostrou, historicamente, a mais estável forma de limitação do poder político.

1.2 A Administração Pública

A formulação tradicional da separação dos poderes conferiu a atividade administrativa a um conjunto de órgãos inseridos no Poder Executivo. A Administração

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Pública integra o contexto geral do sistema político de um Estado, refletindo as peculiaridades e distorções desse sistema. A relevância da Administração se evidencia pelo tratamento vasto que atualmente recebe nas Constituições, inclusive a brasileira. Evidencia-se, ainda, pela busca constante de sua modernização, para que tenha eficiência, opere sem corrupção, não desperdice recursos públicos e respeite o indivíduo, tendo-o como cidadão, portador de direitos, não como súdito que recebe favor. (MEDAUAR, 1998)

Afonso da Silva (2008) ensina que a Administração Pública é o conjunto de meios institucionais, materiais, financeiros e humanos preordenados à execução das decisões políticas. Tal definição evidencia que, antes de tudo, a Administração Pública é subordinada ao poder político e assim sendo, configura um meio e, portanto, algo de que se serve para atingir fins definidos – um conjunto de órgãos a serviço do poder político.

Já nas palavras de Hely Lopes Meirelles, Administração Pública, “em sentido formal, é o conjunto de órgãos instituído para a consecução dos objetivos do governo.” (2010, p. 65). O autor explica ainda que, em sentido material, a Administração é o conjunto das funções necessárias aos serviços públicos em geral; em sentido operacional, é a atuação duradoura e sistemática, legal e técnica, dos serviços próprios do Estado ou por ele assumidos em prol da coletividade.

A Constituição pátria fornece bases à atuação da Administração, traçando as diretrizes de um modelo de Administração, conforme leciona Odete Medauar (2008). Para tanto, o caput do artigo 37 elenca alguns dos seus princípios, estabelece um rol de preceitos sobre direitos e deveres dos servidores públicos, além de delinear a competência administrativa fundamental da União, dos Estados e dos Municípios ao dividi-la entre estes três entes. A autora ainda ressalta que “a atuação rotineira da Administração é um dos elementos reveladores da efetividade das normas constitucionais na vida da coletividade” (p. 49).

O caput do artigo 37 da Constituição Federal reportou de maneira expressa à Administração Pública apenas cinco princípios, quais sejam a legalidade, a

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impessoalidade, a moralidade, a publicidade e a eficiência – este último acrescentado pela Emenda Constitucional 19/98. Entretanto, inúmeros outros merecem consagração constitucional, seja pelo fato de constarem expressamente da Carta Magna, embora não condensados no caput do artigo 37, outros por estarem logicamente nele abrigados, como consequência incontestável dos aludidos princípios, outros, por fim, por se tratarem de implicações diretas do próprio Estado de Direito. (CELSO ANTÔNIO BANDEIRA DE MELLO, 2010)

Já para Hely Lopes Meirelles (2010), os princípios básicos da Administração estão consubstanciados em doze regras de observância constante e forçosa para o bom administrador. Em seu ensinamento, o autor elenca a legalidade, a moralidade, a impessoalidade ou finalidade, a publicidade, a eficiência, a razoabilidade, a proporcionalidade, a ampla defesa, o contraditório, a segurança jurídica, a motivação e a supremacia do interesse público, sendo que os cinco primeiros estão contidos de forma expressa na Lei Maior. O autor esclarece que os demais princípios foram textualmente enumerados no artigo 2° da Lei 9.784/99, que estabelece as normas do processo administrativo, dando relevo ao fato de que, embora se trate de lei federal, possui verdadeiro conteúdo de normas gerais da atividade administrativa não só da União, mas também dos Estados e Municípios.

A respeito dos princípios da Administração pública, o autor ainda salienta:

(...) por esses padrões é que deverão se pautar todos os atos e atividades administrativas de todo aquele que exerce o poder público. Constituem, por assim dizer, os fundamentos da ação administrativa, ou, por outras palavras, os sustentáculos da atividade pública. Relegá-los é desvirtuar a gestão dos negócios públicos e olvidar o que há de mais elementar para a boa guarda e zelo dos interesses sociais. (HELY LOPES MEIRELLES, 2010, p. 88)

1.2.1 Breve análise dos princípios da Administração Pública

Acerca da supremacia do interesse público, Celso Antônio Bandeira de Mello (2010) esclarece que a superposição do interesse público sobre o privado é o princípio geral de Direito inerente a qualquer sociedade, é um pressuposto lógico do convívio

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social. A Administração é a expressão desta supremacia, por representar o interesse público. Assim, não obstante não se radicar em um artigo específico da constituição, inúmeros dispositivos implicam manifestações concretas deste princípio.

Di Pietro (2009) explana que em nome do primado do interesse público, ocorreram diversas transformações, a exemplo da ampliação das atividades assumidas pelo Estado para atender às necessidades coletivas. Brotaram, no plano constitucional, novos preceitos que demonstram a interferência crescente do Estado na vida econômica e no direito de propriedade. Assim são as normas que admitem a intervenção do Poder Público no funcionamento de empresas, as que condicionam o uso da propriedade ao bem-estar social e as que reservam para o Estado a propriedade e a exploração de certos bens. Isso ocorre em nome do interesse público, cuja tutela é incumbência do Estado.

Já no que respeita ao princípio da legalidade, Hely Lopes Meirelles (2010) destaca que o administrador público está, em toda a sua atividade funcional, sujeito aos mandamentos da lei e às exigências do bem comum, e deles não se pode afastar ou desviar.

