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Intoxicações em animais de companhia por inseticidas e rodenticidas

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Academic year: 2021

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Ciências da Saúde

Intoxicações em animais de companhia por

inseticidas e rodenticidas

Experiência Profissionalizante na vertente de Farmácia

Comunitária, Hospitalar e Investigação

Daniela Rodrigues Fernandes

Relatório para obtenção do Grau de Mestre em

Ciências Farmacêuticas

(Ciclo de estudos Integrado)

Orientador: Prof. Doutor Samuel Martins Silvestre

Coorientadora: Profª. Doutora Eugénia Gallardo

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ii

Agradecimentos

O presente trabalho não poderia ser alcançado sem a presença de vários intervenientes, por isso, devo agradecer-lhes por todo o apoio ao longo deste últimos anos.

Agradecer ao meu orientador, Prof. Drº Samuel Silvestre, por orientar o meu estudo e por toda a disponibilidade demonstrada tanto nestes últimos meses, como ao longo dos anos do percurso académico.

Agradecer à minha co-orientadora, Profª Drª Engénia Gallardo pelas indicações fundamentais no desenvolvimento da tese e pela sua disponibilidade.

Agradecer aos intervenientes principais na obtenção de casos clínicos para o estudo, nomeadamente à Drª Catarina e à Drª Raquel da Clínica Feras de Companhia em São Pedro do Sul, pela disponibilização dos casos clínicos e por toda a ajuda relativamente à bibliografia e esclarecimento de dúvidas; ao Prof. Drº Hugo Brancal pela disponibilização dos casos clínicos e toda a informação necessária à compreesão da sintomatologia e terapêuticas resultantes de intoxicações em animais de companhia; agradecer à Drª Mónica do centro veterinário MedicalVet na Covilhã pela disponibilização de dados e por toda a atenção prestada.

Agradecer à Farmácia Teixeira por todo o apoio e conhecimento transmitido ao longo do estágio e agradecer ao CHTV pela realização do estágio curricular.

Por último, mas não menos importante, agradecer à minha família e aos meus amigos por todo o apoio e força ao longo do percurso académico, principalmente à minha amiga Fabiana, por toda a ajuda e tempo dispensado tanto para a realização deste trabalho como ao longo do percurso académico.

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iii O presente relatório de estágio do Mestrado Integrado em Ciências Farmacêuticas apresenta-se organizada em três componentes: Investigação, Farmácia Comunitária e Farmácia Hospitalar.

Na primeira componente encontram-se expostos os resultados do estudo intitulado “Intoxicações em animais de companhia por inseticidas e rodenticidas”, que tem como objetivo perceber quais as intoxicações mais frequentes nestas espécies, verificar a sintomatologia associada a cada tóxico, assim como analisar a abordagem terapêutica para cada caso clínico e a respetiva resposta ao tratamento.

Neste contexto, os pesticidas são bastante utilizados a nível mundial no controlo de pestes e um dos problemas associado à sua utilização prende-se com o facto de poderem ser muito tóxicos para os humanos e para os animais. De facto, estes compostos têm sido responsáveis por um elevado número de intoxicações acidentais, criminais e suicidas, sendo que, nos casos clínicos observados neste estudo, se constatou que as intoxicações ocorreram de forma acidental.

Nos casos clínicos obtidos e analisados verificou-se que os organofosforados são os inseticidas com maior relevância ao nível das intoxicações, dado que estão envolvidos num maior número de casos, seguindo-se os rodenticidas e os piretróides. Ao longo deste estudo foram analisados 14 casos clínicos obtidos em três cidades Mangualde, São Pedro do Sul e Covilhã, durante 5 meses.

A segunda componente retrata as atividades desenvolvidas e os conhecimentos adquiridos na Farmácia Teixeira durante a realização do estágio curricular em farmácia comunitária. O relatório de estágio pretende, assim, descrever o funcionamento de uma farmácia comunitária assim como realçar o importante papel do farmacêutico na comunidade, uma vez que como este tem um contato mais próximo dos utentes poderá ter um papel essencial na promoção da saúde e prevenção de doenças. O relatório também descreve todo o percurso dos medicamentos desde a realização de encomendas, receção, armazenamento, dispensa, aconselhamento e prestação de cuidados de saúde aos utentes.

A terceira componente aborda o papel do farmacêutico no meio hospitalar, descrevendo os conhecimentos adquiridos ao longo do estágio curricular realizado no Centro Hospitalar Tondela-Viseu. O farmacêutico hospitalar tem um papel muito importante e decisivo na terapêutica do doente e o relatório pretendeu abordar todas as tarefas dos vários setores em que o farmacêutico tem um papel ativo, assim como descrever a estrutura e funcionamento da farmácia hospitalar.

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Palavras-chave

Farmacêutico, pesticidas, intoxicações, animais de companhia, Farmácia Comunitária, Farmácia Hospitalar.

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v This traineeship report of the Integrated Master Degree in Pharmaceutical Sciences is organized in three components: Investigation, Communitarian Pharmacy and Hospital Pharmacy.

In the first component are exposed the results of the study entitled “Intoxications in domestic animals by insecticides and rodenticides” which aims to realize which are the most frequent intoxications for these species, verify the signs associated with each toxic compound, analyze the therapeutic for each case reported and the respective answer after treatment.

The pesticides are frequently used worldwide in pest’s control and one of the problems associated with their use is that they can be very toxic for humans and for animals. In fact, these toxics are responsible for an high number of accidental, criminal and suicidal intoxications. In this study, a special attention to accidental intoxications is given, since they occurred in the cases reported envolving pesticides.

In the clinical cases analyzed it was found that organophosphates are the insecticides which represent the highest clinical importance, because they represent the major number of intoxications, followed by rodenticides and pyrethroids. In this study 14 cases obtained in three cities, Mangualde, São Pedro do Sul e Covilhã, during 5 months were analyzed.

The second component reports the activities developed and the knowledge acquired during the internship at Farmácia Teixeira. The aim of this report is to describe all the procedures usually performed in a community pharmacy and to evidence the importance of the pharmacist´s role in the community, since they have a close contact with patients, which will be important in health promotion and in the prevention of diseases. This report also describes the medication´s route since the drafting orders, reception, storage and the dispensation as well as the counseling and health education made by the pharmacist.

The third component reports the important role of the pharmacist in the hospital, describing the acquired knowledge along the internship at Centro Hospitalar Tondela-Viseu. In the hospital, the pharmacist has an important and crucial role in the patient´s therapy and the report aims to describe every task performed by the pharmacist in the hospital sectors, and described the structure and operation of the hospital pharmacy.

Keywords

Pharmacist, pesticides, intoxications, companion animals, Communitarian Pharmacy, Hospital Pharmacy.

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Índice

Agradecimentos ii Resumo iii Palavras-chave iv Abstract v Keywords v Índice vi Lista de Figuras ix Lista de Gráficos x Lita de Tabelas xi

Lista de Acrónimos xii

Capítulo I – Intoxicações de animais de companhia com inseticidas e rodenticidas 1

1. Introdução 1 1.1 Pesticidas 2 a) Conceitos gerais 2 b) Inseticidas 3 1) Organoclorados 3 2) Organofosforados e Carbamatos 4 3) Piretróides 6 4) Rodenticidas 8

2. Justificação do tema e objetivos 10

3. Material e métodos 11

3.1 Tipo de estudo 11

3.2 Seleção da amostra e recolha de dados 11

3.3 Análise de dados 12

4. Resultados e discussão 12

4.1 Caraterização da amostra 12

4.2 Interpretação dos resultados 14

4.2.2.1 Intoxicação por organofosforados 16

4.2.2.2 Intoxicação por rodenticidas 23

4.2.2.3 Intoxicação por piretróides 27

4.3 Reflexão final 29

5. Conclusão 30

6. Bibliografia 31

Capítulo II – Farmácia Comunitária 37

1. Introdução 37

1.1 Organização da Farmácia 37

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vii 2. Medicamentos e Produtos 41 2.1 Encomendas 43 2.2 Receção 43 2.3 Armazenamento 44 2.4 Distribuição 45

