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Pesquisa científica em áreas protegidas do litoral norte de São Paulo : limitações e perspectivas visando a conservação

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Carolina Joly

PESQUISA CIENTÍFICA EM ÁREAS PROTEGIDAS DO

LITORAL NORTE DE SÃO PAULO - LIMITAÇÕES E

PERSPECTIVAS VISANDO A CONSERVAÇÃO

CAMPINAS

2014

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Universidade Estadual de Campinas Instituto de Filosofia e Ciências Humanas

CAROLINA JOLY

PESQUISA CIENTÍFICA EM ÁREAS PROTEGIDAS DO LITORAL

NORTE DE SÃO PAULO - LIMITAÇÕES E PERSPECTIVAS VISANDO

A CONSERVAÇÃO

ORIENTADORA: PROF.ª DR.ª SIMONE APARECIDA VIEIRA CO-ORIENTADORA: PROF.ª. DR.ª. LEILA DA COSTA FERREIRA

Tese de doutorado apresentada ao Instituto de Filosofia e Ciências Humanas (IFCH) da Universidade Estadual de Campinas para obtenção do Título de Doutora em Ambiente e Sociedade na Área de Concentração “Aspectos Sociais de Sustentabilidade e Conservação”

Campinas 2014

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FICHA CATALOGRÁFICA Universidade Estadual de Campinas

Biblioteca do Instituto de Filosofia e Ciências Humanas Cecília Maria Jorge Nicolau - CRB 8/338

Joly, Carolina, 1980 – J688p

Pesquisa científica em áreas protegidas do litoral norte de São Paulo -

limitações e perspectivas visando a conservação / Carolina Joly. – Campinas, SP : [s.n.], 2014

Orientador: Simone Aparecida Vieira Coorientador: Leila da Costa Ferreira

Tese (doutorado) – Universidade Estadual de Campinas, Instituto de Filosofia e Ciências Humanas.

1. Áreas de conservação de recursos naturais - São Paulo (Estado). 2. Áreas protegidas – São Paulo (Estado). 3. Pesquisadores – São Paulo (Estado). 4. Biodiversidade – Conservação. 5. Parque Estadual da Serra do Mar (SP) - Conservação. 6. Mata Atlântica – Conservação. I. Vieira, Simone Aparecida, 1967-. II Ferreira, Leila da Costa, 1958-. III Universidade Estadual de Campinas – Instituto de Filosofia e Ciências Humanas. IV. Titulo

Informações para Biblioteca Digital

Título em inglês: Scientific research in protected areas of the northern coast of São Paulo:

limitations and perspectives aimed at conservation

Palavras chave em inglês:

Natural resources conservation areas - Sao Paulo (States) Protected - Sao Paulo (States)

Researchers - Sao Paulo (States) Biodiversity - Conservation

Serra do Mar State Park (SP, Brazil) - Conservation Mata Atlantica (Brazil)

Área de Concentração: Aspectos Sociais de Sustentabilidade e Conservação Titulação: Doutora em Ambiente e Sociedade

Banca Examinadora

Simone Aparecida Vieira [Orientadora] Juliana Sampaio Farinaci

Sonia Regina da Cal Seixas Gabriela Marques Di Giulio Leonardo Ribeiro Teixeira

Data da Defesa: 27/08/2014

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RESUMO

A presente pesquisa de doutorado investigou a contribuição das pesquisas acadêmicas para a manutenção e manejo de áreas protegidas, considerando a importância dessas áreas como estratégia fundamental para a conservação da biodiversidade, sobretudo em regiões tropicais, especialmente aquelas localizadas na Mata Atlântica. O destaque de contribuições acadêmicas para a construção conjunta de marcos regulatórios importantes para a conservação ambiental e, em especial, da Mata Atlântica, também está presente na pesquisa. Porém, nosso estudo de caso se deu sob o prisma das áreas protegidas, analisando a atuação de um grupo de pesquisadores, entre alunos e professores, ligados ao Programa BIOTA/FAPESP, em quatro núcleos do Parque Estadual da Serra do Mar, localizados no litoral norte do Estado de São Paulo, em relação ao seu grau de envolvimento com a gestão dessas áreas. Verificou-se que, de maneira geral, pesquisadores percebem o potencial da pesquisa acadêmica como subsídio à conservação, porém, na prática, ainda predomina o distanciamento e a desvinculação de questões ligadas à gestão e à manutenção desses refúgios.

PALAVRAS CHAVE

Áreas protegidas – conservação – pesquisadores - Programa BIOTA/FAPESP – Núcleos do PESM no Litoral Norte de São Paulo

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ABSTRACT

The research has investigated the contribution of academic studies to protected areas management, considering the importance of these areas as a fundamental strategy for environmental conservation, mainly in tropical regions, and especially those located in the Brazilian Rainforest. The importance of academic contributions to the collective construction of regulatory frameworks for environmental conservation, particularly those related to the Atlantic Forest, is also discussed in this research. However, our case study was carried out from the perspective of the administration of protected areas, analyzing the performance of researchers in relation to their degree of involvement with the management of the protected areas where they are working. Our focus was a group of researchers, both students and supervisors, linked to the BIOTA/FAPESP Program and working within four administrative Nuclei of the Serra do Mar State Park in São Paulo State. We found that, in general, researchers do realize the potential contribution of academic research to environmental protection, but in practice, still predominate their disconnection from issues related to management and maintenance of the protected areas where they are carrying out their own research.

KEY WORDS

Protected areas – conservation – Mata Atlântica - researchers – BIOTA/FAPESP Program – Northern Nuclei of the Serra do Mar State Park in São Paulo State

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO 01

CAPÍTULO 1 - CIÊNCIA NA POLÍTICA – EVIDÊNCIAS, FATOS E

CONTRIBUIÇÕES 07

1.1 - SOBRE A VALIDADE DA AUTORIDADE CIENTÍFICA 07

1.2 CONTRIBUIÇÕES CIENTÍFICAS EM MARCOS

CONSERVACIONISTAS NO BRASIL 13

1.3 CONTRIBUIÇÕES CIENTÍFICAS EM MARCOS

CONSERVACIONISTAS PARA O BIOMA MATA ATLÂNTICA 17

CAPÍTULO 2 - ÁREAS PROTEGIDAS E PRODUÇÃO CIENTÍFICA 27

2.1 ÁREAS PROTEGIDAS NO MUNDO 27

2.2 ÁREAS PROTEGIDAS NO BRASIL 33

2.3 PESQUISA EM ÁREAS PROTEGIDAS DE MATA ATLÂNTICA 38

2.4 PESQUISADORES X CONSERVAÇÃO 45

CAPÍTULO 3 - PESQUISADORES EM ÁREAS PROTEGIDAS DO

LITORAL NORTE DE SÃO PAULO – O BIOTA NO PESM 49

3.1 OS NÚCLEOS DO PARQUE ESTADUAL DA SERRA DO MAR, NO

LITORAL NORTE DE SÃO PAULO 49

3.2 O PROGRAMA BIOTA/FAPESP 57

3.3 PESQUISADORES DO PROGRAMA BIOTA/FAPESP NO PESM 66

3.3.1 METODOLOGIA 66

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3.3.3 DISCUSSÃO 82 CONSIDERAÇÕES FINAIS 85 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 91 APÊNDICE 1 101 APÊNDICE 2 103 APÊNDICE 3 121

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Á Lavínia, Carlos, Helô, Deny e Su, Pois sem eles, não chegaria, Ou nem teria partido.

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AGRADECIMENTOS

Agradeço a Deus pelas oportunidades que encontrei no decorrer dessa pesquisa de me aproximar ainda mais das matas que sempre admirei e das quais tenho muita saudade. Essa tese começou a ser escrita em uma morada em meio a Mata Atlântica, um dos hotspots de biodiversidade do país, e terminou de ser redigida em meio ao Cerrado, o outro hotspot brasileiro, ao qual venho me acostumando. A transição, na verdade um tanto brusca, agora vejo que dá frutos.

