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FUNDAÇÃO UNIVERSIDADE FEDERAL DE RONDÔNIA – UNIR CAMPUS DE CACOAL DEPARTAMENTO ACADÊMICO DO CURSO DE DIREITO FRANKLIN SILVEIRA BALDO

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FUNDAÇÃO UNIVERSIDADE FEDERAL DE RONDÔNIA – UNIR

CAMPUS DE CACOAL

DEPARTAMENTO ACADÊMICO DO CURSO DE DIREITO

FRANKLIN SILVEIRA BALDO

A LEI DA FICHA LIMPA E AS ELEIÇÕES 2010

Trabalho de Conclusão de Curso Monografia

(2)

A Lei da Ficha Limpa e as Eleições 2010

Por:

FRANKLIN SILVEIRA BALDO

Monografia apresentada à Universidade Federal de Rondônia – UNIR – campus de

Cacoal, como requisito parcial para a obtenção do grau de Bacharel em Direito, elaborada sob a orientação do professor Me. Gilson Tetsuo Miyakava.

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BALDO, Franklin Silveira.

A Lei da Ficha Limpa e as Eleições 2010 / Franklin Silveira Baldo. - Cacoal: UNIR, 2010.

61 folhas; 30 cm.

Orientador: Gilson Tetsuo Miyakava

Monografia (graduação) – Universidade Federal de Rondônia, Campus de Cacoal, 2010.

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FUNDAÇÃO UNIVERSIDADE FEDERAL DE RONDÔNIA – UNIR CAMPUS DE CACOAL

DEPARTAMENTO ACADÊMICO DO CURSO DE DIREITO

A monografia intitulada “A Lei da Ficha Limpa e as Eleições 2010, elaborada pelo acadêmico Franklin Silveira Baldo, foi avaliada e julgada aprovada pela banca examinadora formada por:

_________________________________________________ Prof. Me. Gilson Tetsuo Miyakava– Orientador – UNIR

_________________________________________________ Prof ... – Membro - UNIR

_________________________________________________ Prof ... – Membro - UNIR

___________ Média Final

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A democracia é a pior forma de governo, exceto todas as outras que têm sido tentadas de tempos em tempos.

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RESUMO

BALDO, Franklin Silveira. A Lei da Ficha Limpa e as Eleições 2010. 61 folhas. Trabalho de Conclusão de Curso: Universidade Federal de Rondônia – Campus de Cacoal – 2010.

Este trabalho monográfico aborda aspectos de eficácia da lei no tempo relacionados à Lei da Ficha Limpa – Lei Complementar nº 135/2010. Parte-se da revisão teórica dos institutos da elegibilidade e inelegibilidade e dos princípios da anualidade eleitoral e irretroatividade da lei para confrontrar-los com a Lei da Ficha Limpa, averiguando a possibilidade da aplicação dessa lei às Eleições 2010. Por fim, conclui-se que a Lei da Ficha Limpa não poderia ser aplicada às Eleições 2010 em razão desses princípios.

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ABSTRACT

BALDO, Franklin Silveira. The Clean Record Act and the Elections 2010. 61 leaves. End of Course Work: Federal University of Rondonia - Campus Cacoal - 2010.

This monographycal work covers aspects of effectiveness of the law in time and related Clean Record Act - Complementary Law No. 135/2010. It begins with a theoretical review of eligibility, ineligibility and the principles of the annuality of electoral law and the ex post facto law for them confrontations these to the Clean Record Act, verifying the possibility of applying this law to the Brazilian elections of 2010. It concludes that the Clean Record Act could not be applied in the 2010 elections because of these principles.

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LISTA DE ABREVIATURAS, SIGLAS E SÍMBOLOS

§ Parágrafo

ADI Ação Direta de Inconstitucionalidade ARENA Aliança Renovadora Nacional

art. artigo

CF Constituição Federal

LC Lei Complementar

MDB Movimento Democrático Brasileiro NBR Norma Brasileira

nº número

(11)

SUMÁRIO

INTRODUÇÃO ... 11

1 A LEI DA FICHA LIMPA ... 13

2 INELEGIBILIDADE ... 19

2.1 ORIGEM HISTÓRICA ... 19

2.2 ELEGIBILIDADE ... 20

2.3 CONDIÇÕES DE ELEGIBILIDADE ... 21

2.4 INELEGIBILIDADES ... 22

2.4.1 Inelegibilidades absolutas e relativas ... 24

2.4.2 Inelegibilidades inatas e cominadas ... 24

3 PRINCÍPIO DA ANUALIDADE ELEITORAL ... 25

3.1 HISTÓRICO ... 25

3.2 O OBJETIVO DA NORMA ... 25

3.3 A NATUREZA JURÍDICA ... 27

3.4 PROCESSO ELEITORAL ... 27

4 PRINCÍPIO DA IRRETROATIVIDADE DA LEI ... 30

4.1 DIREITO ADQUIRIDO ... 32

4.2 ATO JURÍDICO PERFEITO ... 32

4.3 COISA JULGADA ... 33

4.4 A IRRETROATIVIDADE DA LEI PENAL MAIS GRAVE ... 34

4.4.1 O significado de pena ... 36

5 A LEI DA FICHA LIMPA FRENTE AO PRINCÍPIO DA ANUALIDADE ELEITORAL ... 37

5.1 O PRINCÍPIO DA ANUALIDADE ELEITORAL E SUA APLICAÇÃO ÀS LEIS COMPLEMENTARES ... 37

5.2 INELEGIBILIDADE E ALTERAÇÃO NO PROCESSO ELEITORAL ... 38

5.3 O CASUÍSMO ELEITORAL E A LEI DA FICHA LIMPA ... 39

6 A LEI DA FICHA LIMPA E O PRINCÍPIO DA IRRETROATIVIDADE DA LEI ... 42

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6.2 ATO JURÍDICO PERFEITO ... 43

6.3 COISA JULGADA ... 45

6.4 IRRETROATIVIDADE DA LEI PENAL ... 46

CONSIDERAÇÕES FINAIS ... 50

REFERÊNCIAS ... 52

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INTRODUÇÃO

Este trabalho aborda aspectos de direito intertemporal aplicados à Lei Complementar (LC) nº 135/2010 - Lei da Ficha Limpa. Essa lei criou e majorou modalidades de inelegibilidade alterando a LC nº 64, de 18 de maio de 1990.

Mesmo quando ainda era mero projeto de lei complementar, discutia-se se a nova lei poderia ser aplicada às Eleições 2010, pois não havia possibilidade dela ser publicada com a antecedência mínima de um ano desse pleito e, por isso, em tese, infringiria o princípio da anterioridade da lei eleitoral, consagrado no art. 16 da Constituição Federal (CF) de 1988.

Por outro lado, a Lei da Ficha Limpa por estabelecer restrições ao direitos dos cidadãos de concorrerem a cargos públicos, era contestada era frente ao princípio constitucional da segurança jurídica ou da irretroatividade da lei.

A incorreta aplicação desses princípios constitucionais à Lei da Ficha Limpa tratar-se-ia de grave injustiça, que ainda agrava-se pela possibilidade de minar a legitimidade do sistema de escolha dos representantes. Por isso é crucialmente importante o estudo desses aspectos.

Objetiva-se com este trabalho, de forma geral, definir o âmbito temporal de incidência da Lei da Ficha Limpa. Para isso, será necessário realizar uma revisão teórica conceitual de direitos políticos e dos princípios de direito intertemporal, em especial o princípio da anterioridade eleitoral e da irretroatividade da lei, para, munidos desses conhecimentos analisar aspectos da citada lei que eventualmente conflitem com tais princípios.

Utilizar-se-á, para tal, o método dedutivo. Pretende-se através de rigorosa análise dos tema chegar a premissas seguramente verdadeiras, para assim, chegar a conclusões necessariamente corretas.

O sistema de chamada de referências utilizado é o autor-data seguindo-se as normas da NBR 10520:2002.

O primeiro capítulo faz uma breve apresentação da Lei da Ficha Limpa e de seu surgimento.

No segundo capítulo, disseca-se o conceito de inelegibilidade e demais institutos necessários à sua compreensão, tais como elegibilidade e condições de elegibilidade.

No terceiro capítulo, o princípio da anualidade eleitoral é estudado. Além de buscar a origem histórica e o fim teleológico desse instituto, procurou-se analisar a minucias o sentido do termo processo eleitoral empregado pela constituição.

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adquirido, o ato jurídico perfeito, a coisa julgada e a irretroatividade da lei penal.

No quinto capítulo é verificada a possibilidade de aplicação do princípio da anualidade eleitoral à Lei da Ficha Limpa.

