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A evolução orgânica: uma história de intimidade entre as espécies

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Academic year: 2020

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A

EVOLUÇÃO

ORGÂNICA:

UMA

HISTÓRIA

DE

INTIMIDADE ENTRE AS ESPÉCIES

ORGANIC EVOLUTION: A HISTORY OF INTIMACY

BETWEEN SPECIES

LA

EVOLUCIÓN

ORGÁNICA:

UNA

HISTORIA

DE

INTIMIDAD ENTRE LAS ESPECIES

Rodrigo Ferraz Ramos1

Débora Leitzke Betemps2

Resumo: O objetivo da presente resenha é apresentar os principais tópicos debatidos na obra intitulada “O tapete de Penélope: o relacionamento entre as espécies e a evolução orgânica”, de autoria de Walter A. P. Boeger. A obra discute tópicos de biologia evolutiva, com enfoque nas diferentes associações entre as espécies biológicas. O autor emprega uma linguagem ilustrativa e rica em exemplos de fácil compreensão para um amplo público de leitores. Palavras-chave: Evolução. Mutualismo. Simbiose.

Abstract: The purpose of this review is to present the main topics discussed in the book entitled “O tapete de Penélope: o relacionamento entre as espécies e a evolução orgânica” by Walter A. P. Boeger. The book discusses topics of evolutionary biology, focusing on the different associations between biological species. The author employs illustrative language and rich examples of easy comprehension for a wide readership.

Keywords: Evolution. Mutualism. Symbiosis.

Resumen: El objetivo de la presente reseña es presentar los principales tópicos debatidos en la obra titulada "O tapete de Penélope: o relacionamento entre as espécies e a evolução orgânica", de autoría de Walter A. P. Boeger. La obra discute tópicos de biología evolutiva, con enfoque en las diferentes asociaciones entre las especies biológicas. El autor emplea un lenguaje ilustrativo y rico en ejemplos de fácil comprensión para un amplio público de lectores.

Palabras-clave: Evolución. Mutualismo. Simbiosis.

Envio 07/01/2019 Revisão 08/01/2019 Aceite 20/03/2019

1 Mestrando em Ciência do Solo. Laboratório de Biologia do Solo, Universidade Federal de Santa Maria. E-mail:

rodrigoferrazramos@gmail.com

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Na presente resenha, objetiva-se discutir a fascinante obra intitulada “O tapete de Penélope: o relacionamento entre as espécies e a evolução orgânica”, de autoria do Zoólogo Walter Antonio Pereira Boeger. Atualmente, Boeger é pesquisador e professor titular do Departamento de Zoologia da Universidade Federal do Paraná (UFPR), sendo reconhecido internacionalmente pelos seus trabalhos nas áreas de evolução e parasitologia evolutiva.

Ao longo da presente resenha, uma breve apresentação dos principais tópicos debatidos na obra será apresentada para ilustrar as abordagens empregadas e os temas suscitados pelo autor. Na obra, ao longo de sete capítulos, o autor desafia-se em abordar as relações entre as espécies biológicas através de uma linguagem ilustrativa e de fácil compreensão para o público leigo, contudo, igualmente mantendo-se o rigor científico através de uma escrita coerente e objetiva.

Inicialmente, o autor explora o conto de Penélope, da obra Odisséia de Homero, para ilustrar o entrelaçamento entre as linhas evolutivas (evolução) das espécies biológicas. A partir da imagem dos fios constantemente entrelaçados por Penélope ao tecer, o livro apresenta o processo em que diferentes linhagens evolutivas se ligam de forma direta ou indiretamente, em intensidades variáveis. O objetivo dessa analogia é ilustrar que os relacionamentos e associações entre as espécies podem influenciar a evolução do conjunto de espécies que habitam o planeta. Para tanto, Boeger prossegue a obra com diversos exemplos práticos e ilustrativos. Para o autor, a história evolutiva das espécies não pode ser considerada separadamente. Elas encontram-se entrelaçadas, como os fios no tapete de Penélope.

De acordo com o autor, “a evolução ocorre mediante o aparecimento de novidades evolutivas (mutações da molécula de DNA) que são moduladas pelo processo de seleção natural” (Boeger, 2009, p. 12). Para explicar didaticamente a evolução, Boeger propõe que o processo evolutivo ocorre mediante a analogia com um grande quarto que contém um enorme número de portas:

Essas portas representariam passos evolutivos pelos quais uma expressão temporal de uma linhagem evolutiva (isto é, uma espécie) pode proceder. Ao ‘passar’ por uma porta, a linhagem, agora modificada, entra em um novo quarto, com mais portas. Dependendo do entorno (hábitat, associações com outras espécies), da origem do processo de seleção natural e das características biológicas da espécie (por exemplo, fisiologia, morfologia, comportamento),

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algumas portas (isto é, caminhos evolutivos) podem estar trancadas, entreabertas ou completamente abertas (Boeger, 2009, p. 12).

