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EDUCAÇÃO. Revista Científica do Claretiano Centro Universitário

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Academic year: 2021

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Revista Científica do Claretiano – Centro Universitário

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Pró-reitor Acadêmico: Prof. Me. Luís Cláudio de Almeida

Pró-reitor de Extensão e Ação Comunitária: Prof. Me. Pe. José Paulo Gatti Conselho editorial / Publish Committe

Prof.ª Dra. Aline Sommerhalder (UFSCar) Prof. Dr. Ascísio dos Reis Pereira (UFSM) Prof. Dr. Almir de Carvalho Bueno (UFRN) Prof.ª Dra. Ana Cristina Nassif Soares (UNESP) Prof. Dr. Cae Rodrigues (UFS)

Prof. Dr. Celso Leopoldo Pagnan (UNOPAR) Prof. Dr. Cesar Aparecido Nunes (UNICAMP) Prof.ª Dra. Cinthia Magda Fernandes Ariosi (UNESP) Prof.ª Dra. Claudete Paganucci Rubio (CLARETIANO) Prof.ª Dra. Cristina Satiê de Oliveira Pátaro (UNESPAR) Prof. Dr. Danilo Seithi Kato (UFTM)

Prof.ª Dra. Denise Aparecida Corrêa (UNESP) Prof. Dr. Evandro Luis Gomes (UEM) Prof. Dr. Everton Luis Sanches (CLARETIANO) Prof. Dr. Fábio Ricardo Mizuno Lemos (IFSP) Prof. Dr. Fábio Pestana Ramos (UNIMONTE) Prof. Dr. Fernando Canastra (UCM-Moçambique) Prof. Me. Fernando Luís Pereira Fernandes (UFTM) Prof. Dr. Flávio Henrique Dias Saldanha (UFTM) Prof.ª Dra. Francisca Lúcia Lima (UESPI) Prof. Dr. Francisco Jorge dos Santos (UFAM) Prof. Dr. Genaro Alvarenga Fonseca (UNESP) Prof. Dr. Henry Marcelo Martins da Silva (UFMS) Prof.ª Dra. Ida Mara Freire (UFSC)

Prof. Dr. Jose Barreto dos Santos (UEMS) Prof. Dr. José Claudinei Lombardi (UNICAMP) Prof. Dr. José Luis Sanfelice (UNICAMP) Prof. Dr. José Luís Simões (UFPE)

Prof.ª Dra. Karen Fernanda da Silva Bortoloti (UNICOC) Prof.ª Dra. Luciana Pedrosa Marcassa (UFSC) Prof.ª Ma. Luziene Aparecida Grandi (USP) Prof. Dr. Luiz Gonçalves Junior (UFSCar) Prof. Dr. Marcelo Donizete da Silva (UFOP) Prof. Dr. Marco Antonio Fernandes (UFBA) Prof. Dr. Paulo Cesar Antonini de Souza (UFMS) Prof. Dr. Paulo Eduardo V. de Paula Lopes (CLARETIANO) Prof.ª Dra. Patrícia Junqueira Grandino (USP)

Prof. Dr. Reinaldo Sampaio Pereira (UNESP, UNICAMP e UNEP) Prof.ª Ma. Renata Andrea Fernandes Fantacini (CLARETIANO) Prof. Me. Robson Amaral da Silva (CLARETIANO)

Prof.ª Dra. Rosimeire Maria Orlando (UFSCar) Prof. Dr. Samuel Mendonça (PUC e PUCCAMP) Prof. Dr. Sílvio Sanchez Gamboa (UNICAMP) Prof. Dr. Stefan Vasilev Krastanov (UFMS) Prof.ª Dra. Tatiana Noronha de Souza (UNESP)

Informações Gerais / General Information

Periodicidade: semestral Número de páginas: 114 páginas Número de artigos: 6 artigos neste volume

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Educação Batatais v. 6 n. 4 p. 1-114 jul./dez. 2016

Revista Científica do Claretiano – Centro Universitário

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Equipe editorial / Editorial team

Editores responsáveis: Prof. Dr. Everton Luis Sanches e Prof. Me. Rafael Menari Archanjo

Equipe técnica / Technical staff

Normalização: Dandara Louise Vieira Matavelli

Revisão: Filipi Andrade de Deus Silveira, Rafael Antonio Morotti e Vanessa Vergani Machado Capa e Projeto gráfico: Bruno do Carmo Bulgarelli

Direitos autorais / Copyright

Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução, a transmissão total ou parcial por qualquer forma e/ou qualquer meio (eletrônico ou mecânico, incluindo fotocópia, gravação e distribuição na web), ou o arquivamento em qualquer sistema de banco de dados sem a permissão por escrito do autor e da Ação Educacional Claretiana.

Permuta / Exchange

Os pedidos de permuta devem ser encaminhados à Biblioteca da instituição: periodico@claretiano.edu.br

Bibliotecária / Librarian

Ana Carolina Guimarães – CRB-8/9344

370 E26

Educação : revista científica do Claretiano - Centro Universitário – v.6, n.4 (jul./dez. 2016) -. – Batatais, SP : Claretiano, 2016.

114 p. Semestral. ISSN: 2237-6011

1. Educação - Periódicos. I. Educação : revista científica do Claretiano – Centro Universitário.

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Editorial / Editor’s note

ARTIGO ORIGINAL / ORIGINAL PAPER

Inserção de alunos indígenas no curso de Pedagogia a distância: primeiras experiências pedagógicas

Inclusion of indian students in the e-learning course of Pedagogy: first pedagogical experiences

A relação entre QI e Educação Bilíngue: uma revisão brasileira

The relationship between IQ and Bilingual Education: a brazilian review

Formiga Juju: práticas sociais integradas e interdisciplinares

Ant Juju: integrated social practices and interdisciplinary

O processo ensino-aprendizagem do aluno cego na disciplina de Matemática

The teaching-learning process of the blind student in Mathematics discipline

A narrativa no Ensino Fundamental II: um estudo sobre a importância de se trabalhar a leitura de contos literários em sala de aula

The narrative in the Secondary School: a study about the importance of working the short story in the classroom

A importância do lúdico na educação infantil

The importance of ludic activities in early childhood education

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Editorial / Editor’s note

As discussões desta edição da Revista Educação tratam de

diversos temas que figuram de maneira crucial na experiência do-cente e disdo-cente, vinculando os processos de aprendizado à supe-ração dos múltiplos desafios que perpassam a Educação Básica e a preparação do professor. Duas grandezas mantiveram-se presentes: a acessibilidade e a reorientação de costumes que perpassam a nos-sa cultura escolar.

No que tange à inclusão, chamou-se a atenção para a neces-sidade de repensar a acessibilidade do aluno cego, as ferramentas disponíveis para tal e seu uso; a busca do estabelecimento de estra-tégias para enfrentar os desafios do processo de formação de pro-fessores indígenas na modalidade EaD, pautando o diálogo inter-cultural.

Outro assunto abordado é a superação da trivialidade no que diz respeito ao estímulo às práticas de leitura, procurando tornar significativo ao aluno o contato com o livro e despertar nele o gosto pela estética textual a partir do estudo orientado do conto literário.

Mais uma vez é destacada a importância do lúdico para o processo de desenvolvimento da criança, com uso de brincadeiras educacionais que estimulem a motricidade e a afetividade, entre di-versas áreas do desenvolvimento infantil. Outro assunto recorrente é a interdisciplinaridade, abrangendo neste volume os conceitos de práticas sociais para promover novas reflexões sobre educação, ati-vidades criativas e cooperativas.

Também é tratada a questão da formação bilíngue e seus ddobramentos, matéria relevante, porém pouco considerada em es-tudos nacionais.

As diversas áreas de trabalho do educador, notadamente, cada vez mais ampliam a sua importância e exigem compromisso formal e orgânico, objetivo e subjetivo, além de impor uma dinâmica de aprendizado constante, salientando na prática que o movimento se

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mantém como tônica orientadora da produção e da aquisição do saber.

Boa leitura!

