Daniela Maria Pias de
Prestação familiar de cuidados a idosos
Daniela Maria Pias de
Prestação familiar de cuidados a idosos
Figueiredo
dependentes com e sem demência
Abordagem multidimensional das (dis)semelhanças
Tese apresentada a Universidade de Aveiro para cumprimento dos requisitos necessários a obtenção do graude Doutor em Ciências da Saúde, realizada sob a orientação científica da Doutora Liliana Xavier Marques de Sousa, Professora Auxiliar com Agregação da Secção Autónoma Ciências da Saúde da Universidade de Aveiro, e sob a co-orientação científica da DoutoraMargarida Pedroso de Lima, Professora Associada da Faculdade de Psicologia e de Ciências da Educação da Universidade de Coimbra
Professora Doutora Maria Constança Leite Paul dos Reis Torgal
professora catedrática do instituto de Ciências Biomédicas Abel Saiazar da Universidade do Porto
Professora D o J ~ o ~ ~ Madalena M o ~ t nno Alarcão e Silva
professora associaaa aa Fac.. oade oe Ps cuoq,a e oe C ericas ad Eo~cacáo oa J n iers oaoe ae Coimbra
Professora Doutora Margarida Maria Baptista Mendes Pedroso de Lima
professora associada da Faculdade de Psicologia e de Ciências da Educação da Universidade de Coimbra
Professora Doutora Liliana Xavier Marques de Sousa
professora auxiliar com agregação da Universidade de Aveiro
Professor Doutor Manuel Teixeira Veríssimo
professor auxiliar da Faculdade de Medicina da Universidade de Coimbra
Professor Doutor José Ignácio Guinaldo Martin
agradeço o empenho colocado, a constante disponibilidade, a capacidade de motivar nos momentos de desânimo, a confiança depositada, a paciência permanente e os suportes, formais e informais, que disponibilizou. Agradeço ainda a análise rigorosa de cada capítulo, os esclarecimentos e as sugestões, as ideias partilhadas, os conselhos preciosos, os comentários sempre
oportunos e que espero ter sabido aproveitar. Espero também conseguir encontrar melhor forma e momento para lhe demonstrar o quanto estou agradecida pela gratificante amizade que construímos.
A Professora Doutora Margarida Pedroso de Lima, que co-orientou cientificamente este trabalho, agradeço as sugestões pertinentes, as revisões constantes, os comentários, a disponibilidade permanente, a confiança colocada e a amizade demonstrada.
Considero-me uma privilegiada por ter a ambas como uma referência na minha formação profissional e pessoal.
As Instituições que permitiram a identificação das pessoas entrevistadas, agradeço a facilitação e mediação dos contactos. Sem a sua colaboração e disponibilidade, a concretização deste trabalho teria sido muito mais complexa.
Gostaria de expressar o meu mais profundo agradecimento a todos os familiares de pessoas idosas dependentes que aceitaram colaborar neste trabalho, pois sem eles nada disto teria sentido.
A colega Zélia Teixeira, agradeço a valiosa ajuda e empenho que colocou na recolha dos dados.
A colega e amiga Helena Galante, quero expressar a minha profunda gratidão pela atenção e orientação no tratamento estatístico dos dados, bem como o incentivo, paciência, carinho e amizade constantes.
A colega e amiga Margarida Cerqueira, refúgio permanente das minhas ansiedades, agradeço a amizade, disponibilidade e paciência (muita!) sempre presentes.
A Dra. Florbela Vitória, agradeço as orientações e sugestões pertinentes relativamente
a
metodologia da investigação científica.Aos pais do Zé, a minha gratidão por serem muito meus amigos e tudo fazerem para que me sinta feliz e acarinhada.
A tia Dores, agradeço com um beijinho muito especial todos os mimos que sempre me proporcionou, tão importantes em momentos de maior stresse.
Aos meus pais agradeço com um beijo eterno tudo o que me têm proporcionado ao longo da vida. Sei que me amam e me aceitam
incondicionalmente, apesar de todos os meus defeitos. Sinto-me muito feliz e orgulhosa por tê-los comigo e sei que tudo o que fazem é porque desejam sempre o melhor para mim.
Ao Zé, companheiro inseparável dos sucessos e dos fracassos, pelo apoio, cumplicidade e amor (absolutamente!) incondicional, as palavras de
resumo
A investigação acerca da prestação informal de cuidados tem privilegiado a análise dos impactos negativos (sobrecarga). Todavia, uma abordagem que exclui os aspectos positivos é incapaz de proporcionar uma explicação compreensiva da complexidade da prestação de cuidados a um familiar idoso dependente. Paralelamente, a maioria dos estudos sobre os impactos da tarefa de cuidar recai sobre os cuidadores de idosos com demência. Assim, torna-se fundamental comparar o impacto desta tarefa nos cuidadores familiares de idosos dependentes com e sem demência. Os modelos transaccionais de stresse permitem explorar a complexidade e dinâmica da prestação informal de cuidados.Este estudo tem como principal finalidade compreender a perspectiva de cuidadores familiares de idosos dependentes com e sem demência acerca das principais dinâmicas inerentes
a
prestação de cuidados, como se relacionam e quais os efeitos sobre o seu bem-estar. A amostra compreende 99 cuidadores familiares de idosos dependentes: 52 cuidam de um idoso com demência e 47 de um idoso sem demência. Foram administrados vários instrumentos para avaliar diferentes variáveis inerentes ao contexto da prestação familiar de cuidados: variáveis sócio-demográficas e contextuais do cuidador familiar e do idoso dependente, grau de dependência funcional do idoso, stressores primários objectivos e subjectivos, tensões de papel e tensões intrapsíquicas, percepção das dificuldades, estratégias de coping, satisfações, rede social pessoal, satisfação com a vida e percepção do estado de saúde. Os principais resultados indicam que: i) ambas as sub-amostras de cuidadores tendem a percepcionar o seu estado de saúde como fraco, contudo é a nível da saúde mental que se verificam diferenças relevantes entre as sub-amostras, sendo que os cuidadores familiares de idosos sem demência se encontram significativamente melhor; ii) os cuidadores familiares sentem-se um pouco insatisfeitos com a vida, embora aqueles que cuidam de um idoso sem demência tendam a apresentar resultados mais favoráveis; iii) as satisfações que derivam da prestação de cuidados estão presentes e coexistem a par com as dificuldades; iv) a situação de demência ou não no receptor de cuidados não parece assumir um papel determinante no reconhecimento das fontes de satisfação, coping e rede social pessoal; v) a sobrecarga do papel surgiu mais frequentemente como preditora da satisfação com a vida e da percepção do estado de saúde do cuidador.Estes resultados têm implicações na intervenção: alertam para a necessidade de planeamento de respostas diferenciadas, baseadas na percepção do cuidador; despertam para a importância de ajudar os cuidadores a identificar fontes de satisfação na prestação de cuidados, já que estas se associam ao enriquecimento da relação de cuidados, ao incremento do bem-estar do
abstract
The impact of caregiving on family carers of the dependent elderly have been described by research rnainly based on negative aspects, such as burden. However, the exclusion of the positive aspects hinders a comprehensive vision concerning the complexity of informal care. Additionally, research has focused on family carers of demented elderly persons, which justifies the need of studying and comparing family carers of elderly people with and without dernentia. Transactional models of stress help to provide a good explanation about the cornplex dynarnics of farnily caregiving.This study aims an understanding of subjective perceptions of family carers of dependent elderly with and without dementia on the main dynamics of
caregiving, the relation between them and their irnpacts on well-being. The sample comprises 99 family carers of dependent elderly: 52 care for a
demented elderly person and 47 for a non demented one. Diverse instruments were administrated to assess different variables of the informal caregiving context: social-dernographic and contextual variables of farnily carer and dependent elderly, elderly functional dependence degree, objective and subjective primary stressors, secondary role strains, secondary intrapsychic strains, perceived degree of difficulty, coping strategies, satisfactions, personal social network, satisfaction with life and health status perception. The main findings suggest that: i) both sub-samples tend to perceive a poor health status, however those who take care for a dependent elderly without dernentia tend to experience a better mental health; ii) life satisfaction is generally low, but tend to be higher amongst those who take care for dependent elderly without dementia; iii) satisfactions coexist with difficulties in both sub-samples; iv) caring for a demented or non-demented elderly person does not seem to be a deterrninant factor concerning sources of satisfaction, coping, and social personal network; v) role overload becarne more frequently predictor of carer life satisfaction and health status perception
Important implications for intervention can be drawn from these findings: the need to differentiate intervention programmes, depending on caregivers perceptions; helping carers to identify sources of satisfaction, as they are associated with the improvement of caring relationship and carer well-being, effective coping strategies and reduced elderly institutionalization.
