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Coisa julgada inconstitucional nos embargos à execução e na impugnação ao cumprimento de sentença

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Academic year: 2021

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LEANDRO FERREIRA

COISA JULGADA INCONSTITUCIONAL NOS EMBARGOS À EXECUÇÃO E NA IMPUGNAÇÃO AO CUMPRIMENTO DE SENTENÇA

Tubarão 2011

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COISA JULGADA INCONSTITUCIONAL NOS EMBARGOS À EXECUÇÃO E NA IMPUGNAÇÃO AO CUMPRIMENTO DE SENTENÇA

Trabalho de Conclusão de Curso apresentado ao Curso de Graduação em Direito da Universidade do Sul de Santa Catarina como requisito parcial à obtenção do título de Bacharel em Direito.

Linha de pesquisa: Justiça e Sociedade.

Orientador: Prof. José Paulo Bittencourt Junior, Esp.

Tubarão 2011

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LEANDRO FERREIRA

COISA JULGADA INCONSTITUCIONAL NOS EMBARGOS À EXECUÇÃO E NA IMPUGNAÇÃO AO CUMPRIMENTO DE SENTENÇA

Este Trabalho de Conclusão de Curso foi julgado adequado à obtenção do título de Bacharel em Direito e aprovado, em sua forma final, pelo Curso de Graduação em Direito da Universidade do Sul de Santa Catarina.

Tubarão, 16 de junho de 2011.

______________________________________________________ Professor e orientador José Paulo Bittencourt Junior, Esp.

Universidade do Sul de Santa Catarina

______________________________________________________ Prof. Edir Josias Silveira Beck, Esp.

Universidade do Sul de Santa Catarina

______________________________________________________ Prof. Jean Marcel Roussenq, Esp.

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AGRADECIMENTOS

Agradeço aos meus pais, Evanir Renner Ferreira e Evaldo Ferreira, por todo o apoio e pela confiança incondicional que depositaram em meus estudos.

Agradeço à Deus por me dar forças e aconchego espiritual, por me permitir superar os obstáculos que surgiram ao longo desse caminho, que se chama vida.

Aos meus familiares, os quais terão sempre o meu respeito e a minha gratidão pelo apoio prestado.

Grato aos amigos que me incentivaram a sempre seguir em frente, onde incluo meu professor orientador, que sem dúvidas é uma grande pessoa.

Peço escusas, apenas por não citar o nome de todos, pois não me arriscaria a deixar alguém de fora.

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RESUMO

No presente trabalho de conclusão de curso o tema abordado é a “coisa julgada inconstitucional nos embargos à execução e na impugnação ao cumprimento de sentença”. Estudam-se, especificamente, as hipóteses de aplicação do parágrafo único do art. 741 e o do art. 475-L em seu parágrafo primeiro, ambos do Código de Processo Civil. O método de abordagem dedutivo foi utilizado, juntamente com o modelo bibliográfico de pesquisa e perspectiva qualitativa. São feitas considerações acerca do controle de constitucionalidade da sentença, do instituto da coisa julgada e da segurança jurídica. Adentramos na discussão sobre a “coisa julgada inconstitucional” e a possibilidade da “eficácia rescisória dos embargos e da impugnação”. O estudo demonstra as divergências doutrinárias acerca da interpretação e até mesmo de inconstitucionalidade de tais dispositivos, bem como exemplos do direito comparado. Aduz ainda que, em razão de não ser a coisa julgada um dogma intocável, que não tem o condão de se sobrepor à própria constituição, é possível vislumbrar a aplicação de tais dispositivos, contudo, de forma restritiva, sempre que possível resguardando a segurança jurídica, que é um pressuposto do estado democrático de direito.

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ABSTRACT

In this work of completion of course, the subject is “the res judicata unconstitutional in embargoes of execution and in appeal to obey the sentence”. It was studied, specifically, the chances of applying the unique paragraph of article 741 and the article 475 in its first paragraph, the both from Civil Code of Procedure. The method of deductive approach was used along to the bibliographical model research and qualitative perspective. Considerations were made concerning the control of constitutionality of the sentence, the institute of res judicata and legal safety. We entered in discussion about the “unconstitutional res judicata” and the possibility of “availability rescission of embargoes and impugnment”. The study shows disagreement on the interpretation and even the unconstitutionality of such devices, as well as examples of comparative legislation. In this work it was alleged, on grounds of res judicata does not be a untouchable dogma which does not has the power to superimpose the Constitution, it is possible glimmering the application of such devices, however, narrowly, protecting whenever possible the legal safety which is a prerequisite of democratic state of rights.

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SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO... 8

1.1 DELIMITAÇÃO DO TEMA E FORMULAÇÃO DO PROBLEMA ... 8

1.2 JUSTIFICATIVA ... 9 1.3 OBJETIVOS ... 9 1.3.1 Objetivo geral ... 9 1.3.2 Objetivos específicos ... 10 1.4 CONCEITOS OPERACIONAIS ... 10 1.5 PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS ... 11

1.6 DESENVOLVIMENTO DO TRABALHO: ESTRUTURAÇÃO DOS CAPÍTULOS .. 12

2 SENTENÇA E COISA JULGADA ... 13

2.1 SENTENÇA ... 13

2.1.1 Natureza jurídica... 15

2.1.1.1 Espécies de Sentença ... 17

2.1.1.1.1 Delimitação no Código de Processo Civil ... 19

2.2 COISA JULGADA ... 20

2.2.1 Requisitos da Coisa Julgada ... 23

2.2.1.1 Efeitos da Coisa Julgada ... 24

2.2.1.1.1 Segurança Jurídica ... 25

3 DIREITO CONSTITUCIONAL ... 28

3.1 CONSTITUIÇÃO ... 29

3.1.1 Controle de Constitucionalidade ... 32

3.1.1.1 Histórico do controle de constitucionalidade ... 33

3.1.1.1.1 Inconstitucionalidade ... 35

3.2 FORMAS DE CONTROLE DE CONSTITUCIONALIDADE ... 37

3.2.1 Controle difuso ... 38

3.2.2 Controle concentrado ... 40

3.2.3 Efeitos do controle de constitucionalidade ... 42

3.2.3.1 Retroativos ou futuros ... 42

3.2.3.2 Gerais ou particulares ... 43

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4.1 COISA JULGADA INCONSTITUCIONAL COMO FORMA DE DEFESA NA

EXECUÇÃO E NO CUMPRIMENTO DE SENTENÇA ... 45

4.1.1 Modulação dos efeitos da inconstitucionalidade ... 46

4.1.1.1 A sentença inconstitucional é nula, inexistente ou ineficaz? ... 47

4.1.1.2 Inconstitucionalidade do art. 741, parágrafo único e 475-L §1º do CPC ... 48

4.1.2 O sistema português e o sistema alemão ... 49

4.2 APLICABILIDADE MODERADA ... 51

4.2.1 Existência de precedente do STF ... 52

4.2.1.1 Direito intertemporal ... 53

4.2.1.2 Proibição do controle de constitucionalidade das decisões ... 53

5 CONCLUSÃO ... 56

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1 INTRODUÇÃO

No presente trabalho de conclusão de curso serão apresentadas considerações acerca da possibilidade dos embargos à execução ou a impugnação ao cumprimento de sentença, rescindindo a sentença transitada em julgado. Para tanto, serão analisadas as formas de controle de constitucionalidade, a sentença e a coisa julgada.

