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BIODIVERSIDADE José Maria da Silva Júnior Márcia da Costa Rodrigues de Camargo Maria Luíza C. Dantas Lima SUMÁRIO

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José Maria da Silva Júnior

Márcia da Costa Rodrigues de Camargo Maria Luíza C. Dantas Lima

SUMÁRIO

CONSIDERAÇÕES INICIAIS ... 4

1 A RELAÇÃO HOMEM-NATUREZA ... 6

1.1 As bases da relação homem-natureza ... 7

1.2 Biodiversidade e Diversidade Cultural: um conceito econômico de recursos . 10 1.3 Modos de identificação da natureza ... 12

1.4 Modos de relação ... 14

2 A BIODIVERSIDADE GLOBAL E BRASILEIRA ... 16

2.1 Ecorregiões no Mundo ... 16

2.2 As Ecorregiões Brasileiras ... 18

2.3 Unidades de Conservação no Brasil ... 20

2.4 Corredores de Biodiversidade ... 21

2.5 A Conservação da Biodiversidade ... 25

2.6 A Questão da Biodiversidade no Brasil ... 27

3 A PROTEÇÃO DA BIODIVERSIDADE NO BRASIL ... 33

3.1 Os Marcos Precursores da Proteção à Biodiversidade ... 34

3.2 A Convenção da Biodiversidade: Aspectos e Princípios Gerais... 36

3.3 A Diversidade Biológica no Brasil ... 38

3.3.1 A Biodiversidade na Constituição Federal de 1988 ... 38

3.3.2 O Ordenamento Infraconstitucional e a Proteção da Biodiversidade ... 42

3.3.2.1 O Código Florestal de 1965 ... 42

3.3.2.2 A Lei de Proteção à Fauna (Lei nº 5.197/67) ... 44

3.3.2.3 A Criação de Áreas Protegidas (Estações Ecológicas e Áreas de Proteção Ambiental) pela Lei nº 6.902/81 ... 46

3.3.2.4 – A Lei da Política Nacional de Meio Ambiente – Lei nº 6.938/81... 47

3.3.2.5 – A Lei da Biossegurança – Lei nº 8.974/95 ... 48

3.3.2.6 – A Regulamentação da Convenção da Diversidade Biológica – Medida Provisória nº 2.186-16/2001 ... 49

3.3.2.7 – Regulamentação da Política Nacional da Biodiversidade – O Decreto 4.339/02... 55

4 CONSIDERAÇÕES FINAIS ... 61

BIBLIOGRAFIA ... 65

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CONSIDERAÇÕES INICIAIS

A presente exposição tem por objetivo uma abordagem sobre as visões de mundo possíveis acerca dos elementos que compõem o meio ambiente e as relações implícitas que se estabelecem entre os mesmos, através da interferência do homem sobre o meio, baseadas nestas visões de mundo, contextualizadas no espaço e no seu reflexo para a sustentabilidade.

O despertar para a importância da biodiversidade desenvolveu-se dentro de um contexto de crise ambiental devido a superexploração dos recursos naturais. A consciência sobre a possibilidade de esgotamento desses recursos, o que pode

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por em risco a sobrevivência futura da espécie humana, segundo nosso padrão ocidental de compreensão, tem nos levado a repensar a relação homem-natureza.

A noção de biodiversidade toma então um sentido novo porque vem nos alertar para a necessidade de uma gestão melhor adaptada à preservação dos grandes ecossistemas naturais. Pois, longe de assumir um ambiente tal como lhe é dado, cada sociedade o constrói segundo suas possibilidades e de acordo com suas necessidades.

Para entender as causas humanas da crise ambiental é, portanto, imprescindível compreender que as relações com a natureza, tratando-se de sociedades humanas, não são nunca relações padronizadas, porque refletem maneiras peculiares de conceber a pessoa humana, o espaço, o tempo e o cosmo.

Dessa perspectiva, a hipótese que estará sendo tratada durante essa análise diz respeito ao fato de que, se o esgotamento dos recursos naturais decorre da ação humana, é exatamente neste contexto das relações que é preciso situar as preocupações atuais e buscar alternativas possíveis.

Para alcançar tal propósito, num primeiro momento deste trabalho, buscaremos apresentar quais são as visões de mundo possíveis sobre os elementos que compõem o meio ambiente e as relações que se estabelecem entre eles. Seguindo um modelo geral de “ecologia simbólica”, proposto por Descola (1992-1996), antropólogo social francês, as diferenças entre os modos de identificação da natureza e os modos de relação com o meio ambiente serão aqui bem marcadas.

Num segundo momento, embora seja mesmo impossível avaliar a riqueza da biodiversidade como um todo, e até mesmo a riqueza de cada uma de suas

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espécies, buscaremos apresentar as principais estruturas que compõem a diversidade natural presente no contexto brasileiro.

Ao finalizar, tentaremos caracterizar os esforços legais, globais e brasileiros, que buscam regulamentar as relações entre as sociedades humanas e o meio ambiente.

1 A RELAÇÃO HOMEM-NATUREZA

Maria Luiza Dantas Lima Vincular causas humanas à atual crise ambiental já é senso comum. E quando se aprofunda a discussão, sob a ótica ocidental, observa-se que os problemas ambientais, tal como se apresentam, podem ser reduzidos a:

superexploração dos recursos naturais; poluição por causa de detritos que não se reciclam naturalmente ao ritmo de sua geração; superpopulação e pobreza constituída por aqueles que não ingressaram no processo de produção.

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Nota-se que as relações sociais implícitas no processo produtivo não são aqui discutidas, mas apenas os efeitos negativos decorrentes do sistema capitalista. Quando na verdade, há de considerar que as gerações humanas herdam de seus antepassados os meios de produção, distribuídos segundo determinadas regras, o que condiciona a sua organização social, a reprodução de sua cultura e a relação com o meio ambiente. Sendo assim, não discutir a “forma social” de produção, no momento em que a crise ambiental traz impactos de longo alcance temporal para a humanidade, é supor que a forma capitalista seja a única possível, contra o que assinala a história da humanidade (FOLADORI, 2001).

Estudos diversos da Antropologia têm apontado que todo ser humano vive e age segundo determinado código simbólico que lhes permite atribuir sentido ao mundo e às suas ações, gerando não somente as relações entre os próprios homens, mas também destes com o meio ambiente em que vivem.

Concepções de meio ambiente são assim socialmente construídas.

O que se pretende aqui é apresentar quais são as visões de mundo possíveis sobre os elementos que compõem o meio ambiente e as relações que se estabelecem entre eles, com base num modelo de “ecologia simbólica”

proposto por Descola (1992-1996).

1.1 As bases da relação homem-natureza

Entendendo que concepções de meio ambiente são socialmente construídas e variam de acordo com fatores históricos e culturais, observa-se que o princípio ocidental, segundo o qual o homem e a natureza são pensados como duas entidades separadas, não deveria ser projetado como um paradigma ontológico sobre muitas das culturas às quais não se aplica (DESCOLA,1992).

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Fato é que o reconhecimento do homem como elemento melhor relacionado com o meio natural transparece nos numerosos modelos de relacionamentos não- ocidentais com a natureza, que parecem mais adaptados à preservação da biodiversidade.

Entre os ameríndios da Amazônia, por exemplo, a noção de “natureza” é adjacente à noção de “sociedade”, constituindo uma grande sociedade, ou uma natureza cósmica (VIVEIROS DE CASTRO, 2002). Todos os membros desses grupos se consideram ligados a parentes vivos e mortos. Estes os remetem a lugares onde viveram os ancestrais e onde vivem atualmente. São esses ancestrais que legitimam os direitos de seus descendentes de uso dos recursos naturais existentes no território que habitam. Importante ainda ressaltar que, segundo a cosmologia ameríndia, as espécies animais e vegetais são liberadas para consumo mais extenso pelos seus “donos” espirituais, através de um acordo tácito mediado pelo xamã, cuja violação resulta em doença e morte ao ofensor e sua comunidade (TORAL, 1992).

