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CONFRONTANDO HÉRCULES: os desafios à prática judiciária do direito como integridade

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Academic year: 2021

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CONFRONTANDO HÉRCULES: 

​os desafios à prática judiciária do direito 

como integridade 

A.P.P. Martins¹ 

¹Estudante de graduação em Direito pela Universidade Federal do Pará; membro da Liga        Acadêmica Jurídica do Pará; membro do Grupo de Pesquisa Teoria do Direito        Contemporânea,  orientado  pelo  Prof.  Msc.  André  Coelho.  Email:  ana­ppmartins@hotmail.com. 

 

RESUMO 

O presente trabalho visa analisar, no contexto da teoria do direito como integridade de Ronald        Dworkin, o chamado Método de Hércules, conceituando­o e identificando seus principais        objetivos e trunfos em relação ao convencionalismo e ao pragmatismo, em um primeiro        momento, no contexto da Tese da Única Resposta Correta. Em seguida, verificar­se­á se o        referido método realmente atende aos objetivos interpretativos propostos por Dworkin, na        medida em que confrontado com dois principais desafios à sua tese: a heterogeneidade da        história institucional e a vinculação aos valores políticos e morais do juiz.  

 

PALAVRAS­CHAVE: Ronald Dworkin; interpretação; Método de Hércules; Tese da Única        Resposta Correta. 

 

INTRODUÇÃO  

O juiz Hércules de Dworkin é um modelo de juiz ideal, introduzido primeiramente        pelo artigo Hard Cases (1975) e aperfeiçoado posteriormente por sua vinculação ao direito        como integridade de O Império do Direito. Sua primeira utilização procurava demonstrar a        argumentação jurídica aplicada à prática judiciária, uma vez conjugados os conceitos de        propósito legislativo e os princípios da       ​common law  , bem como o que ambos exigem do        intérprete do direito na análise do caso concreto.   

Dworkin descreve o juiz Hércules como “a lawyer of superhuman skill, learning,        patience and acumen” (1975, p. 1083); em virtude destas características, Hércules seria capaz       

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de elaborar teorias de justificação da prática jurídica estabelecida, encontrando seu propósito        ou suas exigências, com o fulcro de solucionar         ​hard cases,   que consistem em situações        judiciais nas quais o juiz encontra duas ou mais interpretações aceitáveis de uma lei ou de um        julgado (DWORKIN, 2004, p. 306). Para isso, Hércules deve partir de uma análise de moral        política para encontrar, dentre as interpretações possíveis, aquela que revele o direito em sua        melhor luz.  

Este compromisso, trazido à tona pelo teoria interpretativista de Dworkin, confere um        duplo papel à interpretação jurídica, vez que identifica como essencial a combinação de        elementos voltados tanto para o passado quanto para o futuro de determinada prática jurídica.        Para tanto, insere o conceito de integridade no direito, que, em seu aspecto adjudicatório, é        um princípio que vincula o jurista a decidir com fulcro no direito existente, exigindo deste que        “ponha à prova sua interpretação de qualquer parte da vasta rede de estruturas e decisões        políticas de sua comunidade, perguntando­se se ela poderia fazer parte de uma teoria coerente        que justificasse essa rede como um todo” (DWORKIN, 2003, p. 294). Assim, a integridade        requer que regras diferentes de um mesmo ordenamento jurídico reflitam e justifiquem        coerentemente os mesmos princípios morais e políticos (BALKIN, 1987, p. 402).  

Significa dizer que o trabalho interpretativo de Hércules, para que se adeque aos        mandamentos do direito enquanto integridade, deve levar em consideração dois aspectos: a        história institucional relativa àquela prática jurídica em questão ­ o modo como os juízes        anteriores decidiram a respeito do mesmo problema ­ e o apelo moral que a tese adotada pela        atual decisão deve conter, a saber, a justificação da comunidade de princípios vigente no        momento do exercício interpretativo. 

Logo após identificar o papel da interpretação jurídica, Dworkin traz à tona uma        afirmação importante quanto ao direito como integridade. Por se tratar de um modelo de        racionalidade jurídica voltado para os fundamentos do direito, afirma Dworkin ser o direito        como integridade “mais inflexivelmente interpretativo que o convencionalismo ou o        pragmatismo”, versões adaptadas do positivismo e do realismo jurídico norte­americano,        respectivamente, à teoria interpretativista.  

Estas últimas, segundo Dworkin, não passariam de interpretações em si, isto é,        concepções de direito que propõem modelos específicos para a interpretação do direito e a        deliberação judicial. Embora destituídos do problema do aguilhão semântico, que        caracterizavam suas teorias semânticas equivalentes, o convencionalismo e o pragmatismo       

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apresentariam uma abrangência interpretativa muito maior, vez que não associam a        necessidade de coerência com as decisões do passado à imperatividade de justificação da        comunidade jurídica atual, vinculando­se apenas a um destes elementos. 

A integridade, por sua vez, exige que a comunidade tome suas decisões com base nos        princípios que informam a nossa posição compartilhada do que significa a justiça, a equidade        e o devido processo legal naquele momento histórico­político específico. Esta concepção        rejeita a ideia de que todas as interpretações dentro da moldura ­ ou dentro da zona de foco e        de penumbra ­ são juridicamente autorizadas, vez que autorizado está o magistrado        competente a decidir a respeito.  

