Curso
DIFICULDADES DE
APRENDIZAGEM
Disciplina
DIFICULDADES DE
APRENDIZAGEM
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Curso
DIFICULDADES DE
APRENDIZAGEM
Disciplina
DIFICULDADES DE
APRENDIZAGEM
Maria POPPE
Raquel PEREIRA
Soraya JORDÃO
www.avm.edu.br3
Sobre
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Meu nome é MARIA DA CONCEIÇÃO MAGGIONI POPPE, sou psicóloga formada pela UFRJ e atuo em dois segmentos da Psicologia: a docência e a clínica. Na atividade docente iniciei minhas atividades em 1997, aqui mesmo no IAVM, primeiramente só nos cursos de pós-graduação Lato Sensu na modalidade presencial. Foram muitos alunos/professores que tive e ainda tenho ansiando por uma qualificação e movidos por algumas incertezas quanto a sua atuação. No ano de 2001 passei a fazer parte também do corpo de professores que atuam no IAVM na modalidade a distância, primeiro nos cursos de pós-graduação e, agora também, nos cursos de graduação. A atuação nos cursos a distância me fez buscar uma certificação de especialista em Gestão de Ensino a Distância na Universidade Federal de Juiz de Fora, curso que, atualmente, estou em fase de conclusão. Face a essa trajetória pessoal é fácil, então, identificar que, ainda que os campos de minha atuação sejam em duas áreas distintas, estas conjugam desejos bem próximos na medida em que tenho de lidar com as necessidades de educandos, professores e familiares. Eis aqui nosso encontro e minha grata satisfação!
Olá Queridos! Meu nome é RACHEL DE CARVALHO PEREIRA. Sou fonoaudióloga e por acreditar que não podemos enfocar somente os sintomas apresentados pelos clientes, fiz pós-graduação em psicomotricidade. Desta maneira pude olhá-los de uma forma holística, fazendo a interação entre o psiquismo e o movimento, entre o próprio sentimento e a ação. Por atuar a 6 anos com crianças portadoras de necessidades educativas especiais, senti a necessidade de fazer pós-graduação em educação inclusiva, seguida pela complementação pedagógica-didática do ensino superior. A partir deste momento, percebi que era hora de publicar meu primeiro livro – Surdez. Aquisição de Linguagem e Inclusão Social pela Editora Revinter. Este foi o caminho encontrado para continuar lutando por um mundo melhor e acessível para as crianças com necessidades educativas especiais. Obrigada vocês, caros alunos, por estarem aqui conosco nesta caminhada. Grande abraço!
Olá, Meu nome é SORAYA JORDÃO MARTINS, sou psicóloga formada desde 1991 com especialização em Psicologia Clínica (UERJ/1995). Iniciei meu percurso profissional numa instituição filantrópica, em Niterói, como psicóloga de um Núcleo de Atendimento a Crianças Autistas e Psicóticas. Nesse trabalho, desenvolvido durante 6 anos, pude perceber que além do atendimento clínico oferecido a essas crianças era fundamental que oferecêssemos apoio sistemático a escola, professor e equipe pedagógica, de forma a permitir a inserção dessas crianças no ambiente escolar, dentro de uma perspectiva de Educação Inclusiva. Paralelo a esse projeto, participo de um trabalho em grupo, voltado para crianças com dificuldades de aprendizagem, cujo objetivo é o resgate da curiosidade e a desmistificação do processo de aprendizagem como um obstáculo intransponível. Portanto, se ao longo dessa aula, eu conseguir trazer à reflexão a importância da escola, do professor, da equipe pedagógica e da prática da Educação na transformação do organismo humano em Ser Humano, terei cumprido meu papel.
5
Sumário
07
Apresentação
09
Aula 1
Introdução às dificuldades de
aprendizagem
39
Aula 2
Transtornos da leitura e da escrita e
do cálculo matemático
69
Aula 3
Fracasso escolar e educação
inclusiva
103
Aula 4
Transtorno de déficit de atenção e
hiperatividade
130
AV1
Estudo dirigido da disciplina
133
AV2
Trabalho acadêmico de
aprofundamento
Dificuldades de
Aprendizagem
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Apresen
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Este caderno é dedicado a discussão aprofundada dos problemas de aprendizagem, que se tornou um dos assuntos mais frequentes nas escolas e entre os educadores. As atuais estatísticas sobre o fracasso escolar são alarmantes e preocupa todos os envolvidos no processo ensino-aprendizagem. Os autores que elaboraram estas aulas procuraram discutir de maneira reflexiva e intensa as formas como estes problemas se apresentam e as possibilidades de superação dos mesmos, pois acreditar na superação dos impasses de aprendizagem é o primeiro passo para se assumir uma atitude transformadora na atualidade. Dialogar com diferentes saberes e visões permite a criação de oportunidades para os alunos e para os professores que trabalham com Educação.Objetivo
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Este caderno de estudos tem como objetivos:
Analisar profundamente o fracasso escolar questionando as formas de aprender e ensinar, além de incluir o papel da família no compromisso da aprendizagem;
Conhecer o histórico do enfrentamento das dificuldades de aprendizagem e a forma como os discursos acadêmicos foram influenciados pelos diagnósticos médicos e compreensão patológica destes problemas;
Conhecer as principais deficiências, sintomas e maneiras possíveis de atendimento às necessidades, potencialidades e habilidades nos espaços de aprendizagem;
Compreender o aluno portador de TDAH para eximir de rótulos que comprometem as condições de aprendizagem e as oportunidades afetivas e sociais nos ambientes de interação.
Introdução às
Dificuldades de
Aprendizagem
Maria PoppeA
ULA
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Apresen
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Nesta aula são introduzidas as idéias sobre as dificuldades de aprendizagem e os principais fatores presentes, procurando distinguir o fracasso escolar das dificuldades de aprendizagem. Aprofunda-se o tema da perspectiva preventiva no trabalho com os impasses do processo de aprendizagem.
Objetivo
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Esperamos que, após o estudo do conteúdo desta aula, você seja capaz de:
Analisar o sujeito que está sendo formado e o valor cultural dado à escolaridade que determinam formas de sucesso e fracasso na aprendizagem;
Conhecer os fatores mais importantes a serem considerados nos problemas de aprendizagem (orgânicos, específicos, psicogênicos e ambientais):
Discutir o rótulo de fracasso dado somente ao aluno, pois deve ser partilhado pelo professor, pela escola, pelo sistema de ensino e pela família uma vez que sua aquisição de conhecimento se constituiu por estas experiências de aprendizado advindo de sua família, meio social e vida escolar; Pensar nas variáveis que implicam: as formas de aprender, à
perda do prazer de aprender, à impossibilidade do aluno se apropriar da sua história e das experiências vividas, e, assim se ocupar preventivamente da dificuldade de aprendizagem.
Aula 1 | Introdução às dificuldades de aprendizagem 10
Introdução
Apresentar o tema das dificuldades de aprendizagem é no mínimo complexo, pois detectamos inúmeros vetores que atuam no processo de ensino aprendizagem.
Citando alguns desses para ilustrar, temos então: as diferentes formas de concepção sobre o que é aprendizagem; os fatores constitutivos e hereditários que compõem o desenvolvimento de cada educando; as múltiplas maneiras de avaliar a aquisição de conhecimento na escola; a estrutura e a dinâmica familiar a que o educando pertence; aspectos culturais e ambientais que favorecem ou dificultam o processo
de aprendizagem; a adequação curricular e
metodológica do processo de ensino-aprendizagem; bem, parece que essa lista não termina nunca.