Nesse sentido, nem todas as mudanças são igualmente possíveis e, portanto, os caminhos evolutivos (portas) que uma espécie pode percorrer são poucos, considerando o universo de caminhos possíveis. Essa analogia, quando analisada à luz dos debates atuais da biologia evolutiva, corrobora com a ideia de que a evolução não é um processo meramente ao acaso. Essa ideia, apesar de ser abordada no livro, é mais amplamente discutida em outras obras, como no livro “O Relojoeiro Cego”, de Richard Dawkins (2001).

Na obra, Boeger conceitua um fenômeno importante para melhorar a compreensão das mudanças evolutivas das espécies: a troca compensatória. Esse conceito assume que qualquer novidade evolutiva deve ser compensada pelo sistema biológico da linhagem onde esta novidade surgir. Por exemplo:

Acredita-se que a perda do trato digestivo do ancestral dos cestoides (tênias ou solitárias) só pode ser fixada [...] porque esse ancestral habitava um local rico em nutrientes já digeridos (o trato digestivo de hospedeiros vertebrados) e porque ele já apresentava a capacidade de realizar a absorção de moléculas relativamente grandes pela superfície corporal (absorção de compostos alimentares). Uma análise simplista sugere que a função de digestão e de absorção de substâncias alimentícias realizadas pelo sistema digestivo perdido foi compensada (daí o nome troca compensatória) pela absorção direta de compostos nutritivos já processados (digeridos) pelo hospedeiro diretamente pela superfície corporal (Boeger, 2009, p. 14).

O autor, ainda no início da obra, discute uma das questões mais polêmicas da Biologia: o conceito de espécie. Devido ao fato que as espécies adquirem e perdem características (genéticas, morfológicas, fisiológicas e comportamentais) ao longo do tempo, é inevitável a constatação de que o próprio conceito de espécie enquanto uma unidade evolutiva apresenta um caráter temporário. Assim, “a definição morfológica do que representa uma espécie, pode ter, portanto, um contexto temporal limitado” (Boeger, 2009, p. 19).

Como discute Boeger ao longo da obra, o caráter temporal da definição de espécie torna-se mais complexo quando constatado o fato que nenhuma das espécies biológicas existe isoladamente. Ou seja, todas as espécies existentes se relacionam com intensidades variáveis, onde essas relações, com diferentes graus de interdependência, influenciam os caminhos

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evolutivos possíveis que uma espécie poderá percorrer. Em algumas situações, diferentes espécies se relacionam tão intimamente que a extinção de uma das espécies inevitavelmente acarretará na extinção da outra espécie associada; enquanto que em outro extremo, alterações em uma das partes pode não interferir expressivamente sobre a outra.

Diante desse contexto, a obra prossegue discorrendo sobre os diferentes graus de associações entre as espécies. Para tanto, Boeger discute as associações simbióticas: parasitismo, mutualismo e comensalismo. Ainda, em outro grupo de associações não simbióticas, o autor discorre sobre o conceito de neutralismo, amensalismo, competição e predação. Com o intuito de demonstrar a abrangência e sobreposição desses tipos de relacionamentos interespecíficos, o autor apresenta ilustrativamente as relações simbióticas e não simbióticas na perspectiva de um espaço tridimensional. Assim, a partir dessa ilustração, Boeger apresenta exemplos práticos de relações entre diferentes espécies que se enquadrariam, ao menos teoricamente, dentro dos quadrantes tridimensionais para cada tipo de associação.

Para além de discorrer sobre os conceitos e exemplos de associações, Boeger debate sobre o surgimento e a evolução das mesmas. Como surge uma associação íntima entre duas espécies? Para o autor, em um primeiro momento, ocorre um evento que possibilita o contato entre os potenciais parceiros. Em seguida, ocorre uma fase de “co-acomodação”, quando as espécies que sobreviveram à fase inicial da associação passam por um processo de “co-adaptação”. Nesse contexto, é necessário que as espécies em processo de associação apresentem pré-adaptações que são necessárias para que a associação ocorra. As pré-adaptações, como discute o autor, “são características morfológicas, comportamentais e fisiológicas, entre outras, [...] que influenciam quais portas do quarto evolutivo estarão abertas para a espécie” (Boeger, 2009, p. 45).

