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Sumário. Supremo Tribunal de Justiça Processo nº 04B837

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Supremo Tribunal de Justiça Processo nº 04B837

Relator: OLIVEIRA BARROS Sessão: 22 Abril 2004

Número: SJ200404220008377 Votação: UNANIMIDADE Meio Processual: REVISTA.

Decisão: CONCEDIDA A REVISTA.

IVA TRIBUTAÇÃO SUJEITO PASSIVO

EXIGIBILIDADE DA OBRIGAÇÃO FACTURA COMERCIAL

Sumário

I - Como se vê do art.676º, nº1, CPC, a finalidade ou função dos recursos é a revisão ou reexame das decisões da instância recorrida, não sendo, sob pena de preterição de jurisdição, lícito conhecer em sede de recurso de questões antes não deduzidas e, por isso, não submetidas a debate e decisão naquela instância.

II - Por isso de considerar nessa relação jurídica fiscal dois sujeitos passivos, que são o contribuinte de direito e o contribuinte de facto, o IVA é um imposto cobrado por uns, mas posto a cargo de e suportado economicamente por

outros.

III - Na perspectiva tradicional, que por tal entendia quem, em último termo, suporta o imposto, são estes últimos quem vem na realidade a ser os

contribuintes, pois são eles os devedores principais e originários desse tributo, e, nessa óptica, o seu sujeito passivo propriamente dito.

IV - Enquanto responsável fiscal chamado a pagá-lo, o contribuinte de direito é responsável também pela falta da oportuna liquidação e cobrança desse

imposto a quem efectivamente o desembolsa, ou seja, ao contribuinte de facto.

V - Para além do IVA não pode ser exigido sem prévia emissão e apresentação de factura com os requisitos estabelecidos no nº 5 do art.35º CIVA, quando a emissão e apresentação duma tal factura for imposta por convenção das partes, estar-se-á perante condição da exigibilidade, e, assim, do vencimento, de toda a dívida - parte remuneratória e imposto -, e, assim, perante uma condição suspensiva, sem o preenchimento da qual, conforme art.270º C.Civ.,

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o pagamento não é exigível - caso em que há lugar à aplicação do disposto no art.662º, nº1, CPC.

Texto Integral

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça:

Em 25/5/2000, A, moveu acção declarativa com processo comum na forma ordinária contra a B, que foi distribuída à 2ª Secção da 8ª Vara Cível do Porto.

Invocando contrato de agência pelo qual a demandada lhe conferiu a

exclusividade da sua representação comercial relativa a indicadas marcas em determinada área ou zona do sul do País, incluindo Lisboa, Açores e Madeira, pediu a condenação da mesma a pagar-lhe 5.799.800$00 de comissões sobre as vendas e comparticipação nas despesas da agência, sendo 2.737.000$00 do total de indicadas facturas com datas que vão de Novembro de 1988 até

Março de 1999, e bem assim discriminados 3.042.000$00 relativos aos meses de Abril a Setembro de 1999, ainda não facturados para evitar suportar o competente IVA, da responsabilidade da Ré. Deduziu também pedido acessório de juros de mora, à taxa legal sucessivamente vigente, vencidos, no montante de 740.109$00, e vincendos. E pediu, ainda, a condenação da Ré a pagar-lhe quantia, a liquidar em execução de sentença, pelos prejuízos decorrentes de (concretizada) violação da cláusula contratual de exclusividade da

representação comercial em causa.

Contestando, a Ré confessou dever os 2.737.000$00 facturados, montante a que conclui dever ser reduzida a procedência da acção (4 primeiros artigos e conclusão).

Quanto ao mais, deduziu defesa por impugnação, fundada em

desconhecimento, "uma vez que não recebeu qualquer factura para, se for disso caso, proceder ao pagamento respectivo" (itens 5º e 6º desse

articulado); opôs não haver lugar a juros, dado não ter sido acordado nenhum prazo de pagamento (artigo 7º); negou a outrossim arguida violação da

exclusividade da representação, afirmando ter sempre comunicado à A.

qualquer venda directa no território em causa (artigo 8º). E mais não disse.