2.5 Controlo dos prazos de validade 45

2.6 Devoluções 45 3. Interação medicamento-farmacêutico-utente 46 3.1 Papel do farmacêutico 46 3.2 Dispensa 47 3.2.1 Psicotrópicos 47 3.3 Comparticipações 47 3.4 Manipulados 48 3.5 MUV 48

4. Outros cuidados de saúde 48

4.1 Glicémia 49 4.2 Colesterol 49 4.3 Ácido úrico 50 4.4 Triglicéridos 50 4.5 Pressão arterial 50 4.6 Vacinação 51 4.7 Palestras 51 5. Farmacovigilância 52 6. Contabilidade e Gestão 52 7. Receituário e Facturação 52 8. Campanhas associadas 53 8.1 Valormed 53 8.2 Rastreios 54 9. Conclusão 54 10. Bibliografia 55

Capítulo III – Farmácia Hospitalar 56

1. Introdução 56 1.1 Recursos humanos 56 2. Gestão e qualidade 57 3. Aprovisionamento 57 3.1 Receção 58 3.2 Armazenamento 59 4. Distribuição 59

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4.2 Distribuição clássica 61

4.3 Distribuição a doentes em ambulatório 62

4.4 Circuitos especiais de distribuição 64

i) Estupefacientes e psicotrópicos 64

ii) Hemoderivados 65

5. Farmacotecnia 66

5.1 Citotóxicos 66

5.2 Preparações estéreis e não estéreis 69

5.3 Reembalagem 70

6. Recall 70

7. Ensaios Clínicos 71

8. Controlo dos prazos de validade 72

9. Inutilização 73

10. Palestras e formações 73

11. Conclusão 74

12. Bibliografia 75

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Lista de Figuras

Figura 1 – Mecanismo de ação dos rodenticidas, adaptado de VALCHEV, et al,2008.

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Lista de Gráficos

Gráfico 1 - Caracterização da população de estudo por espécie.

Gráfico 2 - Identificação dos agentes que originaram intoxicações em cães Gráfico 3 - Identificação dos agentes que originaram intoxicações em gatos Gráfico 4 - Identificação dos agentes tóxicos na população em estudo. Gráfico 5 - Distribuição por espécie das intoxicações por OF.

Gráfico 6 - Resposta ao tratamento farmacológico nos casos clínicos resultantes das

intoxicações por OF.

Gráfico 7 - Administração de atropina em intoxicações por OF. Gráfico 8 – Deteção do composto em causa em intoxicações por OF.

Gráfico 9 - Resposta ao tratamento farmacológico em casos clínicos resultante da intoxicação

por rodenticidas.

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Tabela I - Sinais e Sintomas apresentados por OF e carbamatos. Tabela II - Descrição dos casos clínicos.

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Lista de Acrónimos

ACh Acetilcolina

AChE Acetilcolinesterase

ACSS Administração Central do Sistema de Saúde

AINE´s Anti-inflamatório não esteróides

AIM Autorização de Introdução no Mercado

ANF Associação Nacional de Farmácias

AO Assistentes Operacionais

CFLV Câmara de fluxo de ar laminar vertical

CHTV Centro Hospitalar Tondela-Viseu

DCI Denominação Comum Internacional

DDT Diclorodifeniltricloroetano

DGS Direção Geral de Saúde

EPI Equipamento proteção individual

FDS Fast Dispenser Server

FHNM Formulário Hospitalar Nacional do Medicamento

GABA Ácido ϒ-aminobutírico

Infarmed Autoridade Nacional do Medicamento e Produtos de Saúde

IMC Índice de Massa Corporal

MNSRM Medicamento Não Sujeito a Receita Médica

MSRM Medicamento Sujeito a Receita Médica

MUV Medicamentos de Uso Veterinário

OF Organofosforados

OMS Organização Mundial de Saúde

PA Pressão Arterial

PAD Pressão Arterial Diastólica

PAS Pressão Arterial Sistólica

PIC Preço Impresso na Cartonagem

PUV Produtos de Uso Veterinário

PVF Preço Venda à Farmácia

SF Serviços Farmacêuticos

SNC Sistema Nervoso Central

SNS Sistema Nacional de Saúde

SGQ Sistema de gestão de qualidade

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Daniela Rodrigues Fernandes

Mestrado Integrado em Ciências Farmacêuticas|2013-2014

Capítulo I - Intoxicações de animais de companhia com

inseticidas e rodenticidas

1. Introdução

A nível mundial, o recurso a pesticidas está geralmente relacionado com o seu uso na agricultura e habitações de modo, a evitar o desenvolvimento de pestes. Porém, os pesticidas podem ser muito tóxicos tanto para os humanos como para os animais e, um dos problemas detetados nos últimos anos está relacionado com o facto de existir um elevado número de intoxicações por estas substâncias. As principais causas de intoxicação por pesticidas são a exposição acidental e a utilização inadequada destes tóxicos, resultando na utilização excessiva ou inapropriada de químicos tóxicos e na exposição aos mesmos nos solos, ar e água (OMS, 2014 a e b).

Os habitantes dos meios rurais são geralmente a população mais afetada à exposição acidental, assim como os todos os intervenientes no trabalho agrícola, dado que durante o manuseio, nomeadamente na diluição, na mistura e na aplicação do pesticida, são os principais expostos a este tóxico. A principal fonte de exposição é por via tópica e inalatória aquando da preparação e da aplicação do pesticida através de sprays. Além da exposição através da agricultura, os humanos e animais podem ficar expostos aos pesticidas através da alimentação e da bebida contaminada, uma vez que os pesticidas, assim como os fertilizantes, podem infiltrar-se nos solos e atingir as fontes de água e, consequentemente, contaminar as águas e espécies animais. Por outro lado, os humanos ou outros animais do meio rural, podem alimentar-se de animais contaminados e, consequentemente, estarão expostos aos pesticidas. Este tipo de intoxicação acidental poderá ter um elevado impacto na saúde pública e a exposição a pesticidas poderá, assim, resultar em problemas de saúde graves ou mesmo em morte (OMS a e b).

Estudos realizados a nível europeu mostram que as intoxicações por pesticidas em animais de companhia são documentadas desde os anos 50, sendo que os tóxicos que ocasionam a maior parte das intoxicações acidentais são os carbamatos, os organofosforados (OF), os rodenticidas, a estricnina, o metaldeído e alguns metais e fármacos, dos quais se destacam anti-inflamatórios não esteróides (AINE´s) (Fitzgerald, K.,2006), (Berny, P., 2010a), (Novoty, L., 2011), (Martínez-Haro, M., 2008), (Wang, Y., 2007), (Ruder, M., 2011).

Existem vários tipos de fatores que condicionam o tipo de pesticida a utilizar, como é o caso do tipo de agricultura, a qual difere entre as regiões, e depende também do conhecimento da população sobre a toxicidade de cada composto e do seu acesso a estes tóxicos (Martínez-Haro, M., 2008). Neste

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Daniela Rodrigues Fernandes

Mestrado Integrado em Ciências Farmacêuticas|2013-2014

âmbito, os pesticidas que apresentam maior relevância a nível mundial são os OF, sendo que as intoxicações em animais de companhia mais frequentes ocorrem por exposição a estes compostos (Xavier, F., 2007).

A intoxicação por OF pode resultar da sua utilização na agricultura, de uma exposição acidental ou pode mesmo existir carácter intencional de intoxicação de animais (Xavier, F., 2007). Neste contexto, a utilização generalizada e a facilidade de obtenção de OF resultam num número avultado de intoxicações em animais de companhia, sendo os cães, uma das espécies mais afetadas. Nestes animais, as intoxicações mais comuns além dos OF resultam da exposição a carbamatos e rodenticidas. (Worek, F., 2005), (Berny, P., 2010a). Contudo, é de salientar que a maioria destas intoxicações é acidental (Arnot, A., 2011), (Pachtinger, G., 2008). O risco de contaminação destes animais resulta das caraterísticas do tóxico, da via de exposição e de fatores individuais referentes a cada animal: espécie, raça, idade, sexo, determinadas condições fisiológicas como lactação e gravidez e mesmo doenças, que podem levar, nomeadamente, a uma alteração de enzimas de expressão ou a alteração da biotransformação do tóxico. Assim, dependentemente destes fatores, a resposta a cada tóxico é variável. Os fatores que determinam o risco de contaminação e a gravidade da exposição a esse tóxico, são considerados fatores não individuais, dos quais se destacam as caraterísticas físico-químicas dos tóxicos, as condições ambientais, a alimentação, as vias de exposição através da água, comida e ar, e a exposição prévia a outros tóxicos (Gupta, R., 2012).

