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Argumentação oral em contexto de debate : uma proposta de intervenção didáctica no ensino secundário

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Academic year: 2021

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Relatório da Prática de Ensino Supervisionada

Argumentação Oral em Contexto de Debate:

Uma Proposta de Intervenção Didáctica no Ensino Secundário

Patrícia Maria Pereira Alves

Mestrado em Ensino de Português e Línguas Clássicas

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Universidade de Lisboa

Relatório da Prática de Ensino Supervisionada

Argumentação Oral em Contexto de Debate:

Uma Proposta de Intervenção Didáctica no Ensino Secundário

Patrícia Maria Pereira Alves

Mestrado em Ensino de Português e Línguas Clássicas

Orientador: Professora Doutora Ana Isabel Mata

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AGRADECIMENTOS

Foram algumas as pessoas que me ajudaram e contribuíram para a realização deste trabalho, que só se tornou possível graças à sua preciosa colaboração. É a elas que quero deixar, aqui, a minha sincera gratidão.

À Professora Doutora Ana Isabel Mata, orientadora deste trabalho, por me ter levado a percorrer novos caminhos, uma grande aventura que se revelou muito gratificante. Agradeço tantas palavras de incentivo, a paciência, os sábios comentários, os valiosos conselhos e todos os ensinamentos.

À Dra. Cristina Duarte, professora cooperante, por ter disponibilizado a sua turma, viabilizando o presente trabalho. O meu agradecimento por todas as sugestões e pelos conhecimentos que sempre me transmitiu, que enriqueceram, sem dúvida, a minha aprendizagem e a minha formação, enquanto futura professora.

Ao professor António Souto por, tão prontamente, aceitar colaborar comigo neste desafio, ao disponibilizar a sua turma, como turma de controlo.

Aos alunos do 12.º ano que tomaram parte neste estudo pela participação e envolvimento no trabalho proposto.

Aos meus amigos, principalmente à Patrícia Francisco, pela ajuda, pelo apoio, pela paciência e pela compreensão nos momentos de desânimo, e pelo seu admirável sentido de humor que muito contribuiu para os superar, e ao Luís Neves pela ajuda prestada.

Às minhas primas Carla e Sandra Sacramento por acreditarem sempre em mim, por serem amigas e as minhas «irmãs». Sobretudo à Carla, pela presença constante nos momentos de desalento, apesar dos cerca de 500 km de distância. Um agradecimento também ao meu primo Marco Costa pela ajuda prestada e pela prontidão que manifestou.

Ao Bruno pela valiosa ajuda, mas antes de mais por estar ao meu lado, pela compreensão, pela paciência com que tolerou as minhas alterações de humor e por ter entendido as minhas ausências.

À minha avó Almerinda (in memoria) pelo carinho, preocupação e zelo constantes pelo meu bem-estar, enquanto lhe foi possível acompanhar-me nesta caminhada, e porque acredito que continua a olhar por mim mesmo depois disso.

Aos meus pais, a quem dedico este trabalho, porque são os pilares em que assenta a minha vida. Um agradecimento muito especial pelo amor, pelo carinho, pela dedicação, pela paciência, pela compreensão, por acreditarem em mim, pelo apoio incondicional e por não me deixarem desistir, por serem para mim um exemplo de que com força e perseverança conseguimos ultrapassar os obstáculos que se nos colocam.

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RESUMO

Este relatório tem como objecto o desenvolvimento de capacidades de argumentação oral em situação de debate, no Ensino Secundário, já que é um domínio de indiscutível importância na formação do aluno, na escola, para além da escola e ao longo da vida, e em que, como apontado em diversos estudos, os alunos manifestam dificuldades.

O seu principal objectivo é apresentar uma intervenção didáctica desenhada no âmbito da prática de ensino supervisionada e implementada numa turma do 12.º ano da Escola Secundária de Camões, com o intuito de contribuir para a promoção do ensino do oral formal na aula de Português. A intervenção didáctica desenvolveu-se na turma alvo, fundamentalmente em três fases, ao longo de seis aulas de noventa minutos: produção inicial (1.ª fase), sequência didáctica de quatro oficinas de argumentação oral em contexto de debate (2.ª fase) e produção final (3.ª fase). A 1.ª e 3.ª fases, que desempenham a função de pré-teste e pós-teste, foram aplicadas também a uma outra turma do 12.º ano, que constituiu a turma de controlo.

Os resultados mostram que, ao contrário da turma de controlo, em que praticamente não se regista evolução, a turma alvo apresenta, de um modo geral, progressos significativos do pré-teste para o pós-teste, ainda que continuem a verificar- -se dificuldades em alguns aspectos. Permitem corroborar a ideia de que urge trabalhar a argumentação oral de forma explícita e sistemática, como objecto de programação e de avaliação específicas, equiparado à leitura e à escrita.

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ABSTRACT

The object of this report is the development of oratory competences, within a debate context, in Secondary Education. This is an area of unquestionable value in the formation of a student, at school, after school and, hereafter, throughout life, and in which, as several studies have indicated, students show difficulties.

The main purpose of this report is to present a didactical intervention delineated

in the context of a supervised teaching practice and implemented in a 12th grade class at

Escola Secundária Luís de Camões (High School Luís de Camões), aiming to promote the teaching of oracy in Portuguese. This didactic intervention was developed at the target class fundamentally in three phases, during six classes of ninety minutes each:

initial production (1st stage); didactic sequence of four workshops of oral argumentation

within a debate context (2nd stage) and final production (3rd stage). The 1st and 3rd

phases, that function as pre-test and post-test, have been applied to other 12th grade

class, which was the control class.

The results show that, unlike the control class, where we find practically no evolution, the target class reveals, in general, significant evolution from the pre-test to the post-test. Although one can still observe difficulties in some aspects, this results support the idea that it is important to work oral argumentation in an explicit and systematic way, as an object of specific programming and evaluation, at the same level of reading and writing practices.

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ÍNDICE

AGRADECIMENTOS ... I RESUMO... II ABSTRACT...III CAPÍTULO 1 INTRODUÇÃO ...1

1.1. Objecto de estudo e objectivos ... 1

1.2. Estrutura do relatório ... 8

CAPÍTULO 2 ENQUADRAMENTO...9

2.1. Modelos didácticos de ensino da oralidade... 9

2.2. A Retórica e a argumentação oral ... 15

2.2.1. A situação comunicativa... 18

2.2.2. Estrutura do discurso argumentativo ... 20

2.2.3. Conectores discursivos e recursos modalizadores... 23

2.2.3.1. Conectores discursivos... 23

2.2.3.2. Recursos modalizadores... 24

2.2.4. A actio e os códigos não verbais ... 30

2.2.4.1. Elementos relacionados com a voz ... 31

2.2.4.2. Códigos não verbais ... 33

2.2.5. Técnicas argumentativas ... 34

CAPÍTULO 3 METODOLOGIA ...36

3.1. Desenho da intervenção didáctica... 36

3.2. Selecção dos materiais orais de input ... 43

3.3. Caracterização das turmas... 44

3.3.1. Turma alvo... 44

3.3.2. Turma de controlo ... 46

CAPÍTULO 4 DESCRIÇÃO DA INTERVENÇÃO DIDÁCTICA...48

4.1. Pré-teste/Pós-teste ... 52

4.2. Sequência didáctica de argumentação oral em contexto de debate... 59

4.2.1. Oficina 1: Compreensão oral e leitura da imagem ... 60

4.2.1.1. Parte I – Os principais intervenientes no debate e respectivas funções ... 60

4.2.1.2. Parte II – Os gestos, os movimentos, a organização do espaço e a actio... 65 4.2.2. Oficina 2: À (Re)Descoberta dos conectores discursivos e dos recursos

(7)