Houve réplica, relativa aos juros.

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Em audiência preliminar, foi proferido saneador tabelar, com seguida indicação dos factos assentes e fixação da base instrutória.

Infrutífera suspensão da instância requerida e deferida ao abrigo do art.279º, nº4º, CPC, veio, após julgamento, a ser proferida sentença, em 20/12/2002, que, julgando a acção parcialmente procedente, condenou a Ré a pagar à A. as quantias em euros correspondentes a 2.737.000$00 e a 3. 042.000$00, com juros de mora, vencidos e vincendos, sobre a primeira dessas quantias, à taxa legal sucessivamente vigente, desde 30 dias após a data da emissão de cada uma das facturas a fls. 16 a 19 dos autos, e sobre a segunda, desde a citação, sempre até integral pagamento. A Ré foi então condenada a pagar também quantia a liquidar em execução de sentença pelos prejuízos decorrentes da violação da cláusula contratual de exclusividade da representação comercial.

A assim condenada apelou dessa decisão.

Sustentou, essencialmente, em 7 conclusões, não poder a apelada exigir IVA de facturas não emitidas, uma vez que, conforme arts.28º, n.º 1, al.b), 35º, n.º 1, e 36º, n.º 1, CIVA, a obrigação do pagamento desse imposto só nasce com a emissão do documento contabilístico competente, ou seja, da respectiva

factura, cuja falta determina as sanções previstas nos arts.96º ss CIVA, bem assim estando a apelante impedida de proceder à competente dedução sem que a factura preencha o condicionalismo legal constante do art.35º, nº5º, CIVA, para mais, com o recente aumento do IVA para 19%, não sendo já o valor em causa o constante da sentença apelada, mas superior. Aditou estar a obrigação de pagamento contratualmente condicionada à prévia apresentação da factura. Daí, concluiu, a inexigibilidade da obrigação correspondente, na falta de emissão da factura, não vencida. Deu por violados os arts.406º, n.º 1, 428º, n.º 1, 762º e 763º C.Civ.

Em contra-alegação, obtemperou-se, em síntese, ter-se a apelada, por não poder suportar o encargo que o IVA constitui, limitado a diferir o cumprimento da obrigação acessória de emitir factura para momento coincidente com a entrega do valor em dívida.

Deixando claro que, como resultava das conclusões da alegação respectiva, a apelante só pretendia a alteração do decidido na parte relativa aos meses de Abril a Setembro de 1999, no montante global 3.042.000$00, incluindo IVA, de que não lhe foi apresentada factura, a Relação do Porto, por acórdão de

10/7/2003, concedeu provimento à apelação, revogou, na parte impugnada, a sentença recorrida, e julgou a acção, nessa parte, improcedente, pelo que

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absolveu a Ré do pedido de condenação no pagamento daquela quantia e dos juros de mora respectivos. Então postas as custas a cargo da apelante, deu-se em seguida razão à reclamação por esta deduzida contra esse lapso.

Pede, agora, a A. revista dessa decisão.

Em remate da alegação respectiva, formula, com prejuízo óbvio da síntese imposta pelo n.º 1 do art.690º CPC, 21 conclusões. Estas, em termos úteis:

1ª - A recorrente exige da recorrida o pagamento do I.V.A. incidente sobre um montante que, apesar de contratualmente devido, nunca foi facturado, nem pago pela recorrida.

2ª - A recorrente não cumpriu a obrigação de emissão de facturas por a ter cumprido durante 5 meses sem ter obtido, da parte da Recorrida, o

cumprimento da obrigação respectiva.

3ª - Por via deste repetido incumprimento por parte da recorrida, a recorrente foi compelida a assumir um papel que não lhe caberia no modus operandi do I.V.A. - o de contribuinte de facto.

4ª e 5ª - Viu, assim, frustradas as suas expectativas quanto ao cumprimento por parte da recorrida e desgastada a sua situação financeira.