O sexto capítulo trata da verificação da possibilidade de incidência do princípio da irretroatividade da lei à Lei da Ficha Limpa.

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1 A LEI DA FICHA LIMPA

A Lei da Ficha Limpa – nome pelo qual se apelidou a LC nº 135/2010 – alterou a Lei de Inelegibilidades – LC nº 64 de 1990 – criando hipóteses e majorando os prazos de inelegibilidades.

Antes da publicação dela, a Lei de Inelegibilidades cominava à maioria dos casos o prazo de três anos de inelegibilidade. Quando se tratava, por exemplo, de inelegibilidade em razão de condenação por abuso do poder econômico ou político em campanha o termo inicial do prazo era a data da eleição em que ocorreu o abuso. Ora, no Brasil os mandatos duram, em regra, quatro anos, uma inelegibilidade que durasse menos tempo do que o próprio mandato não impediria que na próxima eleição o candidato, mesmo condenado por abuso do poder econômico no pleito anterior, disputasse novamente o mesmo cargo. Por esse motivo, Gomes (2008 p. 149) criticou severamente a exiguidade do prazo: “Nesse sentido, a ineficácia da regra legal é de todo censurável, sendo evidente não se tratar de sansão séria, mas meramente simbólica”.

A nova lei sanou essa ineficiência. O prazo de inelegibilidade agora é de oito anos. Ela trouxe também novas hipóteses geradoras de inelegibilidade, como a renúncia de cargo político após o oferecimento de denúncia que em tese poderia resultar na cassação do mandato.

Diante das ineficácias da Lei das Inelegibilidades então vigente, o Movimento de Combate a Corrupção Eleitoral (MCCE). começou uma campanha para um projeto de iniciativa popular.

O MCCE, preenchendo os critérios para proposição de projeto de lei de inciativa popular, conseguiu em todo Brasil mais de 1 milhão e 300 mil assinaturas para o projeto. No dia 29 de setembro de 2009, com ampla cobertura da imprensa nacional, o texto foi entregue ao então presidente da Câmara dos Deputados, Michel Temer. Tanta divulgação atraiu a atenção de parlamentares ávidos em ganharem notoriedade na onda do Projeto Ficha Limpa. Talvez por isso a tramitação do projeto tenha sido tão meteórica. Hoje muitos disputam os louros pela aprovação da Lei, entre eles os dois candidatos a Vice-presidência da República que disputaram o segundo turno nas Eleições 2010: Michel Temer, então Presidente da Câmara dos Deputados, e Índio da Costa, que foi relator do projeto na Câmara.

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Câmara que foi enviado ao Senado no dia 13 de maio de 2010.

Nesse texto os incisos que cominavam inelegibilidade em razão da Lei estavam no passado – por exemplo, “os que tenham sido condenados” ou “tenham tido contas rejeitadas” – no Senado, por proposta do Senador Demóstenes Torres, essas expressões foram alteradas para o tempo futuro para “os que forem condenados”, ou “tiverem contas rejeitadas”. A justificativa para a alteração foi a padronização do tempo verbal. O projeto não retornou para a Câmara dos Deputados para a apreciação dessas mudanças sob justificativa de que as alterações eram apenas de forma, não de conteúdo. Com isso, geraram-se muitos questionamentos se a Lei não estaria a partir daí contaminada de inconstitucionalidade formal por não respeitar o devido processo legislativo no que tange ao sistema bicameral. Há, inclusive, quem acredite que o motivo oculto de o projeto não ter retornado à Câmara foi justamente para que a lei se tornasse inconstitucional (SILVA, José Renato, 2010).

A lei então foi enviada ao Presidente da República, que a sancionou no dia 4 de junho de 2010, sendo publicada no Diário Oficial da União no dia 7 de junho de 2010, passando a vigorar imediatamente.

Mesmo antes da sua publicação pairava a dúvida se a Lei deveria ou não ser aplicada às Eleições 2010. O motivo mais evidente é que a primeira vista essa aplicação feriria o princípio constitucional da anualidade eleitoral presente no art. 16 da CF. Veja-se o referido artigo:

Art. 16. A lei que alterar o processo eleitoral entrará em vigor na data de sua publicação, não se aplicando à eleição que ocorra até um ano da data de sua vigência. (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 4, de 1993).

Esse princípio impede a aplicação da Lei que altera o processo eleitoral nas Eleições que se realizam até um ano após a aplicação da Lei. Restaria saber, portanto, se a LC nº 135/2010 efetivamente alterou o processo eleitoral, se sim, ela não deveria ser aplicada às eleições do dia 3 de outubro de 2010. Ocorre que não há interpretação autêntica para o que seja processo eleitoral e a jurisprudência é cambaleante.

Diante dessa dúvida o Senador Arthur Virgílio Neto ajuizou no Tribunal Superior Eleitoral (TSE) a Consulta nº 1120-26.2010.6.00.0000 que questionou se uma Lei que alterasse as inelegibilidades até o dia 5 de julho, poderia ser aplicada às eleições do mesmo ano. No dia 10 de junho de 2010 o TSE, seguindo o voto do relator Min. Hamilton Carvalhido, respondeu favoravelmente a consulta, vencido o Ministro Marco Aurélio de Melo que respondeu negativamente.

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direito adquirido, o ato jurídico perfeito e a coisa julgada e proíbe a retroação de lei penal para prejudicar o réu. Por isso, uma norma que comine inelegibilidades em razão de fatos ocorridos antes de sua criação, gera questionamentos quanto à quebra dessas proteções constitucionais.

Por sua vez, o Deputado Federal Ilderlei Cordeiro, ajuizou a consulta nº 1147-09.2010.6.00.0000 que além da questão formulada pelo Senador Arthur Virgílio Neto também questionava, em síntese, se uma lei que alterasse as hipóteses de inelegibilidades seria aplicável a fatos anteriores a sua publicação. No dia 17 de junho de 2010 o TSE mais uma vez respondeu afirmativamente seguindo o voto do relator Ministro Arnaldo Versiani e novamente vencido o Ministro Marco Aurélio de Melo que foi contra a aplicação da lei nesses casos e o Ministro Marcelo Ribeiro, que era contra a aplicação quando a inelegibilidade representasse sansão.

Resultado: para o TSE a Lei da Ficha Limpa deveria ser aplicada às Eleições 2010 e afetaria fatos ocorridos antes de sua publicação.

A polêmica não se encerrou por aí. As respostas às consultas pelo TSE tem caráter administrativo-informativo e não vincula órgãos hierarquicamente inferiores como os Tribunais Regionais Eleitorais (TRE's) e Juízes Eleitorais, nem o próprio TSE (AMORIM, 2007).

No registro das candidaturas às Eleições, a maior parte dos Tribunais Regionais Eleitorais seguiu o entendimento do TSE, e indeferiram as candidaturas dos “ficha sujas”. O primeiro a contrariar o TSE, foi o TRE-MA entendendo que a Lei da Ficha Limpa é inaplicável a fatos anteriores a sua publicação, logo foi seguido pelos TRE's de Roraima, Rio Grande do Sul, Pará, Tocantins e Sergipe (COELHO, 2010). Todavia essa aplicação foi claudicante, tanto que o procurador regional eleitoral do Tocantins, João Gabriel Moraes de Queiroz (2010), chegou a dizer que naquele estado "a Ficha Limpa está sendo aplicada apenas quando convém, em casos de políticos menores".

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todos os outros recursos, no sentido de que a Lei da Ficha Limpa é totalmente aplicável às Eleições 2010.

Como a matéria envolve princípios constitucionais, havia a possibilidade de recurso extraordinário ao Supremo Tribunal Federal (STF), aonde inevitavelmente chegaram os recursos oriundos das decisões do TSE.

