Registro: 2021.0000033369
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos de Agravo de Instrumento
nº 3000592-95.2020.8.26.0000, da Comarca de Jacareí, em que é
agravante ESTADO DE SÃO PAULO, é agravado MINISTÉRIO PÚBLICO
DO ESTADO DE SÃO PAULO.
ACORDAM, em sessão permanente e virtual da 1ª Câmara
Reservada ao Meio Ambiente do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a
seguinte decisão: NEGARAM PROVIMENTO ao recurso e, de ofício,
cassaram a decisão recorrida, para que outra seja proferida nos termos
do REsp nº 1.274.466/SC, julgado em 14.5.2014 sob o rito dos recursos
repetitivos. V. U., de conformidade com o voto do relator, que integra este
acórdão.
O julgamento teve a participação dos Desembargadores
NOGUEIRA DIEFENTHALER (Presidente sem voto), TORRES DE
CARVALHO E RUY ALBERTO LEME CAVALHEIRO.
São Paulo, 24 de janeiro de 2021.
OTAVIO ROCHA
Relator
Voto nº 16.456
Agravo de Instrumento nº 3000592-95.2020.8.26.0000
Comarca: JACAREÍ
Agravante: FAZENDA PÚBLICA DO ESTADO DE S. PAULO
Agravado: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SÃO PAULO
Agravo de instrumento Ação civil pública em fase de
cumprimento de sentença Alegação da Fazenda Estadual
no sentido de que o adiantamento de depósito de honorários
periciais deve recair sobre o Ministério Público Processo
que se encontra na fase do cumprimento da sentença,
devendo a questão ser analisada sob outro ângulo, visto que
nada é mais lógico do que imputar o pagamento da
mencionada obrigação processual à parte vencida na ação
principal Matéria já apreciada pelo C. Superior Tribunal de
Justiça, em sede de recurso repetitivo (REsp nº
1.274.466/SC, julgado em 14.5.2014), tendo esta Corte
firmado o entendimento de que, na fase de liquidação de
sentença, incumbe a parte vencida a antecipação dos
honorários periciais. Recurso desprovido. Decisão cassada,
de ofício, para que outra seja proferida nos termos do REsp
nº 1.274.466/SC.
Inconformado com a decisão reproduzida à fl. 38, pela MMª
Juíza de Direito da 3ª Vara Cível da Comarca de Jacareí nos autos da
ação civil pública (em fase de cumprimento de sentença) nº
0007142-97.1996.8.26.0292, determinando o recolhimento de honorários
periciais pela FAZENDA PÚBLICA DO ESTADO DE S. PAULO, contra
ela se insurgiu a i. Procuradora do Estado às fls. 1/3, arrazoando o
recurso às fls. 4/15.
A i. Procuradora do Estado, em síntese, argumentou no sentido
da: “1. Superação do entendimento sufragado pelo Superior Tribunal
de Justiça, no julgamento do Recurso Especial n° 1.253.844-SC,
submetido ao procedimento dos recursos repetitivos, diante da
revogação tácita da súmula 232 do STJ pelo disposto no artigo 91, §§º
1° e 2°, do Novo Código de Processo Civil; 2. Adoção do princípio da
litigiosidade responsável Autonomia Administrativa e Funcional do
Ministério Público Capacidade Orçamentária Própria (art. 127, § 3° e
art. 165, ambos da CF). A lei orçamentária deste ano reserva ao
Ministério Público, exclusivamente para o financiamento das suas
despesas gerais inseridas no Grupo de Despesa Outras Despesas
Correntes (onde está contido o elemento de despesa 3390.36 -
destinado para suportar gastos gerais com Outros Serviços de
Terceiros Pessoa Física); 3. Ausência de lei Impossibilidade de
custeio pela Fazenda Pública. Necessidade de dotação orçamentária
violação aos artigos 37 e 167, II e IV da CF e dos §° 1° e 2° do artigo
91 do CPC” (fls. 3/4).