Prof. Dr. Everton Luís Sanches Prof. Me. Rafael Menari Archanjo

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Inserção de alunos indígenas no curso de

Pedagogia a distância: primeiras experiências

pedagógicas

Agenor Pereira da SILVA1 Arlete Guisso Scaramuzza Portilho NICOLETTI2

Karina de Melo CONTE3

Rosana da Silva de SOUZA4

Royson dos Santos ROTH5

Resumo: Este relato apresenta uma experiência pedagógica referente à inserção de alunos indígenas, analfabetos digitais em um curso de Pedagogia a Distância vinculado ao Claretiano – Centro Universitário, Polo Boa Vista, Roraima. Assim, refletiremos sobre o curso de formação de professores indígenas na modalidade EaD e discutiremos os limites e as possibilidades dessa construção após um ano de trabalho. No primeiro momento, apresentamos um breve histórico do atendi-mento à formação de professores indígenas no Estado até a formação da parceria entre a Ação Educacional Claretiana e a Organização dos Professores Indígenas de Roraima. Em seguida, enfocamos as principais dificuldades encontradas nes-se primeiro ano de curso e àguisa de conclusão, nos propomos a criar um grupo de estudos com a participação de três professores indígenas, atuantes na educa-ção e nos movimentos indígenas, para juntos pensarmos e discutirmos o desenho dessa concreção curricular com as novas turmas.

Palavras-chave: TICs. Formação de Professores Indígenas. Currículo.

1Agenor Pereira da Silva. Graduado em Licenciatura Intercultural Indígena pela Universidade Federal de Roraima

(UFRR). Assistente educacional indígena no Claretiano – Centro Universitário. Professor indígena na Rede Estadual de Roraima. E-mail: <profagernor@gmail.com>.

2 Arlete Guisso Scaramuzza Portilho Nicoletti. Mestre em Desenvolvimento Humano e Tecnologias pela

Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho (UNESP), campus de Rio Claro (SP). Atua como coordenadora e tutora presencial do curso de Pedagogia Indígena modalidade a distância no Claretiano – Centro Universitário, polo de Boa Vista (RR). E-mail: <muzzanicoletti@hotmail.com>.

3Karina de Melo Conte. Doutora em Educação pela Universidade de São Paulo (USP), campus de Ribeirão Preto

(SP). Mestre em Psicologia pela mesma instituição. Coordena o Curso de Graduação em Pedagogia – Licenciatura, nas modalidades presencial e a distância no Claretiano – Centro Universitário, além de atuar como docente na mesma instituição. E-mail: <pedagogia@claretiano.edu.br>.

4Rosana da Silva de Souza. Especialista em História Regional pela Universidade Federal de Roraima (UFRR). Licenciada

em História pela mesma instituição. Licenciada em Pedagogia pela Faculdade de Ciências, Educação e Teologia do Norte do Brasil (FACETEN). Atualmente é professora de história da Rede Claretiano de Ensino, possui experiência na área de História, Filosofia e Sociologia com ênfase em História. E-mail: <rosanasouza@claretiano.edu.br>.

5Royson dos Santos Roth. Especialista em Docência no Ensino Superior pela Universidade Estadual de Roraima

(UERR). Especialista em História Cultural pelo Claretiano – Centro Universitário. Tutor presencial, tutor à distância e professor no Claretiano – Centro Universitário, polo de Boa Vista (RR). E-mail: ˂roysonroth@claretiano.edu.br˃.

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Inclusion of indian students in the e-learning

course of Pedagogy: first pedagogical

experiences

Agenor Pereira da SILVA Arlete Guisso Scaramuzza Portilho NICOLETTI Karina de Melo CONTE Rosana da Silva de SOUZA Royson dos Santos ROTH

Abstract: This is an account of a pedagogical experiment regarding the inclusion of digitally illiterate indigenous students in a distance learning education course, linked to Claretiano, a College in Polo Boa Vista, Roraima, Brazil. We seek to reflect on the teachers’ formation course which is aimed at indigenous people through distance learning and now, after one year of course, we propose a discussion on the limits and possibilities of this construction. Firstly, we present a brief history on these indigenous teachers’ attendance to a teachers’ formation course in the state of Roraima until a partnership between Claretiano’s Educational Action and the Indigenous Teachers Organization of Roraima is established. Secondly, we focus on the main difficulties found during this first year of course and, as a conclusion, we propose the creation of a study group with the participation of three indigenous teachers who act on education and indigenous movements in order to discuss and design together a curricular action with new groups.

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1. INTRODUÇÃO

Durante todo o período compreendido entre 1549 e 1970, quando se intensificam as discussões sobre os direitos dos povos indígenas, a educação escolar indígena tem um caráter opressor, já que o objetivo sempre foi fazer com que o índio se familiarizas-se com os costumes e conhecimentos do homem branco para que pudesse servir aos seus interesses (mão de obra barata, mercado consumidor, cessão de terras etc.). Em nenhum momento, nesse intervalo de tempo, se pensou em preservar, resgatar ou afirmar a cultura dos povos indígenas.

A grande mudança na forma de se conceber a educação es-colar indígena se iniciou a partir de 1970, contexto em que os di-reitos humanos e a globalização passam a ser tema de constantes discussões, quando os próprios povos indígenas assumem a posição de protagonistas de suas histórias e passam a reivindicar os seus direitos.

Todo esse cenário de debates e discussões resulta em uma grande vitória para os povos indígenas. Em 1988 é promulgada a Constituição Federal do Brasil, que, pela primeira vez na História, garante aos povos indígenas o direito de os índios continuarem sen-do índios.

Com a garantia de seus direitos estabelecidos na lei máxima do país, algumas outras conquistas legais se tornaram possíveis, dentre elas destacamos aqui o Referencial Curricular Nacional para as Escolas Indígenas – RCNEI; a Lei de Diretrizes e Bases para a Educação Nacional – LDB (Lei nº 9.394/96), que, em seus artigos 32 (inciso 3º), artigo 78 e 79, trata especificamente da educação escolar indígena; o Plano Nacional de educação – PNE, que prevê a universalização da oferta de programas educacionais aos povos indígenas para todas as séries do Ensino Fundamental, a criação da categoria “escola indígena” para assegurar a especificidade do modelo de educação intercultural e bilíngue, a responsabilidade da União e dos Estados em equipar as escolas indígenas com recursos didático-pedagógicos básicos, a profissionalização e o

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reconheci-mento público do magistério indígena como carreira específica do magistério.

Em Roraima, a história da Educação Indígena começa a partir de 1930, quando, por iniciativa do Serviço de Proteção ao Índio – SPI, criam-se as primeiras escolas em áreas indígenas, iniciativa que trouxe poucos resultados. Em 1960, por iniciativa da Igreja Católica, é criada a primeira rede de escolas funcionando nas ma-locas6. Em 1949 a Igreja Católica manteve um internato para

indí-genas na região do Surumu7, internato esse que nos anos 1970 foi

assumido pelo governo do território de Roraima e transformado em um centro para a formação de professores índios e catequistas (MATOS, 2013).

A qualidade da educação oferecida aos indígenas do território de Roraima passou a ser alvo de questionamentos por parte dos tuxauas8 das comunidades, que se reuniram e discutiram sobre o

assunto, chegando à conclusão de que a causa dos problemas da crise da língua e da cultura indígena em Roraima eram as escolas. A partir dessa conclusão, foi realizado, em 1985, o dia D da Educa-ção em Roraima, que ocorreu na fazenda São Marcos, e, em 1986, foi criado o núcleo de Educação Indígena – NEI (que atualmente corresponde à Divisão de Educação Indígena – DIEI), com o obje-tivo de coordenar os trabalhos e atividades educacionais em áreas indígenas (MATOS, 2013).

Somente no ano de 1991 foi criado o Plano Diretor de Educa-ção Indígena de Roraima e em 1992 a OrganizaEduca-ção dos professores Indígenas de Roraima – OPIRR promoveu o I Seminário Nacional de Educação Indígena do Estado de Roraima, evento que repercu-tiu nacionalmente, colocando a educação indígena ainda mais em evidência no Brasil.