Devemos, então, permitir um recorte de certos pontos para que a análise das dificuldades não se torne
outra dificuldade ainda maior. Sendo assim,
elaboramos uma sequência de aulas para destacar as primeiras considerações do contexto de aprendizagem.
Existe a crença de que o processo formal de aprendizagem inicia com o ingresso da criança na escola, entretanto, observamos quantas conquistas podem ocorrer antes mesmo da escolaridade, assim como paralelamente. Exemplo disto: a aquisição da fala, o reconhecimento de signos, a localização espaço-temporal etc.
A característica essencial da escola é de formação instrucional, mas também tem seu papel de formação cidadã, depende muito da idéia que se valoriza numa época Histórico- cultural sobre o que vem a ser a formação escolar.
Quer saber mais?
Para saber mais, visite o site: http://www.psicope dagogia.construtivis mo.com.br O site da Associação Brasileira de Psicopedagogia é muito interessante: http://www.abpp.co m.br Introdução 10
Fatores presentes nas
dificuldades de aprendizagem 13
Fatores orgânicos 14
Fatores específicos 14
Fatores psicogênicos 15
Fatores ambientais 16
Fracasso escolar e dificuldade
de aprendizagem 17
Inibição e sintoma: as duas
faces da ignorância 23
Aula 1 | Introdução às dificuldades de aprendizagem 11 Têm-se, desde já, duas questões:
Qual o sujeito que estamos formando? Qual o valor cultural dado à escolaridade? A escolha de um tipo de formação poderá criar um marco a partir do qual alguns educandos terão
sucesso e outros terão fracassos, de acordo com a
referência estabelecida.
Certamente, a referência não será o próprio sujeito com suas possibilidades e desejos, por isso mesmo o mapa global que for adotado poderá dificultar ou, até, impedir o acesso do educando ao aprender.
Nesta aula, introduziremos as principais idéias sobre dificuldades de aprendizagem, de maneira que a discussão permita pensar o que pode ser feito antes mesmo de se instalar uma situação de dificuldade propriamente dita.
Para iniciarmos um estudo a respeito do fracasso escolar e os multifatores que estão envolvidos na dificuldade de aprendizagem, é preciso pensar no processo de aprendizagem. A questão que se coloca é: QUANDO E COMO COMEÇA A APRENDIZAGEM?
Rubinstein, em seu livro “O Estilo de Aprendizagem e a Queixa Escolar: entre o saber e o conhecer”, assim escreve:
A aprendizagem escolar é
predeterminada por uma
aprendizagem informal que ocorre no seio familiar desde que o bebê existe e atravessa o universo escolar.
Aula 1 | Introdução às dificuldades de aprendizagem 12 Se considerarmos a predeterminação de uma aprendizagem informal, consideramos também a importância desse outro (família ou quaisquer cuidadores) que, sendo próximo do bebê, vai lhe apresentando o mundo e suas leis.
Como afirma Lajonquière,
as aprendizagens têm lugar porque há um adulto que pede ao sujeito que conheça uma ou outra coisa.
(Lajonquière apud Rubinstein, 2003:81). Sendo assim, podemos considerar que a natureza das expectativas do outro significativo ao bebê é um fator importante na constituição da complexidade do processo de aprendizagem tanto no seu sentido informal quanto no formal.
Desde o início da vida, o bebê se depara com a expectativa, por parte dos que o cercam, de que ele aprenda como todo mundo, de que ele absorva os valores culturais, as regras sociais, que responda positivamente as expectativas depositadas nele.
Freud, em 1930, concluiu:
A transmissão cultural permitirá a sobrevivência individual e coletiva do grupo humano, e essa transmissão se dará pela educação.
(Freud apud Rubinstein, 2003:27)
Não é possível dissociar aprendizagem,
educação e processo civilizatório. Só podemos pensar na aprendizagem considerando, simultaneamente, a cognição e o desejo. Nesse sentido, a constituição do sujeito psíquico, dentro da visão freudiana, possibilita um olhar para o sujeito da aprendizagem por levar em conta a complexidade dos fatores envolvidos. O que se destaca é que na relação ensino aprendizagem se torna presente a intersubjetividade. Para refletir As mães são as primeiras educadoras de uma criança. Pode-se, então, refletir que diversas carências vividas nos primeiros anos de vida são marcas muito fortes no processo de aprendizagem. Entretanto, não se pode dizer que é um destino de fracasso de aprendizagem.
Dica de leitura
No livro Sucesso Escolar nos Meios Populares – As Razões do Improvável (LAHIRE, Bernard. Tradução de Ramon Américo Vasques e Sonia Goldefer, São Paulo: Ática, 1997), o autor disserta que o bom ou o mau desempenho escolar não está necessariamente ligado às condições socioeconômicas do aluno, e demonstra que existem razões culturais mais amplas para explicar o sucesso e o fracasso escolar.
Aula 1 | Introdução às dificuldades de aprendizagem 13 Ainda que o educador dirija sua atenção para as
chamadas funções egóicas, mas ao considerar o sujeito da aprendizagem, tem que se levar em conta a existência do inconsciente.
É essa visão que permite ao educador compreender o processo de aprendizagem e, mais
especificamente, as possíveis dificuldades de
aprendizagem, a partir da estrutura psíquica, que é fruto do interjogo entre o social, a dinâmica do inconsciente e a inteligência.
As consequências dessa visão
interferem nas condições de
intervenção, sejam elas de natureza individual ou coletiva, pois o sujeito da aprendizagem deve surgir em primeiro plano
(Rubinstein, 2003:100). A dinâmica do inconsciente deve ser levada em conta, visto que em várias situações a dificuldade de aprendizagem não decorre somente de fatores orgânicos, não é ele o responsável pelo fato do sujeito da aprendizagem não reter o conhecimento. Pois, ainda que o sujeito tenha contato com o conhecimento transmitido, não lhe é possível se apropriar deste, então, não se apodera e por isso não consegue retê-lo.
Fatores presentes nas dificuldades de
aprendizagem
Várias são as razões que levam o sujeito a posicionar-se de forma a não querer saber, como salienta Rubinstein “... é o sujeito que tem o poder de fazer suas escolhas conscientes e inconscientes sobre o que deseja saber.
(2003:110)
Muitas vezes, para a criança,
apropriar-se de um conhecimento traz a atualização de um conflito, coloca-a em risco e por isso tal apropriação é
Dica da professora Lembramos que no espaço escolar é possível colocar a ênfase do trabalho na prevenção das dificuldades de aprendizagem.
Aula 1 | Introdução às dificuldades de aprendizagem 14
evitada. “A criança pode tornar-se um conhecedor ou aprendiz inibido caso seus pais desejem resguardá-lo de conhecimentos que a ameacem”.
(Zelan apud Rubinstein, 2003:105) Para que se possa fazer o diagnóstico de um problema de aprendizagem, devemos levar em consideração alguns fatores. Sara Pain, em seu livro “Diagnóstico e Tratamento dos Problemas de
Aprendizagem”, destaca como fundamental a
consideração dos seguintes fatores:
Fatores orgânicos
Embora perturbações orgânicas (hipoacusia, miopia, desnutrição, lesões neurológicas) não se constituam como causa suficiente para o aparecimento do problema de aprendizagem, estes aparecem como causa necessária.