O primeiro caso a ser julgado pela Excelsa Corte – em 23 de setembro de 2010, portanto, já a poucos dias do primeiro turno das eleições - foi o do candidato a governador do Distrito Federal, Joaquim Roriz. Em 4 de julho de 2007, ele havia renunciado ao cargo de senador da república para evitar uma possível cassação de seu mandato em razão de suposto desvio de dinheiro público ocorrido durante seu mandato como Governador no Distrito Federal (CONJUR, 2007). Na época, essa manobra lhe livrava da inelegibilidade cominada no art. 1º, inciso I, alínea b da LC nº 64/90. Com a Lei da Ficha Limpa a simples renúncia passou a ensejar a inelegibilidade de acordo com o texto da nova alínea k (BRASIL, 1990), in verbis:

Art. 1º São inelegíveis: I - para qualquer cargo: [...]

k) o Presidente da República, o Governador de Estado e do Distrito Federal, o Prefeito, os membros do Congresso Nacional, das Assembleias Legislativas, da Câmara Legislativa, das Câmaras Municipais, que renunciarem a seus mandatos desde o oferecimento de representação ou petição capaz de autorizar a abertura de processo por infringência a dispositivo da Constituição Federal, da Constituição Estadual, da Lei Orgânica do Distrito Federal ou da Lei Orgânica do Município, para as eleições que se realizarem durante o período remanescente do mandato para o qual foram eleitos e nos 8 (oito) anos subsequentes ao término da legislatura;

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tribunal havia julgado constitucional a norma, pois não havia maioria absoluta dos membros da corte no sentido contrário. Por fim, a corte se furtou a decidiu e suspendeu o julgamento aguardando a nomeação do 11º ministro.

O esforço desprendido no julgamento do caso Roriz foi em vão. No dia seguinte ao julgamento, Joaquim Roriz renunciou a sua candidatura para que sua esposa Weslian Roriz concorresse em seu lugar. O recurso foi extinto sem julgamento do mérito por perda do objeto.

No dia 3 de outubro ocorreu o primeiro turno das Eleições. As candidaturas que estavam sub judice, em conformidade com o artigo 16-A, parágrafo único, da Lei 9.504/97, não tiveram seus votos computados. Esses candidatos ficaram sujeitos a uma situação inusitada: os votos que receberam dos eleitores nas urnas dependeriam da confirmação do Poder Judiciário. Não só isso, caso fosse decidido pela validade dessas candidaturas esses votos poderiam mudar o resultado não só dos próprios recorrentes, mas de todos os outros candidatos ao mesmo cargo, causando confusão e dúvida no eleitorado (BARRETO, 2010).

No dia 27 de outubro (o segundo turno seria no dia 31) a Lei da Ficha Limpa estava novamente em pauta no STF. Novamente um recurso extraordinário. O recorrente era Jader Barbalho. Em 2001 ele havia renunciado a cadeira de ocupava na Câmara dos Deputados após se ver envolvido em denúncia de desvio dinheiro da Superintendência de Desenvolvimento da Amazônia (Sudam) e do Banco do estado do Pará (Banpará) (HAIDAR, 2010). Mesmo assim, nas eleições de 2002 e de 2006 seu registro de candidatura foi aceito, e ele acabou sendo eleito deputado federal nas duas eleições. Mas em 2010 seu registro de candidatura foi rejeitado pelo TRE-PA pela aplicação da Lei da Ficha Limpa, por isso ele recorria.

Nessa sessão os votos dos ministros não mudaram. Todos permaneceram com as mesmas opiniões que possuíam no julgamento do caso Roriz. O décimo primeiro ministro não havia sido nomeado, o empate continuava. Mas os ânimos foram igualmente exaltados (HAIDAR, 2010). Desta vez, porém, o Ministro Celso de Melo sugeriu que se aplicasse analogicamente o artigo 205, parágrafo único, I, do Regimento Interno do STF; com relação ao processamento de mandado de segurança contra ato do Presidente da STF aquela norma determina que se houver empate ao final da votação, o ato impugnado deverá ser mantido. Essa foi a solução dada pela corte para finalizar o julgamento.

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violará o princípio do juiz natural, porque será escolhido para dirimir um conflito específico em determinado sentido ou em outro".

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2 INELEGIBILIDADE

A escolha dos representantes é processo fundamental em uma democracia. As tarefas de representar o povo e guiar a coisa pública afetam sobremaneira o desenvolvimentos social e econômico de uma nação, que por consequência são fortemente afetados pela capacidade de seu povo escolher representantes probos. As restrições de acesso aos cargos públicos a algumas pessoas se justificam nessa linha de raciocínio, que foi muito bem delineado por Costa, E. (1994 p. 45) no seguinte trecho:

“O instintivo anseio de perfeição da ordem política e de sobrevivência da opção constitucional induz o legislador a afastar do acesso ao governo da coisa pública os que, por qualquer título, possam comprometer a dignidade dos cargos eletivos e a manutenção dos ideais constitucionais.”

Surge, assim, uma necessidade não só de escolher representantes, mas de escolhê-los bem. Assim, a fim de proteger a coisa pública criam-se critérios que determinam quem pode ser candidato a gerir a coisa pública.

2.1 ORIGEM HISTÓRICA

Por toda a história, os povos democráticos tiveram a preocupação estabelecer quem poderia e quem não poderia exercer o cargo público. Os critérios adotados, porém, não foram muito uniformes. Sexo, idade, local de nascimento, religião, posses, todas essas características já foram utilizadas para excluir alguns do controle da coisa pública.

Na Atenas clássica, por exemplo, para que um homem ateniense tivesse lugar na assembleia dos cidadãos teria que demonstrar que seus pais eram atenienses, ter um voto de seus vizinhos e não ter sido declarado culpado por um crime contra o Estado (OBER, 2001). . No Império Romano, o direito de exercer cargos públicos era chamado de ius honorum

(expressão até hoje utilizada na doutrina), e fazia parte de um conjunto de direitos chamado de ius civile era reservado apenas aos cidadãos romanos (OLIVEIRA, 1998). E mesmo estes poderiam perdê-lo se não observassem seus deveres religiosos, essa é a lição de Coulanges (2006) em seu clássico A Cidade Antiga: “Em Roma, para gozar de direitos políticos, era necessário assistir à cerimônia sagrada da lustração(3). O homem que não observasse essa regra, isto é, que não tomasse parte na oração comum e no sacrifício, deixava de ser cidadão até o lustro seguinte.”

No Brasil Império, a nomeação ao cargo de deputados era defesa aos que não alcançassem a renda anual liquida de quatrocentos mil réis, aos estrangeiros naturalizados e aos que não professassem a religião do Estado (BRASIL, 1824).

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analfabetos, parentes titulares de cargos públicos, dentre outras, e ainda determina que Lei Complementar estabeleça outras hipóteses de inelegibilidade. Papel esse cumprido pela LC nº 64/1990, que hoje ostenta as modificações da Lei da Ficha Limpa, objeto deste estudo.

2.2 ELEGIBILIDADE

Sendo a inelegibilidade uma restrição à elegibilidade, é necessário compreendermos primeiro esta, para depois estudarmos aquela. Por essa razão, traz-se à baila o conceito de elegibilidade de Costa, E. (1994 p. 45), que expressa de forma clara o entendimento de quase a totalidade da doutrina quanto ao significado do termo:

“Direto pré-eleitoral, inerente ao cidadão pela sua simples condição de integrante do poder constituinte, consiste elegibilidade no direito de alguém ser escolhido, mediante sufragação popular, para o desempenho de função pública na formação do governo”

De acordo com Silva, José Afonso (2007 p. 366) “Consiste, pois a elegibilidade no direito de postular a designação pelos eleitores a um mandato político no Legislativo ou no Executivo” (Grifo do autor).

Na lição de Gomes (2008 p. 117)

O substantivo feminino elegibilidade retrata as idéias de cidadania passiva e capacidade eleitoral passiva. Conforme o sufixo da palavra indica, é a aptidão de ser eleito ou elegido. Elegível é o cidadão apto a receber votos em um certame, que pode ser escolhido para ocupar cargos político-eletivos. Exercer a capacidade eleitoral passiva significa candidatar-se a tais cargos. Para isso, devem ser atendidas algumas condições previstas na Constituição Federal, denominadas condições de elegibilidade. Em suma, é o direito público subjetivo atribuído ao cidadão de disputar cargos público-eletivos.

A elegibilidade, portanto, guarda semelhança com o ius honorum dos tempos romanos. Tanto que os termos são frequentemente utilizados como sinônimos pela doutrina eleitoralista.

Uma pessoa pode ter obstada sua capacidade eleitoral passiva em dois casos: ou porque não alcançou os requisitos necessários para o exercício da elegibilidade – condições de elegibilidade – ou porque incide em alguma hipótese que impede o exercício desse direito – inelegibilidades.

Assim, as condições de elegibilidade dizem respeito à aquisição da elegibilidade, já as inelegibilidades, ao seu impedimento. Nesse sentido Silva, José Afonso (2007 p. 366):

“Enfim, para que alguém, entre nós, possa concorrer a uma função eletiva, é necessário que preencha certos requisitos gerais, denominados condições de elegibilidade, e não incida em nenhuma das inelegibilidades [...] que precisamente constituem impedimentos à capacidade eleitoral passiva”.