No nível superior, a primeira iniciativa no sentido de oferecer aos indígenas uma formação universitária se deu em 1994, quando

6Maloca é um tipo de cabana comunitária utilizada por alguns nativos indígenas da região amazônica, notadamente na Colômbia e Brasil. Cada tribo tem sua própria espécie de maloca, com características únicas que ajudam a distinguir um povo do outro.

7Surumu é uma região do município de Pacaraima, situada no meio das serras, no extremo norte de Roraima, a 200 km da capital Boa Vista.

8Tuxaua é a denominação, na comunidade indígena, para líder. Antigo termo cacique que caiu em desuso.

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a Universidade Federal de Roraima instituiu um número previa-mente definido de vagas em cursos específicos para indígenas. Em 2002 foi criado o (INSTITUTO INSIKIRAN) Núcleo Insikiran de formação superior indígena e no ano seguinte foi criado o curso de Licenciatura Intercultural, com o objetivo de formar e habilitar pro-fessores indígenas em licenciatura plena com enfoque intercultural. Já em 2006 foi criado pela Secretaria de Educação e Cultura de Roraima o projeto Tamîkan, destinado à formação de professo-res que já trabalhavam como docentes nas comunidades indígenas, mas que não tinham formação em magistério. O projeto teve fim em 2010.

2. A PARCERIA

Em fevereiro de 2015, após várias tentativas frustradas de acordo entre Instituições governamentais e particulares, que a Ação Educacional Claretiana, recém-chegada em Boa Vista, assume a responsabilidade, em parceria com a Organização dos Professores Indígenas de Roraima (OPIRR), de oferecer aos povos indígenas uma formação inicial e continuada a distância, na modalidade EaD, com cursos de graduação, pós-graduação latu sensu, tecnólogos e cooperação nas áreas acadêmicas.

A OPIRR coube gerenciar as ações de administração dos pro-jetos a serem realizados nas áreas indígenas (Documento de Acordo de Cooperação Acadêmica entre a Ação Educacional Claretiana e a Organização dos Professores Indígenas de Roraima, datado de fevereiro de 2015).

A ideia inicial era de suprir a necessidade de formação em nível superior dos professores indígenas que atuavam dentro das comunidades indígenas no Estado de Roraima. Havia uma exigên-cia de formação para esses professores no prazo máximo de quatro anos, mas não havia compromisso de governo em oferecê-la. Dessa forma, seguindo as Políticas Afirmativas do MEC, Lei nº 11096, de 13 de janeiro de 2005, que institui o Programa Universidade Para Todos – PROUNI, o Claretiano assume a responsabilidade de

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oferecer duzentas (200) bolsas integrais de estudo no curso de Pe-dagogia para professores indígenas das Comunidades de Roraima.

Neste acordo, o Claretiano também assegura três tutores para acompanhar os ingressantes, orientando-os nos encontros presen-ciais e nas atividades em geral, fornecendo suporte no polo de Boa Vista, no que tange ao uso das Tecnologias de Informação e Comu-nicação, fundamentais no curso de EaD.

3. COMPREENDENDO O DESCONHECIDO

Éramos três tutores para duzentos ingressantes. A aula inau-gural foi preparada com cuidado. Todos foram recebidos na quadra da escola. Os indígenas trouxeram como sinal de agradecimento e cumprimento um grupo de crianças, jovens e adultos que se apre-sentaram caracterizados para a dança do Parixara, em língua wapi-chana, da região da Serra da Lua, Município de Cantá.

Percebemos que a maioria possuía aparelhos celulares ou má-quinas fotográficas e que registravam tudo, fotografando, filmando ou gravando. Nessa aula, apresentamos a sala na qual teriam aulas, o laboratório de informática, a sala de estudos, os demais espaços que utilizariam e em especial a sala de aula virtual, onde realizamos um “passo a passo”.

Estranhamos a falta de questionamentos, dúvidas ou troca de informações. As atividades que deveriam ser postadas ao longo do mês através e na Sala de Aula Virtual (SAV) foram explicadas, o material apresentado e o cronograma dos próximos encontros en-tregue impresso.

Ao final desse primeiro encontro, sentamos para a troca de informações e experiências, estávamos ansiosos e empolgados. Pa-recia que tudo estava dando certo. No primeiro encontro presencial, após a aula inaugural, ao perguntarmos sobre a postagem das ativi-dades, tivemos uma surpresa: os alunos não haviam postado, deram vários motivos, dentre eles, que não sabiam como fazer.

Diante desse impasse, dividimos a turma em três grupos, le-vando cada grupo por uma hora e meia no laboratório de

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informá-tica para entendermos as dificuldades e as possibilidades de posta-gem no dia do encontro às atividades.

Grande parte dos alunos não sabia ligar os computadores, outros sentiam medo de mexer no mouse, outros ficavam olhando para a tela e aguardando o que iria acontecer. Poucos se sentiam à vontade para perguntar, o que, no primeiro momento, nos pareceu um obstáculo de linguagem. Assim, esforçamo-nos para que con-seguissem entender o que tinham que fazer: digitar, copiar, colar, salvar.

Ao final do dia, estávamos exaustos, sentamos novamente para avaliar e, dialogicamente, percebemos que ainda não estáva-mos nos fazendo entender entre eles e não sabíaestáva-mos como ou o que fazer. Nesse momento, tivemos a ideia de chamarmos um dos professores indígenas que estava acompanhando todo o processo, desde a assinatura do acordo, para que nos falasse o que estava acontecendo, quais as impressões dos alunos a nosso respeito e ao sistema de aulas utilizado pela modalidade EaD.

Essa atitude nos fez e faz repensarmos nossa prática a cada encontro. Hoje essa parceria está firmada e podemos contar com ele semanalmente. Foi a partir desse encontro que começamos a pen-sar em uma nova configuração curricular para esse público, como sugere o Referencial Curricular Nacional para as Escolas Indígenas – RCNEI e a Lei de Diretrizes e Bases para a Educação Nacional – LDB (Lei nº 9.394/96).

4. DIFICULDADES

A cada encontro os alunos se mostravam mais próximos, mais participativos e mais integrados com o sistema de ensino apre-sentado. Dessa forma, com o apoio incondicional da Coordenação Pedagógica do Claretiano e do Senhor Agenor (professor indíge-na graduado pela Universidade Federal de Roraima e membro da OPIRR), várias mudanças ocorreram em função das dificuldades relatadas pelos alunos em relação à linguagem, ao formato das ati-vidades, às correções, aos prazos de entrega de atividades e estra-tégias utilizadas nos encontros nesse primeiro ano. Mantivemo-nos

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sempre conversando, tentando entender as necessidades e apren-dendo com esse novo grupo de alunos tão especial. Vejamos:

• Nas comunidades a energia é ativada e desativada através de geradores que têm horário para serem ligados e desli-gados diariamente.

• Há, como combinado no acordo, computadores nas comu-nidades, mas isso não significa que estejam aptos para o uso ou que estejam disponíveis sempre quando o aluno precisa.

• O analfabetismo digital foi o grande impasse no curso, pois a formação oferecida é na Modalidade de Educação a Distância.

• A linguagem se mostrou outro ponto de difícil acesso para os tutores e alunos.

• Os tutores que corrigiam as atividades as corrigiam sem conhecer o contexto desses alunos e as dificuldades de in-serção da escrita, para eles, na língua portuguesa.

• O tempo para a realização das atividades e para as refle-xões sobre os conteúdos é diferente dos alunos não indí-genas e teve que ser reconsiderado nesse novo contexto de alunos.

• Os alunos nos questionavam a respeito da necessidade de conhecermos seu local de vida para que pudéssemos en-tender sobre as dificuldades que nos relatavam.

A partir desses dados, começamos a nos organizar para irmos às comunidades indígenas e a compreendermos a cultura desses povos do Estado de Roraima. Além disso, era necessário estudar muito para construirmos uma proposta curricular diferenciada, vol-tada, especificamente, ao curso de Pedagogia Indígena, oferecido na Modalidade a Distância

Perante a experiência de um ano de curso com os alunos, conhecendo algumas comunidades, participando das discussões sobre educação em assembleias indígenas, interagindo com eles e refletindo constantemente com a Coordenação Pedagógica, nossa

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demanda consiste em fazer um estudo criterioso a respeito das pos-sibilidades e necessidades de uma proposta curricular multicultural que possa atender esse público sem um reducionismo identitário e, segundo Silva (2008), tratar dessa diversidade problematizando-a com a prerrogativa da escolha.