Medauar (1998) dá relevo a outro aspecto do referido princípio, esclarecendo que, na sua concepção originária, a legalidade vinculou-se à separação de poderes e ao conjunto de idéias que historicamente traduziram oposição às práticas do período absolutista. Por meio da submissão da Administração à lei, o poder tornava-se objetivado, de forma que obedecer à Administração era o mesmo que obedecer à lei, não à vontade instável do soberano. Daí um sentido de garantia, certeza jurídica e limitação do poder inserido nessa acepção do princípio da legalidade administrativa.

Nessa senda, Di Pietro (2009) leciona que o princípio da legalidade - em conjunto com o princípio de controle da Administração pelo Poder Judiciário - nasceu com o Estado de Direito e compõe uma das principais garantias de respeito aos direitos individuais. Assim é porque a lei, ao passo em que define tais direitos, também estabelece os limites da atuação administrativa que tenha por fim restringi-los em benefício da coletividade.

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Em síntese, Hely Lopes Meirelles (2010) ensina:

Na Administração Pública não há liberdade nem vontade pessoal. Enquanto na administração particular é lícito fazer tudo que a lei não proíbe, na Administração pública só é permitido fazer o que a lei autoriza. A lei para o particular significa “pode fazer assim”; para o administrador público significa “deve fazer assim”. (p. 89)

No que tange ao princípio da impessoalidade, Elias Rosa (2010) elucida que o princípio agasalha três abordagens distintas: a) a atuação impessoal genérica, relativa à finalidade da Administração, que visa à satisfação do interesse coletivo; b) a imputação da atuação do órgão ou entidade estatal, não o sendo quanto ao agente público, pessoa física; e c) a isonomia, eis que obrigatório o tratamento igualitário de todos os administrados.

Hely Lopes de Meirelles (2010) acentua o princípio da impessoalidade na sua acepção de finalidade da atuação administrativa. O autor esclarece que a finalidade “terá sempre um objetivo certo e inafastável de qualquer ato administrativo: o interesse público. Todo ato que se apartar desse objetivo sujeitar-se-á a invalidação por desvio de finalidade (...).” (p. 93)

Mais adiante complementa:

Desde que o princípio da finalidade exige que o ato seja praticado sempre com finalidade pública, o administrador fica impedido de buscar outro objetivo ou de praticá-lo no interesse próprio ou de terceiros. Pode, entretanto, o interesse público coincidir com o de particulares, como ocorre normalmente nos atos administrativos negociais e nos contratos públicos, casos em que é lícito conjugar a pretensão do particular com o interesse coletivo. (HELY LOPES MEIRELLES, 2010, p. 93-94)

Já Afonso da Silva (2008) corrobora a idéia de impessoalidade como imputação dos atos ao órgão estatal. Segundo ensina,

os atos e provimentos administrativos são imputáveis não ao funcionário que os pratica mas ao órgão ou entidade administrativa em nome do qual age o funcionário. Este é um mero agente da Administração pública, de sorte que não é ele o autor institucional do ato. (p.667)

Ainda a respeito do princípio da impessoalidade, Celso Antônio Bandeira de Mello (2010) salienta o seu aspecto da isonomia, destacando que a Administração deve

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tratar todos os administrados sem discriminações, sejam elas benéficas ou detrimentosas. Não são toleráveis favoritismos ou perseguições, sendo que animosidades, simpatias e interesses sectários não podem interferir na atuação administrativa.

Já quanto ao princípio da moralidade, Medauar (1998) destaca que ele é de difícil expressão verbal, razão pela qual a doutrina busca atrelá-lo a termos que propiciem seu entendimento e aplicação.

Manoel de Oliveira Franco Sobrinho, em obra específica sobre o tema - “O Controle da Moralidade Administrativa” - considerou que:

a ordem jurídica não justifica no excesso, no desvio, no arbítrio, motivações outras que não encontram garantia no interesse geral, público e necessário; (...) o que se quer defender é a lisura ou a exação nas práticas administrativas, a presunção de fim legal equivale à presunção de moralidade. (MANOEL DE OLIVEIRA FRANCO SOBRINHO, 1974 apud MEDAUAR, 1998, p. 137)

Ao passo que o citado autor ligou a moralidade administrativa ao conceito de lisura e exação, Hely Lopes Meirelles (2010) conecta a moralidade ao conceito de “bom administrador” (p. 92), sugerindo que a moralidade do ato administrativo em conjunto com sua finalidade e legalidade “constituem pressupostos de validade sem os quais toda atividade pública será ilegítima.” (p.91)

No que toca ao princípio da publicidade, Di Pietro (2009) o conceitua como a exigência de “ampla divulgação dos atos praticados pela Administração Pública, ressalvadas as hipóteses de sigilo previstas em lei.” (p. 71)

O dever de levar o conhecimento do ato ou da atividade administrativa a terceiros, com o intuito de facilitar o controle e conferir possibilidade de execução constitui um dos vetores da Administração. A publicidade está intimamente relacionada ao controle da Administração, vez que, a par de seus atos, pode o particular cogitar impugná-los. Assim, a publicidade é imprescindível como meio conferidor de eficácia da atividade administrativa, mas se aceita a manutenção do sigilo quando expressamente

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autorizar a Constituição ou quando ocorrer possível prejuízo para a coletividade ou para outrem. (ELIAS ROSA, 2010)

A publicidade não é elemento formativo do ato. Trata-se de requisito de eficácia e moralidade. Por tal motivo, os atos irregulares não se convalidam com a publicação, tampouco os regulares a dispensam para sua exequibilidade, quando a lei ou o regulamento a exige. (HELY LOPES MEIRELES, 2010)

Nas palavras de Celso Antônio Bandeira de Mello (2010):

Consagra-se nisto o dever administrativo de manter plena transparência em seus comportamentos. Não pode haver em um Estado Democrático de Direito, no qual o poder reside no povo (art. 1º, parágrafo único, da Constituição), ocultando aos administrados dos assuntos que a todos interessam, e muito menos em relação aos sujeitos individualmente afetados por alguma medida. (...)