Com base nos argumentos acima alinhavados, a FAZENDA
PÚBLICA requereu “seja concedido EFEITO SUSPENSIVO ao
presente Agravo, dada a relevância das argumentações trazidas ao
longo das razões recursais, bem como à vista do risco de lesão grave
e de difícil reparação caso não seja a decisão recorrida suspensa
imediatamente, determinando-se ao magistrado de piso que se
abstenha de reiterar a determinação de recolhimento de honorários
periciais pelo Estado de São Paulo, desobrigando-se, de imediato, que
qualquer preposto estatal proceda ao depósito determinado nos autos”
(fl. 14). No mérito, requer “o PROVIMENTO do presente recurso, a fim
de que, reconhecida a ilegalidade da decisão interlocutória, seja ela
reformada, afastando-se o ônus dela decorrente (recolhimento de
honorários periciais diretamente pelos recursos do erário estadual)” (fl.
15).
O pedido liminar foi deferido às fls. 45/50 e as informações de
estilo foram prestadas à fl. 54.
Contra-arrazoado o recurso (fls. 57/66), a E. Procuradoria de
Direitos Difusos e Coletivos manifestou-se pelo seu desprovimento (fls.
69/74).
É o relatório.
O Ministério Público propôs Ação Civil Pública em face de
EXTRACOM EXTRAÇÃO TRANSPORTE E COMÉRCIO DE AREIA
LTDA.,
em
razão
de
degradação
ambiental
causada
no
desenvolvimento de sua atividade fim.
A ação foi julgada parcialmente procedente nos seguintes
termos (fl. 18):
“Ante o exposto, julgo parcialmente procedente a ação para, prejudicado o
pedido de obrigação de não fazer, condenar a requerida EXTRACOM EXTRAÇÃO
TRANSPORTE E COMÉRCIO DE AREIA LTDA. na obrigação de fazer, consistente
em restaurar integralmente as condições primitivas da vegetação, solo e corpos
d'água, no prazo de 180 dias, sob pena de pagamento de multa diária-que
estabeleço conforme os parâmetros do art. 14, inc. i da Lei n.º 8.938/81, no valor de
R$ 1.000,00, corrigidos monetariamente desde a propositura da ação e ao
pagamento em dinheiro de indenização quantificada em pericia em liquidação de
sentença, a ser recolhida ao Fundo Especial de Despesas de Reparação dos
Interesses Difusos Lesados, correspondente às vantagens econômicas auferidas
pela requerida com a extração mineral irregular e, em consequência, julgo extinto o
processo com julgamento do mérito na forma do art. 269, I do Código de Processo
Civil Em razão da sucumbência, condeno a requerida ao pagamento de custas e
despesas processuais, sendo incabível a condenação em honorários advocatícios.”
de fazer foi convertida em perdas e danos, motivo pelo qual foi
determinada a realização de exame pericial para quantificação
monetária de todos os danos ambientais provocados pela executada
no local objeto da lide, tendo o i. Juízo de origem determinado o
recolhimento dos honorários correspondentes pela FAZENDA
PÚBLICA DO ESTADO DE SÃO PAULO que, irresignada, interpôs o
presente recurso contra essa decisão.
As alegações da d. Procuradora do Estado, representando a
agravante, não procedem.
Dispõe o art. 18, da Lei nº 7.347/85
[sem destaque no original]
:
“Nas ações de que trata esta lei, não haverá adiantamento de custas, emolumentos, honorários periciais e quaisquer outras despesas, nem condenação da associação autora, salvo comprovada má-fé, em honorários de advogado, custas e despesas processuais”.
Nos termos do enunciado, não compete ao Ministério Público,
autor da ação civil pública objeto do recurso, o adimplemento do ônus
processual de adiantamento dos honorários do perito nomeado pelo d.
Juízo de Primeiro Grau.
Levando-se em conta, porém, que não seria exigível do perito
que desempenhasse sua atividade profissional gratuitamente, a
jurisprudência tem entendido que nas ações civis públicas movidas
pelo Ministério Público, parte isenta do ônus do adiantamento dos
honorários periciais (consoante o acima reproduzido artigo 18 da Lei nº
7.347/85), a solução mais adequada para o impasse processual é a de
imputar ao Estado de São Paulo, o beneficiário último da procedência
da ação, o ônus de proceder ao referido adiantamento de honorários.
