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FILMMAKER

Manual Prático para Cinema Independente: Do roteiro ao

lançamento

Por Tristan Aronovich

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Copyright 2013-2020 por Tristan Aronovich. Todos os direitos reservados. Dedicatória

À Raquel Cunha e Amanda Maya

pela inspiração, amor e paciência

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CAPÍTULO 1: O CINEMA DIGITAL E INDEPENDENTE

Até bem pouco tempo atrás, trabalhar profissionalmente com cinema em plataforma digital exigia coragem e disposição para enfrentar diversos riscos (especialmente no Brasil, já que, em outros países, particularmente nos EUA, a plataforma digital vinha sendo aceita e propagada em escala industrial desde o fim dos anos 1990). Em 2002, quando eu ainda era um estudante de cinema em Los Angeles no California Institute of The Arts ou, simplesmente, CalArts (uma

universidade encantadora por onde passaram lendas do cinema como Tim Burton, Ed Harris e Don Cheadle), fui convidado a participar como técnico na equipe do longa-metragem “The Chocolate Curse” (“A Maldição do Chocolate”), um filme infanto-juvenil que infelizmente nunca chegou ao Brasil. Esse projeto foi inteiramente gravado com a câmera digital SONY F900, naqueles tempos já conhecida do grande público através de nomes de peso como George Lucas (que a utilizou na segunda geração de sua trilogia de Star Wars). Foi a primeira vez que tive a oportunidade de trabalhar profissionalmente com cinema digital, e foi amor à primeira vista. Fiquei encantado pelas possibilidades que o digital proporcionava e principalmente pelo fato de que, finalmente, após mais de um século de existência, a arte e o ofício do cinema estariam ao alcance das legiões de cineastas independentes que não possuíam as quantidades exorbitantes de dinheiro necessárias para financiar suas produções em película – e o que parecia ainda melhor: a qualidade da plataforma digital era surpreendentemente boa além de facilitar ao extremo toda a logística operacional e workflow de produção! Era a tão sonhada

“democratização” do cinema! Se nos primeiros momentos a plataforma digital enfrentou

resistência de puristas e de profissionais já completamente habituados à uma indústria analógica, na última década o debate “película Vs. digital” já foi por terra. Os incríveis avanços tecnológicos (ou melhor, a “avalanche” tecnológica!) provaram que matematicamente, mecanicamente e cientificamente a captura das imagens em plataforma digital pode igualar e até mesmo superar a película em todos os aspectos, mantendo ainda a drástica redução de custos e otimização logística. Cineastas consagrados em todos os gêneros, desde os classificados como “mainstream” como Steven Spielberg, Peter Jackson, George Lucas, Martin Scorcese e Michael Mann até os mais alternativos ou “indies” como Lars Von Trier (“Dançando no Escuro”, “Dogville”,

“Anticristo”), Michael Haneke (“Caché”, “A Professora de Piano”) Soderbergh (“Che”, “Traffic”) ou Richard Linklater (da famosa trilogia “Before”: Sunset, Sunrise, Midnight), já navegam há bastante tempo nas águas do cinema digital.

Fabricantes multinacionais de peso como Sony, Arri, Red, Canon, BlackMagic e outros disputam acirradamente a soberania pelas melhores câmeras de cinema digital, e já é seguro afirmar que há modelos em fartura para todos os gostos e bolsos. Finalmente, a realização cinematográfica não mais se limita à questão orçamentária e sim, à qualidade da obra e dos

artistas! Se a “arte” for boa, não importa a mídia, suporte ou plataforma escolhido. A arte não pode nem deve estar condicionada e/ou limitada a seu suporte midiático. Felizmente, os avanços

tecnológicos tornaram a discussão de plataformas “película X digital” obsoleta e jogaram a responsabilidade de volta nas mãos do cineasta, o que nos gera, portanto um novo paradoxo pós-midiático: a questão “formação” do cineasta. Com a possibilidade da realização democrática e acessível, o diferencial já não reside mais no leque de possibilidades tecnológicas mas sim no

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5 desenvolvimento, amadurecimento e sensibilidade artística do realizador, direcionando um peso

grande ao processo de aprendizado e educação. Numa reviravolta antropológica surpreendente, justamente em uma era pós-midiática onde é possível localizar gratuitamente “tutoriais” sobre quaisquer equipamentos na internet, volta-se a perceber a importância crucial de livros, professores ou da instituição acadêmica como um todo (afinal de contas, não há “tutoriais” gratuitos que desenvolvam maturidade, sensibilidade e conteúdos artísticos de qualidade!).

Outra questão crucial – e bastante diferente – também chama muito a atenção:

apesar do advento do cinema digital, da extrema redução de custos, do aumento da praticidade e do avanço tecnológico, a indústria brasileira de cinema independente (e é importante frisar que estou me referindo somente à produção de filmes de longa metragem) continua assustadoramente pequena quando comparada a outros países. Para que se tenha ideia, os EUA produzem uma média de 600 filmes por ano (por vezes ultrapassando essa média, como no ano de 1997 quando 767 filmes de longa metragem foram produzidos!). Já a consagrada “Bollywood” explode a marca norte-americana com uma média de 1000 longas anuais (por vezes também extrapolando essa marca). No Brasil, um país de proporções e dimensões continentais e mais de 193 milhões de habitantes, dificilmente a média ultrapassa 95 filmes por ano (com uma quantidade reduzida lançada no mercado)! A vizinha Argentina, com pouco mais de 41 milhões de habitantes

facilmente ultrapassa a marca de 60 filmes nacionais lançados no mercado! Também vale salientar que o conceito de “cinema independente” também possui aplicação contextualizada. Da forma como se utiliza essa nomenclatura nos EUA, cinema independente seria todo aquele realizado sem vínculo direto com as “MAJORS” (companhias com a capacidade de produzir e distribuir seus próprios filmes além de comandar uma porcentagem bastante significativa dos lucros e bilheterias da indústria cinematográfica mundial): Fox, Columbia, Paramount, Universal, Walt Disney, Warner Bros. Se fôssemos seguir a mesma premissa, praticamente todo filme brasileiro seria

“independente”, o que não é verdade, afinal de contas, a quase totalidade dos longas brasileiros só é possível através dos conhecidos mecanismos das leis de incentivo, ou seja, utilizando verba pública após cumprir uma série de exigências estabelecidas pelo estado num processo de triagem, seleção e aprovação. Portanto, um filme que “depende” de verba e aprovação do estado ou ainda, “depende” de satisfazer uma série de critérios estabelecidos pelo estado não poderia, pela lógica, ser chamado de independente, correto? Ironicamente, os mecanismos de incentivo fiscal haviam sido moldados somente como uma alavanca ou “ponta pé” inicial para estimular uma indústria cinematográfica brasileira que encontrava-se praticamente parada entre meados dos anos 80 e início dos anos 90. Para o bem e para o mal, aquilo que deveria ser a exceção acabou virando a regra e hoje, duas décadas após a implementação de tal iniciativa nos modelos como o

conhecemos, o mercado do cinema nacional parece estar intrinsicamente atrelado aos mecanismos de incentivo fiscal – mais do que isso, esse comportamento acabou inclusive migrando para a produção televisiva, que hoje comumente exibe programas nacionais produzidos com verba pública através das leis de incentivo. Para avaliar esse panorama, dois lados precisam ser levados em consideração: se de certo modo os mecanismos de incentivo fiscal podem ajudar os cineastas a captar orçamentos de peso para produções custosas e sofisticadas, por outro lado parecem surgir dois grande problemas: A) um descompromisso grande com o retorno de público e espaço de distribuição e exibição (já que a verba de produção e realização fica garantida independente do veiculação comercial – o que pode representar um grande “tiro no pé” da indústria cinematográfica

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6 brasileira já que de nada adianta acumular dezenas ou centenas de filmes produzidos para meia

dúzia que efetivamente chegam às salas de cinema com uma campanha sólida de divulgação) e, finalmente, B) o surgimento de uma teia burocrática verdadeiramente assustadora. Como o assunto é verba pública, as numerosas etapas para o controle, aprovação ou obtenção de recursos bem como a quantidade de documentos necessários fizeram surgir na indústria nacional um jargão popular: é comum cineastas afirmarem que, no Brasil, cinema é feito através de tabelas de Excel®!

MAS É POSSÍVEL FAZER CINEMA COM POUCO DINHEIRO????

Muitas vezes em centros acadêmicos, universidades, cursos ou festivais, me deparo constantemente com uma questão: o dinheiro. Estudantes e cineastas reclamam quase em uníssono sobre a falta constante de verba para nossas produções. Ok, não resta dúvida de que o cinema é por natureza uma atividade custosa, porém, será que não há meios de reduzir custos, otimizar equipe e sistemática de trabalho, e, ainda que com um orçamento limitado, realizar um produto profissional e bem acabado? Pode apostar!

