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Art. 33, §4º, da Lei n. 11.343 de 23 de agosto de 2006: aplicação da pena e vedação ao bis in idem

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UNIVERSIDADE FEDERAL DE SANTA CATARINA CENTRO DE CIÊNCIAS JURÍDICAS

DEPARTAMENTO DE DIREITO

NATHÁLIA VAZ GALVÃO LANDIM STORI

ARTIGO 33, § 4o DA LEI N. 11.343 DE 23 DE AGOSTO DE 2006:

APLICAÇÃO DA PENA E VEDAÇÃO AO BIS IN IDEM

Florianópolis

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NATHÁLIA VAZ GALVÃO LANDIM STORI

ARTIGO 33, § 4o DA LEI N. 11.343 DE 23 DE AGOSTO DE 2006:

APLICAÇÃO DA PENA E VEDAÇÃO AO BIS IN IDEM

Trabalho de Conclusão de Curso apresentado ao Centro de Ciências Jurídicas da Universidade Federal de Santa Catarina, como requisito parcial à obtenção do título de Bacharel em Direito.

Orientador: Prof. Alexandre Morais da Rosa

Florianópolis

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AGRADECIMENTOS

Agradeço, primeiramente, a Deus por ter me abençoado com os pais, Cláudio e Josiane, pessoas determinadas e de caráter. A estes, sou muito grata por serem o alicerce e porto-seguro de nossa família, e que, sempre pacientes, atenciosos e amorosos, me transmitiram confiança e sabedoria para enfrentar as dificuldades da vida adulta, tal como a mudança para o lugar desconhecido e distante, que acabou por se tornar um marco de crescimento pessoal e profissional.

Um agradecimento especial a Paulo Ricardo Lorandi, grande companheiro para todas as horas, que dividiu comigo momentos de muita alegria durante boa parte dos anos de faculdade, assim como muitas das angústias que antecediam avaliações das disciplinas mais difíceis lecionadas na faculdade.

À Mariana Franciosi Tatsch, grande profissional e amiga, que ampliou minha visão sobre o mundo e sobre mim mesma, não poderia deixar de prestar meus agradecimentos.

Agradeço aos mestres da Universidade Federal de Santa Catarina, que dedicaram seu tempo e esforço para transmitir todo o seu conhecimento sobre o universo jurídico, dentre os quais, dedico um agradecimento especial ao professor Alexandre Morais da Rosa, meu orientador neste trabalho.

Demonstro também minha gratidão à Fernanda Amorim pelas essenciais observações sobre o presente trabalho de conclusão de curso.

Agradeço, ainda, ao juiz de Direito, Dr. Marcelo Carlin, e à toda a sua equipe da 1ª Vara Criminal de Florianópolis/SC, que juntos me propiciaram uma incrível experiência de estágio, no qual eu pude me aproximar do Direito Penal, área que muito estimo e na qual pretendo atuar.

Por fim, um enorme agradecimento aos meus colegas de faculdade, futuros grandes juristas, pessoas que guardarei para sempre na memória, em especial Amanda Nunes, Bruna Pfiffer, Gisele Cardoso, Heloísa Mondardo e Vitória Muller, grandes amigas e mulheres, que jamais deixarão de ocupar um lugar em meu coração.

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RESUMO

STORI, Nathália Vaz Galvão Landim. ARTIGO 33, § 4o DA LEI N. 11.343 DE 23 DE AGOSTO DE

2006: APLICAÇÃO DA PENA E VEDAÇÃO AO BIS IN IDEM. 2016. Trabalho de Conclusão de Curso (Bacharelado em Direito – Área: Direito Penal) – Universidade Federal de Santa Catarina, Centro de Ciências Jurídicas, Florianópolis.

O presente trabalho tem por objetivo estudar as significativas mudanças no âmbito da aplicação da pena dos crimes de tráfico de drogas com o advento da Lei n. 11.343/2006. Mais especificamente, pretende tratar dos requisitos e critérios de gradação da causa de diminuição de pena prevista no art. 33, § 4o da referida legislação. Utiliza-se, para tanto, o método de procedimento monográfico, o método de abordagem indutivo e a técnica de pesquisa indireta, com pesquisa bibliográfica, documental e jurisprudencial. Apresenta-se, inicialmente, um estudo sobre a dosimetria da pena, seus princípios e regras de aplicação, passando-se, então, à análise histórica das legislação penal antidrogas no Brasil, até a alteração em 2006. A partir disso, realiza-se uma abordagem sobre o crime de tráfico de drogas estabelecido no art. 33 da Lei n. 11.343/06 e a causa de diminuição de pena a ele atrelada, analisando-se as decisões judiciais sobre o tema também relacionadas aos princípios da individualização da pena, da proporcionalidade e do non bis in idem.

Palavras-chave: Princípios constitucionais. Bis in idem. Tráfico de drogas. Dosimetria. Causa de diminuição de pena.

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ABSTRACT

This monograph aims to study the significant changes in terms of penalty application when it comes to drugs dealing crimes with the advent of the Law n. 11.343/2006. More specifically, it intends to treat about the penalty diminution cause requirements set on article 33, § 4o of the mentioned legislation. It uses the method of monographic procedure, the inductive approach method and the indirect research technique, with bibliography, documentary and jurisprudential study. Initially, it presents a study about the application of penalties, its principles and rules, which will be followed by a historical analysis of Brazil's anti-drugs legislation, until its last alteration in 2006. After that, it's analyzed de now called drugs dealing crime, established on article 33 of the Law n. 11.343/06 and its diminution cause and the judicial decisions about the theme and also related to principles, such as the penalties individualization, proportionality and non bis in idem.

Keywords: Constitutional principles. Bis in idem. Drugs dealing. Penalties application. Diminution cause.

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO ... 7

1 APLICAÇÃO DA PENA ... 9

1.1 Princípios constitucionais aplicáveis ao cálculo da pena ... 9

1.1.1 Princípio da individualização da pena ... 10

1.1.2 Princípio da proporcionalidade ... 13

1.1.3 Princípio do non bis in idem ... 16

1.2 Método trifásico de aplicação de pena adotado pela reforma penal de 1984 ... 18

1.2.1 Pena-base: circunstâncias judiciais ... 22

1.2.2 Pena intermediária: circunstâncias agravantes e atenuantes ... 26

1.2.3 Pena definitiva: causas de aumento ou diminuição ... 30

2 TRÁFICO DE DROGAS ... 36

2.1 Breve histórico da legislação penal brasileira sobre drogas ... 36

2.2 Lei n. 11.343 de 23 de agosto de 2006 ... 40

2.2.1 Finalidades, princípios e objetivos ... 40

2.2.2 Crime do art. 33 da Lei n. 11.343/06 ... 43

2.2.3 Princípios da proporcionalidade e da individualização da pena aplicados ao crime do art. 33 da Lei n. 11.343/2006 ... 48

3 CAUSA DE DIMINUIÇÃO DE PENA (art. 33, § 4o, da Lei n. 11.343/2006) ... 55

3.1 Relação com os princípios da individualização da pena e da proporcionalidade ... 55

3.2 Requisitos para a concessão do art. 33, § 4o, da Lei n. 11.343/06 ... 59

3.2.1 Primariedade do agente ... 59

3.2.2 Ausência de antecedentes criminais ... 61

3.2.3 Réu que não se dedique a atividades criminosas... 65

3.2.4 Acusado que não integre organização criminosa ... 66

3.3 Fração da causa de diminuição de pena ... 69

3.4 Vedação ao bis in idem... 72

3.4.1 Quanto à reincidência ... 73

3.4.2 Quanto aos antecedentes ... 78

3.4.3 Quanto às circunstâncias do art. 42 da Lei n. 11.343/2006 (quantidade e natureza da droga) ... 79

CONSIDERAÇÕES FINAIS ... 85

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INTRODUÇÃO

Com o advento da Lei n. 11.343/06, a política criminal antidrogas no Brasil ampliou seus princípios, objetivos, maneiras de prevenção e repressão, tudo contra o uso e a mercancia ilícita de substâncias entorpecentes, dada o alto grau de lesividade que o consumo e o tráfico de drogas apresentam à saúde pública, bem jurídico tutelado pelo tipo penal. Não é a toa que a pena mínima do delito de tráfico foi agravada e passou a ser de 05 (cinco) anos.