Perturbações orgânicas podem ter como consequência problemas cognitivos, que variam em gravidade, mas que não configuram, por si sós, um problema de aprendizagem. Se o organismo apresenta-se em equilíbrio, o sujeito pode viabilizar o exercício cognitivo e encontrar outros caminhos que não afetem seu desenvolvimento intelectual.
Fatores específicos
Existem certos transtornos na área da adequação perceptivo-motora que, embora se suspeite de uma origem orgânica, não é passível de verificação. Esses transtornos aparecem no nível da aprendizagem da linguagem, sua articulação, sua lecto-escrita e manifestam-se em algumas perturbações, tais como: inaptidão gráfica, impossibilidade de construir imagens claras de fonemas, sílabas, palavras etc.
Importante Quando se coloca em evidência um conjunto de fatores envolvidos no diagnóstico e tratamento dos problemas de aprendizagem, deve ser observado também que a prevenção dos mesmos nem sempre é possível. Pois existem situações em que o aluno é transferido durante o ano letivo, trazendo consigo uma história de antecedentes sombrios em outras instituições de ensino. Para pensar Completar o diagnóstico ou a avaliação com o auxílio de especialistas, por vezes, é fundamental. Desde que isso não sirva para
discriminar e excluir o aluno, que poderá ser identificado como o portador de tal problema ou estigma.
Aula 1 | Introdução às dificuldades de aprendizagem 15 Podemos também encontrar dificuldade no nível
da análise e síntese dos símbolos, na aptidão sintática, na atribuição significativa. Esses processos podem apresentar-se sem que possam ser relacionados com qualquer dano cerebral localizado que justifique as perturbações decorrentes.
Fatores psicogênicos
Aqui convêm diferenciar duas possibilidades para o fato de não aprender: na primeira, este constitui um sintoma, onde se supõe a prévia repressão de um acontecimento que a operação de aprender, de alguma forma, significa, traz à tona; na segunda, trata-se de uma retração intelectual do ego que pode se dar, segundo Freud, em três oportunidades.
Essas três oportunidades de retração intelectual do ego são destacadas por Sara Paín, em seu livro “A Função da Ignorância”, da seguinte forma:
Quando os órgãos intervenientes na ação de aprender sexualizam-se; neste sentido, a função do órgão fica desviada de seu destino original;
Quando o sujeito evita o sucesso,
apresentando, no momento preciso de obtê-lo, um comportamento de fracasso de si mesmo que pode ser interpretado como autopunição da ambição. A paralisia das operações mentais parece-nos constituir um verdadeiro sintoma ligado ao sistema fracasso/sucesso que caracteriza a simbólica das trocas intelectuais;
Nas situações em que o “eu” exige e requer toda a energia psíquica disponível, por exemplo, durante o período de luto. Nos acontecimentos que comportam uma perda
Quer saber mais?
Para saber mais, visite o site: http://www.aomestr ecomcarinho.com.br /
Aula 1 | Introdução às dificuldades de aprendizagem 16 (tais como: morte, mudança de residência, de escola ou de professor) põe-se o problema do esquecimento e do valor das coisas aprendidas que não são mais úteis.
Os fatores psicogênicos dos problemas de
aprendizagem se confundem então com sua
significação, entretanto, é importante destacar que não é possível assumi-lo sem levar em consideração, também, as disposições orgânicas e ambientais do sujeito. Desta forma, o não aprender se constitui como inibição ou como sintoma sempre que se dêem outras condições que facilitem esse caminho. (Paín, 1985:32).
Fatores ambientais
Aqui se inclui o meio ambiente material do sujeito, as possibilidades oferecidas por seu meio, a quantidade e a qualidade dos estímulos que compõem o campo de aprendizagem habitual do sujeito. O fator ambiental é especialmente determinante no diagnóstico do problema de aprendizagem, na medida em que nos permite compreender sua coincidência com a ideologia e os valores vigentes no grupo. Nesse sentido, não basta situar o aluno numa classe social, é preciso conhecer qual o seu grau de consciência e participação. Para pensarmos a produção do Fracasso Escolar, antes de tudo, precisamos saber que nunca há uma causa única para a produção desse fracasso, suas causas são múltiplas e diversas. É essa conjunção de causas intrincadas que têm o poder de agir uma sobre as outras tornando o fracasso escolar uma questão complexa, composta por todos os elementos acima descritos e estudados.
Dica de leitura
BAETA, Anna Maria Bianchini.
Ajudando a desmistificar o fracasso escolar. São Paulo: Casa do Psicólogo, 2000. RUBINSTEIN, Edith Regina. O estilo de aprendizagem e a queixa escolar: entre o saber e o conhecer.
São Paulo: Casa do Psicólogo, 2003.
Aula 1 | Introdução às dificuldades de aprendizagem 17
Fracasso
escolar
e
dificuldade
de
aprendizagem
Para podermos pensar a dificuldade de aprendizagem, é preciso, antes de tudo, traçar uma distinção entre Fracasso Escolar e Problema de Aprendizagem.
É certo que o fracasso escolar pode desencadear um problema de aprendizagem que, de outro modo, não teria aparecido, mas como destaca Alicia Fernández, em seu livro “Os Idiomas do Aprendente” (2001), o fracasso escolar é um fracasso na aprendizagem que está apoiado no sistema educativo. Logo, deve ser pensado a partir deste.
No fracasso escolar, há um hiato entre a modalidade de aprendizagem do aluno e a modalidade de ensino da escola, embora nesse caso o sujeito não tenha ainda sofrido uma alteração na sua modalidade de aprendizagem. O problema de aprendizagem é também um fracasso na aprendizagem, mas um fracasso que se revela, principalmente, na criança e seu meio familiar. Pois, como sabemos, decepciona a expectativa dos pais e frustra a possibilidade e desejo de aprender do aluno.
Sabemos que, tanto no fracasso escolar quanto no problema de aprendizagem, o aluno mostra que não aprende, mas no primeiro caso devemos intervir sobre as modalidades de ensino da escola, visto que o fracasso escolar se dá como um problema de “aprendizagem reativo”, ou seja, como uma resposta à situação escolar, que afeta o aprender do aluno em todas as suas manifestações sem chegar a afetar sua modalidade de aprendizagem.
Aula 1 | Introdução às dificuldades de aprendizagem 18 O importante seria que todos os educadores percebessem que o dito fracasso escolar de um educando está diretamente vinculado ao fracasso institucional e ao reducionismo pedagógico de algumas instituições de ensino que se negam a compreender os erros escolares como oportunidade de novas construções. O erro é a própria identificação de uma dificuldade para análise do educador sobre o conhecimento e o aprendizado de seu educando.
O rótulo de fracasso dado a um aluno deve, no mínimo, ser partilhado pelo professor, pela escola, pelo sistema de ensino e pela família, pois todos estes não estão desvinculados da história do educando. Afinal de contas, a sua aquisição de conhecimento se constituiu por estas experiências de aprendizado advindo de sua família, seu meio social e sua vida escolar.
Pode-se dizer que o professor, por não ter todas as competências necessárias para atendê-lo e acima de tudo não ser capaz de lançar outros olhares sobre o potencial do educando, deixa, então, de singularizar a relação com o aluno que permitiria um vínculo mais favorável ao processo de aprendizagem.