Na esfera administrativa o sigilo só se admite, a teor do art. 5º, XXXIII, precitado, quando “imprescindível à segurança da Sociedade e do Estado”. (p. 114-115)

Passando à análise do princípio da eficiência, José Afonso da Silva (2008) salienta que eficiência não é um conceito jurídico, mas sim econômico, que traduz uma idéia de fazer acontecer com racionalidade. Isso implica medir os custos que a satisfação das necessidades públicas importam em relação ao grau de utilidade alcançado. Destarte, o princípio da eficiência, que foi inserido posteriormente no caput do artigo 37 da Lei Maior, pela Emenda Constitucional 19/98, orienta a atividade administrativa no sentido de conseguir os melhores resultados com os meios escassos de que se dispõe e a menor custo. Rege-se, assim, pela regra da consecução do maior benefício com o menor custo possível, tendo como conteúdo a relação “meios x resultados”.

Não destoa o pensamento de Di Pietro (2009), que destaca:

O princípio da eficiência apresenta, na realidade, dois aspectos: pode ser considerado em relação ao modo de atuação do agente público, do qual se espera o melhor desempenho possível de suas atribuições, para lograr os melhores resultados; e em relação ao modo de organizar, estruturar, disciplinar a Administração Pública, também com o mesmo objetivo de alcançar os melhores resultados na prestação do serviço público. (p. 82)

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Já para Celso Antônio Bandeira de Mello (2010), o princípio da eficiência não parece ser mais que uma faceta de um princípio mais amplo, há muito tratado no Direito italiano: o princípio da boa administração. Tal princípio exprime o desenvolvimento da atividade administrativa do modo mais congruente, mais oportuno e mais adequado aos fins a serem alcançados, importando, para tanto, a escolha e o emprego dos meios concebidos como os mais idôneos. O autor, por fim, ressalta: “nas hipóteses em que há discrição administrativa, a norma só quer a solução excelente.” (p. 123)

1.3 Controle da Administração Pública

“Controle, em tema de administração pública, é a faculdade de vigilância, orientação e correção que um Poder, órgão ou autoridade exerce sobre a conduta funcional do outro.” (HELY LOPES MEIRELLES, 2010, p. 697)

A finalidade do controle, explica Di Pietro (2009), é a de assegurar que a Administração atue em consonância com os princípios que lhe são impostos pelo ordenamento jurídico. Em determinadas circunstâncias, abrange ainda o controle denominado de mérito e que tange aos aspectos discricionários da atuação da Administração.

Com o advento do Estado Democrático de Direito, os bens e receitas do Estado deixaram de ser compreendidos como propriedade da autoridade soberana, passando a vigorar a idéia de propriedade da coletividade, com o precípuo fim seria atender suas necessidades. Dessa forma, o controle assumiu um papel relevante na Administração, impondo limites à atuação do governo e orientando a melhor utilização dos recursos disponíveis de forma organizada e ponderada. (BRAGA, 2008)

Consoante Medauar (1998), a Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, de 1789, já continha, no artigo 15, o preceito segundo o qual “A sociedade tem o direito de pedir conta a todo agente público quanto a sua administração.” A autora ainda lembra que Bobbio, em sua obra “O futuro da democracia”, vincula a possibilidade de

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controle – que ele chama de controlabilidade – com a democracia, e a incontrolabilidade com o arbítrio.

Segundo a referida autora, o tema do controle também se relaciona com a questão da visibilidade ou transparência no exercício do poder estatal. Logo, os mecanismos de controle inseridos no processo de poder apresentam inquestionável relevância, lembrando a afirmação de Montesquieu: “É necessário que, pela natureza das coisas, o poder de tenha o poder.” (Montesquieu apud MEDAUAR, 1998, p. 396)

Em relação aos tipos de controle, Silva (2002) afirma que o critério de classificação mais geral baseia-se na identificação do órgão que exerce tal controle. Assim, o controle pode ser administrativo, se realizado pela própria Administração, por iniciativa própria ou provocação; legislativo ou parlamentar, se exercido pelo Poder Legislativo; e, por fim, jurisdicional ou judiciário, se realizado pelo Poder Judiciário, para a correção dos atos ilegais quando lesivos de direito individual ou do patrimônio público.

Esse controle, de acordo com a localização do órgão que o realiza, pode ser ainda interno ou externo. O controle interno, conforme explana Hely Lopes Meirelles (2010), é aquele realizado pela entidade responsável pela atividade controlada, no âmbito da própria Administração. O autor ressalta ainda que a Constituição determina, em seu artigo 74, que os três Poderes mantenham sistema de controle interno de forma integrada.

Di Pietro (2009) discorre:

O artigo 74 da constituição inova de várias maneiras: primeiro, ao deixar claro que cada um dos Poderes terá um sistema de controle interno; segundo, ao prever que esse sistema se exercerá de forma integrada entre os três Poderes; terceiro, ao estabelecer a responsabilidade solidária dos responsáveis pelo controle quando, ao tomarem conhecimento de irregularidade, deixarem de dar ciência ao Tribunal de Contas (§ 1º) (...). (p. 726)

Afonso da Silva (2008) destaca que o controle interno é de controle de natureza administrativa, exercido dentro das estruturas administrativas de qualquer dos Poderes, de maneira que não mais um controle apenas do Poder Executivo, como ditavam as Constituições passadas. Isso porque, se a Constituição dilata a autonomia

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administrativa dos outros poderes, é lógico que também exija, de cada um deles, o exercício do controle interno, que tem como uma de suas finalidades apoiar o controle externo na sua missão institucional.