Agradeço à minha família, sempre presente e solícita, não importando a distância.

Agradeço aos colegas do NEPAM, especialmente aos que participaram do questionário teste e aos que leram versões passadas e me ajudaram muito a caminhar na pesquisa.

Agradeço à minha orientadora, Simone, e à minha co-orientadora Leila. Agradeço à Shakira, minha pastora francesa, companheira de todas as horas.

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LISTA DE ILUSTRAÇÕES

Figura 1

Mapa das formações vegetais do bioma Mata Atlântica contempladas pelo Projeto de Lei n°3.285/1992 e, posteriormente, pelo Decreto n° 750/1993.

Figura 2

Mapa da extensão do Domínio Mata Atlântica sob a jurisdição do Decreto de Lei n° 750/1993 e os remanescentes florestais do bioma.

Figura 3

Porcentagem de vegetação natural dentro e no entorno de áreas protegidas em quatro formações vegetais distintas: Floresta Amazônica, Mata Atlântica, Floresta do Congo e Florestas do Oeste Africano.

Figura 4 Comparação do grau de fragmentação entre duas áreas

protegidas do bioma Mata Atlântica.

Figura 5

Produção bibliográfica em biodiversidade e ecologia de Floresta Atlântica de autores brasileiros no período de 1945 a 2008.

Figura 6 Mapa do Parque Estadual da Serra do Mar (PESM)

subdividido em oito núcleos.

Figura 7 Pontos de coleta registrados por pesquisadores vinculados ao

Programa BIOTA/FAPESP.

Figura 8

Número total de coletas realizadas por pesquisadores vinculados ao Programa BIOTA/FAPESP, no período entre 1999 e 2009, classificadas em ordem decrescente, por município.

Figura 9

Gráfico ilustrativo do gradiente altitudinal avaliado pelo projeto temático.

Figura 10

Gráfico indicando as quantidades de estocagem de Carbono tanto acima quanto abaixo do solo, comparando as diferentes fisionomias de Mata Atlântica com algumas fisionomias amazônicas.

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Figura 11

Gráfico indicando as quantidades de estocagem de Nitrogênio tanto acima quanto abaixo do solo, comparando as diferentes fisionomias de Mata Atlântica com algumas fisionomias amazônicas.

Figura 12

Gráfico indicando as respostas dos pesquisadores com relação à pergunta: Em sua opinião, é desejável que

pesquisadores contribuam de maneira efetiva para a prática da conservação ambiental nas unidades de conservação onde realizam suas pesquisas de campo?

Figura 13

Gráfico indicando as respostas dos pesquisadores com relação à pergunta: Você gostaria que os resultados de sua

pesquisa fossem utilizados na gestão/manutenção do(s) Núcleo(s) onde trabalha (ou trabalhou)?

Figura 14

Gráfico das respostas dos pesquisadores para a pergunta: Em

relação ao programa BIOTA/FAPESP, qual o melhor resultado até o momento, em sua opinião?

Figura 15

Gráfico das respostas dos pesquisadores para a pergunta: Os

Núcleos do PESM no Litoral Norte abrigam 7 das 11 áreas prioritárias para conservação em todo o Parque. Segundo seus conhecimentos, classifique em ordem de importância, as principais ameaças à conservação nesses locais.

Figura 16

Gráfico das respostas dos gestores para a pergunta: Os

Núcleos do PESM no Litoral Norte abrigam 7 das 11 áreas prioritárias para conservação em todo o Parque. Segundo seus conhecimentos, classifique em ordem de importância, as principais ameaças à conservação nesses locais.

Figura 17

Gráfico das respostas dos pesquisadores para a pergunta:

Segundo seus conhecimentos, classifique em ordem de importância os principais problemas de infraestrutura enfrentados pelo(s) gestor(es) do(s) Núcleo(s) onde você atua.

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Figura 18

Gráfico das respostas dos gestores para a pergunta: Segundo

seus conhecimentos, classifique em ordem de importância os principais problemas de infraestrutura enfrentados pelo(s) gestor(es) do(s) Núcleo(s) onde você atua.

Figura 19

Gráfico das respostas dos gestores para a pergunta: Durante

este período, já precisou consultar algum pesquisador? Se sim, em qual situação?,seguido pelas respostas individuais

dos gestores.

Figura 20

Gráfico das respostas dos gestores para a pergunta: Em sua

opinião, a atuação dos pesquisadores vinculados ao Programa BIOTA/FAPESP trouxe benefício para o Núcleo onde trabalha (trabalhou)? Se SIM, qual (quais) foi (foram)?, seguido pelas

respostas individuais dos gestores.

Figura 21

Gráfico das respostas dos gestores para a pergunta: Gostaria

de participar da escolha dos temas de pesquisa desenvolvidos ou em desenvolvimento no Núcleo onde trabalha (trabalhou)?,

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TABELAS

Tabela 1

Lista das 31 guildas de plantas e animais, além dos 21 vetores de mudanças ambientais, avaliados tanto no interior das 60 áreas protegidas quanto em seu entorno imediato.

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LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS

AP - Área Protegida

BIOTA/FAPESP – Programa de Pesquisa em Caracterização, Conservação, Restauração e Uso Sustentável da Biodiversidade.

CDB – Convenção de Biodiversidade Biológica

CETESB – Companhia de Tecnologia de Saneamento Ambiental de São Paulo

CNPq – Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico CONAMA – Conselho Nacional de Meio Ambiente

FAO – Food and Agriculture Organization of the United Nations

FAPESP – Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo

FF – Fundação Florestal

IBAMA – Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e Recursos Naturais Renováveis IBGE – Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística

IGFA - International Group of Funding Agencies for Global Change Research IPBES - Plataforma Intergovernamental de Biodiversidade e Serviços Ecossistêmicos

INPE – Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais IUCN – International Union for Conservation of Nature MMA – Ministério do Meio Ambiente

NSF - Nacional Science Foundation

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ONG – Organização Não Governamental

PESM – Parque Estadual da Serra do Mar

RBMA – Reserva da Biosfera da Mata Atlântica

SBPC – Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência

SEMA – Secretaria Especial de Meio Ambiente

SMA – Secretaria de Meio Ambiente do Estado de São Paulo SNUC – Sistema Nacional de Unidades de Conservação

UC – Unidades de Conservação

UFMG – Universidade Federal de Minas Gerais

UNESP – Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho” UNICAMP – Universidade Estadual de Campinas

USP – Universidade de São Paulo

UTGCA – Unidade de Tratamento de Gás de Caraguatatuba WDPA – World Database on Protected Areas

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INTRODUÇÃO

Dentro da temática das mudanças ambientais globais o tema da perda da diversidade biológica não tem o mesmo destaque e repercussão que as mudanças climáticas, sobretudo junto aos meios de comunicação e às ações de governos. Podemos justificar afirmando que as alterações do clima afetam diretamente a vida dos habitantes, trazendo prejuízos materiais e de vidas humanas, enquanto a perda de espécies representa uma ameaça indireta para a maioria da população. No entanto, segundo estudo que se tornou referência internacional em avaliação da degradação ambiental em escala planetária, utilizado inclusive como referência nos documentos oficiais da Conferência RIO+20 (Rockström et al, 2009), a extinção de espécies já representa a maior das violações que a humanidade realizou ao que os autores chamam de “limites planetários”. Silenciosa e de difícil mensuração, a perda de biodiversidade representa um prejuízo diário e constante, eliminando o patrimônio genético e muitos dos serviços ambientais que tínhamos à nossa disposição.