A escola por falhar em sua organização, planejamento e orientação pedagógico-educacional acerca do processo evolutivo do educando. Não esquecendo, também, do processo de avaliação que contribui para a discriminação e exclusão de alunos. O sistema educacional que muitas vezes se apresenta desarticulado, descontextualizado e com regras mal definidas. Fazendo com que o aluno se sinta um estranho na escola, originando um processo reativo em relação à mesma. Não raro se ouve dos alunos que seu desinteresse pelo aprendizado ocorre muito pelo fato de não entender para que aprende tanto conteúdo na escola que não será aproveitado no futuro.
Dica de leitura
PATTO, Maria Helena Souza. A Produção do Fracasso Escolar: Histórias de
Submissão e Rebeldia. São Paulo: Casa do Psicólogo, 1999.
Aula 1 | Introdução às dificuldades de aprendizagem 19 Principalmente, no item inclusão, destacamos o fato de
existirem atividades inadequadas às condições reais dos alunos.
A família, como representante de uma herança cultural que por vezes é anacrônica, desfavorece a integração do educando com a escola. A escolha da escola para os filhos reveste os pais de um desejo que muitas vezes não leva em consideração o desejo e as possibilidades de seus filhos. Os pais acabam por contemplar facilidades como: proximidade da escola a casa, equiparação de ensino com vizinhos e parentes, a impossibilidade financeira e outros. Mas, nota-se uma ausência de critérios para garantia do bem-estar do filho na relação com a escola, os colegas de estudo e o aprendizado.
OUTRAS VISÕES SOBRE O FRACASSO ESCOLAR Anny Cordié (1996), em seu livro “Os Atrasados Não Existem”, chama atenção para o seguinte:
O fracasso escolar é uma patologia recente. Só pôde surgir com a instauração da escolaridade obrigatória no fim do século XIX e tomou um lugar considerável nas preocupações de
nossos contemporâneos em
consequência de uma mudança radical da sociedade. Também, nesse caso, não é somente a exigência da sociedade moderna que causa os distúrbios, como se pensa muito frequentemente, mas um sujeito que expressa seu mal-estar na linguagem de uma época em que o poder do dinheiro e o sucesso social são valores predominantes. A pressão social serve de agente de cristalização para um distúrbio que se inscreve de forma singular na história de cada um.
(Cordié, 1996:17) É importante destacar que, numa situação de fracasso escolar, o sujeito é afetado em sua totalidade, ele sofre por não corresponder as suas aspirações, o
Dica da professora
Estas características apontadas ao lado provocam muitos impasses nos alunos que não querem frustrar as expectativas dos pais e, ao mesmo tempo, não têm condições de corresponder às mesmas. Outras vezes geram rebeldias e insatisfações que os afastam do processo de aprendizagem.
Aula 1 | Introdução às dificuldades de aprendizagem 20 que abala sua auto-estima, compromete sua confiança em si mesmo e em suas potencialidades, restringe e aprisiona sua ação na direção de novas aquisições.
O fracasso escolar também atinge o ser social do sujeito, pois ele sofre por não conseguir corresponder ao que se espera dele, sofre por não conseguir acompanhar seu grupo, sofre por ter que se deparar, muitas vezes, com o descrédito dos que lhe cerca.
O discurso do entorno sempre busca localizar no sujeito todas as causas do seu fracasso, para isso alegam, muitas vezes, que a escola é boa, o ensino é de qualidade, o professor é qualificado, porém o aluno é que não consegue aprender, não quer prestar atenção ou tem preguiça.
Sabemos também que a qualidade do ensino ministrado não garante o sucesso nos estudos, pois vários fatores entram em jogo para dificultar o alcance do nível de instrução exigido hoje.
Anny Cordié (1996) ressalta:
Já podemos salientar o quanto a rapidez da transformação social inverteu os velhos esquemas de transmissão da herança cultural. Muitas vezes, há
discordância entre as tradições
familiares e os novos modos de vida. Essa ruptura brutal implica conflitos entre gerações, conflitos que são eles próprios, fontes de fracasso escolar
(Cordié, 1996:19). O sujeito, ao se deparar com uma situação de fracasso escolar, vê-se diante de uma angústia que o paralisa, que, muitas vezes, ele não consegue identificar e que tem sua fonte nas exigências dos pais, na pressão social, nos conflitos inerentes à construção do ego. Existem fortes evidências, hoje em dia, de estatísticas sobre a depressão infantil, por exemplo, que se relacionam com aspectos acima referidos.
Dica de leitura BOSSA, Nádia. Fracasso Escolar: Um Olhar Psicopedagógico. Porto Alegre: Artes Médicas, 2002. Neste livro, a autora destaca o aspecto de sintoma do fracasso escolar que, ao mesmo tempo, é singular e plural, tendo em vista as condições individuais e sócio-culturais. Importante
Ainda que seja importante destacar o papel da escola quando proporciona a circulação dos saberes de uma cultura, mas é também importante destacar as exigências desta juntamente com todos aqueles envolvidos na ação educacional em colocar parâmetros ideais de aprendizagem que não podem ser igualmente
cumpridos por todos os alunos.
Aula 1 | Introdução às dificuldades de aprendizagem 21 A criança percebe muito bem que ela tem que
responder a uma expectativa, ela aprende bem cedo que lhe é dirigida uma demanda, que se espera que ela aprenda e seja bem-sucedida em suas incursões pelo mundo. A inquietação dos pais com as performances intelectuais e as possibilidades de sucesso dos filhos encontra eco na escola, onde o sujeito vai deparar-se com educadores que sustentam o discurso do sucesso
como oposição ao fracasso, educadores que
demandaram dele bons resultados que possibilitem a aprovação para a série subsequente. Sem que tenham sido respeitados o ritmo do aluno e sua própria condição de desenvolvimento pessoal e escolar.
Essa exigência que surge dentro da sala de aula, que se torna presente pelo professor na relação com seu aluno, muitas vezes, tem sua raiz no fato de que o reconhecimento do professor, a qualidade do seu ensino é auferida a partir dos resultados apresentados por sua turma. Além da expectativa dos pais, vai pesar sobre o sujeito a expectativa dos seus educadores, que esperam que ele seja “capaz” de acompanhar seu grupo e de não lhe causar maiores transtornos. Afinal, aluno bom é aquele que não incomoda, assim diz o dito comum.
Anny Cordié (1996) afirma:
(...) São, portanto, os bons resultados dos alunos que fazem os bons mestres serem reconhecidos pela hierarquia: direção, inspeção acadêmica etc. e pelos pais de alunos. A angústia que essa competitividade gera, se ela se
manifesta em todos os níveis,
parecemos mais particularmente nocivas
durante os primeiros anos da
aprendizagem escolar. De fato, a inquietude ligada às performances suscita na criança um questionamento permanente: conseguirá passar de ano? Terá “maturidade” suficiente? Possuirá todas as capacidades intelectuais que se supunha que tivesse? Os julgamentos sobre ela terão sérias consequências e serão, às vezes, determinantes para o
Para refletir
Neste livro, a autora descreve o mal-estar causado pelo fato de, atualmente, o fracasso escolar ser considerado sinônimo de fracasso de vida. Entendendo que a criança precisa ser bem sucedida na escola para garantir um futuro promissor no sentido que lhe permita acesso ao consumo de bens e serviços.
Aula 1 | Introdução às dificuldades de aprendizagem 22
prosseguimento da escolaridade, pois
podem modificar e até mesmo
deteriorar grandemente as relações com o ambiente
(Cordié, 1996:24). Mais uma vez constatamos que são múltiplas as causas que interferem na produção do fracasso escolar, várias são as situações que cristalizam o sujeito na posição de não querer saber.