1.1. Pesticidas

a. Conceitos gerais

Os pesticidas, também denominados biocidas, são regularmente utilizados na indústria, na agricultura e em propriedades habitacionais (Xavier, F., 2007). Segundo a Organização Mundial de Saúde (OMS), os pesticidas são compostos químicos utilizados na eliminação de pestes, incluindo insetos, roedores, fungos e algumas plantas e, são utilizados na eliminação de vetores, nomeadamente, mosquitos, que poderão provocar doenças em humanos e animais. Os pesticidas são potencialmente tóxicos, não só para as pestes mas também para os humanos e espécies animais e, por isso, devem ser utilizados de maneira adequada e segura (OMS 2014 a e b).

A classificação dos pesticidas difere se tivermos em consideração a sua utilização ou a sua estrutura química. É de referir que, de acordo com a sua utilização, podem ser classificados em inseticidas, fungicidas, herbicidas e rodenticidas. Contudo, se tivermos em linha de conta a sua estrutura química, podem ser agrupados em organoclorados, carbamatos, piretróides e organofosforados (Xavier, F., 2007).

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Um pesticida ideal deve ser específico, seguro e eficaz na eliminação dos parasitas, ter tempo de semi-vida curto, originar metabolitos não tóxicos, e ser barato e de fácil aplicação (Wismer, T., 2012). É de salientar que os pesticidas apresentam inúmeros benefícios na eliminação de parasitas, porém ainda tendem a apresentar elevado perigo e toxicidade quando utilizados de forma inadequada (Peshin, S., 2014).

As intoxicações por pesticidas em humanos têm sido bastante estudadas e são frequentemente reportadas no âmbito da medicina forense, dado que as intoxicações agudas por estes compostos apresentam uma elevada taxa de mortalidade e morbilidade (Wang, Y., 2007), (Peshin, S., 2014). Ao nível de intoxicações em animais de companhia, o estudo destes compostos tem cada vez maior impacto dado que, ao longo dos anos, as intoxicações têm sido cada vez mais acentuadas. Assim, torna-se importante estudar as mesmas, uma vez que torna-se tornam cada vez mais comuns e perigosas (Xavier, F., 2007), (Wang, Y., 2007).

Os pesticidas que estão associados a uma maior frequência de intoxicações em animais de companhia são os inseticidas e os rodenticidas. Estas intoxicações dependem de inúmeros fatores, desde o tipo de agricultura praticado na região, ao conhecimento da população sobre a toxicidade destes produtos e à aquisição dos mesmos a nível do mercado (Martínez-Haro, M., 2008).

b. Inseticidas

1) Organoclorados

Os organoclorados pertencem ao grupo dos organohalogéneos e estão divididos em cinco grupos, dos quais o diclorodifeniltricloroetano (DDT) e os seus análogos são os de maior impacto na população (Carpenter, S., 2014). A utilização destes compostos é maioritariamente a nível da agricultura e a nível doméstico porém, verificou-se na década dos anos 60 um número elevado de intoxicações resultantes da exposição a este tóxico, nomeadamente intoxicações de caráter suicida, criminal e profissional (Calabuig, G., 2004).

A utilização dos organoclorados na agricultura foi proibida, uma vez que a exposição prolongada a estes compostos resulta em imunossupressão, carcinogenicidade, toxicidade reprodutiva e desregulação ao nível endócrino, tanto em animais como em humanos (Storelli, M., 2009), (OMS 2014a). Além dos referidos efeitos carcinogénicos associados a estes compostos, as suas caraterísticas, como a elevada lipossolubilidade e não serem biodegradáveis, também são fatores que influenciaram esta proibição (Calabuig, G., 2004), (Covaci, A.,2002).

A exposição a estes tóxicos acontece por via oral, através da pele e por absorção pulmonar devido à aplicação destes produtos sob forma de pulverização e, devido às suas propriedades lipossolúveis, o tóxico acumula-se no tecido adiposo, o que permite a realização de estudos de

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modo a estimar a magnitude da poluição ambiental, assim como para prever os riscos para a saúde humana (Storelli, M., 2009), (Calabuig, G., 2004).

O mecanismo de ação dos organoclorados varia de acordo com as estruturas químicas deste composto, sendo que os efeitos neurotóxicos associados ao DDT são resultado da modulação da abertura dos canais de sódio, enquanto para outras classes de organoclorados, a ação neurotóxica pode estar associada ao bloqueio dos canais de cloro ou associados a uma desregulação na sinalização intracelular ao nível da transmissão do impulso nervoso (Kanavouras, K., 2008).

Devido à diversidade de estruturas químicas destes compostos, a sintomatologia apresentada pelos animais em caso de intoxicação será diferente para cada tóxico (Klaassen, C., 2008). Geralmente, os sintomas iniciais são comuns e estão relacionados com desordens gastrointestinais, como náuseas, vómitos e diarreia. Posteriormente, desenvolvem-se sintomas mais específicos como confusão, tremores, hiperexcitabilidade e ansiedade, podendo mesmo ocorrer, para casos mais graves, icterícia, anúria e convulsões (Klaassen, C., 2008), (Calabuig, G., 2004). O tratamento para este tipo de intoxicação é baseado na sintomatologia apresentada pelo animal assim como terapia de suporte e, em alguns casos, poderá ser necessário recorrer ao diazepam ou fenobarbital para o controlo das convulsões (Klaassen, C., 2008).

2) Organofosforados e Carbamatos

Os organofosforados e carbamatos são bastante utilizados na agricultura para o controlo de pestes, uma vez que são ativos contra um elevado número de espécies e possuem vantagens em relação aos organoclorados, dado que são biodegradáveis e não tendem a acumular-se no tecido adiposo dos animais (Calabuig, G., 2004). Estes pesticidas estão disponíveis no mercado sob a forma de sprays, pour-ons, orais (antihelmínticos), coleiras, nebulizadores e grânulos (Wismer, T., 2012).

Atualmente, a quantidade de organofosforados e carbamatos disponíveis no mercado é bastante inferior ao que se verificava anteriormente. Ao longo dos anos, estes compostos têm estado associados a inúmeras intoxicações, tanto acidentais, como suicidas e criminais, o que resultou na retirada de alguns organofosforados do mercado. Atualmente, encontram-se disponíveis em Portugal o indoxacarbe, o butóxido de piperonilo, o fiflubenzurão, o imidaclopride, o metilcarbamato de 2-2-dimetil-1,3- benzodioxol-4-ilo e o bendiocarbe (DGV, 2014).

Apesar da diversidade de radicais que os OF e carbamatos apresentam na sua estrutura química, o mecanismo de ação é idêntico, e resulta na inibição da ação da acetilcolinesterase (AChE). Esta enzima é responsável pela destruição de acetilcolina (ACh), o que provoca uma acumulação dos níveis deste neurotransmissor na fenda sináptica e um aumento da sua atividade biológica, principalmente ao nível dos recetores nicotínicos e muscarínicos (Novoty, L., 2011), (Colovic, M., 2013), (Klaassen, C., 2008). A principal diferença entre estes compostos é que nos OF a inibição é considerada irreversível e, por isso, a recuperação da atividade da enzima só ocorre após a síntese de

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novas moléculas, resultando em efeitos tóxicos mais graves, enquanto os carbamatos inibem reversivelmente esta enzima e, por isso, são considerados mais seguros do que os OF (Colovic, M., 2013), (Novoty, L., 2011), (Wismer, T., 2012).

Assim, a sintomatologia associada a estes pesticidas resulta do aumento excessivo dos níveis de ACh o que origina, nomeadamente, uma estimulação no músculo liso e secreção glandular. Ao nível das junções músculo-esqueléticas, o excesso de ACh pode ter ação tanto estimulatória (fasciculação) como inibitória (fraqueza muscular) (Wismer, T., 2012). Os sinais e sintomas caraterísticos de intoxicações por estes compostos encontram-se representados na Tabela 1.