Pelo que foi exposto, portanto, vê-se que dificilmente poder-se-ia , com base no nosso padrão de compreensão (ocidental), acusar os indígenas de estarem causando danos irreparáveis ao meio ambiente.

Por outro lado, segundo a tradição ocidental, a partir de preceitos científicos e naturalistas, a natureza é um “recurso”, um bem a ser apropriado pelo homem para atender às suas necessidades. Ou seja, o homem deixa de ser entendido como parte do mundo natural e pode dispor deste como bem entender.

Podemos dizer que a separação homem-natureza, característica do pensamento ocidental, tem sua matriz filosófica no pensamento clássico. Sócrates sustentava que os deuses haviam disposto tudo em benefício do homem. E em Aristóteles, é ainda mais visível essa imagem de uma natureza criada para a utilização pelos seres humanos.

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Mas foi sobretudo com a influência judaico-cristã que a oposição homem- natureza adquiriu maior dimensão. Os cristãos da Idade Média vão afirmar decididamente que “Deus criou o homem à sua imagem e semelhança”.

Localizado num lugar privilegiado, do alto Ele tudo vê e controla.

O homem é assim dotado de um privilégio. À imagem e semelhança de Deus, tudo pode. Aparece então como um intermediário entre Deus e o mundo natural, para ordená-lo e dominá-lo. Enfim, com o cristianismo, os deuses já não habitam mais a natureza. Esta, dessacralizada pode ser tornada objeto. O mercantilismo assim se afirma e se torna com o colonialismo, senhor e possuidor de todo o mundo.

Na Idade Moderna, entre os séculos XVII e XVIII, com Descartes entre outros, essa oposição homem-natureza, espírito-matéria, sujeito-objeto, se tornará mais completa, constituindo-se no centro do pensamento moderno e contemporâneo. Aqui, dois aspectos da filosofia cartesiana vão marcar a modernidade: 1) a natureza é vista como um recurso; 2) o homem passa a ser visto como o centro do mundo.

O homem, instrumentalizado pelo método científico, pode então penetrar os mistérios da natureza e assim tornar-se “senhor e possuidor deste”, utilizando-a para os fins que desejar.

Com a industrialização capitalista, essa tendência será levada às últimas conseqüências. Qualquer tentativa de pensar o homem e a natureza de uma forma integrada torna-se agora mais difícil, até porque a divisão não se dá somente enquanto pensamento. A divisão social e técnica do trabalho agora faz parte do mundo concreto dos homens e não pensar de modo fragmentado, passa a ser cada vez mais característico daqueles que parecem ter perdido o sentido de realidade.

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A Revolução Industrial, muito mais que uma profunda revolução técnica, foi o coroamento de um processo civilizatório que almejava dominar a natureza e para tanto submeteu e sufocou os que se opunham.

Em nome da ciência, do seu rigor técnico e metodológico, tem-se justificado toda uma prática de dominação dos homens e da natureza. De mãos dadas com a destruição da natureza, o crescimento do capitalismo produziu efeitos sobre a própria espécie humana. Substituiu o antigo trabalho servil e de produtores independentes pelo trabalho assalariado e fomentou o surgimento de um modo de vida de aglomerações (população excedente à produção) e de sobreexploração.

Submeteu as sociedades ao capital, ignorando que os povos subjugados e as classes exploradas também faziam parte do ambiente.

Nesse contexto, um dos primeiros passos para entender as visões de mundo e de natureza é buscar o conhecimento das relações entre os próprios homens e destes com o meio ambiente em que vivem.

Pois, se o esgotamento dos recursos naturais decorre da ação humana, é exatamente no contexto das relações homem-natureza que é preciso situar as preocupações atuais e buscar as alternativas possíveis.

1.2 Biodiversidade e Diversidade Cultural: um conceito econômico de recursos

Como vimos, o cartesianismo consolida dois pontos fundamentais do pensamento moderno: o caráter prático e utilitário do conhecimento e uma visão antropocêntrica do mundo e da natureza: “o homem é o centro do mundo” e, se a natureza existe, foi criada para servi-lo. Esta forma de pensar e de agir sobre o meio ambiente é que, ao longo do tempo, levou ao agravamento da problemática ambiental atual.

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Contudo, paralelo ao processo de modernização, observou-se uma preocupação crescente com a destruição do meio natural causada pelas atividades humanas. As manifestações de alerta vindas dos diversos setores sociais, políticos e científicos dão conta da necessidade de reformulação dos princípios e planos de ação que forcem a adoção de novas tecnologias, de medidas de contenção desses impactos ambientais e de preservação da biodiversidade.

Mas, apesar dos crescentes protestos, ao longo dos anos, a perda de biodiversidade prosseguiu, o que significa para o Brasil uma prova de fogo. Pois, não há como negar que a biodiversidade brasileira, internacionalmente reconhecida, é vista como fonte de matéria-prima para a produção industrial de alimentos, medicamentos, fibras, etc., estando longe de ter seus usos potenciais totalmente investigados, porque ainda é desconhecida em sua grandeza e porque o saber tradicional tem sofrido duros golpes da sociedade moderna, antes mesmo de ter o seu valor reconhecido (FOLADORI, 2001).

No caso brasileiro, portanto, a ameaça à diversidade natural incide diretamente sobre aquelas culturas que dependem dos recursos naturais para sua subsistência e reprodução cultural. E quando se fala em culturas tradicionais inclui-se, neste conceito, não apenas as comunidades indígenas, mas todas aquelas que vivem da estreita relação com o meio natural – comunidades ribeirinhas, rurais, remanescentes de quilombos, entre outros.

E, embora seja mesmo impossível avaliar a riqueza da biodiversidade brasileira como um todo, é possível pulverizá-la em fragmentos microscópicos, apropriar-se de algumas dessas unidades mínimas e conferir-lhes um valor econômico que pode render milhões no mercado mundial. Na verdade, a biotecnologia parece expressar um novo tipo de predação mais perversa e uma

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maneira sofisticada de submeter a biodiversidade à lei de mercado (FOLADORI,2001).

Há ainda outros “benefícios” que podem ser considerados, segundo a lógica de mercado: aqueles ligados à agricultura e á pecuária, por exemplo. Pois, quando se considera o estilo predatório de desenvolvimento que prevaleceu na sociedade moderna, é espantoso constatar que florestas e áreas de cerrado estão sendo destruídas, afetando não só a flora, mas também a fauna, simplesmente porque para os agentes econômicos o “valor natural” dessas áreas é menor do que o valor de usos alternativos do solo.

De fato, o destino da biodiversidade e, conseqüentemente, da diversidade cultural parece atado ao conceito econômico de recursos. A riqueza da biodiversidade brasileira vem sendo dilapidada para promover a sua integração na economia de mercado através de um estilo de desenvolvimento predatório.

Surge então uma indagação: Haveria outros modos de identificação e de relação com o meio ambiente, ou o “nosso” seria o único?

1.3 Modos de identificação da natureza:

Segundo um modelo de “ecologia simbólica” proposto por Descola (1992- 1996), antropólogo social francês, distingue-se três modos dominantes de identificação da natureza: animismo, totemismo e naturalismo.

O animismo, típico das cosmologias não-ocidentais, dota os seres não- humanos (animais, plantas, espíritos) de atributos humanos e sociais; chegando em alguns casos a conferir-lhes “cultura”, como hábitos, rituais, músicas e danças próprias. Um contexto, no qual o ser humano não é a única voz ativa no discurso cosmológico. Comum nas comunidades tradicionais, essa concepção orienta comportamentos sociais, permite interpretar acontecimentos e tomar decisões.

Então, por exemplo:

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- Entre os Makuna, grupo de língua Tukano do noroeste da Amazônia, o universo é pensado enquanto uma rede de troca de alimentos. E, assim, o universo é dividido entre “caçador” e “caça”, formando um esquema tripartido de classificação cósmica, com base na cadeia alimentar (ARHEM, 1993):

CAÇADOR SUPREMO caça/CAÇADOR caça

(seres espirituais que caçam e não são caça)

(humanos e

animais que ora caçam, ora são caça)

(plantas, frutos e sementes; que

são apenas

caça)

Desta forma, seres humanos e não-humanos interagem nos diferentes níveis de vida, garantindo a continuidade ordenada de todas as classes de seres.