1.1 DELIMITAÇÃO DO TEMA E FORMULAÇÃO DO PROBLEMA

O tema gira em torno das controvérsias doutrinárias existentes acerca da possibilidade de relativizar a coisa julgada por meio de embargos e/ou impugnação no processo de execução.

A problemática abordada consiste em explorar as dúvidas existentes acerca da aplicação da quebra (rescisão) da coisa julgada, decorrente de uma sentença que teve como fundamento lei declarada inconstitucional pelo Supremo Tribunal Federal, através de embargos à execução ou impugnação à execução de sentença.

Divergências existem na doutrina, desde o seu alcance temporal, bem como se os embargos à execução e a impugnação de sentença podem ou não ser utilizados para substituir a ação rescisória.

Há posicionamentos doutrinários, no sentido de que a sentença inconstitucional é inexistente, por outro lado, há quem defenda a primazia da segurança jurídica e da coisa julgada, na existência de tais sentenças. Deste modo, são gerados diversos posicionamentos da doutrina e incertezas ao aplicador do Direito.

Tal instituto jurídico poderia atingir processos que obtiveram o transito em julgado de suas sentenças antes da entrada em vigor da Medida Provisória nº 2.180-35 (BRASIL, 2001) que, posteriormente, foi revogada pela Lei 11.232 (BRASIL, 2005) a qual, contudo, manteve e ampliou ao 475-L do CPC tal disciplina legal.

O que se discute é: pode existir a admissibilidade, dentro de nosso padrão

constitucional, dos embargos à execução ou a impugnação ao cumprimento de sentença modificar a decisão judicial transitada em julgado?

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1.2 JUSTIFICATIVA

Tal assunto justifica-se pela grande polêmica que é gerada com esse modo de retirar da sentença transitada em julgado uma de suas principais características, qual seja, de tornar-se imutável.

A possibilidade de flexibilizar a coisa julgada, introduzida no Código de Processo Civil, que utiliza os embargos à execução como ferramenta para retirar a exigibilidade de título judicial fundado em lei ou ato normativo considerado inconstitucional pelo Supremo Tribunal Federal encontra muitas formas de interpretação, sendo que muitas dúvidas ainda são existentes quanto ao alcance e a constitucionalidade da norma.

Divergências na aplicação do disposto na lei, no que tange ao referido assunto merecem atenção, sobre sua retroatividade, se há anulação com efeitos ex tunc ou ex nunc ou ainda se é inexistente tal decisão.

Merecem estudo, também, os princípios constitucionais envolvidos nesse assunto, tanto explícitos, como o da coisa julgada, bem como implícitos, que nesse caso é o da segurança jurídica. Uma vez que são princípios, estão acima da própria lei, contudo, parece haver choque entre os embargos e tais princípios.

Debruçar-se sobre o assunto diminuiria as dúvidas e traria mais segurança a todos os operadores do Direito, uma vez que a execução normalmente faz-se necessária para o cumprimento de alguma obrigação. Se, por ventura, essa obrigação surgir de lei posteriormente declarada inconstitucional, inevitavelmente o operador encontrar-se-á diante de vários entendimentos, o que, por si só, mostra iminente insegurança jurídica.

1.3 OBJETIVOS

1.3.1 Objetivo geral

Analisar o posicionamento da doutrina sobre a aplicação do disposto nos artigos 475-L, §1º e 741, parágrafo único do Código de Processo Civil (BRASIL, 1973), ou seja, a

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interpretação que deve ser dada ao disposto na referida norma, se deve e de que maneira deve ser aplicada quando direito advindo de matéria declarada inconstitucional pelo Supremo Tribunal Federal transitar em julgado.

1.3.2 Objetivos específicos

-Demonstrar os principais posicionamentos existentes na doutrina sobre o alcance temporal dos artigos 475-L, §1º e 741, parágrafo único do CPC;

-Verificar a constitucionalidade de tais artigos;

-Identificar as formas de declaração de inconstitucionalidade de uma lei;

-Descrever os efeitos que podem gerar a sentença fundada em lei ou ato normativo declarado inconstitucional pelo Supremo Tribunal Federal;

-Indicar quais princípios deverão ser levados em consideração nesses casos.

1.4 CONCEITOS OPERACIONAIS

Lei: é a “regra geral justa e permanente que exprime a vontade imperativa do Estado, a que todos são submetidos” (FELIPPE, 2007, p. 173).

Constituição: é a lei fundamental de um Estado soberano, está no ápice de todas as normas de determinada nação. Carta que submete todos os cidadãos e os poderes do Estado a seus preceitos (FELIPPE, 2007, p. 74).

Constitucionalidade: é discutida quando a norma é conflitante com nosso texto magno, nossa lei suprema. A coisa julgada está protegida pela lei máxima, de modo a evitar que as decisões fiquem indefinidamente em discussão perante nossos tribunais (WAMBIER et al., 2006, p. 237).

Inconstitucionalidade: “condição de lei que se mostra oposta e inversa à Carta Magna, cabendo ao STF a apreciação dessa argüição (sic)” (FELIPPE, 2007, p. 156).

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Controle de constitucionalidade: pode ser feito de duas maneiras: a) Direto ou Concentrado, que se dá por meio de ação dirigida ao STF, sendo que não se analisa um caso concreto, mas a lei ou sua interpretação; b) Difuso, pode ser realizado por qualquer juízo na análise de um caso concreto.

Sentença: é “a expressão jurídica de prestação jurisdicional pelo Estado” (FELIPPE, 2007, p. 234). É o ato do juiz que implica alguma das situações previstas nos arts. 267 e 269 do Código de Processo Civil.

Coisa Julgada ou Caso Julgado: é a qualidade que a sentença adquire de se tornar imutável (FELIPPE, 2007, p. 66).

Execução: forma pela qual o credor (exequente) procura satisfazer sua pretensão, ter acesso material ao “bem da vida”. Processo para que o devedor cumpra com sua obrigação.

Embargos na execução: forma de defesa utilizada pela Fazenda Pública no processo de execução.

Impugnação ao cumprimento de sentença: forma de defesa utilizada pelo executado no processo de execução.

1.5 PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS

O método de abordagem, no presente trabalho, será dedutivo, partindo de premissas gerais de ordem constitucional até atingir o objetivo específico, que será a análise dos embargos e da impugnação.

O tipo da pesquisa, quanto ao seu procedimento, será preponderantemente bibliográfico, através de estudo na doutrina, por meio de livros, revistas, entre outros.

Quanto ao nível, será exploratório, pois procura proporcionar ao pesquisador maior familiaridade com a questão problema, ou seja, busca um melhor conhecimento sobre a problemática dos embargos e da impugnação terem o poder de rescindir a coisa julgada.

No tocante a abordagem, será qualitativa (na análise documental), uma vez que trabalha com amostra subjetiva, preocupando-se mais com a profundidade da pesquisa do que com sua extensão, pois não serão analisados dados (números), mas sim valores acerca da questão problema.

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1.6 DESENVOLVIMENTO DO TRABALHO: ESTRUTURAÇÃO DOS CAPÍTULOS

O desenvolvimento da monografia foi estruturado em cinco capítulos. O primeiro capítulo mostra a estrutura elementar do trabalho, justificando a pesquisa, bem como trazendo conceitos que visam facilitar a compreensão da pesquisa.