Pode soar como um clichê, mas nunca é demais afirmar que dinheiro não é tudo! Quantas vezes não vimos produções carérrimas torrarem milhões e milhões de reais ou dólares para no final resultarem em filmes medíocres e mal feitos? Por outro lado, o oposto também é comum: filmes realizados com quase nada de dinheiro arrebatarem público e crítica? Se eu fosse citar exemplos de ambos os casos, dedicaríamos meia dúzia de capítulos somente à isso!

Mas resta ainda outra pergunta: que seja possível fazer um filme com pouco dinheiro não é difícil de concordar. Mas será possível fazer um filme com pouco dinheiro e que mesmo assim resulte num filme com aspecto profissional, com visual e acabamento de grande produção, sem aquela cara de “filme amador” repleto de problemas de cor, som etc...? Sim, é possível. Meu objetivo é dividir com o leitor informações, dicas e truques para otimizar suas produções, de modo que seu filme de R$ 1 mil reais tenha aquela “cara” de produção de 1 milhão! Mas atenção: isso não significa que o processo seja mais fácil simplesmente por ser mais barato! Muito pelo

contrário. Não há milagres, mas sim muito estudo e trabalho duro e demorado. Posso pelo menos garantir que vale a pena! Com bastante atenção e planejamento, uma equipe bem estruturada e organizada pode fazer verdadeiras mágicas! Salvo raríssimas exceções, sempre trabalhei no Brasil e nos EUA em produções de baixíssimo orçamento: desde curtas e longas ate videoclipes,

documentários e vídeos institucionais. A limitação financeira dos projetos, no entanto, nunca pode comprometer a qualidade artística dos mesmos. Nesse momento único e paradoxal do mercado cinematográfico independente é importante abordar todas essas questões em profundidade (ao mesmo tempo preservando a praticidade e a objetividade) para uma formação completa e produtiva do cineasta que trabalha em meio a esse panorama de transformações: desde informações práticas e técnicas até conceitos reflexivos que visam estimular o amadurecimento sensível do artista passando por questões fundamentais de mercado como, por exemplo, captação de recursos, elaboração de projetos e distribuição. É justamente com esse propósito que surge esse livro, para fornecer e discutir ferramentas e dicas para a produção e realização completa de filmes de longa-metragem! Desde o roteiro, planejamento, cronogramas e orçamentos até dicas de organização e otimização no set de gravação, divisão de equipes e funções, seleção de

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7 equipamentos adequados, esclarecimentos tecnológicos, referências para estudo, edição,

finalização e distribuição. Não importa qual o seu orçamento, sempre haverá uma solução disponível que pode se adequar às suas necessidades e limitações preservando (e construindo) o máximo de qualidade (Robert Rodriguez que o diga!). Que a informação aqui apresentada sirva de estímulo e incentivo ao cineasta independente, ajudando-o a resolver problemas e superar obstáculos rumo ao SET de gravação.

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CAPÍTULO 2: COMPREENDENDO AS ETAPAS

BÁSICAS

Inicialmente, devemos entender em linhas gerais algumas etapas básicas e essenciais para a realização de um filme:

1) PRÉ PRODUÇÃO: Essa primeira e importantíssima etapa geralmente é uma das mais ignoradas e atropeladas em produções amadoras, e isso pode acarretar consequências desastrosas. Resumidamente, a pré produção é tudo aquilo que acontece desde a elaboração do roteiro e concepção do projeto até o primeiro “Ação!” que o diretor grita no SET de gravação, ou seja, é o momento de planejar absolutamente tudo. Salvo exceções, os cineastas geralmente adoram o SET de gravação e odeiam burocracia, planejamento cauteloso e papelada, e é por isso que muitos ignoram a importância de uma pré produção meticulosa. O tempo devidamente investido na pré produção é inversamente proporcional aos obstáculos imprevistos e ao tempo gasto na produção, ou seja, quanto mais tempo for empregado num planejamento sólido, mais rápida e suavemente transcorrerá a gravação. Esse é o momento de pesquisa, de ajustes e quebra de roteiro, de desenho de produção e gerenciamento de projeto, elaborações financeiras e business planning, escolha de equipe e equipamentos, arquitetura de cronogramas, criação dos projetos divididos por setores artísticos como a fotografia e a direção de arte, estabelecimento e organização de decupagem e shotlist, ordem do dia e muito mais. Mas isso não significa necessariamente custos adicionais, significa sim investimento de tempo e organização. Uma excelente pré produção pode ser realizada com uma equipe concisa e enxuta e gastos mínimos, além de ser essencial para um projeto com “cara” de grande produção.

2) PRODUÇÃO: Esse é o momento que todos parecem curtir mais! A “hora da verdade”, da gravação, dos consagradas e almejados “Ação!” e “Corta!”. Pois é. Na maioria das vezes, uma experiência que deveria ser maravilhosa acaba se transformando numa verdadeira tragédia, e não raro nos deparamos com SETs de gravação caóticos, desordenados, com diretores perdidos, fotógrafos desorientados, pilhas de

equipamento desnecessários e sem uso, atores abandonados, horas e horas de atraso e dinheiro indo embora! Quem trabalha com vídeo e cinema com certeza já passou muitas vezes por situações assim! O fato é que não pode ser assim e ponto final. Se você busca um visual profissional no seu projeto, sua produção pode ser barata, porém deve ser profissional! Um comportamento e uma postura profissionais geram uma obra profissional. É importante saber planejar e organizar sua gravação,

aproveitando ao máximo o rendimento da equipe e das diárias tendo sempre uma visão clara e sólida de onde se quer chegar. Saber como comunicar-se com os outros profissionais também é importante, pois só assim poderemos obter o máximo de cada um. Durante a etapa da produção (ou gravação), um dos fatores mais cruciais é compreender a fundo quais são as incumbências e responsabilidades de cada

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9 integrante da equipe bem como estabelecer uma dinâmica e fluxo de trabalho

baseados na colaboração e na produtividade.

3) PÓS PRODUÇÃO: Acabou a gravação. Do momento em que o diretor anunciar o último “Corta!” no SET de gravação até que o filme esteja absolutamente pronto, editado finalizado e apto a ser assistido em sua versão ou corte definitivo, estamos oficialmente na pós produção. Essa etapa extremamente complexa envolve a montagem, edição, colorização, tratamento e mixagem de áudio, inserção de trilha sonora, encodagem, exportação e por aí a fora. Muitos filmes nesse momento encontram seu “sepultamento” já que a maioria das equipes amadoras não sabe exatamente como conduzir de maneira coerente e eficaz todo o longo processo da pós produção. Somente a título de ilustração, mesmo numa produção extremamente profissional com equipe experiente e de ponta, essa fase é a mais demorada, podendo levar até 4 ou 5 vezes o tempo gasto na produção (às vezes mais, dependendo do projeto). Uma equipe amadora e desorganizada, então, pode chegar a levar anos (!) na pós produção de um curta metragem! E se engana quem acreditar que isso é raro. Recentemente conheci cineastas que estão “paralisados” na finalização de um curta de cinco minutos há mais de dois anos! É importante saber conduzir de maneira sólida a pós produção de um projeto mantendo sempre em mente onde se quer chegar. Conhecer e dominar todas as atividades é importantíssimo para qualquer cineasta (além de significar grande poder de economia, afinal de contas, caso o cineasta não esteja familiarizado com as técnicas e recursos necessários, inevitavelmente irá depender da contratação – ou da boa vontade – de outros profissionais). Na pós produção acontece a verdadeira “mágica” do cinema e o filme aos poucos vai tomando forma e a história começa a acontecer na frente dos nossos olhos. Domínio técnico, excelentes referências artísticas e muita paciência e organização

desempenham papéis cruciais nessa fase. Será essencial também destrinchar todas as possibilidades estéticas para que o projeto tenha o “look” ou visual cinematográfico desejado.

4) LANÇAMENTO: E agora que o filme está pronto, o que fazer? A vontade de todo cineasta é ter seu filme exibido e visto pelo maior número possível de pessoas, mas como conseguir que o projeto chegue às salas de cinema, às locadoras, aos veículos recentes de exibição e distribuição como VOD, Pay Per View, iTunes, Netflix ou outros meios de exibição? Isso geralmente será elaborado e executado por um produtor de lançamento ou uma equipe especializada que irá planejar em detalhes uma estratégia coesa para localizar e colocar em prática uma “plataforma” adequada de lançamento, mas como estamos falando em cinema independente (e consequentemente em reduzir custos), nada que um cineasta dedicado e uma equipe otimizada não possam fazer. Basta ter tempo e dedicação.