Tal matéria já foi analisada pelo C. Superior Tribunal de Justiça,
em sede de recurso repetitivo (REsp nº 1.253.844/SC, Primeira Seção,
j. 13.03.2013), firmando-se nessa Corte o entendimento de que os
honorários periciais devem ser custeados pela Fazenda Estadual à
qual estão vinculados (financeiramente) o Ministério Público e a
Defensoria Pública beneficiários do exame pericial. Confira-se
[sem
destaque no original]
:
ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. ADIANTAMENTO DE HONORÁRIOS PERICIAIS. NÃO CABIMENTO. INCIDÊNCIA PLENA DO ART. 18 DA LEI N. 7.347/85. ENCARGO TRANSFERIDO À FAZENDA PÚBLICA. APLICAÇÃO DA SÚMULA 232/STJ, POR ANALOGIA. [-] Trata-se de recurso especial em que se discute a necessidade de adiantamento, pelo Ministério Público, de honorários devidos a perito em Ação Civil Pública. [-] O art. 18 da Lei n. 7.347/85, ao contrário do que afirma o art. 19 do CPC, explica que na ação civil pública não haverá qualquer adiantamento de despesas, tratando como regra geral o que o CPC cuida como exceção. Constitui regramento próprio, que impede que o autor da ação civil pública arque com os ônus periciais e sucumbenciais, ficando afastada, portanto, as regras específicas do Código de Processo Civil. [-] Não é possível se exigir do Ministério Público o adiantamento de honorários periciais em ações civis públicas. Ocorre que a referida isenção conferida ao Ministério Público em relação ao adiantamento dos honorários periciais não pode obrigar que o perito exerça seu ofício gratuitamente, tampouco transferir ao réu o encargo de financiar ações contra ele movidas. Dessa forma, considera-se aplicável, por analogia, a Súmula n. 232 desta Corte Superior ("A Fazenda Pública, quando parte no processo, fica sujeita à exigência do depósito prévio dos honorários do perito"), a determinar que a Fazenda Pública ao qual se acha vinculado o Parquet arque com tais despesas. Precedentes: EREsp 981949/RS, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 24/02/2010, DJe 15/08/2011; REsp 1188803/RN, Rel. Ministra ELIANA CALMON, SEGUNDA TURMA, julgado em 11/05/2010, DJe 21/05/2010; AgRg no REsp 1083170/MA, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, SEGUNDA TURMA, julgado em 13/04/2010, DJe 29/04/2010; REsp 928397/SP, Rel. Ministro CASTRO MEIRA, SEGUNDA TURMA, julgado em 11/09/2007, DJ 25/09/2007 p. 225; REsp 846.529/MS, Rel. Ministro TEORI ALBINO ZAVASCKI, PRIMEIRA TURMA, julgado em 19/04/2007, DJ 07/05/2007, p. 288. [-] Recurso especial parcialmente provido. Acórdão submetido ao regime do art. 543-C do CPC e da Resolução STJ n. 8/08. (REsp 1253844/SC, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 13/03/2013, DJe 17/10/2013)
E, contrariamente ao alegado pela agravante, o artigo 91
1do
Código de Processo Civil de 2015, que disciplina a questão do
pagamento das despesas processuais relativas a atos praticados a
requerimento da Fazenda Pública, do Ministério Público ou da
Defensoria Pública, não provocou a superação do entendimento
firmado nos termos do julgamento acima mencionado.
De fato, ao ser questionado acerca do alcance do mencionado
1 NCPC - Art. 91. As despesas dos atos processuais praticados a requerimento da Fazenda Pública, do Ministério Público ou da
Defensoria Pública serão pagas ao final pelo vencido. § 1º As perícias requeridas pela Fazenda Pública, pelo Ministério Público ou pela Defensoria Pública poderão ser realizadas por entidade pública ou, havendo previsão orçamentária, ter os valores adiantados por aquele que requerer a prova. § 2º Não havendo previsão orçamentária no exercício financeiro para adiantamento dos honorários periciais, eles serão pagos no exercício seguinte ou ao final, pelo vencido, caso o processo se encerre antes do adiantamento a ser feito pelo ente público.