- Entre os Achuar, do Equador, ter roça é sinal de status. A condição necessária para uma prática eficaz da horticultura é estabelecer um pacto harmonioso e permanente com Nunkui, o espírito tutelar das roças. Ou seja, enquanto mito de origem das plantas cultivadas, Nunkui é a “mãe” de todas as plantas cultivadas. E as mulheres, tomadas pela crença do poder mágico de Nunkui, também se colocam numa relação de consangüinidade com as plantas.

Elas também seriam “mães” das plantas cultivadas, tratando-as com dedicação.

Esta harmonia que reina entre as mãos femininas que cuidam e as plantas cultivadas é o que garante a presença espiritual de Nunkui na roça, que se revelaria concretamente na abundância, beleza e longevidade das plantações.

Um segundo modo de identificação, o totemismo, não é propriamente um esquema de interação entre humanos e não-humanos, como os outros dois modos (animismo e naturalismo), mas de classificações lógicas e diferenciais entre as espécies naturais (com base no conhecimento profundo de sua morfologia e modos de utilização) para conferir uma ordem interna ao grupo

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social. Ou seja, elementos da natureza para explicar a organização social. As unidades sociais são aqui determinadas por clãs. Então, por exemplo, o clã da ema, o clã do urso, entre outros. Os privilégios e proibições ligados às dependências de clã manifestam-se nas técnicas de trabalho, nos ornamentos e na alimentação. Um exemplo fácil de entender é aquele em que um caçador do clã da ema não pode caçar este animal. Uma lógica que também explica as relações entre os indivíduos dos diferentes clãs no que se refere aos laços de matrimônio.

Um indivíduo do clã da ema não pode casar-se com um indivíduo do clã do urso, porque não há nenhuma relação entre os elementos de um animal de planície (ema) e um animal de montanha (urso).

Um terceiro modo de identificação, e mais familiar à nós, é o naturalismo (aquele de desenvolvimento predatório). Nesse contexto, uma equivalência entre humanos e não-humanos é difícil de alcançar, por não se considerar a existência de uma base comum entre eles, pois são pensados como duas entidades separadas (herança do pensamento cartesiano), numa situação em que o homem é superior. Comum às culturas ocidentais, o pensar e o agir sobre o meio ambiente como se a natureza estivesse à disposição do homem é o que tem contribuído, ao longo do tempo, para o agravamento da problemática ambiental. E, exemplo do que ocorre, já foi dado no início desta fala – a superexploração dos recursos naturais.

Mas, estas identificações tornam-se realmente diferenciadas e significantes antropologicamente, quando mediadas por modos de relação entre os diversos elementos do meio ambiente, que refletem uma variedade de estilos e valores implícitos na práxis social.

1.4 Modos de relação:

Distingue-se assim três modos diferentes de relação homem- natureza:

predação, reciprocidade e proteção.

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A predação se estabelece quando na relação entre humanos e não- humanos, estes não participam de nenhum sistema de troca. É um modo de relação que se observa no animismo (entre os makuna da Amazônia, por exemplo, quando as plantas, frutos e sementes são apenas “alimento”); no totemismo (entre os aborígines australianos, quando a busca de alimento não carrega em si um significado simbólico – por exemplo, não há nenhuma interdição ao clã do urso de caçar a ema), e no naturalismo (entre os ocidentais, quando as relações são pautadas na exploração desmensurada dos recursos naturais).

A reciprocidade, por outro lado, baseia-se no princípio da estrita equivalência entre humanos e não-humanos, compartilhando a biosfera. É um sistema de troca recíproca de serviços, alimentos e fluxos vitais que se estabelece entre os vários habitantes do cosmos. Um modo de relação que se observa principalmente no animismo, quando esta troca revitalizante com a natureza envolve, por exemplo, homens e espíritos. Na cosmologia Makuna, assim como na cosmologia Karajá, em momentos de celebração, que exigem uma quantidade maior de comida, o xamã (homem) realiza um ritual no qual pede autorização aos “Donos Espirituais dos Animais” (Seres Supremos) para uma caça e pesca mais extensa; em troca oferece “comida espiritual” (folha de coca, tabaco e cera de abelha).

A proteção implica um contato direto e permanente com as espécies protegidas, e um tipo de dependência entre humanos e não-humanos geralmente recíproca, quando garante uma base de subsistência, um laço emocional, ou um laço de dependência com determinada divindade protetora. É um modo de relação que se observa no animismo (quando na Índia, por exemplo, é preciso que exista a vaca enquanto animal sagrado para que se proteja a “divindade” e por ela seja protegido); e no naturalismo (o caso das espécies domesticadas – por exemplo, o gado e a ave como base de subsistência; e o cão enquanto laço emocional).

Implica uma reciprocidade utilitária, em termos de espécie, em que esta acaba sendo beneficiada (proteção utilitária).

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Ao finalizar, mesmo no mais altruísta nível, caso dos movimentos conservacionistas contemporâneos, como pensar em conservação da biodiversidade, se vivemos uma sociedade cujo paradigma de identificação é naturalista e o modo de relação com o meio natural é predatório?

2. A BIODIVERSIDADE GLOBAL E BRASILEIRA

Márcia Rodrigues Costa de Camargo 2.1 Ecorregiões no Mundo

O conceito de ecorregião, já conhecido dos ambientalistas, torna-se chave da proteção ambiental. “Ela é uma unidade individual, com uma formação determinada”, explica o biólogo Leandro Ferreira, um dos responsáveis pelo trabalho.”Sua fauna e sua flora se interligam a outros elementos, como solo, relevo, regime de chuvas e até movimento de marés.” É com tais particularidades que essas regiões devem ser entendidas e protegidas. Não se trata mais de defender genericamente os biomas: o que garante o futuro da natureza é a adequada conservação dessas subdivisões particulares.

O Projeto Global do WWF Internacional começou em 1994 e traça um desenho completo do planeta. Em 2002, associou-se ao governo brasileiro e ao Banco Mundial, para completá-lo. O compromisso de preservar a natureza para as próximas gerações deve ir além de proteger paisagens agradáveis, ele pode incluir metas mais ambiciosas, como a de sustentar, em sua integridade, uma natureza rica, variada e generosa como poucas no planeta.

O Fundo Mundial para a Natureza (WWF, 2003), detalhou regiões terrestres para facilitar a sua conservação. Agrupadas em 14 ambientes, as 869 ecorregiões definidas pelos pesquisadores, estão representadas desta forma:

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Mangues

Ambientes tropicais, localizados na faixa do litoral entre marés, onde as águas doce e salgada se misturam. Ricos em nutrientes, servem de abrigo para peixes na época de reprodução e atraem aves em busca de alimento, como nos mangues da costa noroeste mexicana.

Campo de Inundação e savanas de regiões alagadas

Ambientes inundados sazonalmente e que atraem várias espécies de aves aquáticas na época da cheia, como os campos de inundação de Guayaquil, no equador.

Floresta Temperada Mista

Caracterizada por um mosaico de habitats e de espécies, como as florestas de baixada do leste dos Grandes lagos.

Floresta Úmida Tropical e Subtropical

Um dos ambientes com maior diversidade animal e vegetal do Planeta, como a Mata Atlântica, onde se encontra a maior parte das espécies de animais brasileiros ameaçados de extinção.

Campo de Gramíneas, Cerrados e Savanas tropicais e Subtropicais Necessitam de muita luz, onde há alternância de períodos de chuva e de seca, como as savanas tropicais da região oeste do Sudão, localizadas em terrenos planos.

Desertos e Campos Arbustivos Secos

Áreas onde quase nunca chove, geralmente localizadas em regiões muito quentes como o Deserto da Namíbia.

Regiões Montanhosas de Vegetação Arbustiva e Gramíneas

Topos de morros, onde a vegetação está adaptada as baixas temperaturas.

