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DOUTORADO EM LINGUÍSTICA APLICADA E ESTUDOS DA LINGUAGEM

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Academic year: 2018

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Siderlene Muniz-Oliveira

O trabalho representado do professor

de pós-graduação de uma universidade pública

DOUTORADO EM LINGUÍSTICA APLICADA E ESTUDOS DA LINGUAGEM

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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO

PUC-SP

Siderlene Muniz-Oliveira

O trabalho representado do professor

de pós-graduação de uma universidade pública

DOUTORADO EM LINGUÍSTICA APLICADA E ESTUDOS DA LINGUAGEM

Tese apresentada à Banca Examinadora da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, como exigência parcial para obtenção do título de DOUTORA em Linguística Aplicada e Estudos da Linguagem, sob a orientação da Profª Drª Anna Rachel Machado.

SÃO PAULO

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Tese defendida e aprovada em ___ / ___ / ___

Banca Examinadora

______________________________________

Profª Drª Anna Rachel Machado – Orientadora ______________________________________

Prof. Dr. Tony Berber Sardinha

______________________________________

Profª Drª Maria Cecília Perez Souza-e-Silva

______________________________________

Profª Drª Lília Santos Abreu-Tardelli

______________________________________

Profª Drª Anna Maria Carmagnani

______________________________________

Profª Drª Luzia Bueno – Suplente ______________________________________

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AGRADECIMENTOS

É difícil agradecer a todos que, de alguma forma, contribuíram para que esta tese se realizasse, pois foram muitas as pessoas que fizeram e fazem parte da minha vida acadêmica e/ou pessoal, que considero indissociáveis, já que o trabalho do pesquisador consiste na mobilização do ser integral (físico, psíquico, psicológico). Trata-se de um trabalho que, na verdade, se iniciou no mestrado e consiste em inúmeras vozes que o permeiam. Não sendo possível nomear todos, agradeço, principalmente:

 à querida orientadora, Profª Drª Anna Rachel Machado, por ter, desde o início, acreditado no meu trabalho. Por todo o seu esforço, dedicação e exigência fundamentais numa orientação; pelo ser humano maravilhoso que é;

 ao Prof. Dr. Tony Berber Sardinha, que, em épocas difíceis, desempenhou o papel de co-orientador, com suas instigantes perguntas que contribuíram para o meu desenvolvimento intelectual.

 aos professores doutores Elisabeth Brait, Lília Abreu-Tardelli, Joaquim Dolz, Tony Berber Sardinha, Maria Cecília Perez de Souza-e-Silva e Luzia Bueno, que participaram das bancas dos exames de qualificação, trazendo inúmeras contribuições para o desenvolvimento desta pesquisa;

 aos professores participantes da banca de defesa, por contribuírem com observações e sugestões para esta pesquisa;

 às colegas do grupo Análise de Linguagem, Trabalho Educacional e suas Relações (Alter), com quem me relacionei durantes os anos de vida acadêmica, que muito contribuíram com discussões sobre a minha pesquisa, como Carla Messias, Elisabete Laureano, Márcia Donizete, Maria Christina Cervera, Daniella Barbosa, Maria Izabel Tognato, Kátia Diolina, Sibéria Carvalho, Carla Galhardo, Marina Buzzo, entre outras, pelas conversas na hora do café, pelo carinho e amizade, que contribuíram com meu crescimento;

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e à Profª Drª Vera Cristóvão, da Universidade Estadual de Londrina (UEL) pela leitura da minha tese no início do doutorado.

 à Ermelinda Barricelli, em especial, pela amizade, pelos momentos que passamos juntas estudando ou trabalhando, presencialmente ou on-line, que contribuíram muito para o meu desenvolvimento como pesquisadora e como professora;

 à Maria Lúcia, secretária do LAEL, por estar sempre disposta a ajudar, mesmo diante de tantos afazeres;

 às doutoras Eliane Lousada, Lília Abreu-Tardelli e Luzia Bueno, por terem contribuído com o meu percurso profissional-acadêmico e com quem aprendi muito durante esses anos;

 à Profª Drª Raquel Salek Fiad por ter contribuído sobremaneira com esta pesquisa;

 ao Evandro Lisboa Freire, do Grupo de Estudos de Linguística de Corpus (GELC/LAEL), por ter traduzido o resumo para o inglês, pela revisão cuidadosa desta tese (exceto dos capítulos 3 e 4), pelas sugestões e pela amizade;

 ao Adail Sobral, pelos bate-papos nos congressos, pela tradução do resumo para o francês;

 ao amigo Valdeir Del Cont, doutor em Ciências Sociais pela Unicamp, por ter aceitado participar de uma pesquisa piloto mesmo antes de eu iniciar o doutorado;

 às participantes de pesquisa, professoras de pós-graduação, sem as quais este trabalho não seria possível;

 ao amigo Anselmo Lima, professor da UTFPR, pelas discussões virtuais que contribuíram para o meu desenvolvimento acadêmico;

 ao José, meu marido, pelas discussões com olhar sociológico que contribuíram para expandir a visão sobre a temática estudada e por ter compartilhado todos os momentos deste trabalho;

 à Vitória, minha filha, que procurava para mim os livros na minha biblioteca enquanto eu escrevia a tese;

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 aos meus familiares, que sempre incentivaram a minha vida profissional-acadêmica;

 à Capes, pela bolsa flexibilizada, sem a qual não seria possível o desenvolvimento desta pesquisa;

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Todos aqueles que trabalham, que executam tarefas como assalariados ou não, merecem ter no seu trabalho não apenas um meio de ganhar a vida, mas um meio de desenvolvimento pessoal e social.

(9)

SUMÁRIO

Lista de figuras ...XIX

Lista de quadros ...XXI

Lista de tabelas ...XXIII

Resumo ...XXV

Abstract ...XXVII Résumé ...XXIX Introdução ...XXXI

CAPÍTULO 1 – CONCEPÇÕES DE TRABALHO E DE TRABALHO DOCENTE ...1

1.1. O trabalho na visão ergonômica ...2

1.2. O real da atividade para a Clínica da Atividade ...7

1.3. O trabalho como forma de agir na abordagem do ISD ...13

1.4. Concepção do trabalho do professor sob uma visão interdisciplinar ...18

CAPÍTULO 2 – A PÓS-GRADUAÇÃO STRICTO SENSU NO BRASIL E O PAPEL DO PROFESSOR DE PÓS-GRADUAÇÃO...27

2.1. História da pós-graduação no Brasil: da sua regulamentação ao século XXI ...27

2.2. O Sistema de Avaliação da Capes e os critérios de avaliação da área Letras/Linguística ...35

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3.1. As condutas humanas, a interação sócio-histórica e os instrumentos semióticos para o

interacionismo social ...44

3.2. O agir de linguagem e o desenvolvimento numa abordagem interacionista sociodiscursiva ... 48

3.2.1. O agir e a linguagem ...50

3.3. Atividade de linguagem e desenvolvimento humano...56

CAPÍTULO 4 – O QUADRO DE ANÁLISE DE TEXTOS DO ISD ...61

4.1. O texto empírico e o tipo de discurso ...61

4.2. Os elementos do contexto de produção ...67

4.3. Os elementos do nível organizacional ...71

4.4. Os elementos do nível enunciativo ...80

4.5. Os elementos do nível semântico ...84

CAPÍTULO 5 – PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS ... 93

5.1. A seleção dos participantes da pesquisa ...93

5.2. As participantes da pesquisa ...95

5.3. A instrução ao sósia ...96

5.4. Procedimentos de geração dos dados ...99

5.5. Perguntas de pesquisa ...102

5.6. Procedimentos de análise ...103

5.6.1. Análise do contexto de produção do texto ...103

5.6.2. Análise dos três níveis textuais: organizacional, enunciativo e semântico ...104

CAPÍTULO 6 – DISCUSSÃO E RESULTADOS DAS ANÁLISES DE DADOS ...109

(11)

6.2. As atividades da professora de pós-graduação tematizadas ...111

6.3. Actantes postos em cena no texto analisado...126

6.4. As funções atribuídas ao professor de pós-graduação ...144

CONSIDERAÇÕES FINAIS ...151

Referências ...161

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LISTA DE FIGURAS

Figura 1.1 – Os elementos do trabalho ... 9

Figura 1.2 – Elementos constituintes do trabalho do professor em situação de sala de aula ...22