dispositivo da nova lei processual, o Superior Tribunal de Justiça, por
ocasião do julgamento do RMS nº 55.476-SP (2ª Turma, j. em
21-11-2017), sob a Relatoria do Min. HERMAN BENJAMIN, assim se
pronunciou [
sem destaque no original
]:
RECURSO EM MANDADO DE SEGURANÇA. OS HONORÁRIOS PERICIAIS DEVEM SER CUSTEADOS PELA FAZENDA À QUAL O MINISTÉRIO PÚBLICO ESTÁ VINCULADO. APLICAÇÃO DO RECURSO REPETITIVO 1.253.844/SC. INCIDÊNCIA DA SÚMULA 232/STJ. 1. Cuida-se de irresignação contra a decisão do Tribunal de origem que denegou a ordem em Mandado de Segurança, entendendo que o impetrante deve ser o responsável pelo pagamento do adiantamento dos salários periciais, haja vista ser a pessoa jurídica de direito público a que se vincula o MP, postulante da prova. 2. Não se sustenta a tese de aplicação das disposições contidas no art. 91 do Novo CPC, as quais
alteraram a responsabilidade pelo adiantamento dos honorários periciais; isto porque a Lei 7.347/1985 dispõe de regime especial de custas e despesas processuais, e, por conta de sua especialidade, a referida norma se aplica à Ação Civil Pública, derrogadas, no caso concreto, as normas gerais do Código de Processo Civil. 3. O Superior Tribunal de Justiça, no REsp
1.253.844/SC, Rel. Ministro Mauro Campbell Marques, Primeira Seção, DJe 17.10.2013, submetido à sistemática do art. 543-C do Código de Processo Civil, consignou que "não é possível se exigir do Ministério Público o adiantamento de honorários periciais em ações civis públicas. Obtempera-se que não foi superado o entendimento firmado no retromencionado julgamento, tendo sido seguido por recentes julgados do STJ (AgInt no REsp 1.420.102/RS. Ministra Regina Helena Costa. Primeira Turma. DJe 30/3/2017) 4. Ocorre que a isenção conferida ao Ministério Público em relação ao adiantamento dos honorários periciais não pode obrigar que o perito exerça seu ofício gratuitamente. Dessa forma, considera-se aplicável, por analogia, a Súmula 232 do STJ, a determinar que a Fazenda Pública ao qual se acha vinculado o Parquet arque com tais despesas: "A Fazenda Pública, quando parte no processo, fica sujeita à exigência do depósito prévio dos honorários do perito". 5. Recurso ordinário a que se nega provimento. (RMS 55.476/SP, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 21/11/2017, DJe 19/12/2017)2
Tal orientação jurisprudencial é adotada neste Sodalício,
inclusive pelas 1ª e 2ª Câmaras Reservadas ao Meio Ambiente, sendo
pacífico o entendimento de ser da Fazenda Pública do Estado o ônus
do adiantamento dos honorários nas ações civis públicas movidas pelo
Ministério Público, consoante se verifica, v.g., das seguintes ementas:
MANDADO DE SEGURANÇA ORIGINÁRIO. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. PROCESSO CIVIL. ADIANTAMENTO DE DEPÓSITO DE HONORÁRIOS PERICIAIS. Levando-se em conta que é ônus daquele que requer a prova o adiantamento de depósitos para pagamento de honorários periciais, bem como que não é possível exigir que perito nomeado pelo juízo receba apenas no término do processo ou preste serviço sem qualquer remuneração, deve a Fazenda Pública a qual está vinculado o Ministério Público ou a Defensoria Pública efetuar o depósito, nos termos do decidido no REsp 1.253.844/SC, no rito dos recursos repetitivos. Aplicação por analogia do enunciado da Súmula 232 do E. STJ. Matéria pacificada no âmbito dos Tribunais Superiores. Lei 7.347/85 que garante ao Ministério Público a isenção do adiantamento de custas, emolumentos, honorários periciais e quaisquer outras despesas. Ausente violação a direito líquido e certo a determinar a concessão da segurança, nos termos da Lei n° 12.016/09. Extinção com resolução do mérito, nos termos do art. 487, inciso I, do Novo Código de Processo Civil. Segurança denegada. (TJSP - Mandado de Segurança 3001507-18.2018.8.26.0000; Relator Marcelo Berthe; 1ª Câmara Reservada ao Meio Ambiente; Foro de Campos do Jordão - 1ª Vara; Data do Julgamento: 02/08/2018; Data de Registro: 03/08/2018)
MANDADO DE SEGURANÇA MEIO AMBIENTE AÇÃO CIVIL PÚBLICA ADIANTAMENTO DE DEPÓSITO DE HONORÁRIOS PERICIAIS Decisão que determinou que a Fazenda Pública do Estado de São Paulo efetuasse o adiantamento dos honorários periciais
2 Vide também, no mesmo sentido: STJ, AgInt no RMS 56.454/SP, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, SEGUNDA
Possibilidade Aplicação, por analogia, do enunciado da Súmula 232 do E. STJ Questão analisada pelo C. STJ à luz do novo diploma processual, notadamente o art. 91 do CPC/2015, mantendo o entendimento proferido em sede de recurso repetitivo (REsp 1.253.844/SC), porquanto aplicável, à espécie, o regime especial estabelecido na Lei de Ação Civil Pública, que isenta o Ministério Público do adiamento dos honorários periciais em ações civis públicas Exegese do RMS 55.476/SP, julgado pelo C. STJ em 21.11.2017 Inexistência de direito líquido e certo a ser amparado Segurança negada. (TJSP - Mandado de Segurança 2120836-41.2018.8.26.0000; Relator Luis Fernando Nishi; 2ª Câmara Reservada ao Meio Ambiente; Foro de Guarulhos - 2ª Vara da Fazenda Pública; Data do Julgamento: 11/09/2018; Data de Registro: 11/09/2018).