E também Gomes (2008 p. 117):

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preenchimento das condições de elegibilidade - não é suficiente que seja elegível -, porque também é preciso que não compareçam fatores negativos denominados inelegibilidades.

Daí conclui-se que a elegibilidade é direito que surge conforme vão sendo preenchidas as condições de elegibilidade. Há, no entanto, quem defenda que a elegibilidade surge apenas no momento do registro da candidatura. Nesse sentido Costa, A. (2009):

O registro de candidatura é o fato jurídico que faz surgir a elegibilidade. Antes do registro, todos os nacionais não possuem elegibilidade, não podendo lançar sua candidatura, pleiteando votos em seu próprio nome. Logo, as condições de elegibilidade nada mais são do que pressupostos inafastáveis para a concessão do registro de candidatura, motivo pelo qual são, em verdade, verdadeiras condições de registrabilidade. Todos os nacionais que não têm o registro de candidatura não possuem o ius honorum, sendo desvestidos de elegibilidade.

Porém, tal entendimento restringe o conceito de elegibilidade de forma que a Constituição não o fez. Como se verá logo à frente, a Constituição apenas elenca requisitos para a aquisição da elegibilidade, por conseguinte, preenchidos esses requisitos, entende-se que a elegibilidade é adquirida na forma de direito subjetivo (BRASIL, 1988).

2.3 CONDIÇÕES DE ELEGIBILIDADE

Mais uma vez nas palavras de Gomes (2008 p. 118)

[...]as condições de elegibilidade são exigências ou requisitos positivos que devem, necessariamente, ser preenchidos por quem queira registrar candidatura e receber votos validamente. Em outras palavras, são requisitos essenciais para que se possa ser candidato e, pois, exercer a cidadania passiva.

Esses requisitos gerais para aquisição do ius honorum estão na Constituição (BRASIL, 1988) a insculpidas no art. 14, § 3º:

§ 3º - São condições de elegibilidade, na forma da lei: I - a nacionalidade brasileira;

II - o pleno exercício dos direitos políticos; III - o alistamento eleitoral;

IV - o domicílio eleitoral na circunscrição; V - a filiação partidária;

VI - a idade mínima de:

a) trinta e cinco anos para Presidente e Vice-Presidente da República e Senador; b) trinta anos para Governador e Vice-Governador de Estado e do Distrito Federal; c) vinte e um anos para Deputado Federal, Deputado Estadual ou Distrital, Prefeito,

Vice-Prefeito e juiz de paz; d) dezoito anos para Vereador.

Depreende-se do texto que existem condições gerais a todos os cargos e específicas para alguns cargos. Sendo que a elegibilidade plena só poderá ser atingida aos 35 anos. O texto constitucional não deixa abertura para a criação, por Lei, de outras condições de elegibilidade. A Lei poderá apenas regulamentar o texto constitucional.

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das hipóteses do art. 15 da Constituição Federal (BRASIL, 1988):

Art. 15. É vedada a cassação de direitos políticos, cuja perda ou suspensão só se dará nos casos de:

I - cancelamento da naturalização por sentença transitada em julgado; II - incapacidade civil absoluta;

III - condenação criminal transitada em julgado, enquanto durarem seus efeitos; IV - recusa de cumprir obrigação a todos imposta ou prestação alternativa, nos

termos do art. 5º, VIII;

V - improbidade administrativa, nos termos do art. 37, § 4º.

O alistamento eleitoral possui requisitos próprios que indiretamente tornam-se condições de elegibilidade, por exemplo: ao militar conscrito e aos estrangeiros (exceto os portugueses abrangidos pelo Estatuto da Igualdade) é vedado o alistamento eleitoral (GOMES, 2008).

2.4 INELEGIBILIDADES

Ao mesmo tempo em que preenche as condições de elegibilidade, aquele que pretende candidatar-se não poderá estar sob a incidência de nenhuma das circunstâncias impeditivas à capacidade eleitoral passiva, denominadas inelegibilidades. Gomes (2008 p. 129), eleitoralista, conceitua inelegibilidade nos seguintes termos:

Denomina-se inelegibilidade ou ilegibilidade o impedimento ao exercício da cidadania passiva, de maneira que o cidadão fica impossibilitado de ser escolhido para ocupar cargo político-eletivo.

Já o constitucionalista Lenza (2010 p. 879) utiliza outros termos, mas com sentido bastante próximo:

As inelegibilidades são as circunstâncias (constitucionais ou previstas em lei complementar) que impedem o cidadão do exercício total ou parcial da capacidade eleitoral passiva, ou seja, da capacidade de eleger-se. Restringem, portanto, a elegibilidade do cidadão.

Também Silva, José Afonso (2007 p. 388) a conceitua:

Inelegibilidade revela impedimento à capacidade eleitoral passiva (direito de ser votado). Obsta, pois, à elegibilidade. Não se confunde com a inalistabilidade, que é o impedimento à capacidade eleitoral ativa (direito de ser eleitor), nem com a

incompatibilidade, impedimento ao exercício do mandato depois de eleito. (grifos do autor)

Carvalho (2008 p. 824) registra uma diferenciação entre os três significados que podem ser dados ao termo inelegibilidade.

No plano normativo, a inelegibilidade contém três significados:

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Em suma, a ocorrência de uma das hipóteses de inelegibilidades, obsta ao cidadão o seu direito de ser eleito como representante do povo, não podendo assim, oferecer seu nome para sufragação popular. É, portanto, uma restrição à elegibilidade. Essas hipóteses estão na Constituição (BRASIL, 1988) no art. 14 entre os parágrafos 4º e 8º, conforme segue:

§ 4º - São inelegíveis os inalistáveis e os analfabetos.

§ 5º O Presidente da República, os Governadores de Estado e do Distrito Federal, os Prefeitos e quem os houver sucedido, ou substituído no curso dos mandatos poderão ser reeleitos para um único período subsequente .(Redação dada pela Emenda Constitucional nº 16, de 1997)

§ 6º - Para concorrerem a outros cargos, o Presidente da República, os Governadores de Estado e do Distrito Federal e os Prefeitos devem renunciar aos respectivos mandatos até seis meses antes do pleito.

§ 7º - São inelegíveis, no território de jurisdição do titular, o cônjuge e os parentes consangüíneos ou afins, até o segundo grau ou por adoção, do Presidente da República, de Governador de Estado ou Território, do Distrito Federal, de Prefeito ou de quem os haja substituído dentro dos seis meses anteriores ao pleito, salvo se já titular de mandato eletivo e candidato à reeleição.

§ 8º - O militar alistável é elegível, atendidas as seguintes condições: I - se contar menos de dez anos de serviço, deverá afastar-se da atividade;

II - se contar mais de dez anos de serviço, será agregado pela autoridade superior e, se eleito, passará automaticamente, no ato da diplomação, para a inatividade. § 9º Lei complementar estabelecerá outros casos de inelegibilidade e os prazos de

sua cessação, a fim de proteger a probidade administrativa, a moralidade para exercício de mandato considerada vida pregressa do candidato, e a normalidade e legitimidade das eleições contra a influência do poder econômico ou o abuso do exercício de função, cargo ou emprego na administração direta ou indireta. (Redação dada pela Emenda Constitucional de Revisão nº 4, de 1994)

A Lei Complementar a que se refere o § 9º é a LC 64/1990 (Lei das Inelegibilidades) e suas alterações.

Silva, José Afonso (2007 p. 388) destaca que as inelegibilidades possuem um conteúdo ético:

As inelegibilidades possuem, assim, um fundamento ético evidente, tornando-se ilegítimas quando estabelecidas com fundamento político ou para assegurarem o domínio do poder por um grupo que o venha detendo, como ocorreu no sistema constitucional revogado. Demais, seu sentido ético correlaciona-se com a democracia, não podendo ser entendido como um moralismo desgarrado da base democrática do regime que se instaure.

Da lição acima resulta que as inelegibilidades devem servir à democracia e não a interesses políticos transitórios. Assim, é forçoso concluir que ao aplicar inelegibilidades aos cidadãos – assim como em tudo mais – os Poderes Legislativo e Judiciário devem-se obedecer aos princípios balizadores de um Estado Democrático de Direito.

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elegibilidade constituem requisitos para a obtenção do direito de elegibilidade, as inelegibilidades são hipóteses que, ao incidirem sobre a pessoa, obstam a ela aquele direito.