Figura 1.3 – O conjunto possível de atividades do trabalho do professor que pode ser detectado nas pesquisas ...23

Figura 5.1 – Conjunto de dados possíveis para a interpretação do agir em textos sobre o trabalho ...98

Figura 6.1 – Actantes identificados no texto analisado ...134

Figura 6.2 – As múltiplas funções atribuídas ao professor de pós-graduação ...147

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LISTA DE QUADROS

Quadro 1 – 1o e-mail trocado com a professora da Unicamp: 30 jul. 2008 ...179

Quadro 2 – 2o e-mail trocado com a professora da Unicamp: 31 jul. 2008 ...180

Quadro 3 – 3o e-mail trocado com a professora da Unicamp: 31 jul. 2008 ...181

Quadro 4 – 4o e-mail trocado com a professora da Unicamp: 15 out. 2008 ...182

Quadro 5 – 5o e-mail trocado com a professora da Unicamp: 15 out. 2008 ...183

Quadro 6 – 6o e-mail trocado com a professora da Unicamp: 16 out. 2008 ...184

Quadro 7 – 7o e-mail trocado com a professora da Unicamp: 17 out. 2008 ...184

Quadro 8 – 8o e-mail trocado com a professora da Unicamp: 26 out. 2008...185

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LISTA DE TABELAS

Tabela 4.1 – Sequências, representações dos efeitos pretendidos e fases correspondentes ...77

Tabela 5.1 – As atividades elencadas no e-mail pela professora da Unicamp ...101

Tabela 5.2 – Exemplo de uma função atribuída ao professor e os elementos do trabalho docente ...107

Tabela 6.1 – Levantamento quantitativo e percentual das palavras ...115

Tabela 6.2 – Plano global da instrução ao sósia e da entrevista aberta ...116

Tabela 6.3 – Exemplos dos tipos de agir ...121

Tabela 6.4 – As atividades agradáveis representadas...131

Tabela 6.5 – As atividades desagradáveis representadas...132

Tabela 6.6 – A quantidade e a porcentagem de actantes no texto analisado...135

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RESUMO

Esta pesquisa tem por objetivo contribuir com uma reflexão sobre o trabalho do professor de pós-graduação stricto sensu, por meio da análise e interpretação das representações construídas sobre o trabalho docente em um texto produzido por uma professora que atua em uma universidade pública, a fim de trazer à cena o real da atividade que ela desenvolve. Pesquisas revelam a problemática da profissão do professor de pós-graduação, sugerindo que ele é atingido pelo “mal-estar docente” gerado pela pressão para desenvolver várias atividades prescritas pela universidade e pelas agências de fomento à pesquisa, sendo a produtividade e a eficiência mensuradas em índices. Essa sugestão nos leva à hipótese de que esse “mal-estar” deve se manifestar de alguma forma em textos nos quais o professor descreve o seu próprio trabalho.

Para verificar essa hipótese, seguimos o interacionismo sociodiscursivo (ISD), que atribui ao agir e à linguagem papel fundamental no desenvolvimento humano. Para essa abordagem, o trabalho é definido como uma forma de agir cujas representações são construídas na e pela linguagem, sendo concebido como um dos lugares centrais de aperfeiçoamento do ser humano na sociedade atual. Assim, ao estudarmos textos que trazem representações sobre o trabalho do professor de pós-graduação, estamos também contribuindo para uma melhor compreensão de como se dá esse desenvolvimento pessoal e profissional nas situações de trabalho.

Além do ISD, adotado como quadro teórico-metodológico, baseamo-nos em outras disciplinas que também vêm estudando situações de trabalho, como a Ergonomia da Atividade e a Psicologia do Trabalho, especificamente a Clínica da Atividade. Pressupostos da análise de discurso da linha francesa complementam a análise de dados.

Para a geração do texto em análise utilizamos um procedimento denominado instrução ao sósia com uma professora experiente da área de estudos da linguagem que atua em uma universidade pública. Por meio desse procedimento, a professora vivenciou uma experiência ao dar instruções a esta pesquisadora sobre o modo de realizar as suas atividades de trabalho. Para complementá-lo, utilizamos, também, uma entrevista aberta.

A análise do texto transcrito gerado para esta pesquisa possibilitou-nos ter acesso à multiplicidade de tarefas desenvolvidas pela professora, assim como aos gestos de seu métier (ofício). Foram evidenciadas, ainda, as dificuldades para desenvolver as atividades e as alternativas para superá-las, sendo colocados em cena os diferentes modos de agir da professora, assim como o sofrimento gerado para a realização das atividades e as dimensões envolvidas no trabalho. Além disso, essa análise evidencia as diferentes funções desempenhadas pelo professor de pós-graduação, assim como os elementos do trabalho docente envolvidos em cada uma delas. Tudo isso revela a complexidade do trabalho desse professor, pois ele tem de saber gerenciar inúmeros elementos.

Esta tese consiste, de modo geral, na ideia de que a multiplicidade de tarefas desenvolvidas pelo professor de pós-graduação da área de estudos da linguagem prejudica o desenvolvimento das atividades de pesquisa e de ensino prescritas em documentos oficiais que regem sua profissão, principalmente aqueles que se dizem avaliativos. Esse fato nos obriga a refletir em busca de alternativas para sanar os problemas identificados.

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ABSTRACT

This research aims at contributing to a reflection on the teacher’s job at the stricto sensu graduate level through the analysis and interpretation of representations about the teaching work expressed in a text produced by a professor who teaches at a public university, in order to raise the real work activity she develops.

Some researches reveal the complex issues involved in the work of graduate professor and suggest that he/she is affected with the “teaching discomfort” due to the pressure to perform many tasks prescribed both by the university and the research funding agencies, which measure productivity and efficiency through indexes. This suggestion leads us to the hypothesis that this “discomfort” should be expressed somehow in the texts where the professor describes her/his own job.

In order to investigate this hypothesis, we adopt the socio-discursive interactionism (SDI), which attributes to acting and language a fundamental role in human development. According to this approach, job is defined as a way of acting whose representations are expressed in and through language, and it is considered a major human being improvement center in current society. Thus, studying texts with representations about the job of graduate professor, we also contribute to a better understanding of how this personal and professional development occurs in working situations.

Besides SDI, adopted as theoretical and methodological framework, our research is based on other disciplines which study working situations, as Activity Ergonomics and Labor Psychology, particularly the Activity Clinic. Tenets of the French inspired discourse analysis complement the data analysis.

To generate the text under analysis we employed a procedure called instruction to the double with an experienced professor of the field of language studies who teaches at a public university. Through this procedure, she lived an experience providing this researcher with instructions on how to perform her work activities. In order to complement this procedure, we also used an open interview.

The analysis of the text transcribed for this research allowed us to access the multiplicity of tasks carried out by the professor, as well as the gestures of her métier (job). The difficulties to perform the activities and the alternative ways to overcome them were also evidenced, bringing about the professor’s distinct modes of acting and the uneasiness due to the tasks and the dimensions involved in the job. Moreover, this analysis evidenced the diverse functions of the graduate professor and the elements of the teaching work involved in any of them. All this reveals the complex nature of this teacher’s job, since she/he should know how to manage innumerous elements.

This thesis consists, in a general sense, in the idea that the multiplicity of tasks performed by the teacher at the graduate level in the field of language studies impairs the performance of research and teaching activities prescribed in the official documents ruling her/his profession, mainly those intending to be seen as evaluative ones. Regarding this fact, we should reflect in search of alternative ways to solve the problems identified.

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RÉSUMÉ

Cette recherche a pour but présenter une réflexion sur le travail du professeur des cours de post-graduation stricto sensu par le moyen de l'analyse et de l'interprétation des représentations construites sur le travail d'enseignement dans un texte produit pour un professeur qui travaille à une université publique, afin d'apporter à la scène le réel de l'activité qu'il développe.