Agravo de Instrumento AÇÃO CIVIL PÚBLICA EXECUÇÃO DE TERMO DE AJUSTAMENTO DE CONDUTA RESPONSABILIDADE PELO ADIANTAMENTO DOS HONORÁRIOS PERICIAIS Decisão do Juízo "a quo" que deferiu a realização de prova pericial requerida pelo Parquet, determinando, contudo, que a Fazenda Estadual adiantasse o valor destinado ao custeio dos honorários periciais Acerto Não se aplicam as disposições contidas no art. 91 do CPC/15, que alterou a responsabilidade pelo adiantamento dos honorários periciais, no âmbito das ações civis públicas, já que a Lei nº 7.347/1985 dispõe de regime especial de custas e despesas processuais, e, por conta de sua especialidade, a referida norma se aplica à Ação Civil Pública, derrogadas, no caso concreto, as normas gerais do Código de Processo Civil Não sendo possível exigir do Ministério Público o adiantamento de honorários periciais em ações civis públicas, bem como não se podendo reinvidicar que o perito exerça seu ofício gratuitamente, tampouco transferir ao réu o ônus de financiar ações movidas em seu desfavor, aplicável, por analogia, a Súmula nº 232 do c. STJ ("A Fazenda Pública, quando parte no processo, fica sujeita à exigência do depósito prévio dos honorários do perito") Entendimento consolidado no âmbito do c. STJ sob a égide do julgamento de casos repetitivos (art. 543-C CPC/1973) e mantido após a vigência do CPC de 2015 (RMS nº 55.476/SP 2ª Turma, 21-11-2017, Rel. Herman Benjamin) Decisão agravada mantida. Recurso não provido. (TJSP; Agravo de Instrumento 3001842-37.2018.8.26.0000; Relator Des. Paulo Barcellos Gatti; Órgão Julgador: 4ª Câmara de Direito Público; Foro de Ibiúna - 1ª Vara; Data do Julgamento: 30/07/2018; Data de Registro: 03/08/2018)
Cumpre observar, ademais, que não merecem acatamento os
argumentos esgrimidos pela agravante no sentido de que os
honorários são exigíveis do Ministério Público porque (i) é ele
“instituição independente, apartada da estrutura organizacional do
Estado, que ostenta, por imperativo constitucional, autonomia
administrativa, funcional e capacidade orçamentária própria (art. 127, §
3° e art. 165, ambos da CF)”, encontrando-se apartado da estrutura
organizacional da Fazenda Pública do Estado de São Paulo; (ii) “a
exigência do adiantamento dos honorários periciais, como ônus a ser
cumprido pelo interessado, implica em uma litigiosidade responsável,
[e] constituiu a opção política encampada pelo Novo Código de
Processo Civil”; e, ainda, (iii) porque “toda e qualquer geração de
despesa pública depende de prévia autorização legislativa e dotação
orçamentária própria, sob pena de se afrontar o disposto nos artigos
37, caput e 167, II e IV da Constituição Federal” (fl. 7/9).