6ª - Está-se perante uma obrigação com prazo certo sujeita a condição, isto é, uma obrigação que deve ser cumprida numa data previamente estabelecida, mas cujos efeitos estão subordinados à realização de determinado

acontecimento futuro ou incerto ( v. arts.270º e 397º C.Civ.).

7ª - A condição identifica-se, neste caso, com a emissão das facturas

correspondentes ao montante em débito, incluindo o Imposto sobre o Valor Acrescentado que incide sobre o montante facturado.

8ª - A recorrente não cumpriu a condição, o que levaria a crer não ser devido o cumprimento da recorrida.

9ª - Contudo, "a estipulação de uma condição pelas partes conduz (...) a um estado de pendência. Não existe ainda um direito pleno na pessoa do

adquirente; mas há já um direito à aquisição plena, que podemos designar por expectativa jurídica" (Heinrich Ewald Hörster, "A Parte Geral do Código Civil

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Português" (1992), 490 ss).

10ª - Na situação em apreço, há uma autêntica expectativa jurídica, por parte da recorrente, pois que já começou o processo aquisitivo, e, caso se verifiquem todos os pressupostos, o direito em expectativa concretiza-se.

11ª, 12ª, e 13ª - A não verificação de todos os pressupostos deve-se a uma falta de cumprimento da condição por parte da recorrente, todavia legítima, como indica o art.429º C.Civ., ao estabelecer a possibilidade de aquele que estiver obrigado a cumprir em primeiro lugar poder lançar mão da excepção de não cumprimento, quando a outra parte, - no caso, a recorrida -, não cumprir ou não der garantias de cumprimento.

14ª - A finalidade desse artigo é a de garantir um dos sujeitos - o obrigado ao cumprimento prévio - contra o perigo de não obter a contraprestação que lhe é devida (José João Abrantes, "A excepção de não cumprimento do contrato").

15ª - Não há dúvidas quanto à legitimidade da recorrente para usar este expediente legal, visto que durante cinco meses cumpriu a sua obrigação contratual - a apresentação da factura discriminativa dos valores em débito - sem que houvesse da parte da recorrida o cumprimento contratual que lhe era devido.

16ª - O imposto em questão apresenta-se como uma obrigação complexa, cujo núcleo, em volta do qual gravitam várias obrigações acessórias, se concentra na entrega pelo contribuinte de facto ao contribuinte de direito do montante devido pelo valor acrescentado na prestação do serviço.

17ª - A obrigação acessória que, no caso, apresenta maior relevo, inscrita nos arts.28º, n.º 1, al.b), e 36º, n.º 1, ambos do Código do Imposto sobre o Valor Acrescentado, é a obrigação de emissão de factura em que esteja incluído, para além do valor remuneratório, a importância do imposto liquidado.

18ª - A recorrente não cumpriu tempestivamente a obrigação acessória supramencionada, não se traduzindo, todavia, tal intempestividade num não cumprimento definitivo. Aliás:

19ª - Quer o artigo 8º da petição inicial, quer a sentença proferida em sede de 1ª Instância, bem como o ponto III da peça que se apresenta, justificam

plenamente tal atitude, que, ao invés da máscara que lhe desejam apor, não

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passa de legítimo uso de um mecanismo legal protector de quem está obrigado ao cumprimento prévio.

20ª - Em boa verdade, o intuito da recorrente dirige-se, em sentido oposto ao da ilegalidade, ao diferimento do cumprimento da já mencionada obrigação de emissão das facturas discriminativas dos valores em débito para momento coincidente com a entrega desse mesmo valor.

21ª - Desta forma, cumprir-se-ão as formalidades decorrentes dos arts 7º, n.º 1, al.b), e 28º, n.º 1, al. b), CIVA, do mesmo modo que se salvaguardará a saúde económico-financeira da recorrente.

Não houve contra-alegação, e, corridos os vistos legais, cumpre decidir.

