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Parrhesía e produção de subjetividade em Arnaldo Antunes : escrita, autoria e poder

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Academic year: 2021

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(1)1. UNIVERSIDADE FEDERAL DE UBERLÂNDIA. SIRLENE CÍNTIA ALFERES LOPES. Parrhesía e produção de subjetividade em Arnaldo Antunes: escrita, autoria e poder. Uberlândia – MG Junho de 2015.

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(3) 3. SIRLENE CÍNTIA ALFERES LOPES. Parrhesía e produção de subjetividade em Arnaldo Antunes: escrita, autoria e poder. Tese apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Estudos Linguísticos – Curso de Doutorado em Estudos Linguísticos – do Instituto de Letras e Linguística da Universidade Federal de Uberlândia, como requisito parcial para a obtenção do título de Doutor em Estudos Linguísticos. Área de concentração: Estudos em Linguística e Linguística Aplicada Linha de Pesquisa: Linguagem, Texto e Discurso Orientador: Prof. Dr. Cleudemar Alves Fernandes Apoio financeiro – início da pesquisa: Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Ensino Superior – CAPES. Universidade Federal de Uberlândia Uberlândia – MG Junho de 2015.

(4) Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP) Sistema de Bibliotecas da UFU, MG, Brasil.. L864p 2015. Lopes, Sirlene Cíntia Alferes. Parrhesía e produção de subjetividade em Arnaldo Antunes : escrita, autoria e poder / Sirlene Cíntia Alferes Lopes. - 2015. 219 f. Orientador: Cleudemar Alves Fernandes. Tese (doutorado) - Universidade Federal de Uberlândia, Programa de Pós-Graduação em Linguística. Inclui bibliografia. 1. Linguística - Teses. 2. Língua portuguesa - Escrita - Teses. 3. Subjetividade - Teses. 4. Antunes, Arnaldo, 1960- - Teses. I. Fernandes, Cleudemar Alves, 1966-. II. Universidade Federal de Uberlândia. Programa de Pós-Graduação em Linguística. III. Título.. CDU: 801.

(5) 5. FOLHA DE APROVAÇÃO SIRLENE CÍNTIA ALFERES LOPES. “Parrhesía e produção de subjetividade em Arnaldo Antunes: escrita, autoria e poder” Tese apresentada ao Programa de Pós-graduação em Estudos Linguísticos da Universidade Federal de Uberlândia para obtenção do Título de Doutor em Estudos Linguísticos. Área de concentração: Estudos em Linguística e Linguística Aplicada Linha de Pesquisa: Linguagem, Texto e Discurso Orientador: Prof. Dr. Cleudemar Alves Fernandes Apoio financeiro – início da pesquisa: Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Ensino Superior – CAPES. Uberlândia, 29 de junho de 2015.. Banca examinadora:. __________________________________________________________________ Prof. Dr. Cleudemar Alves Fernandes (UFU) - presidente ___________________________________________________________________ Prof. Dr. Antônio Fernandes Júnior (UFG) ___________________________________________________________________ Prof. Dr. Welisson Marques (IFTM) ___________________________________________________________________ Profa. Dra. Carla Nunes Vieira Tavares (UFU) ____________________________________________________________________ Prof. Dr. Ernesto Sérgio Bertoldo (UFU).

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(7) 7. À minha família e aos meus amigos, meus portos-seguros..

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(9) 9. AGRADECIMENTOS No decurso do Curso de Doutorado em Estudos Linguísticos (marcado por tantas decisões e, principalmente, cisões) até o produto que ora se apresenta como tese, eu obtive estímulo de muitas pessoas especiais, nas mais diversas formas de manifestação de auxílio. Aproveito este momento singular, de fechamento e de abertura de mais uma etapa de meus estudos, para deixar algumas palavras de agradecimento a essas pessoas excepcionais em minha vida: Ao meu orientador, Prof. Dr. Cleudemar Alves Fernandes, pela acolhida, pela compreensão, por acreditar em meu trabalho quando a grande maioria já não acreditava, e, principalmente, por possibilitar uma relação de orientação com aberturas ao diálogo e como meio de proporcionar uma escrita singular. Ademais, por estar e ser presente em todo o processo: aceite de orientação extemporânea em novembro de 2012; leitura de esboços; correção de textos antes das qualificações e defesas; participação assídua no grupo de pesquisa Laboratório de Estudos Discursivos Foucaultianos – LEDIF; qualificação de projeto; qualificação de tese; e defesa de tese; À Prof. Dra. Marisa Martins Gama Khalil e ao Prof. Dr. Antônio Fernandes Júnior, pela leitura do projeto de doutorado para o exame de qualificação e pelas contribuições valiosas quanto ao caminho a ser trilhado; à Prof. Dra. Fernanda Mussalim e, uma vez mais, ao Prof. Dr. Antônio Fernandes Júnior, pelos apontamentos feitos durante o exame de qualificação da tese, possibilitando um melhor delineamento do texto e um olhar mais apurado quanto às escolhas até aquele momento; Às Professoras Doutoras Dilma Maria de Mello e Fernanda Costa Ribas, pelas contribuições valiosas durante o exame de qualificação do trabalho em área complementar – Linguística Aplicada; à Profa. Dra. Maria Inês Vasconcelos Felice, pelos momentos valiosos de troca de saberes, pelo aceite e pela orientação do trabalho em área complementar: um momento para exercer a diferença de perspectivas teóricas e aprender mais sobre as linhas de pesquisa; Aos Professores Doutores Antônio Fernandes Júnior (UFG – Catalão), Welisson Marques (IFTM – Uberaba), Carla Nunes Vieira Tavares (UFU – Uberlândia), Ernesto Sérgio Bertoldo (UFU – Uberlândia), membros titulares, e aos Professores Doutores Nilton Milanez (UESB – Vitória da Conquista) e Marisa Martins Gama Khalil.

(10) 10. (UFU – Uberlândia), membros suplentes, pela leitura e pela honra a mim concedida ao partilharem de suas perspectivas de olhar a respeito de meu trabalho, participando da banca examinadora de defesa de tese: fechamento de um ciclo e início de outro; À Profa. Dra. Alice Cunha de Freitas, pela atenção e disposição para ajudar em sua função de Coordenadora do Programa de Pós-Graduação em Estudos Linguísticos (PPGEL) no início do curso de Doutorado em Estudos Linguísticos; à Profa. Dra. Dilma Maria de Mello, pela disponibilidade e atenção, tanto como leitora do trabalho em área complementar quanto como Coordenadora do PPGEL; à Tainah, à Maria José, e, posteriormente, à Maria Virgínia, à Lorena e à Luana, pela solicitude e esclarecimento no atendimento da secretaria do PPGEL; aos professores das disciplinas cursadas, pelo aprendizado e pelas trocas de experiência tão profícuas e enriquecedoras; Ao LEDIF e aos meus amigos – João de Deus, Márcia, Jaciane, Karina, Vanessa, Andressa, Percival, Ana Maria, Léa, Francisco, Laylla e Jefferson –, que contribuíram acadêmica e pessoalmente com interlocuções teóricas e não teóricas, sempre com palavras de incentivo e de carinho; à Fabiana Kettmann, pelo carinho, pela amizade e pelo résumé; Ao João Alferes, meu pai, por compreender que era preciso sacrificar-se mais um pouco por conta da filha, permitindo a presença de sua esposa, Júlia Alferes, em meu dia-a-dia, desde o final de setembro do ano de 2012 até a defesa da tese. Pai, muito obrigada por seu apoio e amor incondicionais, pelas palavras tão certeiras e necessárias nos momentos mais diversos e difíceis, por não medir forças e recursos para acudir a filha que ficou doente... enfim... por ser (meu) PAI!; À Júlia Alferes, minha mãe, pela dedicação à minha filha, ao meu marido, à minha casa e a mim nesses anos tão cruciais para o desenvolvimento da tese e para início do serviço público como professora de Ensino Fundamental II. Por enxugar minhas lágrimas e me consolar em tantos momentos difíceis, por sorrir com minhas alegrias e vitórias... Por cuidar de minha filha com tanta paciência, dedicação e compreensão, mesmo com dores no corpo e sinais visíveis de esgotamento. Mãe, meu muito obrigada por todo o seu amor... Por tudo o que escrevi e também por aquilo que não consegui expressar em palavras. A senhora foi os pés e as mãos para este caminho... enfim... obrigada por ser (minha) MÃE!;.