No tocante ao primeiro argumento, cabe afirmar que embora
certo que o Ministério Público seja instituição dotada de orçamento
próprio, ele está inserido no orçamento global do Poder Executivo ao
qual a instituição está vinculada financeiramente , representando
apenas 1,31% do orçamento global do Estado
3. É natural, concluir,
portanto, que o item “elemento de despesa 3390.36” a que alude a
impetrante, ao referir-se a “Terceiros-Pessoa Física”, não pode
abranger despesas fixadas em ações judiciais cuja propositura resulta
do natural desempenho das atividades-fim da instituição, definidas na
Constituição Federal e Leis Orgânicas Nacional e Estadual do
Ministério Público, senão, apenas, às despesas relativas às
atividades-meio da instituição, ou seja, aquelas necessárias à existência e
manutenção da estrutura física e serviços necessários ao desempenho
das primeiras.
O segundo argumento é de ser afastado porque a sugestão de
que o ajuizamento de ações civis públicas pelo Ministério Público de
São Paulo, sem prévio suporte financeiro para custear as despesas
processuais correspondentes, equivaleria a uma atuação distanciada
da exigível “litigiosidade responsável”, se levada às últimas
consequências culminaria na inércia do Parquet ante o dever de atuar
na defesa dos bens e interesses de difusos previstos nos incisos II e III
do artigo 129 da Constituição Federal
4, até que lhe fosse
disponibilizado orçamento adequado ao cumprimento dessas
relevantes funções de natureza pública
cujos resultados, aliás,
interessam também ao próprio Estado
5.
3 Dados relativos ao orçamento anual de 2018, disponível em: www.orcamento.planejamento.sp.gov.br/download_lei/p2018_1.
Acesso em 9.out.2018.
4 CF/88, Art. 129: “São funções institucionais do Ministério Público: (...) II - zelar pelo efetivo respeito dos Poderes Públicos e dos
serviços de relevância pública aos direitos assegurados nesta Constituição, promovendo as medidas necessárias a sua garantia; III - promover o inquérito civil e a ação civil pública, para a proteção do patrimônio público e social, do meio ambiente e de outros interesses difusos e coletivos;...”.
5 Vide, nesse sentido [sem negrito no original]: EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. AGRAVO DE INSTRUMENTO. Ação Civil Pública.
Perícia. Decisão que carreou os ônus do adiantamento das verbas do 'expert' à Fazenda Estadual. Cabimento. Dever de adiantamento dos honorários periciais incumbe, de fato, ao interessado, nos termos do artigo 95, do NCPC, no caso ao autor. Artigo
18 da Lei nº 7.347/85 que, por sua vez, confere isenção ao Ministério Público quanto ao dever de proceder, entre outros, ao adiantamento de honorários periciais. Ônus que, ao seu turno, também não pode ser imputado ao réu, por ausência de previsão legal. Imposição ao perito de realização do trabalho gratuitamente que, outrossim, não seria plausível. Estado de São Paulo que é o beneficiário direto em vista da procedência da ação. Art. 91, do NCPC, ademais, que não considera as especificidades da Lei n.º 7.347/85. Decisão mantida. 1. Inexistência de obscuridade, contradição, omissão ou erro material, à luz
do artigo 1.022 do NCPC/2015. Matéria aventada prequestionada. Exegese do artigo 1.025 do NCPC/2015. 2. Embargos de declaração rejeitados. (TJSP; Embargos de Declaração 2144719-85.2016.8.26.0000; Relator Des. Oswaldo Luiz Palu; Órgão Julgador: 1ª Câmara Reservada ao Meio Ambiente; Foro de Mairiporã - 1ª Vara; Data do Julgamento: 21/09/2017; Data de Registro: 25/09/2017).
A recepção do argumento relativo à “litigiosidade responsável”,
de qualquer modo, não dispensaria a consideração de que os próprios
profissionais que representam o Estado de São Paulo nas demandas
judiciais em que esse ente federativo figura como autor, embora
atuando a partir de arcabouço legal e premissas específicas, não estão
a salvo da conhecida crítica relativa ao excesso de litigiosidade,
embasada no aparente desinteresse do Estado em evitar a
judicialização de questões que comportariam tratamento adequado na
esfera administrativa
6.