Segundo Diaz et al (2006), a biodiversidade promove sim o bem estar humano, incluindo o acesso a água e a materiais básicos para se ter uma vida satisfatória, além de segurança frente às mudanças ambientais globais. Mas para populações com modos de vida ainda muito dependentes dos recursos ambientais, como comunidades tradicionais ou agricultores de subsistência, o prejuízo de serviços ambientais, causados pela perda de biodiversidade, representa um considerável aumento nas dificuldades de sobrevivência. E como estes são atores com baixo nível de poder econômico, muitas vezes não têm como substituir produtos ou serviços perdidos com fim de benefícios ambientais de que dispunham. Assim, Diaz et al (2006) nos mostram que a perda de biodiversidade está inexoravelmente ligada ao aumento da pobreza, o maior dos desafios ao futuro da humanidade, segundo as Nações Unidas. E os mais prejudicados são justamente aqueles já menos favorecidos.

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E, assim como nas mudanças climáticas (Yearley, 2009), as projeções sobre perda de biodiversidade também podem ser consideradas uma construção social, sujeita a falhas e discordâncias, pois todo o conhecimento acumulado sobre o tema e as previsões a respeito do futuro de determinadas espécies estão calcadas em estudos e modelagens envolvendo ecossistemas extremante complexos e um conhecimento, que apesar dos esforços, ainda é bastante incompleto.

As ciências ambientais do século XXI ainda não nos permitem afirmar quantas espécies existem de fato no planeta, por exemplo (Lewinsohn & Prado,

2005). Estimativas avaliam que o número total, incluindo espécies ainda não

descritas, pode chegar a cerca de 14 milhões (UNEP-WCMC, 2000), sendo que boa parte das lacunas de conhecimento está localizada nas regiões neotropicais e nos oceanos, justamente onde a biodiversidade é maior. Segundo uma avaliação mais recente, depois de 250 anos de classificações taxonômicas e mais de 1,2 milhões de espécies catalogadas mundialmente, restam ainda a serem descritas cerca de 86% das espécies do planeta, das quais 91% estão nos oceanos, em sua maioria invertebrados. (Mora et al, 2011).

As Áreas Protegidas (APs), entendidas nesta pesquisa como propõe a definição internacional adotada pela International Union for Conservation of Nature (IUCN), foram criadas, inicialmente, por seu caráter cênico e para proteção de ecossistemas constituídos de parte desta biodiversidade que ainda estamos descobrindo. Mas a incorporação de conceitos biológicos que foram surgindo (como diversidade de espécies, de ecossistemas, interações entre espécies, entre outros) também acompanhou o processo de implantação de APs, valorizando-se cada vez mais o caráter científico dessas áreas (Brito, 2000).

Nesse sentido, as APs podem desempenhar um papel fundamental na ampliação do conhecimento científico a respeito das espécies e seus ecossistemas, uma vez que estão se tornando, cada vez mais, os últimos locais onde ainda é possível realizar esses estudos. As ciências ambientais ainda

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espécies pelo planeta, quais teriam sido as principais formas de sua dispersão e quais são as estratégias evolutivas de plantas e animais em relação às mudanças ambientais do passado e se, possível, também do futuro. As APs, se não usadas pelos pesquisadores como fonte primária de informações, são utilizadas como parâmetro para muitas dessas informações.

O conhecimento científico sobre os ecossistemas envolvidos pelas APs, por sua vez, é um dos fatores determinantes para o futuro dessas áreas, onde o pesquisador, ao lado das instituições gestoras, desenvolve papel central. Porém, a literatura nos mostra que, de maneira geral, os pesquisadores não enxergam seu trabalho como forma de colaborar ativamente com a conservação dessas APs (Castro, 2004; Shanley & López, 2009; Jolibert & Wesselink,

2012). A discrepância entre a enorme quantidade de publicações científicas sobre

o tema “biodiversidade” e o alto grau de degradação ambiental que os biomas, de maneira geral, vêm sofrendo é um retrato desse desinteresse (Scarano, 2007).

A presente pesquisa teve como questão central, investigar se é possível afirmar que há mudanças nessa postura dos pesquisadores quando se trata de programas de pesquisa que têm um viés de colaboração com políticas públicas voltadas à conservação. Assim, analisamos as práticas de pesquisa de um grupo de investigadores vinculados ao Programa BIOTA/FAPESP, que desenvolveu pesquisas em APs de Mata Atlântica, no Litoral Norte do Estado de São Paulo. O Programa, existente há quatorze anos, tem como um dos seus objetivos auxiliar no aperfeiçoamento de políticas públicas de conservação no Estado de São Paulo. Nesse sentido, o objetivo da pesquisa é contribuir para o debate sobre o papel dos cientistas na elaboração de políticas públicas voltadas à conservação.

Escolhemos como local de estudo os núcleos do Parque Estadual da Serra do Mar (PESM) localizados no litoral norte de São Paulo, por ter uma alta concentração de pesquisadores do Programa BIOTA/FAPESP trabalhando com um dos biomas mais ameaçados do planeta, e pelas rápidas transformações espaciais pelas quais essa região do Estado vem passando, intensificando os

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vetores de pressão sobre as APs aí localizadas. Os núcleos selecionados são: Picinguaba, Caraguatatuba, São Sebastião e Santa Virgínia.

Do ponto de vista metodológico, trabalhamos em dois níveis, abrangendo pesquisa documental e a realização de entrevista/questionários. O estudo envolveu a seleção de pesquisadores vinculados ao BIOTA/FAPESP que trabalharam nessas APs no período entre 1999 e 2009, e o posterior envio de questionário eletrônico, contendo perguntas relativas à atuação deles como pesquisadores nessas APs. Também foram identificados os gestores atuais e os anteriores desses núcleos, para os quais também foi enviado um questionário semelhante. Através da comparação entre as respostas de ambos os atores foi possível perceber que existe um desejo latente de maior colaboração por parte dos gestores. E os pesquisadores, de modo geral, afirmam que gostariam de colaborar mais, mas acabam não o fazendo na prática. Também realizamos entrevistas semiestruturadas com o atual coordenador do Programa BIOTA/FAPESP, o Prof. Carlos Joly (UNICAMP), com o Professor Naércio A. Menezes (USP), então membro da Coordenação de Ciências Biológicas da FAPESP durante o período de criação do BIOTA/ FAPESP, e com o Professor Thomas Lewinsohn (UNICAMP), que também participou do momento de criação do Programa e desenvolveu projetos vinculados a ele.

O trabalho está dividido em três capítulos. O primeiro discute, do ponto de vista teórico, o papel da autoridade científica a respeito das questões ambientais, trazendo como argumento favorável a essa autoridade algumas contribuições científicas em importantes marcos conservacionistas no Brasil e alguns específicos para o bioma Mata Atlântica.

O capítulo 2 aborda a relação direta entre produção científica e APs, mostrando, através de algumas pesquisas, a importância que dados científicos desempenham no reforço à criação e à manutenção de APs, especialmente em biomas tropicais, hoje os mais ameaçados. Também traz um recorte sobre a interação atual entre pesquisas e APs no Brasil, especialmente aquelas realizadas

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que a comunidade científica, em geral, demonstra em relação à transmissão do conhecimento a outros públicos, além de suas consequências.

No capítulo 3 são apresentados os resultados da pesquisa empírica, que investigou se os pesquisadores vinculados ao BIOTA/FAPESP internalizam em suas pesquisas, realizadas em uma das maiores APs de Mata Atlântica do país, a possibilidade de contribuir de maneira efetiva para a conservação desse bioma.

É importante destacar que esta pesquisa está inserida no Projeto Temático Urban Growth, Vulnerability and Adaptation: social and ecological

dimensions of climate change on the Coast of São Paulo (Processo FAPESP

2008/58159-7), coordenado por Lúcia da Costa Ferreira, que, em linhas gerais, busca investigar os impactos das mudanças climáticas globais no litoral do Estado de São Paulo, com foco no Litoral Norte, a partir de quatro eixos de pesquisa: Dinâmicas Populacionais, Conflitos Sociais, Biodiversidade e Políticas Públicas, eixo ao qual este trabalho está vinculado.