Anny Cordié, em “Os Atrasados Não Existem”, chama atenção que na fonte de todos esses bloqueios encontra-se o mesmo fenômeno de paradas nas operações do pensamento, fenômeno que é chamado de inibição.
A inibição pode manifestar-se em diferentes campos, mas nas situações de fracasso escolar falamos, especificamente, da inibição intelectual, da inibição para aprender, inibição que denuncia a interdição da pulsão de saber. Popularmente, à inibição se refere certo recato e timidez que são valorizados enquanto sinais de respeito à autoridade.
Muito embora tenhamos que reconhecer a importância das descrições e estudos feitos a respeito da inibição mental, sabemos que isso não basta para dar conta da complexidade do problema. Sabemos que não adianta interpretar todo e qualquer problema de aprendizagem como uma inibição intelectual que acompanha situações neuróticas.
A seguir, serão apresentadas e trabalhadas as idéias de inibição e de sintoma, a partir dos conceitos extraídos da obra de Sara Paín. A autora recorta de certa forma a idéia antes discutida por Freud, mas insere uma abordagem da dinâmica escolar envolvendo todos os agentes presentes no processo de aprendizagem, com relevo maior para o aluno.
Importante
A inibição surge na medida em que cada criança reage diferente frente aos conflitos internos, ou melhor, conflitos psíquicos.
Entretanto, qualquer que seja a forma pela qual a criança enfrenta estes conflitos, sem dúvida alguma, haverá efeitos sobre sua inteligência lógica e seu interesse na aprendizagem escolar. Dica de leitura KUPFER, Maria Cristina Machado. Freud e a Educação: O Mestre do Impossível. São Paulo: Scipione, 1989. A autora trabalha com conceitos da psicanálise e aprofunda a idéia do desejo de saber.
Aula 1 | Introdução às dificuldades de aprendizagem 23
Inibição e sintoma: as duas faces da
ignorância
Sara Paín, em “A Função da Ignorância”, descreve duas possibilidades para dar conta do comportamento de não aprendizagem: a Ignorância como inibição e a Ignorância como sintoma. A distinção entre inibição e sintoma é pautada na diferenciação feita por Freud, em seu texto de 1925, “Inibição, Sintoma e Angústia”, onde a palavra inibição aplica-se ao enfraquecimento de uma função e a palavra sintoma à transformação dessa função.
EXERCÍCIO 1
Não estaria a educação seguindo tão somente um modelo médico quando se preocupa principalmente com a verificação exploratória de um organismo (no caso do aluno) que não apresenta seu funcionamento de acordo com o esperado?
Qual o espaço existente na escola para discussão dos aspectos afetivos, presentes nos alunos, que afetam a aprendizagem?
Responda a essas questões como se fosse um diálogo: ____________________________________________ ____________________________________________ ____________________________________________ ____________________________________________ ____________________________________________ IGNORÂNCIA COMO INIBIÇÃO
Nesse caso, a não aprendizagem corresponde a uma retração intelectual do eu. Segundo Freud, essa retração pode aparecer em três ocasiões (na sexualização dos órgãos intervenientes na ação de
Aula 1 | Introdução às dificuldades de aprendizagem 24 aprender, na evitação do sucesso como autopunição, nas situações de luto). As perturbações por causa da inibição ligam-se a situações mais pontuais, eventos reais ou simbólicos da vida afetiva.
IGNORÂNCIA COMO SINTOMA
Nesse caso, as perturbações são permanentes, a ignorância, aqui, apresenta-se como representante de uma relação patológica entre o sujeito e o conhecimento. Para Freud, também o déficit cognitivo pode constituir um sintoma. Ele supõe, então, que houve um recalcamento prévio de um acontecimento cuja ação de aprender constitui a significação substituída.
Sara Paín ressalta a necessidade de restituir ao conhecimento e à atividade cognitiva a alegria que foi pervertida sob a forma de ignorância para que se possa ajudar a criança a sobrepujar sua perturbação, já que não basta denunciar o papel da perturbação como defesa. Destaca para isso a importância do papel do professor nesse processo, a necessidade de que haja investimento pessoal, por parte deste, no resgate do interesse de aprender. Assim conduzindo, o professor cria um espaço de aproximação e diálogo com o aluno que favorece canais de expressão, consequentemente, aproxima também o aluno da aquisição do conhecimento novamente.
Paín (2003) posiciona-se sobre o papel do educador, ressaltando:
A tarefa que damos à criança não é para ensinar-lhe coisa alguma porque, verdadeiramente, nada ensinamos. Nem a fazer contas, nem a escrever. O que buscamos é devolver-lhe (porque em algum momento de sua vida deve tê-lo experimentado) o interesse de aprender, o interesse por si mesma, o
Aula 1 | Introdução às dificuldades de aprendizagem 25
interesse de poder ser sujeito de uma ação inteligente.
(Paín apud Rubinstein, 2003:122) O papel do professor na produção, cristalização ou superação do fracasso escolar também é discutido por Maria Helena S. Patto (1999), em seu livro “A Produção do Fracasso Escolar”. A pesquisa realizada, pela autora, numa escola de ensino público na periferia de São Paulo a faz constatar que:
(...) portadoras do desprezo social generalizado pelas classes “baixas”, as educadoras que se encarregam das primeiras e segundas séries na escola do Jardim dedicam-se diariamente a
práticas pedagógicas autoritárias,
arbitrárias e mais comprometidas com interesses particulares do que com os interesses da clientela
(Patto, 1999:249). Qualquer trabalho voltado para a prevenção e/ ou superação do fracasso escolar deve levar em conta a importância do educador, da escola, da família, da equipe pedagógica nesse processo. O educador deve estar atento à necessidade de aproximação entre as instituições escola e família, deve buscar promover espaços de troca, discussão, reflexão entre os professores, equipe, pais, alunos, para que se possa falar das dificuldades e apostar nas potencialidades, para que se possa resgatar o prazer de aprender, de desvendar o mundo.
Quer saber mais?
Para saber mais, visite o site: http://www.abceduc atio.com.br/
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EXERCÍCIO 2
O educador tem um papel de agente de inclusão social também.
Exemplo disto seria a sua reflexão constante sobre qual a função das dificuldades de aprendizagem na dinâmica relacional de uma criança e de sua família?
O que você pensa sobre isto? Procure escrever suas idéias. ____________________________________________ ____________________________________________ ____________________________________________ ____________________________________________ ____________________________________________
A criança que apresenta uma situação de fracasso escolar pode despertar no professor sentimentos hostis, na medida em que o desempenho do professor, muitas vezes, é avaliado a partir dos resultados apresentados por seu grupo de alunos na turma. Com isso, o professor perde a oportunidade de criar situações que resgatem no aluno o desejo, o prazer de aprender.
No lugar de apostar na superação das dificuldades de seus alunos, de trabalhar as potencialidades, valorizar os ganhos e conquistas feitas por cada um, o professor rechaça, despreza, desinveste esse aluno de sua atenção. Acreditando que o fraco desempenho é fruto da má vontade do aluno, acaba por rotulá-lo de preguiçoso, agressivo, desatento, agitado, problemático etc. Eximindo-se, assim, de qualquer participação nesse fracasso.