A função de controle da Administração sobre si própria é inerente à atividade administrativa. O controle interno visa ao cumprimento do princípio da legalidade, à observância dos preceitos da “boa administração”, a instigar a ação dos órgãos, a constatar a conveniência e a oportunidade das medidas e decisões no atendimento do interesse público (controle de mérito) e a apurar o custo-benefício na prática das atividades. (MEDAUAR, 1998)

Já em relação ao controle externo, Bacellar Filho assinala que:

Desde o advento do Estado Social e Democrático de Direito, constatou-se a necessidade do estabelecimento de mecanismos de controle que possam ser exercidos por agentes que estejam fora da estrutura administrativa e que sejam, por assim dizer, totalmente desvinculados e imparciais em relação à atividade que será objeto do controle. (BACELLAR FILHO apud CASTRO, 2007, p. 118).

O controle externo da Administração compreende: a) o controle parlamentar direto; b) o controle exercido pelo Tribunal de Contas; e c) o controle jurisdicional. (CELSO ANTÔNIO BANDEIRA DE MELLO, 2010)

Nesse rol, Castro (2007) inclui ainda o controle social: “O controle externo da Administração Pública, em suma, é aquele exercido pelo Poder Legislativo com apoio dos Tribunais de Contas, pelo Poder Judiciário e pela sociedade através do controle social.” (p. 118)

O controle social no Brasil tem seu grande marco instituído pela Constituição Federal de 1988, que se pautou pelos princípios da descentralização e da participação popular, criando instrumentos para que a sociedade possa exercer o seu papel, participando e controlando as ações do Estado na busca do bem comum e do interesse público. Um amplo arcabouço de normas legais e infra-legais, voltado para a implementação de mecanismos de democracia participativa, vem sendo produzido desde então. Todavia, diversas dificuldades têm sido encontradas, com o passar dos

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anos, na utilização desses mecanismos, evidenciando uma lacuna entre o controle social idealizado pelo ordenamento jurídico e o controle efetivamente praticado pela sociedade. (CARVALHO BREDER, 2006)

Tratando ainda das espécies de controle da Administração, quanto à sua extensão, o controle pode ser de legalidade ou de mérito. Para Hely Lopes Meirelles (2010), o controle de legalidade tem o escopo de verificar unicamente a conformação do ato ou do procedimento administrativo com as normas legais que o regem, podendo ser exercido tanto pela Administração, quanto pelo Legislativo ou pelo Judiciário. O Executivo exercita-o de ofício e mediante provocação recursal ou representação administrativa, enquanto o Legislativo só o efetiva nos casos expressos na Constituição, e o Judiciário através da ação adequada. Por este controle, impõe-se que o ato ilegal ou ilegítimo deve ser anulado. No que tange ao controle de mérito, o autor explica que esse visa à comprovação da eficiência, do resultado, da conveniência ou oportunidade do ato controlado. Dessa forma, tal controle compete normalmente à Administração, e, em situações excepcionais, previstas na Constituição, ao Legislativo (art. 49, IX e X, CF), mas jamais ao Judiciário.

Em síntese, Elias Rosa (2010) esclarece que o controle em razão da legalidade é exercido pela própria Administração ou pelo Judiciário, impondo-se, na eventual ilegalidade, a anulação do ato administrativo. Quando ao mérito, contudo, tão-somente a Administração o exercitará, julgando a oportunidade e conveniência da manutenção ou revogação do ato já editado.

1.3.1 O controle administrativo

Controle administrativo “é o poder de fiscalização e correção que a Administração Pública (em sentido amplo) exerce sobre sua própria atuação, sob os aspectos de legalidade e mérito, por iniciativa própria ou mediante provocação”. (DI PIETRO, 2009, p. 726)

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O controle administrativo deriva do poder-dever de autotutela que a Administração tem sobre seus próprios atos e agentes. Por meio dele, a Administração pode anular, revogar ou alterar seus próprios atos, bem como punir seus agentes com as penalidades previstas no estatuto próprio. A Administração só anula o ato ilegal, e revoga ou altera o ato legal mas ineficiente, inoportuno ou inconveniente. (HELY LOPES MEIRELLES, 2010)

Nesta senda, foram editadas pelo Supremo Tribunal Federal, as Súmulas n. 346 e 473. Nos termos da primeira, “a Administração Pública pode declarar a nulidade de seus próprios atos”; e, conforme dita a segunda, “a Administração pode anular seus próprios atos, quando eivados de vícios que os tornem ilegais, porque deles não se originam direitos; ou revogá-los, por motivo de conveniência ou oportunidade, respeitados os direitos adquiridos e ressalvada, em todos os casos, a apreciação judicial.”

O poder de autotutela encontra fundamento nos princípios os quais regem a Administração Pública, notadamente o da legalidade e o da supremacia do interesse público, dos quais emanam os demais. (DI PIETRO, 2009)

A referida autora ainda complementa:

Com efeito, se a Administração está sujeita à observância da lei e à consecução do interesse público, não há porque negar-lhe o controle sobre os próprios atos para assegurar a observância daqueles princípios, mesmo porque, não o fazendo, sujeita-se ao controle pelos demais poderes, aumentando os ônus do Estado na missão suprema de tutela do direito. (DI PIETRO, 2009, p. 727)

O controle é exercido de ofício pela própria Administração ou por provocação. “Os meios de controle administrativo, de um modo geral, bipartem-se em fiscalização hierárquica e recursos administrativos, embora a lei possa especificar outras modalidades mais adequadas para certos órgãos (...).” (HELY LOPES MEIRELLES, 2010, p. 704)

Em resumo, nas palavras de Di Pietro (2009), recursos administrativos “são todos os meios que podem utilizar os administrados para provocar o reexame do ato

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pela Administração Pública.” (p. 727). Medauar (1998) corrobora o ensinamento, assinalando que os recursos administrativos “apresentam-se como um dos modos pelos quais a Administração é provocada a fiscalizar seus próprios atos, visando ao atendimento do interesse público e à preservação da legalidade.” (p. 398)

No tocante à fiscalização hierárquica, Elias Rosa (2010) esclarece que incide internamente, na estrutura escalonada e ordenada da Administração, sendo que pode ser realizada a qualquer tempo, antes ou depois da edição do ato e independentemente de qualquer provocação. Não pressupondo o vínculo de subordinação, existe a supervisão ministerial (no âmbito federal), limitada às hipóteses em que a lei expressamente admite sua realização.