Um exemplo é o prado alpino das montanhas Hindu Kush, entre o Afeganistão e o Paquistão, com grave degradação ambiental.

Tundra

Ambiente rochoso, frio e de poucas chuvas, como a tundra das ilhas do Sul do Oceano Índico, em que se encontram vários insetos, aves e mamíferos marinhos.

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Floreta de Coníferas Tropical e Subtropical

Freqüentes nas regiões temperadas, elas ocorrem nos trópicos geralmente em locais elevados. Um exemplo são as florestas tropicais de pinheiros de Sumatra.

Floresta Boreal ou Taiga

Localiza-se somente no Hemisfério Norte, em locais frios e pouco úmidos, em regiões extensas, como a taiga russa e escandinava.

Floresta de Coníferas de Clima Temperado

Um exemplo são as do oeste do Himalaia, das quais dependem aves e mamíferos migratórios.

Floresta e Campos Arbustivos Mediterrâneos

Árvores que nunca perdem as folhas e arbustos adaptados para reduzir a perda de água nos verões quentes e secos, como os bosques do sudoeste da Austrália, com várias espécies de eucalipto.

Floresta Seca Tropical e Subtropical

Nela, as estações chuvosas e secas alternam-se. Nas ilhas Fiji, a floresta se reduz a fragmentos e é o habitat mais ameaçado do Pacífico.

Campo de Gramíneas e Savanas Temperadas

A intensidade das chuvas é bem menor que na região tropical, como nas savanas temperadas do sudeste da Austrália

As ecorregiões não respeitam as fronteiras entre os países. Elas são determinadas por um conjunto de características muito mais vitais que a simples divisão política das terras e, no entender das organizações não governamentais, como o próprio WWF, elas são uma ferramenta eficiente para orientar projetos de conservação.

2.2 As Ecorregiões Brasileiras

O ponto de partida da definição das 49 ecorregiões, realizado pelo Ibama em parceria com WWF-Brasil e TNC (ONGs), teve como um de seus pontos de

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referência o Mapa da Vegetação do Brasil, publicado em 1988 pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Nele, dados cruciais sobre desmatamento, relevo, ocupação agrícola e os parques e reservas florestais já estão anotados, tendo sido reajustados os limites dos biomas, a partir das análises realizadas.

Com o nome de Estudo de Representatividade Ecológica nos Biomas Brasileiros, o estudo que durou três anos, delimita 78 ecorregiões para o Brasil, sendo:

 Amazônia: 23 ecorregiões

 Cerrado: 22 ecorregiões

 Mata Atlântica : 9 ecorregiões

 Zona Costeira: 9 ecorregiões

 Caatinga: 8 ecorregiões

 Pantanal: 2 ecorregiões

 Campos Sulinos: 1 ecorregião

Segundo Moacyr Arruda (2003), biólogo-coordenador de ecossistemas do Ibama, o Brasil é hoje um dos países com menor índice de área protegida em relação a média mundial de 6%. Os biomas mais apoiados por unidades de conservação de proteção integral são o Costeiro com 6,31% e a Amazônia com 30 Unidades de Conservação protegendo 4,83% de sua área total. O terceiro mais protegido é o Cerrado, com 20 Unidades de Conservação que, no entanto, cobrem apenas 1,7% de sua área total.

As 23 ecorregiões da Amazônia já estavam definidas e serviram para a delimitação do Parque Nacional do Tumucumaque, no Amapá, com 3,8 milhões de hectares.

O estudo também definiu com precisão as áreas de transição, tecnicamente chamados de ecótonos, que costumam abrigar grande riqueza de espécies. Os

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três maiores ecótonos brasileiros chegam a ter áreas superiores a muitos países.

São eles, o Cerrado-Amazônia, que abrange 4,85% do território nacional, a Caatinga-Amazônia, que atinge 1,7% do País e o Cerrado-Caatinga, 1,3% do país.

No que se refere à definição das ecorregiões no Brasil importa considerar que:

“A definição das ecorregiões brasileiras baseou-se em mapas de flora e fauna, em imagens de satélite e mapas de relevo, hidrografia, solo, geologia, precipitação e outros fatores físicos, além de levantamentos específicos, realizados pela Universidade de Brasília, pela Embrapa, com o apoio da entidade ambientalista The Nature Conservancy (TNC), com sede em Washington, EUA“

(JOHN, 2003)

2.3 Unidades de Conservação no Brasil

A proteção da biodiversidade brasileira, através de parques e reservas, não se distribui de maneira eqüitativa em todo o país. Hoje existem 118 unidades de conservação (UCs) federais, abrangendo 2,74% do território nacional. Mas algumas das grandes regiões naturais (ou biomas) são privilegiadas, em termos de proteção legal, em relação as outras. Temos 47 parques Nacionais no Brasil, sendo 9 na região Norte, 12 na região Nordeste, 7 na região centro-Oeste, 10 na região Sudeste e 9 na região Sul.

Até agora, não tínhamos um estudo detalhando os 7 biomas brasileiros, por isso a implantação de unidades de conservação obedeceu outros critérios, conta Moacyr Arruda, do Instituto Brasileiro de Meio Ambiente( Ibama). A delimitação das ecorregiões, como unidades de paisagem, flora, fauna, que servem de base para o planejamento da preservação da biodiversidade. Uma grande região como a Amazônia, não é homogênea, mas subdividida em áreas menores, as

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ecorregiões – que funcionam como unidades para os seres vivos nativos, do mesmo modo como uma bacia hidrográfica funciona como uma unidade para a conservação da água.

“A delimitação das ecorregiões terá grande impacto na definição de políticas públicas, além da política de conservação, porque permite a análise das lacunas”

(JONH, 2003). Em outras palavras, com os mapas agora produzidos é possível saber quais as áreas importantes que ainda não estão legalmente protegidas e iniciar estudos para a criação de novas unidades de conservação, complementando a definição de áreas prioritárias, dos workshops realizados entre 1999 e 2000, com a participação de grande número de cientistas.

2.4 Corredores de Biodiversidade

O termo “corredores” foi primeiramente usado por Simpson (1963) no contexto de dispersão de fauna entre os continentes. Os registros paleontológicos são um “testamento” do valor de corredores intercontinentais. Hoje, em dia, o enfoque dado a corredores para reservas naturais é bem diferente. Entretanto, é interessante especular o quanto a idéia foi influenciada pela percepção anterior de que a biota se dispersa ao longo dos vales, bacias hidrográficas e outras características fisiográficas (SHAFER,1990). Leopold (1949) notou que vários animais, por razões desconhecidas, não pareciam ater-se às suas populações, porém, foi Preston (1962) que recomendou o uso de corredores entre reservas.

Usados estrategicamente, os corredores e zonas de amortecimento podem mudar fundamentalmente o papel ecológico das áreas protegidas. Esses corredores serviriam para aumentar o tamanho e as chances de sobrevivência de populações pequenas, além de poderem servir como possibilidades de recolonização de espécies localmente perdidas e, ainda, permitir a redução da pressão do entorno das áreas protegidas.

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Podemos melhor definir o que deverão ser nossos corredores de biodiversidade, como faixas de vegetação ligando blocos de habitat nativo; ou por exemplo como “Áreas homogêneas (numa determinada escala) de uma unidade da paisagem, que se distinguem das unidades vizinhas e apresentam disposição espacial linear”(METZGER,2001)

No sentido que tem sido utilizado por algumas organizações não governamentais ambientalistas, como o Instituto Conservation International, a Fundação SOS Mata Atlântica e o Instituto de estudos Sócio-Ambientais da Bahia- IESB, um corredor de biodiversidade ou um corredor ecológico, “compreende uma rede de parques, reservas e outras áreas de uso menos intensivo, que são gerenciadas de maneira integrada para garantir a sobrevivência de um maior número possível de espécies de uma região”.