Por outro lado, a lei de 2006 também trouxe modificações benéficas aos sentenciados pelos crimes elencados na referida legislação, pois o elaborador da norma de caráter penal, sabiamente, estabeleceu uma maneira de privilegiar os denominados "traficantes não habituais", desde que cumpridos os requisitos elencados em seu dispositivo autorizador, qual seja, o art. 33, § 4o, da Lei n. 11.343/2006.

Tal inovação é de extrema relevância para o Direito Penal, pois, em determinados casos, pode atuar como instrumento dos princípio da proporcionalidade e da individualização das penas aplicadas àqueles condenados por tráfico ilícito de entorpecentes.

Dessa forma, por meio dos métodos de procedimento monográfico e de abordagem indutiva, além da técnica de pesquisa indireta, como a bibliográfica, documental e jurisprudencial, será realizado um estudo sobre a aplicação da pena e, mais adiante, sua incidência na Lei de Drogas de 2006, com enfoque no seu art. 33, § 4o.

Para tanto, serão inicialmente abordados os princípios constitucionais aplicáveis ao cálculo das sanções criminais, tais como a individualização da pena, da proporcionalidade e da vedação ao bis in idem, ressaltando-se a grande importância da sua observância já na fase embrionária, ou seja, no procedimento legislativo.

Com relação à diretriz de individualizar as penas, destacar-se-á a importância da não mecanização das decisões judiciais, principalmente em termos de dosagem das reprimendas.

Quanto ao preceito fundamental da proporcionalidade, será enfatizada a dupla dimensão de seu sentido estrito: proibição do excesso - que diz respeito à vedação ao Estado de impor sanções exorbitantes ou severas em demasia, e proibição da proteção deficiente, a fim de que seja efetivado o sentido punitivo e repressivo do Direito Penal ao que desrespeitarem suas regras, afastando, assim, o sentimento de impunidade.

Por fim, com relação ao bis in idem, será demonstrada a sua importância para a garantia de um estado democrático de direito, onde são proibidas as duplas punições, seja por um mesmo fato ou circunstância negativa ao réu.

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Na sequência, far-se-á um estudo crítico sobre a reforma penal de 1984 e a perpetuação do modelo trifásico de cálculo da pena de Nelson Hungria, que muito colaborou com a correta individualização da pena, ainda que tenha facilitado a ocorrência do odioso bis

in idem.

Serão, ainda, individualmente examinadas as três fases do referido método, esmiuçando-se os conceitos de circunstâncias judiciais, circunstâncias agravantes e atenuantes e causas de aumento e diminuição, bem como o correto momento de avaliação de cada um desses elementos, de acordo com o positivado no art. 68 do Código Penal.

Em seguida, será introduzido o tema do tráfico de drogas, com uma breve análise histórica sobre a legislação penal antidrogas no Brasil até o advento da Lei n. 11.343/06 e sua ligação com os princípios fundamentais da individualização da pena e da proporcionalidade, com enfoque em seu art. 33.

A partir de então, será efetuada a análise sobre o delito acima mencionado e a causa de diminuição de pena prevista em seu § 4o, salientando sua importância para a efetiva aplicação dos princípios da individualização da pena e da proporcionalidade.

Não obstante os avanços que o dispositivo inédito trouxe aos condenados pelo crime de tráfico ilícito de entorpecentes, serão apontados os requisitos para a concessão e gradação da minorante, os quais, em sua maioria - primariedade, bons antecedentes, personalidade e conduta social do agente e natureza e quantidade da droga, refletem circunstâncias judiciais e legais, já previstas no Código Penal pelo legislador.

Dessa forma, conforme se verá, há quem sustente que tais condições são duplamente avaliados na dosimetria e, por tal motivo, levam o aplicador da reprimenda a incorrer em bis in idem e, consequentemente, a agir contrariamente aos princípios da individualização e da proporcionalidade das penas, norteadores do cálculo da sanção criminal.

Com isso, chegar-se-á na discussão fundamental sobre a incidência ou não em bis

in idem das decisões que consideram determinadas circunstâncias tanto para afastar a

minorante ou reduzir sua fração de diminuição, ao mesmo tempo em que agravam a reprimenda em outra fase da dosimetria, o que está longe de ser pacífico.

Assim, o presente trabalho buscará identificar os argumentos jurídicos utilizados por ambas as correntes: aquela que entende configurado o bis in idem e aquela que afasta tal tese, bem como as mudanças jurisprudenciais acerca do tema.

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1 APLICAÇÃO DA PENA

1.1 Princípios constitucionais aplicáveis ao cálculo da pena

Princípios são diretrizes normativas que devem reger a sociedade, sendo de extrema importância para a consolidação de um estado democrático de direito, os quais devem guiar o sentenciante na busca pela pena justa em cada caso específico, considerando-se que se trata de uma decisão que irá determinar sobre a liberdade individual de uma pessoa humana.

Dito isso, como bem salienta NUCCI1:

[...] julgar não é tarefa de matemáticos nem de computadores, sendo deplorável a (nem sempre incomum) pena-padrão, que elimina as evidentes diversidades entre os réus, seres humanos diferentes por natureza no cotidiano. Igualar os acusados artificialmente, no momento da punição, não poucas vezes por indiferença dos julgadores, [...] é inaceitável, mormente se confrontarmos esse resultado com o princípio constitucional da individualização da pena.

É por tal motivo, por não ser o Direito e, principalmente, a aplicação de sanções criminais uma ciência exata, que a cominação das penas deve levar em conta diversos princípios constitucionais explícitos ou implícitos, os quais objetivam garantir que, realizada a subsunção do fato à norma, o sentenciado receberá punição justa de acordo com sua responsabilidade no caso concreto.

A esse respeito, BATISTA preconiza2:

Existem efetivamente alguns princípios básicos que, por sua ampla recepção na maioria dos ordenamentos jurídico-penais positivos da família romano-germânica, pela significação política de seu aparecimento histórico ou de sua função social, e pela reconhecida importância de sua situação jurídica — condicionadora de derivações e efeitos relevantes — constituem um patamar indeclinável, com ilimitada valência na compreensão de todas as normas positivas. Tais princípios básicos, embora reconhecidos ou assimilados pelo direito penal, seja através de norma expressa [...], seja pelo conteúdo de muitas normas a eles adequadas [...], não deixam de ter um sentido programático, e aspiram ser a plataforma mínima sobre a qual possa elaborar-se o direito penal de um estado de direito democrático.

1 NUCCI, Guilherme de Souza. Individualização da pena. - 7. Ed. - Rio de Janeiro: Forense, 2015, p. 160. 2 BATISTA, Nilo. Introdução crítica ao direito penal brasileiro. - 11. Ed. - Rio de Janeiro: Revan, 2007, p.

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Assim, a legalidade, a isonomia, a culpabilidade, a individualização da pena, a proporcionalidade e o non bis in idem, entre outros, são exemplos de preceitos fundamentais que devem guiar os responsáveis pela fixação de penas criminais, seja no âmbito legislativo ou judicial.

Dentre os princípios alhures mencionados, mostram-se de extrema relevância para o presente trabalho os três últimos, quais sejam: a individualização da pena, a proporcionalidade e o non bis in idem.

1.1.1 Princípio da individualização da pena

A Constituição Federal de 1988 estatuiu em seu artigo 5º, inciso XLVI, que: "A lei regulará a individualização da pena".

Dessa forma, o constituinte assegurou que o édito condenatório penal será regulado pelo princípio da individualização da pena, a fim de que sejam evitadas as estandardizações das sanções criminais. Nas palavras de NUCCI: "sua importância é a fuga da padronização da pena, da "mecanizada" ou "computadorizada" aplicação da sanção penal3".

A relevância da individualização das penas é tanta que se processa em três etapas distintas. A aplicação inicial deste princípio ocorre quando o legislador fixa as penas mínimas e máximas em abstrato, para cada tipo penal em questão.