5. CONSIDERAÇÕES FINAIS

Considerando que os processos identitários não são estan-ques, que os espaços, tempo e condições de acesso às TICs são dife-renciados, faz-se necessário pensar um currículo que dialogue com padrões culturais plurais, sem que haja, segundo Carmen (2010), o risco de guetização cultural, é um imenso desafio.

Atender às especificidades culturais, valorizar os saberes tra-dicionais e legitimar o projeto social desses grupos é fundamental para que façamos de fato uma Educação Superior diferenciada, que possa transcender o etnocentrismo, os preconceitos e as ideologias de poder, além de empoderar as comunidades indígenas para que, vigilantes e articuladas, possam cuidar de seus costumes, hábitos de vida, valores, crenças e de sua casa.

Acreditamos que essa mudança na proposta curricular só pos-sa ser realizada com a participação de professores indígenas que atuem na Educação Básica e façam parte de nosso grupo de acadê-micos no curso de Pedagogia, sabedores de sua realidade, dificul-dades e necessidificul-dades. De acordo com Freire (1988), no momento em que conseguem (oprimidos), através da reflexão e ação comum, de fato, conhecer essa realidade, perceberão que são restauradores dela dentro de um processo permanente de engajamento.

Dessa forma, precisa-se de um currículo que possa habilitar os discentes à realização de um trabalho que possibilite a compre-ensão do mundo através do conhecimento de seu povo, de sua cul-tura e das relações com o outro.

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REFERÊNCIAS

AÇÃO EDUCACIONAL CLARETIANA. Documento de Acordo de

Cooperação Acadêmica entre a Ação Educacional Claretiana e a Organização dos Professores Indígenas de Roraima. [s.l., s.n.] fev. 2015.

BRASIL. Diretrizes para a Política Nacional de Educação Indígena. Brasília: MEC, 1993.

______. Referencial Curricular Nacional para as Escolas Indígenas. Brasília: MEC/SEF/DPEF, 1998.

CANEN, A. Sentidos e dilemas do multiculturalismo: desafios curriculares para o novo milênio. In: LOPES, A. C.; MACEDO, E. (Orgs.). Currículo: debates contemporâneos. São Paulo: Cortez, 2010. p. 13- 54.

FREIRE, P. Pedagogia do oprimido. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1988.

MATOS, M. B. As culturas indígenas e a gestão das escolas da Comunidade

Guariba, RR: uma etnografia. 2013. 265f. Tese (Doutorado em Educação) –

Programa de Pós-Graduação em Educação, Universidade do Vale do Rio dos Sinos, São Leopoldo (RS). Disponível em: <file:///C:/Users/103310/Downloads/ Maristela%20Bortolon%20de%20Matos.pdf>. Acesso em: 26 out. 2016. SILVA, T. T. (Org.). Identidade e diferença: a perspectiva dos estudos culturais. Petrópolis: Vozes, 2008.

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A relação entre QI e Educação Bilíngue: uma

revisão brasileira

José Roberto PACHECO FILHO1 Renata PUCCI2

Resumo: No Brasil, há uma crescente procura por instituições de ensino que oferecem uma formação bilíngue, principalmente voltada para o ensino da lín-gua inglesa, que é considerada uma línlín-gua internacional. Estudos diversos, na sua grande maioria internacionais, revelam que indivíduos bilíngues tendem a apresentar maiores habilidades em certas funções, como linguagem, memória, funções executivas, criatividade e resolução de problemas, porém, pouco se en-contra a respeito da relação entre bilinguismo e QI. O presente trabalho é um levantamento feito por meio dos bancos de dados Scielo e Google Acadêmico utilizando os termos: “inglês”, “Brasil”, “bilíngue” e “QI”. Os resultados indica-ram uma quantidade extremamente parca de publicações. Não foindica-ram encontra-das publicações no banco de dados Scielo. Por meio do Google Acadêmico, en-controu-se somente 1 artigo científico que discutia as questões que relacionavam os termos escolhidos. Conclui-se que a produção científica, no Brasil, é extrema-mente escassa nesta área e deve ser ampliada, uma vez que o bilinguismo é uma tendência e a quantidade de instituições de ensino bilíngue cresce em nosso país. Palavras-chave: Bilinguismo. Educação. QI. Inglês. Brasil.

1José Roberto Pacheco Filho. Mestre em Psicologia pela Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho (UNESP), campus de Assis. Docente da Faculdade da Fundação Educacional Araçatuba (FacFEA).

E-mail: <swedtmolinari@bol.com.br>.

2 Renata Pucci. Mestre em Educação pela Universidade Metodista de Piracicaba (UNIMEP). Docente do Claretiano – Centro Universitário. E-mail: <renatasilva@claretiano.edu.br>.

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The relationship between IQ and Bilingual

Education: a brazilian review

José Roberto PACHECO FILHO Renata PUCCI

Abstract: In Brazil, there is a growing demand for schools to offer bilingual training, mainly in English, which is considered an international language. Several studies, mostly international, show that bilingual individuals tend to have higher skills in certain functions, such as language, memory, executive functions, creativity and problems solving. However, these studies do not often demonstrate a correlation between bilingualism and IQ. This study is a survey based on “Scielo” and “Google Acadêmico” databases, searching the Portuguese terms: “Inglês”, “Brasil”, “Bilingue” and “QI”. The findings indicate an extremely meager amount of publications. There were no publications in the Scielo database. Google Acadêmico generated only one scientific article that discussed the issues related to the chosen terms. The study concludes that Brazilian scientific studies in this area are extremely scarce and must be expanded due to the growing trend of bilingualism and increasing number of bilingual schools in Brazil.

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1. INTRODUÇÃO

Alavancada pela globalização, há uma crescente procura por instituições de ensino que ofereçam uma formação bilíngue no Bra-sil, principalmente voltada para o ensino da língua inglesa.

Vale salientar que, atualmente, há uma demanda extrema-mente grande e crescente de alunos buscando o aprendizado de uma segunda língua, principalmente o inglês – uma vez que tal lín-gua se espalha rápida e mundialmente como línlín-gua internacional (MENDONÇA; FLEITH, 2005).

Além disso, cresce a quantidade de instituições de ensino bi-língue, mas não há estudos suficientes que possam oferecer respal-do a respeito, tanto aos professores quanto às próprias instituições, a fim de contribuir adequadamente em suas metodologias e currí-culos (PIANTÁ, 2011).

Devido à sua complexidade, a linguagem, bem como sua constituição e aquisição, vêm sendo um desafio para os pesquisa-dores que, há mais de cinquenta anos, vêm pesquisando a respeito (MACWHINNEY, 1997 apud MENDONÇA; FLEITH, 2005).

Considerando que muitos autores internacionais confirmam que o bilinguismo leva a um desenvolvimento de certas habilidades cognitivas (BIALYSTOK, 2006 apud BRENTANO, 2011), houve o interesse em se conhecer a produção de artigos científicos, no Bra-sil, a respeito do tema, bem como as especificidades encontradas em nossa cultura.

Diante do exposto, o objetivo do presente trabalho foi revisar a literatura brasileira que estuda a relação entre o bilinguismo e o quociente de inteligência (QI) através de um levantamento feito, no dia 29 de abril de 2016, por meio dos bancos de dados Scielo e Google Acadêmico, utilizando os termos: “inglês”, “Brasil”, “bilín-gue” e “QI”. A busca foi limitada para artigos publicados em inglês e português. Como critérios de exclusão, optou-se por não conside-rar qualquer outro tipo de produção que não fosse artigo científico.

A seguir, neste texto, serão desenvolvidas algumas considera-ções acerca do bilinguismo, a apresentação de estudos

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internacio-nais que relacionam bilinguismo e QI e, em seguida, o resultado do levantamento bibliográfico proposto que revela a produção cientí-fica extremamente escassa nesta área no Brasil.