4.2.3. Oficina 3: Planificação e produção oral de discurso argumentativo em contexto de

debate – Parte I ... 74

4.2.4. Oficina 4: Planificação e produção oral de discurso argumentativo em contexto de debate – Parte II... 83

4.3. Instrumentos de avaliação da expressão oral construídos... 89

4.3.1. Análise do desempenho dos alunos na oficina 4 ... 97

CAPÍTULO 5 ANÁLISE E DISCUSSÃO DOS RESULTADOS ...98

5.1. Resultados obtidos em situação de pré-teste e pós-teste de acordo com as pontuações gerais... 99

5.2. Resultados obtidos, por parâmetros, em situação de pré-teste e pós-teste... 101

5.2.1. Turma alvo... 101

5.2.2. Turma de controlo ... 104

5.3. Resultados de cada aluno, por parâmetro de avaliação, em situação de pré-teste e pós- -teste... 107

5.3.1. Turma alvo... 107

5.3.2. Turma de controlo ... 122

5.4. Análise comparativa, por parâmetros, dos resultados obtidos em ambas as turmas ... 140

CAPÍTULO 6 CONCLUSÕES E REFLEXÃO FINAL ...143

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS...149

ANEXOS ...158

Anexo 1 Planificação da Sequência Didáctica e Planos de Aula ... 159

1.1.Planificação da Sequência Didáctica………...160

1.2.Plano de Aula – Pré-teste/Pós-teste………...166

1.3.Plano de Aula – aula 1………...169

1.4.Plano de Aula – aula 2………...172

1.5.Plano de Aula – aula 3………...175

1.6.Plano de Aula – aula 4………...178

Anexo 2 Materiais Didácticos Construídos para a Intervenção Didáctica ... 181

2.1.Guião de Planificação do Discurso – Pré-teste/Pós-teste ………...182

2.2.Documento de Suporte à Preparação do Tema – Pré-teste/Pós-teste...185

2.3.Ficha de Compreensão Oral e Leitura da Imagem – Parte I ……...187

2.4.Ficha de Compreensão Oral e Leitura da Imagem – Parte II………...191

2.5.Ficha de Trabalho: Conectores e Recursos Modalizadores…………...193

2.6.Quadro de Sistematização dos Conectores Discursivos mais Específicos do Discurso Argumentativo...196

(8)

2.7.Quadro de Sistematização dos Recursos Modalizadores…...197 2.8.Guião de Planificação do Discurso – Parte I………...199 2.9.Documento de Suporte à Preparação do Tema – aula 3…...204

2.10. Cartão com a Designação, a Descrição e Exemplos de Diferentes Tipos de Argumentos………...206

2.11.Ficha de Trabalho: Reflexão sobre as Produções Orais………...207 2.12.Guião de Planificação do Discurso – Parte II………...223 Anexo 3

Instrumentos de Avaliação Construídos ... 227 3.1.Modelo de Avaliação: Níveis de Desempenho Analíticos………...228 3.2. Grelha de Classificação – Turma Alvo: Pré-teste (situação 1) e Pós-teste (situação 2)...233 3.3. Grelha de Classificação – Turma de Controlo: Pré-teste (situação 1) e Pós- -teste (situação 2)...234 Anexo 4

Transcrições Ortográficas ... 235 4.1.Lista das Convenções Utilizadas nas Transcrições Ortográficas...236 4.2. Transcrição dos Discursos Produzidos pelos Alunos da Turma Alvo Durante as Oficinas de Argumentação Oral………...237 4.3.Transcrição dos Discursos Produzidos pelos Alunos da Turma Alvo no Pré-teste e no Pós-teste ………...242 4.4. Transcrição dos Discursos Produzidos pelos Alunos da Turma de Controlo no Pré- -teste e no Pós-teste ………...251 Anexo 5

Reprodução dos Registos Escritos das Planificações dos Discursos ... 262 5.1. Reprodução dos Registos Escritos das Planificações dos Discursos Elaborados pelos Alunos da Turma Alvo, Durante as Oficinas de Argumentação Oral...263 5.2. Reprodução dos Registos Escritos das Planificações dos Discursos Elaborados pelos Alunos da Turma Alvo, no Pré-teste e no Pós-teste………...268 5.3. Reprodução dos Registos Escritos das Planificações dos Discursos Elaborados pelos Alunos da Turma de Controlo, no Pré-teste e no Pós-teste…...277

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ÍNDICE DE FIGURAS

Figura 1: Esquema da sequência didáctica de ensino dos géneros orais formais (Dolz & Schneuwly,

1998)...10

Figura 2: Modelo didáctico da produção oral na aula de Francês, no secundário (Lafontaine, 2001)11 Figura 3: Esquema da sequência argumentativa prototípica (Adam, 2005: 118) ...21

Figura 4: Esquema da estrutura lógica do discurso argumentativo (inspirado em Cros, 2005)...22

Figura 5: Mecanismos utilizados para exprimir diferentes graus de certeza, de acordo com Grau (2003 e 2005) ...28

Figura 6: Intervenção didáctica sobre a argumentação oral em contexto de debate. ...38

Figura 7: Desenho da intervenção didáctica ...40

Figura 8: Situação socioprofissional dos pais dos alunos – turma alvo ...45

Figura 9: Habilitações Literárias dos pais dos alunos – turma alvo...45

Figura 10: Situação socioprofissional dos pais dos alunos – turma de controlo ...46

Figura 11: Habilitações Literárias dos pais dos alunos – turma de controlo...47

Figura 12: Quadro síntese da intervenção didáctica ...51

Figura 13: Esquema da estrutura do discurso ...86

Figura 14: Níveis de Desempenho ...97

Figura 15: Desempenhos dos alunos da turma alvo de acordo com as pontuações gerais...97

Figura 16: Evolução dos alunos da turma alvo de acordo de com as pontuações gerais ...99

Figura 17: Evolução dos alunos da turma de controlo de acordo com as pontuações gerais...99

Figura 18: Pré-teste – Níveis de desempenho da turma alvo nos diferentes parâmetros de avaliação...102

Figura 19: Pós-teste – Níveis de desempenho da turma alvo nos diferentes parâmetros de avaliação...103

Figura 20: Pré-teste – Níveis de desempenho da turma de controlo nos diferentes parâmetros de avaliação ...104

Figura 21: Pós-teste – Níveis de desempenho da turma de controlo nos diferentes parâmetros de avaliação ...106

Figura 22: Evolução do aluno AP nos diferentes parâmetros de avaliação ...107

Figura 23: Evolução do aluno AR nos diferentes parâmetros de avaliação ...110

Figura 24: Evolução do aluno MA nos diferentes parâmetros de avaliação ...114

Figura 25: Evolução do aluno AC nos diferentes parâmetros de avaliação ...118

Figura 26: Evolução do aluno DG nos diferentes parâmetros de avaliação...122

Figura 27: Evolução do aluno AC nos diferentes parâmetros de avaliação ...124

Figura 28: Evolução do aluno JS nos diferentes parâmetros de avaliação...127

Figura 29: Evolução do aluno SA nos diferentes parâmetros de avaliação ...129

Figura 30: Evolução do aluno TS nos diferentes parâmetros de avaliação...131

Figura 31: Evolução do aluno FL nos diferentes parâmetros de avaliação...134

(10)

CAPÍTULO 1

INTRODUÇÃO

Este primeiro capítulo constitui uma introdução ao relatório, de modo a proporcionar ao leitor uma visão global do trabalho realizado no âmbito da prática de ensino supervisionada. É composto por duas secções: na primeira secção apresenta-se o objecto de estudo, expõem-se as principais motivações da realização deste trabalho e enunciam-se os objectivos do relatório; na segunda secção, são apresentados os restantes capítulos.