Já na fase judicial, a observância da individualização deve acontecer tanto no momento de fixação da pena em concreto pelo magistrado, bem como na fase executória da reprimenda, quando serão analisados a unificação de penas, progressão de regime, dentre outros benefícios, o que explicita BOSCHI4.

No presente estudo, é de interesse a segunda etapa da individualização da pena, oportunidade em que o magistrado, fazendo uso de certa discricionariedade, deve encontrar a pena justa a ser aplicada a cada caso concreto, respeitados os limites previamente estabelecidos pelo legislador.

3 NUCCI, Guilherme de Souza. op. cit., p. 27.

4 BOSCHI, José Antônio Paganella. Das penas e seus critérios de aplicação. - 6. Ed. - Porto Alegre: Livraria

(13)

A respeito da história da individualização judicial da pena, destaca-se da doutrina de BITENCOURT5:

Na Idade Média, o arbítrio judicial, imposto por exigências políticas da tirania, era produto de um regime penal que não estabelecia limites para a determinação da sanção penal. Se outra fosse a natureza humana, talvez esse fosse o sistema mais conforme à ideia retribucionista, isto é, à justa e rigorosa adequação da pena ao crime e ao delinquente. Contudo, a segurança jurídica e a garantia dos direitos fundamentais do cidadão exigem, com precisão e clareza, a definição de crimes e a determinação das respectivas sanções. A primeira reação do Direito Penal moderno ao arbítrio judicial dos tempos medievais foi a adoção da pena fixa, representando o “mal justo” na exata medida do“mal injusto” praticado pelo delinquente. Na verdade, um dos maiores males do Direito Penal anterior ao Iluminismo foi o excessivo poder dos juízes, exercido arbitrariamente, em detrimento da Justiça e a serviço da tirania medieval.

A iniquidade que resultava do exercício arbitrário do “poder de julgar” constituiu um dos maiores fundamentos do movimento liderado por Cesare de Beccaria visando à reforma do Direito punitivo. E a reação mais eficaz contra aqueles extremos seria naturalmente a limitação do arbítrio judicial, com a definição precisa do crime e um sistema rígido de penas fixas. Na concepção de Beccaria, seguindo a de Montesquieu, ao juiz não deveria sequer ser admitido interpretar a lei, mas apenas aplicá-la em seus estritos termos. Assim, a um sistema largamente aberto na dosagem da pena sucedeu um sistema de pena rigorosamente determinada, consubstanciado no Código Penal francês de 1791. Por esse novo sistema, a função do juiz limita-se à aplicação mecânica do texto legal. Mas logo se percebeu que, se a

indeterminação absoluta não era conveniente, também a absoluta determinação não era menos inconveniente. Se a pena absolutamente

indeterminada deixava demasiado arbítrio ao julgador, com sérios prejuízos aos direitos fundamentais do indivíduo, igualmente a pena absolutamente determinada impediria o seu ajustamento, pelo juiz, ao fato e ao agente, diante da realidade concreta.

Essa constatação determinou a evolução para uma indeterminação relativa: nem determinação absoluta, nem absoluta indeterminação. Finalmente, abriu-se um grande crédito à livre dosagem da pena, pelo juiz, estabelecendo o Código Penal francês de 1810 limites mínimo e máximo, entre os quais pode variar a mensuração da pena. Essa concepção foi o ponto de partida para as legislações modernas, fixando os limites dentre os quais o juiz deve — pelo princípio do livre convencimento — estabelecer fundamentadamente a pena aplicável ao caso concreto.

Como se pode extrair do excerto acima, o processo de individualização da pena vem se modificando na história, com a finalidade de se encontrar o caminho mais justo ou menos gravoso ao sentenciado, sempre valendo-se do princípio da dignidade da pessoal humana.

5 BITENCOURT, Cezar Roberto. Tratado de direito penal, parte geral. - 17. Ed. - São Paulo: Saraiva, 2012,

(14)

Neste norte, entendeu-se que não se mostra razoável a fixação da pena baseada exclusivamente na discricionariedade do seu aplicador, ou o oposto, na padronização isenta de análise subjetiva, como bem salienta LYRA6:

O arbítrio judicial, a serviço da individualização da pena, através da indeterminação relativa consagrada na lei, veio dar forma equitativa e sistemática ao que se vinha fazendo eventualmente com caráter de privilégio, a pretexto de liberdade de interpretação. Não seria digno da cultura brasileira um código que tratasse igualmente desiguais e reduzisse juízes capazes, responsáveis e garantidos, a meros contadores trabalhando [...]

Assim, as modificações históricas no que tange ao juízo discricionário do aplicador da lei passaram a permitir uma maior atuação deste, a fim de se evitar exatidões na ciência jurídica e, consequentemente, injustiças. Isso porque, por melhor que seja a intenção do legislador, a aplicação da pena deve, sim, respeitar o texto normativo, mas, mais além, necessita da análise das circunstâncias do caso concreto, de modo que, atualmente, conforme os ensinamentos de NUCCI, trata-se7:

[...] de um processo de discricionariedade juridicamente vinculada, por meio do qual o juiz, visando à suficiência para reprovação do delito praticado e prevenção de novas infrações penais, estabelece a pena cabível, dentro dos patamares determinados previamente pela lei.

Cabe salientar que a Exposição de Motivos do Código de Processo Penal exige a motivação da sentença, em consonância com previsão constitucional sobre o tema8, a fim de

que o sentenciado possa vir a se defender amplamente da decisão, conhecendo os exatos motivos de sua absolvição ou condenação e, neste caso, os parâmetros utilizados pelo julgador para aplicar-lhe determinado quantum de reprimenda, regime, entre outros.

Logo, explicita AGUIAR JÚNIOR: "a individualização judicial é uma garantia do réu e deve ser sempre fundamentada, não de forma vazia, com a repetição dos dizeres da lei e termos abstratos, mas com a indicação precisa dos fatos provados nos autos9".

6 LYRA, Roberto. Comentários ao código penal: vol. 2. - 2. Ed. - Rio de Janeiro: Forense, 1958, p. 188. 7 NUCCI. op. cit., p. 126.

8 Constituição Federal de 1988, art. 93, IX: todos os julgamentos dos órgãos do Poder Judiciário serão públicos,

e fundamentadas todas as decisões, sob pena de nulidade, podendo a lei limitar a presença, em determinados atos, às próprias partes e a seus advogados, ou somente a estes, em casos nos quais a preservação do direito à intimidade do interessado no sigilo não prejudique o interesse público à informação.

9 AGRUIAR JUNIOR, Ruy Rosado de. Aplicação da pena. - 5. Ed. - Porto Alegre: Livraria do Advogado

(15)

Por fim, importante ressaltar que a individualização da pena implica na análise de outros princípios constitucionais penais, tais como o da proporcionalidade e do non bis in

idem, que serão melhores detalhados a seguir.

1.1.2 Princípio da proporcionalidade

O princípio da proporcionalidade, é mais fácil de compreender do que definir. Entretanto, pode se caracterizar, como ensina BONAVIDES: "pelo fato de presumir a existência de relação adequada entre um ou vários fins determinados e os meios com que são levados a cabo10".

No que se refere ao Direto Penal, assevera BECCARIA sobre o princípio da proporcionalidade11:

Não somente é interesse de todos que não se cometam delitos, como também que estes sejam mais raros proporcionalmente ao mal que causam à sociedade. Portanto, mais fortes devem ser os obstáculos que afastam os homens dos crimes, quando são contrários ao bem público e na medida dos impulsos que os levam a delinquir. Deve haver, pois, proporção entre os delitos e as penas.

Destarte, em sua forma mais resumida, o princípio da proporcionalidade, no tocante à matéria criminal, deve pressupor uma correlação razoável entre o fato e a sanção que lhe será atribuída.

O referido preceito encontra-se previsto desde 1789, na Declaração Francesa dos Direito do Homem e do Cidadão, que estabeleceu em seu art. 8º que: "a lei só deve cominar penas estritamente necessárias e proporcionais ao delito12", de maneira que a visão atual que

se extrai de proporcionalidade no âmbito da aplicação da pena é a de vinculação entre a intensidade desta, sua eficácia e exigência de tutela de bens jurídicos, como bem esclarece Rodrigo Roig13.