Índice
Índice de quadros……….. ix
Índice de figuras………. xvii
Introdução………... 1
PARTE I–ENQUADRAMENTO TEÓRICO Capítulo 1 – Envelhecimento e Dependência Introdução……… 9
1. Modificações associadas ao processo de envelhecimento………... 9
1.1. O envelhecimento biológico………. … 11
1.1.1. Noção de envelhecimento biológico……….….. 11
1.1.2. Principais modificações estruturais e funcionais………. 12
1.2. O envelhecimento psicológico e cognitivo………... 15
1.2.1. Inteligência………. 17 1.2.2. Memória e Aprendizagem……… 21 1.2.3. Personalidade……… 25 1.3. O envelhecimento social………. 27 1.3.1. Reforma………. ………. 28 1.3.2. Relações familiares……….………. 29 1.3.3. Redes sociais………. 31 2. Envelhecimento e dependência………. 33
2.1.1. Dependência: questões metodológicas………. 37
2.2. Envelhecimento e demência………. 39
2.2.1. Definição de demência: diagnóstico e causas………. 40
2.2.2. Alterações psicológicas comportamentais na demência……….…………. 44
2.2.3. Severidade, epidemiologia e factores de risco da demência………. 46
2.2.4. Doença de Alzheimer e Demência Vascular………. 51
2.3. Envelhecimento, dependência, respostas de apoio e cuidados familiares…… 56
Capítulo 2 – Prestar cuidados: os cuidadores familiares de idosos Introdução……… 65
1. Cuidar, cuidador informal e cuidador familiar………. 66
1.1. Definição de conceitos……… 66
1.2. Processo de iniciação: tornar-se cuidador………. 68
1.3. O perfil do cuidador……….………. 73
1.4. Tarefas desempenhadas………. 75
1.5. Características do receptor de cuidados………. 77
2. Impacto da prestação de cuidados………. 80
2.1. Impactos negativos……… 80
2.1.1. A sobrecarga………. 80
2.1.2. Saúde física e mental do cuidador……… 82
2.1.3. Relações familiares e sociais………. 83
2.1.4. Actividade profissional e situação financeira………. 86
2.1.5. Tempo livre e lazer……… 87
2.1.6. Impacto dos cuidados no idoso dependente……… 88
2.2. Impactos positivos: satisfações………... 90
2.2.1. Satisfações: uma conceptualização………. 91
3. Necessidades do cuidador familiar………. 97
3.1. Identificação das necessidades……… 98
3.2. A importância da avaliação das necessidades………... 100
Capítulo 3 – O stresse e a prestação familiar de cuidados Introdução……… 107
1. O que é o stresse?... 108
1.1. Em torno do conceito de stresse……… 108
1.2. Modelos conceptuais de stresse……… 110
1.2.1. O modelo “estímulo-resposta” de Seyle………... 110
1.2.2. Stresse e acontecimentos de vida………. 111
1.2.3. Os modelos transaccionais………... 113
2. Os modelos transaccionais e a prestação familiar de cuidados………... 114
2.1. O modelo transaccional de Lazarus e Folkman……… 114
2.1.1. A avaliação cognitiva……… 115
2.1.2. O coping………. 118
2.2. A importância do suporte social……… 124
2.2.1. A rede social pessoal e o suporte social………... 126
2.3. O modelo de desenvolvimento de stresse (Stress Process Model) de Pearlin……….. 132
2.3.1. A proliferação de stresse……… 139
PARTE II– ESTUDO EMPÍRICO Capítulo 4 – Objectivos e metodologia da investigação Introdução……… 153
1. Enquadramento e objectivos de pesquisa……… 153 1.1. Delimitação do problema……… 153 1.2. Objectivos do estudo...………. 156 1.3. Esquema da investigação………... 160 2. Metodologia……… 162 2.1. Selecção da amostra……… 162
2.1.1 Critérios de emparelhamento da amostra: os grupos de cuidadores familiares de idosos dependentes……….. 163
2.1.2. Procedimentos de recolha de dados……… 163
2.2. Instrumentos utilizados………... 164
2.2.1. O Índice para avaliação das dificuldades do prestador de cuidados (CADI)……… 165
2.2.2. O Índice para avaliação das maneiras como o prestador de cuidados enfrenta as dificuldades (CAMI) ……….. 166
2.2.3. O Índice para avaliação das satisfações do prestador de cuidados (CASI) ……… 168
2.2.4. A Escala de Satisfação Com a Vida (SWLS) ……… 171
2.2.5. O Medical Outcomes Study -Short Form 36 (SF-36)……..….……… 173
2.2.6. O Questionário geral………... 176
2.2.7. O Questionário de análise da rede social pessoal……… 179
2.2.8. O Índice de Barthel……….. 179
2.3. Estudo das qualidades psicométricas dos instrumentos e procedimentos…….. 180
2.3.1. O CADI………. 180
2.3.2. O CAMI……… 182
2.3.3. O CASI………. 184
2.3.4. A SWLS……….. 186
2.3.5. O questionário geral (factores de stresse primários e secundários)………. 188
3. Caracterização da amostra……….…. 196
3.1. Caracterização sócio-demográfica dos cuidadores familiares..……… 196
3.2. Caracterização do contexto da prestação de cuidados……… 199
3.3. Caracterização sócio-demográfica e funcional dos idosos dependentes……. 207
Capítulo 5 – Apresentação e leitura dos resultados Introdução……… 213
1. Análise comparativa dos factores de stresse……… 213
1.1. Factores de stresse primários………... 214
1.1.1. Factores de stresse primários objectivos: dependência do idoso nas actividades de vida diária………. 214
1.1.2. Factores de stresse primários subjectivos: sobrecarga do papel e clausura do papel……… 215
1.2. Factores de stresse secundários………. 216
1.2.1. Tensões de papel: conflito familiar, conflito profissional e constrangimentos financeiros………... 216
1.2.2. Tensões intrapsíquicas: sentido de competência e enriquecimento pessoal………. 219
2. Análise comparativa das variáveis moderadoras……….………. 220
2.1. Percepção das dificuldades (CADI)………. 221
2.2. Estratégias de coping (CAMI)………. 227
2.3. Fontes de satisfação (CASI)………. 231
2.4. A rede social pessoal: tamanho, composição, funções e reciprocidade……... 238
3. Análise comparativa das consequências………. 241
3.1. A satisfação com a vida (SWLS)………. 242
3.2. A percepção do estado de saúde (SF-36)……… 242
4. Estudo da relação entre as variáveis……….. 244 4.1. Variáveis sócio-demográficas e contextuais e factores de stresse,
moderadores e consequências……….. 245 4.1.1. Variáveis sócio-demográficas e contextuais e factores de stresse
primários objectivos………. 246 4.1.2. Variáveis sócio-demográficas e contextuais e factores de stresse
primários subjectivos……… 247 4.1.3. Variáveis sócio-demográficas e contextuais e tensões de papel………… 247 4.1.4. Variáveis sócio-demográficas e contextuais e tensões intrapsíquicas…… 249 4.1.5. Variáveis sócio-demográficas e contextuais e a percepção das
dificuldades (CADI)……….. 249 4.1.6. Variáveis sócio-demográficas e contextuais e as estratégias de coping
(CAMI)……….. 250 4.1.7. Variáveis sócio-demográficas e contextuais e as satisfações (CASI)…….. 250 4.1.8. Variáveis sócio-demográficas e contextuais e a rede social pessoal……. 251 4.1.9. Variáveis sócio-demográficas e contextuais e a satisfação com a vida
(SWLS)………... 251 4.1.10. Variáveis sócio-demográficas e contextuais e a percepção do estado
de saúde (SF-36)……… 252 4.2. Factores de stresse e factores de stresse secundários……… 252 4.3. Moderadores e factores de stresse.……….. 255
4.3.1. Correlações entre o CADI e os factores de stresse primários e secundários……… 255 4.3.2. Correlações entre o CAMI e os factores de stresse primários e
secundários……… 256 4.3.3. Correlações entre o CASI e os factores de stresse primários e
secundários……… 257 4.3.4. Correlações entre a rede social pessoal do cuidador familiar e os
factores de stresse primários e secundários………. 258 4.4. Factores de stresse e consequências………... 260
4.4.1. Correlações entre os factores de stresse primários e secundários e a