Devidamente ordenada (1), a matéria de facto fixada pelas instâncias é esta (indicam-se entre parênteses as correspondentes alíneas e quesitos):

- A. e Ré celebraram o contrato de agência a fls.8 a 11 dos autos, mediante o qual esta conferiu àquela a exclusividade da sua representação relativamente às marcas Inspiro, Twenty e Nougat na área geográfica que vai da linha Leiria/

Portalegre ao extremo sul do País, incluindo a Zona da Grande Lisboa, Açores e Madeira ( A ).

- Por causa e no exercício da sua actividade comercial, a A. promoveu, por conta da Ré, a celebração de contratos no âmbito espacial especificado

naquele contrato, do que resulta ter-se a Ré constituído na obrigação de pagar à A., a título de comissões sobre as vendas e comparticipação nas despesas da agência, até Março de 1999, o montante de 2.737.000$00, que a A. facturou, em indicados termos, tendo remetido à Ré essas facturas (B).

- No âmbito do contrato mencionado, a A. promoveu, por conta da Ré, a celebração de contratos nos meses de Abril, Maio, Junho, Julho, Agosto e Setembro de 1999 (1º a 6º).

- O vencimento das facturas ocorria 30 dias após a data da sua emissão (11º).

- A Ré contactou e celebrou directamente negócios com as lojas Algodão &

Companhia e Forma e Feitio, situadas na área de representação exclusiva conferida à A. ( C ).

- Em Setembro de 1999, representantes da A. visitaram essas lojas e

constataram que existiam em ambas roupas da Ré, nomeadamente a colecção Inspiro Outono/Inverno, e que a segunda tinha saldos de Verão de 99, o que,

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de acordo com a prática comum de venda antecipada de colecções para

estações posteriores, evidencia a celebração desse negócio pela Ré há já, pelo menos, duas estações ( D ).

- Esses factos tiveram lugar sem que a Ré tivesse dado conhecimento deles à A. (7º).

- Não foi a A. quem promoveu a venda das roupas existentes nas lojas

mencionadas, pelo que não efectuou qualquer comunicação de venda relativa às mesmas ( 8º).

Já em sede de apreciação de direito (2), o acórdão recorrido refere ainda o teor da cl.III, nº5, do contrato sub judicio (a fls. 9 dos autos) (3), que reza assim:

"O 1º outorgante (a ora recorrida) pagará ainda ao 2º outorgante (a ora recorrente):

- 200.000$00 (duzentos mil escudos) acrescidos de IVA (,) contra factura (,) nos meses de Fevereiro e Setembro, a título de comparticipação nas despesas de agência;

- 400.000$00 (quatrocentos mil escudos) acrescidos de IVA por conta de comissões (,) contra factura a apresentar mensalmente pelo 2º outorgante"

(destaque nosso).

Oposto - como melhor adiante se dirá, autenticamente ex novo excepcionado - pela apelante que o vencimento da obrigação em causa dependia da prévia apresentação da factura, o acórdão sob recurso deu-lhe razão. Com efeito:

"Apreciando a questão" - isto é, na respectiva fundamentação de direito -, julgou-se, com apoio na cláusula supramencionada, que não apresentadas as competentes facturas, a devedora apelante não estava obrigada a efectuar as prestações em referência.

Considerou-se, para tanto, mesmo se em diversa ordem, não poder perder-se de vista a natureza da obrigação em causa - dívida de natureza comercial que dá lugar a tributação em IVA - e implicações relativas ao pagamento e

recuperação desse tributo; que "ao estipularem o pagamento contra apresentação da factura, as partes tiveram certamente em conta essa

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circunstância e a exigência legal de emissão de um documento contabilístico para cobrança desse imposto e recuperação do mesmo por parte dos

intervenientes no circuito conducente ao utilizador ou consumidor final"; e que o pedido da A. inclui o de condenação da Ré a pagar, juntamente com o crédito que reclama, o correspondente IVA (fls.162 e 163) (4).

Nela não mencionada qualquer outra disposição legal, há, nesta

fundamentação de direito, referência apenas à invocação pela apelante dos arts.35º, nº5º, e 36º, n.º 1, CIVA ( fls.162).