A definição de corredores de biodiversidade numa paisagem, visa diminuir os efeitos da fragmentação e do isolamento de habitats, contribuindo também para um manejo mais apropriado de toda a região, uma vez que pressupõe introdução de novas técnicas de manejo e uso dos solos sem, no entanto, influenciar diretamente no desenho fundiário regional.

Segundo o documento “Planejando Paisagens Sustentáveis” o corredor de biodiversidade, é uma unidade de planejamento regional, muito mais que um mecanismo de zoneamento. Um corredor inclui tanto as áreas protegidas já existentes, como as por criar, as reservas privadas, áreas prioritárias, projetos demonstrativos e outras áreas de uso econômico intensivo.

Sob uma perspectiva biológica, o objetivo principal dos corredores de biodiversidade é manter ou restaurar a conectividade da paisagem. Para isso, são necessárias várias ações, algumas de caráter investigativo, outras de caráter indutivo e ainda algumas intervenções. Um primeiro conjunto de ações está relacionado ao conhecimento da região.

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O que pode, a estratégia de estabelecimento de corredores de biodiversidade mais acrescentar, além de seus resultados para a conservação da diversidade biológica, é a introdução de políticas de conservação que custem menos ao governo e a sociedade, permitindo que os últimos optem por receber compensações pelos seus esforços de conservação, em vez de verem impostas medidas autoritárias e burocráticas, sem que sequer se compreenda que objetivos pretendem alcançar (BRITO, 2002).

Finalmente, o sexto projeto do Subprograma de Unidades de Conservação e Manejo de Recursos Naturais, no âmbito do PPG-7, em fase final de preparação é o projeto parques e reservas, que tem como objetivo a conservação in situ da biodiversidade das florestas tropicais brasileiras, por meio da integração de Unidades de Conservação públicas e privadas em Corredores Biológicos selecionados. Os alvos específicos são a implementação de unidades modelo em áreas de alta prioridade para a diversidade biológica, a expansão do sistema de Reservas Particulares do Patrimônio Natural (RPPNs) e a preservação de grandes blocos de florestas tropicais, por meio da integração de populações locais e outros atores. O manejo integrado dos corredores ecológicos visa facilitar o fluxo de indivíduos e genes entre populações, aumentando a probabilidade da sobrevivência das espécies em longo prazo e assegurando a manutenção de processos ecológicos evolutivos em larga escala.

Por intermédio da Diretoria de Ecossistemas (DIREC), o IBAMA é o executor do projeto, junto com governos estaduais e municipais e Organizações não Governamentais.

Sete corredores prioritários foram propostos, após estudos extensivos, dos quais cinco na Amazônia e dois na Mata Atlântica. Juntos, eles representam 25%

das florestas tropicais úmidas brasileiras e podem preservar 75% das espécies de animais e plantas nelas existentes. São eles:

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Corredor Centro –Amazônico, que inclui grandes extensões de florestas inundadas e de terra firme nas bacias dos Rios Negro e Solimões. As florestas inundadas deste corredor têm alta diversidade biológica e muitas espécies endêmicas. Ele inclui a Reserva de Desenvolvimento Sustentável de Mamiruauá, a ESEC de Anavilhanas, a Floresta Nacional de Tefé, o Parque Nacional (PARNA) do Jaú, a Reserva Florestal Adolpho Ducke, outras nove Unidades de Conservação e 14 áreas indígenas.

Corredor Norte-Amazônico, situado na fronteira Norte do Brasil com a Colômbia e a Venezuela. Inclui montanhas e ecossistemas de altitude ainda praticamente intocados. Abrange o PARNA do Pico da Neblina, a FLONA de Roraima, o Parque Estadual da Serra do Araçá, mais 17 Unidades de Conservação e 20 áreas indígena.

Corredor Oeste-Amazônico, um ambiente que abriga muitas espécies de aves, plantas e macacos. Provavelmente é o mais rico da Amazônia em termos de biodiversidade. Inclui o PARNA da Serra do Divisor, as Reservas Extrativistas (RESEX) Chico Mendes e do Rio Preto-Jacundá, mais 30 Unidades de Conservação e 30 áreas indígenas.

Corredor Sul-Amazônico, vital para a proteção da fauna e da flora entre os rios da margem direita (sul) do Amazonas: Tapajós, madeira, Xingu e Tocantins. Inclui áreas localizadas em três Estados (Amazonas, Pará e Maranhão), que abrangem a Floresta Nacional do Tapajós, o Parque Nacional (PARNA) da Amazônia, a Reserva Biológica (REBIO) de Gurupi, mais três Unidades de Conservação e 20 áreas indígenas.

Corredor do Ecótono Sul-Amazônico (Amazônia-Cerrado), localizado nas áreas de transição entre a Amazônia e as savanas do Cerrado. É um ecossistema ameaçado de extinção devido ao avanço da fronteira agropecuária. Inclui o Parque Nacional (PARNA) do Araguaia situado na Ilha do Bananal, Estado de Tocantins e 17 áreas indígenas nos Estados do Amazonas, Mato Grosso e Tocantins.

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Corredor Central da Mata Atlântica, com áreas de alta biodiversidade nos Estados do Espírito Santo, Minas Gerais e costa sul da Bahia. Abriga muitas espécies de animais e plantas da planície costeira. Inclui a Reserva de Sooretama, a reserva Florestal de Linhares, a Reserva Biológica (REBIO) de Uns, os Parques Nacionais (PARNA) de Monte pascal e da Serra do Caparão, além de outras Unidades de Conservação e áreas indígenas que, juntas, formam um mosaico de fragmentos florestais.

Corredor Sul da Mata Atlântica (Corredor da Serra do Mar), a maior extensão contínua de Mata Atlântica e a mais viável para a conservação.

Este corredor inclui 27 Unidades de Conservação, como a Área de Proteção Ambiental (APA) Estadual da Serra do Mar (São Paulo), a Área de Proteção Ambiental (APA) da Serra da Mantiqueira (MG), os Parques Nacionais (PARNA) da Serra da Bocaina e o de Itatiaia (Rio de Janeiro), a Área de Proteção Ambiental (APA) de Guaraqueçaba (Paraná)”.

O Projeto Corredores Biológicos está programado para duas fases, cada uma com duração de cinco anos. Na primeira serão implantados o Corredor Centro-Amazônico e o Corredor Central da Mata Atlântica, o Corredor do Descobrimento (MMA, 1998).

2.5 A Conservação da Biodiversidade

Durante a Conferência das Nações Unidas, sobre meio Ambiente e Desenvolvimento (a Eco-92), em 1992, cerca de 175 países, incluindo o Brasil, assinaram a Convenção da Diversidade Biológica (CDB), que foi ratificada em 1994, pelo Brasil. A partir daí foram traçados planos e estratégias para a conservação e uso sustentável da biodiversidade, de modo a atender as exigências da CDB.

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Os objetivos da Convenção da Diversidade Biológica foram dispostos no seu artigo 1º, nos seguintes termos:

“Os objetivos desta Convenção, a serem cumpridos de acordo com as disposições pertinentes, são a conservação da diversidade biológica, a utilização sustentável de seus componentes e a repartição justa e eqüitativa dos benefícios derivados da utilização dos recursos genéticos, mediante, inclusive, o acesso adequado aos recursos genéticos e a transferência de tecnologias pertinentes, levando em conta todos os direitos sobre tais recursos e tecnologias, e mediante financiamento adequado”. (CDB, Ministério do Meio Ambiente)

O Significado do termo Diversidade Biológica, segundo o artigo 2º do texto final da Convenção foi assim definido:

“Diversidade Biológica significa a variabilidade de organismos vivos de todas as origens, compreendendo, dentre outros, os ecossistemas terrestres, marinhos e outros ecossistemas aquáticos e os complexos ecológicos de que fazem parte;

compreendendo ainda a diversidade dentro das espécies, entre espécies e de ecossistemas “(CDB, Ministério do Meio Ambiente)

A Biodiversidade é uma das propriedades fundamentais da natureza, responsável pelo equilíbrio e estabilidade dos ecossistemas, e fonte de imenso potencial de uso econômico. É a base das atividades agrícolas, pecuárias, pesqueiras e florestais e, também a base para a estratégica indústria da biotecnologia.