Tabela I - Sinais e sintomas apresentados por OF e carbamatos; adaptado de Wismer, T., 2012; Colovic, M., 2013; Arnot, L., 2011.

A maioria dos carbamatos usados neste contexto não atravessa a barreira hematoencefálica e, assim, não se verifica toxicidade relevante ao nível do SNC na maior parte dos casos (Arnot, L., 2011). O mesmo não se sucede com intoxicações por OF, que ostentam sintomas mais graves ao nível do SNC, principalmente quando o tóxico está em elevada concentração ou quando o composto em causa é bastante tóxico (Wismer, T., 2012). Em casos muito graves, pode ocorrer falha respiratória e/ou paragem cardíaca, podendo o resultado da intoxicação por estes tóxicos ser a morte (Seeger, T., 2006). Os OF e carbamatos são rapidamente absorvidos quando administrados por vias oral, tópica ou inalatória, sendo que os sinais e sintomas clínicos podem ocorrer minutos a horas após exposição (Colovic, M., 2013), (Wismer, T., 2012). A toxicidade e duração dos sinais clínicos dependem da dose, via de administração, espécie animal afetada (os gatos são mais suscetíveis que os cães) e do tratamento. Para além disso, animais mais jovens, velhos e debilitados tendem a sofrer mais efeitos nocivos (Wismer, T., 2012).

Sistema Nervoso Central (SNC) Recetores

Muscarínicos Nicotínicos

Hiperatividade Sialorreia Tremores musculares

Ataxia Bradicardia Fasciculação

Convulsões Poliúria Fraqueza

Coma Defecação Ataxia

Confusão Dispneia Paresia (progressão para paralisia)

Emese Midríase

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Para confirmar a intoxicação aguda por OF ou carbamatos deve ter-se em consideração: historial clínico compatível com o diagnóstico a exposição; medição da atividade da AChE, que em casos de intoxicação, está diminuída; deteção química do inseticida a concentrações que correspondam a intoxicação. A principal amostra, em animais vivos, para confirmar a intoxicação é o sangue e realiza-se uma comparação dos valores de atividade de AChE com os valores de referência para cada espécie (Pérez, J.,2012). Para isso, deve ser realizada a colheita de uma amostra de sangue no início do tratamento e posteriormente, de modo a comprovar a intoxicação por OF (Arnot, L., 2011).

A terapêutica abordada depende do estado em que se encontra o animal (Wang, W., 2014). O tratamento tem como objetivo central bloquear ou modular a atividade ao nível dos recetores muscarínicos e nicotínicos ou reverter a inibição da AChE com a administração de oximas (Thiermann, H., 2007). Geralmente, o tratamento inicia-se com lavagem gástrica se a exposição foi por via oral, seguidamente é importante a reposição de fluidos de modo a manter a hidratação do animal e prevenir hipovolémia e poderá ser necessário recorrer à terapêutica farmacológica com a administração de atropina, um anti-muscarínico, que é o antídoto escolhido para controlar os sintomas muscarínicos. Se ocorrer uma resposta positiva a este fármaco, há a confirmação preliminar de diagnóstico. No caso de o animal apresentar convulsões, pode recorrer-se à administração de diazepam (Arnot, L., 2011), (Klaassen, C., 2008).

3) Piretróides

Os piretróides são muito utilizados em animais de companhia devido à sua elevada eficácia contra artrópodes e, deste modo, as intoxicações por este composto têm sido reportadas tanto em cães como em gatos. Contudo, é de ressalvar que os gatos apresentam maior taxa de intoxicação comparativamente aos cães (Anadón, A., 2009), (Draper, W., 2013). A causa da maior sensibilidade dos gatos a este composto ainda não está totalmente compreendida, todavia, pensa-se que seja resultado da sua deficiência ao nível da enzima glucoronil-tranferase, e que resulta numa taxa de metabolismo lenta (Haworth, M., 2012), (Draper, W., 2013), (Kuo, K., 2013).

As causas de intoxicação mais comuns são a utilização inapropriada, nomeadamente aquando da aplicação de um desparasitante externo contendo permetrina em gatos, a ingestão acidental e a exposição de felinos a estes produtos, nomeadamente em contato com cães aos quais foram administrados produtos com esta substância (Draper, W., 2013), (Haworth, M., 2012), (Anadón, A., 2009). A principal via de exposição é a tópica, mas não se podem excluir outras vias como a oral e a inalatória (Anadón, A., 2009).

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Daniela Rodrigues Fernandes

Mestrado Integrado em Ciências Farmacêuticas|2013-2014

A permetrina é um piretróide sintético e é um dos principais compostos deste grupo. Este químico atua ao nível do SNC e, embora ainda não seja completamente conhecido nenhum mecanismo de ação específico, considera-se que interfira na modulação dos canais de sódio, provocando a abertura dos canais por um longo período de tempo, resultando numa descarga repetitiva nas células e uma hiperatividade do SNC (Haworth, M., 2012), (Brückner, M., 2012), (Anadón, A., 2009).

Os sinais clínicos apresentados em intoxicação com piretróides em animais de companhia são semelhantes para ambas as espécies acima referidas, ocorrendo tremores, hiperestesia, ataxia, midríase, piréxia, desordens gastrointestinais, hipersalivação, vómitos, hiperexcitabilidade, prostração, convulsões e, em casos extremos, pode mesmo ocorrer a morte do animal (Draper, W., 2013), (Anadón, A., 2009), (Wismer, T., 2012). Dependendo da via de administração, os sinais clínicos podem começar entre minutos a horas (24-72h) após a exposição (Anadón, A., 2009), (Haworth, M., 2012). É de realçar que a severidade dos sinais clínicos não está diretamente relacionada com a dose (Kuo, K., 2013).

Atualmente não é comum recorrer a testes práticos de diagnóstico para confirmar a intoxicação por permetrina (Brückner, M., 2012), sendo que o diagnóstico da intoxicação por piretróides é efetuado com base no historial de exposição a esta substância e no desenvolvimento de sinais clínicos (Anadón, A., 2009), (Brückner, M., 2012).

O tratamento da intoxicação por estes compostos em animais envolve a prevenção e atraso na absorção do tóxico. A terapêutica inicial consiste na descontaminação a nível gastrointestinal ou descontaminação tópica (dependendo da via de exposição), instituir terapia de suporte, nomeadamente, para reposição dos fluidos e eletrólitos e tratamento farmacológico para o controlo das convulsões (Anadón, A., 2009), (Haworth, M., 2012). A terapêutica permite geralmente a resolução dos sinais clínicos apresentados pelo animal e estes não apresentam efeitos adversos após o tratamento (Draper, W., 2013).

De modo a evitar casos de intoxicação por piretróides, é necessário alertar e educar os proprietários dos animais para que estes utilizem os produtos contendo piretróides segundo as normas de segurança e ter em conta que nem cães, nem gatos com idade inferior a 6 semanas devem ser expostos a estes compostos (Anadón, A., 2009).

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4) Rodenticidas

i) Hidroxicumarínias e Indanodionas

Os rodenticidas, nomeadamente os anticoagulantes são dos compostos mais utilizados na agricultura e no controlo urbano de roedores, e são responsáveis por um elevado número de intoxicações em cães e em gatos, podendo levar a um aumento da morbilidade e mortalidade destes animais (Pachtinger, G., 2008), (Valchev, I., 2008), (Vandenbroucke, V., 2008). Estes compostos estão classificados geralmente segundo a sua estrutura química em hidroxicumarínicos e indanodionas. Os hidroxicumarínicos foram descobertos em 1940 e têm sido bastante utilizados desde essa altura (Valchev, I., 2008). No presente, continuam a ser muito utilizados e são responsáveis por inúmeros acidentes envolvendo tanto humanos como animais (Valchev, I., 2008). Estes químicos são comercializados sob a forma de produtos que possam atrair os roedores, porém, ao serem inodoros e apresentarem um sabor agradável causado pelo teor de sacarose, estes tóxicos também vão atrair outros animais (Vandenbroucke, V., 2008), (Valchev, I., 2008). A ingestão destes produtos é, assim, uma das principais causas de intoxicação nos animais de companhia (Vandenbroucke, V., 2008), (Valchev, I., 2008). Outra causa associada à intoxicação por rodenticidas é a ingestão de animais vivos ou mortos previamente contaminados com este pesticida. A contaminação por via tópica ou por ingestão de água é pouco frequente (Valchev, I., 2008).