1.1. Objecto de estudo e objectivos

Este relatório tem como objecto o desenvolvimento de capacidades de argumentação oral, em situação de debate, de alunos do Ensino Secundário. O trabalho sobre o debate, enquanto género público e formal do oral, permite aos alunos participar numa situação real de comunicação e adquirir ou desenvolver capacidades de argumentação oral, tais como as de planificação e de produção oral de discurso argumentativo, a um nível mais lato, e de selecção de informação pertinente e sua utilização com coerência, construção de uma argumentação e de uma contra- -argumentação, elaboração de uma estrutura textual e lógica e utilização de mecanismos linguísticos do discurso argumentativo, a um nível mais estrito. Possibilita também o desenvolvimento de outras capacidades fundamentais, a diferentes níveis,

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e social, que são transferíveis para outros domínios da vida escolar e da vida pública. O campo da argumentação é, como se sabe, bastante amplo, o que impõe, necessariamente, uma selecção dos aspectos a trabalhar no âmbito de uma intervenção didáctica. Pretendendo-se trabalhar com os alunos a planificação de discurso argumentativo e a sua proferição em situação de debate, restringiu-se o estudo aos seguintes aspectos: tomada de posição; definição de uma tese; elaboração de um discurso estruturado em três partes bem definidas (introdução, desenvolvimento e conclusão); construção de argumentos de diferentes tipos; antecipação de eventuais contra-argumentos dos adversários para cada um dos argumentos apresentados e inclusão dos mesmos, de forma ajustada, no próprio discurso, rebatendo-os antecipadamente; utilização de conectores adequados e diversificados, de forma a garantir a coesão do discurso; uso adequado de recursos de modalização, tendo em conta a situação comunicativa; e construção de um esquema da estrutura lógica da argumentação. Além destes foram ainda abordados, de modo breve, aspectos como o uso dos códigos paraverbais, quinésicos e proxémicos; a utilização da voz, no que se refere à entoação, às pausas, aos acentos de intensidade, à velocidade de fala, ao volume e à dicção, e da postura física, no que respeita à expressividade do rosto. Procurou-se, por conseguinte, incidir sobre capacidades argumentativas mobilizadas aquando da participação numa situação de comunicação oral formal como o debate, que é, por excelência, o lugar do discurso argumentativo.

A oralidade, tal como a escrita, é um domínio de suma importância, em qualquer momento do percurso escolar do aluno e ao longo de toda a sua vida para além da escola. A importância da oralidade não é recente. Na verdade, este domínio era já extremamente valorizado na Antiguidade Clássica, uma vez que a retórica e a argumentação faziam parte do currículo dos jovens, desde cedo. As escolas de oratória proliferavam, com o intuito de tornar os alunos exímios na ars dicendi, ou seja, na arte de argumentar para convencer e persuadir. Esta situação é inequívoca quando se lêem excertos como o seguinte:

«os que foram criados desde início como homens livres não se conhecem pela coragem, riqueza ou qualidades dessa espécie, mas se distinguem sobretudo pela maneira de falar, e é este o sinal mais seguro da educação de cada um de nós, e aqueles que sabem usar bem a palavra, não só são poderosos no seu país, como honrados nos outros.» (Isócrates, Panegírico, 47-49, apud Pereira, 1995: 302-303)

(12)

Para os clássicos, o domínio do oral é uma questão de mestria no uso da língua mas também de honra. De um ponto de vista actual, diferentes autores defendem que a oralidade assume um papel de indiscutível importância no ensino-aprendizagem da língua materna (Aldeia, 2005; Lobo, 2002; Mata, 1992, 1999, 2004; Santos, 2000) e basilar no exercício da cidadania (Dolz & Schneuwly, 1998; Lafontaine, 2000; Lebre- -Peytard, 1990; Roulet, 1991; Sousa, 2006).

Há também autores que defendem que o trabalho sobre o oral formal, enquanto objecto de ensino explícito e sistemático, tem reflexos positivos ao nível da escrita. Esta ideia faz todo o sentido, uma vez que a produção de um discurso oral formal e preparado tem como suporte a escrita. A planificação do discurso argumentativo, por exemplo, inclui a definição de uma tese, o esboço dos principais argumentos e contra- -argumentos, entre outros procedimentos, que ajudarão os alunos na redacção de textos escritos, nomeadamente de textos argumentativos. Auriac-Peyronnet (2001) demonstrou que o treino da produção de discursos argumentativos orais por crianças de onze anos contribuiu para melhorar a escrita de textos argumentativos.

A oralidade é, igualmente, um domínio em que os alunos manifestam várias dificuldades, nomeadamente quando são confrontados com tarefas de produção de discursos orais formais. A partir da consulta do documento intitulado Dificuldades dos

alunos em Língua Portuguesa1, verifica-se que os discentes do 8.º ano de escolaridade,

chamados a participar numa situação de debate, revelam dificuldades:

«- inerentes à timidez, insegurança e falta de hábitos de trabalho com esta competência;

- em produzir argumentos e contra-argumentos; - em manter a orientação da argumentação;

- em apresentar exemplos que sustentem a argumentação;

- em reformular a opinião em função dos argumentos dos outros; - em formular conclusões.»

(Rodrigues et al., 2008: 15) Quanto aos alunos de 10º. e 11º. anos que participaram numa situação de interacção verbal e numa situação de exposição oral, observa-se que manifestam dificuldades:

1 Este faz parte do documento Diagnóstico de Dificuldades dos Alunos que reflecte a intervenção

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«- em respeitar regras de interacção verbal; - em tomar parte na discussão;

- em desenvolver estratégias argumentativas.»

(idem, ibidem: 16) Além das dificuldades expostas no referido documento, conhecem-se outras, reveladas por estudos feitos para outras línguas como, por exemplo, o Catalão. Cros e Vilá (2003) analisaram as dificuldades mais comuns dos alunos em situações de comunicação oral formal, relacionando-as com as três fases de elaboração do discurso, apontadas pela retórica: inuentio, dispositio e elocutio.

No que respeita à inuentio, são referidas a «falta de conhecimentos gerais, enciclopédicos», a «falta de conhecimentos sobre as situações», a dificuldade em «gerar e seleccionar as ideias ou os argumentos» e «o desconhecimento das convenções de alguns dos géneros que se lhes pede para prepararem» (idem, ibidem: 95 -96).

Relativamente à dispositio, são mencionados como problemas a «desordem na organização dos conteúdos» e o «uso de conectores incorrectos ou repetitivos» (idem, ibidem: 95, 97-98). O primeiro dos problemas referidos diz respeito à necessidade de garantir a ordenação e a progressão dos conteúdos, manifestando-se as dificuldades dos alunos na elaboração de ideias complexas. No trabalho sobre a argumentação, estes revelam dificuldades na justificação dos argumentos.

No que se refere à elocutio, os problemas dos alunos prendem-se com: « Falta de controlo sobre aspectos linguístico-discursivos: - Imprecisões, confusões lexicais e uso excessivo de bordões; - Falta de concordância, sintaxe truncada e frases incompletas; - Mudanças de registo involuntárias;

Falta de estratégias para tornar o discurso mais comunicativo e mais agradável:

- Ausência de reiteração: reformulação, focalização; - Não se utilizam exemplos ou elementos ilustrativos; - Não se procura a implicação dos receptores;

Falta de controlo sobre a modalização;

Falta de controlo sobre os elementos supra-segmentais (ênfase expressivo, dicção, velocidade, etc.) e não verbais (imagem e atitude, olhar, gestos, etc.);

Falta de integração coordenada destes elementos no discurso».

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Como se pode verificar, são várias as dificuldades manifestadas pelos discentes na produção de discursos orais formais.

Deve acrescentar-se, ainda, que a competência de comunicação oral, e quando se fala em comunicação oral fala-se em compreensão e em expressão oral, é apresentada como nuclear no ensino-aprendizagem do Português, nos documentos programáticos, nomeadamente no Programa de Português 10.º, 11.º e 12.º anos: Cursos Científico- -Humanísticos e Cursos Tecnológicos. Nele, podem encontrar-se indicações no sentido de se considerar o oral como um objecto de ensino autónomo e de o trabalhar em sala de aula enquanto tal, como se pode verificar no excerto seguinte:

«Do ponto de vista exclusivo da disciplina, dada a complexidade da comunicação oral, que associa os códigos verbal, paraverbal e não verbal, torna-se imperativo conceder a este domínio um estatuto autónomo no processo de ensino-aprendizagem, embora em articulação com os domínios da leitura e da escrita. Deverão ser introduzidos nas aulas de Português espaços de ensino-aprendizagem da língua portuguesa-padrão, do oral reflectido e de géneros públicos e formais do oral, tanto ao nível da compreensão como da produção, instituindo o aluno como ouvinte activo e locutor de

pleno direito.»2 (2002: 18).