Il-y-a des recherches qui révèlent la problématique de la profession du professeur de post-graduation, suggérant qu'elle soit atteinte par “la malaise de enseignement” produite par la pression de développer quelques activités prescrites pour l'université et des agences de promotion des recherches, dont la productivité et l'efficacité son mensurées par le moyen des indexes. Cela nos a suggéré l'hypothèse selon lequel cette “malaise” peut se révéler d'une certaine façon dans des textes où le professeur décrit son travail.

Le travail se base sur l’interactionnisme socio-discursif (ISD), qui attribue au agir et au langage un rôle vital dans le développement humain. Pour l'ISD, le travail est défini comme une manière d'agir dont les représentations sont construits dans et par le langage, étant conçu comme un des endroits essentiels pour le perfectionnement des êtres humains dans la société. Ainsi, en étudiant les textes qui apportent des représentations sur le travail du professeur recherché, nous contribuons également pour un meilleur compréhension du développement personnel et professionnel dans des situations de travail.

Au delà de l'ISD, adopté comme le fondement théorétique-méthodologique, le travail considere d'autres outils de recherche sur des situations de travail, comme l'ergonomie de l'activité et la psychologie du travail, spécifiquement la clinique de l'activité. Des presuposés de l'analyse du discours française ont aidé notre analyse.

Pour la génération du texte analysé nous employons le procédure d’instruction au sosie avec un professeur expériencé du domaine d'études du langage travaillant à une université publique. Au moyen de ce procédé, le professeur a vécu profondément une expérience en donnant des instructions au chercheur sur le séquence de tâches qui constituent ses activités de travail. Nous employons aussi une entrevue ouverte.

L'analyse du texte transcrit a rendu possible l'accès à la multiplicité de tâches développées pour le professeur, comme les gestes de son métier. Des difficultés dans la réalisation des activités et des efforts pour les surpasser, et ont a pu observer les différentes manières d'agir du professeur, comme la souffrance générée par l'accomplissement des activités et des dimensions impliquées dans le travail. D'ailleurs, cette analyse démontre les différentes fonctions jouées pour le professeur, aussi bien des éléments qui constituent le travail d'enseignement dans chacun des fonctions. L'étude a révèle la complexité du travail du professeur, qui doit développer la capacité de gérer des éléments innombrables.

Notre thèse consiste essentiellement dans l'idée que la multiplicité de tâches développées pour le professeur étudié nuit le développement des activités de recherche et de l'enseignement prescrites dans des documents officiels qui constituent des prescriptions pour sa profession, principalement ceux caractérisées comme évaluatives. L'étude montre qu'il nous faut chercher des solutions pour bien résoudre les problèmes identifiés.

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INTRODUÇÃO

Nesta introdução, primeiramente, apresentaremos o objetivo desta tese e trataremos da trajetória acadêmica que nos motivou a estudar o tema, indicando a problemática mais ampla na qual este estudo se insere. Na sequência, apresentaremos, de modo conciso, o quadro teórico que a embasa. Por fim, apresentaremos a questão mais ampla de pesquisa e a organização da tese.

O objetivo desta tese é identificar e discutir como o trabalho do professor se configura em um texto produzido por uma docente de pós-graduação em situação de pesquisa. Ela está integrada aos estudos do grupo Análise de Linguagem, Trabalho Educacional e suas Relações (Alter), que tem como objetivo central “desenvolver um aprofundamento teórico -metodológico sobre as relações entre linguagem/trabalho educacional tomadas no quadro da problemática maior das relações entre discursos, atividades sociais e ações” (MACHADO, 2003, p. 5).

Em 2002 ingressei1 como aluna de mestrado no Programa de Estudos Pós-Graduados em Linguística Aplicada e Estudos da Linguagem da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (LAEL/PUC-SP), instituto em que a análise da linguagem é foco central, sendo marcada pela transdisciplinaridade. Na disciplina “Tópicos em Linguística do Trabalho e Disciplinas Conexas”, ministrada no primeiro semestre de 2003 pela Profª Drª Anna Rachel Machado, coordenadora do grupo Alter, e pela Profª Drª Maria Cecília Souza-e-Silva, coordenadora do grupo Atelier Linguagem e Trabalho, conheci pressupostos oriundos de outras disciplinas, como a Psicologia do Trabalho, especificamente a da Clínica da Atividade, coordenada pelo pesquisador Yves Clot (2000, 2001, 2006, 2010) do Conservatoire des Arts et Métiers2 (CNAM) de Paris, e, também, os pressupostos seguidos pelo Grupo Ergonomie de l’Activité des Professionnels de l’Education3 (Ergape) de Marselha, França, do qual fazem parte René Amigues (2002, 2003, 2004), Frédéric Saujat (2002, 2004) e Daniel Faïta (2002, 2004), entre outros. Nessa disciplina tive contato com pesquisas que se centram em estudos sobre o trabalho e que utilizam aportes desses pesquisadores, podendo-se citar, dentre elas, as de pesquisadores do exterior, como de Schwartz (1996), Boutet (1993), Guérin et al. (2001), e

1 Utilizaremos a primeira pessoa do singular quando se tratar do histórico pessoal/acadêmico desta pesquisadora. 2 Conservatório de Artes e Ofícios.

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as do Brasil, especificamente as desenvolvidas no LAEL/PUC-SP sobre diferentes situações de trabalho, como sobre o Mercosul e o mundo do trabalho (SANT’ANNA, 2002), como em hospital (FRANÇA, 2002), em empresa terceirizada que vende cartões de crédito (ALGODOAL, 2002), em escola (KAYANO, 2005), em empresa jornalística (NASCIMENTO, 2008), entre outras. A partir dessas pesquisas percebi que a atividade de linguagem e a atividade de trabalho estão intrinsecamente ligadas, pois as trocas no trabalho são realizadas na e pela linguagem. Comecei a me interessar também pela temática linguagem, trabalho e educação a partir dos artigos de pesquisadores brasileiros e estrangeiros publicados em 2004 no livro O ensino como trabalho, organizado pela Profª Drª Anna Rachel Machado, que discutem a questão do trabalho do professor, incluindo pressupostos das disciplinas do trabalho abordadas anteriormente. Nesse período, como integrante do grupo Alter, tive acesso, ainda, a pressupostos teóricos do interacionismo sociodiscursivo (ISD) (BRONCKART, 1999, 2006, 2008), que é uma vertente da psicologia vigotskiana, como veremos mais adiante.

No mestrado, desenvolvi um trabalho no qual analiso verbos de dizer em resenhas acadêmicas produzidas por professores-pesquisadores e publicadas em revistas científicas (MUNIZ-OLIVEIRA, 2004), fato este que me levou ao interesse pelo tema “trabalho do professor de pós-graduação”, já que produzir resenhas é uma das atividades referentes à pesquisa desenvolvida por esse profissional. Nessa época, estudar as relações entre linguagem e trabalho no ensino superior parecia instigante para compreender as outras atividades que o professor desenvolve.

Ingressei no doutorado em 2007 apresentando um projeto sobre o tema o trabalho do professor de pós-graduação, pois realmente estava interessada em compreender como se organiza o trabalho do docente nesse nível de ensino, pois, as discussões com a minha orientadora, os bate-papos informais com outros professores de pós-graduação e a tese de Alvarez (2000), que abordaremos mais adiante, indicavam uma problemática da profissão desse docente, já que parecia haver dificuldades para o professor gerenciar todas as atividades prescritas a ele por haver um acúmulo de trabalho que atualmente recai sobre o docente de pós-graduação. Isso nos fez levantar a hipótese de que o número de atividades que o professor precisa desenvolver acaba prejudicando a qualidade, além de levar o professor ao sofrimento no trabalho.

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pesquisa por indução do pesquisador. Podemos citar como exemplo as teses de Lousada (2006), Abreu-Tardelli (2006) e Mazzillo (2006) e as dissertações de mestrado de Correia (2007) e Barricelli (2007), e, ainda, os artigos de Bronckart e Machado (2004), Machado e Cristóvão (2005) e Machado e Bronckart (2005), entre outros, que têm como quadro teórico principal o ISD, que já tinha fornecido os subsídios necessários à minha pesquisa de mestrado. Além disso, tive acesso a pesquisas do grupo LAF (Language, Action et Formation4), da Faculdade de Psicologia e Ciências da Educação da Universidade de Genebra, dirigido pelo Prof. Dr. Jean-Paul Bronckart, ao qual os pesquisadores do grupo Alter são associados,5 e com o qual a PUC-SP mantém acordos institucionais, tendo se voltado, recentemente, para pesquisas em situações de trabalho (BRONCKART, 2006, 2008; BRONCKART; BULEA; FRISTALON, 2005; BULEA, 2007).