Com relação ao problema de aprendizagem, seja na constituição de um sintoma de dificuldade para a criança/adolescente, ou então, seja na forma de uma
Aula 1 | Introdução às dificuldades de aprendizagem 27 inibição cognitiva, o sujeito tem sua dinâmica de
articulação entre os níveis de inteligência, desejo, organismo e corpo afetada, o que leva a quase um impasse da sua modalidade de aprendizagem e ao aprisionamento da inteligência.
Mas para entender esta significação é preciso
descobrir a funcionalidade da dificuldade de
aprendizagem como sintoma dentro da estrutura familiar, assim como é preciso que se aproxime da história singular da criança/adolescente para se analisar os fatores que influenciam nessa situação específica.
O fracasso escolar, entretanto, afeta a criança/adolescente em sua totalidade e esta, diante do fracasso, sente-se subestimada por não conseguir responder às expectativas dos pais e dos professores. O grupo escolar que a criança participa, bem como os
professores, tem um lugar privilegiado de
reconhecimento das aptidões que são medidas a partir dos resultados avaliativos, além disso, o modo como os outros a definem tem um papel importantíssimo nas construções identificatórias que levam à formação da identidade.
EXERCÍCIO 3
Pesquise um pouco mais sobre construção de identidade, pois desta depende grande parte do amadurecimento dos adolescentes e o futuro ingresso na vida adulta.
Registre aqui suas idéias.
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Aula 1 | Introdução às dificuldades de aprendizagem 28 A resposta do meio, ao sujeito que não aprende, reforça uma imagem sumamente desvalorizada de si mesmo. A sociedade e a própria instituição escolar, muitas vezes, não se encarregam desse problema, e a criança fica marginalizada. Embora, algumas vezes, esse seja o efeito buscado, pois, inconscientemente, a imagem que provoca acaba redundando, de maneira dialética, na deteriorização da auto-imagem da criança.
Sara Paín (1982) assim escreve:
Na produção da problemática da aprendizagem, intervêm fatores que dizem respeito ao socioeconômico, ao educacional, ao emocional, ao orgânico e ao corporal, tendo relevância para sua terapêutica e prevenção o encontro
entre diferentes áreas de
especialização (psicopedagogia,
psicanálise, pedagogia, pediatria,
sociologia etc.). Com relação à
Psicopedagogia, devemos buscar
oferecer espaços onde se possam realizar experiências com professores
que favoreçam o processo de
identificação e potencialização de possibilidades singulares de cada pessoa, a aposta deve ser feita numa modalidade de aprendizagem que favoreça essa troca.
O educador deve levar em consideração todos os aspectos que envolvem as condições de aprendizagem atuais e pregressas, contemplando, assim, aspectos familiares, metodológicos, ambientais, profissionais. Sendo assim, é analisar os fatores que intervêm, favorecendo ou prejudicando a aprendizagem numa determinada instituição.
Desta forma, podendo atuar em
INTERDISCIPLINARIDADE com os diferentes saberes que envolvem os problemas de aprendizagem.
Aula 1 | Introdução às dificuldades de aprendizagem 29
EXERCÍCIO 4
Qual seria a forma de se trabalhar com a interdisciplinaridade?
Muito tem se falado sobre a utilização dos Temas Transversais sugeridos pelos Parâmetros Curriculares Nacionais.
Escreva o que pensa sobre isso:
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Entendendo o fracasso escolar como uma resposta reativa à situação escolar, é possível também
observar o enrijecimento da modalidade de
aprendizagem como consequência do impedimento imposto ao sujeito de ser autor da sua própria história.
Como destaca a autora argentina Silvia Iannantuoni (1996):
A escola como instituição tende à submissão a determinadas pautas, em vez de promover o fato artístico e a autoria da produção; não surpreende o fato de que não conte a possibilidade de questionar a si mesma. As respostas de que “as crianças não lêem”, “não gostam de ler”, “escrevem
sempre as mesmas orações”,
“apresentam muitos erros de
ortografia” etc., sempre encontram linearmente suas causas fora do ambiente escolar. Não servem para questionar-se dentro dele.
Aula 1 | Introdução às dificuldades de aprendizagem 30 PERGUNTA, ENTÃO:
COMO A ESCOLA PODE PROPICIAR O
SURGIMENTO DE SUJEITOS ESCRITORES,
REPRESENTANTES DE SUAS IDÉIAS, GESTORES DE ATOS CRIATIVOS?
Talvez não apenas enunciando-os formalmente em objetivos e/ou expectativas de sucesso. Mas possibilitando que os educadores possam se mostrar como modelos de autoria de pensamento e de palavra, como sujeitos que possam desmontar seus “duendes e princesas”, porque, como pretender que o aluno que vai à escola seja um sujeito construtor de suas próprias aprendizagens, se não se outorga ao professor que, como ensinante, se encontre com sua própria autoria?
É importante que o fracasso escolar possa ser falado e escutado, antes que a modalidade de aprendizagem torne-se patológica, o que já se configuraria como um problema de aprendizagem. Problema porque instalado no aluno, esse se verá como único responsável pelo seu fracasso e sem recursos internos possíveis, na medida em que sua auto-estima estará fortemente abalada.
A condição de patologia desvia o educando do principal objetivo educacional que é educar, pois o aluno estrutura uma auto-imagem de derrota e se distancia cada vez mais da possibilidade de ação Educacional. Tomando, então, para si, toda a responsabilidade do insucesso, a escola fica isenta de qualquer responsabilidade no fracasso.
PERSPECTIVA PREVENTIVA
Pensar numa perspectiva preventiva trata-se, antes, de trabalhar baseado em variáveis que a prática já
Dica de leitura MINGUET, Pilar Aznar (org.). A construção do conhecimento na educação. Porto Alegre: Artmed, 1998
Aula 1 | Introdução às dificuldades de aprendizagem 31 anuncia como fatores de importância na produção do
fracasso escolar.
Nesse sentido, o educador também convoca todos a uma reflexão sobre o seu fazer, sobre sua implicação no processo que produziu as dificuldades, e convoca a um reconhecimento da autoria de sua história, do seu pensamento, fazendo com que cada um possa tirar proveito do que tem para dar e do que pode receber.
Para que isso aconteça, é necessário que os professores sejam estimulados a escutar a si próprios, reconheçam-se como importantes e se tornem implicados nesse processo de aprendizagem. O professor precisa reconhecer o quanto pode ajudar, a partir do momento que olha de maneira diferente para esse aluno que apresenta uma reação à situação escolar (fracasso escolar). Olhar esse aluno de maneira diferente é poder se identificar como uma das partes que contribui na produção desse fracasso.
O educador deve propiciar a abertura de espaços onde seja interrogado sobre, por exemplo, “o que é a inteligência?”. Para que nesses espaços possa,
também, constatar que as modalidades de
aprendizagem se tornam patológicas quando não são dados os espaços de autoria do pensamento, espaços onde se avalie a implicação da modalidade de aprendizagem do professor na sua modalidade de ensino.
Pensar nas variáveis que implicam a apresentação desse tipo de resposta ao aprender já circunscreve um campo de atuação voltado para a prevenção, ou seja, se ocupar da dificuldade de aprendizagem antes que ela
possa se consolidar com consequências mais
devastadoras, que corresponde ao aprisionamento na não-mudança, à perda do prazer de aprender, à
Importante Pensar a educação e o aprendizado em termos preventivos é estar pensando o modo de avaliar, na escola, a maneira de distribuir o conteúdo programático, a forma de criar espaços de interação entre a escola e a família, por exemplo.