10 BONAVIDES, Paulo. Curso de direito constitucional. - 15. Ed. - São Paulo: Malheiros, 2004, p. 392/393. 11 BECCARIA, Cesare. Dos delitos e das penas. - 4. Ed. - São Paulo: Revista dos Tribunais, 2009, p. 42. 12 FRANÇA. Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão (1789). Disponível em:

<http://pfdc.pgr.mpf.mp.br/atuacao-e-conteudos-de-apoio/legislacao/direitos-humanos/declar_dir_homem_cidadao.pdf>. Acesso em: 20 de maio de 2016.

13 ROIG, Rodrigo Duque Estrada. Aplicação da pena: limites, princípios e novos parâmetros. - 2. Ed. - São

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Em razão de sua complexidade, a proporcionalidade se divide em outros três subprincípios, como classifica Castanho de Carvalho: adequação, necessidade e proporcionalidade em sentido estrito. A esse respeito, o mesmo doutrinador explica que14:

[...] o primeiro constitui-se no exame de a medida constritiva processual ter ou não causalidade em relação ao fim pretendido, ou seja, ser idônea, apta, para atingir aquele fim. A necessidade, exige a intervenção mínima possível na esfera do outro direito. E, por último, a proporcionalidade em sentido estrito consiste na razoabilidade da restrição imposta, aferida no confronto direto entre os interesses individuais e públicos, a fim de se estabelecer se é razoável exigir-se o sacrifício do interesse individual em nome do interesse coletivo.

Logo, a fim de fazer valer a diretriz em foco, primeiramente exige-se uma avaliação sobre a real utilidade que determinada medida visa; em segundo plano, deve ser analisada se aquela medida realmente é necessária, ou se outro meio menos gravoso poderia substituí-la; por fim, devem ser sopesados o interesse público e o individual da pessoa humana que terá algum direito cerceado em resposta a sua conduta.

Importa salientar que a proporcionalidade, bem como seus subprincípios, destinam-se também ao legislador, assim como ocorre com o princípio da individualização da reprimenda, sob pena de afronta a preceitos constitucionais. Nesse sentido, BONAVIDES, citando o jurista alemão Grabitz, conclui que: "quanto mais livre o legislador para o fim de sua produção normativa, tanto mais fraca a eficácia do princípio da proporcionalidade15".

Ocorre que não é fácil a tarefa atribuída ao editor das normas penais de qualificar a gravidade de um ou de outro delito, na busca dos patamares mínimo e máximo ideais a cada tipo criminal, uma vez que é quase inexistente a literatura sobre o tema, como destaca FERRAJOLI, o qual, ao expor os pontos de maior dificuldade na predeterminação legislativa, menciona que16:

A primeira dificuldade originada do problema da eleição pelo legislador da entidade da pena em relação à gravidade do delito corresponde à noção de "gravidade" do delito. [...] Ainda mais difícil é o problema das medidas máxima e mínima da pena [...]. Se a pena é quantificável, não é quantificável o delito. E tem fracassado todos os esforços realizados até a presente data para colmatar esta heterogeneidade por meio de técnicas desenvolvidas com o propósito de medir a gravidade dos delitos, tanto as referidas aos graus do dano como, sobretudo, aos da culpabilidade.

14 CARVALHO, L. G. Grandinetti Castanho de. Processo Penal e Constituição: princípios constitucionais

do processo penal. - 5. Ed. - Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2009, p. 37.

15 BONAVIDES. op. cit., p. 423.

16 FERRAJOLI, Luigi. Direito e razão: teoria do garantismo penal. - 3. Ed. - São Paulo: Revista dos

(17)

De fato, não é fácil a missão de imaginar a gravidade abstrata de determinado delito a fim de que sejam mensuradas penalidades mínimas e máximas suficientes a sua repressão, punição e prevenção.

Não obstante, o fracasso das técnicas adotadas para encontrar um patamar de gravidade aos delitos, como bem destacou o autor supracitado, tem-se adotado a chamada "dupla dimensão do princípio da proporcionalidade", diretamente relacionada ao subprincípio da proporcionalidade estrita, a qual se resume na proibição do excesso e na proibição da proteção deficiente.

Não há grande dificuldade em definir a proibição do excesso. Nas palavras de CARVALHO: "se o objetivo do Direito Penal é exercer controle estatal sobre a violência, punindo os infratores e evitando que a justiça seja feita pelas próprias mãos das vítimas, não seria justificável o emprego, justamente, de um desmedido arbítrio17".

Por outro lado, enfatiza o mesmo autor que a proibição da proteção deficiente é tema controverso e pouco discutido no Brasil, verificando-se sua ocorrência quando inexistente medida legal adequada à proteção de um determinado direito fundamental18.

A incidência do princípio da proporcionalidade já na fase legislativa é de extrema importância, pois garantirá ao magistrado sentenciante o poder de fazer valer o mesmo preceito fundamental na fase judicial, dentro dos limites preestabelecidos.

Ora, se uma pena possui o quantum mínimo deveras elevado, ainda que fixada no menor patamar legal, não raras serão as desproporções entre a gravidade da conduta do agente e sua penalidade.

Exemplo disso é o delito de tráfico de drogas, com redação trazida pela Lei n. 11.343/2006. O referido texto normativo, em seu artigo 33, elenca 18 (dezoito) condutas configuradoras do delito em questão, todas puníveis com pena de reclusão, de 05 (cinco) a 15 (quinze) anos, além da multa. É certo que o crime em questão, por si só, é grave, pois dele surgem inúmeros outros delitos, tais como furto, receptação e latrocínio.

Por outro lado, não há qualquer proporção em condenar um indivíduo à pena de 05 (cinco) anos de reclusão, por ter sido flagrado com 10 (dez) papelotes de maconha em situação que caracteriza o estado de mercancia, ao mesmo tempo que se fixa sanção de igual monta ao sujeito que, tendo em depósito, gerencia o preparo, a distribuição e a venda de drogas.

17 CARVALHO. op. cit., p. 37. 18 CARVALHO. op. cit., p. 37.

(18)

Especificamente sobre o delito de tráfico ilícito de entorpecentes e o princípio ora estudado, Salo de Carvalho comenta19:

Ao ser transladada a estrutura sistemática do princípio da proporcionalidade ao problema de investigação, outra não poderá ser a constatação senão a da substancial violação ao postulado da razoabilidade em decorrência da desproporção entre os meios empregados (penalização isonômica de condutas com diferente capacidade de lesão do bem jurídico) e o fim visado (tutela do bem jurídico saúde pública). A título de exemplificação, tensionando ao máximo as contradições do tipo penal do art. 33 da Lei 11.343/06 como forma de diagnosticar a ruptura com o princípio da razoabilidade, alguns interrogantes seriam pertinentes, como, p. ex., se as condutas fornecer ainda que gratuitamente ou entregar a consumo possuem o mesmo grau de lesividade daquelas relativas à exportação, importação ou

venda de entorpecentes? Se não seria excessiva a punição (quantidade e

qualidade da pena) isonômica destas condutas? Se não seria razoável estabelecer tratamento penal, processual e punitivo diferenciado? A inevitável resposta positiva evidencia a necessidade de elaboração de ferramentas doutrinárias e jurisprudenciais corretivas.

Em que pese os questionamentos de suma importância apontados pelo nobre jurista, é válido ressaltar que, em termos de proporcionalidade e individualização da pena e os crimes de tráfico de drogas, o legislador realizou algumas modificações relevantes em 2006, pois inovou ao prever, por exemplo, a causa de diminuição de pena prevista no art. 33, §4o, da Lei n. 11.343/200620 que, muito embora, tenha se restringido a critérios que versam

exclusivamente sobre as condições pessoais dos agentes, permitiu menor punição ao chamado "traficante de primeira viagem", como se verá mais adiante.

1.1.3 Princípio do non bis in idem

O referido preceito pode ser traduzido, genericamente, em repetição (bis) sobre o mesmo (in idem)21. É a partir daí que se pode extrair seu conceito, qual seja a proibição da

19 CARVALHO, Salo de. A política criminal de drogas no Brasil: estudo criminológico e dogmático. - 4. Ed.

- Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2007, p. 199.