2. CONSIDERAÇÕES ACERCA DO BILINGUISMO

No Brasil, a escolarização bilíngue vem crescendo conside-ravelmente, tendo um aumento de 24% de 2007 para 2009, porém, ainda é parco o número de estudos que investiga os efeitos cogniti-vos de uma experiência bilíngue (BRENTANO, 2011). A pessoa bi-língue, nesse caso, será entendida como quem sabe e domina duas línguas, isto é, tem consciência dos diferentes idiomas, mesmo que só os utilizem quando necessário (PIANTÁ, 2011).

Porém, o conceito de bilinguismo é complexo, recebendo di-versas definições (MEGALE, 2005). Para Bloanfield (1935 apud MEGALE, 2005), por exemplo, bilinguismo é entendido como o controle ou capacidade de se falar duas línguas. Já Macmara (1967 apud MEGALE, 2005) afirma que o indivíduo que tem a capaci-dade mínima de lidar com uma das quatro habilicapaci-dades linguísticas (falar, ouvir, ler, escrever) pode ser considerado bilíngue.

Diebold Jr. (1968) se estende no assunto e define pessoa bi-língue como sendo aquela que adquire duas línguas em uma co-munidade falante, onde foram oferecidas à criança possibilidades iguais de apropriação de ambas as línguas, bem como exposição simultânea das crianças a elas. Segundo o autor, a situação bilíngue mais típica é quando uma das línguas é sociologicamente dominan-te. Diebold Jr. (1968) cita, também, casos de psicopatologia bilín-gue, que ocorre quando há uma crise social e de identidade pessoal do indivíduo bilíngue, proporcionada pelo antagonismo aculturati-vo promovido à comunidade bicultural por parte da sociedade mo-nolíngue dominante.

De acordo com Cummins (1979 apud MENDONÇA; FLEITH, 2005), há uma distinção entre os bilíngues, classificados entre bilinguismo aditivo e subtrativo. No bilinguismo aditivo, a segunda língua é adquirida após a primeira encontrar-se já bem

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desenvolvida no indivíduo. Já no bilinguismo subtrativo, elementos da segunda língua substituem elementos da outra.

Atualmente, aproximadamente dois terços das crianças no mundo crescem em ambientes bilíngues (CRYSTAL, 1997 apud PIANTÁ, 2011), confirmando que o bilinguismo está presente no atual mundo globalizado (EDWARDS, 2006 apud PIANTÁ, 2011). Diversos estudos apontam a facilidade que as crianças bilín-gues têm com a metalinguagem, isto é, possuem uma consciência metalinguística mais aprimorada, que pode ser entendida como a capacidade de refletir sobre a própria língua, bem como manipulá--la, ou seja, ter consciência de seu funcionamento (PIANTÁ, 2011). Assim, crianças bilíngues, por fazerem uso de duas línguas, apre-sentam melhor desempenho em atividades que requerem análise linguística (BIALYSTOK, 2001).

King e Mackey (2007 apud BRENTANO, 2011) afirmam que o bilinguismo traz benefícios ao desenvolvimento social e cogniti-vo dos indivíduos. Grande parte dos estudos convergem no que diz respeito à influência do bilinguismo em relação às funções execu-tivas (BIALYSTOK, 2010 apud BRENTANO, 2011), que por sua vez têm influência no processo de inibição, memória operacional e flexibilidade cognitiva (DIAMOND, 2006 apud BRENTANO, 2011).

Dessa forma, as pesquisas internacionais sugerem que crianças bilíngues desenvolvem a atenção de forma diferenciada e mais aprimorada que as crianças não bilíngues, uma vez que as bilíngues lidam com dois sistemas de linguagem (BIALYSTOK; SHAPERO, 2005), além de apresentarem propensão para a criatividade e mais facilidade na resolução de problemas (BIALYSTOK et al., 2004). Grande parte das pesquisas internacionais evidenciam que os processos cognitivos das crianças bilíngues são mais acelerados (ZIMMER; FINGER; SCHERER, 2008). Segundo Lasagabaster (2000), o bilinguismo estimula o desenvolvimento da criatividade. Já Lindholm (1995 apud MENDONÇA; FLEITH, 2005) afirma que o bilinguismo leva a uma maior flexibilidade mental.

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3. A RELAÇÃO ENTRE BILINGUISMO E QI NA PES-QUISA INTERNACIONAL

Há pesquisas internacionais que afirmam melhor nível de de-senvolvimento em bilíngues (MENDONÇA; FLEITH, 2005). Diaz (1983 apud MENDONÇA; FLEITH, 2005), por exemplo, confirma a melhor performance dos bilíngues em testes de inteligência.

By Peal e Lambert (1962) estudaram crianças de dez anos em Montreal, onde foram testadas as inteligências verbais e não verbais dessas crianças. Foi observado por meio da pesquisa que as crianças bilíngues obtinham performance superior em ambas as avaliações, comparando-se com crianças monolíngues. Os autores acreditam que tal desempenho esteja ligado a uma capacidade su-perior das crianças bilíngues em formar conceitos, bem como uma maior flexibilidade mental por parte delas. Além disso, By Peal e Lambert (1962) pontuam que bilíngues possuem maior diversidade no conjunto das habilidades mentais.

Na pesquisa de Bak et al. (2014), foi constatado que o bi-linguismo pode retardar a aparência de demência, apontando que os indivíduos bilíngues possuem diferenças no patamar das habi-lidades cognitivas, principalmente relacionadas à inteligência ge-ral e leitora. Tais informações foram detectadas a partir da bateria de testes aplicada, incluindo o Letter Number Sequencing, Raven, Bloch Design, Digit Symbol e Symbol Search – todos da concei-tuada bateria WAIS III, além do Digit Span Backward da bateria WMS – III.

O estudo de Mortorell (2000 apud MENDONÇA; FLEITH, 2005) indica que o bilinguismo é um fator que pode influenciar no desenvolvimento da criatividade.

Em pesquisa realizada por Saer et al. (1923), comparan-do crianças monolíngues e bilíngues, submetidas a testes de QI, verificou-se que as bilíngues alcançaram resultados inferiores em comparação às monolíngues. Porém, tal pesquisa possui várias li-mitações metodológicas, como o fato de o teste ser em inglês para ambos os grupos de crianças – inclusive àquelas as quais a língua inglesa não era sua língua materna, no caso das bilíngues. Outra

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questão que merece destaque é que as crianças bilíngues eram de classes sociais distintas das monolíngues, porém, foram avaliadas como um todo. Nisbet et al. (2012 apud CAVALINI et al., 2015) analisou os efeitos do QI e constatou que diferenças socioeconô-micas e sociais podem influenciar no desenvolvimento das habili-dades intelectuais, assim, quanto maior o nível socioeconômico da criança, maior o repertório de vocabulário dela.

Christophersen (1949 apud NISBET, 1953) aponta que a criança bilíngue pode até se tornar cognitivamente competente, tan-to quantan-to a monolíngue, mas, para isso, deverá ser preparada para se concentrar em apenas uma língua.

Outro estudo, realizado por Lewis (1959), avaliou crianças de 10 anos por meio de testes não verbais de inteligência e aponta melhores performances das crianças monolíngues. Os autores acre-ditam que tal resultado seja devido ao fato de a amostra não ser homogênea e haver um viés social que, talvez, tenha influenciado.

Mendonça e Fleith (2005) afirmam que, realmente, as pri-meiras pesquisas com bilíngues – início do século XX – levaram a acreditar que o bilinguismo não fosse benéfico ao indivíduo, po-rém, tais afirmações podem ter sido influenciadas pelo preconceito vigente na época em relação aos imigrantes.

4. A RELAÇÃO ENTRE BILINGUISMO E QI NA PES-QUISA NACIONAL

A pesquisa acerca da relação entre bilinguismo e QI realizada na base de dados “Scielo” não apresentou nenhum resultado a partir dos termos selecionados. Já na base de dados “Google Acadêmico” foram encontrados 7 (sete) resultados. Dentre estes, foram encon-trados 3 (três) dissertações de mestrado, 1 (uma) tese de doutorado e 3 (três) resultados para artigo científico. Porém, os 3 (três) resul-tados referentes a artigos científicos referiam-se ao mesmo trabalho (MENDONÇA; FLEITH, 2005).