O mecanismo de acção dos hidroxicumarínicos e das indanodionas é idêntico e, independentemente do grupo químico que causa a intoxicação, as manifestações clínicas, as alterações hematológicas e a terapêutica abordada são semelhantes (Valchev, I., 2008).

Os rodenticidas acumulam-se no fígado e vão inibir tanto a ação da vitamina K epoxido redutase como da vitamina K redutase, sendo que a primeira enzima permite a conversão de vitamina K epóxido (forma inativa), em vitamina K quinona (forma ativa) e a segunda enzima permite a conversão da vitamina K quinona em vitamina K1 hidroquinona (forma ativa), sendo que esta é um

cofator importante no ciclo de carboxilação dos fatores de coagulação II, VII, IX e X (figura 1). Pela ação anticoagulante dos rodenticidas, há uma diminuição destes fatores de coagulação no sangue cerca de 12-14h após a administração de rodenticidas, resultando em hemorragias graves (Valchev, I., 2008) (Flood, A., 2006), (Vandenbroucke, V., 2008), (Pachtinger, G., 2008).

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Figura 1 - Mecanismo de ação dos rodenticidas, adaptado de VALCHEV, et al,2008.

Os sinais clínicos iniciais apresentados nestes casos de intoxicação são pouco específicos. Os animais apresentam, nomeadamente, sonolência, fraqueza, anorexia, poliúria, polidipsia, diminuição da perceção e exaustão (Valchev, I., 2008), (Pachtinger, G., 2008). Ao nível da sintomatologia apresentada, os sinais mais caraterísticos são as hemorragias, que podem ocorrer espontaneamente e em qualquer órgão (Flood, A., 2006). Assim é característico o aparecimento de petéquias, equimoses, hematémese, sangramento nasal, vaginal e no canal auditivo, disúria, hematúria e melenas (Valchev, I., 2008), (Pachtinger, G., 2008). É de referir que as consequências da intoxicação por rodenticidas em cães são bastantes graves, uma vez que podem ocorrer hemorragias ao nível da pleura e dos pulmões (Pachtinger, G., 2008), (Valchev, I., 2008). De facto, há inúmeros casos reportados em cães, contrariamente à intoxicação por estes pesticidas em gatos (Kohn, B., 2003).

Inibição Inibição Vitamina K redutase Vitamina K quinona (ativa) Glutamato ϒ-carboxiglutamato Vitamina K epóxido redutase Vitamina K epóxido (inativa) Vitamina K carboxilase dependente

Fatores de coagulação II, VII, IX, X

Vitamina K1 hidroquinona

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O diagnóstico é efetuado com base nos sinais clínicos apresentados pelos animais, em alterações dos parâmetros de coagulação e bioquímicos e através de radiografias (Kohn, B., 2003). As análises laboratoriais ao sangue são essenciais para confirmar o diagnóstico de intoxicação por rodenticidas (Valchev, I., 2008). Uma vez que estes pesticidas se acumulam no fígado, poderiam realizar-se biopsias a este órgão, porém, não é comum recorrer a estes procedimentos invasivos. Por isso, realizam-se outros procedimentos, como a determinação do tempo de protrombina, tempo tromboplastina, concentração de fibrinogénio no plasma e o volume globular (Vandenbroucke, V., 2008).

A terapêutica associada a toxicidade por estes compostos está dependente da situação de cada animal: nos casos mais simples poderá ser apenas necessário recorrer à administração de adsorventes como carvão ativado ou a realização de uma lavagem gástrica (Pachtinger, G., 2008). Noutros casos, recorre-se à oxigenoterapia, transfusões de sangue e administração de vitamina K (Pachtinger, G., 2008), (Flood, A., 2006).

2. Justificação do tema e objetivos

O presente estudo surge da necessidade de tentar conhecer e compreender as principais causas de intoxicação por inseticidas e rodenticidas em animais de companhia e a terapêutica abordada para cada tipo de intoxicação. Em Portugal, a informação a este nível é escassa e raramente é abordada e, neste sentido, torna-se importante a realização deste tipo de estudos que envolvem as áreas da toxicologia e dos medicamentos de uso veterinário.

Assim sendo, o presente trabalho é um estudo retrospetivo que tem com objetivo analisar as intoxicações mais frequentes em animais de companhia, verificar a sintomatologia apresentada e a abordagem terapêutica para cada caso clínico bem como a resposta ao tratamento.

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3. Material e Métodos

3.1. Tipo de Estudo

Como referido no capítulo de justificação do tema, o presente estudo surgiu da necessidade de perceber e compreender as principais causas de intoxicação por inseticidas e rodenticidas em animais de companhia e a terapêutica abordada para cada tipo de intoxicação.

Para isso, foi realizado um estudo retrospetivo e descritivo onde se incluíram os casos clínicos que foram recolhidos num período de 5 meses, de novembro de 2013 até março de 2014, em quatro clínicas veterinárias de três cidades distintas: Covilhã, São Pedro do Sul e Mangualde. Os casos clínicos apresentam informação acerca da sintomatologia apresentada por cada animal, a terapêutica associada e o resultado final.

3.2. Seleção da Amostra e Recolha de Dados

Este estudo retrospetivo tem com objetivo analisar as intoxicações mais frequentes, verificar a sintomatologia apresentada e a abordagem terapêutica para cada caso clínico, assim como a resposta ao tratamento. No total foram obtidos 14 casos com exposição a rodenticidas, permetrina e organofosforados.

Os casos clínicos obtidos têm informação da espécie animal afetada, do tóxico envolvido, da sintomatologia associada, do tratamento efetuado e do resultado final. No total, foram obtidos 14 casos clínicos, em que 2 casos resultaram de intoxicação por permetrina, 4 por rodenticidas e os restantes, ou seja, 8 casos são resultantes de intoxicações por organofosforados.

Como já foi referido, variáveis como a idade e peso não são considerados neste estudo uma vez que em alguns casos não foi possível a identificação dos mesmos. Contudo, considera-se que estes fatores podem influenciar a gravidade da intoxicação, a terapêutica utilizada, o resultado final e as consequências para o animal.

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3.3. Análise de Dados

Os dados recolhidos foram sujeitos a tratamento estatístico recorrendo ao programa Microsoft Office Excel 2007 TM, que também foi utilizado para a realização dos gráficos, tendo sido realizada uma análise estatística do tipo descritivo.

Os parâmetros analisados foram a espécie animal, sexo, sintomatologia apresentada, gravidade da sintomatologia e estado do animal, esquema de tratamento, resposta ao tratamento e situação clínica final. A abordagem terapêutica foi realizada segundo o tipo de intoxicação, a sintomatologia apresentada, o estado do animal e com base na prevenção de possíveis infeções secundárias, sendo que a resposta à terapêutica foi definida como positiva quando o animal sobreviveu, e sem resposta à terapêutica quando o resultado da intoxicação resultou em morte do animal. Não foi possível obter informação sobre o seguimento do estado do animal nos meses posteriores à intoxicação, mas seria interessante observar as possíveis complicações associadas à intoxicação e à terapêutica abordada, principalmente a nível hepático e renal.

A amostra apresenta uma dimensão muito reduzida e, como tal, optou-se por apenas considerar variáveis qualitativas, em que os resultados são apresentados sob a forma de percentagem, enquanto os resultados relativos às variáveis quantitativas não foram apresentados, nomeadamente sob a forma de média e desvio padrão.

4. Resultados e discussão

4.1. Caracterização da Amostra

A amostra foi composta por 14 animais de companhia, 8 cães e 6 gatos e toda a informação obtida referente à possível causa de intoxicação, ao tóxico em causa, à sintomatologia apresentada, ao tratamento não farmacológico e farmacológico abordado e ao resultado final da resposta ao tratamento encontra-se resumida na tabela 2.