Bom, agora que abordamos em linhas gerais quais são as etapas essenciais para a elaboração e realização de um projeto, nos próximos capítulos vamos mergulhar em cada uma dessas fases para destrinchar as atividades necessárias além de conferir dicas e truques para realizá-las da melhor maneira possível, tirando o máximo proveito de cada centavo investido.

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CAPÍTULO 3: COMEÇANDO PELO COMEÇO –

ROTEIRO, ROTEIRO, ROTEIRO!

Quando o assunto é realização cinematográfica com ênfase na prática e na objetividade, logo surge uma pergunta importante: por onde começar? Bom, que tal começar do começo? Quando pensamos em “produção cinematográfica” logo vem à mente a cadeirinha do diretor, as câmeras, luzes, claquetes e por aí afora. Pois é, mas isso não é o começo. Como vimos no capítulo anterior, muita coisa acontece antes de uma equipe pisar num SET de gravação: todo o trabalho de pesquisa, planejamento, organização, captação de recursos etc... então é aí que começa? Quase. Vamos ainda mais fundo. Todo esse trabalho de organização e planejamento que juntamos sob a bandeira da chamada “pré produção”, pressupõe, antes de mais nada, que tenhamos um projeto em mãos, uma idéia, uma história! Correto? Afinal de contas, toda a pré produção é estruturada a partir de que exatamente? A partir dessa história, ou, mais especificamente, a partir de um roteiro! Sem um roteiro nas mãos, não há muito o que se fazer, já que é a história – o roteiro – que

determina quantos personagens serão necessários, quais serão as locações e equipamentos adequados, quantos dias de gravação serão ideais e tudo mais que precisaremos organizar e viabilizar até o momento de pisar no SET, logo, se não houver um roteiro não há como iniciar de maneira concreta os trabalhos da pré produção, já que não saberíamos ao certo o que seria necessário. Todo filme nasce com uma idéia que acaba se transformando num roteiro que por sua vez serve de alicerce para toda a produção. Eu sei que muitos leitores e novos cineastas podem ficar ansiosos e desejando chegar logo nos truques e dicas de produção, equipamentos etc... mas seria um equívoco hediondo não falar da primeira – e certamente uma das mais importantes – etapas na realização de um longa: a elaboração do roteiro. Ter um bom roteiro nas mãos vale ouro: para que se tenha uma vaga idéia do peso e importância dessa etapa, basta ler as críticas de cinema ou observar a reação do público ao assistir filmes. Ao que exatamente eles reagem? Na maioria esmagadora das vezes, tanto o público como a crítica reagem essencialmente ao roteiro, ou ainda, à história que está sendo contada! Quantas vezes você já foi ao cinema e ouviu, ao término da sessão, alguém do público comentar: “...gostei do filme, mas o tratamento de cor não

estava adequado e a sonoplastia não ficou homogêna...” ? Ou ainda, quantas vezes você leu um

artigo de crítica em jornal ou revista alegando algo como “...os filtros utilizados na edição e as

lentes escolhidas pelo fotógrafo determinaram o tom perfeito da obra...” ? Imagino que nunca,

estou certo? Pois é, o público reage essencialmente à história que está sendo contada e quase nunca à aspectos técnico-artísticos como fotografia, direção de arte ou edição! Quando alguém fala que gostou ou detestou um filme, geralmente estão se referindo ao desenrolar da história

apresentada e à forma como ela foi transmitida e desenvolvida, ou seja, estão se referindo e reagindo principalmente ao roteiro! Uma excelente professora que tive em Los Angeles chamada Nicole Panter costumava dizer que uma equipe de produção, mesmo que inexperiente, com certeza alcançaria algum êxito se tivesse como ponto de partida um roteiro excelente; já o contrário jamais aconteceria, se o roteiro for fraco ou ruim, mesmo uma equipe altamente qualificada estará fadada ao fracasso. Pode ser uma afirmação radical, mas não deixa de ser pertinente (ainda mais proferida por alguém com o gabarito de Panter, que trabalhou por anos nos mais diversos estúdios de Hollywood). Portanto, todo o tempo que se gasta amadurecendo uma idéia e aperfeiçoando um roteiro nunca é demais. Mas então, o que é exatamente um bom roteiro

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11 e como escrevê-lo? Para se ter um bom roteiro é obrigatório que se tenha uma excelente história

na cabeça? Sim e Não, e isso é um equívoco constante entre estudantes e roteiristas iniciantes. Um bom roteiro não é necessariamente uma BOA história, mas sim uma história muito BEM CONTADA. Qualquer história, por mais simples ou desinteressante que possa parecer, pode ser contada de mil e uma formas diferentes, e justamente nisso reside a técnica e a habilidade do roteirista: a arte de “COMO” contar ou desenvolver uma história. Todos sabem que uma piada qualquer pode soar engraçadíssima ou ser um fiasco completo dependendo da forma como for contada, correto? Pois bem, com roteiros a coisa é bem parecida. É necessário dominar as técnicas e ferramentas dramáticas e narrativas para saber como contar uma história e, consequentemente, como redigir um bom roteiro. Mais uma vez, é importantíssimo frisar que o êxito do roteiro não depende unicamente da história nem do gênero. É possível encontrar roteiros maravilhosamente bem escritos no Drama, na Comédia, na Ação, Suspense, Horror etc... até documentários podem (e devem!) fazer excelente uso de roteiros bem estruturados!

Vamos então às vias de fato: como escrever um roteiro? Evidentemente, há uma variedade abundante de livros especializados no assunto (e sem dúvida seria possível dedicar este livro inteiro somente à arte e técnica necessárias para elaboração e desenvolvimento de bons roteiros), vou, portanto, me ater àquilo que considero verdadeiramente essencial para que o cineasta possa de fato começar a “escrever” seus roteiros de maneira coerente e crítica. Esse livro vai cobrir de modo prático e objetivo as técnicas que aprendi e desenvolvi ao longo de anos de estudos bem como os frutos da minha experiência de mais de uma década como roteirista e professor de cinema em diversas instituições:

1) ESTUDE! CONHEÇA SEU OFÍCIO E CRIE REFERÊNCIAS:

Para que um músico/instrumentista tenha uma formação sólida e completa, é necessário que ele ESCUTE muita música, só assim ele terá um vocabulário rico em referências musicais para construir seu próprio “estilo”. O mesmo acontece com grandes pintores, bailarinos e demais artistas: todos possuem uma ampla cultura no que tange seus ofícios. Pois bem, o ofício do roteirista é a escrita, portanto, leia! Não apenas roteiros, mas literatura em geral. Para escrever bem, é importante ler bem! De Machado de Assis até José Saramago, de Dostoievsky até Guimarães Rosa! Se você quer escrever, devore livros! Até mesmo a literatura

especializada na área, ou seja, livros “técnicos” sobre roteiros serão aproveitados de outra forma se você possuir uma farta bagagem literária (inclusive, jamais recomendo aos meus alunos que leiam livros sobre “roteiros” sem antes criar o hábito da leitura “literária”, afinal de contas, muitos dos especialistas em técnicas de roteirização farão referências constantes à obras diversas da literatura. Se você não possui tais referências, não poderá aproveitar tais referências). Querer escrever roteiros sem antes ler é o mesmo que querer tocar um instrumento sem jamais ter escutado música. E para aqueles que já possuem o hábito da leitura e procuram por fontes específicas, existe disponível, conforme mencionei, farta literatura específica no assunto . Para mencionar apenas os clássicos e “hits” adotados em grande parte do mundo e na maioria das escolas, cito os livros de Syd Field que podem ser facilmente encontrados na maioria das livrarias. No Brasil, o mais popular parece ser o

“Manual do Roteiro”, porém existem outros títulos igualmente interessantes do mesmo autor. Além de Syd Field, Robert Mackee e seu livro “Story” também merecem atenção.

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12 Evidentemente, uma etapa essencial seria a leitura dos grandes dramaturgos (William

Shakespeare, Anton Chekhov, Henrik Ibsen, Arthur Miller etc.). É indiscutível que o roteiro cinematográfico derivou da escrita teatral, portanto, familiarize-se com as grandes obras do teatro e procure sempre entender o que o agrada ou desagrada em cada obra. Desenvolver a capacidade de exercer uma leitura crítica e reflexiva é o primeiro passo de qualquer roteirista sério.