Como observado na sentença apelada, a fls.123 vº (penúltimo par.), a ora recorrida "limitou-se a alegar que nunca teve conhecimento das quantias

reclamadas nos artigos 6º e 7º da petição inicial, uma vez que nunca lhe foram apresentadas as respectivas facturas".

Percorrida a contestação, que tem apenas 8 artigos, tal é o que, de facto, consta do item 5º desse articulado, que é do seguinte teor:

"Quanto à restante quantia peticionada pela A., a R. desconhece-a, uma vez que não recebeu qualquer factura para, se for disso caso, proceder ao

pagamento respectivo.".

A não emissão das facturas, outrossim aludida no seguinte artigo 6º, encontra- se, de facto, confessada no artigo 8º da petição inicial, com a justificação de que a A. não podia suportar o encargo com o IVA - cfr., a propósito, art.360º C.Civ.

Na contestação, - articulado em que, por imperativo do n.º 1 do art.489º CPC, devia ter sido deduzida toda a defesa - , não há referência alguma a esse imposto.

É, por outro lado, já só na conclusão 4ª da contra-alegação da então apelada a fls.145 dos autos, que há, pela primeira vez, referência explícita à sobredita cl.III, nº5, do contrato em causa.

Foi, em todo o caso, com evidência, nessa base que na sentença apelada se considerou estar-se perante obrigação com prazo certo, sujeita a condição, que é a apresentação da competente factura.

Não interpelada a devedora por esse acordado modo, julgou-se relevar tal

(9)

apenas para efeitos do disposto no n.º 1 do art.805º C.Civ., ou, na expressão do acórdão recorrido, que a apresentação da factura tinha como única

finalidade a interpelação para o pagamento.

Julgada suprida, para esse efeito, a falta de emissão das facturas pela citação, as dívidas foram, na sentença proferida, julgadas vencidas.

É tal que no final do acórdão sob recurso se contraria, considerando, com referência expressa ao pagamento do IVA, que a obrigação da ora recorrida se concretiza com o vencimento do crédito inscrito na factura, a qual, por sua vez, possibilita eventual recuperação do imposto pago - não podendo a citação da mesma considerar-se adequada para esse efeito.

Comum ou normal função de qualquer factura a liquidação do débito - no caso, de montante certo, acrescido de IVA, cuja taxa se aduz na alegação oferecida na apelação ter, entretanto, sido aumentada -, a sua emissão e apresentação não constitui, neste caso, simples obrigação ou condição legal imposta pelos arts.28º, n.º 1, al.b), 35º, n.º 1, e 36º, n.º 1, CIVA.

Está-se, na realidade, perante convenção das partes, que estabelece uma condição suspensiva sem o preenchimento da qual, conforme art.270º C.Civ., não é exigível o pagamento e não pode, portanto, exercer-se esse direito em juízo como o art.817º dessa mesma lei prevê.

E nem, de facto, pode atribuir-se à citação a virtualidade de substituir a emissão e apresentação das facturas em falta, visto que se trata de condição, contratualmente estipulada, da exigibilidade, das obrigações em causa.

Destarte constatada a inexigibilidade da obrigação na parte em litígio, não pode, em todo o caso, deixar de considerar-se contestada a sua existência, conforme artigo 5º e conclusão da contestação deduzida.

Valerá, no caso, a pari, o disposto no n.º 1 do art.662º CPC (5).

Logo, deste jeito, uma pormenorizada análise da sentença apelada permitindo alcançar a solução adequada desta causa, a questão sub judicio,

aparentemente simples, redunda convertida, na apelação, num imbróglio fiscal (6). Ora:

Será de recordar, antes de mais, a preclusão estabelecida no já referido

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art.489º, n.º 1, CPC.