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O único artigo encontrado foi desenvolvido a partir de uma pesquisa realizada em Brasília com estudantes – adolescentes e adultos – de uma instituição de ensino de língua inglesa.

Tal pesquisa tem como justificativa a demanda por uma se-gunda língua – principalmente o inglês – e pretendeu desenhar o perfil do bilíngue referente às características cognitivas e afetivas, bem como o processo de aprendizagem dessa segunda língua, uma vez que estudos em relação a uma segunda língua são bem menos comuns no Brasil, se comparado com a produção científica norte--americana.

Assim, o objetivo do estudo foi analisar a relação entre a cria-tividade, a inteligência e o autoconceito de alunos bilíngues, com-parados a alunos monolíngues.

Foi considerado bilinguismo o domínio de uma segunda lín-gua, nesse caso, o inglês. As variáveis independentes foram gênero, nível de proficiência e faixa etária, enquanto as variáveis depen-dentes foram criatividade, inteligência e autoconceito.

Participaram de tal pesquisa 269 alunos de uma instituição de língua inglesa de nível socioeconômico entre médio e médio alto. Entre os 269 alunos, 190 foram considerados bilíngues por apresentarem proficiência escrita e oral na língua inglesa, atestadas por meio de testes escritos e orais. Os demais (79) foram conside-rados monolíngues por estarem no primeiro ou segundo semestre do curso.

Foram aplicados os seguintes testes: Torrance de Pensamen-to Criativo (TTCT) (TORRANCE, 1974), o Teste Não Verbal de Raciocínio para Adultos (TNVRA) (PASQUALI, 1998) e a Escala Fatorial de Autoconceito (TAMOYO, 1981). Após a aplicação, os resultados foram analisados estatisticamente.

Como resultados do estudo, os alunos bilíngues obtiveram escores acima da média nas avaliações de criatividade verbal e fi-gurativa e de inteligência. Foi observada, também, uma relação en-tre criatividade e autoconceito (atividade social e responsabilidade social) entre os alunos bilíngues. Porém, não foram encontradas

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di-ferenças significativas em relação à questão do autoconceito isola-damente e, também, nos resultados das avaliações entre os gêneros.

É apontada, pelos autores, a necessidade de se fazer estudos entre bilíngues que emigraram, bilíngues que adquiriram a segunda língua em seu país e monolíngues, bem como entre pessoas de con-textos socioeconômicos divergentes.

Apesar das diversas contribuições e da aplicação do teste TNVRA de inteligência, tal trabalho não foca a questão do quociente de inteligência (QI), uma vez que não foram analisados escores desse teste, não sendo possível inferir se indivíduos bilíngues apresentam QI diferenciado.

5. CONSIDERAÇÕES FINAIS

O presente trabalho nos permitiu entender que o conceito de bilinguismo é vasto, recebendo diversas definições, dependendo do viés analisado pelo autor, porém, a grande parte entende que o bilinguismo se dá a partir do uso ou entendimento de duas línguas por parte do falante e que, especificamente no Brasil, a quantidade de pessoas bilíngues cresce cada vez mais – fator influenciado pela globalização e crescente número de escolas de idiomas, principal-mente em relação à língua inglesa.

Notou-se que a literatura internacional possui uma conside-rável gama de estudos envolvendo bilíngues, principalmente em relação à sua avaliação psicológica, a fim de se investigar se es-tes possuem habilidades cognitivas superiores às dos monolíngues. Percebeu-se que diversos pesquisadores encontraram dados que confirmam tal hipótese.

Porém, nem todas as pesquisas internacionais convergem seus resultados em relação ao desempenho superior por parte dos bilíngues em avaliações psicológicas, divergência que deixa claro que ainda são necessárias mais pesquisas e estudos nessa área.

Já no Brasil, encontrou-se um número restrito de estudos a partir da pesquisa feita em bancos de dados de periódicos científi-cos. O único artigo encontrado – por meio de palavras-chave – nos

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aponta que os bilíngues estudados obtiveram escores superiores nos testes aplicados, porém, a questão do quociente de inteligência não é aprofundada, o que não nos permite inferir se o QI dos bilíngues é superior ao da média populacional.

Percebe-se, então, que são parcos os estudos dos efeitos do bilinguismo no Brasil, se comparado a outros países (MENDON-ÇA, 2003 apud MENDONÇA; FLEITH, 2005).

Conclui-se, então, o quão importante é a realização de maior número de estudos interdisciplinares em relação ao tema no Bra-sil, principalmente envolvendo a Psicologia, a Educação e a Lin-guística, a fim de contribuir para um melhor entendimento acer-ca do bilinguismo (MENDONÇA; FLITH, 2005) e sua influência nas habilidades cognitivas e QI, visto que mesmo que a literatura internacional seja mais rica, as questões socioculturais podem in-fluenciar nos resultados, não nos permitindo generalizar tais dados para a população brasileira. Além disso, o bilinguismo, por ser uma tendência – inclusive no Brasil – fez aumentar o número de insti-tuições educadoras especializadas no assunto, assim, estudos vol-tados à área contribuiriam no aprimoramento de suas metodologias e currículos.

REFERÊNCIAS

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Formiga Juju: práticas sociais integradas e

interdisciplinares

Denise Andrade de Freitas MARTINS1

Resumo: Discutidos os conceitos de práticas sociais e interdisciplinaridade, bus-camos suscitar e promover novas reflexões em Educação, estimulando a reali-zação de atividades dialógicas cooperativas e criativas, com base em pessoas e profissionais sensíveis e abertos ao Outro. O ponto de partida são os contos moçambicanos da Formiga Juju, de autoria de Cristiana Pereira. Com base nos princípios pedagógicos do educador brasileiro Paulo Freire, apresentamos re-latos de intervenção e resultados parciais de uma pesquisa em andamento que busca identificar e compreender os processos educativos decorrentes de uma práxis dialógica envolvendo música, teatro e literatura. De natureza qualitativa e inspiração fenomenológica, os instrumentos de coleta de dados são os diários de campo, fotos, filmagens, desenhos, textos escritos e entrevistas, com poste-rior análise ideográfica e nomotética. Esperamos que este trabalho possibilite reflexões comprometidas com abordagens alternativas para o ensino de música, envolvendo teatro e literatura, em escolas de educação básica.

Palavras-chave: Práticas Sociais e Processos Educativos. Interdisciplinaridade. Práticas Dialógicas.

1Denise Andrade de Freitas Martins. Doutora em Educação pela Universidade Federal de São Carlos (UFSCar). Professora na Universidade do Estado de Minas Gerais (UEMG), campus de Ituiutaba (MG). E-mail: <denisemartins@netsite.com.br>.

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Ant Juju: integrated social practices and

interdisciplinary

Denise Andrade de Freitas MARTINS

Abstract: Discussed the concepts of social and interdisciplinary practices, we seek to encourage and promote new thinking in education, stimulating the realization of cooperative and creative dialogical activities, based on sensible and professional and open to the Other. The starting point are the Mozambicans tales Ant Juju, Cristiana Pereira authored. Based on the pedagogical principles of the Brazilian educator Paulo Freire, present intervention reports and partial results of a research in progress, which seeks to identify and understand the educational processes resulting from a dialogical praxis involving music, theater and literature. Qualitative and phenomenological, data collection instruments are the field diaries, photographs, films, drawings, written texts and interviews, with subsequent analysis ideographic and nomothetic. We hope this work will enable reflections committed to alternative approaches to music education, involving drama and literature in basic education school.

Keyboards: Social Practices and Educational Processes. Interdisciplinarity. Dialogic Practices.

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1. INTRODUÇÃO

Este texto trata de uma reflexão na área de Educação, tendo em vista nossa experiência, nos níveis fundamental, médio e supe-rior, além da experiência em gestão escolar em escola pública de música e coordenação de pesquisa e extensão universitária. Dessa forma, nossa motivação é a própria trajetória, cuja atuação sempre ultrapassou os muros das escolas em que trabalhamos, num exer-cício permanente de ideal compartilhado, envolvendo diferentes pessoas e instituições de ensino, áreas de conhecimento, objetivos e metodologias, abordagens e procedimentos.