(11) 11. À Shirlei, minha sogra, por permanecer alguns meses nos ajudando a cuidar da Julinha e de nossa casa com tanto carinho; ao Valdemar, meu sogro, e às minhas cunhadas Lígia e Ana Carolina, por permitirem a presença de Shirlei em Uberlândia; À minha irmã Sirlei, ao meu cunhado Antônio Carlos, aos meus sobrinhos Maria Rosa e João Lucas, por tantos momentos singulares (vocês sabem... e como sabem!) e por acreditarem em mim; ao meu irmão Sidnei, que mesmo distante me apoia e sabe bem como é este processo – porque passou por isso também na mesma época, mas com o agravante de ser em outro país. Sid, muito obrigada pelo abstract; Ao meu marido, Fábio, e à minha filha, Júlia, pelo carinho, pelo amor, por aguentarem as alterações de humor e pela compreensão desse processo, que resultou em uma ausência necessária para colhermos bons frutos mais adiante. Filha, agora mamãe poderá ser mãe; Aos meus amigos da Escola Municipal Prof. Jacy de Assis – Mirna, Mônica, Edésio, Mária, Edna, Carla, Adriana, Eliane, Suéllen, Rosário, Izabel, Joana, Delci, Maria Aurora –, pelos risos, pelo apoio, pelas rodas de conversa e trocas de experiências; ao Vanderlei, pela amizade e pelas conversas sobre algumas questões históricas; à diretora, Luciana, por possibilitar a dispensa para desenvolver a escrita da tese; aos mais novos colegas da Escola Municipal Profa. Stella Saraiva Peano, pelos dizeres pontuais e pelo astral contagiante tão necessários para o fim do percurso; ao Rogério, pela amizade e pelas trocas de referêncais sobre o período da ditadura militar no Brasil; aos meus alunos, ex-alunos e futuros alunos, pela interlocução e por serem inspiração para a continuidade de meus estudos; Àqueles que me apoiaram direta e indiretamente em todo o processo: funcionários da UFU; senhor Pedro, dona Zilná, Lucas, Aline, Débora (Tano Cópias); amigos e familiares; E à CAPES, Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Ensino Superior, pelo apoio financeiro, no início da pesquisa, até o momento de posse do cargo de Professor de Português (Ensino Fundamental II) no município de Uberlândia..

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(13) 13. [...] De que valeria a obstinação do saber se ele assegurasse apenas a aquisição dos conhecimentos e não, de certa maneira, e tanto quanto possível, o descaminho daquele que conhece? [...] (FOUCAULT, [1984] 1998, p.13).

(14) 14.

(15) 15. Resumo Considerando que o exercício da parrhesía tem compromisso com o dizer-verdadeiro e, em relação ao artístico, esse conceito se reformula, analiso nesse trabalho produções de Arnaldo Antunes, levando em conta as noções de escrita, autoria, poder, parrhesía, subjetividade e identidade a partir da perspectiva foucaultiana do discurso. Estabeleci como entrada para análise nomes, concebidos como aquilo que funciona como especificador e diferenciador de sentidos, sempre perpassados pelo sistema (língua), pelo sujeito e pela história: o tripé de sustentabilidade da construção dos sentidos. Observei a recorrência de nomes nas produções arnaldianas (Che Guevara, Simone de Beauvoir, Pinochet, Lao Tsé, Stalin, Hitler etc.), o que me fez indagar a possibilidade de estudo dessas produções a partir da perspectiva foucaultiana do discurso. Para constituir o corpus, recorri aos trabalhos 40 escritos, Como é que chama o nome disso, Outros 40 e ao Site Oficial de Arnaldo Antunes (www.arnaldoantunes.com.br). Aventei a hipótese de que haveria nas produções arnaldianas um modo “velado” de materialização de discursos que “escancararia” as relações de poder e possibilitaria o exercício da parrhesía e a produção de subjetividade. Esse escancarar as relações de poder se daria por meio da oposição entre discursos, que se materializariam por meio da memória, submergida em meio aos nomes, na tensão entre o enunciado e o não enunciado via discurso, possibilitando, inclusive, em certos casos, a construção de identidades de sujeitos. Como subsídio teórico-metodológico, embasei-me em A arqueologia do saber (FOUCAULT, [1969] 2004), a partir da noção de enunciado como “a unidade elementar do discurso” (p.90). Sendo assim, foi possível cotejar enunciados de modo a evidenciar que a parrhesía, nos dias de hoje, se dá de modo diferente da época grega, contudo, ainda é um meio de compromisso com a verdade (enquanto construto), em um cotejo entre questões históricas, sociais e culturais a partir do que é permitido pela arte: um lugar privilegiado para a transgressão. No primeiro capítulo, apontei aspectos sobre o estudo das produções arnaldianas e justifiquei a escolha por analisar essas produções a partir das relações de poder postuladas em textos de Foucault. No segundo capítulo, tracei o caminho teórico-metodológico, de modo a apontar alguns conceitos que foram fulcrais para o desenvolvimento dessa pesquisa – quais sejam: nome; enunciação; enunciado; discurso; descontinuidade histórica; escrita; autoria; caráter relacional do poder e formas de resistência; parrhesía e produção de subjetividade; e outros que foram discutidos de modo atrelado a esses conceitos (ser da linguagem, memória, história, sujeito, identidade, diferença, etc.), embasando-me, principalmente, em textos de Foucault e de autores que se filiam à Análise do Discurso sob a perspectiva desse autor. No terceiro capítulo, analisei produções arnaldianas fazendo cotejo com os principais conceitos abordados, a fim de chegar ao objetivo dessa tese e observar se a hipótese realmente se sustentou. Por fim, retomei a discussão acerca da produção arnaldiana e sua relação com a literatura contemporânea, bem como a reconfiguração da noção de parrhesía e sua relação com a subjetividade, a escrita, a autoria e o poder a partir das produções de Antunes. Palavras-chave: Escrita; Autoria; Poder; Resistência; Identidade; Subjetividade; Parrhesía..