20 Lei n. 11.343/06, art. 33: Importar, exportar, remeter, preparar, produzir, fabricar, adquirir, vender, expor à

venda, oferecer, ter em depósito, transportar, trazer consigo, guardar, prescrever, ministrar, entregar a consumo ou fornecer drogas, ainda que gratuitamente, sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar: Pena - reclusão de 5 (cinco) a 15 (quinze) anos e pagamento de 500 (quinhentos) a 1.500 (mil e quinhentos) dias-multa.

§ 4o Nos delitos definidos no caput e no § 1o deste artigo, as penas poderão ser reduzidas de um sexto a dois

terços, vedada a conversão em penas restritivas de direitos, desde que o agente seja primário, de bons antecedentes, não se dedique às atividades criminosas nem integre organização criminosa.

(19)

dupla valoração do mesmo fato jurídico, de modo a criminalizar a mesma conduta ou a agravar a pena22.

Assim, é necessário observar que ocorre bis in idem não só quando, no âmbito do Direito Penal, determinado sujeito responde pelo mesmo fato criminoso, praticado contra a mesma vítima, mas também quando uma circunstância do delito é utilizada pelo magistrado em diferentes etapas do cálculo da pena, tanto como elementar do crime, como circunstância judicial (art. 59, do Código Penal), por exemplo.

Nesse prisma, AGUIAR explica que23:

Uma vez definido certo aspecto como elementar do crime, não pode ele novamente ser ponderado para a fixação da pena em alguma de suas fases seguintes. Prevalece a regra de que o mesmo fator deve ser utilizado apenas uma vez, de modo que mais atue a favor ou contra o réu. Non bis in idem é a expressão comummente usada para repelir essa dupla consideração do mesmo fator nas fases de cálculo da pena [...].

Ainda que não previsto, expressamente, pela Constituição Federal, o princípio do

non bis in idem é fundamental quando se busca a pena ajustada para cada caso específico. Até

porque, o referido preceito está intimamente vinculado com as diretrizes fundamentais da legalidade, da proporcionalidade e, consequentemente, da individualização da pena.

NUCCI, em seu livro dedicado, exclusivamente, a tratar da individualização da sanção criminal, consagra que24:

Por certo, o bis in idem é incorreto, ofendendo a legalidade, que prevê única pena para cada fato delituoso, além de lesar a proporcionalidade, pois a punição se torna extremamente gravosa ao condenado.

A individualização da pena é essencial, atribuindo-se o quantum merecido a cada réu, sem qualquer padronização. Porém, quando o magistrado considera preenchido o tipo penal básico [...], chega à conclusão de haver crime. A partir disso, não pode levar em consideração os mesmos elementos para a aplicação da pena, pois incidiria em bis in idem.

Importante destacar, entretanto, que o mesmo fato pode ser levado em conta para a fase seguinte, quando o juiz for decidir sobre substituição, suspensão e regime inicial da pena, como esclarece AGUIAR JÚNIOR25.

Isso porque, não suficiente o método trifásico - que se estudará a seguir, divide-se a aplicação da pena em diferentes etapas: primária, quando será alcançada a pena em concreto a

22 QUEIROZ, Paulo. Direito Penal: parte geral. 4. Ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2008, p. 49. 23 AGRUIAR JUNIOR. op. cit. p. 36.

24 NUCCI. op. cit. p. 146.

(20)

ser aplicada a cada sentenciado, dentro dos limites estabelecidos pelo legislador; secundária, oportunidade em que será determinado o regime de cumprimento de pena, dentro dos parâmetros da lei; e terciária, momento em que será apreciada a possibilidade de substituição da pena privativa de liberdade por restritivas de direitos ou multa, ou opção pela concessão do

sursis penal26.

Portanto, não poderá uma mesma circunstância ser considerada em fases distintas do método trifásico previsto no art. 68 acima mencionado, sob pena de bis in idem, sendo permitida, por outro lado, a sua utilização 01 (uma) única vez dentro do modelo mencionado e, na sequência, em outras etapas, tais como a fixação de regime inicial de cumprimento de pena, o que será melhor detalhado na sequência.

1.2 Método trifásico de aplicação de pena adotado pela reforma penal de 1984

O Código Penal de 1940, foi classificado por ZAFFARONI e PIERANGELI27

como norma de "tecnicismo jurídico" autoritário, cuja finalidade é neutralizar "indesejáveis", isso levando em consideração o momento político em que fora sancionado.

O referido texto normativo estabeleceu a forma como deveria ser aplicada a pena a partir de seu artigo 42, que assim previa:

Art. 42 . Compete ao juiz, atendendo aos antecedentes e à personalidade do agente, à intensidade do dolo ou gráu da culpa, aos motivos, às circunstâncias e consequências do crime [sic]:

I - determinar a pena aplicavel, dentre as cominadas alternativamente [sic]; II - fixar, dentro dos limites legais, a quantidade da pena aplicavel [sic].

Ocorre que na redação original do Código Penal não foi elaborado um critério sequencial de acordo com o qual o aplicador da pena deveria realizar a dosimetria, o que só veio ocorrer a partir da reforma advinda com a Lei n. 7.209 de 1984 (art. 68 do Código Penal)28.

Diante da ausência de orientação sequencial, os juristas Nelson Hungria e Roberto Lyra elaboraram métodos que ficaram vinculados a seus nomes, como seus preconizadores.

26 NUCCI. op. cit. p. 145/152.

27 ZAFFARONI, Eugenio Raúl; PIERANGELI, José Henrique. Manual de direito penal brasileiro: parte

geral. - 9. Ed. - São Paulo: Revista dos Tribunais, 2011, p. 200.

(21)

NUCCI explicita com os dispositivos redigidos após a reforma de 1984 que29: Para Hungria, o juiz deve estabelecer a pena em três fases distintas: a primeira leva em consideração a fixação da pena-base, tomando por apoio as circunstâncias judiciais do art. 59; em seguida o magistrado deve aplicar as circunstâncias legais (atenuantes e agravantes dos arts. 61 a 66), para então opor as causas de diminuição e aumento (previstas nas Partes Geral e Especial).

LYRA, por sua vez, ensina merecerem as circunstâncias atenuantes e agravantes ser analisadas em conjunto com as circunstâncias do art. 59 para a fixação da pena-base.

Entre os dois métodos abordados, sobressaiu o de Nelson Hungria, de maneira que, atualmente, o Código Penal prevê expressamente que: "a pena-base será fixada atendendo-se ao critério do art. 59 deste Código; em seguida serão consideradas as circunstâncias atenuantes e agravantes; por último, as causas de diminuição e de aumento" (art. 68 do Código Penal, com redação dada pela Lei n. 7.209/1984)30.

Nesse norte, faz-se mister compreender que reforma na Parte Geral do Código Penal trazida pela legislação de 1984, nas palavras de ZAFFARONI31:

[...] constituiu uma verdadeira reforma penal [...], posto que apresenta uma nova linha de política criminal, muito mais de conformidade com os Direitos Humanos. De uma maneira geral, o neo idealismo autoritário desaparece do texto, apresentando apenas uma isolada amostragem de neo hegelianismo, ao cuidar da imputabilidade diminuída.

Faz sentido, portanto, aduzir que o critério trifásico de dosimetria da pena se mostra satisfatório na medida em que conferiu maior valor aos preceitos fundamentais aplicáveis ao cálculo da pena.

Na mesma linha de raciocínio, BOSCHI entende que a reforma: "vai bem ao encontro dos princípios gerais de garantia, mesmo porque o juiz tem o dever de fundamentar suas atividades em todas as fases32".

Não obstante as vantagens que o referido modelo trouxe ao Direito Penal em termos de garantias ao sentenciado, uma vez que obriga o magistrado a esclarecer cada ponto do seu cálculo e, consequentemente, individualizar a pena, esclarece NUCCI que33:

Sem dúvida, há possibilidade de haver bis in idem, caso não proceda com extrema cautela, pois as circunstâncias do delito espalham-se por todas as

29 NUCCI. op. cit., p. 148. 30 Vide nota de rodapé n. 26. 31 ZAFFARONI. op. cit., p. 201. 32 BOSCHI. op. cit., p. 153. 33 NUCCI. op. cit., p. 149.