As funções ecológicas desempenhadas pela biodiversidade são pouco compreendidas, muito embora se considere que ela seja responsável pelos processos naturais e produtos fornecidos pelos ecossistemas e espécies que

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sustentam outras formas de vida e modificam a biosfera, tornando-a apropriada e segura para a vida. A diversidade biológica possui além de seu valor intrínseco, valores ecológicos, genéticos, sociais, científicos, educacionais, culturais, recreativos e estéticos. Com tamanha importância é preciso evitar a perda da biodiversidade. (MMA/biodiversidade).

2.6 A Questão da Biodiversidade no Brasil

Brasil possui uma área de 8,5 milhões de km2, ocupando quase a metade da América do Sul. Essa área possui várias zonas climáticas que incluem o trópico úmido no norte, o semi-árido no nordeste e áreas temperadas no sul. As diferenças climáticas contribuem para as diferenças ecológicas formando zonas biogeográficas distintas, chamadas biomas. A maior floresta tropical úmida (Floresta Amazônica) e a maior planície inundável (Pantanal) do mundo se encontram nesses biomas. Isso sem falar do cerrado (savanas e bosques), da Caatinga (florestas semi-áridas) e da Mata Atlântica (floresta tropical pluvial).

O país também possui uma costa marinha de 3,5 milhões km2 com uma variedade de ecossistemas que incluem recifes de corais, dunas, manguezais, lagoas, estuários e pântanos. A variedade de biomas reflete a riqueza da flora e fauna brasileiras, tornando-as as mais diversas do mundo. Muitas das espécies brasileiras são exclusivas no mundo (e são chamadas de endêmicas), sendo que o país sozinho tem pelo menos 10% das espécies conhecidas de mamíferos e anfíbios e 17% das espécies de aves descritas em todo o planeta. Diversas espécies de importância econômica mundial são originárias do Brasil, como por exemplo: abacaxi, amendoim, castanha do Pará, a mandioca, o maracujá, o caju, a seringueira e a carnaúba.

Em anos recentes, a intervenção humana em habitats que eram estáveis aumentou significativamente, gerando perda de biodiversidade. Biomas estão

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sendo ocupados, em diferentes escalas e a degradação dos mesmos chega velozmente.

Áreas muito extensas de vegetação nativa foram devastadas no Cerrado, na Caatinga e na Mata Atlântica (desde o descobrimento do Brasil, em 1500), ficando reduzida a apenas 5% de sua área original.

Os principais processos responsáveis da perda da biodiversidade são:

 Perda e fragmentação dos habitats

 Introdução de espécies e doenças exóticas

 Exploração excessiva de espécies de plantas e animais

 Uso de híbridos e monoculturas na agroindústria e nos programas de reflorestamento.

 Contaminação do solo, água e atmosfera por poluentes.

 Mudanças climáticas

 Queimadas

 Avanço das fronteiras agrícolas

 Biopirataria

A extinção ameaça 13% dos peixes, 11% dos mamíferos, 10% dos anfíbios, 8% dos répteis, e 4% das aves, As florestas tropicais perderam 10% de sua área, na década de 90.

As inter-relações das causas de perda de biodiversidade com a mudança do clima e o funcionamento dos ecossistemas apenas começam a ser vislumbradas.

O Princípio da Precaução, aprovado na Declaração do Rio aprovado na Declaração do Rio durante a Conferência das nações Unidas sobre meio

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Ambiente e desenvolvimento (Rio-92) estabelece que devemos agir imediatamente e de forma preventiva, em vez de se esperar a confirmação das previsões sobre extinção das espécies para então se tomar medidas corretivas, em geral caras e ineficazes.

Há diferenças essenciais entre a natureza das responsabilidades e dos interesses entre nações provedoras de diversidade biológica, como o Brasil, e os países consumidores desses recursos para o seu desenvolvimento biotecnológico.

Estes últimos se preocupam com a extinção da biodiversidade, mas tem propostas guiadas por interesses econômicos. Já os países provedores querem o retorno econômico da utilização de seu patrimônio, para melhorar a qualidade de vida de sua população.

Estudos recentes estimam entre 16 e 54 trilhões de dólares o valor anual dos serviços ambientais proporcionados por 16 tipos de ecossistemas do planeta.

Levando-se em conta que o Brasil detém entre 10 a 20% da biodiversidade planetária e 12,7% dos deflúvios dos rios do mundo, além de 3,5 milhões de quilômetros quadrados de águas costeiras, não seria arriscado afirmar que o valor estimado da biodiversidade e dos serviços dos ecossistemas situa-se na casa dos trilhões de dólares anuais, algumas vezes o valor do PIB nacional.

Mais rico entre os países de megadiversidade, o Brasil conta com pelo menos 20% do total de espécies do planeta. Tem a flora mais diversificada.

Também tem 17% das aves do planeta. Mais de 524 espécies de mamíferos, entre os quais 77 primatas (27% do total mundial), mais de 103 das aves que estão ameaçadas de extinção.

Os estudos demonstraram que o Brasil abriga:

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TABELA 1

A DIVERSIDADE BIOLÓGICA DO BRASIL 45.000 espécies de plantas

superiores

22% do total mundial

524 mamíferos 27% do total mundial

517 anfíbios 294 endêmicos

1677 aves 191 endêmicas

498 répteis 172 endêmicas

- 3.000 espécies de peixe de água doce - cerca de 1.000.000 milhão de insetos.

Fonte: IBAMA,

Mas, em 3 de abril de 1992, através da Portaria n. 37-N, o IBAMA publicou a Lista oficial de Espécies da Flora Brasileira Ameaçada de Extinção, contendo 107 espécies, entre as mais conhecidas, estão o gravatá, o pau-de-rosa, a.aroeira-do- sertão, a castanheira, a sucupira, o jequitibá, o pau-brasil, várias espécies de bromélias, a araucária, a helicônia, a lelia-verde, a canela-preta, a dracena-da- praia, o jaborandi, o anjelim-rajado, a baraúna, o mogno e a imperatriz-do-brasil.

(BRASIL, 1992)

Em 1995, a estimativa de espécies ameaçadas de plantas no planeta, era de 26.106, além de 533 mamíferos, 562 pássaros, 257 répteis, 133 anfíbios, 934 peixes, 2647 invertebrados. (GLOBAL BIODIVERSITY ASSESSMENT, 1995).

Em 27 de maio de 2003, o Ministério do Meio Ambiente, publicou a Lista das Eespécies da Fauna Brasileira Ameaçadas de Extinção, contendo:

• Vertebrados: 5 (ex: tatu-bola, tamanduá, tatu-canastra);

• Chiroptera: 5 (ex: morcego);

• Primates: 27 (ex: mico-leão-dourado,bugio,sagüi,coatá);

• Carnívora: 2 (ex: lobo-guará e cachorro-vinagre);

• Felidade: 7 (ex: puma, jaguatirica,onça pintada);

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• Mustelidae: 1 (ex: ariranha);

• Cetácea: 7 (ex: peixe-boi,,baleia-azul,boto-amarelo);

• Artiodactyla: 2 (ex. cervo-do-pantanal, veado-bororó-do-sul);

• Rodentia: 11 (ex. rato-do-cacau, ouriço-preto);

• Aves: 162 (ex: jaó, codorna, carapé, albatroz-real,pretinha,fura-buxo, tesourão-pequeno,arara-azul, gavião cinza,águia-cinzenta, mutum, jacu- de-barriga-vermelha, uru, jacamim, sana-cinza, rolinha-do- planalto,papagaio, pica-pau,cuspidor-do-nordeste, araponga-de- barbela,arapaçu, tico-tico-do-campo,anumará, cardeal amarelo,pintassilgo,pixoxó, João-do-araguaia,João-baiano);

• Reptilia: 14 (ex: jararaca, cobra-de-vidro);

• Testudines: 6 (ex: cágado, aruanã,tartaruga-oliva);

• Amphibia: 16 (ex: rãzinha, perereca-verde,sapinho);

• Invertebrados: 21 (ex: aranha-armadeira, escorpião);

• Insecta: 113 (ex: libélula, besouro,abelha, saúva).