2) CONHEÇA AS REGRAS DO JOGO E NORMAS ESPECÍFICAS:

Escrever roteiros é uma arte específica e não tem nada a ver com escrever um livro, por exemplo. Num livro, o escritor/autor reina soberano, já que a finalidade de sua obra é o livro

per se. Ou seja, aquilo que ele escreve já é o resultado e o propósito final daquela forma de

expressão artística. Com roteiros a coisa não funciona assim, já que, ao contrário de um livro, um roteiro é o INÍCIO de uma realização artística e não o fim, ou seja, depois de escrito, revisado e finalizado, um roteiro passará de mãos em mãos por todas as pessoas de uma equipe. Cada profissional lerá a obra de forma diferente, com ênfase nos aspectos inerentes ao seu ofício (os atores, por exemplo, certamente lerão a obra dando atenção especial à forma como as personagens foram desenvolvidas, já um diretor de arte certamente pousará seu foco sobre outros aspectos estéticos inerentes ao futuro filme). Possivelmente o roteiro sofrerá diversas alterações e ajustes até que venha a ser gravado, e finalmente, montado e editado. Numa conversa com o exímio montador brasileiro Daniel Resende (indicado ao Oscar® por seu trabalho em Cidade de Deus), ele sabiamente afirmou que cada longa-metragem envolve na realidade três filmes diferentes: um que está no papel – o roteiro - , que acaba se

transformando em um “segundo” filme quando é gravado, e, finalmente, resultando num terceiro filme durante a montagem e edição. Dessa forma, por mais que a escrita pareça ser um trabalho solitário, um roteiro está envolvido num processo extremamente colaborativo, e para que esse processo se desenrole da melhor forma possível, há uma série de regras que devem ser observadas. Engana-se quem pensa que tais regras podem limitar a criatividade ou liberdade do escritor. Muito pelo contrário: as regras servem para auxiliar o trabalho da equipe como um todo – e isso evidentemente inclui o escritor. O alicerce básico dessas normas técnicas encontra-se apoiado em dois pontos principais: o conceito da “linguagem visual” e a formatação específica e padronizada para roteiros cinematográficos, o que nos leva ao próximos tópico:

3) ENTENDENDO A “LINGUAGEM VISUAL”:

“Linguagem Visual” talvez seja o mais importante conceito no que se refere à redação de roteiros para cinema. Diferentemente de livros ou de qualquer outra forma de escrita em poesia, prosa e por aí a fora (onde tudo é permitido), em roteiros só é aconselhável escrever “AQUILO QUE SE VÊ” (daí a o termo “linguagem visual”). Isso quer dizer que absolutamente tudo que for abstrato, subjetivo ou interpretativo como emoções, sentimentos ou

pensamentos devem ser evitados. Frases como “Amanda sorri repleta de vibrante entusiasmo

por lembrar-se da manhã agradável no parque” podem funcionar maravilhosamente bem em

prosa, mas não são práticas para um roteiro, já que o “vibrante entusiasmo” não é algo concreto, que possa ser objetivamente gravado. Além disso, a audiência não conseguirá “VER”

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13 aquilo que está somente no pensamento ou na memória da personagem, ou seja, a

“lembrança” da manhã agradável no parque. Como a audiência poderá saber o que leva a personagem a sorrir? Se o autor quiser revelar essa informação, terá de fazê-lo através de uma ação concreta e visível, ou de um diálogo, ou ainda, através de uma outra cena na qual

vejamos a personagem no tal parque, caso contrário, tudo que a audiência verá será a

personagem sorrindo. Da mesma forma, jamais insira em seu roteiro ações que não podem ou não devem ser vistas. Tome como exemplo: “Raquel aproxima-se de Mariana e faz um gesto

imperceptível com a cabeça.” Ora, se o gesto é “imperceptível”, como então o operador de

câmera e a audiência poderão perceber tal gesto? Se eles conseguirem, então o gesto NÃO terá sido imperceptível, correto? Ou ainda frases como “Celso caminha lentamente trazendo

um revólver escondido em sua cintura”, novamente, se o revólver está escondido, ninguém o

está vendo (e consequentemente o roteirista não precisa mencioná-lo até o momento em que efetivamente o tal revólver seja visto. Após muitos anos dando aulas à centenas de alunos, percebi que desenvolver a capacidade de escrever em “linguagem visual” é uma das maiores dificuldades no processo de aprender a roteirizar, já que, de uma forma ou de outra, todos nós estamos acostumados a escrever de maneira livre, incluindo todo tipo de abstracionismos ou elementos invisíveis aos olhos. Resumindo, é preciso sempre lembrar que a finalidade do roteiro é criar uma cena que será gravada e projetada numa tela, portanto, o melhor truque para cultivar a técnica de escrita em linguagem visual é sempre “visualizar a cena” numa tela, e aí, colocar no papel exatamente aquilo que você VIU em sua tela imaginária. Foque na “AÇÃO”, ou seja, naquilo que ACONTECE, e deixe que as emoções e abstrações fiquem a cargo dos atores e da platéia que irá absorver tudo aquilo.

4) FORMATAÇÃO DE ROTEIROS:

Vamos agora começar a colocar o roteiro na página! No entanto, antes de simplesmente apontar aleatoriamente dados técnicos que precisam ser seguidos, é importante explicar a razão de existir tal formatação: primeiramente, deve-se lembrar que um roteiro será utilizado por diversos profissionais numa equipe de cinema e que cada um precisará localizar elementos necessários ao seu ofício específico. Um Diretor de Fotografia, por exemplo, precisará

identificar prontamente quantas locações serão utilizadas no projeto, bem como o tipo (dimensões e espaçamentos etc...) dessas locações e a presença ou ausência de luz natural nas cenas. Já um Produtor de Elenco deverá ser capaz de verificar com facilidade quantos atores serão necessários – bem como seus perfis. E assim sucessivamente com cada profissional, ou seja, cada membro da equipe relaciona-se com o roteiro de maneira única. Exatamente daí surge a necessidade de padronizar uma formatação que FACILITE e auxilie e trabalho de todos. Além disso, a formatação adotada pela indústria não apenas facilita o trabalho da equipe como também proporciona uma sincronia matemática impressionante e extremamente conveniente: uma página equivale a aproximadamente um minuto de filme, de tal forma que é possível prever a duração do filme (com pequena margem de erro) com ele ainda no papel! Acredito que esses argumentos já sejam o suficiente para estimular os escritores e aspirantes a roteiristas a adotarem a formatação industrial, correto? Então vamos ao dados:

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14 UNICAMENTE a fonte Courier New tamanho 12. Jamais utiliza-se negrito ou itálico.

* Cabeçalho de Cena: Num roteiro, as cenas são determinadas pelas LOCAÇÕES, ou seja, cada novo lugar significa uma nova cena, e cada nova cena exige um novo cabeçalho. Um cabeçalho contém somente três elementos: informa se é uma locação externa ou interna (ou seja, se é um

ambiente fechado ou ao ar livre), o nome da locação propriamente dito, e, finalmente, se é dia ou noite. Esses elementos aparecem em letras maiúsculas e de forma abreviada conforme o Exemplo 1:

Exemplo 1 (modelo de cabeçalho):

EXT. RUA DE SÃO PAULO. NOITE

ou

INT. ESCRITÓRIO DE ÂNGELA. DIA

* Ação e Diálogo: Agora, cada cena pode apresentar dois elementos – a “Ação” , ou seja, aquilo que ACONTECE na cena, e os “Diálogos”, aquilo que as personagens falam. Toda a “Ação” deve ser redigida em tempo verbal presente simples, sem

gerúndios, pretéritos ou futuros, já que reflete precisamente aquilo que é visto na tela. Já as personagens, quando APRESENTADAS pela primeira vez na “Ação”, aparecem com nomes em letra maiúscula seguidos por indicação de idade. Não usa-se parágrafo e o espaçamento é simples. Os diálogos são centralizados e ocupam SOMENTE o terço central da página (imagine uma página dividida em três colunas idênticas e insira o diálogo na coluna do meio). Observe o Exemplo 2:

Exemplo 2 (modelo de ação e diálogo):

ÂNGELA (30) está sentada à mesa. Ela assina documentos. EDUARDO (65) entra.

EDUARDO

Oi, Ângela. Vamos ao cinema hoje?

ÂNGELA

(15)

15 Preciso fechar os contratos até amanhã.

EDUARDO

Sem problemas. Fica pra próxima então.

Eduardo sai do escritório.

Com isso, cobrimos os três elementos estruturais básicos de um roteiro: Cabeçalho de Cena, Ação e Diálogo, mas cuidado: lembre-se que o papel do roteirista é CONTAR uma história, portanto, evite colocar indicações de câmera ou tentar “dirigir” os atores. Essas são funções do DIRETOR e DIRETOR DE FOTOGRAFIA (veremos todas as funções de uma equipe mais adiante). Eles não vão dizer ao roteirista como escrever sua história, logo, espera-se que o roteirista também não diga à eles como desempenhar suas funções. É comum em roteiros iniciantes flagrar erros como os ilustrados no Exemplo 3:

Exemplo 3 (modelo de ERRO):

A câmera revela um calendário sobre a mesa. O ângulo da câmera se abre e vê-se Ângela, pensativa e angustiada, observando o calendário.