O segundo capítulo busca proporcionar ao leitor noções sobre a sentença e a coisa julgada, eis que é a sentença que institui o título executivo que, posteriormente, poderá ser declarado inconstitucional, e a coisa julgada, cujo instituto é proteger a sentença de nova discussão.

O terceiro capítulo versa sobre a constituição e principalmente sobre o controle de constitucionalidade, matéria imprescindível quando tratamos da coisa julgada inconstitucional nos embargos ou na impugnação ao cumprimento de sentença.

No quarto capítulo são abordados os posicionamentos da doutrina acerca da aplicação dos artigos 741, parágrafo único e 475-L, parágrafo primeiro do CPC, bem como sua aplicação moderada.

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2 SENTENÇA E COISA JULGADA

No presente estudo, é de grande valia e um passo necessário o entendimento sobre o que é uma sentença e, consequentemente, o instituto da coisa julgada antes de adentrar na problemática da coisa julgada inconstitucional na execução de sentença (processo de execução).

2.1 SENTENÇA

Em decorrência da teoria da ação, que é o direito subjetivo e instrumental de todo e qualquer cidadão buscar tutela jurisdicional, os litígios são levados ao judiciário.

O Estado-Juiz precisa utilizar-se de um meio para solucionar os litígios, esse meio ou ferramenta é o processo, uma sequência de atos previstos em lei, que culmina na decisão do juiz ou tribunal. Deste modo, podemos entender a sentença como uma manifestação da vontade estatal, que é exaltada após o convencimento do julgador acerca de determinado assunto.

A sentença é o ato estatal que dirime a lide, manifestação da vontade estatal emitida no exercício da função jurisdicional.

Como ato estatal, deve nela ser enfatizado o caráter de ato de poder, de decisão, de manifestação de vontade do Estado visando à resolução de conflitos de interesses. [...]

É através da sentença que o Estado intervém na relação contenciosa, impondo a conduta a que as partes se obrigarão – como diz o art. 468, a sentença tem força de lei nos limites da lide e das questões decididas (SLAIBI FILHO, 2004, p.275). A sentença, assim, é uma decisão do Estado-juiz que, através do exercício da função jurisdicional, intervém na lide para solucionar o litígio. Desta forma, visa a resolver o conflito de interesses e alcançar a pacificação social. As partes (autor e réu) buscam do juiz uma decisão que coloque fim ao conflito.

É importante salientar que nem todas as sentenças têm o condão de resolver os litígios, afinal, apenas aquelas que conhecem do mérito podem afirmar, com todo o poder estatal, a solução a ser dada em determinado conflito de interesses. Porquanto, algumas não adentram no mérito e, singelamente falando, não dizem qual direito deve ser aplicado ou, ainda a melhor, a solução do caso. Vejamos definições em um dicionário jurídico.

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Sentença – 1. Ou veredictum, o ato culminante do processo pelo qual o juiz põe termo ao processo decidindo o mérito da causa, ou a expressão jurídica de prestação jurisdicional pelo Estado (FELIPPE, 2007, 234).

Observa-se que a sentença é entendida como a decisão final proferida pelo juiz ou tribunal, que extingue o processo e que pode ou não resolver o mérito da causa. Definirá acerca do mérito quando acolher ou rejeitar os pedidos da parte, quando vencidas as questões processuais, e quando decidir sobre a lei que será ou não aplicada ao caso concreto.

Ensina a doutrina que, no direito romano, a sentença era entendida como a decisão definitiva, aquela que punha fim à lide, pois resolvia acerca do pedido do autor, desta sorte as demais decisões eram tidas como interlocutórias.

No direito romano a sententia era sinônimo de sentença definitiva, ou seja, decisão emanada do juiz que, recebendo ou rejeitando a demanda, punha fim à constestabilidade de um bem da vida (Chiovenda); era um provimento do juiz que resolvia sobre o pedido do autor, acolhendo-o ou rejeitando-o, definindo a lide com a atuação e a vontade da lei. Os demais provimentos do juiz no processo recebiam o nome de interlocutiones (SLAIBI FILHO, 2004, p. 275).

Com o fito de atuar na solução dos litígios, “a sentença é, assim, ato jurídico-processual praticado pelo órgão estatal com o fim de produzir efeitos na relação jurídico-processual” (SLAIBI FILHO, 2004, p. 277). Deste modo, a sentença exterioriza o convencimento do magistrado sobre como solucionar o conflito de interesses.

Se o processo existe por causa de um conflito de interesses, do qual decorre a demanda, que é o pressuposto da relação processual, a sentença extingue a relação processual (arts. 267 e 269 do CPC), resolvendo ou não o mérito do litígio.

[...]

Ao extinguir o processo, com ou sem julgamento de mérito, a sentença “corta” a relação processual que vincula as partes e o Estado – juiz, e a eventual existência de recurso somente estende a relação processual nos pontos recorridos, tão somente (SLAIBI FILHO, 2004, p. 281).

No processo, o exercício do poder estatal de decidir pertence, privativamente, ao magistrado, conforme preconiza o art. 164 do Código de Processo Civil. Assim, conforme ensina Slaibi Filho (2004, p. 277) “o poder de decisão é indelegável pelo magistrado, quer no plano horizontal (delegar a decisão a membros dos outros Poderes) quer no plano vertical (delegar a decisão a membros do mesmo Poder judiciário)”. Vejamos o citado artigo:

Art. 164. Os despachos, decisões, sentenças e acórdãos serão redigidos, datados e assinados pelos juízes. Quando forem proferidos verbalmente, o taquígrafo ou o datilógrafo os registrará, submetendo‑os aos juízes para revisão e assinatura. Parágrafo único. A assinatura dos juízes, em todos os graus de jurisdição, pode ser feita eletronicamente, na forma da lei (BRASIL, 2011).

Contudo, como forma de melhorar e sistematizar os serviços judiciários, principalmente para a celeridade processual, os atos meramente ordinatórios independem de despacho e, desta forma, da assinatura do juiz. Conforme § 4º do art. 162 do Código de

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Processo Civil, tais atos devem ser praticados de ofício pelo servidor (chefe de cartório), todavia, tal previsão de modo algum interfere na função julgadora do magistrado.

Assim, a sentença só pode ser proferida pelo magistrado (seja de 1º grau ou de cortes superiores, neste caso um acórdão), e somente este é incumbido e possui legitimação para julgar e, ao fim da fase probatória, profere uma decisão; contudo, esta decisão depende de um processo para ter validade e eficácia. Desta forma, não pode existir sentença sem um processo, sendo este causa necessária à existência daquela.

O processo é a causa necessária da sentença – não se pode admitir que a decisão estatal possa surgir ex novo sem o suporte da relação jurídica vinculativa de direito público em que participam, como sujeitos necessários, ao lado do órgão estatal, o demandante e o demandado.

[...]

O princípio da substanciação da sentença é, assim, aquele que condiciona a sua existência ao processo, em determinada situação concreta, enquanto que o princípio da congruência exige que a sentença seja coerente com o que foi demandado (SLAIBI FILHO, 2004, p. 282).