(16) 16. Abstract Considering that the practice of parrhesia is committed to truth-telling, and in relation to art this concept is reformulated, I analyze productions of Arnaldo Antunes in this thesis, taking into account the written notions of authorship, power, parrhesia, subjectivity, and identity from the perspective of Foucault’s discourse. I established names as input for analysis, conceived as that which functions as “specifier” and differentiator of meanings, always tangent by the system (language), by subject, and by history: the tripod of sustainability of construction of the senses. I observed the recurrence of names in arnaldian works (Che Guevara, Simone de Beauvoir, Pinochet, Lao Tzu, Stalin, Hitler, etc.), which made me inquire about the ability to study these productions from the perspective of Foucault’s discourse. To constitute the corpus of this study, I resorted to the works 40 escritos, Como é que chama o nome disso, Outros 40, and the Official site of Arnaldo Antunes (www.arnaldoantunes.com.br). I proposed the hypothesis that there would be arnaldian productions in a “veiled” way of discourses’ materialization that would “throw-open” power relations and would enable the practice of parrhesia and the production of subjectivity. This “throwing-open” of power relations would take place through the opposition between discourses, which would materialize themselves through the memory, immersed in the names in the tension between the spoken and unspoken via speech, enabling even in certain cases, the construction of subject identities. As theoretical and methodological subsidy, I based the study in Foucault’s L’archéologie du savoir1, from the notion of speech as “the elementary unit of discourse” (p.90). Thus, it was possible to collate statements in order to show that parrhesia, in the present day, takes place differently from the Greek era. However, it is still a means of commitment to truth (as a construct), in a comparison of historical, social, and cultural issues from what is permitted by the arts: a privileged place for transgression. In the first chapter, I discussed aspects of the study of arnaldian productions and I justified the choice for analyzing these productions from the power relations postulated in Foucault’s texts. In the second chapter, I traced the theoretical and methodological path in order to observe some concepts that were key to the development of this research – to be precise: appellative, articulation, statement, speech, historical discontinuity, writing, authorship, relational character of the power and forms of resistance, parrhesia, production of subjectivity, and other discussed concepts that were bound to the former concepts (the being of language, memory, history, subject, identity, difference, etc.), based primarily on Foucault’s texts and authors who join the Discourse Analysis from the perspective of that author. In the third chapter, I analyzed arnaldian productions making comparisons with the principally addressed concepts, in order to reach the goal of this thesis and to see if the hypothesis could firmly stand. Finally, I resumed the discussion of arnaldian production and its relation to contemporary literature, as well as the reconfiguration of the notion of parrhesia and its relation to subjectivity, writing, authorship, and the power from the productions of Arnaldo Antunes. Keywords: Writing; Authorship; Power; Resistance; Identity; Subjectivity; Parrhesia.. 1 I used the 2004 Portuguese version A arqueologia do saber instead of the original French 1969 publication..

(17) 17. Résumé Considérant que la pratique de la parrhésie est engagée dans le "franc-parler "et, appliquée au domaine artistique, ce concept est reformulé; j’analyse dans ce travail les œuvres d’Arnaldo Antunes, en prenant en compte les notions d’écriture, de paternité de l'œuvre, de pouvoir, de parrhésie, de subjectivité et d’identité à partir de la perspective foucaldienne du discours. J’ai débuté l’analyse par des termes, servant à définir et à différencier les différents sens, toujours exigés par la langue, par le sujet et par l’histoire: la base de la construction des significations. J’ai observé la récurrence de certains termes (Che Guevara, Simone de Beauvoir, Pinochet, Lao Tsé, Staline, Hitler etc.) dans les œuvres d’Arnaldo Antunes. Ce qui m’a évoqué la possibilité d’étudier ces œuvres à partir de la perspective foucaldienne du discours. Pour construire le corpus, j’ai eu recours aux ressources suivantes: 40 escritos, Como é que chama o nome disso, Outros 40 et au Site Officiel d'Arnaldo Antunes (www.arnaldoantunes.com.br). J'ai avancé une hypothèse selon laquelle il y aurait un mode dissimulé de la matérialisation des discours qui démontrerait clairement les relations de pouvoir et qui permettrait la pratique de la parrhésie et la production de la subjectivité. Cette mise en lumière des relations de pouvoir se déroulerait à travers l'opposition entre les discours qui se matérialisent dans la mémoire, submergée par les termes, dans la tension entre le dit et le non-dit via le discours, permettant, y compris dans certains cas, la construction d'identités du sujet. Je me suis basée sur l'œuvre L’archéologie du savoir (FOUCAULT, [1969] 2004), à partir de la notion de l'énoncé comme "unité élémentaire du discours (p.90). Ainsi il a été possible de comparer les énoncés qui mettent en relief que la parrhésie, de nos jours, prend un sens différent de l'époque grecque, néanmoins, reste engagée dans la vérité , dans une comparaison entre questions historiques, sociales et culturelles à partir de ce qui est permis par l'Art : Un endroit privilégié pour la transgression. Dans le premier chapitre, j'ai souligné les aspects sur l'étude des œuvres d'Arnaldo Antunes et j'ai justifié le choix d'analyser ces œuvres à partir des relations de pouvoir présentes dans les textes de Foucault. Dans le second chapitre j'ai retracé l'itinéraire théorico-méthodologique afin de démontrer quelques concepts qui ont été fondamentaux pour la conduite de cette recherche, ces derniers sont : terme, énonciation, énoncé, discours, discontinuité historique, écriture, paternité de l'œuvre, caractère relationnel du pouvoir et des formes de résistance, parrhésie et production de subjectivité, et d'autres qui ont été débattus conjointement à ces concepts. (Etre du langage, mémoire, histoire, sujet, identité, différence, etc.), en me basant, principalement sur les textes de Foucault et d'auteurs rattachés à l'Analyse du discours sur le point de vue de cet auteur. Dans le troisième chapitre, j'ai analysé les œuvres d'Arnaldo Antunes en réalisant une comparaison avec les principaux concepts abordés, ceci afin d'atteindre de cette thèse et observer si l'hypothèse se vérifie effectivement. En conclusion, j'ai repris la discussion concernant la production d'Arnaldo Antunes et son lien avec la littérature contemporaine, ainsi que la redéfinition du sens de parrhésie et sa relation avec la subjectivité, l'écriture, la paternité de l'œuvre et le pouvoir à partir des œuvres d'Arnaldo Antunes. Mots-clé : Écriture, Paternité de l'œuvre, Pouvoir, Résistance, Identité, Subjectivité, Parrhésie..

(18) 18.

(19) 19. SUMÁRIO. CONSIDERAÇÕES INICIAIS .............................................................................................. 21. Capítulo I. DA RELEVÂNCIA DE ANÁLISE DAS PRODUÇÕES ARNALDIANAS ........ 31. 1.1. Alguns estudos sobre a produção arnaldiana ........................................ 54. 1.2. O percurso de produção arnaldiana: pulular criativo ........................ 58. 1.3. Do interesse de análise a partir da noção de relações de poder..... 62. Capítulo II. CAMINHO TEÓRICO-METODOLÓGICO ................................................ 69. 2.1. Escolha pelos estudos foucaultianos ......................................................... 75. 2.1.1. Ponto de encontro entre Saussure e Foucault: o caráter relacional......................................................................................................................... 80. 2.1.2. Algumas considerações sobre a ferramenta escolhida .................. 84. 2.2. Discussão de conceitos: estabelecendo limites .................................... 86. 2.2.1. Estatuto do nome ........................................................................................... 88. 2.2.2. Enunciado, enunciação e discurso ........................................................ 95. 2.2.3. História e memória ....................................................................................... 104. 2.2.4. Escrita e autoria ............................................................................................. 116 2.2.5. Poder: caráter relacional e formas de resistência ........................... 125 2.2.6. Parrhesía e produção de subjetividade ................................................ 132.

(20) 20. Capítulo III. PARRHESÍA E PRODUÇÃO DE SUBJETIVIDADE EM ARNALDO ANTUNES: ESCRITA, AUTORIA E PODER ...................................................................... 145 3.1. Nome aos bois ...................................................................................................... 146. 3.2. Saiba ........................................................................................................................... 155 3.2. Essa mulher ........................................................................................................... 162 3.3. Inclassificáveis ..................................................................................................... 167 3.4. São Paulo, São Paulo 2, Miséria e Riquezas são diferenças ............... 174. CONSIDERAÇÕES FINAIS ................................................................................................. 189. REFERÊNCIAS.................................................................................................................... 192 Bibliográficas ............................................................................................................... 192 Consultadas .................................................................................................................. 199 Filme ................................................................................................................................ 200 Músicas ........................................................................................................................... 200 Online .............................................................................................................................. 202. ANEXOS........................................................................................................................... 203 1. Músicas ...................................................................................................................... 203 2. Escritos....................................................................................................................... 214.