Bom, para corrigir essa cena, em primeiro lugar devemos retirar todas as indicações de câmera (até porque, convenhamos, dizer que a “câmera revela” algo é uma redundância e tanto, não? Estamos falando de um roteiro que deverá ser transformado em filme, logo, TUDO será “revelado” pela câmera!). As indicações de emoção para a personagem também devem ser eliminadas, já que o trabalho de interpretar é responsabilidade dos atores e diretor! Tenha a certeza de que um bom ator saberá a emoção necessária à uma cena (desde que o texto esteja coerente, é claro!). A Ação acima, se corrigida, resultaria no Exemplo 4:

Exemplo 4 (correção do erro):

Há um calendário sobre a mesa. Ângela o observa.

Um tanto mais simples, não?

*Espaçamento: Todo espaçamento em roteiro é simples, pulando-se somente uma linha de cabeçalho para ação, uma linha de ação para diálogo, uma linha de diálogo para diálogo e duas linhas antes de um novo cabeçalho.

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16 *Particularidades de formatação: Finalmente, no que diz respeito à formatação, resta ainda

apontar recursos que aparecem com menos frequência mas que podem eventualmente ser necessários para sua história, por exemplo:

*Sons específicos devem ser escritos como “Ação” e aparecem também em letras maiúsculas.

*Se uma personagem está NARRANDO a história, ou seja, se podemos ouvir a sua voz mas ela não está necessariamente na cena, indicamos entre parênteses e ao lado do nome da personagem a rubrica VO (abreviação para Voice Over). Utilizamos o recurso de Voice Over também em cenas em que desejamos “ouvir” o pensamento de alguma personagem, ou por exemplo, nas famosas cenas em que uma personagem lê uma carta e escutamos a voz de quem a escreveu. Em outras situações, caso a personagem esteja presente na cena e realmente fale mas não seja vista (alguém cuja voz somente ouvimos através do telefone, por exemplo, ou ainda alguém que fale de outro cômodo de uma casa), indicamos entre parênteses e ao lado do nome dessa personagem a rubrica OS (abreviação para Off Screen).

*Finalmente, se por acaso acreditamos que seja importante para o roteiro que a câmera registre em close-up algum detalhe específico, podemos inserir isso escrevendo no canto esquerdo da página (e em letras maiúsculas) a palavra “INSERT”, ao lado da qual apontamos o detalhe que deve ser observado. Agora, se juntarmos todos os exemplos listados acima, teremos uma pequena cena de roteiro na íntegra sintetizando os elementos básicos da formatação padrão industrial:

Exemplo 5:

INT. ESCRITÓRIO DE ÂNGELA. DIA

ÂNGELA (30) está sentada à mesa. Ela assina documentos. EDUARDO (65) entra.

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17 Oi, Ângela. Vamos ao cinema hoje?

ÂNGELA

Acho que não vou conseguir. Preciso fechar os contratos até amanhã.

EDUARDO

Sem problemas. Fica pra próxima então.

Eduardo sai do escritório.

Há um calendário sobre a mesa. Ângela o observa.

INSERT – No calendário, está circulada a data “20 de Junho”.

Som de MADEIRA QUEBRANDO.

ÂNGELA Eduardo, tudo bem aí?

EDUARDO (OS)

Tudo. Foi a cadeira que quebrou.

ÂNGELA (VO)

Esse escritório está caindo aos pedaços!

Finalmente, vale lembrar também que há softwares desenvolvidos exclusivamente para redação de roteiros (como o Celtx ou Final Draft) que podem ser comprados e já realizam automaticamente essa formatação.

5) ESTRUTURA NARRATIVA

Agora que estudamos o básico de formatação, é hora de abordar um pouco daquilo que chamamos “estrutura narrativa”, ou seja, o desenvolvimento uma história. Esse é

provavelmente o tópico mais complexo naquilo que tange roteiros. Como contar uma história de maneira a cativar e prender o público, independente do gênero? Um rápido background histórico e informativo: o primeiro homem a estudar de maneira séria e sistemática essa “arte de contar histórias” foi o grego Aristóteles. Intrigava ao filósofo os aspectos que faziam as histórias “prenderem” as audiências (ainda mais num período em que a tradição oral colocava os contadores de histórias numa posição delicada!), e após bastante observação e análise detalhada ele chegou à constatação de que, REALMENTE, as histórias precisavam apresentar determinados elementos para atingir êxito junto ao público. Até hoje, utilizamos as

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18 conjunto de aspectos em sua aplicação prática como “Estrutura Clássica Aristotélica”. Grande

parte dos roteiros de sucesso (sejam eles filmes de aventura hollywoodianos ou dramas existenciais europeus) apresentam em sua estrutura narrativa bastante dessa Estrutura Clássica Aristotélica (aliás, vale salientar que quase todos os apontamentos e estudos de Syd Field, o “papa” dos roteiros, baseiam-se em Aristóteles), portanto, pretendo salientar ao menos de forma sintética uma base dessa estrutura para que sirva como “porta de entrada” para novos escritores. Aristóteles defendia, a princípio, uma idéia que hoje nos parece simples e lógica: toda história deveria apresentar TRÊS ATOS, três momentos distintos de

desenvolvimento, ou seja: começo, meio e fim! Embora a idéia pareça rudimentar, sua aplicação e desenvolvimento não é tão simples assim. O filósofo destrinchava cada um desses atos e revelava exatamente que tipo de elemento deveria estar presente em cada um deles. Que me perdoem os ortodoxos e acadêmicos, mas, para fins ilustrativos e sobretudo práticos, disponibilizo aqui um sistema simples e fácil de ser entendido e que talvez já possa ajudar os roteiristas:

PRIMEIRO ATO: representa aproximadamente 10 – 20 porcento da história. Nesse ato, deve-se apresentar as principais personagens (protagonista/antagonsita), bem como seus OBJETIVOS (o que essas personagens precisam/devem fazer ou alcançar) e os CONFLITOS e OBSTÁCULOS (o que está ENTRE as personagens e seus objetivos, ou seja, aquilo que impede as personagens de

alcançarem de imediato aquilo que almejam). Dessa maneira, a audiência conhece as personagens, envolve-se com elas e cria expectativas: “será que fulano conseguirá alcançar o que deseja? Conseguirá conquistar sua amada? Conseguirá vingar a morte de seu pai? Conseguirá resgatar o filho desaparecido?” e etc.

SEGUNDO ATO: o mais longo dos atos representa entre 60 – 80 porcento da história. É o momento do DESENVOLVIMENTO dos conflitos. As personagens passam a perseguir seus objetivos, porém, deparam-se com os obstáculos e precisam superá-los. É literalmente o

desenvolvimento/desenrolar da história, com todas suas reviravoltas, estorietas secundárias (que chamamos de “sub plots”), momentos em que os desafios parecem insuperáveis e as personagens cogitam desistir, revelações surpreendentes que possam ajudar a personagem em sua jornada etc... esse desenvolvimento eventualmente conduz a audiência ao clímax do roteiro (lembrando que clímax não significa necessariamente um momento grandioso, mas sim o ápice dramático da história, seja uma revelação importante, uma tragédia, uma grande batalha ou simplesmente uma decepção amorosa, por exemplo).

TERCEIRO ATO: o mais curto dos atos representa cerca de 10 porcento (ou menos) do roteiro. É a conclusão que se forma após o clímax, o desfecho e resolução dos conflitos estipulados pelo escritor, ou ainda, o momento de “recompensar” a audiência. Apresentamos protagonistas, levantamos questões, impusemos obstáculos e desafios e de alguma forma a audiência sente a necessidade de ser recompensada (atenção: isso não significa, de modo algum, que os finais precisem ser “finais” ou conclusivos, significa apenas que o “desfecho”, seja ele qual for, deve ser satisfatório de alguma maneira).

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19

Há outros detalhes no que toca a Estrutura Clássica Aristotélica ou mesmo a “fórmula” de Syd Field, mas essa explicação sucinta e objetiva deve ao menos estimular os roteiristas a planejarem melhor o desenvolvimento de suas histórias e a manterem-se dentro da formatação padrão exigida pela indústria. É importante frisar também que outros teóricos e analistas de roteiros (como Robert Mackee) defendem estruturas diferenciadas com outras possibilidades de divisão de atos, no entanto, a estrutura tradicional e clássica aqui apresentada sem dúvida irá satisfazer – e provavelmente auxiliar – a maioria dos roteiristas.