Sobre essa questão, releva acrescentar por último que embora
os membros do Ministério Público, como representantes do autor nas
ações civis públicas que propõem, possam ser responsabilizados
pessoalmente no caso de atuação desleal ou de má-fé, de acordo com
as leis civis e penais em vigor, bem assim administrativamente perante
o órgão disciplinar correspondente, a instituição do Ministério Público
“em si mesma, não poderá ser responsabilizada. A uma, porque, pelos
fins constitucionais do Ministério Público, não se pode admitir que,
como 'instituição', aja de má-fé (CR, art. 127, 'caput'). A duas, porque,
se efetivamente de má-fé a ação foi proposta ou conduzida por um
'membro' do Ministério Público, esse membro responsabilizará ao
Estado e, regressivamente, a si mesmo, mas não ao Ministério
Público, que não detém personalidade jurídica e é órgão do Estado”
7.
6 Em artigo intitulado Lentidão da Justiça é ruim para a economia do país, o Prof. LUIZ FLÁVIO GOMES, comentando pesquisa
publicada pela revista Análise Justiça no ano de 2006, destacou que “A pesquisa também descobriu que o maior cliente do Poder
Judiciário é o poder público; verificou-se que é o Estado-Administração que contribui consideravelmente para o excesso de processos nas Cortes Superiores e, consequentemente, para a morosidade. [-] Sobre esse assunto, o CNJ realizou um estudo dos cem maiores litigantes do Brasil, e chegou à conclusão que o poder público é responsável por 20% dos processos existentes no país. O campeão é o Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), com 22,3% das ações dos cem maiores litigantes nacionais. A Caixa Econômica Federal ficou em segundo lugar, com 8,5% e a Fazenda Nacional ocupou a terceira posição, com 7,7% das demandas. Na sequência está o Banco do Brasil e o Banco Bradesco. [-] No tocante aos Tribunais Superiores, o setor público é responsável por 90% dos processos em tramitação. O primeiro colocado é o Poder Executivo Federal, que representa 67% das ações, e dentre os doze maiores litigantes, dez são estatais. São eles: a Caixa Econômica Federal (CEF), a União, o Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), o Estado de São Paulo, o Banco Central, o Estado do Rio Grande do Sul, o município de São Paulo, a Telemar Norte Leste S/A, o Banco do Brasil e o estado de Minas Gerais” Artigo disponível na Internet:
http://niajajuris.org.br/index.php/artigos/419-lentidao-da-justica-e-ruim-para-a-economia-do-pais - Acesso em 9.out.2018.
No tocante ao terceiro argumento, relativo à ausência de
“dotação orçamentária própria” que implicaria ofensa aos artigos 37,
caput e 167, II e IV, da CF/88, cumpre frisar que embora o orçamento
do Estado seja finito como, de resto, tudo o mais , levando-se em
conta que a Lei nº 7.347 entrou em vigor na data de sua publicação,
em 24 de julho de 1985, passados mais de trinta anos já não é mais
razoável que a impetrante alegue a ausência de previsibilidade para
despesas que tais, de modo que a sua não inserção em dotação
orçamentária própria deve gerar, como tem gerado ao longo do
período, o seu pagamento com verbas destinadas ao custeio geral do
ente federativo.
Ficam afastados, portanto, as alegações expendidas nas razões
recursais.
Por outro lado, tendo sido encerrada a fase de conhecimento,
com a condenação da ré EXTRACOM EXTRAÇÃO TRANSPORTE E
COMÉRCIO DE AREIA LTDA., verifica-se que o ônus de pagamento
dos honorários periciais recaiu indevidamente sobre o Ministério
Público e consequentemente em prejuízo da FAZENDA PÚBLICA ,
vencedor da ação principal.
Estando o processo na fase de cumprimento do julgado, a
questão deve ser analisada sob outro ângulo, visto que nada é mais
lógico do que imputar o pagamento da mencionada obrigação
processual à parte vencida.
