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Rev. adm. empres. vol.45 número2

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Academic year: 2018

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1 0 8 • ©RAE • VO L. 4 5 • N º 2

Essa mais recente publicação do psi-canalista brasileiro Jurandir Freire Costa é uma leitura que exige mui-to do leimui-tor – independentemente de ser psicólogo – devido a duas ques-tões principais. A primeira é a co-nhecida erudição do autor, que sabe transitar em várias áreas do conhe-cimento; a segunda, por tratar, es-pecialmente na primeira parte do livro, de temas estritamente ligados ao universo psicanalítico. Mas vale insistir e vencer a barreira inicial, pois o livro de Freire Costa nos aju-da a compreender o sujeito contem-porâneo, a maior contribuição do autor para os leitores do campo da Administração. Afinal, os conflitos, as ambigüidades, os sintomas e to-das as dificuldades que o autor des-creve estão presentes não apenas nos pacientes dos consultórios dos analistas; são questões

contemporâ-CORPO E SENTIDOS NA SOCIEDADE

CONTEM PORÂNEA

Por M aria José Tonelli

Professora da FGV-EAESP

E-mail: mjtonelli@fgvsp.br

RESENHA• CORPO E SENTIDOS NA SOCIEDADE CONTEM PORÂNEA

neas que também fazem parte do espaço organizacional.

A obra é uma análise extrema-mente aguçada do corpo, do consu-mismo e do sentido do excesso de objetos que nos rodeiam. A inten-ção do autor é discutir a sociedade contemporânea e desmistificar algu-mas explicações catastróficas e alar-mistas sobre a perda de valores e de tradições típicas do Ocidente na atu-alidade. Ele nos mostra que, dentre os sintomas exibidos pelos sujeitos contemporâneos, estão o desconfor-to em viver, a ansiedade crônica, a apatia, a depressão permanente, as agressões ao p r óp r io cor p o e a com pu lsão con su m ista. En tão a questão de como relacionar esses sintomas com o controle da sexua-lidade dos tempos freudianos. Os indivíduos contemporâneos são, em geral, sexualmente desinibidos, e

fica difícil associar esses sintomas à questão da sexualidade.

De fato, diz o autor, existe uma angústia frente às perdas dos valores, uma perplexidade que marca nossa conduta que se contrapõem aos ais de justiça do Iluminismo e aos ide-ais de auto-realização do romantismo filosófico e literário. O mundo esta-ria dividido entre esses valores a se-rem preservados e a moral do espetá-culo, em que a imagem do corpo é o centro das atenções. É justamente nesse contexto que o corpo – como sede das sensações e como centro das ações motoras – sofre um desequilí-brio. Os sintomas corporais resultam do conflito entre, de um lado, incor-porar e manter a imagem narcísica pro-pagada pela mídia e, de outro, manter o sentimento de continuidade.

Freire Costa argu men ta qu e a nossa cultura é

predominantemen-O VESTÍGIpredominantemen-O E A AURA: Cpredominantemen-ORPpredominantemen-O E

CONSUM ISM O NA M ORAL DO ESPETÁCULO

De Jurandir Freire Costa

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ABR./ JUN. 2 0 0 5 • ©RAE • 1 0 9

M ARIA JOSÉ TONELLI

te somática, onde a regulação do comportamento social é realizada pelos hábitos de consumo e pelas regras ordenadoras do culto ao cor-po. Os indivíduos oscilam entre a crença economicista de que somos aquilo que a produção econômica nos faz crer que somos – crença que está na base de muitas ideologias políticas – e a crença nos sentimen-tos, na qual somos entes espirituais, que devem ser protegidos do conta-to com os objeconta-tos materiais.