6) DESENVOLVA SUAS PERSONAGENS

Ao ter ideias interessantes para roteiros e histórias, lembre-se também de dar atenção para personagens bem desenvolvidas e coesas. Antes de começar a escrever sem parar, reflita sobre cada personagem em sua história: os desejos de cada um, traços de personalidade e comportamento, valores éticos, crenças, extração social e econômica, nível cultural etc. Conhecer muito bem uma personagem é uma das ferramentas mais valiosas para um roteirista, afinal, se você não souber direito “sobre quem” você está escrevendo, se não conhecer as motivações ou a realidade de seus protagonistas, a tarefa pode beirar o impossível, correto? Portanto, crie o hábito de refletir profundamente sobre as personagens que você cria. É comum que escritores experientes pensem em suas personagens como se fossem seres vivos. O consagrado dramaturgo norueguês Henrik Ibsen (autor de grandes pérolas do Teatro mundial como Peer Gynt e A Casa de Bonecas) era famoso por “conversar” em voz alta com suas personagens. Pode parecer um hábito estranho, mas quando as personagens estão “vivas” na cabeça e na imaginação dos roteiristas, a escrita flui com facilidade incrível.

7) LIDANDO COM BLOQUEIOS CRIATIVOS

É comum que roteiristas ou estudantes de cinema reclamem dos famosos e temidos “Bloqueios Criativos”, momentos temidos em que o desenvolvimento da história parece ficar paralisado e não sabemos ao certo como prosseguir. A melhor estratégia para evitar os bloqueios criativos é estudar minuciosamente os tópicos acima mencionados. Se o escritor souber em detalhes qual é a estrutura narrativa e dramática de sua história e se conhecer muito bem as personagens, ou seja: souber sobre “quem” está escrevendo, o que essa personagem deseja alcançar e por que ela assim o deseja, se souber quais são os principais desafios que ela deverá enfrentar, quem são seus aliados inesperados e suas motivações, e além disso conhecer profundamente as convenções inerentes ao gênero (comédia, drama, aventura etc.) e possuir farto conhecimento literário repleto de referencias, dificilmente o roteirista irá se deparar com um bloqueio criativo! Se, ainda assim, você em algum momento se encontrar “estagnado” frente à um bloqueio, procure não se forçar. Faça uma pausa, pense calmamente nas suas personagens, coloque-se no lugar delas, assista filmes e leia livros que naveguem pelo mesmo universo de sua história.

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20 Busque inspiração em músicas, pinturas ou dê uma volta por museus locais! Resumindo:

encha sua cabeça de boa arte. Nada como isso para convidar a “Musa” da Inspiração a retornar!

SAINDO DO PAPEL

Pois bem, agora é hora de começar a dar vida ao projeto e iniciar o processo de sair do papel! Como transformar um roteiro num filme de fato? Como vender uma história ou fazê-la chegar nas mãos corretas? Ou ainda, como selecionar uma equipe e encarar a realização do seu próprio projeto? Há resposta para tudo; diversas etapas devem ser atravessadas para assegurar a qualidade do projeto e a inserção do seu filme no mercado, então, vamos por partes:

8) PROTEJA SUA OBRA

Antes de mais nada, antes de anunciar aos quatro ventos o quão genial seu roteiro é ou sair distribuindo cópias para amigos e conhecidos por aí afora, PROTEJA sua obra! Um bom roteiro é algo valioso e pode facilmente ser roubado ou plagiado se não estiver

devidamente protegido! Em pólos cinematográficos como Hollywood, plágio e roubo de idéias é uma verdadeira paranóia entre escritores (e com razão! Lembre-se que onde há fumaça há fogo, e muitas idéias foram roubadas ou plagiadas para depois render fortunas incríveis aos usurpadores! Mesmo no Brasil, onde a indústria é radicalmente menor, é possível constatar tristes casos de plágio. Recentemente, entrevistando um dramaturgo consagrado para um programa de TV que dirigi por muitos anos – e evidentemente mantenho os nomes em sigilo para preservar privacidades – ouvimos que uma de suas peças teatrais foi plagiada e transformada em telenovela sem que ele recebesse um tostão por isso!). Portanto, previna-se! Nos EUA e Europa, não é raro um produtor ser obrigado a assinar um “termo de confidencialidade” antes mesmo de ser autorizado a ler um roteiro! Mas afinal de contas, quais são as formas de “proteger” sua propriedade intelectual, ou melhor, registrar um roteiro? No Brasil, o registro de obras literárias (incluindo roteiros) é realizado junto à Biblioteca Nacional, com sede no Rio de Janeiro. Em São Paulo, há uma representação da Biblioteca Nacional na FUNARTE, localizada na Alameda Nothmann (Barra Funda), onde os registros também podem ser efetuados pessoalmente. Outros estados e cidades devem consultar o site da Biblioteca Nacional (www.bn.br) e localizar na sessão “serviços a profissionais” o “Escritório de Direitos Autorais”, que é o responsável por esse trâmite. Feito isso, o autor preenche alguns formulários e documentos, paga uma taxa e pronto! Recebe a princípio um protocolo e posteriormente uma inscrição oficial que garante seus direitos sobre sua obra! Também é possível registrar seu roteiro

internacionalmente através do Writers Guild of America. Os procedimentos e exigências (conhecimento de um pouco de inglês certamente será bem vindo!) podem ser verificados em www.wga.org . IMPORTANTE: Muitos já devem ter ouvido falar no “truque do Sedex”,

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21 correto? Corria a lenda de que para registrar uma obra bastava enviar a si mesmo por

correio - e via SEDEX – uma cópia da obra que ficaria “eternamente” lacrada para casos de disputas jurídicas...não confie nesse truque! Se existem mecanismos apropriados e oficiais para o registro de obras intelectuais, faça uso deles! (além disso, um escritor prolífico que fizesse uso do truque do sedex precisaria de armários e mais armários para guardar envelopes “lacrados para a eternidade”... meio bizarro, não?)

9) VENDENDO SEU ROTEIRO

Essa é a pergunta que não quer calar e que escuto há anos e anos quando ministro cursos de roteiro no Latin American Film Institute (LAFilm) ou outros lugares e universidades do Brasil e do mundo. É realmente um ponto complexo e não há mágica, mas existem sim alguns caminhos. Antes de mais nada, tenha em mãos também (além do roteiro), uma sinopse bem redigida ou o “argumento” escrito do seu roteiro, afinal de contas, muitas vezes um comprador em potencial não terá tempo de ler um roteiro inteiro de cerca de 100 páginas antes mesmo de saber se aquilo lhe interessa ou não. Dessa forma, se a sinopse agradar, o comprador poderá então dedicar seu tempo à uma leitura atenta. Porém, onde encontramos esses tais compradores? Quem compra roteiros? Uma prática comum em muitos países do mundo (infelizmente ainda não é uma prática comum no Brasil) é a realização de Feiras (“Markets”) para pitching, aquisição/compra e “option” (uma espécie de aluguel temporário) de roteiros. São literalmente feiras de negócios, como convenções, onde empresas ou produtores com interesse em comprar roteiros e filmes se reúnem e avaliam o que há disponível. Geralmente essas feiras são relativamente caras para os participantes e exigem um bom domínio da língua estrangeira – isso sem contar que os roteiros também devem estar redigidos em inglês – mas certamente valem a pena! Muitos roteiristas planejam-se e economizam o ano todo para participar das feiras – para onde levam não apenas um, mas vários de seus roteiros para aumentar a chance de fechar negócios. Tenha certeza que muito dinheiro troca de mãos nessas feiras, e uma boa fonte para informar-se acerca de datas e locais de realização é o já mencionado Writers Guild of America. Há ainda festivais nacionais e internacionais que selecionam e premiam roteiros (o mais famoso sendo Sundance, nos EUA) além de alguns prêmios e editais no Brasil também. Além dessas opções para venda de roteiros, há ainda o “caminho das pedras”, ou seja: entre em contato diretamente com produtoras e/ou diretores de cinema e procure saber se elas estão recebendo sinopses ou argumentos para aquisição de roteiros. Negocie e não seja tímido! Todos querem fazer um bom filme e sabem que isso começa com um bom roteiro. Quanto aos valores de compra e venda, uma boa referência são os Sindicatos dos Trabalhadores na Indústria Cinematográfica (SindCine, consulte o de seu Estado), que estipulam pisos salariais para profissionais e serviços. Porém, lembre-se de algo importantíssimo: UMA VEZ VENDIDO, o roteiro não é mais SEU! Vendeu, vendeu! E o comprador pode fazer as alterações que desejar. Nada mais justo, correto? Se eu

comprar uma camiseta, ela é minha e posso pintá-la da cor que eu quiser. O mesmo vale para roteiros. É prática comum e quase obrigatória um roteiro passar por diversos

tratamentos, ajustes e alterações até que se chegue ao tratamento final. Uma prática cada vez mais comum na indústria é a contratação de “Script Doctors” , analistas e experts em desenvolvimento de roteiros cuja função é precisamente ajustar e modificar o roteiro de

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22 modo a atender as expectativas dos profissionais envolvidos na produção ou ainda

expectativas relacionadas ao público alvo, portanto, se você planeja redigir e vender roteiros, acostume-se desde cedo a praticar o “desapego” com relação à sua obra. Pode até parecer cruel para os iniciantes, mas querendo-se ou não, é a realidade!