(22)

fases (pena-base, agravantes e atenuantes, causas de aumento ou diminuição), quando não servem para qualificar ou privilegiar o crime, antecipando-se, pois, ao processo individualizador.

É por essa mesma ótica que BOSHI34 propõe em sua obra Das Penas e Seus

Critérios de Aplicação uma releitura do art. 59 do Código Penal, a fim de que se estabeleça

uma maneira mais coerente e apta ao extermínio da exacerbação da pena pela valoração repetida das mesmas circunstâncias, em ofensa à conhecida regra do non bis in idem, que a aplicação do método trifásico pode vir e ensejar, conforme destacado no tópico anterior.

Cabe salientar que o regime trifásico em estudo diz respeito, apenas, ao cálculo de pena a ser irrogado, ou seja, ao quantum de reprimenda.

Tal observação se faz pertinente, uma vez que encontrado o montante concreto da sanção criminal privativa de liberdade, serão necessárias outras análises, tais como sobre o regime inicial de cumprimento de pena e a possibilidade de substituição da reprimenda por outra substitutiva de direito (art. 44, do Código Penal)35 ou, em último caso, a possibilidade de

concessão de sursis penal (art. 77, do Código Penal)36.

NUCCI, em sua obra Individualização da Pena, menciona que há quem entenda que a análise quanto à substituição de pena privativa de liberdade por restritivas de direitos seria uma quarta fase da dosimetria, com o que não concorda, ao argumentar que37:

[...] o art. 68, caput, do Código Penal trata, unicamente, da fixação do

quantum relativo à pena privativa de liberdade ou da multa (penas previstas,

em abstrato, no preceito secundário dos tipos penais incriminadores), e não dos benefícios legais que poderão advir, tal como a substituição da pena privativa de liberdade por restritivas de direitos, a concessão de sursis ou qualquer outro. Até mesmo a pena restritiva de direitos depende da fixação da pena privativa de liberdade, utilizado, para esta, o critério do art. 68.

Em assim sendo, entende-se que inexiste bis in idem quando determinada circunstância é utilizada no cálculo da pena - método trifásico de Nelson Hungria, ao mesmo

34 BOSCHI. op. cit., p. 14. 35 Vide nota de rodapé n. 28.

36 Código Penal (1940), art. 77 - A execução da pena privativa de liberdade, não superior a 2 (dois) anos, poderá

ser suspensa, por 2 (dois) a 4 (quatro) anos, desde que: I - o condenado não seja reincidente em crime doloso; II - a culpabilidade, os antecedentes, a conduta social e personalidade do agente, bem como os motivos e as circunstâncias autorizem a concessão do benefício; III - Não seja indicada ou cabível a substituição prevista no art. 44 deste Código.

§ 1º - A condenação anterior a pena de multa não impede a concessão do benefício.

§ 2o A execução da pena privativa de liberdade, não superior a quatro anos, poderá ser suspensa, por quatro a

seis anos, desde que o condenado seja maior de setenta anos de idade, ou razões de saúde justifiquem a suspensão.

(23)

tempo em que sua incidência impede a concessão de determinado benefício, como a substituição da reprimenda, por exemplo.

Essa é a interpretação, inclusive, que se extrai a partir da leitura do Código Penal, pois, o dispositivo que dispõe sobre o cálculo da pena (art. 68, do CP)38, nada menciona a

respeito de regime inicial de cumprimento de pena ou de benefícios, tais como a substituição da reprimenda privativa de liberdade por restritivas de direitos, até porque essa previsão se encontra em outro dispositivo do mesmo diploma legal (art. 44, do CP)39.

Neste aspecto, já decidiu o STJ40:

[...] REINCIDÊNCIA. UTILIZAÇÃO PARA AGRAVAR A PENA, FIXAR O REGIME INICIAL DE CUMPRIMENTO E VEDAR A SUBSTITUIÇÃO POR SANÇÕES RESTRITIVAS DE DIREITOS. POSSIBILIDADE. COAÇÃO ILEGAL INEXISTENTE.

A agravante da reincidência pode ser utilizada tanto no cálculo da pena, quanto no estabelecimento do regime de cumprimento e na análise da substituição da sanção reclusiva por restritiva de direitos, uma vez que se tratam de momentos distintos na fixação da reprimenda, estando o citado procedimento autorizado nos artigos 33, 44 e 61 do Código Penal. Precedente.

Diferentemente, a dupla valoração de um mesmo fator em diferentes fases do método trifásico (pena-base, agravantes e atenuantes, causas de aumento ou diminuição), ofende o princípio do non bis in idem, o que obrigará o magistrado a submeter uma nova análise do cálculo da reprimenda41.

38 Código Penal (1940), art. 68 - A pena-base será fixada atendendo-se ao critério do art. 59 deste Código; em

seguida serão consideradas as circunstâncias atenuantes e agravantes; por último, as causas de diminuição e de aumento.

39 Código Penal (1940), art. 44. As penas restritivas de direitos são autônomas e substituem as privativas de

liberdade, quando: I – aplicada pena privativa de liberdade não superior a quatro anos e o crime não for cometido com violência ou grave ameaça à pessoa ou, qualquer que seja a pena aplicada, se o crime for culposo; II – o réu não for reincidente em crime doloso; III – a culpabilidade, os antecedentes, a conduta social e a personalidade do condenado, bem como os motivos e as circunstâncias indicarem que essa substituição seja suficiente.

§ 2o Na condenação igual ou inferior a um ano, a substituição pode ser feita por multa ou por uma pena restritiva

de direitos; se superior a um ano, a pena privativa de liberdade pode ser substituída por uma pena restritiva de direitos e multa ou por duas restritivas de direitos.

§ 3o Se o condenado for reincidente, o juiz poderá aplicar a substituição, desde que, em face de condenação

anterior, a medida seja socialmente recomendável e a reincidência não se tenha operado em virtude da prática do mesmo crime.

§ 4o A pena restritiva de direitos converte-se em privativa de liberdade quando ocorrer o descumprimento

injustificado da restrição imposta. No cálculo da pena privativa de liberdade a executar será deduzido o tempo cumprido da pena restritiva de direitos, respeitado o saldo mínimo de trinta dias de detenção ou reclusão. § 5o Sobrevindo condenação a pena privativa de liberdade, por outro crime, o juiz da execução penal decidirá

sobre a conversão, podendo deixar de aplicá-la se for possível ao condenado cumprir a pena substitutiva anterior.

40 Superior Tribunal de Justiça: HC 334.986/SP, Rel. Ministro Jorge Mussi, Quinta Turma, julgado em

03/03/2016, DJe 16/03/2016.

(24)

Feitas as breves considerações, o presente trabalho pretende estudar cada uma das etapas da dosimetria conforme o art. 68 do atual Código Penal, vindo a analisar as circunstâncias judiciais e a pena-base, as circunstâncias legais e a pena intermediária, e por fim as causas de aumento e diminuição e a pena em concreto.

1.2.1 Pena-base: circunstâncias judiciais

A pena base é o início do cálculo da pena, ou seja, a primeira referência quantitativa de reprimenda encontrada pelo magistrado após analisadas as circunstâncias judiciais.

Como bem salienta BOSCHI, não há conceito do que é a pena-base: "ela é assim denominada por ser a primeira referência quantitativa no método trifásico, que serve de base42".

Antes, porém, de dar início ao cálculo da pena, é necessário que o juiz verifique se o delito é simples ou qualificado, visto que as qualificadoras formam um tipo penal derivado, uma vez que têm o condão de aumentar os limites mínimo-máximo da pena em abstrato, o que esclarece AGUIAR JÚNIOR43.

Feito isso, a fim de encontrar o ponto de partida no que se refere à dosimetria da sanção criminal, deve o magistrado observar as chamadas circunstâncias judiciais, que, nas palavras de Paulo Queiroz: "[...] são dados ou fatos acidentais, objetivos ou subjetivos, que, embora não façam parte da estrutura do crime, são importantes para verificação do grau maior ou menos de culpabilidade do agente44".