Para exemplificar o estabelecimento das associações, Boeger discute as pré-adaptações necessárias para o surgimento do parasitismo de vermes nematóides (como lombriga) em vertebrados:

Para se tornar parasito do trato digestivo de um hospedeiro vertebrado, determinado organismo precisa, antes de colonizar esse órgão, de características que o permitam sobreviver aos “ataques” dos fluídos digestivos de seu novo ambiente. Sem essa pré-adaptação, o organismo é simplesmente digerido! A cutícula grossa e impermeável de vermes nematóides (como lombrigas), por exemplo, é considerada uma

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adaptação importante para a invasão do ambiente representado pelo

trato digestivo de vertebrados e invertebrados. De fato, essa característica parece ter facilitado à aquisição do hábito parasitário observado em diferentes linhagens de nematoides (Boeger, 2009, p. 45).

O autor discute a instigante hipótese de que as associações não simbióticas, como do tipo predador-presa, podem evoluir para associações simbióticas, como do tipo mutualística. Assim, a predação provavelmente possibilitou a origem da associação mutualística das mitocôndrias e dos cloroplastos com células eucarióticas, processo conhecido como endossimbiose primária:

As bactérias ancestrais da mitocôndria ou dos cloroplastos teriam sido ingeridas por organismos unicelulares eucariontes que, em vez de digeridas, seriam mantidas em vacúolos permanentes no citoplasma do parceiro. Evidentemente, a manutenção dessa associação mutualística favoreceu as linhagens eucariontes, descendentes do “predador”, pela disponibilização de compostos químicos de importância, como ATP e açúcares. [...]. Os parceiros se reproduzem separadamente, mas não se isolam durante esse processo” (Boeger, 2009, p. 49).

Ainda, o autor discute a implicação das associações no sucesso da colonização terrestre pelas plantas. Em geral, todos os solos no ambiente terrestre apresentam algum tipo de deficiência nutricional, e essa foi uma enorme barreira para que as plantas colonizassem o meio terrestre. Como discute o autor, atualmente considera-se que “a associação planta-micorriza foi um dos fatores mais importantes no sucesso dessa colonização” (Boeger, 2009, p. 68). Essa associação facilitou a colonização de novos ambientes em terra, devido ao fato que as micorrizas auxiliam na exploração dos recursos nutritivos e hídricos no solo, atuando na disponibilização de nutrientes limitantes para o desenvolvimento vegetal, como o fósforo. Outra associação mutualística que facilitou a dispersão das plantas em diferentes ambientes é associação entre espécies da família Fabaceae com bactérias fixadoras de nitrogênio do gênero

Rhizobium:

Bactérias desse grupo são mantidas em nódulos anaeróbicos nas raízes das fabáceas. As bactérias fixam nitrogênio na forma de amônia utilizada pela planta. Evidentemente, a habilidade dessas bactérias confere enorme potencial de colonização de solos pobres em nitrogênio (Boeger, 2009, p. 69).

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O autor também discorre sobre o fato que a própria espécie humana, Homo sapiens, apresenta associações com diversas outras linhagens de organismos. Como as demais espécies de eucariotos, os seres humanos herdaram as mitocôndrias. Ainda, “uma flora bacteriana de mais de 500 a 1000 espécies ocorre em associação com o ser humano” (Boeger, 2009, p. 95). Nossa espécie também é hospedeira de mais de 340 espécies de helmintos e outros parasitas, com ampla distribuição nas populações humanas pelo planeta, e com frequência, sendo responsáveis por altas taxas de mortalidade. Somos uma espécie que atua como “predadora, competidora, comensal, mutualista, amensal e mesmo como parasita, conforme alguns, de espécies de outras linhagens e mesmo de toda a biota” (Boeger, 2009, p. 95).

Por fim, a obra preserva a discussão de temas atuais da biologia evolutiva que são de grande importância nos debates atuais da Biologia. Para além da discussão de conceitos, a obra se propôs e cumpriu com o papel de discutir e exemplificar com coerência e rigor científico a origem das associações entre as linhagens evolutivas, contudo, mantendo-se uma linguagem ilustrativa e rica em exemplos práticos de fácil compreensão ao público leigo.

Referências

BOEGER, W. A. O tapete de Penélope: o relacionamento entre as espécies e a evolução orgânica. São Paulo: Editora UNESP, 2009. 108 p.

DAWKINS, R. O relojoeiro cego: A teoria da evolução contra o desígnio divino. São Paulo: Companhia das Letras, 2001. 496 p.

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