Dois princípios são lembrados nesse aspecto, o da substanciação, que condiciona a existência da sentença a um processo, e o da congruência, que exige que a sentença seja coerente àquilo que foi posto em lide. Destarte, só pode o juiz proferir uma sentença dentro de um processo, caso contrário, seria outra decisão e não esta com determinação jurídica e, além disso, deve essa sentença ser coerente com o que foi demandado na ação.

2.1.1 Natureza jurídica

O dever do Estado-juiz de proporcionar aos seus súditos a solução dos litígios e pacificação social, através de um processo, leva a uma decisão. Assim, a “sentença é um ente jurídico produzindo efeitos no mundo do Direito, além dos efeitos que se pretende que também produza no mundo fático” (SLAIBI FILHO, 2004, p. 283). Portanto, a decisão judicial se exterioriza, atingindo a sentença não apenas o processo, mas também o mundo dos fatos.

A sentença é a forma pela qual o Estado-juiz exterioriza sua vontade/decisão, em um caso concreto. Tal instituto foi, durante algum tempo, entendido como um ato declaratório do direito, ou seja, o Juiz apenas declara a lei aplicável ao caso concreto, pois somente a lei teria um caráter de neutralidade no Direito.

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Os juízes nada mais são que a boca que pronuncia as palavras da lei; são seres inanimados, que declaram o Direito no caso concreto, mas não dispõe de alma, ou sentimento para tal aplicação.

Por tal vertente de pensamento jurídico, é tão somente a lei que pode criar o Direito através de normas genéricas e abstratas, aplicáveis igualmente nas situações que prevê, cabendo ao intérprete simplesmente um processo de revelação do Direito positivo (SLAIBI FILHO, 2004, p. 283).

Todavia, a sentença também pode ser concebida como um ato constitutivo do Direito. Deste modo, a decisão sólida e individualizada também é criadora do direito. Assim, a deliberação do Estado-juiz pode ser constitutiva de direitos.

Somente o pensamento mais antigo podia ter a veleidade de considerar o sistema jurídico positivo tão perfeito que não fosse necessário autorizar o juiz a completar suas lacunas – no século passado, dizia Portalis que não ensinava o Direito Civil, mas ensinava o “Código Civil”, referindo-se ao Code Napoléon, de 1804, por muitos considerado a suprema realização legal (SLAIBI FILHO, 2004, p. 284).

Nessa segunda vertente, o juiz não é apenas a boca da lei, como se possível fosse essa prever todas as situações do mundo fático: aqui, o julgador pode socorrer-se de outros meios senão aquele, tornando o julgador algo além de um simples repetidor da norma. Pode, então, buscar de outras ciências e outros meios, que não a lei, para a solução dos litígios.

Se fosse possível o juiz simplesmente declarar o direito preestabelecido na norma genérica e abstrata, não haveria mandamentos legais, como o art. 126 do Código de Processo, vedando a denegação de justiça em caso de lacuna ou obscuridade da lei: no julgamento da lide caber-lhe-á (ao juiz) aplicar as normas legais; não as havendo, recorrerá à analogia, aos costumes e aos princípios gerais do direito (SLAIBI FILHO, 2004, p. 284).

O Código de Processo Civil parece ter adotado a posição da sentença como um ato constitutivo do Direito, em virtude do disposto no art. 468, que diz ter a sentença força de lei nos limites das questões decididas.

Se a sentença busca a lógica e a razoabilidade, não deixa, no entanto, de ser uma obra humana, uma criação da inteligência e da vontade, isto é, uma criatura do espírito.

[...]

Como construção lógica, a sentença se erige sobre diversos silogismos, isto é, a figura adotada por Aristóteles para indicar o tipo perfeito de raciocínio dedutivo -“um discurso em que, postas algumas coisas, outras derivam necessariamente” (SLAIBI FILHO, 2004, p. 288).

Assim, podemos dizer que é a sentença uma construção lógica e humana, que busca a razoabilidade para decidir a melhor solução para um conflito.

Busca o juiz, deste modo, resolver a lide, declarando com fundamento não apenas nas ciências jurídicas, a melhor solução para o caso concreto. Sendo que tal decisão faz lei entre as partes do processo.

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2.1.1.1 Espécies de Sentença

A sentença, como ente jurídico processual, pode assumir vários aspectos, já que poderá ter diferentes efeitos ou, ainda, podem ser diferentes os agentes que a prolatam, destarte veremos um pouco de suas particularidades.

Embora a sentença seja ente jurídico-processual de natureza sui generis, ainda assim necessita de ser examinada quanto aos diversos aspectos que podem assumir, pois diferentes serão seus agentes, a forma e seus efeitos por ela pretendidos a se operarem no mundo jurídico (SLAIBI FILHO, 2004, p. 293).

Vejamos, primeiramente, a sentença de primeiro grau, que é o ato judicial, que manifesta a vontade do juiz, onde “sentença... é a decisão definitiva de primeiro grau proferida pelo juiz monocrático” (MARQUES apud SLAIBI FILHO, 1998, p. 293). Deste modo, quando tivermos uma decisão emanada do magistrado (juiz singular) que decide a lide, estaremos diante de uma sentença.

Denomina-se acórdão o julgamento proferido pelos tribunais (art. 163 do CPC), ainda que decorra de exercício de competência originária. [...] A expressão “acórdão” vem de “acordo”, o consenso, a vontade predominante, ao menos pela maioria, dos membros do tribunal sobre determinada matéria. A formação da vontade no acórdão é colegial, isto é, integrada pelas manifestações de vontade de cada juiz (SLAIBI FILHO, 2004, p. 294).

Então, a sentença é a decisão final e singular de um processo de primeiro grau, já a expressão acórdão é designada para definir a decisão final e monocrática ou colegiada dos processos de segundo grau. Quando essas decisões já não podem mais ser objeto de recurso, elas são denominadas arestos, ou seja, “aresto é a decisão de 1º ou 2º graus de jurisdição, da qual não mais cabe recurso” (SLAIBI FILHO, 2004).

Há, também, em nosso ordenamento jurídico, a chamada sentença arbitral que versa sobre a decisão proferida pelo juízo arbitral. De acordo com o art. 584, inciso III do Código de Processo Civil, esta modalidade de sentença constitui título executivo judicial.

Ainda podemos vislumbrar a sentença estrangeira, que nada mais é do que a decisão proferida em um tribunal fora de nosso país. Tal modalidade de sentença, contudo, precisa ser homologada pelo Superior Tribunal de Justiça para ter validade no território nacional.

Quanto aos seus efeitos, a sentença ainda pode assumir mais de um aspecto, já que classificações na doutrina podem variar de acordo com as concepções de cada autor. Destacamos cinco tipos: declaratória, constitutiva, condenatória, executiva e mandamental.

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No tocante à sentença declaratória ou declarativa, seu efeito preponderante consiste em reconhecer a existência ou inexistência de relação jurídica, isto é, o liame jurídico entre as partes na relação material.

Podemos entender a sentença constitutiva como aquela que cria, modifica ou extingue uma relação jurídica. Segundo Slaibi Filho (2004, p. 329), “as sentenças constitutivas são aquelas que, sem limitar-se à mera declaração de relação jurídica e sem estabelecer uma condenação ao cumprimento de uma pretensão, criam, modificam e extinguem um estado jurídico”.