As circunstâncias judiciais encontram-se positivadas no art. 59 do Código Penal vigente, que assim dispõe:

Art. 59 - O juiz, atendendo à culpabilidade, aos antecedentes, à conduta

social, à personalidade do agente, aos motivos, às circunstâncias e consequências do crime, bem como ao comportamento da vítima,

estabelecerá, conforme seja necessário e suficiente para reprovação e prevenção do crime: [...] (grifou-se).

42 BOSCHI. op. cit., p. 153.

43 AGUIAR JUNIOR. op. cit., p. 48. 44 QUEIROZ. op. cit., p. 334.

(25)

Nos crimes abrangidos pela Lei de Drogas, o legislador determinou que algumas magistrado, de acordo com o que prevê o art. 42 da Lei n. 11.343/2006:

Art. 42. O juiz, na fixação das penas, considerará, com preponderância sobre o previsto no art. 59 do Código Penal, a natureza e a quantidade da substância ou do produto, a personalidade e a conduta social do agente.

A redação do dispositivo mencionado, no entanto, não agradou aos juristas em geral45, que discordam da possibilidade de preponderância entre as circunstâncias judiciais. O

argumento é que os fatores elencados no art. 42 da Lei de drogas já se encontram no próprio art. 59 do Código Penal, sendo que a natureza e a quantidade da droga podem ser avaliadas dentro dos elementos "circunstâncias" ou "consequências" do crime46.

De qualquer forma, as circunstâncias judiciais, ainda que formem um conjunto a ser considerado pelo julgador, devem ser analisadas isolada e fundamentadamente, principalmente quando forem sopesadas em desfavor do réu, sob pena de nulidade, salienta BITENCOURT47.

Isso porque as circunstâncias judiciais são elementos aptos a impedir a discricionariedade abusiva do sentenciante que somente deve majorar a reprimenda quando constantes no processo provas de que o aumento se faz necessário no caso concreto, em respeito ao princípio da proporcionalidade, alhures analisado.

Nesse sentido, cumpre frisar que a jurisprudência pátria adotou a doutrina da pena mínima, ou seja, o cálculo da reprimenda parte do mínimo, de forma que ausentes quaisquer circunstâncias negativas, impossível a adoção de pena que difere do menor patamar legalmente previsto na primeira fase da dosimetria48.

Por outro lado, não há entendimento pacífico do quantum máximo que a pena-base pode atingir, já que não há um critério matemático a ser seguido, ou seja, não existe cálculo acertado para cada circunstância judicial que pesar negativamente ao acusado, até porque se trata de um juízo discricionário, cabendo ao magistrado analisar com cautela o grau de culpabilidade do agente em cada caso, especificamente.

45 MESQUITA JÚNIOR, Sidio Rosa de. . Comentários à lei antidrogas. São Paulo: Atlas, 2007, p. 117;

GRECO FILHO, Vicente; RASSI, João Daniel. Lei de drogas anotada: Lei n. 11.343/2006 - 3. ed. - São Paulo:Saraiva, 2009, p. 161; BOSCHI, José Antonio Paganella. op. cit., p. 219.

46 NUCCI, Guilherme de Souza. Leis penais e processuais penais comentadas. - 8. ed. - Rio de Janeiro:

Forense, 2014, p. 343.

47 BITENCOURT. op. cit., p. 1.704.

48 Superior Tribunal de Justiça: HC 10.425/RS, Rel. Ministro Felix Fischer, Quinta Turma, julgado em

(26)

Como bem salienta Paganella Boschi49, nem a doutrina, tampouco a jurisprudência

se dedicaram a realizar um estudo a respeito da quantificação da pena-base, restringindo-se ao fato de que nela devem ser consideradas as circunstâncias descritas no art. 59 do Código Penal.

É nesse contexto pouco aprofundado que os juristas discordam quanto a possibilidade de a pena-base alcançar a reprimenda máxima em abstrato, ou seja, aquela cominada pelo legislador.

Para NUCCI50, caso todas as circunstâncias sejam desfavoráveis ao réu, a

culpabilidade será composta em grau máximo, razão pela qual será justificável a pena-base no máximo. Outrossim, para o mencionado autor, a impossibilidade da pena máxima representaria afronta ao princípio da legalidade.

No mesma senda, segue Inácio de Carvalho Neto, o qual afirma51:

Se o legislador previu pena, abstratamente, entre um e quatro anos de reclusão, isto significa que ele quer que a pena seja fixada em um ano nas circunstâncias mais favoráveis ao réu e em quatro anos nas mais desfavoráveis. Negar a possibilidade de aplicação da pena no máximo legal, como se tem feito frequentemente, é negar frontalmente a lei.

Em discordância com o jurista supracitado, opinam, dentre outros, Carlos Roberto Bitencourt52 e José Antônio Paganella Boschi, os quais se utilizam do chamado "termo

médio", que é a média da soma das penas mínimas e máximas. A fim de melhor explicitar a questão, extrai-se dos ensinamentos do último53:

Essa expressão termo médio não aparece explícita em nosso Código, mas o artigo 47, em sua redação original, dispunha que a pena privativa de liberdade para o reincidente específico deveria ocorrer acima da metade do soma do mínimo como máximo, ou seja, no resultado aritmético que a doutrina e a jurisprudência denominam de termo médio.

O termo médio atua como escudo de proteção contra os excessos do jus

puniendi, porque ele também se mostra bem ajustado à funcionalidade do

método trifásico, que reserva momentos específicos para novas quantificações aptas a conduzirem a pena considerada básica a patamar quantitativo bem mais elevado.

Ora, como primeira referência penal no método trifásico, a pena-base não pode converter-se, desde logo, em pena máxima, porque isso implicaria desconsiderarmos a progressividade para quantificações reservada às fases seguintes, sem necessidade de insistirmos, outrossim, que a tese oposta

49 BOSCHI. op. cit., p. 180. 50 NUCCI. op. cit., p. 132.

51 CARVALHO NETO, Inácio de. Aplicação da pena. - 3. Ed. - São Paulo: Método, 2008, p. 98. 52 BITENCOURT. op. cit., p. 1.705

(27)

destoa do comando normativo da proporcionalidade abraçado pelo nosso sistema normativo constitucional e infraconstitucional.

Em suma: na primeira fase do método trifásico, a pena-base é individualizada dentro das margens específicas (o mínimo legal e o termo médio), jamais podendo excedê-las, salvo em descompasso com o sistema trifásico e com dispositivos constitucionais.

Destarte, inexiste consenso na quantificação da pena-base no seu sentido amplo, nem mesmo no que se refere ao peso de cada circunstância judicial negativa. Com base nisso, há diversas hipóteses e formas de cálculo propostas e efetivamente aplicadas pelos juízes a fora.

Nesse aspecto, CARVALHO NETO54 entende que o valor de cada circunstância

deve corresponder à divisão entre a escala da pena (subtração da pena máxima em abstrato pela pena mínima de mesma natureza) e o número de circunstâncias a analisar.

A seu turno, NUCCI55 propõe um esquema baseado em pesos fixados em escalas

de pontuação.