Ao evidenciar os problemas atuais que as APs do Litoral Norte de São Paulo vêm sofrendo, somados à dificuldade em fazer com que os esforços de pesquisa conduzidos em seu interior contribuam para enfrentar pelo menos parte desses problemas, sinalizamos a necessidade de mudanças nas políticas públicas voltadas à pesquisa científica em APs.

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CAPÍTULO 1 - CIÊNCIA NA POLÍTICA – EVIDÊNCIAS, FATOS E CONTRIBUIÇÕES

Neste capítulo apresentamos uma discussão teórica a respeito do conhecimento científico na elaboração de políticas públicas voltadas à conservação. A dificuldade em se apropriar de fatos, dados e informações usados como parâmetros na elaboração dessas políticas, contudo, não deve ser vista como impedimento à contribuição que a ciência pode oferecer. Ilustramos esse ponto de vista com alguns exemplos de marcos regulatórios ambientais importantes no Brasil, conquistados com o auxílio do debate científico.

1.1 SOBRE A VALIDADE DA AUTORIDADE CIENTÍFICA

Há cerca de dez anos, alguns conservacionistas britânicos iniciaram um debate a respeito de uma perspectiva teórica conhecida como “Evidence Based Policy”, que teve como origem a valorização do uso de evidências empíricas no campo da Medicina britânica aplicada e passou a ser revindicada também para a conservação ambiental (Sutherland et al, 2004). Segundo estes autores,

Before the evidence-based revolution in medicine, ‘experts’ produced guidelines for the management of particular conditions, which were sometimes based on research evidence, but could also be based entirely on an individual experience or opinion. We are guilty of providing similar advice in conservation (Sutherland et al, 2004:306).

Estes autores se preocupam com o uso generalizado de práticas de conservação baseadas apenas no senso comum ou em experiências anteriores, sem que o conhecimento científico de práticas mais adequadas seja difundido e utilizado. Eles defendem a criação e disponibilização de um repositório de informações científicas empiricamente comprovadas sobre conservação (através de websites), que permita a comparação de experiências e esteja sujeita a revisões sistemáticas, devendo ser usadas no suporte da prática da conservação e na elaboração de políticas públicas.

No campo das áreas protegidas (APs), foco principal deste trabalho, essa perspectiva teórica é adotada por Cook et al (2009), ao analisarem a administração de mais de mil APs na Austrália e verificarem o uso de

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“evidence-based knowlegde” na prática da administração dessas áreas. O resultado, segundo eles, é que em pelo menos 25% das avaliações de efetividade do manejo, os gestores indicaram insuficiência de evidências científicas que os ajudassem na administração dessas áreas. Segundo os autores,

Data are often absent in reserves, because of the prohibitive cost of monitoring; consequently, most methods for assessing management effectiveness are based on conservation practitioners’ experience (Cook

et al, 2009: 181).

Para Cook et al (2009), a falta de evidências científicas comprovadas prejudica o bom manejo dessas APs, e é papel das agências governamentais que administram essas áreas mudar esse quadro.

(…) it is a false economy to protect natural areas while failing to adequately support the practitioners trying to manage them. Without sufficient evidence to support decision making by conservation practitioners, it is optimistic to believe the best conservation outcomes will be achieved (Cook et al, 2009: 185).

Porém, em se tratando de APs espalhadas pelos mais diversos biomas do planeta, em diferentes contextos institucionais, políticos e sociodemográficos, falar em uniformização de evidências científicas para manejo e conservação dessas áreas parece impossível, ou talvez até equivocado. Dessa maneira, o papel do pesquisador que trabalha em uma AP se torna ainda mais especial, por possibilitar este possa contribuir com aquele refúgio em particular, que possui atributos únicos, através de sua pesquisa.

O sociólogo da ciência e antropólogo Latour (1997), em sua abordagem epistemológica, advoga a existência de uma categoria de descobertas ou invenções que chama não de evidências mas de “fatos científicos”. São aqueles construídos coletivamente, através da contribuição de vários cientistas através do tempo, e tidos como conhecimentos tácitos, como por exemplo, a estrutura em dupla hélice do DNA. Nesse sentido, as APs também podem ser vistas como potenciais geradoras de fatos científicos, ou evidências empíricas. Para as ciências ambientais, a teoria dos corredores ecológicos, por exemplo, é um fato científico: quanto mais conexas as áreas remanescentes de vegetação

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seu entorno (maior resiliência), tanto do ponto de vista da oferta de refúgio para as espécies que ali se abrigam quanto para a manutenção do fluxo gênico, que, segundo outro fato científico, quanto maior, melhor é a chance de adaptação e sobrevivência das espécies, devido à maior variabilidade genética. Sem dúvida, as APs têm papel preponderante no avanço do conhecimento em disciplinas como a Ecologia ou a Bioquímica, entre outras, basta lembrar das estimativas do que ainda há para ser descoberto somente em número de espécies, por exemplo, como será abordado no Capítulo 2.

Porém, a obtenção de evidências empíricas ou fatos científicos em campos epistemológicos relativamente novos, como a Ecologia, pode não ser tão comum, sobretudo quando se trata do conhecimento científico sobre organismos e interações ainda desconhecidas por qualquer cientista e que se encontram em permanente evolução há bilhões de anos.

Dessa maneira, há autores que, sob a perspectiva da sociologia

ambiental construtivista, desconfiam da simples aplicação de conhecimento científico e evidências empíricas em práticas e legislações ambientais. Yearley

(2005), por exemplo, afirma que a visão de cientistas não é isenta de parcialidade,

está sujeita a generalizações e julgamentos dos fenômenos estudados, os quais, aliás, são realizados muitas vezes através de instrumentos, que podem conter erros ou aproximações. Além disso, os cientistas podem ser levados a acreditar em determinados resultados que corroboram uma teoria a qual eram previamente adeptos. Nas palavras do autor,

The frontier of things which count as factual observations tends to shift as scientific ideas change so that what, at one time, would have been regarded as hypothetical images from a new and experimental form of microscope for example come later to be regarded as unproblematic observations. (…) At a practical level, it is generally impossible for scientists to collect all the information they would like before having to decide on a theoretical interpretation. Scientists’ theoretical beliefs are not fully decided by the factual evidence available to them (Yearley,

2005:120).

Yearley (2005) ainda destaca uma dificuldade a mais enfrentada especialmente por ecólogos para que atinjam o consenso, constituído por um grau

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de incerteza ainda maior, dada a natureza dos fenômenos estudados por esse campo científico. Segundo o autor,

There is less consensus in ecological science than in many other areas of natural science so that the interpretation of ecological information is especially which stems from the fact that they are dealing with large-scale fenomena addressed by those other parts of natural science, technology and engineering that operate with closed systems where all the leading variables can be closed monitored and controlled (Yearley, 2005:127). Realmente, a obtenção de consenso entre cientistas que estudam o uso sustentável de recursos (ou common assessments) por exemplo, pode ser muito difícil, pois a cada novo problema de escassez significa aprender sobre um novo sistema. Além disso, dada a complexidade dos sistemas biológicos e físicos envolvidos, é inevitável recorrer a abordagens reducionistas, levando a necessidade de se descobrir um ponto ótimo de exploração através de tentativas e erros. Do mesmo modo, grandes níveis de variação natural dos recursos podem mascarar os efeitos da sobrexploração, que, em sua fase inicial, não é detectável, até que se torne severa ou irreversível (Ludwig et al, 1993). Sobre a obtenção de consenso, os autores afirmam:

Legislation concerning the environment often requires environmental or economic impact assessment before action is taken. Such impact assessment is supposed to be based upon scientific consensus. For the reasons given above, such consensus is seldom achieved, even after collapse of the resource (Ludwig et al, 1993:17).