2.4.1 Inelegibilidades absolutas e relativas

A doutrina separa as inelegibilidades em absolutas e relativas. É o que leciona Silva, José Afonso (2007 p. 390):

“As inelegibilidades absolutas implicam impedimento eleitoral pra qualquer cargo eletivo. Quem se encontre em situação de inelegibilidade absoluta não pode concorrer a eleição alguma, não pode pleitear eleição para qualquer mandato eletivo e não tem prazo para desincompatibilização que lhe permita sair do impedimento a tempo de concorrer a determinado pleito. Ela só desaparece quando a situação que a produz for definitivamente eliminada. Por isso, ela é excepcional e só é legítima, quando estabelecida na própria Constituição. E esta somente consigna, como tal, a que decorre da inalistabilidade e a dos analfabetos [...]

As inelegibilidade relativas constituem restrições à elegibilidade para determinados mandatos em razão de situações especiais em que, no momento da eleição, se encontre o cidadão.”

Assim, as inelegibilidades absolutas são aquelas que impedem que o eleitor se candidate a qualquer cargo, enquanto as relativas apenas a alguns. Na LC nº 64/1990 são absolutas as inelegibilidades elencadas no art. 1º, inciso I, enquanto as elencadas nos incisos II a VII são inelegibilidades relativas.

2.4.2 Inelegibilidades inatas e cominadas

Outra distinção entre inelegibilidades da doutrina eleitoralista nos será mais útil: aquela que separa as inelegibilidades em inatas e cominadas. Nesse ponto é elucidativo o entendimento de Gomes (2008 p. 133):

[...] denomina-se originária ou inata a inelegibilidade que ocorre independentemente da prática de qualquer conduta por parte do cidadão ou de terceiros em seu benefício. Por exemplo: a inelegibilidade do analfabeto não pressupõe tenha ele realizado qualquer ato ilícito ou censurável, decorrendo naturalmente do estado em que se encontra; assim também a inelegibilidade que atinge o cônjuge e os parente consangüíneos ou afins até o 2º grau do titular de mandato executivo, o não-filiado a partido político ou o estrangeiro. Diferentemente, a inelegibilidade-sanção ou

cominada decorre da prática de certas ações vedadas pelo ordenamento jurídico; a conduta ilícita é também sancionada com a inelegibilidade. Por exemplo: condenação criminal ou por improbidade administrativa transitada em julgado, rejeição de contas pelo Tribunal de Contas, o abuso do poder econômico ou político, conforme previsão constante do artigo 1º, I, "d", c.c. artigos 19 e 22, XIV e XV, todos da LC n. 64/91[sic]; nesse último caso, a inelegibilidade só será pronunciada se o abuso de poder for reconhecido em decisão judicial. (grifos do autor)

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3 PRINCÍPIO DA ANUALIDADE ELEITORAL

O princípio da anualidade eleitoral – também chamado por alguns de princípio da anterioridade eleitoral - está presente na Constituição Federal 1988 no art. 16, com redação determinada pela Emenda Constitucional nº 04 de 1993, in verbis: “Art. 16. A lei que alterar o processo eleitoral entrará em vigor na data de sua publicação, não se aplicando à eleição que corra até um ano da data de sua vigência”.

3.1 HISTÓRICO

A Ditadura Militar iniciada em 1964 foi prodigiosa na criação de casuísmos eleitorais (PRIETO, 2007). O regime autoritário utilizava-se da criação legislativa para afastar da cena política opositores do regime, criando regras eleitorais que favoreciam a Aliança Renovadora Nacional (ARENA) frente ao crescimento do Movimento Democrático Brasileiro (MDB) (PRIETO, 2007).

Talvez o mais conhecido desses casuísmos seja a Lei Falcão (BRASIL, 1976), publicada em 2 de julho de 1976 a lei foi aplicada já nas eleições municipais de 15 de novembro daquele ano e impedia o debate político no rádio e na televisão. A propaganda nesses veículos de comunicação deveria se limitar a mencionar o partido do candidato, seu curriculum vitae, seu número e, na televisão, sua fotografia. Outro exemplo de casuísmo eleitoral dessa época foi o Pacote de Abril, o então Presidente, Ernesto Geisel, fechou o Congresso Nacional por duas semanas determinou diversas mudanças para evitar a vitória do MDB nas eleições de 1978, entre elas, um aumento do número de deputados nos estados menos populosos, onde a ARENA tinha mais força política. Em 1979, no governo do Presidente João Batista Figueiredo a mudança foi a volta do pluripartidarismo com a edição da Lei orgânica dos Partidos Político, com a intenção de fragmentar o MDB em vários partidos menores reduzindo seu poder político (PRIETO, 2007).

O constituinte de 1988, percebendo a importância da estabilidade e de um processo isonômico para a garantia da democracia que almejava restaurar, inovou e criou um instituto que não esteve presente em nenhuma outra constituição brasileira até então: o princípio da anualidade da lei eleitoral (BRASIL, 1996).

3.2 O OBJETIVO DA NORMA

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suas conveniências partidárias.”.

Com o prazo de um ano para a eficácia da lei eleitoral o constituinte está informando ao legislador que as leis devem ser feitas para durar e não para penas uma eleição. Com a aproximação do processo eleitoral, as forças políticas começam a se movimentar para garantir sua posição ou galgar mais poder. Assim, uma lei criada nesse interim sofrerá maior influência dessas forças e nas palavras de Bastos (1989):

Se a lei for aprovada já dentro do contexto de um pleito, com uma configuração mais ou menos delineada, é quase inevitável que ela será atraída no sentido dos diversos interesses em jogo, nessa altura já articulados em candidaturas e coligações. A lei eleitoral deixa de ser aquele conjunto de regras isentas, a partir das quais os diversos candidatos articularão as suas campanhas, mas passa ela mesma a se transformar num elemento da batalha eleitoral.

Também Silva, José Afonso (2007 p. 234), sobre o objetivo da lei, diz “A ratio legis está precisamente em evitar a alteração da regra do jogo depois que o processo eleitoral tenha sido desencadeado”.

Ainda sobre o mens legis do art. 16 da CF, é elucidador o acórdão do STF na Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) nº 3345 relatada pelo Ministro Celso de Melo (BRASIL, 2005):

A norma consubstanciada no art. 16 da Constituição da República, que consagra o postulado da anterioridade eleitoral (cujo precípuo destinatário é o Poder Legislativo), vincula-se, em seu sentido teleológico, à finalidade ético-jurídica de obstar a deformação do processo eleitoral mediante modificações que, casuisticamente introduzidas pelo Parlamento, culminem por romper a necessária igualdade de participação dos que nele atuam como protagonistas relevantes (partidos políticos e candidatos), vulnerando-lhes, com inovações abruptamente estabelecidas, a garantia básica de igual competitividade que deve sempre prevalecer nas disputas eleitorais. Precedentes.

Tem-se, portanto, que se trata de uma norma de intenção moralizadora do processo eleitoral, que, pela estabilização das regras aplicáveis a eleição seguinte, pretende garantir paridade na disputa aos cargos públicos.

Note-se, porém, que o princípio da anterioridade da lei eleitoral não é voltado apenas à proteção dos candidatos e partidos, é também uma garantia individual do próprio cidadão-eleitor. Nesse sentido, já decidiu o STF na ADI nº 3685 de relatoria da Ministra Ellen Gracie (BRASIL, 2006).

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segurança e de certeza jurídicas contra alterações abruptas das regras inerentes à disputa eleitoral"

Assim, a proteção constitucional a mudanças no processo eleitoral visa evitar casuísmos nessa seara deixando claras as regras aplicáveis a eleição um ano antes de sua realização para que os cidadãos (candidatos ou eleitores) estejam espiritualmente preparados para decidirem o seu voto ou sua intenção de colocar seu nome à escolha popular e não sejam surpreendidos por modificações casuísticas.

3.3 A NATUREZA JURÍDICA

Vê-se logo que a norma insculpida no artigo 16 da Constituição Federal é uma condição para eficácia da lei eleitoral no tempo.

A redação anterior do artigo previa que “A lei que alterar o processo eleitoral só entrará em vigor um ano após sua promulgação.” Por se tratar de interstício entre a publicação e a vigência o período constituía verdadeiro vacatio legis (FIUZA, 2008 p. 84).

A mudança para a redação atual se deu para permitir maior flexibilidade da legislação eleitoral. Para ilustrar a diferença entre os efeitos dos dois textos, um bom exemplo seria uma hipotética Lei que alterasse o processo eleitoral e fosse publicada no dia seguinte à realização determinada eleição, sendo certo que a próxima eleição só se dará em dois anos: pela regra anterior ela não vigeria até que se passasse um ano de sua publicação – mesmo que nenhuma eleição fosse ocorrer nesse período -, pela regra atual sua vigência é imediata.