4.4.2. Correlações entre os factores de stresse primários e secundários e o
SF-36………... 261
4.5. Moderadores e consequências……… 263
4.5.1. Correlações entre moderadores e percepção do estado de saúde (SF-36)……….. 263
4.5.2. Correlações entre moderadores e a satisfação com a vida (SWLS)……... 264
5. A análise de regressão hierárquica………. 265
5.1. Estudo da distribuição das variáveis independentes……….. 267
5.2. A satisfação com a vida (SWLS) como variável critério………. 268
5.3. A percepção do estado de saúde (SF-36) como variável critério………. 270
Capítulo 6 - Discussão dos resultados e implicações Introdução……… 285
1. Estudo descritivo dos factores de stresse, moderadores e consequências……. 285
2. Estudos das relações entre as variáveis………. 309
3. Limitações……… 321
Conclusões………... 325
Bibliografia……… 333
Índice de quadros
Quadro 1.1 – Principais características do processo de senescência………. 11
Quadro 1.2 – Alterações estruturais no envelhecimento primário……… 13
Quadro 1.3 – Alterações funcionais no envelhecimento primário……… 14
Quadro 1.4 – Efeitos do envelhecimento no funcionamento cognitivo………. 16
Quadro 1.5 – Características de diagnóstico da Demência, segundo o Manual de Diagnóstico e Estatística das Perturbações Mentais (4.ª Ed.) – DSM-IV……. 41
Quadro 1.6 – Causas de demência……… 43
Quadro 1.7 – Prevalência na demência de alterações psiquiátricas e comportamentais………. 45
Quadro 1.8 – Prevalência estimada da demência (%) para cada região e grupo etário ………... 47
Quadro 1.9 - Número de pessoas com demência em 2001, projecções para 2020 e 2040, e aumento percentual………..………. 48
Quadro 1.10 – Critérios de diagnóstico da Doença de Alzheimer (NINCDS-ADRDA) ……… 53
Quadro 1.11 – Factores de risco da doença de Alzheimer………. 54
Quadro 1.12 – Critérios de diagnóstico da demência vascular - NINDS-AIREN…… 55
Quadro 1.13 – Critérios de diagnóstico da demência vascular – ADDTC…………. 55
Quadro 1.14 - Factores de risco da demência vascular……….. 56
Quadro 1.15 – Modo de apoio a um familiar incapacitado e dependente, 1998 (%) ………. 59
Quadro 1.16 – Principal responsável pelo pagamento dos cuidados aos pais idosos, 1998 (%) ……….. 60
Quadro 2.1 – Domínios para uma avaliação multidimensional do cuidador……… 103
Quadro 3.1 – Quadro conceptual acerca das estratégias de coping………... 119
Quadro 4.1. – Síntese das variáveis a analisar em cada sub-amostra de cuidadores familiares de idosos (com e sem demência), agrupadas de acordo com o modelo de desenvolvimento de stresse de Pearlin……….. 161
Quadro 4.2 – Conteúdos das sub-escalas do CADI………. 165 Quadro 4.3 – Conteúdos das sub-escalas do CAMI………. 167 Quadro 4.4 – Conteúdos das sub-escalas do CASI: dinâmica interpessoal….……. 168 Quadro 4.5 – Conteúdos das sub-escalas do CASI: dinâmica intrapessoal……..… 168 Quadro 4.6 – Conteúdos das sub-escalas do CASI: dinâmica dos resultados….…. 169 Quadro 4.7 – Itens do SF-36 por escala………. 174 Quadro 4.8 – Médias, desvios-padrão e r corrigido do item com o CADI…………. 181 Quadro 4.9 – CADI: Médias, desvios-padrão e alfas de Cronbach (amostra
global e sub-amostras) ……… 182 Quadro 4.10 – Médias, desvios-padrão e r corrigido do item com o CAMI………. 183 Quadro 4.11 – CAMI: Médias, desvios-padrão e alfas de Cronbach por
sub-escala (amostra global e sub-amostras) ……… 184 Quadro 4.12 – Médias, desvios-padrão e r corrigido do item com o CASI………… 185 Quadro 4.13 – CASI: Médias, desvios-padrão e alfas de Cronbach por categoria
(amostra global e sub-amostras) ………. 186 Quadro 4.14 – Indicadores de adequação da amostra e da matriz à
factorização……… 187 Quadro 4.15 - Médias, desvios-padrão e r corrigido do item com a SWLS………… 187 Quadro 4.16 – SWLS: Médias, desvios-padrão e alfas de Cronbach por factor
(amostra global e sub-amostras) ……….. 188 Quadro 4.17 – Dependência do familiar idoso nas ABVD (Q.13): Médias,
desvios-padrão e r corrigido do item com a escala na amostra global……… 189 Quadro 4.18 – Dependência do familiar idoso nas AIVD (Q.13): Médias,
desvios-padrão e r corrigido do item com a escala na amostra global……… 189 Quadro 4.19 – Dependência do idoso nas AVD (Q.13): Médias, desvios-padrão
e alfas de Cronbach por factor (amostra global e sub-amostras) ……… 189 Quadro 4.20 – Sobrecarga do papel (Q. 14): Médias, desvios-padrão e r
Quadro 4.21 – Sobrecarga do papel (Q.14): Médias, desvios-padrão e alfas de Cronbach (amostra global e sub-amostras) ………. 190 Quadro 4.22 – Clausura do papel (Q. 15): Médias, desvios-padrão e r corrigido
do item com a escala na amostra global………. 191 Quadro 4.23 – Clausura do papel (Q. 15): Médias, desvios-padrão e alfas de
Cronbach (amostra global e sub-amostras) ………. 191 Quadro 4.24 – Conflitos familiares (Q. 16): Médias, desvios-padrão e r corrigido
do item com a escala na amostra global………. 191 Quadro 4.25 – Conflitos familiares (Q.16): Médias, desvios-padrão e alfas de
Cronbach (amostra global e sub-amostras) ………. 192 Quadro 4.26 – Conflitos familiares (Q. 17): Médias, desvios-padrão e r corrigido
do item com a escala na amostra global……….…… 192 Quadro 4.27 – Conflitos familiares (Q. 17): Médias, desvios-padrão e alfas de
Cronbach (amostra global e sub-amostras) ……… 193 Quadro 4.28 – Conflito familiar (Q. 18): Médias, desvios-padrão e r corrigido do
item com a escala na amostra global………... 193 Quadro 4.29 – Conflito familiar (Q. 18): Médias, desvios-padrão e alfas de
Cronbach (amostra global e sub-amostras) ………. 193 Quadro 4.30 – Conflito profissional (Q. 19). Médias, desvios-padrão e r corrigido
do item com a escala na amostra global………. 194 Quadro 4.31 – Conflito profissional (Q. 19): Médias, desvios-padrão e alfas de
Cronbach (amostra global e sub-amostras) ………. 194 Quadro 4.32 – Enriquecimento pessoal (Q. 23): Médias, desvios-padrão e r
corrigido do item com a escala na amostra total………. 195 Quadro 4.33 – Enriquecimento pessoal (Q. 23): Médias, desvios-padrão e alfas
de Cronbach (amostra global e sub-amostras) ……….. 195 Quadro 4.34 – Características sócio-demográficas dos cuidadores familiares…… 197 Quadro 4.35 – Idade e género dos cuidadores familiares……….. 199 Quadro 3.36 – Contexto da prestação de cuidados……… 200 Quadro 4.37 – Grau de parentesco e género do cuidador familiar……… 201
Quadro 4.38 – Grau de parentesco e idade do cuidador familiar……….. 202
Quadro 4.39 – Idade do cuidador familiar e a duração da prestação de cuidados (meses) ……….. 203
Quadro 4.40 – Género do cuidador familiar e a duração da prestação de cuidados……….. 240
Quadro 4.41 – Situação profissional do cuidador e duração da prestação de cuidados (meses)……… 240
Quadro 4.42 – Idade do cuidador familiar e horas semanais de prestação de cuidados……….. 205
Quadro 4.43 – Género do cuidador e horas semanais de prestação de cuidados……….. 206
Quadro 4.44 – Situação profissional do cuidador e horas semanais de cuidados.. 206
Quadro 4.45 – Características socio-demográficas e funcionais dos idosos………. 207
Quadro 4.46 – Idade do idoso e grau de dependência………. 209
Quadro 4.47 – Género do idoso e grau de dependência... 209
Quadro 5.1 – Dependência do idoso nas ABVD e AIVD……….. 214