Apesar destas evidências, a escola tem encarado o oral mais como um meio para aprender, isto é, como meio para transmitir conteúdos diversificados, do que como um objecto de estudo por si só, alvo de uma planificação e de uma avaliação específicas. O oral tem ocupado, portanto, um lugar de desprestígio no ensino da língua materna (Figueiredo, 2004; Lobo, 2002; Pietro & Wirthner, 1996, apud Dolz & Schneuwly, 1998). Historicamente, o ensino do oral é um produto tardio. Até aos anos sessenta, o termo «oral» não era referido nos documentos oficiais para o ensino nem nos manuais escolares. Só posteriormente se começou a mencionar a necessidade de reflectir sobre a comunicação e de o oral ser trabalhado em diferentes situações em que os alunos sejam detentores da palavra, com vista à aquisição de competências comunicativas. Se do ponto de vista programático o oral ganhou espaço, ao nível das práticas em sala de aula,

(15)

não é tido como objecto de ensino autónomo (Dolz & Schneuwly, 1998; Figueiredo, 2004).

Actualmente, o oral continua a enfrentar o mesmo problema. Segundo Figueiredo, «O único ‘oral’ que se ensina hoje nas nossas escolas está ainda ligado à escrita. […] O oral não é concebido com um objecto de estudo escolar e a prova disso é que o seu ensino e aprendizagem não é prática corrente no quotidiano das aulas.» (2004: 50-51).

O relatório intitulado O Ensino e a Aprendizagem do Português na Transição do Milénio (2001), da Associação de Professores de Português (APP), dá uma visão clara do lugar do oral formal na aula de Português. Neste, pode ler-se que alguns professores dizem que começam a treinar a oralidade no início do 3º ciclo, a qual acaba por ser secundarizada, segundo estes, em virtude da «falta de tempo» para cumprir um «programa extenso». Acaso a compreensão oral e a expressão oral não são contempladas no Programas de Português do Ensino Básico e no Programa de Português 10.º, 11.º e 12.º anos? Nota-se, aqui, uma incongruência, já que, se há a preocupação de cumprir o programa, o oral deveria integrar os conteúdos a leccionar, uma vez que faz parte dos conteúdos que vêm nos programas.

Em outros países, a situação na língua materna parece ser a mesma, já que um inquérito realizado pelos francófonos Pietro e Wirthner (1996, apud Dolz & Schneuwly, 1998), sobre a prática dos professores, resultou em constatações como as seguintes:

«- l’oral est surtout travaillé comme une passerelle pour l’apprentissage de l’écrit;

- les enseignants analysent l’oral à partir de l´écrit;

- l’oral est bien présent en classe, mais dans ses variantes et ses «normes» scolaires au service de la structure formelle écrite de la langue ;

- la lecture à haute voix, c’est-à-dire l’écrit oralisé, représente l’activité orale la plus fréquemment pratiquée (70% des enseignants interrogés).»

(Dolz & Schneuwly, 1998: 61-62). Verifica-se, pois, um certo desconforto por parte dos professores, relativamente ao ensino do oral, em particular em relação ao oral como um objecto de ensino autónomo, equiparado à leitura e à escrita.

Para tal têm sido apontadas várias razões entre as quais se destacam as seguintes: a inexistência de uma tradição de ensino e avaliação do oral formal; a escassez, quase ausência, de modelos teóricos e metodológicos; a inexistência de materiais didácticos

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adaptados; e a ideia que têm os docentes de que o oral não precisa de ser ensinado. São vários os autores que referem estes motivos, nomeadamente Casanova & Reyzábal, 1993; Lafontaine, 2000; Mata, 1992, 1999b, 2004; Pietro, Érard e Kaneman-Pougatch, 1997; Vilà i Santasusana, 2005. Na aula de língua materna o oral está sempre presente, porém, é utilizado, maioritariamente, para garantir a comunicação entre professor e alunos e transmitir conhecimentos, ou seja, como meio de ensino.

Defende-se, portanto, que o oral deve ser ensinado na aula de Português, desfrutando de um estatuto de autonomia e sendo objecto de um ensino explícito e sistemático. Neste sentido, Fernandes e Barbosa afirmam que

«os resultados obtidos vêm comprovar a necessidade das aulas de Língua Portuguesa contemplarem espaços de trabalho efectivo e sistemático a nível da comunicação oral que, tal como ler e escrever, exige tempo, actividades diversificadas e uma programação rigorosa e hierarquizada de conteúdos a trabalhar e de competências a desenvolver.» (2007: 8).

Com a consciência desta situação, foram definidos os seguintes objectivos gerais para a prática de ensino supervisionada levada a efeito numa turma do 12.º ano de escolaridade da Escola Secundária de Camões:

i) ensaiar estratégias possíveis de intervenção didáctica no ensino explícito

e sistemático do oral formal, na aula de Português, contribuindo para a sua promoção;

ii) elaborar e implementar uma sequência didáctica sobre a argumentação

oral em situação de debate, cujo desenho segue o modelo de ensino do oral formal de Dolz e Schneuwly (1998), descrito mais adiante.

Tendo presentes estes objectivos gerais, o relatório tem os seguintes objectivos específicos:

i) descrever pormenorizadamente a sequência didáctica elaborada e o seu

processo de implementação;

ii) avaliar as produções orais do alunos em diferentes momentos da

intervenção didáctica;

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Os objectivos que norteiam o trabalho que aqui se apresenta evidenciam, assim, a tentativa de explorar novos caminhos, para que o oral formal possa adquirir, em aula, um estatuto de objecto de ensino, diminuindo a distância entre as orientações dos documentos programáticos e as práticas desenvolvidas na aula de Português.

1.2. Estrutura do relatório

Nesta secção, faz-se uma apresentação dos capítulos que compõem o relatório. A este capítulo inicial juntam-se mais cinco capítulos, sendo o relatório estruturado em seis capítulos, no total.

O segundo capítulo apresenta um enquadramento sobre os principais modelos de referência de ensino do oral formal e sobre a retórica e a argumentação oral.

No terceiro capítulo, expõe-se a metodologia adoptada, no desenho da intervenção didáctica e na selecção dos materiais de input utilizados, e caracterizam-se as duas turmas envolvidas neste projecto (turma alvo e turma de controlo).

O quarto capítulo é dedicado à descrição da intervenção, que inclui a apresentação das actividades desenvolvidas e dos materiais elaborados e utilizados, quer no ensino-aprendizagem, quer na avaliação.

No quinto capítulo, analisam-se e comparam-se os resultados obtidos no pré- -teste e no pós-teste da turma alvo e da turma de controlo.

O sexto capítulo apresenta uma síntese do trabalho desenvolvido e uma reflexão sobre as conclusões mais importantes. Inclui, ainda, as principais limitações do trabalho e possíveis caminhos para trabalhos futuros.

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CAPÍTULO 2

ENQUADRAMENTO

Neste capítulo, procede-se ao enquadramento do ensino do oral formal e da

retórica e argumentação oral3. Na primeira secção, descrevem-se os principais modelos

para o ensino da oralidade. Na segunda secção, faz-se um apanhado geral sobre a relevância da argumentação em diferentes épocas e apresentam-se os principais aspectos que se considera deverem ser trabalhados, aquando do ensino da argumentação oral.

2.1. Modelos didácticos de ensino da oralidade

No que diz respeito ao ensino do oral formal, vários autores defendem que, além der ser utilizado como um meio para transmitir conhecimentos, ou seja, como um meio de ensino, o oral pode e deve ser considerado como um objecto autónomo de ensino- -aprendizagem. Eddy Roulet, concordando com a tese formulada por Perrenoud, segundo a qual «une véritable maîtrise de l’oral ne s’acquiert pas spontanément» (1988: 2), enuncia a sua própria tese: «Il faut enseigner l’oral.» (1991: 42). Pietro, Érard e Kaneman-Pougatch, depois de apresentar o modelo didáctico do debate público regulado, apresentam a seguinte exclamação: «Tout comme l’écrit, l’oral s’enseigne!» (1997: 126). Dolz e Schneuwly afirmam, de modo claro e sucinto, que «L’oral

3 Tendo em conta as dificuldades sentidas na Língua Inglesa, consultou-se, principalmente, bibliografia

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s’enseigne» (1998: 27). Lafontaine coloca a questão: «L’oral peu-il s’enseigner au même titre que la grammaire, la lecture, l’écriture ?» (2000: 42) e apresenta de imediato a sua posição relativamente a este assunto:

«À cette question je réponds par l’affirmative; mes expériences d’enseignement de l’oral en classe prouvent hors de toute doute que l’oral peut devenir un véritable objet d’enseignement au lieu de simplement demeurer un moyen de transmission du savoir.» (idem, ibidem).