Acerca da sentença condenatória, podemos colher a característica de que o magistrado condena o demandado a prestar alguma obrigação em favor do demandante. Vejamos as ilustres palavras de Ovídio Batista acerca do tema:

O juiz, ao acolher o pedido da parte e condenar o demandado, não realiza a execução, senão que estabelece o pressuposto para que a execução se faça, numa demanda autônoma e subseqüente [...] ou ainda nos casos excepcionais em que o ato final executório está incluso no chamado processo de conhecimento (O. SILVA, 1995, p. 99).

E prossegue o nobre autor, no sentido de que o juiz, nessa espécie de sentença, apenas emite um enunciado lógico de cunho valorativo, sem adentrar no mundo dos fatos, ou seja, emite uma ordem que deverá ser cumprida pelo demandado, e se este não o fizer, sua obrigação será objeto de execução judicial.

[...] é a conclusão de que há uma distinção essencial entre o condenar e o executar. Enquanto o juiz condena, apenas emite um enunciado lógico de cunho valorativo, sem descer, contudo, ao mundo dos fatos, ao mundo dos fenômenos, para transformar a realidade física; ao passo que pela execução, o juiz realiza o que deveria ter sido feito pelo demandado e não o foi (O. SILVA, 1995, p. 100).

Tal modalidade de sentença é tida no processo de conhecimento, que se destina apenas à obtenção de uma sentença em que o juiz aplica a vontade da lei, visando à pacificação social através da solução do litígio.

O processo dito de conhecimento, segundo tal concepção [...] destina-se pura e simplesmente à obtenção da sentença, como juízo, como solução de controvérsias, onde o juiz, como representante do poder estatal, afirma autoritativamente a vontade concreta da lei, sem contudo realizar, em substituição à atividade privada do condenado, o ato final executório (O. SILVA, 1995, p. 100).

Já a sentença executiva é aquela capaz de modificar o mundo exterior, é o meio pelo qual o juiz exterioriza uma decisão jurídica ao mundo dos fatos: trata-se de fazer por meio da coerção estatal que o demandado cumpra sua obrigação com o demandante.

Sentença executiva é toda aquela que contém, imanente em si mesma, como eficácia que lhe é própria, o poder de operar uma mudança no mundo exterior, [...] compreendida tal mudança como correspondendo a uma transferência de valor

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jurídico do demandado para o patrimônio do demandante, onde tal valor deveria estar.

O ato executivo, então, é um ato jurisdicional de incursão no mundo dos fatos, de transformação da realidade, por meio do qual o juiz, substituindo-se ao condenado, realiza uma atividade essencial e originalmente privada (O. SILVA, 1995, p. 100). Por fim, a sentença mandamental é aquela que o magistrado emite uma ordem para que alguma coisa seja ou deixe de ser feita, neste caso, se a ordem se origina da própria estatalidade da função jurisdicional.

O direito moderno conhece, como, aliás, o conhecia o direito romano, inumeráveis hipóteses de atividade jurisdicional nas quais o juiz, ao invés de condenar, emite uma ordem para que se faça ou se deixe de fazer alguma coisa, ordem essa que se origina da própria estatalidade da função jurisdicional e nada tem a ver com a atividade privada do demandado (O. SILVA, 1995, p. 103).

Por tratar-se de uma atividade estatal, o seu não cumprimento acarretará em responsabilização criminal do demandado que desobedecer a ordem jurisdicional. Assim poderá, inclusive, ser punido pelo crime de desobediência.

[...] o resultado da insubmissão ao comando jurisdicional, o não cumprimento da ordem contida na sentença jamais conduzirá ao sucedâneo do ressarcimento por perdas e danos. Aqui a consequência será a responsabilidade criminal por desobediência, ou outra sanção de natureza publicística (O. SILVA, 1995, p. 103). Tais divisões nem sempre são fáceis de vislumbrar em um caso prático, sendo que uma ou outra característica dificilmente aparecerá sozinha em uma sentença. Desta forma, a classificação deverá ser determinada pela preponderância de um atributo sobre os demais.

2.1.1.1.1 Delimitação no Código de Processo Civil

O Código de Processo Civil de 1973, em sua redação original, definia a sentença como o ato pelo qual o juiz dava termo ao processo, ou seja, era o ato final, o último da lide, decidindo ou não o mérito da causa. Nestes termos:

Art. 162. Os atos do juiz consistirão em sentenças, decisões interlocutórias e despachos.

§ 1o Sentença é o ato pelo qual o juiz põe termo ao processo, decidindo ou não o mérito da causa (BRASIL, 2011).

Todavia, tal conceito não permaneceu na legislação, pois o processo dificilmente terminava, e ainda não termina com a sentença em virtude da possibilidade das partes interporem recursos acerca da decisão ou, ainda, da necessidade da continuidade da prestação jurisdicional face ao não cumprimento voluntário da condenação.

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Assim, a expressão “ato do juiz que põe termo ao processo” tratava-se, em boa parte dos casos, letra morta na lei. Por essa razão, o referido artigo sofreu modificação em 2005, passando o seu parágrafo primeiro a conter a seguinte redação: “Sentença é o ato do juiz que implica alguma das situações previstas nos arts. 267 e 269 desta Lei”.

Deste modo, o legislador retirou a disposição que definia a sentença como ato do juiz que punha fim ao processo, limitando-se a dizer que se trata de ato pelo qual o magistrado julga o processo com ou sem resolução de mérito. Decidido o processo pelo juiz ou pelo órgão julgador, e não havendo mais possibilidade de recurso, há o trânsito em julgado da decisão, cujo instituto constitui o próximo item.

2.2 COISA JULGADA

Dada a sentença pelo magistrado e esgotada a via recursal, ou as partes não atacarem tal decisão no prazo cabível, a decisão não pode mais ser modificada: trata-se a sentença transitada em julgado aquela que não mais pode ser discutida, sendo a qualidade que a torna imutável.

Efetivamente, desde logo, oportuno afirmar que a res iudicata reveste um conceito jurídico cujo conteúdo difere do simples enunciado de suas palavras [...]

Na acepção literal dos vocábulos, pareceria, aos menos avisados, que coisa significa

objeto. Todavia, não é essa a noção jurídica que traduz e, sim, a de uma medida de

valor que pode ser objeto do direito ou até mesmo a noção de bem ou de relação

jurídica. O adjetivo julgada, por seu turno, qualifica a matéria que foi objeto de

apreciação judicial (PORTO, 2006, p. 51).

Observa-se que o termo coisa não deve ser entendido em seu sentido literal, mas sim na acepção jurídica, que define um bem ou uma relação jurídica, e a palavra julgada define a matéria que foi objeto da apreciação judicial. Assim, não deve ser entendida a coisa julgada apenas como um efeito da sentença, conforme ensina Liebman (1984, p. 29):

Constitui erro de lógica definir a autoridade da coisa julgada como efeito da sentença e – consequência inevitável – identificá-la com a eficácia declaratória da própria sentença, contrapondo-a, portanto, aos seus outros possíveis efeitos (constitutivos ou condenatórios).

Assevera o ilustre doutrinador ser a coisa julgada a expressão da vontade concreta do direito, e tal expressão soma-se à autoridade de tal instituto, mesmo que seus efeitos não sejam apenas declaratórios.