Notar-se-á, depois, que, como sobejamente repetido nos nossos tribunais superiores, finalidade ou função dos recursos, como do art.676º, n.º 1, CPC se vê, a revisão ou reexame das decisões da instância recorrida, não é, nessa sede, sob pena de preterição de jurisdição, lícito conhecer de questões antes não deduzidas e, por isso, não submetidas a debate e decisão naquela

instância.

Revisitadas, isto posto, a contestação e a alegação da apelante, afigura-se flagrante que tudo quanto - em sede, já, de recurso - veio a ser arguido, em tema de IVA, pela devedora representa ou constitui matéria nova, de que, por isso mesmo, não havia sequer que conhecer, pela razão imediatamente acima adiantada; desde logo também de rejeitar sendo que se trate de matéria de conhecimento oficioso. De todo o modo:

Delimitado o âmbito ou objecto deste recurso pelas conclusões da alegação da ora recorrente - cfr. arts.684º, nºs 2º a 4º, e 690º, nºs 1º e 3º, CPC, sempre, como assim, se deixará esclarecido ser, de facto, ela, segundo a lei, o sujeito passivo do imposto aludido, consoante n.º 1, al.a) dos arts.1º e 2º, CIVA.

Enquanto responsável fiscal chamado a pagá-lo (contribuinte de direito), é-o também pela falta da sua oportuna liquidação e cobrança a quem

efectivamente o desembolsa (ou seja, ao contribuinte de facto).

Como o imposto de selo, o IVA é, na verdade, um imposto cobrado por uns, mas posto a cargo de e suportado economicamente por outros. Na noção tradicional, que por tal entendia quem suporta o imposto, são estes últimos que vêm na realidade a ser os contribuintes. Nesta perspectiva, são eles os devedores principais e originários desse tributo, e, assim, o seu sujeito passivo propriamente dito (7). Daí que se possam, realmente, considerar, nesta

relação jurídica fiscal dois sujeitos passivos: o contribuinte de direito e o contribuinte de facto.

Adiantado, no texto da alegação produzida na apelação, a fls.135 a 137 dos autos, que, conforme art.7º ( n.º 1, al.b) ) CIVA, a obrigação do pagamento do imposto nasce no momento da realização (efectivação) da prestação dos serviços, a contradição em que, usando o mesmo verbo (nascer), aí - prima facie ou à primeira vista - se incorre ao dizer que, conforme arts.28º, n.º 1, al.b), 35º, n.º 1, e 36º, n.º 1, CIVA, a obrigação do pagamento desse imposto só

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nasce com a emissão do documento contabilístico competente, ou seja, da respectiva factura, é apenas aparente: o art.7º CIVA refere-se, se bem se

entende, à altura em que o imposto é exigível pelo Estado ao respectivo sujeito passivo (contribuinte de direito), os demais estabelecem, por sua vez,

condição da exigibilidade dessa importância por este último a quem efectivamente suporta o tributo em questão (contribuinte de facto) (8).

Destacada na alegação da apelante, a fls.135, a parte final da al.b) do n.º 1 do art.28º CIVA, é certo que, referida a cláusula contratual aludida a pagamentos por conta de comissões, não consta que os tenha efectivamente havido a título de adiantamento, isto é, antes da efectiva prestação dos serviços a que as mesmas correspondem. Como quer que seja :

É na sobredita condição da exigibilidade do falado imposto pela prestadora à utilizadora dos serviços em questão, estabelecida nos arts.28º, n.º 1, al.b), 35º, n.º 1, e 36º, n.º 1, CIVA, que, tão só deduzida, na contestação, defesa por

impugnação, afinal, assenta esta nova defesa, por excepção, abusivamente aditada na apelação.

Trata-se, em todo o caso, claramente, de condição legal relativa à exigência do imposto a quem deve efectivamente suportá-lo (contribuinte de facto), não confundível com a condição convencionalmente estabelecida na

supramencionada cl.III, nº5, do contrato ajuizado; e exorbita, claro está, o âmbito da jurisdição dos tribunais comuns a consideração de qualquer eventual infracção prevenida nos arts.95º ss CIVA.