Com as leituras e com as discussões nos seminários e reuniões do grupo Alter fui aprimorando meus conhecimentos sobre o quadro do ISD, até compreender que os textos são considerados a materialização da ação humana. Sendo assim, ao interpretar um texto, nessa abordagem, estamos interpretando as figuras de agir, ou formas de agir, que o texto contém, e, portanto, aspectos da ação humana.6 Dessa forma, podemos interpretar o trabalho a partir de textos que, de alguma maneira, versam sobre ele, o que nos levará ao trabalho interpretado.

Nesse período, foi possível conhecer instrumentos de geração de dados procedentes da Ergonomia da Atividade e da Clínica da Atividade,7 utilizados pelos grupos Atelier e Alter, como os instrumentos de coleta denominados autoconfrontação,8 que foi utilizado nas pesquisas de Lousada (2006) e Buzzo (2008), e instrução ao sósia,9 utilizado por Tognato (2009) e nas teses de Carvalho (2009) e Lopes-Dias (2010). Interessei-me pela instrução ao sósia quando participei de um curso no 1o semestre de 2004 na PUC-SP, ministrado pelo Prof. Dr. René Amigues, que atua no Instituto Universitário de Formação de Professores de Aix-Marseille, e que fez uma simulação da instrução ao sósia nessa oportunidade, o que mostrou

4 Linguagem, Ação e Formação.

5 Ver site, disponível em: <http://fapsesrvnt2.unige.ch/Fapse/didlang.nsf?OpenDatabase>. Acesso em: 20 ago. 2008.

6 No Capítulo 3 esses pressupostos serão explicados detalhadamente. 7 Essas duas disciplinas serão abordadas no Capítulo 1.

8 A autoconfrontação, que pode ser simples ou cruzada, segue uma perspectiva vigotskiana e bakhtiniana, e consiste numa técnica de filmagem das sequências de atividade de trabalho para que possam ser vistas e analisadas pelo pesquisador e pelos trabalhadores em questão (CLOT et al., 2001).

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que a partir desse instrumento é possível colocar em cena os detalhes de uma atividade a ser realizada.

Tive acesso também, na disciplina citada no início desta introdução, à tese de Denise Alvarez (2000),10 intitulada A temporalidade, a organização do trabalho e a avaliação da produção acadêmica: o caso do Instituto de Física da UFRJ, desenvolvida no programa de Engenharia da Produção da UFRJ. Essa tese, em particular, por tratar do tema “produção acadêmica”, chamou-me muito a atenção pelos depoimentos dos professores-pesquisadores e de editores de revistas científicas, que abordam a problemática da produção de textos acadêmicos nessa era de produtividade e competitividade do mundo do trabalho. Com a leitura da tese de Alvarez (2000), que mostra que os professores-pesquisadores atuam em dois sistemas (o da universidade e o das agências de fomento), e, paralelamente a isso, as discussões com a minha orientadora, que comentava sobre o excesso de atividades que os professores têm de realizar na/para a universidade, interessei-me ainda mais pelo tema do trabalho do professor de pós-graduação. Senti-me, então, instigada a desenvolvê-lo, posteriormente, no doutorado, visando a compreender a complexidade desse trabalho.

É a partir do contexto explicitado anteriormente que surgiu o interesse em realizar uma pesquisa de doutorado sobre o grande tema “o trabalho docente no ensino superior”, utilizando como base teórica pressupostos do ISD, da Ergonomia da Atividade Docente e da Clínica da Atividade. Para prosseguir com a pesquisa, busquei estudos que tratassem desse tema, encontrando algumas pesquisas que abordam a grande temática “educação superior no Brasil”, como os livros Docência no ensino superior, de Selma Pimenta e Lea das Graças Camargos Anastasiou, de 2002, e Universidade: políticas, avaliação e trabalho docente, organizado por Deise Mancebo e publicado em 2004, composto por vários artigos que enfocam as reformas do Estado e políticas para o setor da educação superior, incluindo as políticas científicas e práticas de pesquisa; a questão da avaliação, gestão e financiamento na educação superior e a questão da formação e trabalho do docente do ensino superior. Essas pesquisas citadas revelam a problemática da profissão do professor de pós-graduação, tanto do ensino público como do privado, o que mostra que ele parece ser atingido pelo chamado “mal-estar docente”11 já que seu trabalho caracteriza-se por uma complexidade de atividades que são prescritas pelas instituições governamentais, sobretudo pelos órgãos de fomento à pesquisa, e pelas próprias universidades onde atua.

10 Tese indicada pela Profª Drª Maria Cecília Souza-e-Silva, a quem agradeço.

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Visando a estudar essa problemática, esta pesquisa alia pressupostos teórico-metodológicos oriundos de uma vertente do interacionismo social, o ISD (BRONCKART, 1999, 2006, 2008) e das disciplinas do trabalho, como a Ergonomia da Atividade e a Psicologia do Trabalho. Nesse quadro, o ISD, como vertente da psicologia vigotskiana, tem como objetivo maior investigar a problemática do agir humano, tendo se voltado, mais recentemente, a estudar o agir no trabalho. Diferente de outras vertentes, o ISD dá ênfase especial à linguagem e considera que as representações construídas nos e pelos textos têm um papel muito importante no desenvolvimento humano. Segundo Bronckart e Machado (2004), a análise de textos sobre a relação entre linguagem e trabalho possibilita a compreensão do trabalho do professor em relação a aspectos das interpretações/representações/avaliações que socialmente se constroem sobre o agir concreto. Podemos considerar representações sociais o conjunto de crenças, conhecimentos e opiniões que são produzidas e partilhadas pelos indivíduos de um mesmo grupo a respeito de determinado objeto social (CHARAUDEAU; MAINGUENEAU, 2008). As representações sociais, que se materializam nas produções textuais, são apropriadas pelos indivíduos, constituindo-se em representações individuais, tornando-se uma espécie de guias para ações futuras. As representações sobre a realidade só podem ser acessadas nos e pelos textos. Portanto, as representações veiculadas não são cópias nem reflexo da realidade, pois a linguagem não espelha, ela materializa representações, que são sociais. Assim, as representações são versões da realidade, sócio-historicamente construídas, como detalharemos no Capítulo 3. Desse modo, podemos entender melhor o trabalho a partir das representações que se constroem nos e pelos textos sobre determinada atividade, no nosso caso, o trabalho educacional.

Além da abordagem do ISD, partiremos da Ergonomia da Atividade, vertente da Ergonomia, representada pelo grupo Ergape (AMIGUES, 2002, 2004; SAUJAT, 2002, 2004), e da Psicologia do Trabalho, especificamente a Clínica da Atividade (CLOT, 2001, 2006, 2010; CLOT; FAÏTA, 2000; FAÏTA, 2002, 2004; ROGER, 2007; SCHELLER, 2001, 2003), que desenvolvem pesquisas sobre diferentes situações de trabalho, tendo contribuído com vários conceitos sobre o trabalho (trabalho prescrito, trabalho realizado, real da atividade), fundamentais para esta pesquisa, que serão discutidos no Capítulo 1.

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pressuposto, o qual compartilhamos, de que é necessária uma abordagem transdisciplinar em Ciências Humanas/Sociais, e não uma divisão de disciplinas que têm em comum o humano e o social. Desse modo, essas três abordagens consideram a necessidade das disciplinas se apoiarem umas nas outras para que possam explicar e compreender melhor os complexos fenômenos humanos. Especificamente, nossa pesquisa se constitui dentro do campo da Linguística Aplicada, na qual a análise da linguagem é foco central, sendo marcada pela transdisciplinaridade e privilegiando a compreensão das relações entre linguagem e trabalho educacional.