Ao criticar os conceitos freudia-n os de sexu alidade e de pu lsão como insuficientes para explicar o mal-estar contemporâneo, o autor não chega a indicar o que provoca-ria o sofrimento do sujeito. Entre-tanto, descreve os parâmetros que guiam os transtornos atuais, como os distúrbios alimentares, o fisicul-turismo compulsivo, a correção ci-rúrgica e as ansiedades de exposi-ção (síndrome do pânico e fobias sociais). O corpo é o cen tro das atenções, e, justamente por isso, os transtornos deixaram de ser ínti-mos. A alma e o sujeito psicológi-co desaparecem, e os transtornos passam a ser do corpo, seja na per-cepção da imagem, seja nos abusos da exploração das sensações corpo-rais p rovin d os d e d ep en dên cias químicas ou esportes radicais.

O imaginário da perfeição nos leva a buscar próteses e o corpo é a refe-rência central da imagem ideal do “Eu”, especialmente para as elites ur-banas. Como afirma Freire Costa, “é verdade que os indivíduos urbanos elegeram o bem-estar e os prazeres físicos como a bússola moral da vida” (p. 132) e na sociedade de espetácu-lo, o corpo é celebrado e não há mais espaço para a vida de sentimentos. Estar feliz hoje significa ter o corpo dos vencedores, da celebridade.

O autor retoma Winnicott e a sua idéia de que a pulsão é o sentimento

da continuidade da existência por meio de ações criativas, mas, na era do espetáculo, a nova felicidade deu as costas para outros prazeres e dese-quilibrou a economia da afetividade. Por isso, as depressões freqüentes!

Nesse ponto da discussão, o au-tor afirma que o culto ao corpo e a violên cia são as du as coisas qu e mais chamam a atenção na vida ur-bana contemporânea. O autor tam-bém se apóia em Hannah Arendt para mostrar qu e o con su mismo ocorre pela simultaneidade de dois fenômenos históricos: a fabricação em larga escala de produtos indus-triais e a invenção filosófica da feli-cidade. Essas duas condições leva-ram à in corporação dos objetos como algo que permite a elimina-ção da in satisfaelimina-ção sen timen tal. Antes, os objetos se apresentavam como uma expressão da subjetivi-dade, uma forma de externar o ínti-mo; agora eles constroem a emocio-n alidade. Rich ard Seemocio-n emocio-n ett, ou tro autor a ser retomado por Freire Cos-ta, coloca a questão da seguinte for-ma: o “comprismo” é uma pura prá-tica econômica ou o meio de cons-trução das identidades?

Freire Costa parece demonstrar algum desconforto frente a essa for-ma de construção da subjetividade, mas mostra o papel importante dos objetos na moral do espetáculo e na construção da privacidade burguesa. Os objetos representam a materiali-dade necessária à existência. E, as-sim como Gilles Lipovestky, o autor acaba por adotar uma postura em que considera que o sujeito moderno não é um monstro moral, mas preserva os valores fundamentais da ideolo-gia moderna de igualdade, liberdade e democracia. Todavia nos adverte de que esses princípios de justiça e de-cência são valores frágeis.

Nesse con texto, a violên cia – particu larmen te forte n os países

mais pobres – emerge como uma conseqüência da avidez na busca dos objetos supérfluos, estimulados pela pu blicidade. O au men to da pobreza e a concentração da renda diluíram algumas esferas da vida social, tais como a política, a reli-gião e a tradição familiar, o que le-vou à desorientação pessoal pela perda dos valores tradicionais, num período de hipertrofia do capitalis-mo. Entretanto, isso não quer di-zer que os valores foram perdidos; eles foram re-h ierarqu izados de acordo com a ciência e a mitologia cien tífica qu e gu iam algu n s dos m od ism os qu e con d icion am os comportamentos.

Sem dúvida, a leitura da obra de Freire Costa nos faz compreender melhor o nosso tempo, e alguns as-pectos tratados por ele poderiam ser complementados com a leitura de outros autores, como Guy Debord

em A sociedade do espetáculo, Anthony

Giddens em A transformação da

in-timidade, Zygmunt Bauman em O

mal-estar na pós-modernidade,

Mo-dernidade e holocausto e

Modernida-de líquida e Thomaz Wood Jr. em

Organiz ações de simbolismo intensi-vo, que nos ajudam a compreender a diversidade de condutas e a apa-rente desorientação com que vive-mos atualmente.

Referências

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