1.3.2 O controle jurisdicional

Medauar (1998) explica que o controle jurisdicional caracteriza-se como controle externo, de regra a posteriori e repressivo, podendo também ser, em algumas vezes preventivo. É desencadeado por provocação e efetuado por juízes. Tal forma de controle se concretiza pelo ajuizamento de ações que observam procedimentos formais, com garantias às partes como o contraditório, a imparcialidade e a ampla defesa. O processo se encerra por sentença, obrigatoriamente motivada e dotada de coisa julgada, impondo-se à Administração o dever de acatá-la.

No Brasil vigora o sistema da jurisdição única, de forma que exclusivamente ao Poder Judiciário incumbe decidir com força definitiva toda contenda sobre a adequada aplicação do Direito a um caso concreto. Destarte, o Poder Judiciário controla, in concreto, a legitimidade dos comportamentos da Administração Pública, anulando suas condutas ilegítimas, compelindo-a aquelas que seriam obrigatórias e condenando-a a indenizar os lesados, quando for o caso. Na dicção do artigo 5º, XXXV, da Constituição Federal, que preconiza o princípio da inafastabilidade do Poder Judiciário, “a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito.” ( CELSO ANTÔNIO BANDEIRA DE MELLO, 2010)

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Vê-se que o Brasil rechaçou o sistema de dualidade de jurisdição “em que, paralelamente ao Poder Judiciário, existem os órgãos do Contencioso Administrativo que exercem, como aquele, função jurisdicional sobre lides de que a Administração Pública seja parte interessada.” (DI PIETRO, 2009, p. 743-744)

Logo, importa estabelecer perante quais situações ocorreu o suficiente para legitimar o administrado a buscar o Poder Judiciário. De acordo com o texto constitucional, quando houver “lesão ou ameaça a direito” – princípio da inafastabilidade do Poder Judiciário. Nesse ponto, convém repisar o princípio da legalidade, haja vista que, generalizadamente, a Administração, além de estar proibida de atuar em desacordo coma lei, somente pode emitir atos em conformidade com lei que a habilite para tanto. (CELSO ANTÔNIO BANDEIRA DE MELLO, 2010)

O princípio da inafastabilidade do Poder Judiciário, previsto no artigo 5º, XXXV, da Constituição Federal,

afirma a regra da unidade da jurisdição. Assegura a proteção judiciária como garantia dos direitos reconhecidos pelo ordenamento e como garantia contra a ameaça de lesão de direitos. A proteção judiciária representa um dos pilares do Estado de Direito, sobretudo como corolário do princípio da legalidade que norteia a atuação dos poderes públicos. (MEDAUAR, 1998, p. 415)

O Poder Judiciário pode examinar os atos da Administração Pública, de qualquer natureza, gerais ou individuais, unilaterais ou bilaterais, vinculados ou discricionários, mas sempre sob o prisma da legalidade. No que tange aos atos discricionários, “sujeitam-se à apreciação judicial, desde que não se invadam os aspectos reservados à apreciação subjetiva da Administração Pública, conhecidos sob a denominação de mérito (oportunidade e conveniência).” (DI PIETRO, 2009, p.744)

Di Pietro (2009) ressalta ainda que para impugnar os atos da Administração, o administrado pode valer-se das ações previstas na legislação ordinária, como possessórias, reivindicatórias e ações de indenização. Entretanto, a Constituição prevê ações específicas de controle da Administração Pública, às quais a doutrina denominou remédios constitucionais. Nesse rol de meios de controle estão elencados o habeas

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corpus, o habeas data, o mandado de injunção, o mandado de segurança individual e coletivo, a ação popular e a ação civil pública.

1.3.3 O controle legislativo

De acordo com a dicção do artigo 49, X, da Constituição federal, entre os atos de competência exclusiva do Congresso Nacional incluem-se os de “fiscalizar e controlar, diretamente, ou por qualquer de suas Casas, os atos do Poder Executivo, incluídos os da Administração indireta”. (CELSO ANTÔNIO BANDEIRA DE MELLO, 2010)

O controle legislativo ou parlamentar é exercido pelos órgãos legislativos ou por comissões parlamentares sobre determinados atos do Executivo na dupla linha da legalidade e da conveniência pública. Em razão disso, caracteriza-se como um controle eminentemente político, indiferente aos direitos individuais dos administrados, mas que tem como escopo os interesses superiores do Estado e da comunidade. (HELY LOPES MEIRELLES, 2010)

Di Pietro (2009) ensina que

o controle que o Poder Legislativo exerce sobre a Administração Pública tem que se limitar às hipóteses previstas na Constituição Federal, uma vez que implica interferência de um Poder nas atribuições dos outros dois; alcança os órgãos do Poder Executivo, as entidades da Administração Indireta e o próprio Poder Judiciário, quando executa função administrativa. Não podem as legislações complementar ou ordinária e as Constituições estaduais prever outras modalidades de controle que não as constantes da Constituição Federal, sob pena de ofensa ao princípio da separação dos Poderes; o controle constitui exceção a esse princípio, não podendo ser ampliado fora do âmbito constitucional. (p. 739)