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+ n.i. (não identificado)

Caso

Animal/ Sexo/

Idade Intoxicação Tóxico Sintomatologia Tratamento Resultado

1 Gato, 3 anos Rodenticidas n.i. Prostração, desidratação, muscosas ictéricas - Eutanásia

2 Cão, 2 anos Rodenticidas n.i. anorexia desde o dia anterior. Fezes escuras, prostração, Meloxicam e vitamina K (clínica); ulcermin e vit. K (residência). Recuperação

3 Cão, 3 meses OF Diazinão

Coma, dispneia grave, mucosas cianóticas, sialorreia, tremores,

distenção gástrica e intestinal grave

Oxigenoterapia, lavagem gástrica, furosemida, diazepam,

amoxicilina+ác.clavulánico. Eutanásia.

4 Cão, 3 meses OF Diazinão tremores, hipotermia, sialorreia. Convulsões, diarreia, vómitos, amoxicilina+ác.clavulânico, metronidazol, ranitidina, atropina, Lavagem gástrica, oxigenoterapia, diazepam, furosemida, maropitant,ulcermin.

Recuperação

5 Cadela, 2 meses OF n.i. Choque Adrenalina, atropina, amoxicilina+ác.clavulânico, furosemida, diazepam. Morte

6 Gata, 10 anos OF n.i. Sialorreia, tremores, vómitos, fraqueza Atropina, amoxicilina+ác.clavulânico, furosemida, diazepam, ornipural, metoclopramida, ranitidina, oxigenoterapia. Recuperação

7 Gato, n.i. OF n.i. Sialorreia, tremores, vómitos Atropina, amoxicilina+ác.clavulânico, furosemida, diazepam, ornipural, metoclopramida, ranitidina, oxigenoterapia. Recuperação

8 Gato, n.i. OF n.i. Miose, sialorreia, fraqueza, tremores. Atropina, amoxicilina+ác.clavulânico, furosemida, diazepam, ornipural, metoclopramida, ranitidina, oxigenoterapia. Recuperação

9 Cão, 7 anos Rodenticidas Dicumarínicos Anorexia, fraqueza, taquicardia, equimoses, hematémese Metronidazol, amoxicilina+ác.clavulânico, metilprednisolona, ranitidina, furosemida, dipropionato de imidocarb. Morte

10 Cadela, 9 meses OF n.i. Vómitos, distensão abdominal Ranitidina, metronidazol. Recuperação

11 Cão,n.i. OF n.i. Vómitos, fraqueza. Ranitidina, metronidazol, diazepam,ivermectina, ceftazidima. Recuperação

12 Cão, 5 anos Rodenticidas Dicumarínicos Fraqueza, poliúria, anorexia. Metoclopramida, ranitidina, metronidazol, ampicilina, enrofloxacina, vitamina K. Recuperação

13 Gato, 11 meses Piretróides Permetrina

Fasciculações, tremores, midríase,

hipertermia, convulsões, taquicardia.

Diazepam iv e intra-rectal,fluidoterapia, amoxicilina+ác.clavulânico, tiopental, furosemida,

multivitamínicos.

Recuperação

14 Gato, 6 meses Piretróides Permetrina Tremores, convulsões, sialorreia, midríase. Atropina, diazepam, furosemida, neurobion (vit. B), fluidoterapia. Recuperação

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Os estudos sobre intoxicações em animais de companhia por inseticidas e rodenticidas são escassos, por isso, conhecendo as limitações de um estudo retrospetivo, pretendeu-se caraterizar a sintomatologia apresentada pelo animal resultante da exposição a pesticidas e avaliar-se a resposta ao tratamento clínico diferencial para cada tóxico/situação.

Num total de 14 casos clínicos, os cães correspondem à maioria dos casos obtidos resultantes de intoxicações por pesticidas (57%) enquanto os gatos representam 43% (Gráfico 1). Esta diferença pode resultar do fato de os cães serem uma das espécies animais mais afetadas por intoxicações (Berny, P., 2010a).

4.2. Interpretação dos resultados

A maioria das intoxicações por pesticidas pode ocorrer por uso inadequado dos compostos ou de forma acidental. Contudo, é necessário ter em conta que algumas apresentam caráter criminal, embora não seja uma situação comum (WANG, Y., 2006).

Como referido anteriormente, os cães são a espécie mais afetadas. No gráfico 2 estão representados os tóxicos envolvidos nesta espécie que foram incluídos no presente estudo. Num total de 8 cães, foram obtidos 5 casos clínicos de intoxicação por organofosforados, 3 casos em que o tóxico envolvido foram os rodenticidas e não ocorreu nenhum caso de intoxicação por piretróides. Apesar de se saber que os gatos são a espécie mais afetada por piretróidesnão se pode, contudo, descartar a possibilidade de intoxicações por estes tóxicos em cães (Anadón, A., 2009).

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Mestrado Integrado em Ciências Farmacêuticas|2013-2014 Gráfico 2 - Identificação dos agentes que originaram intoxicações em cães.

Os casos clínicos de intoxicação por pesticidas referentes aos gatos apresentam uma proporção diferente do que se observou nos casos clínicos referentes a cães. De facto, como se pode verificar no gráfico 3, num total de 6 gatos que apresentaram intoxicação por pesticidas, os organofosforados foram dos tóxicos que apresentaram maior número de intoxicações nesta espécie, seguindo-se de 2 casos clínicos referentes à permetrina e apenas 1 caso relativamente a rodenticidas.

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A partir dos gráficos 2 e 3 foi possível verificar que os organofosforados representam o grupo de tóxicos que é responsável pelo maior número de causas de intoxicação em animais de companhia, tanto na espécie canina, como na felina. Os rodenticidas constituem o segundo grupo, com 29% dos casos clínicos, e as intoxicações por piretróides, concretamente a permetrina, constituem o terceiro grupo. Apesar de atualmente não são muito comuns os casos de toxicidade por piretróides, estas representam 14% do total de intoxicações por pesticidas, sendo que os mais afetados são gatos (Gráfico 4).

Gráfico 4 - Identificação dos agentes tóxicos na população em estudo.

4.2.2.1 Intoxicação por organofosforados

Nesta amostra, os inseticidas organofosforados representam um dos principais grupos de tóxicos envolvidos nos casos de intoxicação por animais de companhia. Os cães representam a espécie mais afetada, com 5 casos clínicos, correspondendo a 62% do total de 8 intoxicações por este tóxico, enquanto os casos com gatos constituem um número inferior, correspondendo a 38%, ou seja, a 3 casos clínicos (Gráfico 5).

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Mestrado Integrado em Ciências Farmacêuticas|2013-2014 Gráfico 5- Distribuição por espécie das intoxicações por OF.

A elevada percentagem referente às intoxicações por OF relativamente aos outros tóxicos, poderá ser explicada pela facilidade na sua obtenção nas lojas agrícolas e em supermercados, dado que estes tóxicos são muito utilizados na agricultura para o controlo de pestes. Esta situação pode ser justificada pelo facto de os dados serem provenientes de clínicas de cidades pequenas, ainda com uma proximidade significativa a meios rurais, sendo que é principalmente nestes que se verifica uma maior utilização destes compostos.

De acordo com a tabela 2, os casos clínicos referentes às intoxicações por OF, tanto em cães como em gatos, apresentaram caraterísticas semelhantes ao nível da sintomatologia apresentada e da terapêutica abordada, verificando-se que o mecanismo de ação por parte deste tóxico não deverá ser influenciado pela espécie animal, apesar de os gatos serem mais susceptíveis a estes tóxicos (Wismer, T., 2012).

Os OF atuam inibindo irreversivelmente a atividade da AChE, o que causa um aumento dos níveis de ACh na fenda sináptica. Como consequência, a sintomatologia apresentada resulta essencialmente da interferência marcada no sistema nervoso parassimpático e tem caraterísticas específicas resultantes da intoxicação por este composto, nomeadamente tremores, fraqueza e paresia que, ocorrem pela estimulação dos recetores nicotínicos e a sialorreia, miose e bradicardia, que resulta da acção nos recetores muscarínicos (Côte, E., 2007). Em alguns casos mais graves, os animais podem apresentar convulsões ou mesmo coma, que são sinais clínicos apresentados ao nível do SNC e ocorrem normalmente com elevadas doses deste tóxico ou com compostos de elevada toxicidade (Wismer, T., 2012).