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Que se deva pôr toda a importância da coisa julgada “na expressão da vontade concreta do direito”, uma verdade que deve ser entendida em toda sua extensão: isto é, a essa expressão da vontade concreta do direito pode e deve acrescer a autoridade da coisa julgada, ainda quando o seu conteúdo e seus efeitos não sejam meramente declaratórios, mas também de criação ou de modificação da realidade jurídica (LIEBMAN, 1984. p. 30).

O instituto da coisa julgada pode ser formal ou material. O primeiro ocorre quando a sentença não analisa o mérito da causa, apenas extingue o processo e dá-se quando a decisão é proferida de acordo com algum dos incisos do artigo 267 do Código de Processo Civil; o segundo ocorre na forma do artigo 269 do referido código, ou seja, com resolução de mérito.

Não há, pode-se dizer, discordância entre os escritores sobre o ponto da distinção entre coisa julgada em sentido formal e em sentido substancial (ou material). É a primeira uma qualidade da sentença, quando já não é recorrível por força da preclusão dos recursos; seria por sua vez, a segunda a sua eficácia específica, e, propriamente, a autoridade da coisa julgada, e estaria condicionada a formação da primeira (LIEBMAN, 1984, p. 60).

Ocorre a coisa julgada formal quando a sentença se torna imodificável naquele processo na qual foi prolatada. Assim, nada impede que uma nova ação seja proposta pela mesma parte e com o mesmo objeto, desde que seja sanado o defeito que levou a extinção do feito sem a resolução de mérito.

A coisa julgada formal se constitui no fenômeno que torna a sentença imodificável, no processo em que foi prolatada, em face da ausência absoluta da possibilidade de impugnação da decisão, em razão do esgotamento das vias recursais, quer pelo exercício de todos os recursos possíveis, quer pelo não exercício deles, ou quer, ainda, pela não apresentação de algum, bem como por eventual renúncia ou desistência de interposição (PORTO, 2006. p. 63).

No presente estudo, utilizaremos o termo coisa julgada para fazer referência à coisa julgada material, pois apenas esta pode ser atingida pelos embargos à execução da fazenda pública ou pela impugnação ao cumprimento de sentença. Vejamos, pois, este instituto.

A coisa julgada visa a impossibilitar que o processo seja infinitamente discutido e dar segurança ao cidadão sobre as decisões judiciais para que a vontade do estado, proferida pelo juiz, não seja modificada a todo instante.

Entre o justo absoluto, utópico, e o justo possível, realizável, o sistema constitucional brasileiro, a exemplo do que ocorre na maioria dos sistemas democráticos ocidentais, optou pelo segundo (justo possível), que é consubstanciado na segurança jurídica da coisa julgada material.

Descumprir a coisa julgada é negar o próprio estado democrático de direito, fundamento da república brasileira (NERY JUNIOR, 2009, p.52).

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O sistema constitucional vigente põe a salvo o caso julgado, dispondo que nem a lei pode atenuá-lo, a própria alteração constitucional não tem o condão de modificar a coisa julgada. Também as normas infraconstitucionais colocam-na a salvo das decisões do juiz, que não pode alterá-la.

A lei não pode modificar a coisa julgada material (CF 5.º XXXVI); a CF não pode ser modificada para alterar-se a coisa julgada material (CF 1.º caput e 60 § 4.º); o juiz não pode alterar a coisa julgada (CPC 467 e 471). Somente a lide (pretensão, pedido, mérito) é acobertada pela coisa julgada material, que a torna imutável e indiscutível, tanto no processo que foi proferido a sentença, quanto em processo futuro (NERY JUNIOR, 2009, p. 52).

Prossegue em sua lição o nobre autor Nelson Nery Junior (2009):

O estado democrático de direito (CF 1.º caput) e um de seus elementos de existência [...] que é a coisa julgada, são cláusulas pétreas em nosso sistema constitucional, cláusulas essas que não podem ser modificadas ou abolidas nem por emenda constitucional (CF 60 § 4.º I e IV), porquanto bases fundamentais da República Federativa do Brasil. Por consequência (sic) e com muito maior razão, não podem ser modificadas ou abolidas por lei ordinária ou por decisão judicial posterior. Desta forma, a impossibilidade de rediscutir-se a decisão “se constitui numa qualidade da sentença transitada em julgado – chamada, pela lei, de eficácia – que é capaz de outorgar ao ato jurisdicional as características da imutabilidade e da indiscutibilidade” (PORTO, 2006, p. 65).

Nota-se que, embora por institutos diferentes, a coisa julgada formal é pressuposto para a coisa julgada material, ou seja, é necessário que a sentença seja alcançada pela preclusão do processo, não mais sujeita a recursos, para atingir a imutabilidade do mérito. Todavia, essa dependência não é recíproca, pois, pode a coisa julgada formal independer da material.

Coisa julgada material (auctoritas rei iudicatae) é a qualidade que torna imutável e indiscutível o comando que emerge da parte dispositiva da sentença de mérito não mais sujeita a recurso ordinário ou extraordinário (CPC 467; LICC 6.º § 3.º), nem à remessa necessária do CPC 475. Somente ocorre se e quando a sentença de mérito tiver sido alcançada pela preclusão, isto é, a coisa julgada formal é pressuposto para a coisa julgada material, mas não o contrário. A coisa julgada material é um efeito especial da sentença transformada formalmente em julgado. A segurança jurídica, trazida pela coisa julgada material, é manifestação do estado democrático de direito (CF 1.º caput), (NERY JUNIOR, 2009, p. 52).

Em regra (há exceções, porém não detalhadas no presente trabalho), apenas as decisões proferidas com o fundamento no artigo 269 do Código de Processo Civil são cobertas pela autoridade da coisa julgada, ou seja, apenas as sentenças proferidas em julgamento acerca do mérito da causa estão sob a proteção desta. As demais sentenças são atingidas apenas pela preclusão.

Somente as sentenças de mérito, proferidas com fundamento no CPC 269, são acobertadas pela autoridade da coisa julgada; as de extinção do processo sem julgamento de mérito (CPC 267) são atingidas apenas pela preclusão (coisa julgada

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formal). A coisa julgada material é instrumento de pacificação social (NERY JUNIOR, 2005).

Destaca-se, da citação supra, ser a coisa julgada instrumento de pacificação social, pois, a população deve sentir-se segura acerca de seus bens e seus direitos, sendo vedadas mudanças repentinas nas decisões que lhe são dadas pelo Poder judiciário.

O direito a ter uma decisão que transita em julgado termina o processo e dá-se a cumprimento regular, e o direito de que não sobrevenha mudança no direito que reverbere a decisão tomada e transitada em julgado são fundamentais para que a pessoa tenha certezas no viver, de que lhe nasçam e prosperem condições de sentir-se juridicamente sentir-segura dos sentir-seus bens e direitos (ROCHA, 2005, p. 179).

Conforme ensina a ilustre doutrinadora Carmen Lúcia (2005, p. 179), manifesta-se a coisa julgada com base no princípio da jurisdição. Assim, o direito dito pelo Estado, em determinado caso, deve ser respeitado em razão da certeza dos estatais e da paz social, in verbis:

A coisa julgada aborda-se como manifestação de respeito ao princípio da jurisdição, igualmente posto como direito fundamental [...] Dito pelo Estado o direito a prevalecer em determinado caso, submetido a julgamento, o quanto decidido e contido no ditado juridicamente haverá que ser respeitado em benefício da certeza dos atos estatais e em benefício da paz social. Esta não comporta ou tolera a instabilidade das lides intermináveis e interminadas.