Partimos do princípio de é necessário ouvir a voz do próprio trabalhador, nesse caso específico a do docente de pós-graduação, para tentarmos compreender como se configura o seu trabalho a partir de textos produzidos por ele mesmo. Consideramos que as análises de diferentes textos sobre o trabalho podem fornecer uma nova compreensão sobre o trabalho do professor, nesse caso específico em relação a aspectos das representações que socialmente se constroem sobre ele. Segundo Bronckart e Machado (2004), compreender as representações sobre as ações, sua motivação, sua finalidade e a responsabilidade que o professor assume implica assumirmos que a análise dessa rede discursiva pode nos trazer a sua compreensão. A análise de textos produzidos pelo próprio professor permite compreender como ele realiza, interpreta e avalia o seu trabalho, possibilitando desvendar os modos de agir (o como fazer) e seu cotidiano.

Mesmo com a existência de estudos em diferentes ramos disciplinares, como os que citamos anteriormente, não encontramos pesquisas que abordem as atividades desenvolvidas pelo professor de pós-graduação stricto sensu com o olhar do linguista aplicado, associado ao do ISD, da Ergonomia da Atividade e da Clínica da Atividade, em uma abordagem discursiva. Desse modo, acreditamos que esta pesquisa seja relevante para compreender como se configura o trabalho do professor de pós-graduação, levando-se em conta não somente a atividade de docência, mas outras atividades que, a partir do contato com professores e de nossas pesquisas, sabemos que ele realiza.

A partir dos pressupostos teóricos mencionados, propomos responder a pergunta mais ampla de pesquisa, que será desmembrada em questões específicas no Capítulo 5:

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Para responder a essa pergunta, utilizamos um tipo de procedimento desenvolvido pela equipe da Clínica da Atividade (CLOT, 2006, 2010), denominado instrução ao sósia,sendo complementado por uma entrevista aberta com uma professora de pós-graduação de uma universidade pública. Na instrução ao sósia, o pesquisador/psicólogo se coloca na posição de sósia-substituto do participante de pesquisa, pedindo que este lhe dê instruções para realizar uma atividade de trabalho, possibilitando trazer à tona especificidades da situação de trabalho, conflitos, impedimentos e dificuldades para a realização da atividade. Desse modo, partimos da hipótese de que os conflitos vividos, os impedimentos do agir, as múltiplas tarefas atribuídas ao docente de pós-graduação stricto sensu12 podem se manifestar em textos nos quais o professor comenta/descreve/aborda o seu próprio trabalho, pois são nos e pelos textos que podemos ter acesso às representações.

Ligada ao objetivo e à questão de pesquisa, a tese que buscamos desenvolver consiste na ideia de que o professor de pós-graduação, nesse caso da área da linguagem, desenvolve uma multiplicidade de atividades complexas – pressionado pela universidade e pelas agências de fomento –, o que prejudica o desenvolvimento das atividades de pesquisa e de ensino e contribui para ameaçar a qualidade dos trabalhos desenvolvidos, além de levar o professor ao sofrimento no trabalho.

Embora integrantes do grupo Alter tenham desenvolvido diferentes pesquisas sobre o trabalho docente, tendo trazido muitas contribuições, elas se centram em outros níveis de ensino e/ou utilizam outros métodos de geração de dados. Além disso, esta pesquisa difere das outras da área da Educação ou das Ciências Sociais/Humanas, citadas anteriormente, porque faz a mediação entre o conhecimento proveniente de várias disciplinas, como já mencionado, utilizando a materialidade linguística como forma de possibilidade de compreensão, inserindo-se na área da Linguística Aplicada.

A pesquisa de Alvarez (2000), por exemplo, analisa entrevistas produzidas por professores de pós-graduação, porém, a sua investigação não tem como base a materialidade linguística e foi desenvolvida na área de Engenharia da Produção, utilizando pressupostos da Ergonomia e da Ergologia. Não encontramos, também, registros de pesquisas sobre o trabalho do docente de pós-graduação stricto sensu no campo transdisciplinar da Linguística Aplicada.

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Consideramos, assim, que este estudo possa contribuir para uma melhor compreensão das representações sobre as atividades realizadas pelo docente de pós-graduação, a partir da análise da linguagem, nessa era de profundas transformações pela qual a sociedade vem passando, que tem como resultado a ênfase na produtividade que acarreta excesso de trabalho e de exigências. Assim, ela pode ampliar os estudos existentes sobre a temática, contribuindo para que as instâncias superiores de pós-graduação no Brasil repensem a forma de organização do trabalho do professor, tendo em vista preservar a qualidade do trabalho docente. Além disso, esperamos trazer contribuições teórico-metodológicas no que se refere à forma de geração de dados e aos procedimentos de análise para o grupo Alter e para outros grupos que estudam a questão do trabalho, num momento em que se busca a compreensão do trabalho do professor, visando ao desenvolvimento de capacidades do profissional docente.

Para atingir nosso objetivo, dividimos nossa tese em cinco partes. No Capítulo 1, para que possamos compreender o trabalho do professor de pós-graduação, faremos um percurso histórico da pós-graduação no Brasil, desde a sua regulamentação até o século XXI, tentando resgatar o papel do professor de pós-graduação em documentos oficiais. Com as mudanças ocorridas, evidenciam-se vários instrumentos avaliativos como forma de controlar os resultados de trabalho do professor universitário. Assim, abordaremos o órgão de fomento Capes (Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior), seu sistema de avaliação e os critérios utilizados na avaliação trienal 2010 (2007-2009) para a grande área Letras/Linguística, na qual a participante desta pesquisa está inserida.

Após essa apresentação, discutiremos, no Capítulo 2, pesquisas que embasam a nossa concepção de trabalho, em geral, e de trabalho docente, em específico. Para isso, empregamos pressupostos da Ergonomia da Atividade, da Clínica da Atividade e do ISD, que desenvolvem conceitos fundamentais para a compreensão de uma das formas de agir humano, que é o trabalho.

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Após a apresentação da abordagem teórica e do modelo de análise, centramo-nos nos procedimentos metodológicos utilizados para a realização desta pesquisa. Desse modo, o Capítulo 5 é dedicado à descrição do contexto de pesquisa, à apresentação das perguntas específicas de pesquisa e à exposição dos procedimentos de geração de dados e de análise utilizados neste estudo.

Expostos os procedimentos utilizados, no Capítulo 6 apresentaremos os resultados das análises, visando responder às questões de pesquisa descritas no Capítulo 5, sendo abordados os temas mobilizados no texto analisado e as representações construídas referentes às atividades de trabalho do professor de pós-graduação stricto sensu.

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CAPÍTULO 1

CONCEPÇÕES DE TRABALHO E DE TRABALHO DOCENTE

[...] o trabalho é uma base que mantém o sujeito no homem, visto que é a atividade mais transpessoal possível. (CLOT, 2006)

Para identificar as representações construídas nos e pelos textos sobre o trabalho do professor consideramos necessário compreender qual é a concepção de trabalho, em geral, e de trabalho docente, em particular, assumida nesta tese.

Para tanto, adotamos como referenciais teóricos estudos de Ergonomia da Atividade (FERREIRA, 2001, 2008; GUÉRIN et al., 2001; AMIGUES, 2002, 2004; SAUJAT, 2002, 2004), de Clínica da Atividade (CLOT, 2001, 2006, 2010; ROGER, 2007) e de interacionismo sociodiscursivo (ISD) (BRONCKART, 2006, 2008; MACHADO; BRONCKART, 2009; MACHADO, 2008, 2010; entre outros) que apresentam pesquisas sobre diferentes situações de trabalho, contribuindo com o conceito de trabalho e de trabalho docente. Desse modo, primeiramente, abordaremos o conceito de trabalho numa visão ergonômica; em segundo lugar, partiremos do olhar da Clínica da Atividade, que é uma corrente da Psicologia do Trabalho, para a definição de trabalho; em terceiro lugar, trataremos de aportes de pesquisadores da linha do ISD que, mais recentemente, tem se voltado a situações de trabalho, preocupando-se, então, em defini-lo. Essas abordagens partem de uma visão interdisciplinar para estudar as questões indicadas. A partir desses estudos será possível conceituar os termos trabalho e trabalho docente com base em aportes teóricos de disciplinas diversas.