No total de 8 casos clínicos de intoxicação por OF, 3 cães representaram os casos mais graves resultantes da intoxicação por estes tóxicos. Há que salientar que, da população em estudo, o caso nº 3 apresentava sintomatologia associada a um estado avançado de toxicidade, incluindo coma e, mesmo com a abordagem terapêutica, não foi possível obter-se resposta, e o animal acabou por falecer. Relativamente ao caso nº 4, este apresentava a sintomatologia caraterística de intoxicações por OF nomeadamente sialorreia, tremores e também convulsões. Contudo, a terapia nesta situação clínica foi eficaz, e o animal

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sobreviveu. Finalmente, o caso nº 5, referente a um cão, este apresentava-se em choque e não foi possível obter-se resposta à terapêutica, resultando na morte do animal.

Relativamente aos outros casos clínicos, a sintomatologia apresentada foi semelhante e com a terapêutica abordada foi possível obter-se uma resposta positiva ao tratamento. Nestas intoxicações por OF, os casos clínicos em que ocorreu resposta positiva ao tratamento correspondem a 75% (6 casos clínicos) e para 25% das situações não foi possível obter-se resposta à terapia farmacológica (Gráfico 6).

Gráfico 6 - Resposta ao tratamento farmacológico nos casos clínicos resultantes das intoxicações por OF.

O tratamento farmacológico deve ser selecionado com base na gravidade da sintomatologia apresentada e a resposta para cada animal pode ser positiva, se o tratamento farmacológico é eficaz no tratamento dos sinais e sintomas, ou contrariamente, pode não se obter resposta farmacológica e o resultado poderá ser a morte do animal. Deste modo, para cada tipo de intoxicação há protocolos que devem ser cumpridos de acordo com o tóxico e com o estado que o animal apresenta.

O diagnóstico de intoxicações por OF para estes 8 casos clínicos baseou-se na sintomatologia apresentada. Os sinais clínicos caraterísticos da intoxicação por OF, nomeadamente os sinais muscarínicos, geralmente permitem detetar a intoxicação por este tóxico. O tratamento inicial destes sintomas tem por base a administração de antagonistas muscarínicos, nomeadamente a atropina, e de medicamentos que possam reverter os efeitos ao nível dos recetores nicotínicos, nomeadamente as oximas (Szinicz, L., 2007), (Seeger, T., 2006). Em humanos recorre-se à utilização de oximas para controlar esses efeitos nicotínicos, porém, nos casos clínicos obtidos, isso não foi efetuado. Alguns estudos demonstram que não é comum a administração desses medicamentos porque ainda não há informação conclusiva relativamente à dose e à espécie, uma vez que a cinética apresentada por este fármaco apresenta muitas diferenças interespécies (Joosen, M., 2013), (Szinicz, L., 2007). Para controlar os efeitos anti-muscarínicos, a escolha de primeira linha é a atropina, a qual deve

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ser administrada imediatamente para diminuir os sintomas apresentados e para evitar possíveis complicações, uma vez que uma estimulação excessiva dos recetores muscarínicos resulta em consequências graves que poderão ser fatais (Arnot, L., 2011). A atropina, sendo o principal antídoto em intoxicações por OF, permite regular os sinais muscarínicos como sialorreia, bradicardia e miose (Arnot, L., 2011), (Gupta, R., 2012). Alguns estudos sugerem que entre espécies há diferenças na ligação da atropina aos recetores muscarínicos, o que pode explicar as diferenças das doses administradas (Bogan, R., 2006).

Para este estudo retrospetivo, a quantidade de atropina administrada não foi considerada por falta de informação.

Nos casos clínicos apresentados, nos animais que apresentaram sinais muscarínicos, como sialorreia e miose, a terapêutica inicial foi, precisamente, a administração de atropina com o objetivo de reduzir a sintomatologia apresentada. Num total de 8 animais, cerca de 62% (que representam 5 casos clínicos, dos quais 3 gatos e 2 cães), recorreu-se à administração de atropina, enquanto para os restantes 3 casos, que representam cerca de 38%, não foi administrada atropina (Gráfico 7). Nos casos clínicos nº 10 e nº 11, como estes não apresentaram sinais muscarínicos, não lhes foi administrado atropina; relativamente ao caso nº 3, como o animal já se encontrava num estado clínico muito grave, a administração de atropina não foi uma das terapêuticas farmacológicas escolhidas, possivelmente pelo fato de não existir uma relação custo-benefício favorável à sua utilização.

Gráfico 7 - Administração de atropina em intoxicações por OF.

Os sinais muscarínicos, apesar de serem muito caraterísticos de intoxicações por OF, não são os únicos apresentados pelos animais. Como está descrito na tabela 2, na maioria dos casos, os animais apresentaram sintomatologia caraterística de desordens a nível gastrointestinal, nomeadamente vómitos, diarreia, distensão abdominal e intestinal grave. Para controlar e reduzir a sintomatologia apresentada pelos animais ao nível gastrointestinal,

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recorre-se à administração de medicamentos para controlar esses sintomas e repor os níveis de eletrólitos perdidos. Na maioria dos casos clínicos obtidos, a metoclopramida foi o anti-emético de escolha para a administração em animais que apresentaram vómitos. Como consequência dos vómitos pode ocorrer gastroenterite severa e a administração de metoclopramida vai ter um papel fundamental como tratamento de suporte (Gupta, R., 2012). Este fármaco é utilizado em animais, tanto pela estimulação da mobilidade ao nível gastrointestinal, como pela sua ação anti-emética (Plumb, D., 2008).

A ranitidina, antagonista dos recetores H2 da histamina, também foi um dos fármacos

muito utilizado para o controlo da sintomatologia a nível gastrointestinal e, dado que diminui a acidez gástrica, também permite uma melhoria do estado do animal e alívio da dor e também tem um papel importante no tratamento e prevenção de úlceras gástricas e duodenais, esofagite e refluxo gastroesofágico (Plumb, D., 2008), (Gupta, R., 2012).

Além dos vómitos e outros efeitos a nível gastrointestinal, é também necessária uma eliminação rápida do tóxico em circulação. A furosemida é um diurético da ansa, sendo um potente diurético e tendo elevada utilidade terapêutica neste âmbito, promovendo a excreção renal do tóxico. Além disso, também pode ser administrada quando se realiza a fluidoterapia, na prevenção do desenvolvimento de edema pulmonar (Gupta, R., 2012), (Suzuki, S., 2013). Este fármaco foi administrado em 6 casos clínicos de um total de 8, ou seja, a administração de furosemida foi efetuada em cerca de 75% dos animais que sofreram intoxicação por OF.

As possíveis complicações associadas a intoxicações de OF são, maioritariamente, a nível hepático, principalmente em gatos e podem também ocorrer pancreatite e outros sintomas como ataxia e hipertermia (Côte, E., 2007). O ornipural foi também administrado a todos os gatos que sofreram de intoxicação por OF. Este protetor hepático possui na sua composição betaína, arginina, ornitina, citrulina e sorbitol e, tem como indicações terapêuticas a insuficiência hepática, a dispepsia, a anorexia e intoxicações (DGV, 2014).

Geralmente, para os animais que sofrem intoxicações por OF é necessário recorrer à terapia de suporte, de modo a estabilizar o animal e a prevenir possíveis complicações resultantes da intoxicação. Nos casos clínicos obtidos, a oxigenoterapia constituiu um dos principais procedimentos a ser realizado, visto que ser demonstra ser eficaz na dispneia provocada pela intoxicação por OF (Wismer, T., 2012). A fluidoterapia e o suporte nutricional também pertencem à terapia de suporte e consistem na administração de produtos multivitamínicos e na reposição de fluidos, nomeadamente repondo água e controlando o balanço dos eletrólitos em circulação. Adicionalmente, pode possuir também um papel importante no tratamento da hipotensão por vezes apresentada pelos animais (See, A., 2009). Como já referido, a terapia de suporte é importante na prevenção de possíveis complicações associadas à intoxicação por OF, nomeadamente infeções que possam ocorrer, principalmente ao nível gastrointestinal. Como tal, é necessário recorrer-se à antibioterapia,

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sendo que, a maioria dos casos clínicos, foi administrada amoxicilina combinada com ácido clavulânico, em 6 animais de um total de 8.