Assim, percebe-se a grande importância que a coisa julgada empresta ao ordenamento jurídico, bem como para a sociedade, que não deve ser assolada com confrontos judiciais intermináveis. Vejamos, pois os requisitos para que a coisa julgada se afigure.

2.2.1 Requisitos da Coisa Julgada

Para a existência da coisa julgada são necessários alguns requisitos: que exista um processo; que a sentença seja de mérito; e que essa sentença não possa mais ser impugnada pela via recursal.

Para que se forme a auctoritas rei iudicatae (coisa julgada material), são necessários os seguintes requisitos: a) que o processo exista, isto é, que estejam presentes os pressupostos de constituição do processo (jurisdição, petição inicial, citação – 267 IV); b) que a sentença seja de mérito (CPC 269); c) que a sentença de mérito não mais seja impugnável por recurso ordinário ou extraordinário (CPC 467; LICC 6.º § 3.º) ou reexaminável pela remessa necessária (CPC 475) (NERY JUNIOR, 2009, p. 57).

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No tocante à existência do processo, é mister que estejam presentes os pressupostos processuais de existência: jurisdição, petição inicial, capacidade postulatória e citação do réu (desnecessária em alguns casos). Na falta de algum desses pressupostos o processo não será existente e, portanto, não poderá sua sentença transitar em julgado.

Para que a sentença de mérito, proferida pelo juiz no processo civil, adquira autoridade de coisa julgada (coisa julgada material), é necessário que estejam presentes os pressupostos processuais de existência: jurisdição do juiz, petição inicial, capacidade postulatória (somente para o autor) e citação do réu (quando necessária) [...] Caso falte um dos pressupostos processuais de existência, o processo inexiste e a sentença que nele vier a ser proferida será igualmente inexistente: não terá força de coisa julgada (NERY JUNIOR, 2009. P. 53).

Por outro lado, no processo inválido, aquele que não preenche os pressupostos de validade, como a hipótese de juiz impedido ou incompetente proferir a sentença, a petição for inepta, citação nula, parte incapaz, não está impedido de ter sua decisão acobertada pela coisa julgada material.

O processo inválido, isto é, que contenha vícios porque não preenchidos os pressupostos de validade (juiz impedido, juízo absolutamente incompetente, petição inicial inepta, citação nula, parte incapaz ou representante inexistente ou irregular etc.), não impede que a sentença de mérito nele proferida seja acobertada pela coisa julgada material (NERY JUNIOR, 2009, p. 57,58).

Entendidos os requisitos, podemos buscar compreender os efeitos da coisa julgada para continuar em nosso caminho até a discussão da coisa julgada inconstitucional no processo de execução.

2.2.1.1 Efeitos da Coisa Julgada

Os efeitos da coisa julgada podem ser divididos em duas espécies: endoprocessuais (dentro do processo), e extraprocessuais (fora do processo). A primeira torna indiscutível a sentença transitada em julgado no mesmo processo e torna obrigatório o comando que insurge da parte dispositiva da sentença. Já a segunda espécie vincula as partes e o juízo de qualquer processo e impossibilita uma nova discussão da lide em ação posterior.

A sentença de mérito transitada em julgado [...] possui efeitos dentro do processo em que fora prolatada e, também, efeitos que a projetam para fora desse mesmo processo. Há, portanto, duas espécies básicas de efeitos da coisa julgada: I – efeitos

endoprocessuais: a) tornar inimpugnável e indiscutível a sentença de mérito

transitada em julgado, impedindo o juiz de redecidir a pretensão (CPC 467 e 471); b) tornar obrigatório o comando que emerge da parte dispositiva da sentença; II –

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efeitos extraprocessuais: a) vincular as partes e o juízo de qualquer processo [...]; b) impossibilidade de a lide (mérito, pretensão), já atingida pela auctoritas rei

iudicatae, ser rediscutida em ação judicial posterior (NERY JUNIOR, 2009, p. 56).

No tocante à proibição de rediscussão da lide, percebe-se a preocupação com a pacificação social, onde as partes devem se submeter à sua autoridade, vez que sua vontade é substituída pela vontade do Estado-juiz.

Porque instrumento de pacificação social, quando há a coisa julgada as partes devem se submeter à sua autoridade, qualquer que tenha sido o resultado da sentença (inevitabilidade da jurisdição). Incide aqui o caráter substitutivo da função jurisdicional, vale dizer, a vontade das partes é substituída pela vontade do Estado-juiz, que prevalece (NERY JUNIOR, 2009, p. 58).

Como as atividades das partes são substituídas, em virtude do efeito substitutivo, mesmo as nulidades por ventura existentes no processo abarcadas pela sentença as substituem com o transito em julgado.

Um efeito especial da coisa julgada material é o substitutivo, decorrente da função substitutiva da jurisdição: a sentença de mérito transitada em julgado substitui as atividades das partes e do juiz praticadas no processo, de sorte que as nulidades e anulabilidades porventura ocorridas durante o procedimento terão sido substituídas pela sentença, que as abarca. [...] O efeito substitutivo da coisa julgada também ocorre quando o juiz, por exemplo, reconhece como inexistente uma relação jurídica existente, ou existente uma relação jurídica inexistente (NERY JUNIOR, 2009, p. 56, 57).

Uma expressão bastante utilizada no presente trabalho é “pacificação social”: a coisa julgada conduz tal pacificação. Vejamos agora um princípio que está diretamente ligado com a referida expressão e, consequentemente, com o presente trabalho.

2.2.1.1.1 Segurança Jurídica

Consequência da coisa julgada, a segurança jurídica é elemento que visa a propiciar confiança e convicção nas relações sociais e jurídicas, garantia de que as partes devem postular o que lhes for de direito, respeitando prazos e requisitos previamente estabelecidos em lei; segurança de que a lide não se prorrogará indistintamente, ato que não traria segurança acerca de seu direito.

Há determinados institutos no direito, de natureza material (v.g., decadência, prescrição) ou processual (v.g., preclusão), criados para propiciar a segurança nas relações sociais e jurídicas. A coisa julgada é um desses institutos e tem natureza constitucional, pois é [...] elemento que forma a própria existência do estado democrático de direito (NERY JUNIOR, 2009).

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Diante disso, “afirma-se a coisa julgada como manifestação necessária ou como decorrência precisa da segurança jurídica, em virtude do que as decisões judiciais devem se revestir de intangibilidade absoluta após o seu trânsito em julgado” (ROCHA, 2005). Há, portanto, proteção constitucional no tocante à segurança jurídica, pois, conforme ensina Nelson Nery Junior (2009), “atender-se-á ao principio da supremacia da Constituição, se houver respeito à intangibilidade da coisa julgada”.