Finalmente, Morin (2005) nos mostra que não existe, na realidade, um “fato puro”. A atividade científica consiste o tempo todo numa operação de seleção, de eliminação de fatos que não são pertinentes, quantificáveis ou julgados como contingentes. Logo, uma teoria científica é também fruto de escolhas, de períodos históricos, de momentos políticos, de condições econômicas, enfim, é uma construção social, em permanente transformação. Nesse sentido, é necessário abandonarmos o conceito de progresso linear das teorias científicas, e, além disso, perceber que a ciência tem necessidade de introduzir em si mesma a “reflexividade” em relação a suas práticas. O

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conhecimento do conhecimento científico comporta necessariamente uma dimensão reflexiva, que deveria vir do interior do mundo científico (Morin, 2005).

A reflexividade significa, então, uma avaliação epistemológica, própria de cada área de pesquisa, em relação ao que é o “conhecimento” e sobre os desdobramentos do trabalho científico para a sociedade

(Nonato, 2012).

A chamada questão ambiental, com seu caráter interdisciplinar, se destaca na convocação dos cientistas à reflexividade, pois a ciência tem sido associada tanto às causas da degradação ambiental quanto à busca de soluções para a sua proteção (Fischer, 2000). Consequentemente, a problemática ambiental acelerou o aprofundamento das discussões em torno da neutralidade da ciência, da democratização do conhecimento científico e da necessária participação da sociedade civil na elaboração de políticas de caráter difuso

(Nonato, 2012).

Mas como elaborar políticas públicas de conservação ou estimular tomadas de decisão nessa seara? Devemos sempre desconfiar dos resultados científicos e esperar pela comprovação de evidências ou o estabelecimento de consensos, mesmo que leve muito tempo? A questão é a urgência com que os principais desafios ambientais, como a extinção de espécies, por exemplo, se colocam, sobretudo quando consideramos a velocidade com que a degradação ambiental avança, comprometendo até mesmo a sobrevivência de alguns modos de vida tradicionais de maneira definitiva, tornando a miséria uma condição permanente para esses povos.

É preciso avançar na percepção desse caráter reflexivo que os campos científicos envolvidos na questão ambiental exigem, pois muitos cientistas, analisados sob a perspectiva da sociologia da ciência, ainda insistem em advogar pela existência de uma fronteira entre o “científico”, o “não científico” e o “político”. Porém, essa delimitação é muito fluida ou até inexistente (Nonato,

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Em seu estudo sobre a comunidade científica da Região Norte do Brasil e sua contribuição para o Desenvolvimento Sustentável local, por exemplo,

Nonato (2012) verificou a qualidade da articulação entre a ciência regional e as

políticas públicas. Nas entrevistas realizadas com cientistas da região, os argumentos dominantes como justificativa para a desarticulação entre os resultados científicos e as políticas públicas regionais, foram a “falta de interesse” ou a “falta de conhecimento” do poder público com relação à ciência desenvolvida na Região Norte. Contudo, como aponta a autora, a falta de conhecimento ou de interesse da comunidade científica em relação aos assuntos do poder público não foi questionada ou sequer mencionada nas respostas.

Efetivamente, a maior ou menor contribuição da comunidade de pesquisa depende da quantidade de recursos, mas, principalmente e essencialmente, da perspectiva política envolvida na construção social das pesquisas científicas e das tecnologias (Nonato, 2012:243).

O ecólogo Dr. Thomas M. Lewinsohn, professor do Instituto de Biologia da UNICAMP, afirma que, muitas vezes, a oportunidade de pesquisadores contribuírem diretamente com a elaboração de políticas públicas é circunstancial, como quando surge um momento político favorável. Já o engajamento do pesquisador é uma questão também de personalidade, de disposição, além das circunstâncias. (Prof. Dr. Thomas Lewinsohn, entrevista realizada em

10/06/2014)

A questão, talvez, esteja em como fazer ciência, ou seja, na prática cotidiana dos cientistas, que, em geral, elaboram suas hipóteses nos laboratórios para então as testarem no campo. Inverter a forma de se fazer pesquisa e partir também de hipóteses surgidas no campo para então investigá-las nos laboratórios talvez traga oportunidades de uso do conhecimento gerado na prática da conservação, mesmo que seja apenas in loco. Isso exigiria um pouco mais de envolvimento dos pesquisadores com os locais onde desenvolvem seus estudos, assim como com os prováveis desafios ambientais que estes locais enfrentam. No

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muito latente de que isso ocorra. Não se trata de defender aqui que a pesquisa em APs seja exclusivamente dedicada à solução de questões práticas e que esta opere em função da demanda dos órgãos gestores dessas áreas. Sabemos da importância que a pesquisa independente exerce para o desenvolvimento científico e para o fortalecimento das instituições acadêmicas. Sugerimos apenas um equilíbrio, no qual, na medida do possível, as pesquisas conduzidas em APs também considerem em seus escopos questões colocadas como desafios para a manutenção dessas áreas e para a sobrevivência das espécies ali abrigadas. No caso brasileiro, uma consulta ao plano de manejo de nossas APs, por exemplo, pode trazer muitas informações a respeito destas questões.

1.2 CONTRIBUIÇÕES CIENTÍFICAS EM MARCOS

CONSERVACIONISTAS NO BRASIL

Advogando em favor da contribuição que o conhecimento científico pode conferir às políticas públicas, podemos destacar alguns marcos conservacionistas bem sucedidos, em termos de legislação ambiental no Brasil, que contaram com o peso decisivo de cientistas em sua elaboração.

O primeiro deles é a criação de Estações Ecológicas, categoria de UC destinada principalmente à pesquisa científica, além da preservação de ecossistemas e de ações voltadas para a educação ambiental. Sua criação se iniciou durante o mandato de Dr. Paulo Nogueira Neto, professor emérito e fundador do Departamento de Ecologia do Instituto de Biociências da USP. Segundo ele:

“Foi criado, nos anos 1970 e na metade dos anos 1980, um total de 26 estações ecológicas, das quais 20 foram efetivamente implantadas e as outras seis ainda estão à espera de verbas e ações para sua efetivação, embora as respectivas áreas já estejam reservadas. Como Secretário (Federal) do Meio Ambiente (1974-1986), participei ativamente dessas atividades. É sempre difícil falar daquilo que a gente fez, mas pelo seu alcance (3.200.000 hectares) e pelas finalidades de pesquisa foi, ao que parece, o primeiro grande programa brasileiro e mesmo mundial que uniu, em larga escala, a pesquisa científica e a conservação da natureza.” (Nogueira Neto in Joly & Bicudo, 1999)

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Empossado em 1974, Dr. Paulo esteve por mais de doze anos à frente do primeiro cargo público federal dedicado exclusivamente à conservação ambiental no Brasil, a Secretaria Especial de Meio Ambiente (SEMA), então ligada ao Ministério do Interior. Nesse período, criou, por exemplo, Estações Ecológicas como as de Juréia-Itatins/SP, em 1979 e a de Anavilhanas/AM, em 1981, hoje um Parque Nacional. Dr. Paulo dispensou especial atenção às APs durante seu mandato, registrado inclusive em seu diário na época:

13/05/1980 - Soube que a FINEP [Financiadora de Estudos e Projetos] alegou que a SEMA quer dinheiro para comprar terras. Isso teria levado ao corte [de orçamento] em nosso pedido. É um absurdo fazer tal alegação. Como fazer pesquisas ecológicas e biológicas sem adquirir terras e evitar que ecossistemas únicos sejam destruídos? É uma ignorância total do que seja a Natureza e a necessidade de salvá-la. Gastam milhões em equipamentos e não se importam em proteger para sempre áreas naturais, que ao contrário dos equipamentos só aumentam em valor com o tempo (Nogueira Neto, 2009:386).