Geralmente, a amoxicilina em combinação com ácido clavulânico é administrada em cães e gatos no tratamento de infeções ao nível do trato urinário, da pele e tecidos moles e também pode ter função terapêutica em casos de pneumonia por aspiração (Tse, Y., 2013), (Plumb, D., 2008).

Em dois casos, nº 10 e nº 11, foi administrada ceftazidima, a qual é utilizada no tratamento de infeções de bactérias gram-negativas particularmente contra Enterobacteriaceae (Plumb, D., 2008). A ivermectina foi co-administrada em conjunto com a ceftazidima nestes 2 casos clínicos referentes a cães, tendo este fármaco como objetivo terapêutico a prevenção de dirofilariose (Plumb, D., 2008). Como a ivermectina também aumenta a libertação de GABA na fenda pré-sináptica, pode ter sido administrada aos dois cães com o objetivo de causar relaxamento muscular e provocar algum efeito sedativo (Plumb, D., 2008).

O metronidazol foi também administrado a 3 cães, sendo geralmente utilizado para reduzir a diarreia. Por causa da intoxicação, o sistema gastrointestinal do animal fica mais susceptível a possíveis infeções e, a administração de metronidazol poderá ser vantajosa uma vez que impede a propagação das bactérias a nível gastrointestinal, nomeadamente a nível local porque pode afetar o baço e o fígado e a nível sistémico, podendo mesmo afetar a circulação sanguínea (Yigitler, C., 2004), (Tse, Y., 2013). Medicamentos contendo este fármaco também são utilizados no tratamento de infeções por Giardia tanto em cães como em gatos e no tratamento de outras parasitoses, como Trichomonas, assim como no tratamento de infeções anaeróbicas entéricas e sistémicas (Plumb, D., 2008).

A antibioterapia administrada depende da situação em que os animais se encontram e da resposta ao tratamento e, nas intoxicações por OF, tem como principal objetivo prevenir possíveis complicações e infeções associados ao tóxico em causa e aos efeitos resultantes da sintomatologia apresentada.

Os animais que se encontram em estados mais graves em intoxicações por OF, geralmente apresentam convulsões, o que se verificou em 6 animais, 3 gatos e 3 cães (tabela 2). Para os animais que apresentam esta sintomatologia, o diazepam é a benzodiazepina de eleição pois provoca relaxamento muscular e possui um efeito sedativo (Arnot, L., 2011), (See, A., 2009). As benzodiazepinas são agonistas dos recetores de ácido gama-aminobutírico (GABA) e, como consequência do aumento dos níveis deste neurotransmissor ao nível dos recetores, o qual possui uma ação inibitória, estes fármacos têm efeitos benéficos no tratamento de convulsões (Gholipour, T., 2009), (Arnot, L., 2011). Nos casos clínicos em que foi administrado atropina verificou-se também a administração de diazepam (tabela 2). Neste contexto, alguns estudos referem que o diazepam é utilizado no tratamento de animais com intoxicação por OF, quando combinado com outras terapias, tendo a capacidade de diminuir as convulsões apresentadas pelos animais num estado de toxicidade mais avançado (RamaRao,

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G., 2014). Também foi reportado que o diazepam e a atropina possuem ação sinérgica, o que aumenta a probabilidade de sobrevivência e prevenção de complicações ao nível do SNC. Visto que, quando combinadas, têm este sinergismo de acção, é de extrema importância controlar a dosagem de cada medicamento e, se necessário, reduzir a quantidade de atropina administrada (Arnot, L., 2011). Em estudos realizados verificou-se que para animais em que foi administrado uma única dose de diazepam e atropina logo após o início dos primeiros sinais clínicos, observou-se que foi suficiente para retardar a progressão da sintomatologia apresentada (Joosen, M., 2013). Porém, de acordo com a literatura, uma única dose pode não ser adequada para o tratamento do animal e a administração repetida da combinação destes dois fármacos demonstrou ser mais eficaz do que apenas a administração isolada de cada um (Joosen, M., 2013).

É importante ainda referir que o diazepam não pode ser administrado sem a atropina, uma vez que pode acentuar a toxicidade dos OF (Gupta, R., 2012).

Neste trabalho, no caso clínico nº 5, referente a um cão que foi exposto a OF e que se encontrava em choque, foi necessário também recorrer à administração de adrenalina, além da administração de atropina, diazepam, furosemida e amoxicilina com ácido clavulânico. Esta administração justifica-se já que a adrenalina é utilizada, também na medicina veterinária para reanimação cardíaca e é administrada por via IV, de modo a causar uma estimulação direta no coração e, nomeadamente, aumentar a pressão sistólica (Plumb, D., 2008).

Quanto à identificação concreta do agente tóxico, num total de 8 casos de intoxicações por OF só foi possível identificar o composto resultante da exposição em 2 cães. Em ambos os casos, o tóxico implicado era o diazinão, tendo sido identificado pelo médico veterinário pelas suas propriedades organolépticas (Gráfico 8).

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No caso clínico nº 3, o animal já se encontrava num estado muito grave, estando mesmo em coma e, apesar do tratamento farmacológico, não se obteve resposta por parte do animal e os donos optaram pela eutanásia. Relativamente ao caso clínico nº 4, o animal apresentava convulsões, distúrbios gastrointestinais, sialorreia e tremores, mas o tratamento farmacológico foi eficaz e o animal apresentou uma resposta positiva. Em ambos os casos, antes de se iniciar a terapia farmacológica, realizou-se lavagem gástrica e oxigenoterapia (tabela 2). Porém, a via de contacto com o tóxico poderá não ter sido a via oral mas sim a via tópica, eventualmente resultante do banho aos animais com um champô à base de diazinão. Este champô, em 2013, à data de intoxicação dos animais, ainda se encontrava em comercialização e poderá ter sido a causa da exposição. Apesar do champô não ser contra-indicado em cães, é necessário ter em atenção o fator de diluição do mesmo, o qual poderá não ter sido respeitado. Este fator, juntamente com a idade dos animais, que tinham apenas cerca de 3 meses, poderão ter influenciado a intoxicação.

No caso clínico nº 4 (que pertence também a um cão que sofreu exposição ao diazinão) foi administrado, além do diazepam, atropina, antibioterapia, furosemida e ranitidina, também maropitant e Ulcermin®. O maropitant pertence ao grupo

farmacoterapêutico dos antieméticos e é utilizado sob a forma injectável, tanto em cães como em gatos, e tem como função controlar as náuseas e vómitos apresentados pelos animais (RCM, 2011), (Tse, Y., 2013). Por sua vez, o Ulcermin®, que contém sucralfato, é

utilizado no tratamento de úlceras gástricas e duodenais, que podem resultar da intoxicação e da sintomatologia apresentada por esta intoxicação (Plumb, D., 2008).

4.2.2.2 Intoxicação por rodenticidas

Os OF representam a maioria das intoxicações em animais de companhia nesta amostra, porém, as intoxicações por rodenticidas em animais de companhia são também bastante frequentes (Berny, P., 2010a). Neste estudo, cerca de 29% dos animais de companhia foram expostos a rodenticidas, sendo que 3 casos clínicos correspondem a cães e apenas 1 é referente a um gato (gráfico 4).

A utilização destes pesticidas é bastante frequente no meio rural, dado que as formulações que os contêm apresentam caraterísticas que atraem os roedores, com a intenção de reduzir a sua população, e têm sucesso significativo. Contudo, é de ter em consideração a atração que também exercem em outros animais, nomeadamente os animais de companhia (Vandenbroucke, V., 2008) . A exposição a animais de companhia por rodenticidas não é, no entanto, de fácil deteção, porque a sintomatologia inicial apresentada não é específica (BERNY, P., 2010b). Os sinais clínicos iniciais são sonolência, fraqueza, anorexia, poliúria, polidipsia, diminuição da perceção e exaustão (Valchev, I., 2008), (Pavhtinger, G., 2008). Posteriormente surgem sinais mais caraterísticos, nomeadamente,

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Tabela I - Sinais e sintomas apresentados por OF e carbamatos; adaptado de Wismer, T., 2012; Colovic,  M., 2013; Arnot, L., 2011
Figura 1 - Mecanismo de ação dos rodenticidas, adaptado de VALCHEV, et al,2008.
Tabela II - Descrição dos casos clínicos
Gráfico 1 - Caracterização da população de estudo por espécie.
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