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23

CAPÍTULO 4: A EQUIPE DE CINEMA

Vamos começar a analisar as funções e responsabilidades específicas de cada profissional durante a produção e realização de um projeto cinematográfico. EM TEMPO: vale frisar que, diferentemente de lugares como EUA e Índia (onde a indústria cinematográfica é imensa e altamente padronizada), no Brasil – provavelmente em função de uma indústria ainda limitada e relativamente pequena – as

“responsabilidades” e incumbências de cada profissional parecem variar sensivelmente de acordo com cada equipe, empresa produtora e/ou escola. Explico: trabalhei nos EUA por muitos anos em diversos projetos audiovisuais na California, Nova York, Texas etc… lá, independente da cidade ou da equipe responsável pelo projeto, um “Assistente de Direção” era sempre um “Assistente de Direção” e fazia praticamente as mesmas coisas em todos os projetos (com alterações mínimas). Já aqui no Brasil, desde que retornei e ingressei ativa e intensamente no mercado de trabalho, pude verificar que as funções de um Assistente de Direção, por exemplo, podem variar enormemente de acordo com o projeto e/ou equipe. Somente a título de ilustração e para que se perceba a

amplitude desse problema, há, no Brasil, profissionais que defendem a tese de que um Diretor de Fotografia seria responsável somente pela iluminação de um projeto, enquanto outros alegam que o Diretor de Fotografia, além da iluminação, seria autor da decupagem (ângulos, enquadramentos e movimentos de câmera) e, em certos casos, até mesmo responsável por operar a câmera. Portanto, que esse capítulo sirva de referência e base para suas escolhas mantendo-se em mente que existe sim certa flexibilidade.

Para começar, vamos entender um conceito básico: a grosso modo, podemos dividir uma equipe de cinema em duas grandes categorias interdependentes – a equipe logística e a equipe artística. Essas duas equipes trabalham em conjunto e se comunicam constantemente, o que as diferencia é o fato de que enquanto uns pesquisam e desenvolvem conceitos artísticos e estéticos (equipe artística) outros asseguram que tudo seja devidamente realizado (equipe logística). Evidentemente há profissionais híbridos, cujas funções esbarram tanto em conceitos artísticos como em elementos logísticos. Para mencionar apenas as funções básicas, poderíamos listar a princípio:

EQUIPE “ARTÍSTICA” BÁSICA: *Diretor

*Assistentes de Direção (profissional híbrido - artístico/logístico) *Diretor de Fotografia

*Assistentes de Câmera (Primeiro e Segundo) ou Assistentes de Fotografia *Diretor de Arte/Production Designer e Assistentes

*Operadores de Câmera *Técnicos de Som Direto

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24 *Montadores, Editores

*Coloristas

*Técnicos e engenheiros de som para Pós produção

*Continuistas ou Script Supervisors (Profissional Híbrido: artístico/logístico)

EQUIPE “LOGÍSTICA” BÁSICA: *Diretor de Produção

*Assistente de Direção (Profissional Híbrido: artístico/logístico) *Produtor do Set ou “Line Producer”

*Produtor Executivo *Produtor de Elenco *Produtor de Objetos *Produtor de Locação *Produtor de Arte *Assistentes de Produção

*Continuistas ou Script Supervisors (Profissional Híbrido: artístico/logístico) *Cenógrafos, figurinistas, maquiadores, cabelereiros

*Logger

*Maquinista ou Key Grip *Eletricista ou Gaffer

DIRETOR DE PRODUÇÃO ou “PRODUTOR”: Esse

profissional é o grande

responsável por criar as condições adequadas (ou até mesmo “ideais” ) para toda a realização cinematográfica. Uma das funções mais importantes do Produtor é conseguir perceber qual seria a equipe perfeita para a realização de um determinado projeto (levando em considerações não apenas aspectos artísticos e profissionais mas também aspectos mercadológicos). O Produtor contacta todos os profissionais chaves de equipe, participa das negociações, faz a ponte entre as exigências dos estúdios e as realizações no set e é, consequentemente, o grande responsável pelo êxito de um filme, afinal de contas, definir o time perfeito é o primeiro (e talvez mais importante)

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25 passo no planejamento de um filme. Coordena e supervisiona ativamente todas as etapas de um

projeto, desde a pré até a pós produção garantindo que todas as funções sejam desempenhadas de maneira correta e eficaz até a conclusão e finalização do filme. É o responsável por SUPERVISIONAR a quebra de roteiro, implementação de estratégias de captação e financiamento do projeto, organização do cronograma, contratações de profissionais da equipe, aluguel de equipamentos, delegação de funções e negociações com distribuidores. Muitos produtores optam por não visitar o set pessoalmente e supervisionam todas as etapas através de relatórios, nesse caso, é essencial que os produtores possam contar com Assistentes de Direção e Line Producers de confiança que tenham segurança, firmeza e experiência para conduzir os afazeres no set de gravação.

PRODUTOR EXECUTIVO: Diferentemente do Diretor de Produção, o Produtor

Executivo tradicionalmente se envolve pouco com os aspectos “práticos”da realização cinematográfica dedicando-se mais à preocupações burocráticas, financeiras e econômicas necessárias à produção do filme. Geralmente está associado ao processo de captação e gerenciamento de recursos e verba, mas em certos casos pode estar profundamente ligado ao processo de prestação de contas e elaboração do projeto e Business Plan.

PRODUTOR DE ELENCO: Responsável por cuidar de todos os trâmites logísticos que envolvam atores como organização e agendamento de testes, seleção de atores, ensaios, testes de

maquiagem e figurino (junto à maquiadores e figurinistas), transporte, alimentação, estadia e bem estar do elenco durante as gravações. Também chamado de “Diretor de Casting”.

PRODUÇÃO DE OBJETOS: Também conhecido como “prop master”, cuida da

logística de absolutamente todos os objetos de cena. Providencia e divide os objetos de acordo com as cenas e dias em que serão utilizados, disponibiliza os objetos e guarda-os de modo organizado após as gravações.

PRODUTOR DE LOCAÇÃO: Também chamado de “Location Scout”, é responsável por “segurar” as locações necessárias para um projeto. Localiza diversas locações que possa servir ao filme, registra-as em fotos ou videos para conferência do Diretor e Produtor, percebe e verifica questões logísticregistra-as como dimensões da locação (para os fotógrafos e equipe de arte), situação elétrica para uso de equipamentos, facilidade de acesso, presença de banheiro, necessidade de seguros para utilização da locação e assinatura de contratos que garantam o uso das mesmas.

DIRETOR: “Contador de Histórias” por excelência, o Diretor é o “Maestro” conduzindo toda a orquestra que elabora um filme. É o responsável por todos os aspectos criativos e artísticos do filme, elaborando a “linguagem” ou proposta artística do projeto (ou seja, definindo “como” a história sera contada), orientando a performance dos atores e fornecendo as diretrizes específicas para a equipe de cinematografia e arte. O Diretor também supervisiona e aprova – ou não – o

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26 trabalho desenvolvido pelo cinematógrafo (Diretor de Fotografia) e Diretor de Arte. É o “visionário”

responsável pela “coesão”, integridade e assinatura artística do projeto.

ASSISTENTE DE DIREÇÃO: Em essência e resumo, o A.D. é o profissional responsável por fazer a conexão entre a visão artística do diretor e a realização dessa visão por parte da equipe e elenco. Ou seja, o A.D. é a principal “ponte" entre o artístico e o logístico em um SET de gravação. O A.D. é responsável por manter a ORDEM e ORGANIZAÇÃO no SET. Para isso, ele pode contar com a ajuda de Produtores de Linha (Line Producers) ou Produtores de SET, porém, como o A.D. geralmente está muito mais inteirado de todo o processo de realização artística é mais fácil que ele consiga diagnosticar problemas em setores diversos e saber como resolvê-los sem prejudicar a integridade estética do filme e a visão do diretor. Ao manter a ordem e organização em um SET, o A.D.

responde tanto aos produtores quanto ao diretor. O A.D. pode trabalhar ativamente junto ao diretor e diretor de fotografia na elaboração da SHOTLIST (tópico que será abordado mais adiante). O trabalho de atribuir TEMPO e DURAÇÃO para cada take é responsabilidade do A.D., ou seja, o A.D. estima quanto tempo será necessário para cada take/tomada, organiza isso na Shotlist e MONITORA e SUPERVISIONA a evolução da gravação de acordo com o tempo no SET. Caso

alterações de horário e tempo sejam necessárias em decorrência de atrasos, o A.D. deve modificar e ajustar a Shotlist de acordo. Caso seja necessário eliminar takes, o A.D. deverá organizar e determinar quais takes serão eliminados seguindo uma ordem de prioridade que não prejudique a visão do diretor e a integridade do filme. Por conhecer em detalhes todos aspectos artísticos bem como os aspectos logísticos de um filme, o A.D. também é o responsável por elaborar a ORDEM DO DIA (“callsheet”) detalhada e enviá-la para todos os integrantes da equipe. O A.D. é responsável por coordenar, orientar e organizar toda a performance dos figurantes e extras. O A.D. é o

responsável por comandar o PROTOCOLO de gravação antes de cada take. Após o “Corta" , o A.D. é responsável por verificar se o take foi validado e orientar a equipe quanto ao próximo

procedimento. Deve ainda orientar o continuista/Script Supervisor quanto à validações ou observações a serem incluídas nas planilhas e relatório. Caso o Diretor assim o peça, o A.D. pode ser responsável inclusive por chamar o “Ação” e o “Corta” .