Em seguida, destaca-se a elaboração do próprio Capítulo de Meio Ambiente da atual Constituição Federal brasileira, outorgada em 1988. Elaborado em meio a uma atmosfera de redemocratização do país, o Capítulo VI, Artigo 225 foi redigido com a participação direta de cientistas. O grupo de pessoas responsável pela elaboração do Capítulo foi liderado pelo deputado paulista Fábio Feldmann, único candidato, em 1986, a ser eleito com uma plataforma ambiental. Além de Feldmann, advogado, o grupo que o assessorou mais de perto e foi responsável pela redação do Capítulo era composto, basicamente, por poucos integrantes e colaboradores, dentre eles o jornalista Randau Marques, um dos fundadores da Sociedade Brasileira de Jornalismo Científico (SBJC), ligada ao Conselho Nacional Científico e Tecnológico (CNPq), a bióloga Emília Rutkowski, professora da Faculdade de Engenharia Civil, Arquitetura e Urbanismo da Unicamp, e os biólogos João Paulo Capobianco, idealizador do Instituto Socioambiental (ISA), fundado em 1994, e Carlos Alfredo Joly, professor do Instituto de Biologia também da Unicamp, idealizador e atual coordenador do Programa BIOTA/FAPESP, criado em 1999.

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Havia também outros colaboradores que contribuíam mais à distância, principalmente em São Paulo, como Dr. Paulo Nogueira Neto, José Pedro de Oliveira Costa, arquiteto, primeiro secretário nomeado para a Secretaria de Meio Ambiente do Estado de São Paulo, Clayton Ferreira Lino, arquiteto e atual Presidente do Conselho Nacional da Reserva da Biosfera da Mata Atlântica (RBMA), além de um grupo de trabalho da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC), organizado justamente com o intuito de auxiliar na elaboração do Capítulo de Meio Ambiente, coordenado pelo professor Aziz Ab´Saber, da USP, e pelo Prof. Ângelo Machado, da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) (Joly, C. A, entrevista realizada em 17/03/12).

O uso de certas terminologias na escrita do Capítulo de Meio Ambiente como “processos ecológicos”, “função ecológica”, “patrimônio genético” ou “ecossistemas naturais” demonstra a influência das chamadas ciências da vida na sua elaboração. Muitos dos profissionais que assessoraram de perto sua redação atuavam em áreas de vanguarda dentro da pesquisa acadêmica, trabalhando com paradigmas científicos atuais para a época, no campo da Ecologia de Ecossistemas e da Biologia Evolutiva, por exemplo, que foram claramente transportados para o conteúdo dos princípios apresentados nesse Capítulo VI. Talvez seja essa uma de suas principais virtudes. Segundo Carlos Joly:

“Quando a gente definiu que indicaríamos alguns biomas como biomas muito ameaçados, para serem considerados patrimônio nacional, e, portanto terem um tratamento diferenciado, para cada indicação você tinha que escrever toda uma justificativa. Então, delimitar a Amazônia, ou o Pantanal, a Serra do Mar ou a Mata Atlântica, você tinha que justificar, escrever um “arrazoado” que era o que o Fábio ia usar para convencer os demais membros da Subcomissão de Seguridade, Meio Ambiente e Consumidor de aquilo deveria ficar. Então era muito mais esse o nosso papel. (...) Sem dúvida, foi muito importante para convencer os demais deputados o fato de você ter um conjunto de pesquisadores que estavam suportando, apoiando essas ideias. Por isso que a gente fazia aquelas... Ah, por que usar “processos ecológicos”, e escrevia todo um arrazoado. Na hora que o Fábio apresentava isso na Subcomissão, ele era questionado: “ah, mas por quê? O que isso quer dizer exatamente?”Aí, então, ele tinha o que a gente tinha escrito para justificar, para defender. Algumas vezes, não muitas, a gente participou de reuniões com

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deputados também da Subcomissão, e depois algumas dessas reuniões foram com a frente parlamentarista quando saiu da Subcomissão e foi para a plenária” (Joly, C. A, entrevista realizada em 17/03/12).

O então deputado Fábio Feldmann organizou duas excursões de campo, a fim de ilustrar o conteúdo científico do texto defendido no Capítulo e mostrar os principais problemas ambientais para os deputados constituintes.

“O Fábio convenceu a comissão a fazer visitas in loco, então a Subcomissão [de deputados] veio, ou pelo menos uma parte dela veio a São Paulo, descemos por Cubatão, fomos para Ubatuba, o almoço foi lá na Casa da Farinha [comunidade quilombola, no interior do Parque Estadual da Serra do Mar, Núcleo Picinguaba, Litoral Norte paulista], depois seguimos de Ubatuba para Angra dos Reis para ver a usina e terminava a visita ali. Teve uma outra visita que foi feita ao Pantanal. A ideia era mostrar in loco os problemas e por que a gente estava colocando aquelas áreas como diferenciadas em termos de tratamento”

(Joly, C. A, entrevista realizada em 17/03/12).

Esse parece ter sido um marco histórico importante no qual é possível observar o interesse e a participação efetiva de cientistas na elaboração de políticas públicas conservacionistas. Era também um momento especial da trajetória política brasileira, no qual os movimentos sociais, inclusive o ambientalista, podiam se expressar livremente e buscar representação política. Era natural que os ambientalistas se aproximassem da academia, pois, ao contrário de outros movimentos sociais, a questão ambiental é intrinsecamente ligada à ciência porque suas preocupações nasceram de problemas descobertos por cientistas (Yearley, 2005). Isso é muito evidente no movimento ambientalista britânico, por exemplo, onde as mais renomadas sociedades conservacionistas nasceram do desenvolvimento da História Natural como disciplina, originando organizações como a Royal Society for Nature Conservation (RSNC) ou a The

British Trust for Ornithology, entre outros clubes e associações naturalistas, tanto

que a categoria de AP mais comum naquele país é designada “Sites of Special

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1.3 CONTRIBUIÇÕES CIENTÍFICAS EM MARCOS CONSERVACIONISTAS PARA O BIOMA MATA ATLÂNTICA

Dentre marcos específicos do envolvimento de pesquisadores na discussão sobre políticas públicas voltadas para conservação, considerando especificamente o bioma Mata Atlântica (para além da Constituição Federal, que declara o bioma como patrimônio nacional), destaca-se o caso emblemático envolvendo o município de Cubatão-SP, integrante da Baixada Santista e considerado, no início dos anos 80, como uma das cidades mais poluídas do planeta. Segundo Ferreira (2006),

Cubatão foi um marco na politização da questão ambiental no Brasil, por dois motivos. Em primeiro lugar, por apontar a dimensão e a gravidade

dos riscos ambientais de processos produtivos em países

desenvolvimentistas daquele período histórico. Em segundo, por desnudar um acordo social perverso que agregava ricos e pobres, direita e esquerda, governantes e governados, em torno do descaso por políticas de controle ambiental durante a implantação da industrialização no país. O cruzamento desses dois motivos fez de Cubatão o símbolo de um turning point nas condutas coletivas e no comportamento político frente à questão ambiental no país (Ferreira 2006:165).

Várias pesquisas foram realizadas no local, mostrando a relação direta entre as atividades industriais do seu polo petroquímico (incluindo indústrias siderúrgicas e de fertilizantes), a deterioração da saúde de seus habitantes e também da mata de encosta, que perdeu vários hectares de Mata Atlântica por contaminação atmosférica e do solo. O resultado foi o desnudamento e a desestabilização geológica do terreno, levando a frequentes deslizamentos de terra e ameaçando muitos moradores. Além desse risco, havia ainda a contaminação dos mananciais que abasteciam a cidade e também do ar. A divulgação das pesquisas científicas pela mídia desempenhou um importante papel na mobilização da sociedade civil e contribuiu para o fortalecimento do movimento ambientalista em São Paulo. O termo “vale da morte”, cunhado pelo jornalista Randau Marques, referindo-se ao vale do Rio Cubatão, teve forte repercussão junto à opinião pública.