O exercício do controle é uma das funções típicas do Poder Legislativo ao lado da função de legislar. Em decorrência dessa função, pode o Congresso Nacional instaurar Comissões Parlamentares de Inquérito (CPIs); proceder a pedidos de informações; convocar autoridades para esclarecimentos; exercer a fiscalização financeira, contábil, operacional e orçamentária sobre atos e contratos dos demais Poderes, com apoio consultivo do Tribunal de Contas. (ELIAS ROSA, 2010)

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O controle financeiro, exercido com o auxílio dos Tribunais de Contas, explica Afonso da Silva (2008), verifica a legalidade, legitimidade e economicidade dos atos contábeis, financeiros e orçamentários da Administração direta e indireta. Acerca desta faceta do controle legislativo, o autor assinala que consiste

na atuação da função fiscalizadora do povo, através de seus representantes, sobre a administração financeira e orçamentária. É, portanto, um controle de natureza política, no Brasil, mas sujeito à prévia apreciação técnico-administrativa do tribunal de Contas competente que, assim, se apresenta como órgão técnico, e suas decisões administrativas, não jurisdicionais, como, às vezes, se sustenta, à vista da expressão “julgas as contas” referida à sua atividade (art. 71, II). A mesma expressão é também empregada no art. 49, IX, em que se dá ao Congresso Nacional competência para julgar anualmente as contas prestadas pelo Presidente da República, e nem por isso se dirá que ele exerce função judicante. (AFONSO DA SILVA, 2008, p. 752-753)

Alfredo Cecílio Lopes, em sua obra Ensaio sobre o Tribunal de Contas, observa que somente quando vigem os princípios democráticos em todas as suas consequências – e dentre elas as mais importantes está a consagração da divisão dos poderes – e o orçamento é votado pelo povo por meio de seus representantes legítimos, é que as finanças, de formal, se tornam essencialmente públicas, e a sua fiscalização passa a compor uma irrecusável prerrogativa de soberania popular. (ALFREDO CECÍLIO LOPES apud AFONSO DA SILVA, 2008)

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2 OS TRIBUNAIS DE CONTAS

Conforme ressalta Ferreira Melo (2011), a Administração Pública deve sempre atuar visando à satisfação do interesse público, e para tanto, alguns mecanismos constitucionalmente previstos foram colocados à disposição dos administrados para viabilizar a verificação da regularidade da atuação da Administração de modo a coibir a prática de atos irregulares, ilegítimos, lesivos ao indivíduo ou à própria coletividade. Exemplos desses mecanismos podem ser encontrados no artigo 31, §3º; artigo 5º, LXXIII; e artigo 74, §2º, todos da Constituição Federal.

O referido autor explica que, contemporaneamente, os dois ramos predominantes de Controle da Administração são as Controladorias e os Tribunais de Contas. As Controladorias são mais presentes nos países de tradição anglo-saxônica, difundida na Grã-Bretanha, nos Estados Unidos, na República da Irlanda e em Israel. O controle é formado por um órgão monocrático, o Controlador-Geral, designado pelo Parlamento e um Ofício Revisional, hierarquicamente subordinado àquele. Este modelo de controle de contas públicas observa o mérito ou a economicidade do ato administrativo. Já as Cortes de Contas se difundiram nos países de tradição latina, tendo evidente desenvolvimento na França, na era Napoleônica. Tal modelo caracteriza-se pela marcante presença de um órgão colegiado, cujos membros possuem as mesmas garantias e impedimentos dos membros do Poder Judiciário.

Em relação ao modelo brasileiro, os Tribunais de Contas são co-responsáveis pela efetivação do direito fundamental à probidade administrativa, uma vez que exercem o controle externo. A incumbência estabelecida pela Constituição é a de fazer observar a legalidade, legitimidade e economicidade dos atos praticados pelos agentes públicos ou que lidam com recursos públicos. A função de auxílio ao Poder Legislativo na prestação do controle externo deve ser vista com ponderação, haja vista que não significa subordinação hierárquica ou administrativa. Logo, o vínculo existente entre a Corte de Contas e o Legislativo é meramente institucional. Essa Corte possui estrutura administrativa e funcional constituída por um corpo técnico multidisciplinar, arranjado para auxiliar com eficiência o Poder Legislativo no desempenho do controle externo,

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que, basicamente, consiste em fiscalizar contábil, financeira, orçamentária, operacional e patrimonialmente aqueles que, de alguma maneira, assumem obrigações públicas de natureza pecuniária. (FERNANDO G. JAYME, 2001)

No que tange à independência dos Tribunais de Contas quanto ao Poder Judiciário, Marçal Justen Filho (2009) explica que essa opção constitucional deveu-se à intenção de manter os atos dos Tribunais de Contas sujeitos ao controle jurisdicional, o que não implica em redução da dignidade das Cortes de Contas, uma vez que os atos próprios dos demais Poderes também estão sujeitos ao controle jurisdicional.

2.1 Histórico

A instituição de um Tribunal de Contas no Brasil teve como expoentes os Senadores do Império Felisberto Caldeira Brandt e José Inácio Borges, que apresentaram, em 1826, projeto de lei neste sentido ao Senado Imperial. (CICCO FILHO, 2007)

À época, a principal preocupação dos políticos não recaia sobre fraudes, desvios ou corrupção, mas sim o descontrole do gasto público, visto que não eram raros os casos em que as despesas superavam os valores previstos no orçamento. Em 1838, o Ministro da Fazenda Miguel Abrantes propôs novamente a criação de uma Corte de Contas, contudo inexitosa. Em 1845, novo projeto nesse mesmo sentido foi apresentado ao Parlamento pelo então Ministro das Finanças Manoel Alves Branco. (CLARAMUNT, 2009)