Quadro 5.2 – Resistência oferecida pelo idoso dependente nas ABVD e AIVD….. 215
Quadro 5.3 – Factores de stresse primários subjectivos: sobrecarga do papel e clausura do papel………. 216
Quadro 5.4 – Tensões de papel: dimensões do conflito familiar………... 217
Quadro 5.5 – Tensões de papel: conflito profissional……… 218
Quadro 5.6 - Tensões de papel: constrangimentos financeiros………. 219
Quadro 5.7 – Tensões intrapsíquicas: sentido de competência……… 219
Quadro 5.8 – Tensões intrapsíquicas: enriquecimento pessoal……….. 220
Quadro 5.9 – Percepção das dificuldades pelos cuidadores familiares (CADI)….. 221
Quadro 5.10 – Percepção das dificuldades pelos cuidadores familiares (CADI: sub-escalas)……… 222
Quadro 5.11 – Relação entre o cuidador e o idoso dependente……… 223
Quadro 5.13 - Exigências de ordem física na prestação de cuidados………... 225
Quadro 5.14 - Restrições na vida social………. 225
Quadro 5.15 - Deficiente apoio familiar……… 226
Quadro 5.16 - Deficiente apoio professional………... 226
Quadro 5.17 - Problemas financeiros………. 227
Quadro 5.18 – Estratégias de coping utilizadas pelos cuidadores familiares (CAMI)……….. 227
Quadro 5.19 – Estratégias de coping dos cuidadores familiares (CAMI: sub-escalas)……… 228
Quadro 5.20 – Lidar com os acontecimentos………. 229
Quadro 5.21 – Lidar com os significados………... 230
Quadro 5.22 – Lidar com as consequências……… 231
Quadro 5.23 – Fontes de satisfação para o cuidador familiar (CASI)……….. 232
Quadro 5.24 – Fontes de satisfação do cuidador familiar: dinâmica interpessoal (CASI, sub-escala)………. 232
Quadro 5.25 – Fontes de satisfação para o cuidador familiar: dinâmica intrapessoal (CASI, sub-escala)………. 233
Quadro 5.26 – Fontes de satisfação do cuidador familiar: dinâmica dos resultados (CASI, sub-escala)……… 234
Quadro 5.27 – Satisfações na dinâmica interpessoal: cuidador como principal beneficiário………. 234
Quadro 5.28 – Satisfações na dinâmica interpessoal: idoso como principal beneficiário………. 235
Quadro 5.29 – Satisfações na dinâmica interpessoal: benefício mútuo………. 235
Quadro 5.30 – Satisfações na dinâmica interpessoal: cuidador como principal beneficiário………. 236
Quadro 5.31 – Satisfações na dinâmica interpessoal: idoso como principal beneficiário………. 236
Quadro 5.33 – Satisfações na dinâmica dos resultados: cuidador principal beneficiário………. 237 Quadro 5.34 – Satisfações na dinâmica dos resultados: idoso como principal
beneficiário………. 238 Quadro 5.35 – Tamanho da rede social pessoal dos cuidadores familiares de
idosos………. 239 Quadro 5.36 – Composição da rede social dos cuidadores familiares de idosos... 239 Quadro 5.37 – Características funcionais: nível de apoio recebido pelos
cuidadores……….. 240 Quadro 5.38 - Reciprocidade: apoio pedido e retribuído pelos cuidadores……… 241 Quadro 5.39 – Satisfação com a vida dos cuidadores familiares: resultados da
SWLS………... 242 Quadro 5.40 – Percepção do estado de saúde dos cuidadores familiares: SF-36.. 243 Quadro 5.41 – Grupos de cuidadores segundo as variáveis sócio-demográficas.. 245 Quadro 5.42 – Distribuição dos clusters pelos grupos de cuidadores familiares…... 246 Quadro 5.43 – Variáveis socio-demográficas e contextuais nas sub-amostras e
dependência do idoso nas ABVD e AIVD………. 246 Quadro 5.44 – Variáveis sócio-demográficas e contextuais nas sub-amostras e
stressores subjectivos……… 247
Quadro 5.45 – Variáveis sócio-demográficas e contextuais nas sub-amostras e conflito familiar………. 248 Quadro 5.46 – Variáveis sócio-demográficas e contextuais nas sub-amostras e
conflito financeiro………. 248 Quadro 5.47 – Variáveis sócio-demográficas e contextuais nas sub-amostras e
enriquecimento pessoal……….. 249 Quadro 5.48 – Variáveis sócio-demográficas e contextuais nas sub-amostras e
CADI……….. 249 Quadro 5.49 – Variáveis sócio-demográficas e contextuais nas sub-amostras e
Quadro 5.50 – Variáveis sócio-demográficas e contextuais nas sub-amostras e CASI………... 250 Quadro 5.51 – Variáveis sócio-demográficas e contextuais nas sub-amostras e
rede social pessoal……… 251 Quadro 5.52 – Variáveis sócio-demográficas e contextuais nas sub-amostras e
SWLS………... 252 Quadro 5.53 – Variáveis sócio-demográficas e contextuais nas sub-amostras e
SF-36………... 252 Quadro 5.54 – Correlações significativas entre factores de stresse primários e
secundários………. 254 Quadro 5.55 – Correlações significativas entre o CADI e os factores de stresse
primários e secundários………... 256 Quadro 5.56 – Correlações significativas entre o CAMI e os factores de stresse
primários e secundários………... 257 Quadro 5.57 – Correlações significativas entre o CASI e os factores de stresse
primários e secundários………... 258 Quadro 5.58 – Correlações significativas entre a rede social pessoal e os
factores de stresse primários e secundários………. 259 Quadro 5.59 – Correlações significativas entre a SWLS e os factores de stresse
primários e secundários………... 261 Quadro 5.60 – Correlações significativas entre o SF-36 e os factores de stresse
primários e secundários………... 262 Quadro 5.61 – Correlações entre CADI, CAMI, CASI e rede social pessoal e o
SF-36……… 264 Quadro 5.62 – Correlações entre CADI, CAMI, CASI e rede social e a SWLS……… 265 Quadro 5.63 - Modelo de regressão hierárquica………... 268 Quadro 5.64 - Análise de regressão hierárquica com a SWLS como critério………. 269 Quadro 5.65 - Análise de regressão hierárquica com a DE como critério…………. 271 Quadro 5.66 - Análise de regressão hierárquica com a FS como critério………….. 272 Quadro 5.67 – Análise de regressão hierárquica com a VT como critério…...…….. 274
Quadro 5.68 – Análise de regressão hierárquica com a SG como critério………… 275 Quadro 5.69 – Análise de regressão hierárquica com a DC como critério……….. 277 Quadro 5.70 – Análise de regressão hierárquica com a DF como critério…………. 279 Quadro 5.71 – Análise de regressão hierárquica com a FF como critério…………. 280 Quadro 5.72 – Análise de regressão hierárquica com a SM como critério………… 282
Índice de figuras
Figura 1.1 – Estádios de desenvolvimento cognitivo segundo Schaie……… 20 Figura 2.1 – Matriz conceptual das satisfações da prestação informal de cuidados 92 Figura 3.1 – O processo de avaliação cognitiva no modelo transaccional…………. 115 Figura 3.2 – Auto-eficácia e confiança nos resultados……… 123 Figura 3.3 – Modelo de Desenvolvimento de Stresse……… 134 Figura 3.4 – Modelos de efeitos mediadores e moderadores……… 137 Figura 3.5 – Proliferação de stresse………. 141 Figura 4.1 – Modelo de desenvolvimento de stresse em cuidadores familiares de
idosos com e sem demência………... 161 Figura 4.2 – Modelo factorial SF-36 com duas componentes……… 175 Figura 6.1 – Matriz de frequências e fontes de satisfação experienciadas pela
Introdução
Cuidar de um idoso dependente representa um dos maiores desafios para as famílias e sociedades actuais. Como resultado do aumento da esperança de vida, cada vez mais pessoas atingem faixas etárias em que o declínio físico e mental e as incapacidades têm mais probabilidade de acontecer. Uma das consequências deste processo é a limitação progressiva das capacidades do indivíduo para satisfazer, de modo autónomo e independente, as suas necessidades.