A questão da perda de biodiversidade, não deve levar a pessimismos, ou previsões catastróficas. É preciso, isto sim, organizar-se de maneira a conservar o patrimônio biótico, de tanta importância que a água e o ar.

Para, isso, a sociedade deve ser plenamente informada do estado e da evolução da diversidade biológica e das conseqüências inerentes a certas escolhas econômicas e sociais.

É preciso que a humanidade faça as pazes com a natureza, através de uma educação ambiental aplicada desde cedo, além de políticas nacionais e internacionais que realmente sejam concretizadas.

Aquilo que foi destruído, não volta, mas não teremos desculpa para não cuidar do que existe hoje no planeta.

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No Brasil, nossa responsabilidade é ainda muito maior, pois somos um país megadiverso, com uma população jovem, e um caminho de desenvolvimento que tem que ser claro, nas suas diretrizes ambientais, mas principalmente, formar-mos mais e mais técnicos e cientistas, que abracem a questão ambiental, como sendo prioritária para a manutenção da biodiversidade para as gerações futuras, de tal forma, que em pouco tempo, serviremos de exemplo as demais Nações, como o país que mais investe em pesquisa, tecnologia e controle do seu maior patrimônio:

a Natureza Brasileira.

3 A PROTEÇÃO DA BIODIVERSIDADE NO BRASIL

José Maria Junior As discussões globais em torno da diversidade biológica e sua importância para o futuro da vida no Planeta são recentíssimas, tendo sido desenvolvidas a partir dos debates em torno dos limites físicos e ambientais da Terra, em face dos crescentes índices de pressão demográfica e produção econômica.

Nesse contexto de crise, decorrente dos impactos das atividades humanas sobre recursos naturais, situações como os níveis crescentes de deterioração da qualidade ambiental pelo aumento da poluição, a constatação do desaparecimento maciço e veloz de meios naturais (com a quebra do equilíbrio dinâmico dos seus ecossistemas), além dos prováveis efeitos sobre os fenômenos reguladores da biosfera, determinaram a preocupação dos organismos ambientais, científicos e

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governamentais pelo tema da diversidade biológica, levando á promoção de ações consistentes para a compreensão da sua dimensão e importância local e global.

Dada a atualidade e importância do tema é pertinente o estabelecimento dos marcos teóricos e jurídicos que determinaram o amplo tratamento hoje dedicado ao tema da biodiversidade no plano internacional e seus reflexos no Brasil, que superando a tradicional proteção fragmentária de recursos ambientais evolui para uma proteção mais abrangente e sistêmica, internalizando, através da inserção de disposições legais conservacionistas e preservacionistas os compromissos da nação com as presentes e futuras gerações de brasileiros.

3.1 Os Marcos Precursores da Proteção à Biodiversidade

Prenunciados pelas conclusões do Clube de Roma, quanto aos limites para o crescimento e pelas discussões da Conferência das Nações Unidas de Estocolmo, em 1972 – a partir da idéia de que sendo o planeta um sistema finito de recursos seu colapso somente poderia ser evitado a partir de medidas capazes de controlar as pressões do crescimento exponencial da população e da produção econômica sobre os recursos naturais existentes – vários foram os esforços empreendidos para a uma compreensão mais sistêmica dos elementos componentes do meio ambiente, culminando na constatação de que o modelo de desenvolvimento ainda em curso tem sido o responsável pela acelerada desagregação ou pelo desaparecimento de inúmeros meios naturais e de seus componentes biológicos.

Em 1986, como discorre Milaré (2002), foi realizado em Washington DC, sob os auspícios da National Academy of Sciences e Smithsonian Institution, o “Fórum Nacional sobre Biodiversidade”, onde o tema foi amplamente discutido, sob o enfoque dos seus riscos e desafios, da importância de sua preservação, da dependência humana á diversidade biológica, do seu valor econômico, e, da sua necessária proteção e monitoramento com ajuda da ciência e tecnologia, além da indicação de políticas para sua proteção.

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No âmbito da Organização das Nações Unidas (ONU), as discussões de Estocolmo evoluíram para a criação, em 1983, da Comissão Mundial sobre o Meio Ambiente e Desenvolvimento, cujos trabalhos, concluídos em 1987, expressos no chamado “Relatório Brundtland – Nosso Futuro Comum”, sistematizaram as relações entre o modelo de desenvolvimento reinante – motor das desigualdades entre as nações e seus povos, do subdesenvolvimento e da degradação ambiental em larga escala – cujos impactos estão intrinsecamente relacionados à perda da biodiversidade ante à despreocupação com os recursos naturais, em nome da máxima eficiência do modelo de exploração.

Através da Resolução 44/228, de 1989, adotada pela Assembléia Geral das Nações Unidas, foi convocada a Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento, realizada em junho de 1992 no Rio de Janeiro, para delineamento das questões que seriam objeto das deliberações, destacando-se no grupo das preocupações ecológicas, a proteção da atmosfera, através do combate à alteração do clima, à destruição da camada de ozônio e à formação da chuva ácida; a proteção da qualidade da água dos rios e lagos; a proteção das águas oceânicas e marítimas; a proteção e controle das terras, com o combate ao desmatamento, à desertificação e à seca; e a conservação da diversidade biológica. Embora colocados como temas destacados, observa-se a sua nítida interconexão, dada a sua inegável relação sistêmica.

Na Conferência do Rio (ECO-92), o tema ganhou a dimensão intergovernamental merecida, redundando na Convenção da Biodiversidade, assinada por 156 países, sendo tratada ainda, no capítulo 15 da Agenda 21, documento também assinado durante a conferência.

A Convenção da Biodiversidade, assinada em 1992 e ratificada pelo Senado Federal em fevereiro de 1994, quando passou a vigorar, constitui um instrumento que dita princípios gerais e não normas a serem diretamente aplicadas no âmbito

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de cada país signatário, servindo de substrato para a internalização dos compromissos internacionalmente assumidos no ordenamento jurídico nacional.

Além do tratamento mais abrangente e sistemático pela Convenção da Biodiversidade, outros instrumentos internacionais cuidaram de aspectos mais específicos indiretamente relacionados à proteção da diversidade biológica, destacando-se a Convenção sobre o Comércio Internacional das Espécies da Fauna e Flora Selvagens em Perigo de Extinção (CITES), vigorando no Brasil desde 1975; a Convenção das Nações Unidas sobre o Direito do Mar – que trata sobre a proteção e preservação do meio e da fauna marinha – oficializada no Brasil desde 1990; e, por fim, a Convenção RAMSAR sobre Zonas Úmidas de Importância Internacional, como habitat de aves aquáticas, adotada oficialmente pelo Brasil em fevereiro de 1993.

3.2 A Convenção da Biodiversidade: Aspectos e Princípios Gerais

A Convenção da Biodiversidade constitui o mais amplo esforço global rumo à tomada de consciência da gravidade da situação pela extensa e rápida destruição de ecossistemas naturais e das suas espécies, a partir do reconhecimento do valor intrínseco da diversidade biológica e seus componentes, nas suas dimensões ecológica, genética, social, científica, educacional, cultural, recreativa e estética.

Em seu preâmbulo, os signatários consideraram a importância da biodiversidade para a evolução e para a manutenção dos sistemas que constituem a vida da biosfera, como uma preocupação comum da humanidade, respeitados os direitos soberanos dos Estados sobre os seus próprios recursos biológicos.

Reconhecem, ainda, a sua responsabilidade pela conservação e utilização sustentável dos seus recursos biológicos, assim como a necessidade da

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promoção de cooperação internacional entre os Estados, as organizações intergovernamentais e não-governamentais para cumprir este objetivo.

Discorrem, também, sobre a necessidade do desenvolvimento de capacitação técnica, científica e institucional que proporcione os conhecimentos necessários à implementação das medidas de proteção, conservação in situ e ex- situ, assim como para a recuperação de populações viáveis de espécies no seu meio natural.