O modelo didáctico de ensino dos géneros de Dolz e Schneuwly (1998) ocupa um lugar de destaque no panorama actual do ensino do oral formal, pois é utilizado por vários autores (Lafontaine 2001; Le Cunff, 2004; Sousa, 2006; Vilà i Santasusana, 2005). Um outro modelo importante é o de Lafontaine (2001), que construiu o modelo didáctico da produção oral na aula de Francês, no ensino secundário, dotado de características próprias, mas inspirado no anterior. Nesta secção descreve-se o modelo de Dolz e Schneuwly (1998) e explicitam-se as principais diferenças apresentadas pelo modelo de Lafontaine (2001), em relação a este. As propostas apresentadas por estes autores são representadas nos esquemas reproduzidos de seguida.

Figura 1: Esquema da sequência didáctica de ensino dos géneros orais formais (Dolz & Schneuwly, 1998)

Na proposta de Dolz e Schneuwly (1998), encontra-se uma primeira etapa de introdução dos alunos numa determinada situação de comunicação que corresponde a um projecto de produção oral da turma e mais três etapas que constituem a sequência didáctica: a produção inicial, os ateliers e a produção final.

Projet de classe Mise en situation

Atelier Atelier Atelier Atelier

Séquence didactique Production

initiale

Production finale

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Figura 2: Modelo didáctico da produção oral na aula de Francês, no secundário (Lafontaine, 2001) O modelo didáctico de produção oral de Lafontaine (2001, apud Lafontaine, 2003a, 2003b, 2004) integra as seguintes componentes: intenção de comunicação; situação de comunicação (integração de práticas de leitura, de escrita e de comunicação oral, o tipo de temas apresentados aos alunos, a tomada em consideração dos campos de interesse dos alunos e a consideração do destinatário); actividades de oral planificado e integrado (produção inicial, o ponto da situação relativamente aos conhecimentos dos alunos e os ateliers formativos); e a avaliação sumativa.

Verifica-se, portanto, que, embora as propostas apresentem algumas diferenças entre si, ambas convergem no mesmo sentido. Uma sequência de ensino explícito e sistemático do oral deve ser constituída por três etapas fundamentais: «production initiale», «ateliers formatifs» e «production finale/évaluation sommative» (Dolz & Schneuwly, 1998: 94 e Lafontaine, 2001, apud Plessis-Bélair et al., 2007: 53).

Relativamente às duas primeiras etapas, os referidos modelos apresentam algumas diferenças. O modelo de Dolz e Schneuwly (1998) começa com a «mise en situation» e continua com a «production initiale». Já o modelo de Lafontaine (2001) apresenta, em primeiro lugar, a «production initiale» e depois a etapa designada «état des connaissances des élèves».

MODÈLE DIDACTIQUE DE LA PRODUCTION ORALE EN CLASSE DE FRANÇAIS AU SECONDAIRE (LAFONTAINE, 2001)

1- Intention de communication (projet de communication orale)

2- Situation de communication :

intégration des pratiques d'oral, de lecture et d'écriture

intérêt des sujets présentés aux élèves : signifiants ou non signifiants

prise en compte des intérêts des élèves : forme de l'activité, créativité, jeu, etc. prise en compte de l'auditoire : réel destinataire et participation active de l'auditoire

3- Activités d'oral planifié et intégré

Production initiale

État des connaissances des élèves

Ateliers formatifs en oral : modélisation totale par l'enseignant et parfois par l'élève, apprentissage des rôles à jouer, apprentissage lié aux types de pratiques, apprentissage de faits de langue, apprentissage des techniques d'écoute

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A «mise en situation» do primeiro modelo consiste na introdução dos alunos na sequência didáctica. Nesta fase, pretende-se que os alunos construam uma ideia acerca do trabalho que vai ser desenvolvido. Qualificada pelos autores como um momento crucial e difícil, esta etapa apresenta duas dimensões. Por um lado, a de um projecto de produção oral que é dado a conhecer aos alunos: o tipo de produção oral que vai ser trabalhado, o destinatário da produção, o contexto em que esta vai ser recebida e quem vai participar. Por outro lado, a dos conteúdos que vão ser estudados, durante a sequência didáctica, e que devem ser apresentados aos alunos para que estes tomem conhecimento da sua importância. Em suma, citando as palavras de Dolz e Schneuwly, « La phase préalable de mise en situation permet donc de présenter aux élèves toutes les informations nécessaires pour connaître le projet communicatif visé et l’apprentissage langagier qui y est lié.» (1998: 96).

Neste modelo didáctico, a etapa que se segue à «mise en situation» é a «production initiale». Esta constitui o momento em que os alunos são chamados a realizar pela primeira vez a actividade de produção oral ou o género oral que é objecto de ensino-aprendizagem. Os alunos têm, assim, a oportunidade de ver na prática aquilo que lhes foi apresentado na «mise en situation» e de tomar consciência do que já sabem e das suas dificuldades. Esta primeira etapa da sequência permite, portanto, a (re)definição dos aspectos que é preciso trabalhar. O professor observa estas primeiras produções e, em função do que observar, ajusta a sequência didáctica às necessidades e às capacidades dos alunos. Os autores afirmam que «La production initiale, tout en initiant et régulant la séquence didactique dans son ensemble, constitue donc aussi son premier lieu d’enseignement/apprentissage.» (Dolz & Schneuwly, 1998: 99).

O modelo didáctico de produção oral elaborado por Lafontaine (2001) apresenta uma primeira etapa, a «production initiale», em que os alunos se confrontam com as representações que possuem da actividade de produção oral ou do género que é objecto de ensino e, tal como no modelo didáctico de Dolz e Schneuwly (1998), fazem uma primeira produção oral. Lizanne Lafontaine (2004) salienta o facto de esta produção inicial ser feita com base nos conhecimentos que os alunos já possuem. A autora afirma que, nesta etapa, «l’enseignant fait faire aux élèves une courte production orale par exemple, un court débat) selon leurs propres connaissances antérieurs» (2004: 70) e acrescenta que «Cette étape a pour but de placer les élèves au centre de leur

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apprentissage et de leur faire réaliser qu’ils ont des apprentissages à faire et des compétences langagières à développer.» (idem, ibidem).

Quanto à segunda etapa, ela é denominada «l’état des connaissances des élèves» e consiste em fazer uma reflexão sobre a produção inicial, de forma a identificar os aspectos mais conseguidos e os menos conseguidos. Assim, alunos e professor chegarão aos objectivos de aprendizagem, às competências a desenvolver e aos conteúdos a trabalhar. Citando as palavras da autora, «tout de suite après la production initiale, l’enseignant fait un retour avec ses élèves sur celle-ci. Il leur demande de relever les points forts e les points faibles en vue de fixer des objectifs d’apprentissage et des compétences à développer.» (idem, ibidem).

Apesar das diferenças no que respeita a estas duas etapas iniciais, ambos os modelos didácticos de ensino do oral apontam no mesmo sentido. Na parte inicial de uma sequência didáctica de ensino do oral, é preciso que os alunos realizem uma primeira produção, para que tomem consciência da actividade de comunicação ou do género que vão trabalhar ao longo da sequência, dos aspectos que dominam e daqueles em que sentem dificuldades, sendo que estes últimos serão trabalhados nos ateliers formativos.