3.4 PROCESSO ELEITORAL

É necessário esclarecer que essa condição de eficácia não se aplica a toda e qualquer lei de caráter eleitoral, mas somente àquela que acarrete alteração ao processo eleitoral. Mas o que é o processo eleitoral? Só com a definição desse termo é possível dizer se uma lei qualquer estaria ou não sujeita à regra.

Antes de prosseguir, é necessário alertar quanto à diferença entre processo eleitoral em sentido amplo e processo eleitoral em sentido estrito. Nesse ponto, Gomes (2008 p. 171) leciona:

Nos domínios do Direito Processual, o termo processo traduz a relação jurídica que se estabelece entre autor, Estado-juiz e réu. [...]

No Direito Eleitoral, o termo ‘processo’ assume duplo sentido: um amplo, outro estrito.

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Já em sentido estrito, a expressão ‘processo eleitoral’ apresenta o mesmo significado inicialmente referido. [...]

O art. 16 da Constituição Federal claramente se refere ao processo eleitoral em sentido amplo, não só por ser esse o sentido mais comum da expressão, mas também porque só esse sentido se coaduna com objetivo da norma. Afinal, o cidadão-eleitor, os candidatos e os partidos estariam pouco protegidos de casuísmos se o princípio em comento fosse aplicado apenas às normas que alterassem o processamento de ações judiciais eleitorais (Ação de Impugnação de Mandato Eletivo, Ação de Investigação Judicial Eleitoral, Ação de Impugnação de Registro de Candidatura, et cetera...). O espaço para o casuísmo legislativo seria enorme. De forma diversa, não poderia Silva, José Afonso (2007 p. 234) definir o processo eleitoral nas palavras que utilizou: “O processo eleitoral compõe-se dos atos que, postos em ação (procedimento), visam a decidir, mediante eleição, quem será eleito; visam, enfim, a selecionar e designar autoridades governamentais.”.

Este ponto foi inclusive decido pelo STF na ADI nº 354 (BRASIL, 1990), na oportunidade o Ministro Octávio Gallotti, a respeito do art. 16 da Constituição Federal disse:

A primeira noção a expungir do dispositivo, antes de tentar-se um aprofundamento em sua significação, é a de que a limitação nele instituída não se refere (ou não se restringe, pelo menos) à alteração das regras do processo, tomadas como sendo de direito judiciário, ou seja aos meios ou instrumentos da composição das lides nas questões eleitorais

Portanto, doravante, no presente trabalho utilizar-se-á a expressão processo eleitoral

exclusivamente como na acepção ampla do termo.

Ultrapassada essa ponderação, é necessário investigar a abrangência do processo eleitoral, seu início, suas fases e seu fim.

Mais uma vez através do saber de Silva, José Afonso (2007 p. 234), obtém-se os atos componentes do processo eleitoral:

Os atos desse processo são a apresentação de candidaturas, seu registro, o sistema de votos (cédulas ou urnas eletrônicas), organização das seções eleitorais, organização e realização do escrutínio e o contencioso eleitoral. Em síntese, a lei que dispuser sobre essa matéria estará alterando o processo eleitoral.

Ainda sobre a extensão do termo processo eleitoral, registre-se a definição do STF no acórdão da ADI nº 3345 relatada pelo Ministro Celso de Melo (BRASIL, 2005):

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termina com a diplomação dos candidatos eleitos, bem assim dos seus respectivos suplentes. Magistério da doutrina (José Afonso da Silva e Antonio Tito Costa).

De acordo com o que foi estudado no item 3.4, o início do processo eleitoral se dá com as convenções partidárias para a escolha dos candidatos, mas não se pode olvidar, no entanto, que “fatos anteriores à convenção partidária poderão ter reflexos relevantes no processo eleitoral. [...] É o caso, por exemplo, de abuso de poder econômico ou político, que pode ter por base situações ocorridas antes da escolha e do registro de candidatura” (GOMES, 2008 p. 172).

Por outro lado, há que se reconhecer que a movimentação política dos pré-candidatos se inicia muito antes da realização das convenções partidárias. E ainda: a própria LC 64/1990 (BRASIL, 1990) impõe aos pré-candidatos a necessidade de desincompatibilização de situações impeditivas da candidatura e alguns prazos para sua realização antecedem a convenções partidárias.

Portanto, o inicio do processo eleitoral não pode ser confinado ao início das convenções partidárias, pois a Lei prevê a prática de atos cujos fins são a realização de eleições mesmo antes desse marco.

Da mesma forma, mesmo após a diplomação dos eleitos, poderão ser ajuizadas ações que repercutirão de forma relevante ao processo eleitoral. Assim, o processo eleitoral tampouco poderia se restringir a data da eleição.

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4 PRINCÍPIO DA IRRETROATIVIDADE DA LEI

Diferente do princípio da anterioridade da lei eleitoral, o princípio da irretroatividade da lei – também conhecido como princípio da segurança jurídica (SILVA, 2007) - não é uma inovação do constituinte de 1988. Pelo contrário, remonta ao nascimento do direito escrito. É o que conta Kümpel (2007 p. 141): “Com o advento do direito escrito, os principais diplomas, como o Código de Hammurabi, na Mesopotâmia, até a própria Lei das XII Tábuas em Roma, passam a proteger o direito adquirido, portanto a prestigiar o princípio da irretroatividade.”

Também nesse sentido Pires (2005 p. 101):

Precedentes normativos da irretroatividade e da noção de direito adquirido já são encontrados nos primeiros tempos da juridicidade das civilizações e, portanto, no período embrionário, desde a passagem da sociedade do seu estado de fato para o estado de direito, desde a substituição do direito consuetudinário pelo direito escrito, desde a separação entre o fas (preceitos ético-religiosos) e o jus (regras jurídicas), desde a idéia de separação entre a lei antiga e a nova, passando pela compreensão da noção de revogação e de intangibilidade do império da norma revogada, que representam conquistas importantes para a construção de um núcleo ideológico de segurança jurídica.

Em um Estado de Direito a Lei deve atuar sempre visando o futuro (SILVA, 2007). Sua aplicação ao passado deve se dar apenas em casos excepcionalíssimos. Esse é o sentido extraído da lição de Venosa (2007 p. 109):

A norma deve ter, como regra geral, uma abrangência mais ou menos ampla, isto é, uma generalidade e abstração, para situações futuras. Daí também a sua característica de hipotetividade. A noção fundamental é que a lei, uma vez promulgada e publicada, só poderá atingir relações jurídicas que a partir de sua vigência ocorrerem. Em situações apenas excepcionais, porém, mormente no regime democrático, que garante os direitos individuais, há hipóteses nas quais as leis atingem fatos pretéritos. O efeito retroativo deve ser visto como exceção a confirmar a regra pela qual a lei é uma norma para o futuro. Se as leis atingissem ordinariamente os fatos passados, as relações jurídicas se tornariam instáveis e estaria instaurado o caos.

Nessa mesma vertente, Nader (2010) repudia a aplicação da lei ao passado ao mesmo tempo em que conceitua o princípio da irretroatividade:

“No momento em que a lei penetra no mundo jurídico, para reger a vida social, deve atingir apenas os atos praticados na constância de sua vigência. O princípio da irretroatividade da lei consiste na impossibilidade de um novo Direito atuar sobre fatos passados e julgar velhos acontecimentos. A anterioridade da lei ao fato é o máximo princípio de segurança jurídica”.

Para Pereira (2008 p. 141), efeito retroativo de uma Lei, ou seja, sua aplicação a fatos ocorridos antes de sua criação, atenta contra a estabilidade dos direitos e o planejamento das relações jurídicas.

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também à interpretação, conforme leciona Ferraz Jr, Nery Junior e Carraza (2009 p. 11):

Em nome do direito à segurança, que exige certeza e confiança, não se pode, pois, restringir o princípio da irretroatividade à lei como mero enunciado, devendo compreender a lei como a sua inteligência em determinado momento. [...] A irretroatividade é, assim, do Direito e alcança, portanto, a irretroatividade da inteligência da lei aplicada a certo caso concreto.

Não foram poucos os tiranos que se valeram do estratagema de modificar as leis aplicadas ao passado para que suas vontades atuais fossem efetivadas. As notícias mais gritantes desse tipo de abuso remontam de regimes pouco democráticos como a Ditadura Jacobina da Revolução Francesa (ALMEIDA MELO, 2008), o regime socialista implantado pela Revolução Russa de 1917 (HORTA, 1991) e Getúlio Vargas no Estado Novo (PIRES, 2005 p. 191). Nesse sentido, Maximiliano (2005 p. 224) disse: “Legislar para o passado é um abuso de poder que se praticou apenas em épocas de desordem e tyrannia [sic]”.