Por isso, traremos aqui a discussão e problematização de ba-sicamente três conceitos, que são: práticas sociais, integração e in-terdisciplinaridade, com o objetivo de repensar a própria prática docente e, por meio desta discussão, ser capaz de suscitar e pro-mover novas reflexões na área, em busca de estimular a realização de práticas interdisciplinares com base em pessoas e profissionais sensíveis e abertos ao Outro2, que não é outro qualquer, mas aquele e aquela com o(a) qual escolhemos compartilhar experiências e co-nhecimentos, construir novas formas de ver, fazer e sentir o mundo, novas maneiras de nos relacionarmos.

A justificativa por tal proposição se apoia, sobretudo, na con-dição de escolha e decisão de trabalhar com o Outro, que é a criança estudante de escola pública. Essa criança não é uma criança qual-quer, mas a criança exposta aos perigos da modernidade e sujeita às poucas oportunidades de crescimento. Crianças de fácil acesso às ruas, crimes e drogas e também crianças de forte potencial para a vida digna e autônoma, por isso libertária. Ser professor, ou melhor, educador dessa criança exige formação pessoal e profissional que ultrapasse a compreensão dos manuais de educação. Esse lugar é o lugar do ser humano sensível e comprometido consigo mesmo, com os outros e com o mundo. Por isso, é que o profissional que nesse

2 Para Dussel (s.d.), acolher o outro é servir como sendo o outro, ao que denomina “acolhimento da Alteridade”. Por isso, o uso do termo Outro, com “O” maiúsculo, por compartilharmos com Dussel (s.d.), assim como Fiori (1991, 1986) e Freire (2005a), a ideia de que as nossas realizações e compreensões se dão a partir de nossas relações com as outras pessoas, sendo uns com os outros no mundo, já que o outro com o qual nos relacionamos também faz cultura e história, é o outro do qual também somos responsáveis, por isso Outro.

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mundo deverá atuar não pode ser um profissional qualquer, mas alguém que tenha curiosidade, respeito e compromisso com o que realiza e com quem realiza. Somente uma formação que dê conta dessa realidade pode ser o caminho para uma educação libertadora e humanizante, algo que ainda nos parece longe de se realizar.

2. REFERENCIAL TEÓRICO Práticas sociais

Compartilhamos com Oliveira et al. (2014) a noção de que práticas sociais se constroem na relação estabelecida entre as pes-soas, que se agrupam pelas mais diferentes razões, como afinidades pessoais, objetivos comuns, ideologias, constituições identitárias, modos de ser, planejar, organizar e viver a vida, dentre outros fato-res. Esse ato, o de se agrupar, possibilita às pessoas a constituição individual e coletiva, quando alimenta as relações e afinidades, ges-tos de afeges-tos e desafeges-tos, concordâncias e discordâncias, aproxima-ção e afastamento, liberdade de movimentar-se no grupo do qual participa, num movimento de ir e vir em acordo com as vontades de cada um, de tal forma que não há tempo predeterminado ou fixado para a permanência das pessoas.

Podemos dizer que não há regras capazes de definir práticas sociais, já que sua existência só se justifica pelas vontades humanas que as realizam. De acordo com o educador brasileiro Paulo Freire (2005), realizar e realizar-se não são um ato solitário, ao contrário, só acontecem na coletividade, sendo uns com os outros. Por isso, a convivência é condição básica para compartilhar compreensões e realizações. Martins (2015, p. 40) diferencia a intenção da ação em si, quando diz “[...] convivência e não conviver, porque esta última, investida de sua forma de verbo, pressupõe a intenção; por isso convivência, que é o acontecimento em si, a coisa já acontecendo”. Convivendo, as pessoas ficam próximas umas das outras, numa relação que exige entrega, respeito, prontidão, método, ri-gor, e, necessariamente, encontros-desencontros, tais como

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subje-tividade-objetividade, paixão-razão, compaixão-responsabilidade. Relações como essas são marcadas de humanismo e profissionalis-mo coprofissionalis-mo características fundamentais para a realização conjunta e onde o espírito de cooperação – colaboração em Freire (2005) – é fundamental, com base no diálogo entre as pessoas. Desses diferen-tes modos de convivência e de relações estabelecidas entre as pes-soas de uma mesma prática é que surge o “eu social”, constituição da individualidade na coletividade.

Nesse sentido, Freire (2005) observa que o fundamento da convivência humanizadora e transformadora é aquele que lida com as individualidades, as quais devem ser reconhecidas nas liberda-des assumidas de cada pessoa em meio à coletividade. Aquele que souber bem conviver, conviver verdadeiramente com essas liber-dades em comunhão, é pessoa de autoridade, capaz de agir e poder transformar.

Dessa forma, tomando-se o termo “práticas sociais” para conceituar as nossas atividades profissionais em Educação, convi-vendo com crianças estudantes de escolas públicas em meio ao pro-cesso de construção-reconstrução de atividades envolvendo arte e cultura, poderíamos dizer que o nosso processo de tomada de cons-ciência seria o gatilho para a nossa transformação? Qual é o poder e capacidade transformadora de práticas como essas?

Integração

Trazemos, também, para reflexão o termo “integração”, prin-cipalmente com base em Fazenda (2011, p. 11), por compartilhar-mos com a autora a ideia de que é na intersubjetividade das pessoas em convivência e em interação que o diálogo se faz possível, como “[...] única condição de possibilidade da interdisciplinaridade”, o que requer engajamento pessoal de cada pessoa envolvida na rela-ção, por desejo e não imposição.

A integração é assim compreendida como sendo um momen-to na interdisciplinaridade, referindo-se a um aspecmomen-to formal, no que diz respeito à organização de disciplinas e conteúdos, mas tam-bém integração de pessoas, ideologias, objetivos, vontade de trocas

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e realizações. Dessa forma, a integração não se refere simplesmente à fusão, mas à condição de efetivação da interdisciplinaridade, a qual pressupõe integrar conhecimentos com vistas a novos questio-namentos e novas buscas, com a finalidade maior de ser capaz de transformar a própria realidade vivida.

Por isso, afirmamos o quanto é necessário e urgente, enquan-to profissionais em Educação, assumirmos nossa postura ética de compromisso com o Outro, o outro que nos alimenta no exercício de sermos pessoas e professores educadores. Quanto mais cedo for-mos capazes de refletir e pensarfor-mos sobre nós mesfor-mos, observando nossas próprias preferências, gostos, objetivos e pessoas de convi-vência, estaremos mais próximos e prontos para decidir caminhos, ocupar lugares, escolher procedimentos e até mesmo criar mundos e delinear futuros.

Parafraseando Merleau-Ponty (1991, p. 76):

O que julga um homem não é a intenção e não é o fato, é ele ter ou não ter feito passar valores para os fatos. Quando isso ocorre, o sentido da ação não se esgota na situação que a causou, nem em algum vago juízo de valor, ela per-manece exemplar e sobreviverá em outras situações, sob outra aparência. Ela abre um campo, às vezes até institui um mundo, de qualquer modo delineia um futuro.

Interdisciplinaridade

A interdisciplinaridade, mais do que um termo da moderni-dade ou um slogan, é uma relação estabelecida com base na mutu-alidade e reciprocidade, que pressupõe uma atitude diferente a ser assumida diante do problema do conhecimento e do exercício da docência. Segundo Fazenda (2011), ela vem em forma de tentativa de ruptura de uma concepção fragmentária e unitária do ser humano em direção ao resgate de uma atitude de abertura, na qual todo o sa-ber já constituído e por ser aprendido são igualmente importantes. Tais estruturas, de contorno ambíguo dos movimentos e das ações pedagógicas, valorizam o anonimato, quando acreditam que o conhecimento pessoal se anula diante do saber coletivo, é a pre-sença do “nós” como resultado dos vários “eus”, tão necessários à

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toda realização humana. Entretanto, para a efetivação da interdis-ciplinaridade é preciso desenvolver a sensibilidade que habita cada um de nós, a qual deverá ser estimulada e desenvolvida, no sentido de conviver com o fazer artístico, lugar de criação e imaginação.