A terceira etapa consiste na realização de ateliers formativos no domínio do oral, quer no modelo didáctico de Dolz e Schneuwly (1998), quer no de Lafontaine (2001), ainda que no primeiro sejam sugeridos quatro ateliers e no segundo cinco. Estes ateliers são aquilo a que se poderia chamar «oficinas de oralidade», ou seja, momentos de trabalho sobre diferentes aspectos relativos à comunicação oral, nomeadamente aqueles que constituíram dificuldades para os alunos, aquando da produção inicial. Segundo Dolz e Schneuwly, quando se fala em ateliers fala-se num «travail en commun sur des problèmes soulevés par la production de textes oraux dans une situation de communication bien définie.» (1998: 99).

Segundo Dolz e Schneuwly (1998), a construção de ateliers formativos é necessário ter em conta os seguintes aspectos: o que se ensina, as capacidades dos alunos e as características da turma a que se destina a sequência didáctica da qual fazem parte os ateliers. No que respeita ao que é ensinado, os autores destacam a necessidade de o aluno ser capaz de «se représenter la situation de communication», «élaborer et connaître des contenus», «organiser et planifier l’activité» e «mettre en texte» (1998: 100 e 101). Nos ateliers, devem ser tratados aspectos pertencentes a diferentes níveis do

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domínio do oral e que se complementem entre si. Na escolha destes, convém que também sejam tidas em conta as capacidades dos alunos e as indicações dadas no programa da disciplina e nos estudos sobre o oral. É importante, ainda, que se construam ateliers ajustados às necessidades dos alunos. Dolz e Schneuwly (1998) referem que, normalmente, um atelier integra três tipos de abordagens: a escuta, a observação e a análise de textos de referência; a participação em diferentes situações que permitam praticar determinadas dimensões da actividade de produção oral e a construção de toda uma linguagem que permita falar sobre a actividade de produção oral que é trabalhada. Lafontaine sugere cinco tipos de ateliers diferentes:

«modélisation totale par l’enseignant et parfois par l’élève; apprentissage des rôles à jouer ; apprentissage lié au type de pratiques ; apprentissages des faits de langue et apprentissage des techniques d’écoute» (2004: 70).

Tendo em conta o que é referido em ambas as propostas, os ateliers destinam-se a trabalhar diferentes aspectos do domínio do oral e a desenvolver capacidades de comunicação oral.

A quarta e última etapa do modelo didáctico de Dolz e Schneuwly (1998) e do de Lafontaine (2001) é uma produção final, designada «production finale», na primeira proposta, e «évaluation sommative», na segunda. Nela, espera-se que os alunos invistam os conhecimentos adquiridos ao longo dos ateliers. «Elle donne aux élèves la possibilité, à travers la réalisation de l’activité langagière dans sa totalité, de mettre en pratique et d’intégrer les savoirs élaborés et les divers outils sémiotiques appropriés abordés dans les ateliers.» (Dolz & Schneuwly, 1998: 94). Esta etapa de produção final constitui uma avaliação das aprendizagens dos alunos, precedida e preparada por uma avaliação formativa. A respeito disto, Lafontaine afirma que uma sequência didáctica como a que tem vindo a ser descrita «permet aux élèves de réaliser une évaluation formative en production ou en compréhension orales avant d’être évalués en production finale sommative.» (2007: 20). É, ainda, de referir que a produção final desempenha um papel importante na verificação da evolução dos alunos desde a produção inicial. Como afirmam Dolz e Schneuwly, «la production finale est un révélateur important des apprentissages effectués : aussi bien les élèves que l’enseignant peuvent observer s’il y a eu progression par rapport au point de départ…» (1998: 113).

O modelo didáctico para o ensino do oral de Dolz e Schneuwly (1998) constitui o quadro teórico-metodológico do presente estudo, uma vez que a intervenção didáctica

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sobre a argumentação oral em contexto de debate, que constitui a base deste, foi inspirada directamente nele.

2.2. A Retórica e a argumentação oral

A arte oratória, isto é, a arte de bem falar, sempre se revestiu de grande importância e prestígio na vida púbica. Saber falar perante um público é condição si ne qua non para que se possa argumentar, convencendo e persuadindo, pelo recurso a uma arma muito mais forte do que a violência usada pelos tiranos, que é a palavra. Segundo Aristóteles (2006), saber persuadir é uma necessidade e uma obrigação do homem livre: «…seria absurdo que a incapacidade de defesa física fosse desonrosa, e o não fosse a incapacidade de defesa verbal, uma vez que esta é mais própria do homem do que o uso da força física.» (Retórica, I, 1, 1355a -1355b).

Realiza-se, em seguida, um apanhado geral sobre a importância da Retórica, durante os dois períodos mais relevantes da sua história, que são a Antiguidade Clássica e o mundo contemporâneo, a que correspondem a Retórica Clássica e a Nova Retórica, respectivamente, partindo de autores como Albaladejo, 1993; Barilli, 1979; Declercq, 1992; Senger, 1967, que trataram o assunto, e dos ícones mais relevantes nesta área, em cada uma das épocas, sendo, na primeira, Aristóteles, 2006; Cícero, 1960a, 1960b, 1966, 1989, 1994; e Quintiliano, 1975-1980, e, na segunda, C. Perelman e L. Olbrechts--Tyteca, 1988.

O estabelecimento da Retórica teve lugar no século V a.C., na Magna Grécia, na cidade de Siracusa, pela mão de Corax e Tísias, tendo o primeiro feito uma certa sistematização da argumentação, utilizada com o intuito de persuadir perante os tribunais, de acordo com uns, e perante a assembleia política, de acordo com outros (Albaladejo, 1993). Nas palavras de Cícero (1966):

«Aussi, suivant Aristote, ce fut seulement après l’abolition de la tyrannie en Sicile, quand les procès (…) furent de nouveau soumis à des tribunaux réguliers que (…) deux hommes, Corax e Tisias, composèrent une théorie de la rhétorique avec des

préceptes. Avant eux personne n’avait, pour parler, une méthode raisonnée.» (Brutus, 46)

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palavra em Atenas. Também Isócrates teve uma influência decisiva na fase inicial de configuração da Retórica, uma vez que foi o primeiro a introduzi-la nos estudos regulares dos jovens de Atenas.

No século IV a.C., a Retórica fica completamente estabelecida no sistema de pensamento da Antiguidade Clássica, com a Retórica, de Aristóteles. Segundo o próprio, a Retórica «parece ter, por assim dizer, a faculdade de descobrir os meios de persuasão sobre qualquer questão dada» (2006: 96). De acordo com Albaladejo, «esta obra de Aristóteles es fundamental para la consolidación histórica de la Retórica, por una parte porque la define y aclara su función, y por otra parte porque establece categorías imprescindibles para la constitución del sistema retórico, como son el propio concepto de discurso, los géneros de oratoria, las operaciones que realiza el orador, las diferentes funciones de los oyentes de discurso en relación con éste, etc.…» (1993: 25). Em Roma, a Retórica surge no século II a.C.. A Rhetorica ad Herennium, tratado de Retórica mais antigo, escrito em Latim, conservado, é atribuída a Cícero e o De Inuentione, a primeira obra retórica claramente da sua autoria, «demonstram um domínio seguro dos tratados gregos, de que efectuam uma boa síntese e transposição, mesmo linguístico-nomenclatória, para a latinidade» e tiveram uma importância incalculável, dado que, ao longo de mais de um milénio, deram a conhecer a Retórica Clássica ao mundo ocidental (Barilli, 1979: 39). As obras de Retórica de Cícero, produzidas já num período de maturidade, datam de muitos anos após as que foram referidas e são o De Oratore, o Orator, as Partitiones oratoriae e os Topica. O De Oratore destaca-se entre as obras de Retórica ciceronianas, porque é nela que o pensamento de Cícero se expressa de forma imponente, constituindo um marco importante na história da Retórica. O autor incide na formação do orador e nos elementos do discurso. O Orator consiste na defesa da elaboração oral do discurso. As Partitiones oratoriae constituem uma sistematização do instrumental da Retórica e das suas categorias. Nos Topica são tratados diferentes aspectos da argumentação retórica.