Apesar dos sistemas jurídicos, em sua maioria, adotarem como regra a não-retroação das leis (PEREIRA, 2008 p. 143), são poucos os ordenamentos jurídicos em que há proibição completa de retroação das normas. O que geralmente ocorre é a permissão de certo grau de retroatividade em suas Leis. Existem gradações na aplicação do princípio da irretroatividade (ALMEIDA MELO, 2008). É o caso do Brasil. Apesar de o princípio da irretroatividade estar presente desde a Constituição do Império (KÜMPEL, 2007), ele nunca onde assumiu caráter absoluto (MAXIMILIANO, 2005). Por aqui, desde que a lei que não prejudique o direito adquirido, o ato jurídico perfeito ou a coisa julgada e que não se trate de lei penal mais grave, ela pode retroagir. Efetivamente, essa é a garantia do art. 5º, XXXVI, da Constituição (BRASIL, 1988), in verbis:

Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:

[...]

XXXVI - a lei não prejudicará o direito adquirido, o ato jurídico perfeito e a coisa julgada;

Segundo Sampaio (2005 p. 176), o significado do termo

"Prejudicar", do latim praejudicare, é afetar negativamente, causar dado, lesar, molestar. O termo pela generalidade e, por isso mesmo, insuficiência de sentido técnico-jurídico poderia ter sido substituído por outro com operatividade deôntica, como "incidir" por exemplo. (Grifo do autor).

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legislativas que o redefinam.”

4.1 DIREITO ADQUIRIDO

De acordo com o art. 6, § 2º da Lei de Introdução ao Código Civil (BRASIL, 1942) “Consideram-se adquiridos assim os direitos que o seu titular, ou alguém por êle, possa exercer, como aquêles cujo comêço do exercício tenha têrmo fixo, ou condição pré-estabelecida inalterável, a arbítrio de outrem.”.

A legislação brasileira sobre direito adquirido foi criada sob forte influência de Gabba (WALD, 1981 p. 143), para quem

É adquirido todo direito que a) é conseqüência de um fato idôneo a produzi-lo, em virtude da lei do tempo no qual o fato se realizou, embora a ocasião de fazê-lo valer não se tenha apresentado antes de atuação de uma lei nova a respeito do mesmo e que b) nos termos da lei sob o império da qual se verificou o fato de onde se origina, passou imediatamente a fazer parte do patrimônio de quem o adquiriu

Contudo, a legislação brasileira foi além da definição de Gabba e da vigente em outros países e “[...] equiparou ao direito adquirido o direito condicional desde que não fosse potestativa a condição.” (WALD, 1981 p. 148). E que, portanto,

[...] o direito adquirido não é tão-somente aquele que, preenchidos todos os requisitos legais, já tenha sido integrado no patrimônio do seu titular, mas ainda, aquele que depende de termo suspensivo ou de condição inalterável a arbítrio de outrem. (WALD, 1981 p. 148)

Nos dizeres de Modesto (2002) a proteção ao direito adquirido

[...] funciona, no tempo, como um guarda-chuva. Não impede a aplicação geral e imediata da lei nova. Resguarda, no entanto, os indivíduos que titularizam uma situação jurídica vantajosa anterior da aplicação das novas disposições legais. Estes indivíduos seguem regidos pela regra alterada ou revogada, mais vantajosa, para certos e determinados efeitos, embora a norma nova seja desde logo aplicável aos demais indivíduos.

Assim, direito adquirido deve ser entendido como o direito que o seu titular pode exercer, ou aquele que, para exercê-lo, dependa apenas do adimplemento de condição não alterável por vontade alheia.

4.2 ATO JURÍDICO PERFEITO

O ato jurídico perfeito está definido na Lei de Introdução ao Código Civil (LICC, Decreto-Lei nº 4.657/1942, art. 6º, §1º) como “o já consumado segundo a lei vigente ao tempo em que se efetuou”.

Para maior clareza cabe trazer à tona as lições de Gonçalves (GONÇALVES, 2010 p. 114) sobre o conceito de ato jurídico:

Os fatos humanos ou atos jurídicos em sentido amplo são ações humanas que criam, modificam, transferem ou extinguem direitos; dividem-se em lícitos e ilícitos.

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Praticados em conformidade com o ordenamento jurídico, produzem efeitos jurídicos voluntários, queridos pelo agente. Os ilícitos, por serem praticados em desacordo com o prescrito no ordenamento jurídico, embora repercutam na esfera do direito, produzem efeitos jurídicos involuntários mas impostos por esse ordenamento. Em vez de direitos, criam deveres. [...]

Os atos lícitos dividem-se em: ato jurídico em sentido estrito (ou meramente lícito), negócio jurídico e ato-fato jurídico. Nos dois primeiros, exige-se uma manifestação de vontade. No negócio jurídico (num contrato de compra e venda, p. ex.), a ação humana visa diretamente a alcançar um fim prático permitido na lei, dentre a multiplicidade de efeitos possíveis. Por essa razão é necessária uma vontade qualificada, sem vícios. No ato jurídico, o efeito da manifestação da vontade está predeterminado na lei (notificação, que constitui em mora o devedor; reconhecimento de filho, tradição, percepção dos frutos, ocupação, uso de uma coisa etc.), não havendo, por isso, qualquer dose de escolha da categoria jurídica. [...] Muitas vezes o efeito do ato não é buscado nem imaginado pelo agente, mas decorre

de uma conduta e é sancionado pela lei, como no caso de uma pessoa que acha, casualmente, um tesouro. [...] Essas ações são denominadas pela doutrina atos-fatos jurídicos ou fatos jurídicos em sentido estrito. (grifos do autor)

J. Cretella Júnior (apud BRASIL, 1997, p. 78) esclarece:

Na expressão ‘ato jurídico perfeito’, o vocábulo ‘perfeito’ tem o sentido de ‘acabado’, ‘que completou todo o ciclo de formação’, ‘que preencheu todos os requisitos exigidos pela lei’. Não o sentido de ‘irrepreensível’, ‘íntegro’, embora os dois sentidos tenham pontos de contato. Se o ato se completou, na vigência de determinada lei, nenhuma lei posterior pode incidir sobre ele, tirando do mundo jurídico, porque ‘perfeição’, aqui, é sinônimo de ‘conclusão’.

De acordo com Zavascki (1997 p. 252),

O termo “consumado”, aqui, deve ser entendido como se referindo aos elementos necessários à existência do ato, e não à sua execução ou aos seus efeitos materiais. Ou seja: “ato consumado” é ato existente (= em que se acham completos, “consumados”, todos os requisitos para sua formação), ainda que pendentes (= ainda que não “consumados”) os seus efeitos.

Para PIRES (2005 p. 218) o

Ato jurídico perfeito é aquele negócio, ato stricto sensu ou ato-fato, que, tendo ultimado seu processo formativo factual, integra-se, pela incidência de uma norma, ao sistema jurídico, tal como conformado em determinada circunstância temporal e espacial. (grifo nosso)

Segundo DINIZ (apud FERRAZ Jr.; NERY JUNIOR; CARRAZA, 2009, p. 49), a proteção do ato jurídico perfeito:

[...] é um modo de garantir o direito adquirido pela proteção que se concede ao seu elemento gerador, pois se a nova norma considerasse como inexistente, ou inadequado, ato já consumado sob o amparo da norma precedente, o direito adquirido dele decorrente desapareceria por falta de fundamento.

O ato jurídico perfeito é a ação humana capaz de criar, alterar ou extinguir direito que preencheu todos os requisitos legais para sua eficácia, merecendo, a partir daí, a proteção contra lei nova que incida sobre ele.

4.3 COISA JULGADA

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a coisa julgada material e não a formal (SILVA, 2007). A coisa julgada, de acordo com o art. 6, §3º, da LICC (BRASIL, 1942) é o caso ou decisão judicial do qual não caiba mais recurso. Porém, segundo Silva, José Afonso (2007 p. 436), essa definição foi superada em lugar daquela apresentada no art. 467 do Código de Processo Civil (BRASIL, 1973): “Denomina-se coisa julgada material a eficácia, que torna imutável e indiscutível a sentença, não mais sujeita a recurso ordinário ou extraordinário.”

Ainda segundo Silva, José Afonso (SILVA, 2007): “A coisa julgada é, em certo sentido, um ato jurídico perfeito; assim já estaria contemplada na proteção deste, mas o constituinte a destacou como um instituto de enorme relevância na teoria da segurança jurídica.”.