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O tema foi pauta de uma histórica reunião da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC), realizada em São Paulo, pois segundo o Professor Carlos Joly, esta foi a primeira vez em que ambientalistas e cientistas se encontraram para debater um assunto. Talvez ali estivesse o embrião do Capítulo de Meio Ambiente da atual Constituição Federal. Segundo Joly:

“(...) foi feita a reunião da SBPC em São Paulo, cujo tema era a poluição de Cubatão. O Fábio [Feldmann] era o advogado da Associação das Vítimas da Poluição de Cubatão. Essa reunião da SBPC foi a primeira vez em que se juntou bandeiras ambientalistas com comunidade científica. Então tinha um conjunto de estudos mostrando as crianças com anencefalia que tinha uma incidência mais alta em Cubatão, começou todo um processo de denúncia da poluição, então já tinha uma primeira aproximação entre ambientalistas que denunciavam a situação e da comunidade científica que tinham dados para mostrar que de fato o problema era sério” (Joly, C. A, entrevista realizada em 17/03/12). Em 1987, o CNPq implantou o programa Linhas de Ação em Botânica, que definiu para os diferentes ecossistemas pré-selecionados (entre eles a Mata Atlântica) como seriam os novos estudos de florística e de fitossociologia. O bioma foi reconhecido como prioritário, dado seu alto grau de degradação. O CNPq induziu, na época, cinco projetos a serem desenvolvidos no bioma Mata Atlântica na Região Sudeste, sendo um deles o projeto “Florística, fitossociologia, estrutura

e dinâmica de ecossistema preservado e perturbado na Mata Atlântica na região de Cubatão (SP)”. A pesquisa envolveu pesquisadores da UNICAMP, UNESP –

Rio Claro e do Instituto Florestal de São Paulo (IF), ligado à SMA (Leitão Filho,

1993). Seus resultados comprovaram o enorme dano ambiental que a poluição

hídrica e atmosférica, proveniente do polo industrial ali instalado, causou na vegetação da região. Como recomendação, os pesquisadores, concluíram:

Mantida a situação ambiental vigente, a perspectiva futura é de uma piora nas condições da vegetação. Esta afirmativa está baseada na tendência de novos deslizamentos e na ocorrência de uma crescente erosão laminar, com perda significativa de solo. (...) Não existe milagre algum a ser operado no Vale do Rio Moji. A solução para o problema é clara: controle da poluição a um nível que possibilite a recuperação do solo e das características ambientais que permitam o processo normal de sucessão para aquela região. Fora disto não há saída! (...) A recuperação necessariamente será um processo que deverá ter monitoramento

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sucessão para a Mata Atlântica, que deverão ter um uso amplo inclusive para outras regiões neotropicais (Leitão Filho, 1993:173).

Outros estudos desenvolvidos no município durante a década de 1980 também contribuíram para a percepção da sociedade civil da gravidade dos problemas ambientais encontrados em Cubatão, como lembrado por Hogan

(1995):

(...) a baixa velocidade dos rios, a maré, e a interrupção dos fluxos naturais por drenagem e aterros significam que os resíduos despejados na água não são facilmente levados ao mar aberto. O resultado é o envenenamento do estuário, com todo tipo de substância tóxica, incluindo mercúrio e outros metais pesados (Amaral e Silva, et al, 1982). Muitas lagoas aparecem mortas, e os residentes reclamam que pescam cada vez menos, e que começam a aparecer peixes cegos e deformados. O homem não escapou ileso desse assalto ambiental. Detectar, medir, e descrever estas consequências são tarefas mais difíceis por várias razões, entre as quais a migração constante da população (Hogan,

1993). Mas os envenenamentos por benzeno (Diesat, 1988), a incidência

de doenças respiratórias e dermatológicas (Hogan,1990), além de acidentes de trabalho (Medrado-Faria et al, 1983), são testemunhas eloquentes do sofrimento da população cubatense (Hogan, 1995:120). Os resultados dessas pesquisas, somados à forte pressão da sociedade civil e até de organizações ambientalistas internacionais, pressionaram os órgãos de fiscalização ambiental do Estado de São Paulo, sobretudo a Companhia de Tecnologia de Saneamento Ambiental (CETESB), a estabelecer novos parâmetros para as concentrações de poluentes e exigir das indústrias de Cubatão a instalação de filtros, além de outras medidas mitigadoras. A primeira medida foi reduzir a emissão de material particulado sólido na atmosfera, mas outras iniciativas mais eficazes levaram ainda algum tempo para serem implantadas.

Atualmente, os níveis de poluição nessa região são considerados aceitáveis e a vegetação de encosta foi regenerada, embora ainda seja possível encontrar locais onde a concentração de alguns poluentes no solo continua elevada.

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Outro marco regulatório importante de conservação da Mata Atlântica conquistado com contribuições e debates do meio acadêmico foi a chamada “Lei da Mata Atlântica” (Lei Nº 11.428, de 22 de Dezembro de 2006). No texto original publicado na Constituição Federal de 1988, a Mata Atlântica é colocada como patrimônio nacional e determina que este deve ser usado “na forma da lei, dentro de condições que assegurem a preservação do meio ambiente, inclusive quanto ao uso de recursos naturais” (BRASIL, 1988). Esta disposição sugere que uma legislação específica seria elaborada para definir a área coberta pelo bioma e regulamentar sua exploração sustentável (Câmara in Galindo-Leal e Câmara,

2005).

No campo acadêmico, no entanto, havia um intenso debate sobre a delimitação do que deveria ser classificado como Mata Atlântica e quais tipos de fitofisionomia poderiam ser incluídos nesse domínio, influenciando diretamente na extensão e na localização das áreas que estariam protegidas por essa legislação específica. No artigo intitulado “Evolution of the Brazilian phytogeography

classification systems: implications for biodiversity conservation”, Joly et al (1999)

explicitam as diferentes correntes de autores que abordaram a delimitação do bioma, em termos de evolução biogeográfica e fitogenética. Segundo essa publicação, alguns autores como Ferri (1980) e Leitão Filho (1987), acreditavam que poderia ser considerada como Mata Atlântica apenas a floresta ombrófila densa ou as chamadas matas de encosta, que estão sob a influência direta das chuvas orográficas. Outros autores acreditavam que poderiam incluir sob essa denominação também as florestas decíduas e semidecíduas do interior de Minas Gerais e São Paulo. E um terceiro grupo de pesquisadores acreditava que era possível incluir ainda as matas de araucárias, pois segundo estes, todas essas fisionomias compartilham um longo processo evolutivo.

A controvérsia estimulou mais pesquisas, que também contribuíram para o aumento do conhecimento sobre a biodiversidade e a distribuição das espécies da Mata Atlântica. Oliveira-Filho & Fontes (1999) realizaram amplo estudo sobre a variação da composição florística nessas diferentes fisionomias, à

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florestais amazônicas e com os cerrados. A conclusão é que existe uma forte similaridade de espécies entre a floresta ombrófila densa e a floresta semidecídua, a qual acreditam ser uma variação daquela mata de encosta, incluindo, porém, espécies mais tolerantes a longos períodos secos. Além disso, também incluíram na denominação Mata Atlântica duas áreas de mata de araucárias, classificadas como Floresta Atlântica Alto Montana. Estes resultados corroboram os de Gentry

(1995), que analisou Florestas da América Central e dos Andes, e por Webster (1995), que diagnosticou como Florestas Nebulares Neotropicais muitos gêneros

correlacionados com altitudes mais elevadas no Sudeste brasileiro (Joly et al,

1999). Em seu artigo, Joly et al (1999), concordam com as conclusões de Oliveira-Filho & Fontes (1999):

We support that point of view because today there is enough evidence to understand that all these different physiognomies of vegetation (Ombrophylous dense, Ombrophylous Open, Ombrophylous Mista, Semi-deciduos and Deciduos Forests, as well as mangroves, restinga, dunes, estuaries, lagoons and high altitude rocky fields) present in the Atlantic Rain Forest Domain must be considered as Mata Atlântica sensu lato. During the evolutionary process, there was an intense exchange of species and genes that gave origin to a complex of ecosystems, which are closely related and must be preserved as a unity, otherwise all the physiognomies will disappear with time (Joly et al, 1999).