Todavia, o Império não assistiu a criação da Corte de Contas. Isso porque debates surgidos à época perduraram por mais de meio século, dividindo as opiniões em duas correntes antagônicas. A primeira amparava a necessidade de se implantar um Tribunal de Contas, a fim de que as contas públicas fossem devidamente analisadas por intermédio de um órgão independente, afastado de quaisquer obstáculos que pudessem embaraçar o controle. Em contraponto, uma segunda

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corrente sustentava a negação da criação de uma Corte de Contas, por entenderem que as contas públicas podiam continuar sendo controladas por aqueles mesmos que as realizavam. Com o declínio do Império e o advento de reformas político-administrativas ocorridas no Brasil República, por iniciativa do então Ministro da Fazenda Rui Barbosa, criou-se, por meio do Decreto 966-A/1890, o Tribunal de Contas. (CICCO FILHO, 2007)

Na Exposição de Motivos do referido decreto, Rui Barbosa descreve a situação vivida à época, bem como delineia os primeiros traços e atribuições do Tribunal de Contas:

É, entre nós, o sistema de contabilidade orçamentária defeituoso em seu mecanismo e fraco na sua execução. O Governo Provisório reconheceu a urgência inadiável de reorganizá-lo; e a medida que vem propor-vos é a criação de um Tribunal de Contas, corpo de magistratura intermediária à administração e à legislatura, que, colocado em posição autônoma, com atribuições de revisão e julgamento, cercado de garantias contra quaisquer ameaças, possa exercer as suas funções vitais no organismo constitucional, sem risco de converter-se em instituição de ornato aparatoso e inútil.

Assim, o artigo 89 da primeira Constituição Republicana do Brasil, de 1891, estatuía: “é instituído um Tribunal de Contas para liquidar as contas da receita e despesa e verificar sua legalidade, antes de serem prestadas ao Congresso.”

Conforme informações do sítio do Tribunal de Contas da União,

originariamente o Tribunal teve competência para exame, revisão e julgamento de todas as operações relacionadas com a receita e a despesa da União, ademais, a fiscalização se fazia pelo sistema de registro prévio. A Constituição de 1891 institucionalizou o Tribunal e conferiu-lhe competências para liquidar as contas da receita e da despesa, bem como verificar a sua legalidade antes de serem prestadas ao Congresso Nacional.

José Afonso da Silva (2008) assinala que após a Constituição de 1981, o Tribunal de Contas teve previsão em todas as Constituições sucessoras, que lhe reservaram cada vez mais espaço, encontrando seu ponto alto na Constituição de 1946, dadas as suas relevantes e independentes atribuições contidas no artigo 77.

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A existência de um órgão especializado que fiscalize a realização do orçamento e a aplicação do dinheiro público pelas autoridades que o despendem, é necessidade de há muito sentida, no Brasil e fora dele. Entre nós, já no Império, tentou-se implantar um órgão com essas funções. Todavia, foi o Governo Provisório que criou o Tribunal de Contas, pelo Decreto n. 966-A, de 7 de novembro de 1890. Tal decreto foi da lavra de Rui Barbosa, que também inspirou a inserção desse órgão de contas no texto constitucional (art. 89 da Lei Magna de 1981). E daí em diante o Tribunal de Contas está presente em todas as Constituições Federais. (p. 158)

A Constituição de 1934 tornou obrigatória a prestação de contas dos administradores públicos bem como estabeleceu o direito do Congresso Nacional de julgar as contas do governo. Já a Constituição de 1937, em razão do caráter autoritário do Estado Novo, representou um retrocesso no que tange à responsabilização dos administradores públicos, visto que o novo texto não mais fazia alusão à obrigação do governo em prestar contas. Ademais, a Constituição incumbia o Presidente da aprovação das contas do próprio governo, por meio de decreto. Apenas com a volta à normalidade democrática, ensejada pela Constituição de 1946, é que a obrigatoriedade de apresentação de contas por parte do Presidente, sob pena de crime de responsabilidade, tornou-se elemento definitivo no ordenamento jurídico pátrio. (CLARAMUNT, 2009)

A constituição de 1967 e suas alterações posteriores, contudo, diminuíram substancialmente as prerrogativas do Tribunal, mas a Constituição de 1988, por sua vez, o eleva possivelmente mais além do que fora sob a égide da Constituição de 1946, notadamente porque dera ao Poder Legislativo maiores atribuições. As Cortes de Contas sempre seguem as posições do Poder Legislativo. Quando este está sufocado pelo autoritarismo ou mesmo pela perda de atribuições fundamentais, aquelas sofrem as consequências em grau mais profundo. Insta salientar que o princípio da prestação de contas da Administração Pública, direta e indireta - constante do artigo 34, VII, d, da Carta Magna - só tem eficácia de princípio do Estado Democrático enquanto as demais instituições de apuração dessas contas gozarem de autonomia e prestígio para o cumprimento dessa elevada missão. Do contrário, tudo não passará de mero exercício de formalidades que não alcançam resultados práticos. (AFONSO DA SILVA, 2008)

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Cicco Filho (2007) corrobora esta idéia, anotando que ao longo da evolução constitucional operacionalizada no Brasil, a Corte de Contas ampliou seu rol de atribuições e, dessa forma, fortaleceu o princípio da autonomia que deve nortear sua função. Assim, com a Constituição de 1988, responsável pela redemocratização da soberania brasileira enclausurada até então por um longo regime ditatorial, o Tribunal de Contas logrou a maior expansão em relação às suas competências.

2.2 Natureza jurídica

Importa esclarecer, primeiramente, que, conforme ensina Celso Antônio Bandeira de Mello (2010), todas as disposições constitucionais atinentes ao Tribunal de Contas da União aplicam-se, no que couber, à organização, composição e fiscalização relativas aos Tribunais de Contas dos Estados e do Distrito Federal, bem como aos Tribunais e Conselhos de Contas dos Municípios, atendidas as disposições previstas nas respectivas Constituições estaduais. Ressalte-se que, após a Constituição de 1988, é vedada a criação de Tribunais, Conselhos ou órgãos de Contas Municipais, conforme determina o artigo 31, § 4º, da Lei Maior.