Reconhecem, mais, a relação de dependência das populações tradicionais com os recursos biológicos locais e o seu direito de receber eqüitativamente os benefícios derivados do seu conhecimento tradicional e de suas práticas conservacionistas e de uso sustentável.

Consideram, por fim, que o acesso e a repartição dos recursos genéticos e tecnológicos são essenciais para o atendimento das necessidades de alimentação, saúde e, por sua vez, dependentes da conservação e utilização sustentável da biodiversidade.

Os objetivos da Convenção consistem na conservação da diversidade biológica, na utilização sustentável de seus componentes e na repartição justa e eqüitativa dos benefícios derivados da utilização dos recursos genéticos, prevendo-se a transferência tecnológica e o respeito aos direitos sobre tais recursos e tecnologias.

Um dos seus princípios mais significativos (previsto no seu artigo 3º) é que os Estados têm o direito soberano de explorar seus próprios recursos biológicos, de acordo com suas políticas ambientais e a correspondente responsabilidade de assegurar que as atividades não venham a provocar danos além dos seus limites jurisdicionais. Outro aspecto (previsto no artigo 6º), diz respeito à obrigação do desenvolvimento de estratégias, planos ou programas para a conservação e

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utilização sustentável da biodiversidade. No mesmo diapasão, indica a necessidade da identificação e monitoramento dos elementos componentes da biodiversidade, para conhecimento dos processos e atividades que possam atuar negativamente sobre a sua conservação e utilização sustentável (art. 7º).

Este prevê ainda que os países devem estabelecer um sistema de áreas naturais protegidas, com o objetivo de conservar in situ a biodiversidade dos seus territórios, bem como para a adoção de medidas para a conservação ex situ de seus componentes (artigos 8º e 9º).

É prevista a implantação de programas de educação, treinamento científico e pesquisas voltadas à identificação, à conservação e à utilização sustentável da biodiversidade (art. 14), além da necessidade do processo de avaliação de impacto ambiental de projetos cujos efeitos sejam potencialmente danosos à diversidade biológica.

Finalmente, evidenciam-se as preocupações em garantir que os países em desenvolvimento, onde a maior parte da diversidade biológica está concentrada, tenham acesso às tecnologias que utilizam seus recursos, participem das pesquisas em biotecnologia e tenham acesso aos recursos destinados ao cumprimento das finalidades da convenção (artigos 16, 19 e 21).

3.3 A Diversidade Biológica no Brasil

Destaca-se, ao longo da história legislativa brasileira, inúmeros instrumentos legais destinados à proteção de elementos componentes da biodiversidade, os quais embora com objetivos setoriais ou fragmentários, já delineavam a sua importância como bem de interesse da sociedade.

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A efetiva participação do Brasil nas discussões internacionais sobre desenvolvimento e meio ambiente e o acompanhamento ativo, ao longo das três últimas décadas, das discussões técnicas e científicas em torno da problemática ambiental foram determinantes para as várias incursões de regulação do tema no ordenamento jurídico nacional, inclusive durante os trabalhos da Assembléia Nacional Constituinte instalada em 1986, redundando em várias previsões constitucionais relacionadas à preservação e conservação, anteriores à própria convenção sobre a diversidade biológica.

3.3.1 A Biodiversidade na Constituição Federal de 1988

A constituição democrática de 1988 estabelece uma série de dispositivos expressa ou tacitamente relacionados à biodiversidade, destacando sua importância para as presentes e futuras gerações de brasileiros.

No capítulo reservado ao meio ambiente (Brasil, 1988), arrola como dever do poder público e da sociedade, a preservação e a restauração dos processos ecológicos essenciais e o manejo ecológico das espécies e ecossistemas (art.

225, § 1º, I); a preservação da diversidade e integridade do patrimônio genético do país e fiscalizar as entidades dedicadas à pesquisa e manipulação de material genético (art. 225, § 1º, II); a proteção dos espaços territoriais e seus componentes a serem especialmente protegidos (art. 225, § 1º, III); a proteção da fauna e da flora e de sua função ecológica (art. 225, § 1º, VII).

A Carta Constitucional prevê ainda princípios e critérios para a preservação da Floresta Amazônica brasileira, da Mata Atlântica, da Serra do Mar, do Pantanal Mato-grossense e a Zona Costeira, todos erigidos à condição de Patrimônio Nacional (art. 225, § 4º).

No que se refere à preservação e restauração dos processos ecológicos essenciais, evidencia-se a preocupação em indicar como responsabilidade do

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Poder Público, em todas as esferas de governo (federal, estadual e municipal), quanto aos processos responsáveis pelo funcionamento dos ecossistemas (fluxo de energia e matéria e processos da evolução, por exemplo), através da promoção de ações destinadas a garantir a manutenção do que se encontra em boas condições e à recuperação do que foi degradado.

O manejo ecológico das espécies e ecossistemas, conforme a lição de Silva (2001), diz respeito ao cuidado com o equilíbrio das relações entre a comunidade biótica e seu hábitat, através de uma gestão ambiental que considere princípios científicos, técnicas e tecnologias capazes de manter ao máximo as características e condições naturais existentes, por meio de programas de manutenção da biodiversidade ou de reflorestamento com essências nativas ou exóticas, como exemplifica Milaré (2002).

A preservação da biodiversidade, disposta na Constituição de 1988, significa a adoção de medidas voltadas ao reconhecimento, inventário e manutenção da variedade e diferenças dos seus elementos componentes, demonstrando a preocupação com a diversidade e a integridade do patrimônio genético nacional, essenciais para a produção de novas utilidades alimentares ou farmacêuticas.

De alta significância é a determinação constitucional quanto ao controle das entidades de pesquisa e manipulação de material genético, em face do desenvolvimento da biotecnologia em todo o mundo, abrindo a possibilidade de estudos e exploração em larga escala das espécies da flora e da fauna e dos mais variados microorganismos, com aplicações ilimitadas na indústria, na medicina e na agricultura, desenvolvimento este que demanda o maior cuidado com as pesquisas e a manipulação dos materiais genéticos, tanto no sentido de garantir os aspectos econômicos e estratégicos decorrentes da propriedade intelectual sobre os conhecimentos produzidos – com a repartição dos benefícios oriundos do desenvolvimento tecnológico e científico – quanto no que se refere ao

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estabelecimento e respeito aos valores éticos, sociais, morais e culturais envolvidos.

A definição de espaços territoriais protegidos, referida na norma constitucional, diz respeito à proteção das áreas de interesse ecológico relevante, face às suas características naturais e principalmente sua diversidade biológica, de modo a garantir sua representatividade e integridade, como explica Gouveia (1993), reduzindo ou impedindo intervenções danosas ao meio ambiente.

Destaca-se a previsão expressa de que embora esses espaços,possam ser criados por lei ou por decreto do executivo, estabelecendo os mecanismos de uso, conservação e preservação da área e dos recursos naturais nela contidos, somente podem suprimidos ou alterados através de lei, assegurando uma maior participação da sociedade, através dos seus representantes eleitos, na modificação do regime de sua destinação ou uso.

A proteção à fauna e à flora é também expressa pela ordem constitucional brasileira como obrigação do Poder Público e da sociedade, inclusive vedando textualmente as práticas que possam colocar em risco sua função ecológica, venham a provocar a extinção de espécies ou submetam os animais à crueldade.

A proteção constitucional, como salienta Milaré (2002) “se estende para além do ser vivo, abrangendo suas relações ecossistêmicas”, representando um princípio destinado à garantia da mais ampla proteção da biodiversidade brasileira.

No que se refere à fauna, o princípio protetivo abrange os animais silvestres, domésticos e domesticados, terrestres e aquáticos, em razão da sua importância enquanto espécies e indivíduos para o equilíbrio dos ecossistemas em que se inserem, pois como salienta Milaré “nem todas as espécies de animais têm a mesma função na biosfera, apresentando cada qual peculiaridades que lhe são inerentes do ponto de vista ecossistêmico”.

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