O idoso dependente necessita frequentemente de apoios e/ou cuidados de saúde e bem-estar que, tradicionalmente, são prestados no seio da família. A família tem sido a principal fonte de apoio ao idoso em situação de dependência em vários países da Europa e EUA. Estima-se que 80% do apoio requerido pelo idoso dependente é proporcionado pelos prestadores informais de cuidados, na sua maioria, familiares. Todavia, o surgimento de certas incapacidades físicas e mentais em idades avançadas tem vindo a criar inquietação por representar um encargo pesado para quem presta cuidados ao idoso, quer seja o cônjuge, os filhos (na maioria das vezes, filhas ou noras), vizinhos, amigos ou outros. Alguns estudos têm já demonstrado que a prestação de cuidados ao idoso mais ou menos dependente gera, frequentemente, problemas de stresse, de saúde mental e física, sentimentos de frustração, ansiedade e uma preocupação constante. Por esta razão, os cuidadores informais são muitas vezes apelidados de “pacientes ocultos”, já que necessitam de ajuda externa para melhorar a sua saúde e bem-estar.
Todavia, a avaliação sistemática das suas necessidades tem merecido pouca atenção por parte de políticos, investigadores e profissionais e, dificilmente se pode apoiar adequadamente as pessoas sem uma compreensão holística dos seus problemas. Geralmente, a avaliação do cuidador tem como finalidade a sua integração num plano de cuidados ao idoso dependente e não o conhecimento global dos seus problemas e necessidades específicos. Além disso, existe uma tendência para a avaliação se centrar nos aspectos objectivos da prestação de cuidados, em detrimento dos subjectivos. Mesmo quando os critérios subjectivos são considerados, tendem a reflectir a perspectiva dos investigadores ou profissionais que, frequentemente, diverge da dos cuidadores familiares: os cuidadores tendem a “normalizar” a sua situação e os profissionais inclinam-se a defini-la em termos patológicos (Nolan et al., 2003). Desta forma, a eficácia da
intervenção exige a consideração e valorização da perspectiva do cuidador no processo de avaliação das suas necessidades.
Mas, como a literatura tem sido dominada pela perspectiva da “sobrecarga” (burden), a intervenção tem sido um reflexo desse domínio: em primeiro lugar, a maior parte das intervenções têm como principal objectivo, a redução do stresse do cuidador; consequentemente, são poucas as intervenções que se focalizam nos aspectos positivos do cuidar; finalmente, as intervenções raramente são organizadas num contexto multidisciplinar. Neste sentido, importa considerar os aspectos positivos que decorrem da tarefa de cuidar aquando da concepção e implementação de respostas de apoio a cuidadores, já estes podem funcionar como importantes recursos de coping ou indicadores de “risco” (de institucionalização do idoso ou, no limite, de negligência e maus-tratos) no âmbito da relação de cuidados.
Nos casos em que a integridade da capacidade cognitiva é seriamente ameaçada pela prevalência de uma doença que acarreta estados demenciais, a complexidade da prestação de cuidados tende a aumentar dramaticamente. Cuidar de um familiar idoso que sofre de demência tem sido reconhecido como a situação mais difícil. A maior parte da investigação gerontógica tem-se focalizado sobre os impactos da tarefa de cuidar em prestadores de cuidados familiares a idosos com demência, logo não se pode generalizar a todos os cuidadores, pelo menos sem que se desenvolva pesquisa específica em relação a cuidadores de idosos com outro tipo de incapacidades e/ou necessidades. Neste cenário torna-se fundamental comparar o impacto da situação de prestação de cuidados entre cuidadores familiares de idosos dependentes com e sem demência, com vista ao planeamento de respostas de intervenção adequadas às diferentes circunstâncias de cuidados.
Em termos conceptuais, a abordagem transaccional do stresse permite explorar a complexidade e dinâmica da prestação informal de cuidados, na medida em que ajuda a identificar e a descrever a diversidade de circunstâncias e vivências que, de um modo geral, afectam a saúde e o bem-estar dos cuidadores familiares, assim como a explicar as variações nos impactos produzidos por estas condições e experiências em diferentes grupos de cuidadores. Para além dos modelos transaccionais de stresse reconhecerem os efeitos positivos da prestação informal de cuidados, também admitem que as exigências e acontecimentos não são equitativamente indutores de stresse, que a mesma circunstância pode gerar diferentes tipos de resposta em diferentes momentos, e que o stresse se baseia mais nas avaliações cognitivas subjectivas das situações do que nas suas características objectivas.
Em termos gerais, a finalidade deste estudo consiste em compreender a perspectiva de cuidadores familiares de idosos dependentes com e sem demência acerca das principais dinâmicas inerentes à prestação de cuidados, como se relacionam e quais os seus efeitos sobre o bem-estar do cuidador familiar.
Este trabalho encontra-se dividido em duas partes. Na primeira parte – Enquadramento Teórico – é apresentada uma revisão das linhas de orientação teóricas em três capítulos. O primeiro refere-se às principais modificações associadas ao processo de envelhecimento, dando especial ênfase aos problemas de dependência, incapacidade e perda de autonomia que dele podem derivar e caracterizando as principais consequências que decorrem da situação de demência. O capítulo 2 é dedicado à caracterização dos actuais prestadores informais de cuidados, particularmente dos cuidadores familiares, procurando traçar o seu perfil socio-demográfico, conhecer as suas motivações, necessidades e impactos da tarefa de cuidar. No terceiro capítulo abordam-se os modelos transaccionais de stresse que, no contexto da prestação informal de cuidados, proporcionam uma abordagem compreensiva acerca da complexidade desta situação.
A segunda parte – Estudo Empírico – apresenta o estudo de campo, organizando-se em três capítulos. No capítulo 4 apresenta-se o enquadramento do estudo, bem como os objectivos e procedimentos metodológicos adoptados; é ainda realizada a apresentação dos instrumentos seleccionados e respectivo estudo das qualidades psicométricas; é, ainda, apresentada a caracterização da amostra. No capítulo 5 procede-se à apresentação e análise dos resultados, fazendo também uma pequena descrição dos procedimentos estatísticos adoptados. No capítulo 6 realiza-se a discussão dos resultados, delimitando as limitações do estudo que podem influenciar a interpretação dos mesmos.
Por último, termina-se esta dissertação com as conclusões que se considerou pertinentes retirar do desenvolvimento do trabalho, apontando os seus contributos e futuras linhas de investigação.