Cabe aos gestores, à equipe pedagógica e aos professores, na medida do possível, se anteciparem frente às dificuldades que possam ter que ser enfrentadas.
Aula 1 | Introdução às dificuldades de aprendizagem 32 impossibilidade de se apropriar da sua história, de se apropriar das experiências vividas para poder autorizar-se autor do autorizar-seu pensamento.
A produção de maior valor do sujeito autor não é o conhecimento que ele vai incorporar no processo de aprendizagem, mas o quanto é capaz de transformar a situação na qual está aprendendo, o que significa dizer que o sujeito é também ativo quando transforma a
situação educativa, o professor e/ou seus
companheiros, apropriando-se assim de sua autoria. Podemos pensar como prevenção à dificuldade de aprendizagem a prevenção ao fracasso escolar que se respalda no movimento que possibilita espaços de discussão, reflexão, com os professores, equipe pedagógica, para que estes possam despertar para um novo olhar sobre o aprender, ressignificando a sua implicação nessa troca que se dá no processo de aprendizagem, podendo com isso permitir-se à surpresa de aprender, ensinando e, além disso, poder ser o portador de um conhecimento a ser vivido, experimentado e não o portador de um saber inquestionável. É na medida em que o professor se permite ser doador/receptor que se abre à possibilidade de valoração desse encontro, dessa troca no espaço educacional.
Conclusão
O principal destaque nesse processo do aprender/ensinar é que se deve orientar, enfocar, valorizar os aspectos saudáveis que se apresentam nas trocas estabelecidas, sem perder de vista a importância de que cada sujeito tenha a potencialização de suas habilidades, interesses, a partir do reconhecimento de sua história, de seu papel criativo e de sua autoria.
Para pensar
A idéia de prevenção faz parte das situações de saúde e doença, mas também podemos pensar em relação às condições de aprendizagem. Pensando assim, poderemos criar meios e estruturas para evitar os possíveis sofrimentos que serão vividos por adolescentes e pais nos conflitos provenientes das consequências do não aprender.
Aula 1 | Introdução às dificuldades de aprendizagem 33 Essa relação é recíproca e propicia meios,
recursos, ferramentas que possibilitam ao sujeito encontrar as saídas para suas dificuldades. Assim, escreve Alicia Fernández, no livro “Os Idiomas do Aprendente”:
Nossa concepção de aprendizagem permite-nos e obriga-nos a estabelecer relações com aspectos saudáveis mais do que com a enfermidade. Ensinar está mais próximo de prevenir do que de curar, e prevenir está mais próximo de estender a saúde do que de deter ou atacar a enfermidade.
(Fernández, 2001:44) A partir da relevância do enfoque no estabelecimento de relações com aspectos saudáveis mais do que com a enfermidade, que se inclui nas ações de prevenção às dificuldades de aprendizagem, a aproximação ESCOLA-FAMÍLIA.
O acolhimento, por parte da escola e do educador, das dúvidas, das angústias, dos receios e das exigências dos pais é o ponto mais favorável e que torna possível implicá-los no processo de aprendizagem. Assim, a participação de pais e familiares, transformando a escola num espaço onde suas dúvidas, anseios e temores possam se apresentar, serem escutados e transformados em questionamento a respeito do papel de cada um no processo de aprendizagem e de produção do sucesso escolar.
Escutar os pais, entender suas expectativas com relação à escola, à equipe pedagógica, aos filhos, e pó der pensar com eles e não por eles, no papel atribuído à escola, ao ensino e à educação. Desta forma, abre-se caminho para que novas saídas sejam apontadas, novas versões sejam alcançadas e muitos obstáculos sejam vencidos. Quer saber mais? A autora Alicia Fernández tem vários livros publicados em português, destacando importantes discussões sobre o processo de aprendizagem tanto no tocante ao educando quanto ao educador. Procure no site da Editora Artes Médicas alguns desses livros. http://www.artesme dicas.com.br/frame. php3
Aula 1 | Introdução às dificuldades de aprendizagem 34
EXERCÍCIO 5
Contextualizar e compartilhar
Reflita sobre essas considerações na prática
educacional e escreva algumas propostas.
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Conhecer o que os pais e os alunos esperam de uma escola, do seu ensino, das trocas que nela se processam é a melhor maneira de clarificar as demandas e esclarecer expectativas que serão impossíveis de serem satisfeitas, assim como viabilizar objetivos, metas, execução de projetos, tendo sempre a preocupação de enfocar o que as relações
construíram de mais saudável, criativo e
potencializador.
É preciso que os pais e os alunos façam parte da
escola, sintam-se pertencendo àquele espaço,
reconheçam-se como sujeitos-autores para que possam se implicar, se envolver, pertencer, dialogar, criar, despertar, ouvir e, acima de tudo, apostar e acreditar no potencial de criação de cada um que lá estiver implicado.
Enfim, o que buscamos ressaltar é que todo e qualquer trabalho voltado para a prevenção e/ ou superação do fracasso escolar deve levar em conta a importância do educador, da escola, da família, da equipe pedagógica nesse processo. Identificar as demandas e, então, estabelecer e desenvolver a parceria família-escola, no que se refere ao
Aula 1 | Introdução às dificuldades de aprendizagem 35 comprometimento de ambas quanto ao processo de
desenvolvimento do educando. Só assim poderemos falar, discutir, enfrentar as dificuldades, encontrar
alternativas, saídas, sustentar a aposta nas
potencialidades, para que se possa, então, resgatar o prazer de ensinar, de aprender, de desvendar o mundo.
EXERCÍCIO 6
A equipe pedagógica deve orientar seu trabalho para uma intervenção e não para uma interferência. Entende-se por intervenção:
( A ) A anulação das possibilidades já existentes; ( B ) A anulação das versões e condutas que a
instituição oferece;
( C ) A possibilidade de incluir um novo olhar, a busca por saídas possíveis;
( D ) A mobilização dos alunos; ( E ) Uma reflexão dos professores.
EXERCÍCIO 7
A escola, ao criar espaços que permitam ao professor encontrar-se com sua autoria e apropriar-se de sua história, abre a possibilidade de que o professor:
( A ) Aprenda a ensinar;
( B ) Mude o seu método de ensino; ( C ) Resgate o prazer de ensinar;
( D ) Aproxime-se da equipe pedagógica;
( E ) Escolha mudar de enfoque, priorizando as demandas familiares.
Aula 1 | Introdução às dificuldades de aprendizagem 36
EXERCÍCIO 8
Explique a perspectiva preventiva que não está dirigida diretamente ao aluno que apresenta fracasso escolar. ____________________________________________ ____________________________________________ ____________________________________________ ____________________________________________ ____________________________________________
EXERCÍCIO 9
Escreva sobre as duas faces da ignorância (inibição e
sintoma) segundo a autora Sara Paín.
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RESUMO
Vimos até agora:
Para se pensar a produção do fracasso escolar, antes de tudo, é preciso saber que nunca há uma causa única para a produção desse fracasso, pois suas causas são múltiplas, intrincadas e complexas, agindo uma sobre as outras;
É necessário que os professores sejam
estimulados a escutar a si próprios,
reconheçam-se como importantes e se tornem implicados no processo de aprendizagem, pois
Aula 1 | Introdução às dificuldades de aprendizagem 37 este precisa reconhecer o quanto pode
ajudar, a partir do momento que olha de maneira diferente para o aluno que apresenta uma reação à situação escolar (fracasso escolar);
É possível pensar como prevenção à dificuldade de aprendizagem a prevenção ao fracasso escolar que se respalda no movimento que possibilita espaços de discussão, reflexão, com os professores, equipe pedagógica, para que estes possam despertar para um novo olhar sobre o aprender, ressignificando a sua implicação no processo de aprendizagem.