(21) 21. CONSIDERAÇÕES INICIAIS2. Do lugar da Análise do Discurso, encontramos Foucault pelas páginas inesgotáveis que se abriram à nossa frente, e ainda se abrem e continuam abertas... (FERNANDES, 2011, p.17). A temática da escrita foi foco de pesquisa para a dissertação de mestrado, a qual foi defendida no ano de 2010, no Programa de Pós-graduação em Estudos Linguísticos da Universidade Federal de Uberlândia (PPGEL-UFU). Naquele texto, eu fazia uma relação entre a Linguística da Enunciação, com base em estudos de textos de Benveniste, e a Psicanálise, com base em estudos de textos de Freud e de Lacan, para discorrer sobre 40 escritos, de Arnaldo Antunes (2000). Notoriamente, discuti sobre o processo de singularização do dizer, observando a produção do artístico em relação ao estilo – enquanto um trabalho com e sobre a língua, com e sobre o simbólico3, com e sobre a palavra –, levando à assunção da singularidade em termos linguísticos, naquele livro e em outras produções escritas, as quais relacionei com o recorte estabelecido a partir do livro 40 escritos. Na dissertação (ALFERES, 2010), justifiquei o uso de e a menção a “Arnaldo Antunes”, no decorrer do texto, a fortiori porque muitos, ao me ouvirem ou ao me lerem, inferiram que meu objetivo era analisar Arnaldo Antunes enquanto pessoa no mundo (talvez porque, no trabalho, há uma interlocução com os estudos freudo-lacanianos), e, desse modo, eu estaria exercendo a função, por exemplo, de um psicanalista (o que, é notório, seria impossível: tanto porque não sou formada em Psicanálise quanto porque a escrita, a meu ver, não seria uma [única] via para uma análise psicanalítica, para citar alguns dos vários motivos dessa impossibilidade). E assim foi justificado esse uso e essa menção, na introdução da dissertação, em uma nota de rodapé:. Sobre a estrutura das citações, destaco que, nesse trabalho, o ano escrito entre colchetes [ ] se refere ao ano da primeira publicação; e o outro, ao ano de publicação da obra mencionada. 2. Compreendido como qualquer entidade linguageira que possa significar, produzir sentido(s); saliento que a entidade linguageira se relaciona às questões sociais, culturais e históricas para produzir sentido(s). 3.

(22) 22. Aqui vale uma ressalva: ao mencionar Arnaldo Antunes, não falo de Arnaldo Antunes enquanto pessoa no mundo “em carne e osso”, mas sim como uma via de vislumbrar uma representação. Isso porque, Arnaldo Antunes é nome artístico de Arnaldo Augusto Nora Antunes Filho e, portanto, já marca a diferença entre pessoa no mundo e artista. Concebo, neste caso, o termo “artista” como sendo uma forma de representação deflagrada a partir dos trabalhos realizados em torno da arte. Nessa perspectiva, Arnaldo Antunes é, portanto, uma assinatura que representa a autoria em trabalhos artísticos. Parece um paradoxo dizer que falar em Arnaldo Antunes não é falar em Arnaldo Augusto Nora Antunes Filho. Talvez, dizendo deste modo, a ideia melhor se mostra: assim como na diferenciação entre metáfora e comparação, em que toda metáfora é uma comparação e nem toda comparação é uma metáfora, Arnaldo Augusto Nora Antunes Filho comporta Arnaldo Antunes, já Arnaldo Antunes não comporta Arnaldo Augusto Nora Antunes Filho. Ou seja, a relação com o artístico não necessariamente pode dizer o que é a pessoa no mundo. Sobre o termo representação, cabe aqui outra ressalva. Tomo este termo como abordado por Flores [et al.] (2008, p.47, nota 16): “[...] Aqui, ele é tomado em sentido muito delimitado, qual seja, como propriedade de se marcar. Não se trata de ver na representação algo que teria existência a priori. [...]”. (ALFERES, 2010, p.22-23 – nota de rodapé 7. Grifos da autora). Dada a natureza desse recorte de Flores et.al. (2008) sem contextualização, julgo ser necessário destacar que a noção de representação não é muito discutida no texto citado, O lugar de Benveniste no campo da enunciação; entretanto, a partir da leitura do texto, é sabido que essa noção está relacionada ao modo como o sujeito pode ser considerado no âmbito da teoria da “Linguística da Enunciação”, tomando como base textos de Benveniste e de outros teóricos da enunciação. Assim sendo, os autores afirmam “que o sujeito não pode ser, tacitamente, considerado o objeto de estudo de uma teoria lingüística, nem mesmo de uma teoria da Lingüística da Enunciação, tomada em sentido estrito” (FLORES et al., 2008, p.26), a questão que se leva “em conta sempre é a representação que a enunciação dá do sujeito da língua. Estuda-se [...] as marcas da enunciação e do sujeito do enunciado, e não o sujeito propriamente dito” (FLORES et al., 2008, p.26). Conforme o trecho citado, esta é uma das vias para se considerar a noção de representação (do sujeito) na teoria da enunciação, compreendida, portanto, como “marcas da enunciação e do sujeito do enunciado”, e assim foi concebida a representação..

(23) 23. Relendo o que escrevi, observo que, de certa maneira, esse modo de conceber “Arnaldo Antunes” vai ao encontro do que Foucault postula sobre o que seria o autor, no texto de [1969] 2006a, O que é um autor?, se se ponderar sobre a questão da representação. Isso porque, conforme Foucault ([1969] 2006a, p.276-277):. Sem dúvida, a esse ser de razão, tenta-se dar um status realista: seria, no indivíduo, uma instância “profunda”, um poder “criador”, um “projeto”, o lugar originário da escrita. Mas, na verdade, o que no indivíduo é designado como autor (ou o que faz de um indivíduo autor) é apenas a projeção, em termos sempre mais ou menos psicologizantes do tratamento que se dá aos textos, das aproximações que se operam, dos traços que se estabelecem como pertinentes, das continuidades que se admitem ou das exclusões que se praticam [...]. (Aspas e itálico do autor. Negrito e sublinhado meus). Desse modo, assim como em relação à Linguística da Enunciação, afirmo que, da perspectiva foucaultiana e das relações possíveis com a Análise do Discurso, não se deve conceber o (nome do) autor como o próprio indivíduo, mas sim como representação. Saliento: o termo representação não deve ser compreendido como mera reprodução, transferência, imitação, cópia ou mero decalque do indivíduo autor no mundo. A representação do autor não é cópia “fiel” do autor (e já não poderia ser assim concebida pelo simples fato de ser cópia). A cópia pode carregar ou portar traços do original, os quais podem classificá-la como semelhante ao original (neste caso, ao autor), mas não carrega ou porta o que se poderia chamar de “todo” (o original, ou seja, o autor); caso contrário, a cópia seria o original4: o próprio autor. A meu ver, a representação viabiliza observar traços, nuances, marcas sutis do que se projeta como autor por meio do texto escrito. Entretanto, a representação nunca possibilitará ter acesso ao que, de fato, seja/é o autor. Nesse sentido, parece-me ser permitido sublinhar também o seguinte aspecto: até mesmo o que é dito sobre o autor pelo próprio autor é imagem construída; é projeção do modo como o autor se vê e como infere que os outros o veem/vejam. Tratar-se-ia, portanto, de um recorte limitado, como uma fotografia ou um retrato: os limites da imagem construída (fotografia ou retrato) pelo olhar do fotógrafo são dados pelo fotolito, pela moldura, pela iluminação e pela luminosidade, pela profundidade e pela perspectiva, por exemplo, ou seja, pelo 4. Considerar essa relação, desta forma, seria um engodo..