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Capítulo 1
Envelhecimento e Dependência
Introdução
O aumento da proporção de idosos na sociedade é um fenómeno relativamente recente ao qual se estão a tentar adaptar mesmo os países mais desenvolvidos. Esta alteração na estrutura da população não se deve unicamente ao aumento da esperança de vida, mas ao declínio da mortalidade entre os jovens e os adultos de meia idade. A melhoria da saúde pública, incluindo a educação para a saúde e a promoção da saúde, a melhoria das condições sociais, da nutrição e, mais recentemente, os avanços da medicina preventiva e curativa têm contribuído para a redução da taxa de mortalidade. Paralelamente ao declínio da mortalidade, verifica-se também o declínio da fecundidade. Esgotado o período do “baby boom”, uma forte regressão da fecundidade fez acentuar o processo de envelhecimento demográfico, no mundo desenvolvido em geral, e na Europa em particular.
A conquista do tempo é, sem dúvida, um dos maiores feitos da humanidade, no entanto, convém salientar que o processo de envelhecimento revela profundas disparidades entre os indivíduos, tratando-se de um processo idiossincrático. Consiste num processo complexo da evolução biológica dos organismos vivos, mas também um processo psicológico e social do desenvolvimento do ser humano. Face a um corpo que muda e vai sofrendo alterações funcionais e de papéis sociais, é necessário uma plasticidade constante, na busca de novos equilíbrios.
A maioria das pessoas com 65 ou mais anos de idade padece de, pelo menos, uma doença crónica, que poderá limitar a sua autonomia e diminuir a qualidade de vida. Esta tendência coloca um desafio significativo às sociedades em geral, tornando necessária a compreensão dos processos de envelhecimento que conferem ao indivíduo uma maior ou menor qualidade de vida.
1. Modificações associadas ao processo de envelhecimento
O processo de envelhecimento e as mudanças a ele associadas constituem um dos temas de maior interesse no âmbito da investigação científica contemporânea. Sobre ele têm-se procurado respostas a distintas questões, nomeadamente, acerca de quais são as dimensões das mudanças, principais causas e consequências, as áreas passíveis de intervenção com o intuito de retardar ou mesmo travar o processo de envelhecimento.
Uma questão fundamental que ainda se encontra por resolver é que modificações associadas ao envelhecimento são típicas ou normais e quais são os processos atípicos ou patológicos (Montorio & Izal, 1999).
Embora o processo de envelhecimento seja extremamente complexo e possa ser interpretado sob várias perspectivas, trata-se de um processo normal, universal, gradual e irreversível de mudanças e de transformações que ocorrem com a passagem do tempo. Consiste num fenómeno intimamente ligado aos processos de diferenciação e de crescimento, já que nele concorrem a interacção de factores internos como o património genético, e externos, como o estilo de vida, a educação, o ambiente em que o sujeito vive. Neste sentido, a principal característica do envelhecimento é a variabilidade inter e intraindividual, ou seja, existem padrões de envelhecimento diferentes tanto entre indivíduos com a mesma idade cronológica, como nas distintas funções de um mesmo indivíduo (fisiológicas, psicológicas, sociais...). Assim, existe a possibilidade de estabelecer um contraste frequente entre indivíduos com 70 ou mais anos, que desfrutam de vigor físico e de alegria de viver, traduzida em interacções sociais gratificantes e em actividades com resultados positivos assinaláveis, e indivíduos de 60-65 anos, precocemente envelhecidos, tanto a nível biológico, como psicológico e social. Do mesmo modo, há que ter em conta que, num mesmo indivíduo, as mudanças que se produzem com a passagem do tempo numa determinada função ou capacidade psicológica ou fisiológica não predizem necessariamente modificações noutras características psicológicas ou sistemas fisiológicos, havendo, portanto, uma cadência diferenciada na ocorrência dos diferentes tipos de envelhecimento.
Na análise das transformações associadas à idade em cada dimensão do funcionamento (biológico, psicológico e social) reside uma fonte de dificuldade que consiste na interacção entre os distintos aspectos do funcionamento do indivíduo. Esta interacção implica que, por exemplo, uma mudança no estado de saúde possa levar a uma diminuição do funcionamento cognitivo, ou que as perdas sociais (viuvez, por exemplo) possam causar transtornos afectivos que, por sua vez, irão comprometer o estado de saúde do indivíduo. Assim perante uma determinada modificação é particularmente difícil separar a variância que corresponde aos factores biológicos, psicológicos ou sociais (Montorio & Izal, 1999).
Sendo o envelhecimento um processo extremamente complexo, resultante da interacção entre factores biológicos, psicológicos e sociais, Schroots e Birren (1980, citado por Paúl, 1997) distinguem três principais categorias de envelhecimento: o biológico, que resulta da vulnerabilidade crescente e de uma maior probabilidade de morrer, a que se denomina senescência; o psicológico, definido pela auto-regulação do indivíduo no
campo de forças, pelo tomar decisões e opções, adaptando-se ao processo de senescência; e o social, relativo aos papéis sociais apropriados às expectativas da sociedade para os idosos.
1.1. O envelhecimento biológico
1.1.1. Noção de envelhecimento biológico
O processo de envelhecimento biológico refere-se às transformações físicas que reduzem a eficiência dos sistemas orgânicos e funcionais do organismo, traduzindo-se numa diminuição progressiva da capacidade de manutenção do equilíbrio homeostático que, em condições normais, não será suficiente para produzir distúrbios funcionais. Quando este declínio é muito significativo, ocorre uma importante redução da reserva funcional, colocando o idoso mais vulnerável ao surgimento de doenças crónicas (Netto & Ponte, 2000), que podem levar a alterações na capacidade funcional, ameaçando a sua autonomia e independência. Na sua definição de envelhecimento biológico, Birren e Zarit (1985, 9) sintetizam as ideias anteriores: “envelhecimento biológico, senescência, é o processo de mudança no organismo, que com o tempo diminui a probabilidade de sobrevivência e reduz a capacidade biológica de auto-regulação, reparação e adaptação às exigências ambientais”. A senescência não é sinónimo de doença, mas sim um processo normal de deterioração biológica geral que aumenta a vulnerabilidade do indivíduo à doença e à morte, já que se caracteriza pela redução da reserva fisiológica dos órgãos e sistemas, o que implica a diminuição da capacidade de adaptação do organismo face às alterações do meio ambiente.
O quadro 1.1 resume as principais características do processo de senescência.
Quadro 1.1 – Principais características do processo de senescência Aumento da mortalidade, uma vez ultrapassada a fase de maturidade. Modificações na composição química do organismo.
Transformações progressivas que conduzem à deterioração morfológica e funcional. Menor capacidade de resposta, a todos os níveis biológicos, perante as agressões e
exigências ambientais.
Aumento da vulnerabilidade a doenças. Adaptado de Cruz (1996, citado por IMSERSO, 2002).
Saliente-se, ainda, a distinção entre envelhecimento primário (normal), que reflecte o limite intrínseco de longevidade celular, possivelmente pré-programado geneticamente, e envelhecimento secundário (patológico), que ocorre devido aos efeitos acumulados das agressões ambientais, traumatismos e doenças (Spar & La Rue, 2005). Assim, enquanto que o envelhecimento primário parece estar subjacente à longevidade máxima relativamente constante que se observa em quase todos os estudos de espécies de animais, o envelhecimento secundário explica muito da variabilidade entre seres de uma mesma espécie.
No entanto, a definição daquilo que pode considerar-se envelhecimento normal é particularmente complexa. Apesar de, no seio da comunidade científica, haver relativo consenso de que o envelhecimento não implica necessariamente deterioração ou doença, existem dificuldades para estabelecer limites entre envelhecimento normal e patológico. Na tentativa de clarificar esta dúvida, Montorio e Izal (1999) sugerem que se perspective a relação entre envelhecimento normal e patológico como um contínuo. Num extremo, o envelhecimento pode ser claramente separado da doença, já que existem determinadas transformações que jamais poderiam ser consideradas como patológicas, independentemente da sua extensão (por exemplo, as rugas). No extremo oposto, o normal e patológico sobrepõem-se, já que o normal acima de um certo limiar se considera patológico. Assim, por exemplo, um certo grau de descalcificação dos ossos na velhice não se considera doença até alcançar um determinado limite.