O Tribunal de Contas auxilia o Congresso Nacional no exercício do controle externo da atividade administrativa dos três Poderes, inclusive do próprio Poder Legislativo. É válido salientar, porém, que não há subordinação, tampouco posição inferior em suposta escala hierárquica, sendo que o Tribunal de Contas consiste em uma instituição autônoma, consoante se manifesta a vontade constitucional. (FERREIRA MELO, 2011)

Na mesma direção segue o entendimento de MEDAUAR (1998), que, acerca do Tribunal de Contas, leciona: “impossível considerá-lo subordinado ou inserido na estrutura do Legislativo. Se a sua função é atuar em auxílio ao legislativo, sua natureza é de órgão independente, desvinculado da estrutura de qualquer dos três poderes.” (p. 411)

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José Cretella Júnior (1988) classifica os Tribunais de Contas como "órgãos administrativos independentes" (p. 14). Já Odete Medauar (1993), em obra específica acerca do controle da Administração Pública, indica que a característica “administrativo” não deve ser empregada, tendo em vista a possibilidade de associação direta ao Poder Executivo, dessumindo-se daí que a expressão "instituições estatais independentes" (p. 142) é mais acertada no que respeita à natureza de tais órgãos.

Seguindo a corrente majoritária, ELIAS ROSA (2010, p. 151) ensina que o Tribunal de Contas “apesar de auxiliar o Legislativo, detém autonomia e não integra a estrutura organizacional daquele Poder.”

Noutro norte, José dos Santos Carvalho Filho (2003) defende que o Tribunal de Contas da União "é o órgão integrante do Congresso Nacional que tem a função constitucional de auxiliá-lo no controle financeiro externo da Administração Pública, como emana do artigo 71 da atual Constituição" (p. 968).

De fato, o Tribunal de Contas encontra previsão constitucional nos artigos 70 a 75, inseridos na seção intitulada “Da Fiscalização Contábil, Financeira e Orçamentária”, que por sua vez está contida no capítulo relativo ao Poder Legislativo. Diante disso, uma parte da doutrina defende a idéia de que o Tribunal de Contas está subordinado ao Poder Legislativo. Entretanto, o entendimento majoritário é o de que não existe relação de subordinação, mas sim de cooperação, visto que os Tribunais de Contas órgãos autônomos, não integrantes do Legislativo. Ademais, para tornar mais sólida a autonomia dos Tribunais de Contas, a Constituição Federal assegura aos seus membros as mesmas garantias de independência relativas aos membros do Poder Judiciário, conforme se depreende do disposto no artigo 73, §§ 3º e 4º. (CHAVES DE RESENDE, 2008)

O controle a cargo do Tribunal de Contas está relacionado com a fiscalização da contabilidade, as movimentações financeiras, orçamentárias, patrimoniais e operacionais da Administração Pública. Certamente se pode dizer que sequer poderá chamar-se país democrático aquele não dotado de um órgão de controle com a incumbência de fiscalizar e garantir à sociedade a boa gestão do dinheiro público.

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Convém frisar que, conforme o caput do artigo 71, os Tribunais de Contas auxiliam o Poder Legislativo no exercício do controle externo sem, contudo, dizer que tais instituições se confundam. (ISUMI E ROCHA, 2011)

Chaves de Resende (2008) levanta questão pertinente ao lembrar que, tendo em vista que os Tribunais de Contas não integram quaisquer dos três Poderes do Estado, alguns autores entendem se tratar de um quarto poder, distorcendo assim o clássico trinômio de Montesquieu.

No entanto, assevera o autor:

A constituição, ao consagrar a autonomia funcional do Tribunal de Contas atribuindo-lhe competências próprias e prerrogativas a seus membros, não mitigou o princípio da separação dos poderes, nem criou um quarto Poder, mas tão somente “criou” um órgão independente, desvinculado dos demais Poderes, composto por corpo técnico extremamente especializado e uma imensa estrutura voltada para fiscalizar e auxiliar todos os poderes da federação, e ainda, a comunidade.

Desse modo, a Constituição Federal, para evitar os arbítrios e desrespeito aos direitos fundamentais e com a finalidade de garantir a perpetuidade do Estado Democrático de Direito, previu a existência dos três Poderes do Estado, independentes e harmônicos entre si, bem como das instituições - independentes e autônomas - do Tribunal de Contas e do Ministério Público (art. 127 a 130). (CHAVES DE RESENDE, 2008, p. 6)

Marçal Justen Filho (2009) corrobora tal entendimento, ensinando que a autonomia atribuída constitucionalmente ao Tribunal de Contas poderia conduzir ao reconhecimento de sua qualidade de Poder, contudo a Lei Maior preferiu manter a tradição setecentista de tripartição de Poderes do Estado. O autor destaca ainda que é juridicamente impossível qualquer autoridade integrante de algum dos três poderes intervir sobre o desempenho das competências dos Tribunais de Contas, bem como é inviável suprimir a existência ou reduzir suas atribuições por meio de medidas infraconstitucionais. Nem mesmo o fato de a Constituição ter tratado do Tribunal de Contas no Capítulo destinado ao Poder Legislativo tem relevância, uma vez que, em seu artigo 44, é clara ao estabelecer que o Tribunal de Contas não é órgão do referido Poder.

Em síntese, acerca da natureza jurídica dos Tribunais de Contas, ensina o Ministro do Supremo Tribunal Federal, Carlos Ayres de Britto (2003):

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