(24) 24. suporte e pelos elementos a ele atrelados. Sendo assim, não é possível observar o todo ou ter acesso ao todo; têm-se acesso apenas ao que se apresenta como construído, o recorte. Os traços, as marcas sutis e as nuances são parte do limite do (que pode ser) observável ou do (que pode ser) analisável do projetado. Destarte, enquanto representação, Arnaldo Antunes igualmente poderá ser observado, inclusive nesta pesquisa. Neste ínterim, quando reflito sobre a decorrência que Foucault ([1969] 2006a) dá para o conceito de autor, esbarro-me em algo diferente do que concebi, pois, para esse filósofo, o autor (ou a função autor) é uma “função variável e complexa do discurso”, pois é “uma das especificações possíveis da função sujeito” (FOUCAULT, [1969] 2006a, p.287). Sendo assim, a função autor “não remete pura e simplesmente a um indivíduo real, ela pode dar lugar simultaneamente a vários egos, a várias posiçõessujeitos que classes diferentes de indivíduos podem vir a ocupar.” (FOUCAULT, [1969] 2006a, p.279-280). Desta maneira, não seria apenas a “voz” de Arnaldo Antunes manifesta nas produções, mas sim a de vários “eus” ou de “vários sujeitos” manifestos e construídos por meio de discurso(s). Não considero que, daquela perspectiva, não fosse possível conceber Arnaldo Antunes relacionando aspectos individuais atrelados aos sociais como meios para a produção escrita; no entanto, (re)avaliando a necessidade de olhar por outras perspectivas, uma vez que é “o ponto de vista que cria o objeto” (cf. SAUSSURE, [1916] 2006, p.15), vislumbro a necessidade de ser observada essa escrita sob um viés menos, se assim posso escrever, individualizante ou individualizador. Isso acarreta uma observação em relação à autoria considerando questões sócio-históricas e culturais implicadas na escrita, de modo que a subjetividade emerja como efeito dessa exterioridade que atua na produção de discursos. Conforme Prado Filho (2005, p. 44) em Uma história crítica da subjetividade no pensamento de Michel Foucault, é válido destacar que a noção de subjetividade é compreendida como “experiência histórica, coletiva: é da ordem do enunciado, do discurso, das práticas sociais e das relações éticas do sujeito consigo mesmo”. Nesse sentido, ao se considerar que a subjetividade é da ordem “das práticas sociais e das relações éticas do sujeito consigo mesmo” (cf. PRADO FILHO, 2005), saliento que a noção de subjetividade está ligada à de singularidade, a qual não se relaciona necessariamente ao ineditismo ou àquilo que ultrapassaria o ordinário como.

(25) 25. se fosse (extremamente) extraordinário. Foucault ([1969] 2004), em A arqueologia do saber, articula a possibilidade de se considerar um enunciado como singular; esse enunciado singular que articularia as regras de formulação não seria possível de se encontrar, contudo, a singularidade poderia ser vislumbrada ao se investigar, em vez dos enunciados com regras mais gerais e mais largamente aplicáveis, os enunciados com “regras menos gerais e cujo domínio de aplicação é mais específico” (cf. FOUCAULT, [1969] 2004, p.166). Dessa forma, a noção de singularidade deve ser construída a partir daquilo que passa por algo que é da ordem “do sujeito consigo mesmo” no ato de escrever, mas que, no entanto, não escapa ao enunciado, ao discurso, às práticas sociais e, portanto, às “experiências históricas e coletivas”. Sendo assim, as noções de subjetividade e de singularidade, neste trabalho, estarão atreladas à noção de parrhesía (grosso modo: falar francamente, franqueza, afirmação corajosa) que também se constitui em meio às práticas históricas, sociais e coletivas. A relação entre parrhesía, subjetividade e singularidade foi observada por mim ao ler A hermenêutica do sujeito (FOUCAULT, [1982] 2006b) e ao aprofundar a leitura sobre o assunto em O discurso e a verdade: a problematização da parrhesía (FOUCAULT, [1983] 2013) – seis conferências dadas por Michel Foucault, em Berkeley, entre outubro e novembro de 1983. Este atrelamento será feito no capítulo 2, destinado ao caminho teórico-metodológico desta tese. Sendo assim, uma das escolhas que almejo defender nesta tese aponta para a necessidade de colocar o autor como uma posição a ser ocupada de modo a deflagrar um dado “momento histórico definido” e um “ponto de encontro de um certo número de acontecimentos” (FOUCAULT, [1969] 2006a, p.277), pois, conforme apontado por Foucault ([1969] 2006a, p.267) ao retomar Beckett, não importa “Quem fala”, mas “O que fala” e o que pode suscitar como (re)atualização de discursividades a partir desse(s) dizer(es). Porque, conforme posto em A arqueologia do saber, o que “diz não é dito de qualquer lugar” (FOUCAULT, [1969] 2004, p.139) e também não é dito de qualquer maneira. Fazendo um exercício interpretativo do que foi escrito por Fernandes (2009a), em Autoria, exterioridade e construção identitária em Pierre Rivière, julgo ser possível afirmar que há uma exterioridade aí posta, em que o sujeito, por meio de uma projeção em um dado enunciado, pode fazer representações de si, do universo cotidiano que o cerca e do que os outros podem representar como sendo a imagem do.

(26) 26. sujeito que enuncia. Assim, o sujeito é reconstruído, a cada mo(vi)mento de leitura, por essa exterioridade que é posterior ao texto mas que só é permitida pelo texto a partir disso que emerge como “ser de linguagem”, por meio de relações estabelecidas com representações e construções sociais, históricas e culturais. Trata-se de refletir acerca do fato de que os sujeitos se inscrevem em diferentes lugares, sócio-historicamente marcados, o que implica um não delineamento posto a priori do que possa emergir enquanto construção de um efeito-sujeito a partir da escrita e da articulação entre aspectos sociais, históricos e culturais. Destaco: acerca do “ser da linguagem”, há uma breve menção a esse respeito no texto O que é um autor? (FOUCAULT, [1969] 2006a). Contudo, faz-se necessário um aprofundamento a esse respeito, o qual será feito a partir da leitura de As palavras e as coisas (FOUCAULT, [1966] 2007), mais adiante. Ressalva: embora eu mencione a exterioridade como posterior ao texto, Foucault ([1970] 2008, p.28), em A ordem do discurso, alerta para o fato de o autor ser “aquele que dá à inquietante linguagem da ficção suas unidades, seus nós de coerência, sua inserção no real”. Assim, a meu ver, essa exterioridade está, no texto, em um movimento dentro-fora-fora-dentro. Entretanto, nesse caso específico, quis dar ênfase para o mo(v)imento de interpretação do leitor, muito embora seja sabido que, ao dar nós de coerência e dar a inserção no real à linguagem, aquele que escreve projeta na escrita algo do que seria previsível como possibilidade de leitura dessa escrita. Nesse sentido, a subjetividade não se separa do processo de escrita. Em realidade, será a subjetividade proporcionadora do aparecimento do “novo”, do acontecimento enunciativo, da singularidade enunciativa que acarretará o exercício da autoria. Em relação a como considerar o autor, cumpre salientar que “o autor deve se apagar ou ser apagado em proveito das formas próprias ao discurso” (FOUCAULT, [1969] 2006a, p.294), e, nesse caso, viso a apagar, na análise, particularidades da vida do indivíduo Arnaldo Antunes e de seus parceiros5, enquanto pessoas no mundo, em proveito de observar algo da ordem “de vozes históricas, sociais e ideológicas” (FERNANDES, 2012, p.92) que emergirão enquanto discursividade da função de escritor, que da escrita surge como “ser de linguagem”. Enfatizo que trarei alguns recortes de entrevistas de Arnaldo Antunes comentando sobre suas produções. Talvez, para alguns,. Saliento a necessidade de menção aos parceiros por questões de direitos autorais, haja vista que Arnaldo Antunes trabalha em carreira solo, mas mantém parceria com diversos artistas na produção das letras de músicas. 5.