Ponto vem, assim, a ser que não é apenas o IVA que não pode ser exigido sem prévia emissão e apresentação de factura com os requisitos estabelecidos no nº5º do art.35º CIVA: tornada, pela cláusula referida, contratualmente

necessária essa emissão e apresentação, ela é, como já visto, condição da exigibilidade, como assim, do vencimento, de toda a dívida ainda em

discussão. E do C.Civ. as disposições referidas ao diante sem outra indicação :

Não obstante valer, efectivamente, no que a essa cláusula se refere, o disposto no n.º 1 do art. 406º, cabe fazer notar ainda que a condição aludida é, por sua natureza, um elemento acidental do negócio jurídico.

Nomeadamente fundada a excepção material dilatória de incumprimento - causa justificativa de igual comportamento por parte de quem a invoca - prevista no outrossim ex novo invocado n.º 1 do art.428º no princípio da

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comutatividade (equilíbrio) dos contratos, a emissão e apresentação de

factura, seja ela legalmente imposta ou contratualmente estipulada, constitui, realmente, obrigação acessória que se não vê como possa efectivamente configurar contraprestação (contrapartida) com relevo para efeitos do

disposto neste por último referido preceito ou nos igualmente menciona dos arts.762º e 763º.

Destarte dispensada a consideração do art.429º, invocado pela recorrente (9), mas normalmente referido ao art.780º, desde logo não se trata, enfim, de obrigação correspectiva ou contra-obrigação da prestação dos serviços a que a ora recorrente se obrigou.

Bastando as disposições que seguem para resolver adequadamente, em termos de direito, a questão sub judicio, está-se, isso sim, como já visto,

perante condição - cfr. art.270º, que, enquanto não preenchida, determina não poder considerar-se vencida e exigível a obrigação - toda ela, parte

remuneratória e imposto - ainda litigada, havendo, por isso, lugar à aplicação do já falado art.662º (nº 1) CPC. E é isto tudo, se bem se crê (10).

Arredado quanto, enfim, tinha que sê-lo, chega-se à conclusão de que, na parte impugnada, não pode manter-se a decisão de nenhuma das instâncias : a da Relação que, nessa parte absolvida a ora recorrida do pedido, aparentemente priva a ora recorrente da retribuição contratualmente ajusta- da, a da 1ª instância porque dá por vencida com a citação a correspondente obrigação da recorrida.

Uma última nota: ne eat judex ultra vel extra petita partium, terá de observar- se o disposto no art.661º, n.º 1, CPC (cfr. também subsequente art.668º, n.º 1, al.e)): eventual agravamento do IVA entretanto ocorrido, a que se alude na alegação da ora recorrida oferecida na apelação, não pode ser aqui, sequer, considerado (será, porventura, até, da responsabilidade da ora recorrente, que não emitiu oportunamente as facturas omitidas).

Em vista do demoradamente exposto, alcança-se a decisão que segue:

Concede-se a revista.

Revoga-se o acórdão recorrido.

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No mais subsistente, por não impugnada, a decisão da 1ª instância, mantém- se também a conde nação, então proferida, da ora recorrida a pagar à ora recorrente a litigada importância de 3.042. 000$00: mas tal assim contra a apresentação da competente factura.

Vai a assim condenada, por consequência, absolvida do pedido acessório dos juros moratórios correspondentes.

Custas da apelação e deste recurso por ambas as partes, em igualdade, ficando as da 1ª instância a cargo das mesmas, na proporção do vencido.

Lisboa, 22 de Abril de 2004 Oliveira Barros

Salvador da Costa Ferreira de Sousa ---

(1) V. Antunes Varela, RLJ, 129º/51.

(2) E em prejuízo, assim, da discriminação, isto é, da indicação em separado, imposta pelo art.659º, nº2 ( cfr. também art.713º, n.º 2 ) CPC.

(3) Dado por reproduzido na al.A) da matéria de facto assente, v. , a esse respeito, Antunes Varela e outros, " Manual de Processo Civil ", 2ª ed., 401, nota 2 ( 1ª ed., 386, nota 2 ).