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1.1. O trabalho na visão ergonômica

Para que possamos investigar o conceito de trabalho, iniciaremos explicando o que vem a ser ergonomia, o seu surgimento histórico e o seu desenvolvimento, a fim de compreender o contexto sócio-histórico em que acontecem as construções e modificações desse conceito.

O termo ergonomia deriva das palavras gregas ergon = trabalho e nomos = normas, regras, leis. De acordo com a Associação Brasileira de Ergonomia,1 a Ergonomia é uma disciplina científica relacionada ao entendimento das interações entre os seres humanos e outros elementos ou sistemas, e à aplicação de teorias, princípios, dados e métodos a projetos, buscando otimizar o bem-estar e o desempenho global do sistema. É papel dos ergonomistas contribuir com o planejamento, projeto e avaliação de tarefas, postos de trabalho, produtos, ambientes e sistemas, a fim de torná-los compatíveis com as necessidades, habilidades e limitações das pessoas.

A disciplina Ergonomia surgiu oficialmente na Inglaterra, em 1947, procedente da pesquisa desenvolvida a serviço da Defesa Nacional Britânica durante a Segunda Guerra Mundial. Seus estudos foram desenvolvidos por uma equipe interdisciplinar, com o objetivo de amenizar os esforços humanos em situações extremas (SOUZA-E-SILVA, 2004). Ela se originou para a atuação de engenheiros, psicólogos e fisiologistas na remodelação da cabine de pilotagem (cockpit) dos aviões de caça ingleses. Por isso, é considerada “filha da guerra”,

tendo o estereótipo de ciência do posto do trabalho (FERREIRA, 2008).

Na Inglaterra, a Ergonomia tinha o objetivo de adaptar a máquina ao homem, levando em conta os fatores humanos na concepção de dispositivos técnicos, equipamentos, máquinas e instrumentos, visando a atenuar danos ao organismo humano provenientes da industrialização. Observamos, assim, que a Ergonomia abordava o trabalho na relação homem/máquina.

No mesmo período, na França, surgiram estudos direcionados à observação do trabalho humano, e essas pesquisas mostravam a complexidade das atividades de trabalho. Tanto na Inglaterra quanto na França, as pesquisas dialogavam com outras áreas do saber, porém, na Inglaterra, a Ergonomia visava à adaptação da máquina ao homem, e na França a preocupação central era com a adaptação do trabalho, que envolve várias dimensões, ao homem. Observamos, então, duas correntes da Ergonomia: de um lado, uma de influência

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anglófona que, pelas próprias condições históricas ligadas à aventura tecnológica nos países de língua inglesa, focaliza a adaptação da máquina ao homem; de outro, uma linha de influência francófona, ou de língua francesa, que, também por razões históricas, minimizou a aplicação de conhecimentos científicos e valorizou a adaptação do trabalho ao homem, preocupando-se com os efeitos reais da ação ergonômica sobre o trabalho (SOUZA-E-SILVA, 2004). Na verdade, os pesquisadores franceses começaram a não aceitar as teorias e práticas desenvolvidas nos Estados Unidos, pois consideravam que não se tratava de adaptar a máquina ao homem, mas de melhorar as condições de trabalho para esses indivíduos, fazendo surgir a Ergonomia de vertente francesa ou francófona (MACHADO, 2008, p. 86). No começo dos anos 1970, essa Ergonomia foi fortalecida, pois os trabalhadores franceses começaram a contestar muito a organização taylorista e fordista do trabalho. Assim, os sindicatos de trabalhadores diretamente atingidos por essas organizações solicitaram aos ergonomistas que desenvolvessem pesquisas para melhorar suas condições de trabalho. Nesse sentido, podemos dizer que a Ergonomia francesa ganhou maior impulso a partir de uma demanda dos trabalhadores, o que inclui os sindicatos.

Ao longo dos anos, a diversidade de práticas em Ergonomia deu origem a campos distintos de observação (projetos e correção) e de abordagens ou escolas distintas, a anglófona (human factor engineering) e a francófona (ergonomie de l’activité), não sendo essa distinção objeto de consenso na literatura. Há diferenças entre essas duas abordagens, principalmente

no que se refere aos “modelos de ser humano e de trabalho que se encontram velados ou explícitos nos diferentes usos que se faz em Ergonomia” (FERREIRA, 2008, p. 90). A

primeira tem como preocupação maior a efetividade e a eficiência no trabalho e o aumento da produtividade; somente em segundo lugar estão os valores humanos Em relação à francófona, trata-se da Ergonomia da Atividade, que seguiremos nesta tese e, por isso, dela faremos uma exposição mais detalhada.

A Ergonomia da Atividade surgiu na França e na Bélgica numa época em que havia forte preocupação com o social dos pesquisadores na Europa no século XX. Desde o início, ela esteve claramente articulada com o movimento operário, buscando transformar as situações de trabalho e, consequentemente, atender às demandas sindicais a fim de promover a melhoria das condições de trabalho e garantir a saúde dos trabalhadores.

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paradigma taylorista: ao invés de adaptar o homem ao trabalho, ela propunha a adaptação do trabalho (no sentido amplo do termo) ao homem.

Na abordagem taylorista, trabalha-se com o pressuposto de regularidade e estabilidade de funcionamento do operador. Um dos efeitos dessa abordagem foi a divisão entre o perito, que concebe o trabalho, e o executante, que o realiza, tratando, portanto de separar o trabalho prescrito (regras, normas) do trabalho efetivo, ou atividade. Desse modo, se a atividade fosse diferente da tarefa solicitada, haveria duas possibilidades: ou o trabalhador não teria realizado adequadamente a sua tarefa ou teria havido falha no sistema. Dessa forma, a função organizadora do trabalho tornou-se independente do trabalho efetivo, sendo o taylorismo acusado de roubar a competência dos operários (SOUZA-E-SILVA, 2004, p. 88).

A Ergonomia da Atividade nasceu, então, nesse contexto em que a atividade concreta dos trabalhadores e a maneira como a realizavam nunca estiveram efetivamente nas relações sociais. Essa disciplina recusava a abordagem mecanicista em que o homem pode ser reduzido à atividade que realiza e buscava provar que é possível mudar a técnica, os instrumentos e as condições de trabalho, operando uma inversão do paradigma homem/trabalho numa perspectiva de adaptar o trabalho ao homem. A partir de inúmeras pesquisas, observou-se que o objetivo taylorista de prescrever as tarefas dos trabalhadores em seus mínimos detalhes era totalmente impossível, já que há uma distância entre a prescrição e

a atividade real do trabalhador. Nesse sentido, a „‟Ergonomia da Atividade tem como

preocupação a melhoria do bem-estar dos trabalhadores” (FERREIRA, 2008, p. 90).

A seguir temos a definição da Associação Internacional de Ergonomia (IEA) apresentada por Ferreira (2008, p. 91):

A Ergonomia (ou o estudo dos fatores humanos) tem por objetivo a compreensão das interações entre os seres humanos e outros componentes de um sistema. Ela busca agregar ao processo de concepção teorias, princípios, métodos e informações pertinentes para a melhoria do bem-estar do humano e a eficácia global dos sistemas.

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adaptação do contexto de trabalho a quem nele opera. Visa, dessa forma, à transformação dos ambientes de trabalho buscando conforto e prevenção de agravos à saúde dos trabalhadores. Ainda segundo o autor, o objeto de estudo é a análise da interação e sua intervenção entre os indivíduos em um determinado contexto de trabalho (FERREIRA, 2008, p. 91).

Segundo Ferreira (2008, p. 91):

Tais características [as anteriores] habitam a Ergonomia como uma área científica, mesmo uma “ferramenta”, para atuar na temática de qualidade de vida no trabalho. Pode-se depreender que a razão de ser da Ergonomia é compreender os problemas (contradições) que obstaculizam a interação (mediação) dos trabalhadores com o ambiente de trabalho, cuja perspectiva é promover o bem-estar de quem trabalha e o alcance dos objetivos organizacionais.