Para além do envelhecimento normal e patológico, foi proposto o conceito de “envelhecimento terciário” ou padrão de declínio terminal, caracterizado por mudanças súbitas em diversas capacidades cognitivas e funcionais, ou seja, uma deterioração dos níveis prévios de capacidade diferente das modificações normais associadas à idade (Birren & Schroots, 1996).
1.1.2. Principais modificações estruturais e funcionais
As modificações fisiológicas e anatómicas associadas ao processo de envelhecimento têm o seu início muitos anos antes do surgimento de sinais exteriores. Ou seja, o seu começo é relativamente precoce, por volta do final da segunda década de vida, perpetuando-se de forma pouco perceptível durante a terceira década. Será por volta dos quarenta anos que as primeiras alterações funcionais e/ou estruturais atribuídas ao envelhecimento se tornam mais evidentes, continuando até á morte, isto é, até que o
organismo deixe de conseguir adaptar-se (Berger & Mailloux-Poirier, 1995; Netto & Ponte, 2000).
Na dimensão fisiológica, o processo de senescência provoca o envelhecimento das estruturas e do aspecto geral do corpo humano, bem como o declínio das funções orgânicas. Os quadros 1.2 e 1.3 resumem as principais alterações estruturais e funcionais que fazem parte do processo de envelhecimento primário.
Quadro 1.2 – Alterações estruturais no envelhecimento primário
Alterações estruturais a) Células e tecidos
Diminuição do número de células activas
Aparecimento de lipofuscina e de estatina em diversas células
Abrandamento do ritmo da multiplicação celular Diminuição do número de glóbulos e perda de
eficácia
Modificação dos tecidos gordos e subcutâneos Atrofia e perda de elasticidade tecidular b) Composição global do corpo e peso corporal Aumento do tecido gordo em relação ao tecido
magro
Modificações no peso corporal e no peso dos órgãos
c) Músculos, ossos e articulações
Diminuição de 25% a 30% da massa muscular Diminuição da mobilidade de diversas articulações Adelgaçar dos discos vertebrais o que provoca
uma redução de 1,2 cm a 5 cm na altura Redução da dimensão da caixa toráxica
Perdas de cálcio (osteoporose)
Diminuição no funcionamento locomotor e problemas de equilíbrio
d) Pele e tecido subcutâneo
Perda dos tecidos de suporte subcutâneos; secura e adelgaçar da pele; possibilidade de equimoses e queratoses; modificações vasculares e cutâneas múltiplas
Atrofia e baixa de eficácia das glândulas sebáceas e sudoríparas
Perda da elasticidade da pele Persistência da prega cutânea Aparecimento de rugas
Acentuação das proeminências ósseas
Descair da face, queixo e pálpebras, e alongamento dos lobos das orelhas
e) Tegumentos
Pelos finos e raros, excepto na face
Perda de cabelo, calvície ou cabelos brancos Acizentar ou descolorir dos cabelos
Espessamento das unhas (onicogrifose) Adaptado de Berger e Mailloux-Poirier (1995)
Quadro 1.3 – Alterações funcionais no envelhecimento primário Alterações funcionais
a) Sistema cardiovascular
Degenerescência cálcica das válvulas Diminuição de 18% do volume de água
Diminuição de 40% do débito cardíaco (capacidade máxima)
Aumento da tensão arterial em repouso (sístole e diástole)
Redistribuição do fluxo sanguíneo: o cérebro, artérias coronárias e músculos esqueléticos recebem um maior fluxo residual do que o fígado e rins.
Perda de elasticidade dos vasos e acumulação de depósitos nas paredes
Aumento da resistência dos vasos periféricos b) Sistema respiratório
Perda de capacidade de expansão pulmonar Diminuição da capacidade respiratória Diminuição do consumo basal de oxigénio Possibilidade de enfisema e bronquite senil Atrofia e rigidez pulmonar
Problemas de expectoração das secreções brônquias
c) Sistema renal e urinário
Diminuição do número de nefrónios
Diminuição da taxa de filtração blomerular, de filtração tubular e do fluxo sanguíneo renal Possibilidade de incontinência
Micções mais frequentes e menos abundantes d) Sistema gastrintestinal
Modificação dos tecidos dentários, mais difícil ajustamento das próteses dentárias, perda de dentes, cáries, etc.
Mais lenta cicatrização da mucosa oral Atrofia das glândulas salivares
Diminuição do sentido do paladar
Atrofia da mucosa gástrica e da secreção dos sucos digestivos (lipase)
Diminuição da secreção de ácido clorídrico, da pepsina e do suco pancreático
Diminuição do tonus e da motilidade gátrica gerando uma diminuição do esvaziamento gástrico e peristaltismo
Perturbações da absorção
Diminução da secreção de enzimas hepáticas e da acção anti-tóxica do fígado
Ligeira baixa da absorção intestinal
Diminuição da motilidade do intestino grosso e retardar da evacuação
e) Sistema nervoso e sensorial
Diminuição do número de unidades funcionais no cérebro
Perda de massa cerebral
Baixo consumo de oxigénio pelo cérebro e da perfusão cerebral
Declínio gradual da condução nervosa e demora no tempo de reacção
Diminuição da condução periférica e dos neurotransmissores
Perda de eficácia dos proprioceptores
Dificuldade no controlo da postura e no equilíbrio Perda da motricidade fina
Alteração do controlo do sistema autónomo Diminuição da capacidade mnemónica a curto
prazo
Elevação do limiar da percepção do sabor e odores
Diminuição das sensações tácteis e das que se relacionam com a pressão e a temperatura Diminuição auditiva (presbiacúsia), sobretudo para
os sons agudos
Sensações auditivas anómalas (acufenos)
Diminuição da adaptação à iluminação insuficiente e à visão nocturna
Presbitia e presbiopia
Redução da acuidade visual e da visão periférica Possibilidade de cataratas senis e/ou glaucoma f) Sistema endócrino e metabólico
Possibilidade de perturbação no metabolismo da glucose
Abrandamento da utilização peiférica da tiroxina Alterações menores do funcionamento
corticosuprarenal
Baixa do metabolismo basal Diminuição da taxa de estrogénio g) Sistema reprodutor
Atrofia dos órgãos genitais internos e externos Modificação do ritmo de erecção e de
ejaculação
Modificação da líbido no homem e na mulher Cessação da actividade reprodutora na mulher
(menopausa) h) Sistema imunitário
Lentidão da resposta imunitária a um antigénio Imunodeficiência relativa
i) Ritmos biológicos e sono Modificação das fases do sono Períodos mais frequentes de sono ligeiro Diferente repartição das horas de sono Adaptado de Berger e Mailloux-Poirier (1995)
Todas estas modificações ligadas ao processo de senescência vão levar, como se referiu, a uma perda progressiva da capacidade de adaptação do organismo, isto é, a uma diminuição da sua capacidade funcional, ligada ou não a uma doença. Assim, o processo de senescência coloca o indivíduo numa situação de maior vulnerabilidade à doença, nomeadamente, a problemas crónicos de saúde que os podem limitar na sua vida quotidiana.
1.2. O envelhecimento psicológico e cognitivo
A investigação no âmbito da psicologia do envelhecimento tem recaído sobretudo em duas áreas: a personalidade e o funcionamento cognitivo. Por sua vez, no domínio do funcionamento cognitivo, tem-se privilegiado o estudo da inteligência, memória e aprendizagem. Seguidamente, descrever-se-á as principais características das pessoas idosas no que toca à inteligência, memória, aprendizagem e personalidade.