Quintiliano é o responsável pela Institutio Oratoria, obra que consiste na explicitação mais organizada do fenómeno retórico. Nas palavras de Barilli,

«a Institutio Oratória é insuperável em amplitude e sistematicidade: são bem doze livros que examinam em pormenor cada aspecto da “arte”, procurando efectuar o compêndio, histórico e ao mesmo tempo crítico e argumentado de todas as teses que se foram apresentando: “enciclopédia”, como foi dito, mais do que tratado,

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exactamente pela ambição de conciliar e incluir todos os pontos de vista; é um enorme compêndio retrospectivo, uma memorização paciente e infatigável.»

(Barilli, 1979: 51-52). Ao contrário de Cícero, Quintiliano é, acima de tudo, um mestre de Retórica, um historiador e um teórico da Retórica e é assim que se apresenta nesta obra. Teoriza sobre a Retórica e sobre a educação integral do cidadão romano.

«La Retórica era, pues, en todo momento, un componente fundamental de la formación de los ciudadanos. En las enseñanzas retóricas tenían una función muy importante las exercitationes, ejercicios o prácticas que los alumnos de los maestros de Retórica hacían como ensayo de la construcción y emisión de discursos que se realizaba escribiendo, leyendo y diciendo, es decir, por medio de la redacción, la lectura de textos de autores, que funcionan como modelos objeto de imitación, y la pronunciación de discursos.» (Albaladejo, 1993: 28-29).

Do início da nossa era passa-se para uma época bastante distante, o século XX, já que é na segunda metade deste século que se assiste à reactivação da Retórica, em que se registam várias tendências entre as quais a Retórica da argumentação. Segundo Albaladejo, «La Retórica como teoría de la argumentación se ha centrado fundamentalmente en el razonamiento y en la estructuración argumentativa del discurso.» (1993: 39). Neste processo de renascimento da Retórica, Chaїm Perelman teve um papel crucial. Como afirma Declerq «C’est avec Chaїm Perelman, professeur de philosophie du droit à l’université de Bruxelles, que la théorie de l’argumentation retrouve sa place dans de socle épistémologique de l’occident moderne, comme composante essentielle des relations sociales et interhumaines.» (1992: 119). Na obra intitulada L’empire rhétorique. Rhétorique e argumentation., Chaїm Perelman deixa claro que a teoria da argumentação, encarada com uma nova Retórica, «couvre tout le champ du discours visant à convaincre ou à persuader quel que soit l’auditoire auquel il s’adresse, et quelle que soit la matière sur laquelle il porte.» (2002: 21). No quadro da nova retórica, Perelman e Olbrechts-Tyteca definem a argumentação como “l’étude des techniques discursives permettant de provoquer ou d’accroître l’adhésion des esprits aux thèses qu’on présente à leur assentiment.” (1988: 5). Para estes autores, argumentar consiste, portanto, em ganhar a adesão de um auditório às teses que lhe são apresentadas.

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Na linha do que acaba de ser exposto, no presente estudo entende-se que argumentar consiste em defender uma posição, apresentando argumentos que a sustentem e refutando contra-argumentos dos defensores de uma tese diferente, com a finalidade de influenciar os destinatários/interlocutores. Quando se argumenta, o discurso apresenta uma determinada estrutura e integra mecanismos que garantem a sua coesão e a sua adequação à situação comunicativa, bem como diferentes técnicas argumentativas. Considera-se, pois, que a argumentação é uma actividade discursiva «que tiene una intención comunicativa determinada, que se desarrolla a partir de mecanismos discursivos y lingüísticos característicos y de la utilización de una serie de estrategias también características» (Cros, 2005: 59).

Posto isto, partindo de alguns trabalhos de referência sobre a argumentação e sobre a oralidade, tendo em conta as dificuldades que os alunos costumam manifestar, quando são chamados a produzir um discurso argumentativo, e com a noção dos conteúdos apresentados no Programa de Português 10.º, 11.º e 12.º anos: Cursos Científico-Humanísticos e Cursos Tecnológicos, defende-se que o trabalho sobre a argumentação, na aula de Português, deve centrar-se principalmente nos aspectos que se seguem: situação comunicativa, estrutura textual e lógica do discurso argumentativo, coesão, modalização, actio e técnicas argumentativas.

2.2.1. A situação comunicativa

A produção de um discurso argumentativo insere-se sempre numa determinada situação de comunicativa, em relação à qual o discurso produzido deve mostrar adequação. No Programa de Português, apresenta-se a situação comunicativa como conteúdo relativo às competências de compreensão oral e de expressão oral, no 12.º ano, e, relacionados com ela, conteúdos como «estatuto e relação entre os interlocutores; contexto» e num outro ponto a «intencionalidade comunicativa» (2001/2002: 15). Considera-se que a situação comunicativa se define por diferentes parâmetros que dela fazem parte, seguindo-se, por exemplo, Cros (2005), que afirma que estes «están relacionados, fundamentalmente, con la intención comunicativa y con la relación que se establece entre los participantes del acto comunicativo» (2005: 60). Defendendo que «es importante que los docentes procuren guiar el análisis del contexto en el que se produce la argumentación» (idem, ibidem), a autora refere outros aspectos como: âmbito social

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em que se insere o discurso, a relação com o destinatário, entre outros. Estes elementos desempenham um papel primordial na adequação do discurso argumentativo à situação de comunicação. No presente trabalho, entende-se que a caracterização da situação comunicativa deve assentar em cinco parâmetros principais, a saber: grau de formalidade do discurso, grau de preparação do discurso, intenção comunicativa, destinatários do discurso e relação entre os interlocutores.

A definição do grau de formalidade do discurso tem um papel importante na sua adequação à situação comunicativa, uma vez que a argumentação pode surgir em várias situações que implicam diferentes graus de formalidade do discurso argumentativo que se produz. Uma desadequação notória no que respeita a este parâmetro pode ter reflexos negativos ao nível dos efeitos que se pretende provocar. Assim, propõe-se que, tendo em conta, sobretudo, o lugar (social) de produção, se defina o grau de formalidade do discurso em função de cinco registos – muito informal, informal, neutro, formal e muito formal – que seguem a proposta de Joos (1967).

O grau de preparação do discurso argumentativo assume, igualmente, um papel de relevo na sua adequação à situação de comunicativa, pois a argumentação pode surgir integrada em actividades discursivas variadas, que decorrem em situações diversas, e que exigem graus de formalidade e de preparação do discurso também diferentes. Quando se trata de produzir um discurso argumentativo oral formal, é importante que esse discurso apresente preparação, porque a falta dela pode constituir uma sobrecarga cognitiva para o emissor, que se reflecte ao nível da produção oral, pela falta de segurança e por uma transmissão pouco conseguida da mensagem pretendida, comprometendo seriamente a finalidade do discurso produzido (Sousa, 2007). Os discursos orais formais caracterizam-se, frequentemente, por um elevado nível de planificação (Lugarini, 2003). Neste sentido, considera-se que o grau de preparação do discurso argumentativo deve ser definido previamente, utilizando uma escala como, por exemplo, a que se apresenta de seguida: espontâneo, escassamente preparado, neutro, preparado ou muito preparado.

Por intenção ou intencionalidade comunicativa entende-se a finalidade que o emissor, no caso do discurso argumentativo, o orador, se propõe alcançar com a produção de um determinado discurso. É importante que ela seja especificada, visto que varia em função do tipo de discurso produzido e um mesmo tipo de discurso pode ser produzido com intenções comunicativas diferentes, consoante a situação de

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comunicação em que a produção se insere. A intenção comunicativa não é a mesma quando se produz um discurso expositivo, que é essencialmente a de informar sobre um determinado assunto, e quando se produz um discurso argumentativo, que pode ser a de convencer um auditório, incitar à acção, manipular, entre outras. Considera-se, pois, que, ao fazer a caracterização da situação comunicativa, deve definir-se de forma precisa a intenção comunicativa, para que o discurso argumentativo surta o efeito pretendido.

A importância de ter em conta o destinatário para produzir um discurso adequado à situação comunicativa vem já da retórica clássica. Por exemplo, Cícero (1960a), na sua obra Partitiones Oratoriae (§ 90), salienta que é preciso falar de maneira diferente consoante o destinatário do discurso. O destinatário é o conjunto de pessoas a quem se destina o discurso e a quem o orador quer influenciar. Para isso, é fundamental que o orador tenha em conta as características do destinatário – conhecimentos, idade, estatuto – de modo a que, em função delas, possa, por exemplo, escolher os argumentos mais adequados e prever possíveis contra-argumentos que possam ser colocados aos seus argumentos.