Destarte, como consequência do compromisso assumido com o princípio da        integridade, só pode haver apenas uma interpretação adequada da prática jurídica, havendo,        portanto, apenas uma resposta certa para as questões jurídicas. Esta única resposta será, para        Dworkin, o resultado construtivo do processo de interpretação realizada pelo juiz, após        assumir a obrigação de coerência com as decisões anteriores e a sua justificação pela análise        dos propósitos defendidos pela comunidade de princípios do atual momento histórico.        Hércules, portanto, tem o poder de trazer à tona uma única resposta correta para cada       ​hard  case que julgar (ROSENFELD, 2005). Ao mesmo tempo, porém, Dworkin reconhece, como        afirma Lucy (2004) que “accounts of law offered in the course of both adjudication and        theorizing depend upon the values of the adjudicator or theorist and that values differ        significantly between members of the same community”. Isso, para Dworkin, não consistiria        em uma contradição dentro da denominada Tese da Única Resposta Correta, uma vez que        tanto a decisão do juiz quanto as críticas a ela dirigidas devem se basear em princípios de        moralidade política, presumindo estas que há uma resposta correta ao caso controvertido e        que o juiz não foi capaz de atingi­la (BALKIN, 1987, p. 408)..  

No entanto, a teoria interpretativa do direito de Dworkin, bem como, por        consequência, seu juiz ideal, são frequentemente confrontados com dois principais desafios,        levantados por seus críticos. O primeiro, relativo ao critério de adequação do direito como        integridade, questiona­se se, em alguma medida, é possível que os juízes passem a emular        Hércules em sua prática judiciária, haja vista que as decisões tomadas pelos magistrados do        passado são completamente das jurisprudências revisitadas pelo juiz sobrehumano. Destarte, o        primeiro desafio expõe Hércules à realidade das decisões judiciais, em que juízes reais,        desconhecendo as decisões de seus consortes e desprovidos de tempo, habilidade ou paciência       

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para exaurir as exigências teóricas de uma decisão judicial íntegra nos termos de Dworkin,        escrevem uma história institucional heterogênea e caótica, chegando a discordar do mesmo        conjunto de princípios regentes do ordenamento jurídico num mesmo período histórico. 

O segundo desafio questiona Hércules a respeito da suposta não­contradição entre a        Tese da Única Resposta Correta e o método em que juízes decidem, fundamentados em suas        convicções morais e políticas, a respeito daquilo que revela o direito em sua melhor luz. Tal        questionamento é melhor contextualizado quando se considera que o esforço de Dworkin em        reconstruir a prática judicial de sistemas jurídicos complexos vincula­se a uma filosofia        política específica ­ o liberalismo político ­, que se posiciona como rival em relação a certas        teorias do direito e procura aplicar seus princípios à prática judiciária interpretativa, seja da        common law

​ , da lei ou da Constituição (ROSENFELD, 2005).  

Esta tarefa, ainda segundo Rosenfeld (2005), tem como principal resultado       “the  reconceptualization of law as a principle      ​­based unified system of regulation consistent with        Dworkin's moral and political vision — what we may, in short, refer to as ‘the one law        principle’”. Desta forma, o segundo obstáculo que se propõe à aplicação do método de        Hércules consiste em verificar que, devido à pluralidade de concepções éticas e políticas a        respeito da boa vida e dos princípios que regem a política e a moral de uma comunidade, não        há que se falar de única resposta correta para Hércules e para os juízes que o emulam.  

O presente trabalho, portanto, tem como objetivo verificar se Hércules realmente        atende aos objetivos interpretativos propostos por Dworkin, na medida em que confrontado        com dois grandes desafios, em suma, a heterogeneidade da história institucional e a        vinculação da decisão judicial aos valores políticos e morais do juiz. Da mesma forma,        procura­se averiguar em que medida estes desafios foram respondidos por Dworkin e seus        seguidores, além de observar os problemas persistentes no contexto do debate contemporâneo        da teoria do direito, a partir da leitura analítica dos argumentos de seus críticos. 

 

METODOLOGIA  

O método de pesquisa utilizado é bibliográfico, consistindo na leitura da obra “O        Império do Direito” de Ronald Dworkin, com particular atenção a seu capítulo 6, bem como        de livros e artigos de comentadores e críticos das mesmas.  

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REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS  

BALKIN, Jack M., Taking Ideology Seriously: Ronald Dworkin and the CLS Critique (1987).        Faculty Scholarship Series.

      Paper  293.  Disponível  em: 

http://digitalcommons.law.yale.edu/fss_papers/293Acesso em: 20 set. 2016.   

 

DWORKIN, Ronald.   ​Levando os Direitos a Sério. ​Trad. Nelson Boeira. São Paulo: Martins                Fontes, 2002.  

   

__________, Ronald.    ​O Império do Direito. ​Trad. Nelson Boeira. São Paulo: Martins              Fontes, 2003. 

   

GUEST, Stephen.   ​Ronald Dworkin​. Trad. Luis Carlos Borges. Rio de Janeiro: Elsevier,        2010.  

   

LUCY, William. Adjudication. In:        ​The Oxford Handbook of Jurisprudence and            Philosophy of Law​. Edited by Jules L. Coleman, Kenneth Einar Himma, and          Scott J. Shapiro. Oxford: Oxford University Press, 2004. 

   

MARMOR, Andrei (edit.).     ​Direito e Interpretação​: ensaios de filosofia do direito. Trad.          Luis Carlos Borges. São Paulo: Martins Fontes, 2000.   

   

ROSENFELD, Michel, « Dworkin and the One Law Principle: A Pluralist Critique »,       ​Revue 

internationale de philosophie 3/2005 (n° 233), p. 363­392. Disponível em:         

www.cairn.info/revue­internationale­de­philosophie­2005­3­page­363.htm​. Acesso em: 19       

set. 2016.  

   

SOLUM, Lawrence B., "The Unity of Interpretation" (2010).       ​Georgetown Law Faculty      Publications  and  Other  Works​.  Paper  855.  Disponível  em:  http://scholarship.law.georgetown.edu/facpub/855. Acesso em: 23 set. 2016. 

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