No interior da Ergonomia ou na interface com outras disciplinas, estudiosos vêm definindo o termo trabalho, não existindo, segundo Ferreira (2000), uma definição canônica. Para Teiger (1993, p. 113), por exemplo, o trabalho é:

[...] uma atividade finalística, realizada de modo individual ou coletiva numa temporalidade dada por um homem ou uma mulher singular, situada num contexto particular que estabelece as exigências imediatas da situação. Essa atividade não é neutra, ela engaja e transforma, em contrapartida, aquele ou aquela que a executa.

Ferreira (2000) também traz à cena a definição de trabalho de De Terssac (1995, p. 8):

O trabalho é uma ação coletiva finalística. É uma ação “organizada” porque ela se situa num contexto estruturado por regras, convenções, culturas. É também uma ação “organizadora” porque ela visa não somente preencher as lacunas provenientes das imprecisões da prescrição, mas produzir um acordo, um espaço de ações pertinentes. É pela ação que se define, de forma interativa, o problema e a solução. É na ação que se operam as trocas de informações e que se constroem as formas de agir.

Observamos que essas duas definições de trabalho são semelhantes, pois ambas consideram a questão da coletividade, do contexto estruturado em regras e normas e, também, da interação que possibilita a transformação do trabalhador e a solução para os problemas.

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vizinhas, como, por exemplo, a Sociologia, a Psicologia etc.; e, especialmente, aquelas com as quais a ergonomia mantém uma estreita colaboração, como a Psicodinâmica e a Ergologia, por exemplo. Esclarece, assim, que a construção do conceito é de natureza interdisciplinar, reforçando seu caráter multidimensional e polissêmico, mas que permite identificar um fio condutor que parece costurar as diferentes abordagens, que é a atividade real que aparece como categoria central, desempenhando um papel estruturador dos conceitos. Desse modo, a atividade se constitui como a principal fonte produtora de conhecimento em Ergonomia.

O autor, ainda, propõe alguns elementos que ajudariam a tecer o conceito de trabalho em Ergonomia, que são indissociáveis da atividade humana em situação de trabalho. O primeiro é o fato de que o trabalho cumpre um papel mediador entre o homem e a natureza (material e/ou simbólica), havendo uma interação entre o sujeito e o ambiente. De um lado, o sujeito, ao agir diretamente ou indiretamente (mediação instrumental) sobre o meio pela atividade de trabalho, é, ao mesmo tempo, transformado por ele em função dos efeitos e resultados de sua ação. Por outro lado, a interação é guiada por objetivos que o sujeito

estabelece para o trabalho. Segundo Ferreira (2000, p. 7), “a estruturação dos objetivos dá

sentido à interação e resulta de um processo de apropriação (no sentido psicológico do termo)

e de releitura do que foi prescrito pela organização do trabalho”. Esses elementos, que ajudam

a tecer o conceito de trabalho, remontam a Marx (1967), e também são retomados por vários autores ao discutir a questão da ação, como veremos mais adiante (p. ex., BRONCKART, 2006, 2008, entre outros).

O segundo elemento posto por Ferreira (2000) é o fato de que os estudos da Ergonomia da Atividade evidenciaram que há distância entre o trabalho formalmente prescrito e o trabalho real em situação. A partir dos estudos que mostram essa distância, a Ergonomia contribui com a construção de algumas noções básicas que dão substância teórica ao conceito de trabalho no interior dessa disciplina, que são:

“trabalho teórico” (lato sensu), constituído pelas representações sociais habitando os pontos de vista dos diferentes sujeitos na esfera da produção (do operário ao diretor-presidente);

“trabalho prescrito ou previsto”, circunscrito num contexto particular de trabalho representando os “braços invisíveis” da organização do trabalho que fixa as regras e dita os objetivos qualitativos e quantitativos da produção;

“trabalho real”, comporta a atividade do sujeito, seu modus operandi numa temporalidade dada, num o lócus [sic] específico; onde ele coloca em jogo todo o seu corpo, sua experiência, seu

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operatórios visando regular sua relação com as condições objetivas de trabalho. (FERREIRA, 2000, p. 9-10, grifo nosso)2

Assim, observa-se que a Ergonomia da Atividade tem trazido contribuições no que se refere a mostrar que há distância entre o trabalho prescrito e o real, sendo essa distância fonte produtora de conhecimento para essa disciplina. A partir desses estudos, as análises e as intervenções insistem no fato de que mesmo uma atividade aparentemente bem simples cobra do trabalhador um esforço mental considerável para garantir o funcionamento do sistema produtivo. Em relação a esse aspecto, Ferreira (2000, p. 10) cita Dejours e Molinier (1994, p. 39), que afirmam que “O trabalho real não pode ser reduzido à sua dimensão técnico -econômica, nem mesmo à sua dimensão sócio-ética. Ele é também subjetivo e intersubjetivo e

repousa sobre energias afetivas.”. Ferreira (2000, p. 10) chama a atenção para o fato de que no

trabalho há o caráter de imprevisibilidade, que requer a todo momento a inteligência criadora do trabalhador, que não pode ser interpretada como sinônimo de interesse ou de prazer no trabalho, já que pode haver a fadiga, o sentimento de monotonia, a insatisfação e o sofrimento num mesmo posto de trabalho.

A partir dos estudos da Ergonomia da Atividade (ou francófona), várias disciplinas, que avançam em suas descobertas, foram se constituindo, como, por exemplo, a Ergologia (SCHWARTZ, 1996), a Psicopatologia do Trabalho (LE GUILLANT, 1984) e a Psicologia Clínica do Trabalho, que, por sua vez, constitui duas correntes principais: a Psicodinâmica do Trabalho (DEJOURS, 1996) e a Clínica da Atividade (CLOT, 2006, 2010). Centrar-nos-emos na última corrente, que contribui, por diferentes razões, entre outras coisas, com o conceito de real da atividade, avançando nos estudos da Ergonomia da Atividade no que se refere à definição de trabalho.

1.2. O real da atividade para a Clínica da Atividade

Nesta seção, centrar-nos-emos na definição de trabalho, enfocando o conceito de real da atividade, desenvolvido pela equipe da Clínica da Atividade do Conservatoire des Arts et Métiers (CNAM)3 de Paris, pois utilizaremos esse conceito nesta tese. Antes de abordar esse conceito, tentaremos compreender qual é o foco de estudo dessa Clínica da Atividade.

2 Disponível em: <http://vsites.unb.br/ip/labergo/sitenovo/mariocesar/artigos2/Atividade.PDF>. Acesso em: 23 dez. 2010.

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Segundo Lima (2010), a Clínica da Atividade é uma disciplina em processo acelerado de construção, sendo consideráveis seus avanços no decorrer dos últimos anos. Ela é uma corrente da Psicologia Clínica do Trabalho que aborda o problema da subjetividade no trabalho, situando-se na intersecção da tradição da Ergonomia francófona (de língua francesa) com a tradição da Psicopatologia do Trabalho. Segundo Clot (2001, p. 4, grifo do autor):

São as relações entre atividade e subjetividade que estão no centro da análise [da Clínica da Atividade]. O trabalho é visto não somente como trabalho psíquico, mas como uma atividade concreta e irredutível. Melhor dizendo, a atividade é, para nós, o continente escondido da subjetividade no trabalho. É precisamente neste campo que se observa, do modo mais claro possível, o que convém nomear aqui de desrealização das organizações oficiais do trabalho contemporâneo. Este é o ponto de partida de toda Clínica da Atividade.

Segundo o autor, as condições reais de exercício do trabalho efetivo não são preocupação dos diretores/gerentes dos postos de trabalho, mas, sim, as questões referentes à gestão administrativa. Esse real é permeado de armadilhas, vivências de impotência, ressentimentos e melancolia, ou, ao contrário, euforia profissional, formando um quadro clínico confuso. Para Clot (2001), várias responsabilidades são exigidas dos trabalhadores para agirem nos meios profissionais, sendo requerido que o trabalhador se dedique cada vez mais ao trabalho. Porém, a organização de trabalho não fornece os recursos necessários para essa dedicação, privando o trabalhador dos meios para exercer as responsabilidades que acaba tendo de assumir e impedindo-o de realizar o seu trabalho, o que pode levá-lo ao sofrimento.