O quadro 1.4 resume as tendências gerais do envelhecimento para algumas áreas específicas do funcionamento cognitivo. Neste quadro, o declínio ligeiro diz respeito a modificações que habitualmente se situam dentro de um desvio-padrão da média dos adultos jovens, enquanto o declínio moderado se refere as diferenças da ordem de 1 ou 2 desvios-padrão abaixo da média dos adultos jovens (Spar & La Rue, 2005). Tal como o quadro ilustra, as alterações cognitivas associadas ao envelhecimento normal situam-se entre o ligeiro e o moderado e há, inclusivamente, áreas em que o desempenho se mantém ou melhora. Este padrão diferencial é menos evidente entre os mais idosos (85 e mais anos), relativamente a alguns dos quais certos estudos referem um padrão generalizado de declínio gradual (Spar & La Rue, 2005).
Quadro 1.4 – Efeitos do envelhecimento no funcionamento cognitivo
Aptidão Sentido da mudança
no envelhecimento Comentário Inteligência . Vocabulário, fundo de conhecimento . Habilidades perceptivomotoras Estável ou crescente Em declínio
Pode declinar ligeiramente em idade muito avançada; mais pronunciado em tarefas novas O declínio começa pelos 50-60 anos
Atenção . Campo de atenção . Atenção complexa Estável a declínio ligeiro Declínio ligeiro
Problemas em dividir a atenção, filtrar ruído, deslocar a atenção Linguagem . Comunicação . Sintaxe, conhecimento de palavras . Fluência, nomeação . Compreensão . Discurso Estável Estável Declínio ligeiro
Estável a declínio ligeiro Variável
Na ausência de défice sensorial Varia com o grau de instrução
Lapsos ocasionais em encontrar palavras
Alguma erosão no processamento de mensagens complexas
Pode ser mais impreciso, repetitivo Memória
. De curto prazo (imediata) . De trabalho
. Secundária (recente) . Implícita
. Remota
Estável a declínio ligeiro Declínio ligeiro
Declínio moderado Estável a declínio ligeiro Variável
Intervalo de dígitos em contagem crescente intacto (7 ± 2 itens) mas com fácil ruptura por interferências
Aptidão diminuída para manipular informação na memória de curto prazo
Défices de codificação e recuperação; armazenagem intacta
Pode recordar com mais facilidade características incidentais do que informação processada inconscientemente
Intacta para aspectos mais importantes da história pessoal Visuo-espacial . Copiar desenhos . Orientação topográfica Variável Em declínio
Intacta para figuras simples, mas não para complexas
Mais notável em terreno não familiar Raciocínio . Resolução lógica de problemas . Raciocínio prático Em declínio Variável
Alguma redundância e desorganização Intacto para situações familiares
Funções de execução Declínio ligeiro Planeamento/monitorização menos eficiente de comportamentos complexos
Velocidade Em declínio Lentificação do pensamento e da acção é a mudança mais contante no envelhecimento
1.2.1. Inteligência
As concepções acerca do declínio intelectual associado há idade sofreram sucessivas modificações à medida que a investigação na área se foi desenvolvendo. Actualmente, a maioria dos dados acerca do funcionamento cognitivo provém de estudos realizados no âmbito da abordagem psicométrica, sendo as seguintes as provas mais utilizadas para a avaliação da inteligência: Escala de Inteligência de Wechsler (WAIS) e o Teste de Aptidões Mentais Primárias de Thurstone (PMA). Os resultados podem resumir-se nas seguintes conclusões (Simões, 1982; Schaie, 1983; Schaie, 1993; Montorio & Izal, 1999; Belsky, 2001; Marchand, 2001; Schaie & Willis, 2002):
a) As primeiras investigações acerca da relação entre a inteligência e a idade tiveram lugar entre a década de 20 e a década de 50 e baseavam-se em estudos transversais. A posição dominante era a de um declínio da inteligência com a idade que tinha o seu início por volta dos 20 ou 30 anos de idade.
b) A partir da década de 50 e graças, sobretudo, aos estudos longitudinais, defende-se que a inteligência permanece relativamente estável durante a vida adulta. Ou seja, a maioria destes estudos constatou que uma parte significativa dos sujeitos apresentava um leve ou nulo declínio nas pontuações em testes de inteligência com o aumento da idade. Concluiu-se então que os estudos transversais não reflectiam as mudanças na inteligência devidas à idade, mas sim as diferenças geracionais ou de coorte.
É nesta fase que se integram os estudos de Raymond Cattell e de John Horn que defendem um modelo de inteligência mais complexo, composto por duas dimensões: a inteligência fluída, mais relacionada com aquilo a que Wechler designou por “native
mental ability” (“habilidade mental inata”), reflectindo presumivelmente a qualidade
do cérebro de cada sujeito e que se prende com capacidades básicas tais como a atenção, a memória e as capacidades de raciocínio; e a inteligência cristalizada, representada por testes de informação geral e vocabulário, e que reflecte as capacidades mentais que dependem da experiência, educação e aculturação. Horn e Cattel (1967) revelaram a existência de um declínio na inteligência fluída e estabilidade ou até incremento da inteligência cristalizada durante o período da vida adulta. Ou seja, contrariamente ao declínio linear da inteligência protagonizado pelos primeiros estudos, estes destacam o carácter multidireccional da relação entre idade e inteligência, com algumas funções cognitivas a aumentar com a idade, outras a diminuir e outras a manterem-se estáveis.
c) Todavia, o optimismo dos estudos longitudinais foi apaziguado pelas limitações que lhe são atribuídas, mais especificamente, o abandono selectivo dos sujeitos que
constituem a amostra. Ou seja, os sujeitos que abandonam o estudo têm uma característica comum: quando comparados com os sujeitos que continuam no estudo longitudinal, geralmente têm desempenhos inferiores nos testes de inteligência.
No paradigmático Seattle Longitudinal Study, onde foi utilizado o Teste de Aptidões Primárias de Thurstone, a equipa de investigadores liderada por Schaie controlou esta limitação – o abandono da amostra (mortalidade experimental) - utilizando amostras independentes. Os resultados obtidos revelam que o início do declínio intelectual se situa um pouco antes das idades estipuladas pelos estudos longitudinais, embora não seja universal e só é significativo a partir dos finais da sexagésima década de vida.
Efectivamente, os principais resultados deste estudo permitiram a Schaie e colaboradores (Hertzog & Schaie, 1988; Schaie, 1996) estabelecer as seguintes conclusões: até ao final da terceira década de vida /inícios da quarta verificam-se progressos na maior parte das aptidões intelectuais; a partir daí começa uma etapa de estabilidade até meados do decénio 50/princípios do decénio 60. Nos últimos anos da sexta década de vida começam os declínios estatisticamente significativos.
d) Porém, estes resultados proporcionam apenas uma visão panorâmica do desenvolvimento intelectual na idade adulta. Assim, generalizar torna-se demasiado arriscado já que as diferentes capacidades mostram modelos de mudança/evolução distintos. Deste modo, mais uma vez a distinção entre inteligência fluida e cristalizada torna-se fundamental para perceber que capacidades resistem à passagem do tempo. As pontuações que medem as capacidades fluidas relacionadas com a rapidez, atenção, concentração e raciocínio indutivo começam a diminuir em geral por volta dos 30 anos. Ao contrário, as capacidades cristalizadas, reflectidas nas destrezas verbais, permanecem estáveis até aos 60 anos de idade.
Ainda assim, a adopção de uma perspectiva diferencial, permite verificar que mudanças substanciais na inteligência só ocorrem tardiamente na vida dos indivíduos e para aquelas aptidões que foram menos centrais na sua experiência de vida e, portanto, talvez menos objecto de prática. Se bem que pelos 60 anos quase todos os indivíduos tivessem registado descidas modestas numa das cinco aptidões (significado verbal, relações espaciais, raciocínio indutivo, números e fluidez verbal), a verdade é que quase nenhum apresentava declínios no conjunto das mesmas, nem sequer aos 88 anos.
As razões que subjazem ao declínio de algumas capacidades mentais com a idade ainda não são claras. Todavia, muitas das diferenças em aptidões específicas, associadas ao declínio de algumas aptidões intelectuais, parecem relacionar-se com