Assim, do ponto de vista da conservação do bioma Mata Atlântica, a delimitação espacial mais ampla, sugerida por Oliveira-Filho & Fontes (1999), seria considerada mais eficaz, em termos de embasamento científico à possível legislação específica. Mas enquanto as pesquisas estavam sendo elaboradas e debatidas, outras medidas estavam sendo tomadas em busca da elaboração de uma lei específica de proteção e regulamentação da exploração desse bioma.

Em 1990, foi concluído o primeiro mapeamento dos remanescentes de Mata Atlântica utilizando-se imagens de satélite e tendo como base as cartas do IBGE. Esse mapeamento foi realizado através de uma parceria entre a ONG SOS Mata Atlântica, o Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE) e o IBAMA. Neste mesmo ano, foi realizado no município de Atibaia/SP, o “Workshop Mata Atlântica”, que reuniu cerca de 40 pesquisadores, técnicos de governo e ambientalistas que definiram a abrangência do bioma com base na definição de

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“Domínio Atlântico” (abrangendo todas as fisionomias) proposto pelo Professor Aziz Ab`Saber (USP) e estabeleceram prioridades para sua conservação. O resultado político foi a publicação, ainda em 1990, de um decreto federal (Decreto n° 99.547) definindo que os ecossistemas da Mata Atlântica eram intocáveis, proibindo o corte e a exploração de sua vegetação (Câmara in Galindo-Leal e

Câmara, 2005). Mas a Mata Atlântica ainda carecia de um instrumento com força

de lei que a protegesse.

Em 1991, a Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (UNESCO) aprovou a criação da Reserva da Biosfera da Mata Atlântica (RBMA), conferindo um status internacional de relevância a esse bioma e fortalecendo as ações em busca de uma proteção legislativa mais forte. Em 1992, O Conselho Nacional de Meio Ambiente (CONAMA), talvez influenciado pelas altas taxas de desmatamento divulgadas durante a realização da Conferência Eco 92, finalmente aprovou o conceito amplo do bioma, incluindo todas as fisionomias e ecossistemas associados, propostos durante o “Workshop Mata Atlântica” de 1990, denominado “Domínio Mata Atlântica”. O CONAMA também estendeu a proteção à vegetação em regeneração e estabeleceu bases para elaborar um anteprojeto de lei específico.

Em 1992, o deputado federal Fábio Feldmann apresentou o Projeto de Lei n° 3.285, que dispõe sobre a utilização e a proteção da Mata Atlântica de acordo com os princípios definidos pelo CONAMA (Figura 1), cujo artigo 2° determina:

Art. 2º Para os efeitos desta Lei, considera-se Mata Atlântica as

formações florestais e ecossistemas associados inseridos no domínio Mata Atlântica, com as respectivas delimitações estabelecidas pelo Mapa de Vegetação do Brasil, IBGE 1993, que inclui: Floresta Ombrófila Densa, Floresta Ombrófila Mista, Floresta Ombrófila Aberta, Floresta Estacional Semidecidual e Floresta Estacional Decidual; manguezais, restingas e campos de altitude associados; brejos interioranos e encraves florestais do Nordeste.

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Figura 1 – Mapa das diferentes formações vegetais (fisionomias) do bioma Mata Atlântica

contempladas pelo Projeto de Lei n°3.285/1992 e, posteriormente, pelo Decreto n° 750/1993.

Prevendo que a tramitação deste projeto na Câmara dos Deputados seria morosa, o então Deputado Federal Fábio Feldmann e lideranças ambientalistas convenceram o Presidente da República, na época o Presidente Itamar Franco, a proteger a Mata Atlântica por meio de um decreto, de aplicação imediata. Como resultado, foi publicado, em 1993, o Decreto n° 750/93, que dispunha sobre o corte, a exploração e a supressão de vegetação primária ou nos estágios avançado e médio de regeneração do bioma, e endossava todos os conceitos e definições do projeto de lei. (Figura 2)

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Figura 2 – Mapa indicando, em amarelo, a extensão do Domínio Mata Atlântica sob a jurisdição do

Decreto de Lei n° 750/1993, e em verde, os remanescentes florestais do bioma.

Porém, as pressões políticas para que o decreto fosse revogado e até questionado quanto à sua constitucionalidade acabaram por prorrogar a aprovação da legislação específica e introduziram emendas que enfraqueceram o projeto de lei. Após muitos revezes, o projeto foi aprovado pelo Congresso Nacional em 03 de Dezembro de 2003, aguardando, posteriormente, mais três anos para ser aprovado também pelo Senado Federal e, finalmente, sancionado pelo poder executivo. A chamada “Lei da Mata Atlântica” (Lei Nº 11.428, de 22 de Dezembro de 2006) levou quatorze anos para ser aprovada, mas conseguiu carregar na sua escrita a contribuição do debate acadêmico, pois o Domínio Mata

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Galindo-Leal e Câmara (2005), no futuro da diversidade biológica dos

remanescentes dessa outrora imensa floresta.

No Estado de São Paulo, especificamente, podemos destacar a atuação do Programa BIOTA/FAPESP na elaboração, em conjunto com a Secretaria de Meio Ambiente de São Paulo (SMA), do estudo “Diretrizes para

Conservação e Restauração da Biodiversidade do Estado de São Paulo”. O trabalho envolveu cerca de 160 pesquisadores de várias instituições paulistas e técnicos do Instituto de Botânica de São Paulo, vinculado à SMA, resultando na elaboração de 30 mapas indicativos de como melhorar a proteção e a restauração florestal no Estado, incluindo áreas de Mata Atlântica.

Esse estudo foi utilizado pelo Governo do Estado para elaboração, até o momento, de seis decretos estaduais e treze resoluções publicadas pela SMA e pela Secretaria de Agricultura e Abastecimento do Estado de São Paulo (SAA), algumas até para a criação de novas APs em áreas de Mata Atlântica, como o Parque Estadual Nascentes do Paranapanema e o Mosaico de Unidades de Conservação do Paranapiacaba, por exemplo (Decreto nº 58.148, de 21 de junho de 2012):

Decreto nº 58.148, de 21 de junho de 2012

Cria o Parque Estadual Nascentes do Paranapanema, institui o Mosaico de

Unidades de Conservação do Paranapiacaba e dá providências correlatas.

GERALDO ALCKMIN, GOVERNADOR DO ESTADO DE SÃO PAULO, no uso de suas atribuições legais, Considerando a indicação de grande relevância

para a criação de unidades de conservação de proteção integral no Contínuo

de Paranapiacaba, especialmente na área denominada de Nascentes do Rio

Paranapanema pelo projeto "Diretrizes para Conservação e Restauração da

Biodiversidade do Estado de São Paulo", desenvolvido pelo Programa Biota -

FAPESP;

Considerando que esta área constitui um dos mais conservados remanescentes da Mata Atlântica no Brasil, abrigando dezenas de espécies da

flora e da fauna consideradas ameaçadas de extinção, centenas de nascentes

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das cabeceiras de um dos mais importantes rios paulistas e um rico patrimônio

histórico, além de conter destacados atrativos turísticos; (SÃO PAULO,

2012:1)

O pioneirismo deste programa fez com que se tornasse modelo para outros estados do país, e até para outros países, pois para além de completar seus respectivos inventários de espécies, estes também desejam estabelecer diálogo entre a academia e órgãos legislativos e executivos das políticas ambientais. Mas será que a preocupação com a efetividade desse diálogo permeia as relações que se estabelecem entre os pesquisadores vinculados ao Programa BIOTA/FAPESP e seus respectivos objetos de estudo? A presente pesquisa investigou essa relação quando esta envolve APs no bioma Mata Atlântica em São Paulo.

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