Em produções de grande porte, o A.D. pode ter seus assistentes (Segundo A.D., Segundo Segundo A.D., Terceiro A.D.) e dividir as tarefas acima descritas.

PRODUTOR DE SET / LINE PRODUCER: Devido ao grande acúmulo de funções práticas e logísticas do A.D., o produtor transforma-se muito mais em um GERENTE da produção, supervisionando as funções de todos os profissionais, garantindo que todos estejam desempenhando de acordo com o projeto, controlando o orçamento final e lidando com imprevistos. Ele monitora os afazeres de TODOS no set, incluindo a eficácia do A.D. e tem autonomia para abordar e resolver problemas de natureza logística e orçamentária.

LOGGER: Função mais recente surgida com a necessidade de organizar e armazenar os arquivos gerados pelas cameras digitais. O Logger cria tabelas indicando arquivos aprovados ou não (ou seja, sinalizando quais devem ser utilizados no filme e quais devem ser descartados), realiza o back-up

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27 desses arquivos e comumente já coordena a conversão dos arquivos para o format necessário para

a montagem ou edição. O mesmo pode ser feito com os arquivos de audio.

DIRETOR DE ARTE e PRODUCTION DESIGNER: Função

híbrida que

comumente se confunde com o título de “Production Designer”, esse profissional é responsável por criar conceitualmente todos os elementos artísticos/estéticos de um filme como cenários,

figurinos, maquiagens etc. elaborando o “projeto de Direção de

Arte”. Em produções maiores, geralmente essa função é atribuída ao “Production

Designer” e o “Diretor de Arte” ficaria diretamente subordinado ao Production Designer, realizando a ponte com a equipe manual responsável por efetivamente viabilizar o projeto (marceneiros, construtores, figurinistas, maquiadores, cabelereiros, cenógrafos etc.).

PRODUTOR DE ARTE: Diretamente subordinado ao Diretor de Arte ou ao

“Production Designer”, o Produtor de Arte é responsável por viabilizar o projeto de arte, coordenando e viabilizando a construção de cenários, compondo os figurinos, maquiagens etc.

DIRETOR DE FOTOGRAFIA/CINEMATOGRAPHER: Esse

profissional é o

responsável por toda a equipe ligada à camera e à iluminação bem como o responsável pelo trabalho realizado por essa equipe. Sob a supervisão do Diretor e de acordo com suas orientações específicas e necessidades artísticas/estéticas do projeto, o Diretor de Fotografia compõe o enquadramento, define movimentos de camera, seleciona os equipamentos mais adequados para a necessidade do filme, compõe a iluminação e decide os usos adequados de lentes, filtros, diafragma, obturador etc. Em certas produções, é comum que o Diretor de Fotografia também opere a camera. Já em grandes projetos, é frequente que o Diretor de Fotografia não opere mas apenas supervisione, oriente e direcione todo o trabalho referente à camera e luz.

OPERADOR DE CÂMERA: Diretamente subordinado ao Diretor de Fotografia, como o próprio nome (bastante auto-explicativo) da função já denota, esse é o profissional que fica literalmente atrás das cameras, operando e manuseando o equipamento de acordo com as instruções do Diretor de Fotografia.

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PRIMEIRO ASSISTENTE DE CÂMERA: Mão direita do operador de camera, esse profissional ajuda a ajustar os parâmetros corretos da camera (medidas de diagragma, obturador, gammas), auxilia com uso e troca de lentes e filtros, auxilia no ajuste do foco quando necessário e, em filmes rodados de modo analógico, é comum que o primeiro assistente também coloque o filme (película) na camera.

SEGUNDO ASSISTENTE DE CÂMERA: Profissional responsável por organizar os equipamentos ligados à camera e também por confeccionar, em conjunto com o continuista, diários com

informações precisas quanto aos ajustes e parâmetros utilizados nesses equipamentos a cada cena. É também o responsável pela “Claquete”. Outra responsabilidade sutil porém essencial atribuída ao segundo AC é verificar que as lentes e filtros estejam limpos e prontos para uso.

TÉCNICOS DE SOM DIRETO: Equipe de profissionais de tamanho variado responsável pela gravação do audio no set. Organizam, controlam e manuseiam os equipamentos e não raro supervisionam uma gravação de audio já “pré-mixada”. Essa equipe escolhe e seleciona os microfones ideais, gravadores ou mixers, opera o boom e determina o melhor posicionamento dos microfones no momento da gravação.

GAFFER: Esse é o profissional responsável pelos cuidados “elétricos” durante a produção de um filme. Ele verifica a utilização correta e segura dos equipamentos elétricos bem como supervisiona o ajuste da iluminação.

KEY GRIP: Profissional que auxilia o Gaffer e também o Diretor de Fotografia, coordenando o deslocamento, montage e ajustes de equipamentos pesados ou elétricos.

CONTINUISTA ou SCRIPT SUPERVISOR: Profissional responsável por evitar os erros de continuidade em uma cena ou ainda, nas transições de uma cena para outra. Utilizando recursos como tabelas específicas ou cameras fotográficas e de video, o continuista registra as ações desempenhadas pelos atores, o posicionamento e a interação com objetos de cena, o estado específico dos figurinos, cabelo e maquiagem de cada personagem bem como especificidades como comidas, bebidas ou cigarros. Para garantir a continuidade de uma cena para outra, esse profissional confere ainda especial atenção ao início e término de cada take. Deve acompanhar o roteiro durante a gravação para verificar que todas as falas tenham sido ditas e comunicar o diretor ou A.D. em caso omissões ou variações extremas. É também importante acompanhar o roteiro durante a gravação e verificar onde o ator estava e o que estava fazendo durante cada fala (havendo alterações ou variações extremas deve comunicar o diretor ou A.D.). O continuaste deve ainda acompanhar as gravações através do monitor de campo e observar se há problemas, variações ou quebras no EIXO e na LINHA DE VISÃO (Eyeline). Finalmente, deve conferir junto ao 2A.C. os dados para

preenchimento dos Camera Reports e preencher as planilhas de edição com a confirmação, aprovação ou observação conforme orientação do A.D.

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EDITOR/MONTADOR: Esse é o profissional responsável por ordenar todos os “takes” ou arquivos digitais do filme em um software de edição em ordem coerente e de acordo com a estrutura dramatica da história. Esse profissional testa ainda diversas possibilidades de cortes ou transições até chegar à versão definitive ou corte final idealmente em colaboração com o Diretor ou Produtor. É comum que produções maiores contem com diversos assistentes de edição.

COLORISTA: Responsável por corrigir, equilibrar e ajustar as cores de um filme especialmente nas transições de uma cena para outra. Em determinados casos, é possível que o colorista seja responsável por “criar” um visual específico para o filme.

EQUIPE DE ÁUDIO DE PÓS PRODUÇÃO: Profissionais encabeçados pelo Sound Designer ou Sound Editor e responsáveis por toda a edição e tratamento de som de um filme, incluindo a criação de efeitos de sonoplastia (Folley Artist), a gravação, edição e mixagem de diálogos (ADR ou Dialogue Editors), equilíbrio e distribuição adequada entre todas as pistas e canais de som (Sound Mixer).

É importante lembrar que, de acordo com o tamanho e orçamento do projeto, a configuração dessa equipe pode variar bastante. Em filmes independentes com orçamento limitado, é comum que um único profissional acumule diversas funções, Já produções de grande porte certamente contratarão ainda mais profissionais para funções específicas que não se encontram nessa lista. De todo modo, as funções acima descritas são certamente o “esqueleto” essencial da grande maioria dos projetos cinematográficos e consultar essa tabela pode ser uma ferramenta bastante útil para divisão de equipes, padronização e otimização de fluxo de trabalho bem como de escolha e contratação de profissionais. Finalmente, é importante frisar ainda uma vez que as incumbências exatas e responsabilidades específicas atribuídas a cada profissional podem sofrer pequena variação de acordo com a equipe responsável pelo projeto.

Referências

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