Em meio a essa ausência de padronização é que o Tribunal de Justiça catarinense, a exemplo, adotou a fração de aumento equivalente a 1/6 (um sexto) da pena mínima em abstrato para cada circunstância judicial desfavorável ao réu, com exceção dos casos em que a exacerbada culpabilidade demonstrar a necessidade de maior penalização da conduta56:

PORTE ILEGAL E DISPARO DE ARMA DE FOGO - PLEITO DEFENSIVO ALMEJANDO A REPARAÇÃO DA DOSIMETRIA - ALEGADA NÃO INDIVIDUALIZAÇÃO DA PENA E AUSÊNCIA DE RECONHECIMENTO DA CONFISSÃO ESPONTÂNEA QUANTO AO CRIME DO ART. 15 DA LEI N. 10.826/03 - IMPROCEDÊNCIA - CIRCUNSTÂNCIAIS JUDICIAIS DEVIDAMENTE SOPESADAS QUE AUTORIZAM O INCREMENTO ACIMA DO MÍNIMO LEGAL - ATENUANTE DO ART. 65, INCISO III, ALÍNEA "D", DO CP NÃO CONFIGURADA - RÉU QUE AFIRMOU EM SEU INTERROGATÓRIO QUE NÃO LEMBRAVA DE TER EFETUADO DISPAROS COM REVÓLVER CALIBRE .22 - REPRIMENDA CORRETAMENTE FIXADA. Embora não haja um tabelamento da quantidade de pena que

o Juiz deve aditar para cada uma das circunstâncias reputadas desvantajosas - o que não poderia ser diferente em razão do consagrado princípio da individualização da pena - a praxe adotada por esse Areópago Estadual caminha na trilha de que cada circunstância adversa do art. 59 do Estatuto Repressivo é suficiente para elevar a reprimenda na proporção de 1/6 (um sexto) em relação ao mínimo cominado à infração que se analisa. [...] (grifou-se)

54 CARVALHO NETO. op. cit., p. 106. 55 NUCCI. op. cit., p. 195/198.

56 Tribunal de Justiça de Santa Catarina: Apelação Criminal n. 2006.047525-0, de Blumenau, Rel. Des. José

(28)

Assim, inexistente critério matemático a ser utilizado, deve-se levar sempre em consideração que as circunstâncias judiciais são um limite à discricionariedade do juiz e, como consequência disso, devem ser devidamente fundamentadas, sob pena de nulidade absoluta quando utilizadas para agravar a reprimenda, bem como sua incidência só é possível quando não implicarem em bis in idem, uma vez que é vedada a dupla valoração de uma mesma circunstância na dosimetria da pena de um delito específico sob análise.

1.2.2 Pena intermediária: circunstâncias agravantes e atenuantes

As circunstâncias agravantes e atenuantes, juntamente com as causas de especial aumento e diminuição (que serão estudadas no tópico seguinte) compõem as chamas circunstâncias legais, que são assim conceituadas por Guilherme de Souza Nucci57:

[...] são todas as particularidades envolvendo a prática do delito (fato e autor), devidamente previstas em lei, logo, cuja descrição é feita pelo próprio legislador na elaboração da norma penal. Podem ser genéricas, ou seja, previstas na Parte Geral do Código Penal, para aplicação a todos os crimes: agravantes e atenuantes. Podem denominar-se específicas, quando previstas na Parte Geral ou Especial, mas integrando a tipicidade derivada: causas de aumento ou diminuição (existentes nas Partes Geral e Especial) e qualificadoras e privilégios (constantes somente na Parte Especial).

Nos termos do art. 68 do Código Penal58, ou seja, de acordo com o método

trifásico de aplicação de pena preconizado por Nelson Hungria, na segunda fase da dosimetria deve ocorrer a apreciação, apenas, das circunstâncias agravantes e atenuantes.

Como bem salienta CARVALHO NETO: "essas circunstâncias tem caráter obrigatório, ou seja, uma vez constatada a presença de uma delas, o juiz é obrigado a aumentar ou diminuir a pena, não ficando a seu puro arbítrio aumentar/diminuir ou não59".

Pois bem, as agravantes estão previstas nos arts. 61 e 62 do Código Penal vigentes, que assim estatuem:

Art. 61 - São circunstâncias que sempre agravam a pena, quando não constituem ou qualificam o crime:

I - a reincidência;

II - ter o agente cometido o crime: a) por motivo fútil ou torpe;

57 NUCCI. op. cit., p. 133. 58 Vide nota de rodapé n. 26.

(29)

b) para facilitar ou assegurar a execução, a ocultação, a impunidade ou vantagem de outro crime;

c) à traição, de emboscada, ou mediante dissimulação, ou outro recurso que dificultou ou tornou impossível a defesa do ofendido;

d) com emprego de veneno, fogo, explosivo, tortura ou outro meio insidioso ou cruel, ou de que podia resultar perigo comum;

e) contra ascendente, descendente, irmão ou cônjuge;

f) com abuso de autoridade ou prevalecendo-se de relações domésticas, de coabitação ou de hospitalidade, ou com violência contra a mulher na forma da lei específica;

g) com abuso de poder ou violação de dever inerente a cargo, ofício, ministério ou profissão;

h) contra criança, maior de 60 (sessenta) anos, enfermo ou mulher grávida; i) quando o ofendido estava sob a imediata proteção da autoridade;

j) em ocasião de incêndio, naufrágio, inundação ou qualquer calamidade pública, ou de desgraça particular do ofendido;

l) em estado de embriaguez preordenada.

Art. 62 - A pena será ainda agravada em relação ao agente que:

I - promove, ou organiza a cooperação no crime ou dirige a atividade dos demais agentes;

II - coage ou induz outrem à execução material do crime;

III - instiga ou determina a cometer o crime alguém sujeito à sua autoridade ou não-punível em virtude de condição ou qualidade pessoal;

IV - executa o crime, ou nele participa, mediante paga ou promessa de recompensa

As atenuantes, por sua vez, estão elencadas nos dispositivos 65 e 66 do mesmo diploma legal:

Art. 65 - São circunstâncias que sempre atenuam a pena:

I - ser o agente menor de 21 (vinte e um), na data do fato, ou maior de 70 (setenta) anos, na data da sentença;

II - o desconhecimento da lei; III - ter o agente:

a) cometido o crime por motivo de relevante valor social ou moral;

b) procurado, por sua espontânea vontade e com eficiência, logo após o crime, evitar-lhe ou minorar-lhe as conseqüências, ou ter, antes do julgamento, reparado o dano; [sic]

c) cometido o crime sob coação a que podia resistir, ou em cumprimento de ordem de autoridade superior, ou sob a influência de violenta emoção, provocada por ato injusto da vítima;

d) confessado espontaneamente, perante a autoridade, a autoria do crime; e) cometido o crime sob a influência de multidão em tumulto, se não o provocou.

Art. 66 - A pena poderá ser ainda atenuada em razão de circunstância relevante, anterior ou posterior ao crime, embora não prevista expressamente em lei.

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Logo em uma primeira análise, pode-se dizer que o rol das circunstâncias agravantes é taxativo, enquanto que o das atenuantes é exemplificativo, uma vez que o legislador deixou a cargo do magistrado a possibilidade da mitigação da pena por circunstância não prevista em lei, desde que relevante para o crime em análise (art. 66), embora isso seja de difícil aplicação.

Assim como ocorre na primeira fase da dosimetria, inexiste quantificação correta para cada circunstância agravante ou atenuante, o que deve ser considerado pelo juiz, nos termos de cada crime em si.

Sobre esse aspecto, como exalta ZAFFARONI: "o texto vigente não fixa nenhuma quantia, de modo que a prudência judicial é quem leva a pena-base estabelecida na primeira etapa, a se inclinar para mais ou para menos60".

É por esse motivo, por exemplo, que doutrinadores divergem sobre o tema. Ruy Rosado de Aguiar Júnior61, entende que seria justo um aumento/diminuição de 1/4 (um

quarto) ou 1/5 (um quinto) da pena sobre a qual venham a incidir para cada circunstância agravante/atenuante. Já NUCCI62, propõe a elevação ou mitigação sempre na fração de 1/6

(um sexto) da pena, sob a justificativa de ser esse o menor montante fixado para as causas de aumento ou diminuição de pena.

Independente, o fato é que o magistrado, mais um vez, se encontra face a uma situação delicada, que lhe exige cautela e ponderação, a fim de que sejam devidamente respeitados os princípios constitucionais aplicáveis à quantificação da sanção criminal.

Há, no entanto, algumas regras estabelecidas para a consideração das circunstâncias agravantes e atenuantes.

A primeira delas, é que o criador da norma penal previu, expressamente, determinados fatores que devem se sobrepor. É o que preceitua o art. 67 do Código Penal:

Art. 67 - No concurso de agravantes e atenuantes, a pena deve aproximar-se do limite indicado pelas circunstâncias preponderantes, entendendo-se como tais as que resultam dos motivos determinantes do crime, da personalidade do agente e da reincidência.

No que tange ao tema e seu panorama histórico, ZAFFARONI e PIERANGELI63

esclarecem:

60 ZAFFARONI. op. cit., p. 711. 61 AGRUIAR JUNIOR. op. cit., p. 61. 62 NUCCI. op. cit., p. 198.

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