(27) 27. isso possa parecer uma contradição. Entretanto, uma vez que já mencionei o fato de a referência feita pelo autor sobre si mesmo ser também uma representação, não considero isso como contradição, mas, sim, como um meio para vislumbrar isso que se apresenta para todos a todo o momento: a representação e a interpretação. Nesse sentido, a partir da Análise do Discurso que estabelece diálogo com textos de Michel Foucault, com esta pesquisa analisarei algumas produções escritas de Arnaldo Antunes em caráter de autor e/ou de coautor, levando em conta as noções de escrita, de autoria, de poder, de parrhesía e de subjetividade. Em alguns momentos de análise, atrelarei a esses conceitos a noção de identidade; a esse respeito, tomarei como aporte teórico, principalmente, o texto Identidade e diferença: uma introdução teórica e conceitual, de Woodward (2000). Cumpre destacar que a noção de autor, conforme já sucintamente mencionado, será embasada em textos de Foucault, notoriamente no texto de [1969] 2006a: O que é um autor?. Nesse caso, seguindo a noção lá estabelecida, o conceito de coautor também dessa discussão será embasado. É também relevante mencionar que a tese de doutorado de Alves (2013), O autor em cena: Uma investigação sobre a autoria e seu funcionamento na modernidade, auxiliará a escrita dessa tese no que se refere à leitura sobre a noção de autor e autoria em Foucault. O propósito de analisar produções arnaldianas6 se deu porque observei a recorrência do uso de e da menção a nomes7 em diversas dessas produções (tais como Che Guevara, Simone de Beauvoir, Pinochet, Lao Tsé, Stalin, orientupis, ameriquítalos, tupinamboclos etc.), o que me fez indagar a possibilidade de estudo dessas produções a partir da perspectiva foucaultiana sobre escrita, autoria, relações de poder8, parrhesía e produção de subjetividade. Tendo em vista essas observações, as produções arnaldianas 40 escritos (ANTUNES, 2000), Como é que chama o nome disso (ANTUNES, 2006), Outros 40 (2014) e o Site Oficial de Arnaldo Antunes (www.arnaldoantunes.com.br). 6 Embora seja mais comum o uso do sobrenome para derivar um denominador, adotei o primeiro nome em outras pesquisas, por isso, manterei essa denominação aqui para dar coerência a meus trabalhos.. No capítulo 2 desta tese, Caminho teórico-metodológico, há um tópico destinado à discussão sobre o estatuto do nome na produção arnaldiana. Válido destacar que a noção de nome será articulada a partir das reflexões de Saussure e de Foucault acerca dos signos e sua relação com a constituição de enunciado(s), sendo o enunciado a menor partícula do discurso. 7. Acerca da noção de relações de poder, embasar-me-ei no texto O sujeito e o poder (FOUCAULT, 1995), e na introdução do livro Microfísica do Poder (FOUCAULT, [1977] 2012).. 8.

(28) 28. serão meio para a seleção de material para a constituição do corpus9 para análise e realização desta pesquisa. Sendo assim, destaco que levantei algumas perguntas preliminares10 que foram relevantes para o delineamento desta pesquisa, uma vez que um dos pontos de entrada será os nomes, considerados enquanto enunciados proporcionadores de discursividades, em cotejo com a problemática da escrita, da autoria, das relações de poder, da parrhesía e da produção de subjetividade. São elas: a) Qual seria o estatuto do nome nas produções arnaldianas?; b) Em termos de discursividade, o que implica(ria) fazer uso de e/ou menção a esses nomes, em produções arnaldianas, considerando a problemática da parrhesía e a da produção de subjetividade?; c) O que essa escrita pautada em nomes pode suscitar como possibilidade(s) de leitura(s) acerca de aspectos sociais, históricos e culturais materializados via discurso?; d) Haveria uma forma “(des)velada” de materialização de discursos, por meio de nomes, que apontaria para o “escancaramento” das relações de poder; ou, ainda, haveria uma forma “(des)velada” de materialização de discursos que “escancararia” a questão do caráter relacional da resistência e dos mecanismos de poder?; e) Se houver essa forma “(des)velada” de “escancaramento” das relações de poder na materialização de discursos, como essa forma estaria atrelada à noção de parrhesía e de produção de subjetividade?; e f) Existiria, nessa escrita pautada em nomes, a possibilidade de leitura que apontaria para a construção de identidades de sujeitos a partir das relações de poder?. 9 A análise do corpus estará no capítulo 3 – Parrhesía e produção de subjetividade em Arnaldo Antunes: escrita, autoria e poder.. No capítulo teórico-metodológico, essas perguntas se condensam em três perguntas centrais, de modo a se apresentarem mais sucintas porque estabeleço relação mais articulada com os objetivos gerais e específicos. 10.

(29) 29. A partir desses questionamentos, aventei a hipótese de que haveria, nas produções escritas assinadas por Arnaldo Antunes, ou nas produções arnaldianas, um modo “(des)velado” de materialização de discursos que “escancararia” as relações de poder e possibilitaria o exercício da parrhesía e a produção de subjetividade. Esse escancarar as relações de poder se daria por meio da oposição entre discursos, que se materializariam por meio da memória11, submergida em meio aos nomes, na tensão entre o enunciado e o não enunciado via discurso, possibilitando, inclusive, em certos casos, a construção de identidades de sujeitos. Para desenvolver esta pesquisa, como subsídio metodológico para a análise do material e seleção do corpus, embasar-me-ei em A arqueologia do saber (FOUCAULT, [1969] 2004), tomando a noção de enunciado como “a unidade elementar do discurso” (FOUCAULT, [1969] 2004, p.90). Sendo assim, será possível cotejar enunciados de modo a evidenciar possibilidades de materialidade discursiva que permitam vislumbrar a relação entre parrhesía e produção de subjetividade no que tange à escrita, à autoria e ao poder. Assim sendo, objetivando discutir as noções de escrita, autoria e poder a partir da relação entre parrhesía e produção de subjetividade em Arnaldo Antunes, esta tese será dividida em três capítulos – quais sejam: 1. Da relevância de análise das produções arnaldianas; 2. Caminho teórico-metodológico; e 3. Parrhesía e produção de subjetividade em Arnaldo Antunes: escrita, autoria e poder – e algumas conclusões. No primeiro capítulo, apontarei aspectos relevantes quanto ao estudo das produções arnaldianas e justificarei a escolha por estudar essas produções a partir das relações de poder postuladas em textos de Foucault. Já no segundo capítulo, traçarei o caminho teórico-metodológico, de modo a apontar alguns conceitos de suma importância para o desenvolvimento desta pesquisa; quais sejam: nome; enunciação; enunciado; discurso; descontinuidade histórica; escrita; autoria; caráter relacional do poder e formas de resistência; parrhesía e produção de subjetividade; e outros que serão discutidos de modo atrelado a esses conceitos (ser da linguagem, memória, história, sujeito, identidade, diferença, etc.), embasando-me,. Sobre essas questões, embasar-me-ei principalmente em A arqueologia do saber (FOUCAULT, [1969] 2004) e em O tecido da memória: algumas perspectivas do trabalho histórico nas ciências da linguagem (COURTINE, [1981] 2006).. 11.

(30) 30. principalmente, em textos de Foucault e autores que se filiam à perspectiva foucaultiana do discurso. No terceiro capítulo, “Parrhesía e produção de subjetividade em Arnaldo Antunes: escrita, autoria e poder”, analisarei as produções arnaldianas fazendo cotejo com os principais conceitos abordados, a fim de chegar ao objetivo desta tese e observar se a hipótese (de que haveria, nas produções arnaldianas, um modo “(des)velado” de materialização de discursos que “escancararia” as relações de poder e possibilitaria o exercício da parrhesía e a produção de subjetividade) realmente se sustenta. Por fim, em considerações finais, retomarei a discussão acerca da produção arnaldiana e sua relação com a literatura contemporânea, bem como a (re)configuração da noção de parrhesía, no que tange à produção de subjetividade, atrelada às noções de escrita, autoria e poder em Arnaldo Antunes..