A relação entre os interlocutores constitui o último dos parâmetros de análise da situação comunicativa que aqui se apresentam. A importância de determinar a relação entre os interlocutores, que poderá ser mais próxima ou mais distante, reside na necessidade de adequar o discurso argumentativo produzido, por exemplo, no que respeita às formas de tratamento.

2.2.2. Estrutura do discurso argumentativo

A estrutura da argumentação tem sido tratada por vários autores, desde os clássicos, Aristóteles e Cícero, até aos mais actuais como, por exemplo, Adam (2005).

Na retórica clássica, destacam-se quatro partes fundamentais do discurso retórico4:

proémio, exposição, provas e epílogo (Aristóteles, Rétorica, 1414b) ou exordium, narratio, confirmatio e peroratio/conclusio (Cícero, Orator (122)). A estrutura é, portanto, a seguinte: uma parte inicial (proémio/exordium), correspondente à

4 Cícero, na sua obra de juventude, De Inuentione (I, 19), enumera seis partes do discurso – exordium,

narratio, partitio, confirmatio, reprehensio e conclusio –, passando a salientar apenas quatro partes principais em obras posteriores, por exemplo: Orator (122), Partitiones Oratoriae (IV, 27) e Topica (97-98).

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introdução; uma parte em que são expostos os factos (exposição/narratio); uma outra em que são apresentados argumentos em apoio à posição defendida e refutados os argumentos contrários (provas/confirmatio) e uma parte final ou conclusão (epílogo/peroratio/conclusio). Posto isto e tendo em conta que é possível que a primeira parte e a segunda sejam vistas como uma só, pode considerar-se que o discurso argumentativo apresenta uma estrutura de base tripartida. A introdução, em que se fornece informação ao auditório, de modo a dispô-lo favoravelmente e a prepará-lo para a audição do discurso; o desenvolvimento, que consiste na apresentação de argumentos a favor da posição que se defende e na refutação dos argumentos contrários, e a conclusão, em que se sintetiza e reforça o que foi defendido.

De um ponto de vista mais actual, Adam (2005), no seu estudo sobre tipologia textual, em que defende a existência de sequências textuais prototípicas, propõe o seguinte esquema da sequência argumentativa prototípica.

THÈSE + DONNÉES Étayage donc probablement CONCLUSION

ATÉRIEURE (Prémisses) argumentatif (Nouvelle) Thèse P. arg 0 P. arg 1 P. arg 2 P. arg 3

à moins que Topoï RESTRICTION

P. arg 4

Figura 3: Esquema da sequência argumentativa prototípica (Adam, 2005: 118)

A sequência argumentativa prototípica, conforme é apresentada pelo autor, surge como um conjunto de macroproposições ou fases (Bronckart, 1996: 221) que se sucedem umas às outras: a fase das premissas ou dados, a fase dos argumentos, a fase dos contra--argumentos e a fase da conclusão.

Este esquema textual nem sempre surge de forma completa em discursos argumentativos reais, podendo estes desenvolverem-se de diferentes maneiras (Cuenca, 1995). Por exemplo, a conclusão pode surgir de forma mais ou menos explícita, tal como os contra-argumentos, que podem ser apenas mencionados ou ficar implícitos. Principalmente quando se trata de argumentação oral, como é o caso da argumentação em contexto de debate, muitas vezes há interrupções e o seu desenvolvimento pode assumir uma orientação diferente da que tinha sido pensada, devido às intervenções dos interlocutores. Por conseguinte, considera-se que «la forma textual característica de la argumentación es la reproducción más o menos completa del esquema lógico que pone

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Tese_______________________________________________________________ Anúncio dos principais argumentos ______________________________________ Argumento 1 Eventual contra-argumento Refutação do contra-argumento Argumento 2 Eventual contra-argumento Refutação do contra-argumento Argumento 3 Eventual contra-argumento Refutação do contra-argumento

Síntese dos argumentos_________________________________________________ Tese________________________________________________________________ conclusiones» (Cros, 2005: 62), na linha de Anscombre e Ducrot (1983). De um ponto de vista lógico, poder-se-á reconstruir a estrutura da argumentação, ainda que discursivamente surja muitas vezes de forma incompleta. A estrutura lógica da argumentação pode ser representada num esquema como o que a seguir se apresenta.

Figura 4: Esquema da estrutura lógica do discurso argumentativo (inspirado em Cros, 2005) Este esquema integra os elementos fundamentais que constituem a argumentação e que se considera deverem ser trabalhados no ensino-aprendizagem da argumentação oral. Em função da posição adoptada em relação ao tema, importa definir a tese; antecipar os argumentos a desenvolver, mediante a apresentação das palavras-chave ou núcleos argumentativos; produzir argumentos que sustentem a tese e prever e refutar eventuais contra-argumentos dos opositores; fazer uma síntese dos argumentos e apresentar (de novo) a tese, orientando, deste modo, o discurso para uma conclusão. Pode dizer-se que a estrutura textual do discurso se apresenta constituída por uma parte inicial que integra a apresentação da tese e o anúncio dos principais argumentos que vão ser desenvolvidos; uma segunda parte, o desenvolvimento, em que são apresentados e expandidos argumentos que fundamentam a tese defendida e em que são previstos eventuais contra-argumentos dos opositores, refutando-os antecipadamente; por último, a síntese dos argumentos e a reiteração da tese defendida, de forma a reforçá-la.

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2.2.3. Conectores discursivos e recursos modalizadores

Na argumentação, são utilizados recursos linguísticos destinados a estabelecer relações entre as partes do discurso, de forma a garantir a sua coesão, e outros que assumem um papel fulcral na adequação do discurso à situação comunicativa. Trata-se do uso de conectores e de recursos modalizadores, que se considera serem mecanismos linguísticos com grande relevo no discurso argumentativo.

2.2.3.1. Conectores discursivos

Entre os mecanismos que contribuem para garantir a coesão de um discurso encontram-se os conectores discursivos, que desempenham um papel fulcral no que a isso diz respeito. São os conectores que ligam as partes do discurso entre si, estabelecendo nexos lógico-semânticos entre elas e indicando a interpretação que tem de se fazer. Citando Cuenca, os conectores «tienen la función básica de relacionar dos porciones de discurso (sintagmas o cláusulas, en el nivel oracional, y oraciones y párrafos, en el nivel textual), explicitando de qué manera se tiene que interpretar semántica y/o pragmáticamente la una respecto a la otra. Así, ponen de manifiesto la conexión semántica entre las partes y marcan la orientación pragmática, y concretamente argumentativa, de los componentes de la oración y del texto.» (1995:27). Os conectores desempenham, portanto, um papel fundamental no encadeamento dos principais elementos que constituem a estrutura formal da argumentação (tese – argumentos – contra-argumentos – conclusão).

Cuenca (1995) apresenta uma proposta de classificação dos conectores mais específicos do discurso argumentativo, arrumando-os em três grupos principais: os contrastivos, os causais e consecutivos, e os distributivos. Refere, ainda, que são frequentemente utilizados, na argumentação, os condicionais, generalizadores, exemplificadores e reafirmativos ou enfáticos. Partindo desta proposta, da classificação dos conectores de Duarte (2003) e do trabalho desenvolvido por Costa (2010), distinguiram-se os conectores que se consideram comuns do discurso argumentativo, tendo em conta o tipo de relação que estabelecem e a orientação argumentativa que imprimem às partes do discurso.

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Figura 1: Esquema da sequência didáctica de ensino dos géneros orais formais  (Dolz & Schneuwly, 1998)
Figura 3: Esquema da sequência argumentativa prototípica (Adam, 2005: 118)
Figura 4: Esquema da estrutura lógica do discurso argumentativo (inspirado em Cros, 2005)
Figura 5: Mecanismos utilizados para exprimir diferentes graus de certeza,   de acordo com Grau (2003 e 2005)
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Referências

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