(4) Da objecção em seguida, e por último, feita ao entendimento da sentença apelada dir-se-á adiante, ao analisar o nela adiantado.

(5) Sobre a aí prevista condenação in futurum, v. Antunes Varela e outros,

"Manual de Processo Civil", 2ª ed., nºs 58. e 222., pp.182 ss e 681 ss, maxime, 683. Referindo, embora, a doutrina desse mestre a este respeito, v., em

diverso senti do, Lebre de Freitas e outros, "CPC Anotado", 2º (2001), 651 ss, maxime, 653 e 654. Como elucida Rodrigues Bastos, "Notas ao CPC", III, 3ª ed. (2001), 186: "É pressuposto da aplicação do nº 2 (do art.661º) não haver litígio quanto à existência da obrigação. Se o réu contesta a existência desta, as custas ficam, então, sujeitas ao regime geral". Na contestação deduzida, a existência da obrigação foi impugnada no artigo 5º da contestação "por desconhecimento" (cfr. n.º 3 do art.490º CPC); validamente, segundo se julgou, como o questionário revela; e tudo tal assim apesar da cláusula III, nº 5, do contrato ajuizado, já atrás transcrita no texto.

(6) Aproveita-se deste modo expressão da recorrente, na alegação respectiva (fls.180, último par.).

(7) V. Saldanha Sanches, " Manual de Direito Fiscal " (1998), 267.

(8) De harmonia com o art.7º, n.º 1, al.b), CIVA, esse imposto " é devido e

(14)

torna-se exigível no momento da realização das prestações de serviços". O n.º 1 do art.36º CIVA reza, por sua vez, assim: "A importância do imposto

liquidado deverá ser adicionada ao valor da factura ou documento equivalente para efeitos da sua exigência aos adquirentes das mercadorias ou aos

utilizadores dos serviços". Ao referir-se, na alegação que ofereceu na

apelação, ao art.7º CIVA, a então recorrente, ora recorrida, reportou-se à al.b) do n.º 1 desse artigo, esquecendo o nº3 do mesmo e a cl.III, nº5, do contrato em questão, já atrás transcrita. É, enfim, em relação às alturas mencionadas nessa estipulação que há que referir o prazo de emissão da factura exigida pela al.b) do n.º 1 do art.28º, estabelecido no art.35º (v. seus nºs 1º e 2º)

(9) Alude, sem mais precisar, à dissertação de João José Abrantes, "A Excepção de Não Cumprimento do Contrato no Direito Civil Português" (1986). V., nesse estudo, pp. 74 -8.2., ss., maxime 77 ss, 79 ss e 81 - em contrário, afinal, da tese da recorrente. Em apoio do que, no texto, imediatamente antecede e segue, v.pp.39 ss, maxime 40 e 42, último par., 127 ss, e 141 ss. A

interdependência funcional e consequente nexo causal que esta excepção privilegia estabelece-se, com evidência, entre a prestação dos serviços em questão e a retribuição respectiva - obrigações, essas sim, sinalagmáticas v., a propósito deste adjectivo, Lopes Cardoso, "Manual da Acção Executiva", 3ª ed.

(1964 ), 196 e nota 1).

(10) A recorrente perde-se ainda pelo caminho em considerações referidas ao art.272º C.Civ., cuja incongruência se afigura manifesta. Resulta, conforme exposto, por igual descabido qualquer outro acoplado óculo ou perspectiva, designada mente o fiscal referido na parte final ( IV) da alegação da

recorrente.

Referências

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a) Em termos formais, parecem estar cumpridos, in casu, os requisitos constantes do n.º 3 no artigo 400.º do Código de Processo Penal e do artigo 678.° n.° 1 do Código de

recorrente, tendo em conta o disposto nos art.ºs 21.º, n.º 1, e 31.º do Dec.-Lei n.º 15/93, de 22 de Janeiro e 73.º do CP, condená-lo na pena de 3 anos de prisão (reduzindo a pena

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