Nesse sentido, em processos como esses a metodologia e seus procedimentos são de grande importância, indiscutíveis, mas não como fim e sim como meios, já que a interdisciplinaridade é um exercício e não ensinamento. Interdisciplinaridade como lugar onde uns aprendem com os outros, na convivência. Lugar de espaços cruzados na horizontalidade das funções exercidas, lugar onde ninguém ensina o outro aprender, mas aprendem juntos, na amorosidade das relações estabelecidas, guardadas as responsabili-dades e compromissos assumidos com respeito ao outro.

Quando a interdisciplinaridade acontece, as instituições e pessoas que nelas trabalham têm a oportunidade de por em ação os sonhos, como chance de revitalização, de fundação de “[...] uma obra de educação à luz da sabedoria, da coragem e da humildade” (FAZENDA, 2011, p. 27). Planejar é tão importante quanto imagi-nar, mas na ação conjunta e colaborativa entre as pessoas envolvi-das em uma mesma ação, não há como prever resultados precisos e objetivos em meio ao processo de construção-reconstrução.

Merleau-Ponty (1991, p. 88) nos ajuda a pensar:

A vida pessoal, a expressão, o conhecimento e a história avançam obliquamente, e não em linha reta para os fins ou para os conceitos. Não se obtém aquilo que se procura com demasiada deliberação, e, pelo contrário, as idéias, os valores não deixam de vir àquele que soube em sua vida meditante libertar-lhes a fonte espontânea.

Na interdisciplinaridade, caminhamos juntos na ambiguida-de, com vistas a gerar novos rumos e saberes, de modo a conce-ber novas formas de compreensão das coisas e do mundo. Mas, no entanto, é preciso cuidado e zelo, para mediar, moderar, ponderar e equilibrar-se entre as velhas e novas aprendizagens, livres de pre-conceitos e abertas às novidades na imobilidade ao caos. Vivemos em uma estrutura como reflexo de outras épocas, sentimo-nos tolhi-dos, frente ao imperativo de ordens e valores que não nos pertence,

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temos o impulso de romper. Mas, nesse processo de metamorfose, o nosso saber livre e autônomo é construído lentamente, e exige, de acordo com Fazenda (2011), “atitude de espera”, atitude de vigia alicerçada na paixão pelo que se faz e compromisso por aquilo que se pretende realizar.

É por isso que se diz que a lógica da Interdisciplinaridade é a invenção, a descoberta, a procura, a curiosidade, a vontade de realizar com base nos atos gestados de vontade humana, de desejo planejado e construção da liberdade, princípio fundante da autono-mia. Ser livre e responsável!

3. FORMIGA JUJU, PROCESSOS DE INTERVENÇÃO Vivências compartilhadas

Como atividades de vivências compartilhadas em práticas sociais integradas e interdisciplinares, passaremos à sua descrição, tomando-se como referência atividades envolvendo música, teatro e literatura, criadas a partir dos contos moçambicanos da Formiga Juju e com base no referencial teórico apresentado.

No ano de 2007, após um ano de ampla discussão, foi cria-da na Universicria-dade do Estado de Minas Gerais, unicria-dade Ituiutaba, uma atividade de extensão intitulada “Projeto Escrevendo o Futuro (PEF) – (Re) cortando papéis, criando painéis”, cuja intervenção se deu com estudantes de uma escola pública estadual, localizada em bairro periférico da cidade, a qual apresentava baixo índice nos resultados obtidos junto às provas do Sistema Mineiro de Avaliação (SIMAVE).

A metodologia de intervenção foi pautada na pedagogia dia-lógica do educador brasileiro Paulo Freire (1967, 2005), onde as pessoas pensam e discutem conjuntamente as atividades a serem re-alizadas, assim: o quê, como, com quem, onde, quando, para quê e por que, a partir da realidade vivida de cada pessoa envolvida, seus desejos e expectativas, mas também as condições de sua realização. Na convivência, com base no respeito mútuo, solidariedade,

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coope-ração e diálogo permanente, é que as coisas acontecem, em tempos e lugares de vivência e enfrentamento do dia a dia problematizador, como parte integrante do processo de construção-reconstrução de toda prática social humanizadora.

Com esse espírito e com base em três contos3 da autora mo-çambicana Cristiana Pereira: “A formiga Juju na cidade das papaias” (2011); “A formiga Juju e o sapo Karibu” (2013); “A formiga Juju e o professor Mosquito” (2014), criamos atividades envolvendo mú-sica, teatro e literatura, num trabalho interinstitucional e interdis-ciplinar. Tais trabalhos resultaram em performances, verdadeiros musicais, com a presença dos seguintes elementos: texto, música, cenário, figurino, percussão corporal, orquestra de xilofones e me-talofones, orquestra de teclados, coro, narração, personagens, brin-cadeiras..., uma verdadeira carpintaria, onde as pessoas ocuparam os lugares de desejo em conformidade com suas potencialidades e aptidões, e cujo resultado é parte do processo e não fim.

A ideia de protagonismo é exercida por cada pessoa envol-vida, dentre estudantes, pais/mães e pessoas responsáveis, educa-dores/as e gestores/as, de diferentes escolas (universidade, escola de música, escola de educação básica), cada um/a situado naquilo que foi de sua própria escolha e decisão, lugar de acolhimentos e aprendizagens. Para tal, aconteceram inicialmente reuniões para as tomadas de decisão e em seguida foram organizados os encon-tros (registrados rigorosamente em diários de campo com posterior análise), os quais acontecem duas vezes por semana, com duração de três horas cada, caracterizando-se como momentos do dia a dia problematizador do processo de construção-reconstrução das ativi-dades propostas.

Esse trabalho, que acontece desde o ano de 2013, foi rea-lizado em 2016 a partir do conto “A formiga Juju e o professor Mosquito” (2014), cuja história trata de uma comunidade de for-migas, as quais contam com a sabedoria de um mestre capoeirista, Professor Moskito, e juntas combatem a malária, doença avassala-dora em Moçambique, África, a qual foi adaptada para a Dengue

3 O contato com os contos da Formiga Juju aconteceu no ano de 2013, por ocasião de nossos estudos de doutorado realizados em Moçambique, Programa Doutorado Sanduiche no Exterior (PDSE), como bolsista CAPES (Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior).

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no Brasil. Os resultados desse processo de intervenção, uma prática social, tendo em vista os registros dos dados coletados (situações--diálogo, observações, entrevistas, desenhos, questionários, fotos e filmagens) em diários de campo, com posterior análise, apresentam resultados muito satisfatórios em atividades dessa natureza, que ve-remos a seguir.

“A formiga Juju e o professor Moskito”, o dia a dia problema-tizador

O conto “A formiga Juju e o professor Moskito” (2014) con-tou com a participação de estudantes, professores/as e gestores de duas escolas públicas, uma universidade e uma escola de música, todas localizadas na cidade de Ituiutaba. Inicialmente foram reali-zadas visitas in loco nas instituições habitualmente envolvidas e in-teressadas em participar, de modo a sensibilizar e colocar em con-tato direto com a literatura disponível, de temática muito adequada para as problemáticas atuais, Dengue.

Em seguida foram realizadas reuniões entre os educadores/as e gestores/as educacionais para decidir sobre cronograma de encon-tros, despesas decorrentes de deslocamentos entre escolas, agenda de apresentações (pré-estreia, estreia e reapresentações), respon-sabilidades e funções de cada instituição e pessoas envolvidas, a partir de suas vontades e desejos, liberdade de escolha e decisão, consideradas as condições próprias de cada um/a. Os encontros fo-ram realizados semanalmente, dentre atividades de literatura, inter-pretação de texto, encenação dos personagens principais e secundá-rios, estudos musicais e instrumentação musical (solo vocal e coro; percussão corporal; orquestra de xilofones e metalofones; orquestra de teclados). A criação e confecção do cenário e figurinos ficaram a cargo de um grupo de pessoas, conforme manifestação expressa de suas habilidades específicas, desejos e disponibilidade para tal.

Referências

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