A questão já foi apreciada pelo C. Superior Tribunal de Justiça,
em sede de recurso repetitivo (REsp nº 1.274.466/SC, julgado em
14.5.2014), firmando-se nessa Corte o entendimento de que na fase
de liquidação de sentença, incumbe ao devedor a antecipação dos
honorários periciais. Confira-se [sem destaque no original]:
RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DA CONTROVÉRSIA. PROCESSUAL CIVIL. TELEFONIA. CONTRATO DE PARTICIPAÇÃO FINANCEIRA. COMPLEMENTAÇÃO DE AÇÕES. LIQUIDAÇÃO DE SENTENÇA. HONORÁRIOS PERICIAIS. ENCARGO DO VENCIDO. 1. Para fins do art. 543-C do CPC: (1.1) "Na liquidação por cálculos do credor, descabe transferir do exequente para o executado o ônus do pagamento de honorários devidos ao perito que elabora a memória de cálculos". (1.2) "Se o credor for beneficiário da gratuidade da justiça, pode-se determinar a elaboração dos cálculos pela contadoria judicial". (1.3) "Na fase autônoma de liquidação de sentença (por arbitramento ou por artigos), incumbe ao devedor a antecipação dos honorários periciais ". 2. Aplicação da tese 1.3 ao caso concreto. 3. RECURSO ESPECIAL DESPROVIDO. (REsp 1274466/SC, Rel. Ministro PAULO DE TARSO SANSEVERINO, SEGUNDA SEÇÃO, julgado em 14/05/2014, DJe 21/05/2014).
No julgamento do recurso supracitado ressaltou o i. Ministro
PAULO DE TARSO SANSEVERINO, que, “depois de transitada em
julgado a sentença condenatória, já se tem definição sobre quem 'tem
razão', ou seja, sobre quem venceu a demanda. Assim, dando a
sequência à ideia de que o processo não pode causar uma diminuição
do patrimônio da parte vencedora, não parece adequada a ideia de
que o autor da liquidação de sentença deva antecipar os honorários
periciais... Ora, se o débito é imputado ao vencido, e já se sabe quem
foi vencido na demanda, não faz sentido atribuir a antecipação da
despesa ao vencedor para depois imputá-la ao vencido. É mais
adequado e efetivo imputar o encargo diretamente ao quem deve
suportá-lo” [
sem destaque no original
].
Nesse mesmo sentido já se decidiu nas 1ª e 2ª Câmaras
Reservadas ao Meio Ambiente deste E. Tribunal de Justiça, v.g., das
seguintes ementas:
AGRAVO DE INSTRUMENTO AÇÃO CIVIL PÚBLICA DANOS COMPROVADOS AO MEIO AMBIENTE CUMPRIMENTO DE SENTENÇA DEFERIMENTO DE PERÍCIA PARA AVALIAÇÃO DOS BENS PENHORADOS HONORÁRIOS PERICIAIS A CARGO DA PARTE VENCIDA/EXECUTADAS POSICIONAMENTO ATUAL DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA, NOS TERMOS DO ART. 1.036 DO CPC/15 (ART. 543-C, DO ANTIGO CPC) DECISÃO MANTIDA RECURSO NÃO PROVIDO. Iniciada a fase de cumprimento de sentença, tendo sido determinada a realização de perícia para avaliação dos bens penhorados, o pagamento dos honorários periciais deve ser suportado pela parte vencida/executadas, em adequação a recente posicionamento do STJ. (TJSP;
Agravo de Instrumento 2054763-87.2018.8.26.0000; Relator (a): Paulo Ayrosa; Órgão Julgador: 2ª Câmara Reservada ao Meio Ambiente; Foro de São Vicente - 5ª Vara Cível; Data do Julgamento: 03/07/2018; Data de Registro: 03/07/2018)
RECURSO DE AGRAVO DE INSTRUMENTO EM AÇÃO CIVIL PÚBLICA EM FASE DE CUMPRIMENTO DE SENTENÇA. PROCESSO CIVIL. LIQUIDAÇÃO POR ARBITRAGEM. DEPÓSITO DE HONORÁRIOS PERICIAIS. Determinação à ré condenada, a indenizar os danos ambientais causados, a depositar os honorários periciais. Depósito dos honorários periciais em fase de liquidação por arbitragem que se impõe ao devedor. Perícia que deve ser suportada pela ré condenada à obrigação de fazer. Precedente do E. Superior Tribunal de Justiça. Decisão mantida. Recurso desprovido (TJSP; Agravo de Instrumento 2078172-29.2017.8.26.0000; Relator (a): Marcelo Berthe; Órgão Julgador: 1ª Câmara Reservada ao Meio Ambiente; Foro Central Cível - 18ª Vara Cível; Data do Julgamento: 06/07/2017; Data de Registro: 10/07/2017)