(31) 31. I. DA RELEVÂNCIA DA ANÁLISE DE PRODUÇÕES ARNALDIANAS. Não me pergunte quem sou e não me diga para permanecer o mesmo: é uma moral de estado civil; ela rege nossos papéis. Que ela nos deixe livres quando se trata de escrever. (FOUCAULT, [1969] 2004, p.20). Nesse ponto cabem algumas considerações sucintas sobre o modo como podem ser concebidas as produções arnaldianas, bem como a discussão sobre a noção de contemporâneo, de literatura (contemporânea), interpretação, função do analista, prazer do texto, “ser da linguagem” e a relação de sentido entre as palavras e as coisas, para, após, apresentar algumas produções arnaldianas que não serão foco para análise nesse trabalho, mas são campo profícuo para outras análises. Sendo assim, destaco de início que, para alguns, conceber as produções de Antunes como literatura é algo absurdo, e isso poderia causar certo desconforto no decorrer da leitura. Isso, talvez, se dê porque a grande maioria conhece apenas a faceta que se relaciona com a música brasileira, já que, por parte da televisão aberta e das rádios, a divulgação maior se dá por meio das músicas, dos discos e dos dvds. Contudo, Antunes já foi premiado com o Prêmio Jabuti de Poesia, em 1993, com o livro As coisas12, e, em 2004, ganhou o Prêmio Jabuti13, “da Câmara Brasileira do Livro, pelo 1º lugar na CATEGORIA PROJETO e PRODUÇÃO EDITORIAL”14, juntamente com Carlito Carvalhosa e Marcia Xavier, com o livro ET EU TU. Ademais, em 2011, foi “[i]ndicado ao 53ºPrêmio Jabuti de Literatura, na categoria poesia, com o livro “n.d.a” (iluminuras)”15. Dessa forma, a produção de Antunes pode e deve ser considerada como literatura, pois 12. Cf. <http://premiojabuti.com.br/edicoes-anteriores/premio-1993/> Acesso 20 mai. 2015.. 13. Cf. <http://premiojabuti.com.br/edicoes-anteriores/premio-2004/> Acesso 20 mai. 2015.. Cf. site oficial de Arnaldo Antunes – biografia: <http://www.arnaldoantunes.com.br/new/sec_biografia.php> Acesso 20 mai. 2015. A ênfase em letra maiúscula consta do site. 14. Cf. site oficial de Arnaldo Antunes – biografia, e notícias: <http://www.arnaldoantunes.com.br/new/sec_news_list.php?page=23&id=269> Acesso 20 mai. 2015. A alteração entre colchetes [ ] se deu apenas entre a letra maiúscula trocada pela letra minúscula.. 15.

(32) 32. “[g]anhar o Jabuti representa dar à obra vencedora o lastro da comunidade intelectual brasileira, significa ser admitido em uma seleção de notáveis da literatura nacional.”16, conforme consta do próprio site que caracteriza o Prêmio Jabuti. Portanto, Antunes é um dos “notáveis da literatura nacional”, e, dessa forma, concebo que suas produções também podem ser consideradas como literatura contemporânea. Sendo assim, é válido mencionar que tomar como objeto de estudo a literatura contemporânea não significa uma empreitada com menor dificuldade que a tarefa de estudar literatura clássica. Muitos inferem que a literatura contemporânea é de fácil compreensão, descomplicada, inequívoca, porque “fala a linguagem de hoje”, diferentemente da literatura clássica que se distancia nos costumes e nos tipos de linguagem, por exemplo. Entretanto, vou de encontro à vulgata: a literatura contemporânea não é de fácil compreensão; se assim fosse, o texto teria seu(s) sentido(s) pronto(s) para ser(em) apre(e)ndido(s). Se dessa maneira fosse, ao ser lido, o texto teria compreensão quase que simultânea à leitura. Grosso modo, não há relação direta entre leitura e compreensão assim como também não há relação direta entre consumir um alimento e suprir-se ou nutrir-se plenamente. Algo sempre se perde. Conforme quero apontar, o contemporâneo não é de fácil acesso, descomplicado, entendível de imediato, inequívoco. Há especificidades quanto ao estudo do contemporâneo e da contemporaneidade. De acordo com Agamben (2009) em O que é ser contemporâneo?, a contemporaneidade é. uma relação singular com o próprio tempo, que adere a este e, ao mesmo tempo, toma distância dele. Mais exatamente, é “essa relação com o tempo que adere a este, por meio de uma defasagem e de um anacronismo”. Os que coincidem de um modo excessivamente absoluto com a época, que concordam perfeitamente com ela, não são contemporâneos, porque, justamente por essa razão, não conseguem vê-la, não podem manter seu olhar fixo nela. (AGAMBEN, 2009, p.1. Aspas do autor. Negritos meus.). Além disso, esse filósofo italiano assevera que, para que seja considerado contemporâneo, também é preciso não se cegar pelas luzes do século e enxergar nessas luzes sua escuridão, sua parte de sombras, pois. Fonte <http://premiojabuti.com.br/o-jabuti/> Acesso 20 mai. 2015. Assim como na nota anterior, a alteração entre colchetes [ ] se deu apenas entre a letra maiúscula trocada pela letra minúscula. 16.

(33) 33. contemporâneo é aquele que percebe a sombra de seu tempo como algo que lhe incumbe e que não cessa de interpelá-lo, algo que, mais do que qualquer luz, se refere direta e singularmente a ele. Quem recebe em pleno rosto o feixe de trevas que provém de seu tempo. (AGAMBEN, 2009, p.3). E, mais que isso: Agamben (2009) alerta para o fato de o contemporâneo não ser apenas aquele que, “percebendo a sombra do presente, apreende sua luz invendável” (AGAMBEN, 2009, p.7); o contemporâneo é inclusive aquele que tem condições de transformar o tempo e “colocá-lo em relação com outros tempos, ler nele a história de maneira inédita, ‘encontrar-se’ com ela segundo uma necessidade que não provém absolutamente de seu arbítrio, mas de uma exigência à qual ele não pode responder” (AGAMBEN, 2009, p.7). Consoante a esse filósofo, o contemporâneo seria, portanto, capaz de tomar “essa luz invisível que é a escuridão do presente” e projetar “sua sombra sobre o passado”, de modo a fazer com que este, “tocado por seu feixe de sombra”, adquira “a capacidade de responder às trevas de agora” (AGAMBEN, 2009, p.7). Destaco que Agamben (2009, p.7) afirma que talvez tenha sido esse o movimento de pensamento feito por Foucault quando “escrevia que suas indagações históricas sobre o passado são só a sombra projetada por sua interrogação teórica do presente”. Assim, segundo o que é apontado por Agamben (2009) e também pelas leituras dos textos foucaultianos, é pertinente mencionar que Foucault escreve a partir do lugar do olhar contemporâneo, enxergando luzes nas sombras e vislumbrando sombras nas luzes. Esse também é o funcionamento da escrita nas produções arnaldianas, em uma alternância entre (des)velado e escancarado, em que elementos do passado se projetam no presente de modo a promover a reflexão do passado para se compreender o presente. Ainda sobre o contemporâneo, no livro Reviravolta linguístico-pragmática na filosofia contemporânea, Oliveira (2001) afirma uma questão que vai ao encontro daquilo que Agamben (2009) expôs: “Vivemos num tempo em que as ‘evidências’ são postas em questão. O ‘mundo de sentido’ que nos gerou historicamente parece tender a desaparecer, pois sua validade é posta em dúvida” (OLIVEIRA, 2001, p.417. Aspas do autor), isso porque, de acordo com Oliveira (2001), hoje, a pretensão à racionalidade é ponto de desconfiança; antes, essa pretensão era o ponto cerne do mundo. É essa.