O Código de Processo Civil determina, por exclusão, quais as partes da sentença fazem coisa julgada:

Art. 469. Não fazem coisa julgada:

I - os motivos, ainda que importantes para determinar o alcance da parte dispositiva da sentença;

Il - a verdade dos fatos, estabelecida como fundamento da sentença;

III - a apreciação da questão prejudicial, decidida incidentemente no processo. Art. 470. Faz, todavia, coisa julgada a resolução da questão prejudicial, se a parte o

requerer (arts. 5º e 325), o juiz for competente em razão da matéria e constituir pressuposto necessário para o julgamento da lide.

De acordo com Pires (2005 p. 272)

A coisa julgada, apesar das variações nos assentamentos doutrinários e na base de sua normatividade no âmbito dos ordenamentos jurídicos, quanto à sua expressão conceitual, à extensão de seus efeitos e em relação à integração de seu conteúdo, apresenta-se, de modo recorrente, como firme barreira à retroatividade da lei, sendo seu primado sobre a lei nova reconhecido tradicionalmente no constitucionalismo pátrio.

Do exposto, conclui-se que a partir do momento que não é mais possível modificar uma decisão judicial através de recursos, essa mesma decisão torna-se imutável e passa a constituir coisa julgada, merecendo, por isso, a proteção constitucional contra lei nova que prejudique seus efeitos.

4.4 A IRRETROATIVIDADE DA LEI PENAL MAIS GRAVE

Se uma lei institui uma pena ou agrava uma já existente, a possibilidade de que ela retroaja deve ser repudiada ainda com maior veemência. A própria Constituição Federal (BRASIL, 1988) deixa isso claro ao reservar dois dispositivos especialmente para essa matéria em seu artigo 5º:

XXXIX - não há crime sem lei anterior que o defina, nem pena sem prévia cominação legal;

XL - a lei penal não retroagirá, salvo para beneficiar o réu;

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potencializadas pela força prejudicante da sansão instituída. Observe-se também, que a mesma alínea que impede a retroação prejudicial, determina a retroação da lei se ela for mais benéfica ao réu.

Leciona Lenza (2010 p. 784) que:

O art. 5º, XXXIX, consagra a regra do nullum crimen nulla poena sine praevia lege.

Assim, de uma só vez, assegura o princípio da legalidade (ou reserva legal), como o princípio da anterioridade, visto que não há crime sem lei anterior que o defina, nem pena sem prévia cominação legal. (grifos do autor)

O princípio da irretroatividade da lei penal mais grave não está inserido apenas na Constituição, pelo contrário, permeia todo nosso ordenamento jurídico, estando explícito em vários pontos:

No Código Penal (BRASIL, 1940):

Art. 1º - Não há crime sem lei anterior que o defina. Não há pena sem prévia cominação legal. (Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984).

Na Convenção Americana sobre Direitos Humanos (BRASIL, 1992), também conhecida como Pacto de São José da Costa Rica:

ARTIGO 9

Princípio da Legalidade e da Retroatividade

Ninguém pode ser condenado por ações ou omissões que, no memento (sic) em que forem cometidas, não sejam delituosas, de acordo com o direito aplicável. Tampouco se pode impor pena mais grave que a aplicável no momento da perpetração do delito. Se depois da perpetração do delito a lei dispuser a imposição de pena mais leve, o delinqüente será por isso beneficiado.

No Pacto Internacional sobre Direitos Civis e Políticos (BRASIL, 1992) adotado pela XXI Sessão da Assembleia-Geral das Nações Unidas, em 16 de dezembro de 1966:

ARTIGO 15

1. ninguém poderá ser condenado por atos omissões que não constituam delito de acordo com o direito nacional ou internacional, no momento em que foram cometidos. Tampouco poder-se-á impor pena mais grave do que a aplicável no momento da ocorrência do delito. Se, depois de perpetrado o delito, a lei estipular a imposição de pena mais leve, o delinqüente deverá dela beneficiar-se.

Como consequência do princípio da irretroatividade da lei penal tem-se, como assevera Silva, P. (2001 p. 259), que

[...] uma ação somente pode ser punida quando a punibilidade estiver determinada antes da ação ser perpetrada. Ou seja, os pressupostos da punibilidade e as conseqüências jurídicas do ato precisam estar determinados já na época do fato por meio de lei. (Grifo nosso).

Note-se que na seara penal o princípio da irretroatividade é visto por um prisma objetivo. Basta saber se a pena nova é mais grave que a anterior, se o for, a lei não retroagirá. Se for mais benéfica, deverá retroagir.

(38)

pode ser aplicado. O que é a lei penal? Não é preciso ir muito longe para concluir que lei penal é aquela que institui, revoga ou modifica uma pena, mas o que é pena?

4.4.1 O significado de pena

O Dicionário Filosófico de Abbagnano (1998 p. 749) possui o seguinte verbete: “PENA (gr. Ποινή; lat. Poena; in. Penalty, fr. Peme, ai. Strafe, it. Pena). Privação ou castigo previsto por uma lei positiva para quem se torne culpado de uma infração.”.

De acordo com o Dicionário Houaiss (2009) pena é “sanção aplicada como punição ou como reparação por uma ação julgada repreensível; castigo, condenação, penitência”.

Ainda sobre o significado do termo, mesmo procurando uma definição mais técnica em termos jurídicos, não se distancia das elencadas anteriormente:

A pena é retribuição, é privação de bens jurídicos, imposta ao criminoso em face do ato praticado. É expiação. Antes de escrito nos Códigos, está profundamente radicado na consciência da cada um que aquele que praticou um mal deve também um mal sofrer. (NORONHA, 1995 p. 220)

Quanto à finalidade da pena BECCARIA (1997 p. 62) “[...] é apenas impedir que o réu cause novos danos aos seus concidadãos e dissuadir os outros de fazer o mesmo.” No mesmo sentido, ROXIN (1997 p. 95) entende que o fim da pena só pode ser preventivo, não retributivo, pois as normas penais só se justificam quando tem por fim a proteção da liberdade individual ou da ordem social.

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5 A LEI DA FICHA LIMPA FRENTE AO PRINCÍPIO DA ANUALIDADE ELEITORAL

No item 3.2, viu-se que o princípio da anualidade deveria garantir a segurança jurídica e a certeza das regras a serem aplicadas às eleições. Em várias ocasiões o congresso promulgou leis eleitorais em período inferior a um ano da eleição mais próxima. Para alcançar a finalidade do princípio da anualidade eleitoral, bastaria que o judiciário negasse veementemente a aplicação dessas normas. Ao invés disso, o que se viu foi uma interpretação maleável do termo “processo eleitoral”, permitindo que, às vezes de uma mesma lei, algumas regras fossem aplicadas – pois não alteravam o processo eleitoral – e outras não. Assim, a cada nova legislação casuística não se tinha uma garantia se ela seria aplicada ou não às eleições vizinhas. Só o judiciário poderia responder a isso. Dessa forma, a incerteza que deveria ser suprimida, passou a ser resultante da própria aplicação daquele princípio. São exemplos disso: Lei 11.300/2006 ou Lei da Minirreforma Eleitoral de 2006, a Emenda Constitucional nº 52/2006 que acabou com a verticalização partidária, a Emenda Constitucional nº 58/2008 que definiu a quantidade de vereadores e a própria Lei das Inelegibilidades LC 64/1990.

A Lei da Ficha Limpa foi publicada em 7 de junho de 2010, portanto, aplicando-se a regra do art. 16 da Constituição, ela só teria eficácia para as eleições que ocorressem após 7 de junho de 2011. Para a não aplicação do princípio da anualidade eleitoral a essa Lei, só há duas possibilidades: ou a regra do art. 16 não é aplicável a leis complementares, mas apenas a leis em sentido estrito; ou uma lei que altera inelegibilidades não altera o processo eleitoral. A seguir analisar-se-á cada uma dessas hipóteses.

5.1 O PRINCÍPIO DA ANUALIDADE ELEITORAL E SUA APLICAÇÃO ÀS LEIS

COMPLEMENTARES

Há legítima dúvida em se questionar se a regra do art. 16 da Constituição Federal é aplicável a qualquer espécie normativa ou apenas a leis em sentido estrito, pois a palavra “lei” utilizada naquele artigo possui várias acepções (DINIZ, 2006). Quando da edição da própria Lei de Inelegibilidades (LC 64/1990) essa questão foi enfrentada pelos tribunais brasileiros. No julgamento do Recurso Extraordinário 129392-6 o STF (BRASIL, 1992) entendeu que o princípio anualidade eleitoral não se aplicava a LC nº 64/1990, veja-se a ementa do acórdão:

Referências

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