Transtorno da Leitura
e da Escrita e do
Cálculo Matemático
Maria PoppeA
ULA
2
Apresen
ta
çã
o
Esta aula é dedicada à apresentação e discussão dos tipos mais frequentes de dificuldades de aprendizagem, analisando transtornos, deficiências e sintomas que afetam diretamente o desenvolvimento e a aprendizagem dos educandos.
Objetivo
s
Esperamos que, após o estudo do conteúdo desta aula, você seja capaz de:
Analisar historicamente o enfrentamento das dificuldades de aprendizagem nas escolas, desde o uso do discurso médico que contaminou o mundo acadêmico para levantamento de diagnósticos;
Conhecer as áreas imprescindíveis da aprendizagem e compreender sobre as principais deficiências e sintomas que podem gerar transtornos específicos do aprendizado
(expressão escrita, leitura, matemática, comunicação/
Aula 2 | Transtornos da leitura e da escrita e do cálculo matemático 40
Introdução
Para abordarmos os tipos básicos ou mais frequentes de dificuldade de aprendizagem de que trata essa disciplina, devemos, inicialmente, expor aspectos considerados fundamentais para esse campo.
As dificuldades de aprendizagem devem ser entendidas levando-se em conta suas raízes históricas, assim como devemos considerar todo o movimento que se deu dentro desse campo, que teve como consequência o refinamento das definições e a aproximação de um consenso.
Jesus N. García, no “Manual de Dificuldades de Aprendizagem”, traça um histórico das definições acerca das dificuldades de aprendizagem que resgata toda a trajetória que possibilitou a formação e o desenvolvimento desse campo. Jesus situa o início desse movimento em 1800, com a apresentação do trabalho de pesquisa de Gall, que se baseia nas observações sobre adultos com lesões cerebrais. Gall observou que determinadas pessoas adultas, devido a uma lesão cerebral, perdiam a capacidade de expressão de idéias e sentimentos mediante a fala, embora permanecessem com suas habilidades intelectuais intactas.
A seguir, apresentaremos, primeiramente, esta visão histórica a fim de situarmos as principais formas de conceituação das dificuldades de aprendizagem, através das mudanças que ocorreram no processo de aprendizagem.
UM POUCO DE HISTÓRIA
O período de 1800 a 1929, considerado os primeiros anos da fase de fundação desse campo (das
Dica da professora
A leitura desta 2º aula, assim como os demais, deve ser bem cuidadosa e sempre que necessário é importante reler para acompanhar o conteúdo das aulas subsequentes.
Introdução 40
Os tipos mais freqüentes de dificuldades de aprendizagem 47 Transtornos da expressão escrita 58 Transtornos da leitura 59 Transtornos da matemática 59 Transtornos da comunicação (linguagem) 59 Conclusão 62
Aula 2 | Transtornos da leitura e da escrita e do cálculo matemático 41
dificuldades de aprendizagem), foi marcado pelo desenvolvimento de posições teóricas baseadas na análise das consequências advindas das lesões cerebrais adquiridas.
Dejerine traz uma contribuição de peso ao descrever o caso de um adulto que perdeu a capacidade de ler, mas não a de falar, sendo esse o primeiro caso de alexia ocasionado por lesão cerebral, o que se denominou “transtorno adquirido de leitura”.
O período de 1930 a 1963, considerado o período final da etapa de fundação, foi marcado pela preocupação com o desenvolvimento de intervenções que possibilitassem aplicações terapêuticas dos postulados teóricos. O interesse que, antes, baseava-se nos adultos, cede lugar ao crescente interesse pelas crianças com transtornos do desenvolvimento.
Em 1962, Kirk utiliza pela primeira vez o nome “dificuldade de aprendizagem” e, em sua definição, as dificuldades de aprendizagem teriam como causa uma disfunção cerebral, ou uma alteração emocional-condutal, centrariam-se em dificuldades nos processos
implicados na linguagem e nos rendimentos
acadêmicos, independentes da idade. Em sua definição, Kirk aponta:
Uma dificuldade de aprendizagem
refere-se a um retardamento,
transtorno ou desenvolvimento lento em um ou mais processos da fala, linguagem, leitura escrita, aritmética ou outras áreas escolares, resultantes de um handicap causado por uma
possível disfunção cerebral e/ou
alteração emocional ou condutal. Não é o resultado de retardamento mental, de privação sensorial ou fatores culturais e instrucionais.
(Kirk apud Jésus N. García, 1998, p.8)
Para pensar Ao longo das mudanças conceituais sobre dificuldades de aprendizagem, podemos observar o quanto, primeiramente, foram valorizados os aspectos maturacionais em detrimento dos aspectos ambientais e metodológicos. Assim sendo, o foco estava no indivíduo que tinha problema, isentando toda sorte de dificuldades advindas de modelos de ensino inadequados ou condições de aprendizagem inapropriadas.
Aula 2 | Transtornos da leitura e da escrita e do cálculo matemático 42
Em 1965, Bateman propõe uma definição que introduz o conceito de discrepância aptidão -
rendimento e enfatiza o papel da criança, não situa a
causa da dificuldade de aprendizagem nem tampouco busca especificar os tipos de dificuldades encontradas. Bateman apresenta a seguinte definição:
As crianças que têm dificuldade de aprendizagem são as que manifestam
uma discrepância educativa
significativa entre seu potencial
intelectual estimado e o nível atual de
execução relacionado com os
transtornos básicos nos processos de aprendizagem, que podem ou não vir
acompanhados por disfunções
demonstráveis no sistema nervoso central, e que não são secundárias ao retardamento mental generalizado, de
privação cultural ou educativa,
alteração emocional severa ou perda sensorial.
(Bateman apud Jesus N. García, 1998, p.8) Durante todo esse período (1800 a 1963),
muitas pesquisas foram desenvolvidas, muitos
trabalhos foram publicados e muitas contribuições foram feitas, o que possibilitou o nascimento do movimento das dificuldades de aprendizagem, surgindo com isso um campo específico, com o desenvolvimento de métodos de avaliação, de diagnóstico, e programas específicos de intervenção.
Em 1988, um comitê (National Joint Committee on Learning Disabilities - NJCLD), composto por representantes de 8 (oito) das mais importantes organizações dos E.U.A, que se dedicam ao tema das dificuldades de aprendizagem, propõe uma definição, considerada a mais consensual para se pensar a dificuldade de aprendizagem, o NJCLD elabora assim:
Dificuldade de Aprendizagem (DA) é um termo geral que se refere a um grupo heterogêneo de transtornos que se manifestam por dificuldades significa Para refletir
Mas, afinal, o diagnóstico servia a quem?
Observamos que se tornou uma prática frequente a rotulação de crianças,
considerando muitas delas incapazes para a aprendizagem. Por isso é relevante trabalharmos de forma diferenciada o diagnóstico e a avaliação, pois diagnóstico é uma terminologia utilizada na clínica médica. Diferentemente, na pedagogia trabalhamos com avaliação para se buscar a melhor forma de recuperação de conteúdos e aproveitamento da aprendizagem.