(34) 34. desconfiança, esse olhar para a sombra nas ou das luzes da contemporaneidade que motiva a leitura da literatura contemporânea. Sendo assim, nessa caminhada em que se desconfia “de um sentido unificador a partir de onde pudéssemos situar no todo de nossa experiência” (OLIVEIRA, 2001, p.417), estudar a escrita de autores da literatura contemporânea torna-se um desafio; um desafio, sobretudo, prazeroso. Desafio: por ter caráter contemporâneo, muito do que constitui sóciohistórica e culturalmente a escrita da literatura contemporânea também constitui o sujeito que ocupa a posição de analista e/ou de leitor dessa escrita. Isso pode implicar e, ouso dizer, certamente implica uma análise ou uma leitura que, por vezes, silencia interpretações que seriam possíveis somente àquele que se inscreve sóciohistoricamente em outro lugar, em outro espaço de acontecimentos históricos. Por esse motivo, imerso a um determinado lugar de verdade, não se é possível ter visão do todo. Nesse sentido, essa análise e essa leitura são um desafio e não um problema, pois a completude de uma análise e/ou de uma leitura está inscrita apenas no que é da ordem de um imaginário que conforta. É sabido: o sentido não é único, a interpretação não se fecha. A esse respeito, Orlandi (2007) orienta que a interpretação tem estatuto duplo: do ponto de vista do intérprete comum e do ponto de vista do analista. No que se refere ao intérprete comum, a interpretação se dá “em primeira instância, sendo ela um passo anterior à compreensão” (ORLANDI, 2007, p.151), como se fosse algo imediatamente após a leitura, seguida da compreensão. Desse modo, ao que parece, a interpretação para o intérprete comum, sob essa perspectiva, estaria mais relacionada ao entendimento do conteúdo, e, por isso, “qualquer sujeito, desde que esteja diante de um objeto simbólico, interpreta” (ORLANDI, 2007, p.151). Destaco: não concebo o “intérprete comum” com valor subestimado. Acredito que os “não analistas” também conseguem estabelecer relações e batimentos com questões que os cercam, saindo da leitura rasa de mera constatação de conteúdo. Talvez o diferencial entre “interprete comum” e “analista” esteja justamente no batimento entre interpretação, teoria e método. Nesse caso, justificar-se-ia dizer que a análise do “analista” estaria mais bem fundamentada que a de um “intérprete comum”, pois se acredita que o intérprete comum não faria tal batimento. Ademais, algo ainda deve ser dito sobre a interpretação:.

(35) 35. a compreensão – que se dá no batimento da relação descrição/interpretação – inclui a reflexão do analista sobre a forma material (em que são indissociáveis forma/conteúdo) e daí resulta uma relação regulada (atravessada pela teoria mas não estática nem fechada) com a interpretação (ORLANDI, 2007, p.151. Parênteses da autora).. Sendo assim, à luz da teoria e do método que pratica, o analista interpreta os resultados de sua análise ao realizar a descrição/interpretação. Sobre a relação entre descrição e interpretação, Pêcheux ([1983] 2006, p.54) afirma: “dizer que não se trata de duas fases sucessivas, mas de uma alternância ou de um batimento, não implica que a descrição e a interpretação sejam condenadas a se entremisturar no indiscernível”. Ademais,. dizer que toda descrição abre sobre a interpretação não é necessariamente supor que ela abre sobre ‘não importa o que’: a descrição de um enunciado ou de uma sequência coloca necessariamente em jogo [...] o discurso-outro como espaço virtual de leitura desse enunciado ou dessa sequência. (PÊCHEUX, [1983] 2006, p.54. Aspas do autor. Negrito meu).. Válido destacar: uma vez existindo sujeito implicado, a interpretação não é dotada de “‘neutralidade’ de um sentido ‘puro’ ou ‘verdadeiro’” (ORLANDI, 2007, p.151. Aspas da autora), pois apresenta gestos de interpretação possíveis; ou seja, o analista tem responsabilidade sobre aquilo que apresenta como análise. Nesse ponto também se encontra parte desse desafio, com o qual busquei lidar no processo de escrita. Prazeroso: estudar algo da literatura possibilita entrar em contato com diversas temáticas, as quais podem surpreender o leitor e o analista devido à, por exemplo, tamanha complexidade de relações linguísticas, sociais, históricas e culturais, levando-os para outros lugares (contemporâneos ou não à escrita e, a posteriori, à leitura). Com a literatura, surge a possibilidade de se situar em um lugar (a)temporal, em um mo(vi)mento de abrir e fechar relações com espaços de acontecimentos históricos e fazer relações outras com os enunciados que ali apresentam-se constituindo (um) discurso(s). Daí o motivo de ser prazeroso. Todavia, friso que o sentido de prazer aqui tomado não está para a ordem de uma distração. Trata-se, ao contrário, de um.

(36) 36. prazer que promove o desejo de produzir relações e, inclusive e especificamente nesse caso, construir um corpus para análise. Saliento que, embora se nomeie a literatura como contemporânea, não há uma necessidade e uma obrigatoriedade de se escrever apenas e tão somente sobre o contemporâneo. O fazer literário perpassa por uma determinada liberdade, a qual possibilita, inclusive, sair do lugar da continuidade de fatos e dar saltos entre a unidade e a dispersão histórica sem prejuízo do produto, como poderá ser observado a partir da análise das letras das músicas e dos escritos de Antunes. Dessa maneira, refletindo sobre a unidade e a dispersão, na literatura contemporânea a descontinuidade da história também pode ser, e muitas vezes é, manifesta; daí a importância de se ponderar sobre isso que se coloca como sombra nas luzes da contemporaneidade, e, também, no que seja (a)temporal: a escolha temática, o modo de escrita, os acontecimentos passíveis de emergir via discursividades etc.. Isso, do mesmo modo, torna essa leitura desafiadoramente prazerosa. Ainda sobre a questão do estudo da literatura contemporânea como desafio prazeroso, outro aspecto deve ser discutido. Mencionei na introdução algo sobre o “ser da linguagem”, e esse assunto está relacionado, também, ao desafio prazeroso: tanto da escrita quanto da leitura. No livro As palavras e as coisas, Foucault ([1966] 2007, p.58) coloca em pauta a discussão sobre a experiência da linguagem, que permite fazer menção ao que seria o “ser da linguagem”. Segundo ele, a partir do Renascimento, concebia-se a linguagem como aquela que “existe primeiramente em seu ser bruto e primitivo, sob a forma simples, material, de uma escrita, de um estigma sobre as coisas, de uma marca espalhada pelo mundo e que faz parte de suas mais indeléveis figuras” (FOUCAULT, [1966] 2007, p.58); nesse caso, a linguagem se apresenta como única e absoluta. Há também a forma de comentário, que à linguagem se enquadra, retomando “os signos com um novo propósito” (FOUCAULT, [1966] 2007, p.58). Além disso, existe “o texto, cujo comentário supõe a primazia oculta por sob as marcas visíveis a todos” (FOUCAULT, [1966] 2007, p.58). Esses são os três níveis da linguagem que partem “do ser único da escrita” (FOUCAULT, [1966] 2007, p.58), portanto, a linguagem é ternária, mas se apresenta como uma figura única. Entretanto, esse ser único da escrita, “a linguagem, como escrita material das coisas, não achará mais seu espaço senão no regime geral dos signos representativos” (FOUCAULT, [1966] 2007, p.59); com isso, não seria possível reconhecer se o signo.

Referências

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