É preocupação da Clínica da Atividade justamente esse sofrimento, que é considerado, para essa corrente, uma atividade contrariada, um desenvolvimento impedido, visto como uma amputação do poder de agir. Segundo Clot (2001), as organizações de trabalho de

diversos setores de serviço e da indústria costumam “diminuir” aqueles que trabalham,

ficando estes encolhidos pela atividade realizada. Nesse sentido, a atividade realizada é outra coisa totalmente diferente da tarefa oficial, como observam os ergonomistas, já que a simples execução da tarefa prescrita não permitiria atender os objetivos fixados. Avançando nas descobertas da Ergonomia, a Clínica da Atividade inclui na noção de atividade de trabalho o conceito de conflitos do real da atividade:

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momento. [...] A atividade possui então um volume que transborda a atividade realizada. (CLOT, 2001, p. 6)

Nesse sentido, as atividades suspensas, contrariadas ou impedidas, e mesmo as contra-atividades são consideradas na análise da Clínica da Atividade, assim como as contra-atividades improvisadas ou antecipadas. É a partir da compreensão do real de atividade que se pode extrair os conflitos de uma situação de trabalho. Assim, o conceito de atividade deve incorporar o possível e o impossível, visando preservar as possibilidades de compreender o desenvolvimento e o sofrimento (CLOT, 2001). É a partir dessa noção de real da atividade que a Clínica da Atividade concebe o trabalho.

Clot (2006), ao estudar a unidade de análise do trabalho, o define como uma atividade triplamente dirigida, pois ela se dirige ao comportamento do sujeito trabalhador, ao objeto da tarefa (limpar a casa; dirigir um táxi etc.), e aos outros (chefe, clientes, colegas de trabalho etc.). O sujeito, para realizar o trabalho, poderá utilizar artefatos materiais (vassoura, pá, panela etc.) e/ou simbólicos (instruções, mapas, placas de trânsito etc.). Esses artefatos poderão ser transformados em instrumentos de desenvolvimento das atividades do sujeito se forem apropriados pelo trabalhador, ou seja, se o trabalhador passar a vê-los como úteis para a realização da sua atividade; caso contrário continuarão como simples artefatos, sem contribuir para o desenvolvimento do sujeito.

Com o esquema da Figura 1.1 podemos ilustrar qualquer atividade de trabalho, com base em Clot (2006).

Sujeito

Artefatos (materiais ou simbólicos)

Objeto/meio Outros

FIGURA 1.1. Os elementos do trabalho. Fonte: Machado (2008).

A relação entre os elementos do trabalho (sujeito, objeto e outros) é conflituosa, pois,

no dizer de Clot (2006, p. 99), a “atividade dirigida é uma arena, ou melhor, o teatro de uma luta”, já que o trabalhador luta contra as contradições da atividade e sua prescrição, contra os

outros, contra os artefatos etc. Podemos imaginar uma situação vivida pelos professores da escola pública do estado de São Paulo, que têm trabalhado, normalmente, com material

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didático fornecido para cada aluno pela escola. Porém, no início de 2008, as escolas receberam da Secretaria da Educação um material – chamado de “jornalzinho” – somente para o professor,4 sendo que os alunos não receberam. Imaginemos a situação conflituosa pela qual passou o professor. Considerando que os alunos não receberam o material e a escola não disponibiliza cópias para os alunos, nem se pode pedir dinheiro aos alunos para cópias, pois

“o ensino público é gratuito”, o que esse professor poderia fazer? Utilizar o tempo que

poderia ser destinado à discussão para passar os textos na lousa? Não trabalhar com o material, mesmo sendo essa a prescrição da diretoria de ensino, e utilizar o material didático costumeiro, já que assim cada aluno teria acesso? Notamos aí um conflito, pois, de qualquer forma, seguindo ou não a prescrição, ele poderia ter problema, com o ensino-aprendizagem dos alunos e/ou com a diretoria. Nesse sentido, esse professor seria impedido de fazer o seu trabalho da forma como gostaria ou da forma como já tinha planejando. A partir do conceito de trabalho efetivamente realizado, não vemos esse conflito. Por isso, Clot (2006) propõe o conceito de real da atividade, abordado anteriormente, para aquilo que não é observável, assumindo que o trabalho real envolve também o trabalho pensado, impedido, desejado, possível. Desse modo, retomando a Ergonomia da Atividade e a Clínica da Atividade, teremos a/o:

1. Atividade prescrita: a tarefa; aquilo que é prescrito pelas organizações de trabalho e que deve ser feito.

2. Atividade realizada: é a atividade efetivamente realizada no trabalho.

3. Real da atividade: engloba o que não se faz, o que tentamos fazer sem conseguir, o que desejamos fazer.

Assim, observamos que o real da atividade ultrapassa não somente a tarefa prescrita

mas, também, a própria atividade realizada. Esse “real da atividade, ou seja, aquilo que se

revela possível, impossível ou inesperado no contato com as realidades, não faz parte das

coisas que podemos observar diretamente” (CLOT, 2006, p. 133). Para aceder a esse real da

atividade, a Clínica da Atividade parte de uma abordagem dialógica, de Bakhtin e Voloshinov, e de desenvolvimento vigotskiano, considerando o diálogo como motor do

desenvolvimento. Para Clot (2010, p. 133), “o diálogo e a ordem psicológica é que oferecem o

cenário em que os sujeitos encontram a si mesmos e aos outros, assim como se defrontam com suas histórias, contextos ambientais e circunstanciais”.

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Segundo o Clot (2010, p. 137), o diálogo é visto como instância do desenvolvimento, que se alimenta de outros diálogos anteriores e paralelos do grupo profissional, do qual ele retoma e reelabora os temas. Nesse sentido, as escolhas discursivas dos participantes desempenham um papel importante no processo de desenvolvimento.

Para possibilitar o diálogo, a Clínica da Atividade propõe alguns métodos para a análise do trabalho, como a autoconfrontação simples, a autoconfrontação cruzada, a instrução ao sósia,5 métodos estes que tornam possível o diálogo. Segundo Clot (2006), procedimentos metodológicos que propiciam o diálogo sobre o trabalho já geram, por si mesmos, algum tipo de transformação.

Assim, a Clínica da Atividade, e também a Ergonomia da Atividade, buscam não só compreender o papel do trabalho na perspectiva do desenvolvimento do trabalhador, como também investigar possibilidades de transformações da própria situação de trabalho. Para Clot (2006), numa perspectiva vigotskiana de explicação do desenvolvimento humano, que explicitaremos no Capítulo 3, a própria análise do trabalho contribui para a sua transformação.

A Clínica de Atividade põe em evidência o papel do coletivo e do social na construção do agir humano. Clot (2006) atenta para o fato de que o agir humano só é construído se o trabalho permitir que o sujeito tenha acesso ao mundo social em cujas regras ele possa se apoiar. Nesse sentido, o social, o que inclui o coletivo de trabalho, é essencial para que o indivíduo possa se desenvolver. Para o trabalhador, então, é importante ter um coletivo de trabalho em que ele possa se apoiar nos seus conflitos, nas suas dificuldades, que, muitas vezes, são coletivas. Esse coletivo não é somente o que está presente, mas, também, a verdadeira tradição histórica e social do ofício.

O papel desse coletivo é essencial nas análises de situações de trabalho da Clínica de Atividade do CNAM, que são interventivas e, por isso, os psicólogos/pesquisadores precisam de um longo tempo de trabalho de preparação e observação, já que na França a demanda de intervenção parte da própria instituição de trabalho. É nessa intervenção que são utilizados métodos, como os abordados anteriormente, que possibilitam a criação de diálogo pelo coletivo de trabalho sobre a atividade desenvolvida. Trata-se de processo de intervenção a partir do qual uma experiência vivida se torna um meio de viver uma outra experiência, em que há uma estreita relação entre interação, linguagem e desenvolvimento (CLOT, 2001, 2006, 2010).

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FIGURA 1.2. Elementos constituintes do trabalho do professor em situação de sala de aula
FIGURA 1.3. O conjunto possível de atividades do trabalho do professor que pode   ser detectado nas pesquisas
TABELA 4.1  –  Sequências, representações dos efeitos pretendidos e fases correspondentes   Sequências  Representações dos efeitos pretendidos  Fases
FIGURA 5.1. Conjunto de dados possíveis para a interpretação do agir em textos sobre o trabalho
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