Nobres são as lições da ilustre doutrinadora Carmen Lúcia acerca do tema. Segundo ela, a segurança jurídica é o direito à estabilidade das relações jurídicas, sendo vedada, deste modo, a modificação imprevisível que possa gerar instabilidade e insegurança, seja para o passado, o presente ou o futuro. Vejamos in verbis:

Segurança jurídica é o direito da pessoa à estabilidade em suas relações jurídicas. Este direito articula-se com a garantia da tranqüilidade jurídica que as pessoas querem ter, com a sua certeza de que as relações jurídicas não podem ser alteradas numa imprevisibilidade que as deixe instáveis e inseguras quanto ao seu futuro, quanto ao seu presente e até mesmo quanto ao seu passado (ROCHA, 2005 p. 168). Pode se manifestar a segurança jurídica em várias formas, sendo pela não retroatividade das leis, prescrição, decadência, preclusão, regras de direito intertemporal e demais institutos jurídicos que propiciam confiança e fé acerca dos atos jurisdicionais.

O princípio da segurança jurídica manifesta-se em variadas conformações institucionais, comparecendo quer no princípio da não retroatividade das leis e atos normativos, quer na regra que obriga o juiz a atentar ao direito intertemporal, quer naquelas relativas à prescrição, à decadência e à preclusão, enfim, em todos os institutos que revelem eficazes a confiança e a fé cidadã que a pessoa tem no sistema jurídico, no qual lhe é garantido o direito à segurança (ROCHA, 2005, p. 169). A segurança jurídica é balizada pela convicção e confiança, deve se afirmar, pois resulta de criação estatal como meio da pacificação social. Os súditos precisam ter a certeza que a sentença, a vontade do Estado, que se tornou lei entre as partes, prevalecerá.

Segurança jurídica firma-se como paládio de convicções e confiança. Se o direito não se afirma por seguro e garantidor de segurança para as pessoas, direito ele não é, pelo menos não como expressão maior da criação social e estatal. Por isto, segurança jurídica produz-se na confiança que se põe no sistema e na convicção de que ele prevalece e observa-se obrigatória e igualmente por todos (ROCHA, 2005, p. 169). Deve o patrimônio dos bens jurídicos de todos os cidadãos ser acobertado pela segurança, que é um direito constitucional. Somente assim estará resguardado de mudanças repentinas, sejam sociais, políticas ou jurídicas.

A invulnerabilidade do patrimônio de bens jurídicos da pessoa repousa na segurança que se lhe apresenta como direito fundamental, que o resguarda de violações e põe-no a salvo de tormentas socioeconômicas, políticas e jurídicas.

O homem ser intranqüilo (sic) em sua aventura humana, quer se fazer, pois, tranqüilo (sic) ao menos no que concerne aos negócios jurídicos sobre quais as normas incidem segundo o sistema que lhe é previamente apresentado, dado ao seu conhecimento e ao seu saber quanto a eficácia a se produzir (ROCHA, 2005, p. 169).

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Entendido o instituto da sentença, a importância do trânsito em julgado da mesma e o princípio fundamental da segurança jurídica, temos elementos suficientes para adentrar no capítulo que abordará a Constituição e, principalmente, o controle de constitucionalidade das normas.

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3 DIREITO CONSTITUCIONAL

Fundamental, antes de discutir sobre a coisa julgada inconstitucional, é tecer, mesmo que de forma breve, alguns conceitos, sobre o Direito Constitucional, que não é o foco principal do presente estudo, porém é imprescindível para o entendimento das premissas apresentadas no decorrer do mesmo.

A doutrina apresenta vários conceitos sobre o que é Direito Constitucional. Todavia, é unanime em delinear sua enorme importância no ordenamento jurídico, colocando esse ramo no ápice da seara jurídica. É, portanto,

O ramo por excelência do Direito Público, o principal ramo desta seara jurídica, já que tem por objeto o estudo do ordenamento fundamental do Estado, o conjunto de regras e princípios basilares de uma sociedade politicamente organizada, os quais, em seu conjunto, compõem sua constituição (MOTTA; BARCHET, 2009 pg. 04) Denota-se que tal ramo do Direito é eminentemente Público e o mais importante, pois estuda o ordenamento fundamental do Estado, ou seja, sua Constituição. Ademais, é a fonte primária para todos os demais ramos do Direito, tanto do Direito Público quanto do Direito Privado. Assim define a doutrina:

[...] o ramo-mãe do Direito, o ramo jurídico do qual derivam todos os demais, não só aqueles que integram o Direito Público, mas também os que formam o Direito Privado [...] podemos considerá-lo como o ramo fundamental, num primeiro plano, do Direito Público e, num segundo, do direito como um todo (MOTTA; BARCHET, 2009).

Conforme se observa das palavras do ilustre doutrinador Paulo Bonavides, as constituições deixaram de apenas regular os princípios da forma de governo do Estado e a proteger as garantias individuais, tornando-se a base primária de toda a organização jurídica. Assim, o nobre expõe a importância das constituições:

[...] as constituições clássicas continham somente princípios relativos ao governo e às garantias individuais: hoje em dia as leis fundamentais assinalam as bases primárias de toda organização jurídica do Estado e daí suas múltiplas e importantes relações com os outros ramos do Direito (GONZALES apud. BONAVIDES, pg.43 2004).

Já Alexandre de Moraes (2008) destaca o fato desse ramo do direito “ser fundamental à organização e funcionamento do Estado, à articulação dos elementos primários do mesmo e ao estabelecimento das bases da estrutura política”.

Desta forma, podemos vislumbrar a grande importância e, deste modo, a grande influência, seja direta ou indireta, que possui o direito constitucional sobre os demais ramos do direito, de modo que é fundamental para qualquer aplicador do Direito conhecê-lo. Vejamos então a constituição.

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3.1 CONSTITUIÇÃO

O termo constituição pode ser empregado com vários significados. Conforme assevera José Afonso da Silva (pg. 37, 2005), pode ser: o conjunto de elementos essenciais a alguma coisa; no sentido de organização, formação; todavia, o termo será utilizado em nosso estudo como a lei fundamental de um Estado.

É algo que tem, como forma, um complexo de normas (escritas ou costumeiras); como conteúdo, a conduta humana motivada pelas relações sociais (econômicas, políticas, religiosas etc.); como fim, a realização dos valores que apontam para o existir da comunidade; e, finalmente, como causa criadora e recriadora, o poder que emana do povo (J. SILVA, pg. 39, 2005).

É considerada a lei máxima do Estado, estando acima de todas as leis, normatizando e legitimando todos os poderes do Estado e garantindo os direitos fundamentas da população, evitando o abuso de poder por parte daquele.

A constituição se coloca no vértice do sistema jurídico do país, a que confere validade, e que todos os poderes estatais são legítimos na medida em que ela os reconheça e na proporção por ela distribuídos. É, enfim, a lei suprema do Estado, pois é nela que se encontram a própria estruturação deste e a organização de seus órgãos; é nela que se acham as normas fundamentais do Estado, e só nisso se notará a sua superioridade em relação às demais normas jurídicas (J. SILVA, 2005). Destarte, observa-se a grande importância da Constituição em razão da mesma regular a estruturação e funcionamento de Estado, dividindo os poderes, distribuindo as competências, a forma de aquisição do poder.

Juridicamente, porém, deve ser entendida como a lei fundamental e suprema de um Estado, que contém normas referentes à estruturação do Estado, à formação dos poderes públicos, forma de governo e aquisição do poder de governar, distribuição de competências, direitos, garantias e deveres dos cidadãos (MORAES, 2008). Entendido o significado da palavra constituição, vamos adentrar, de forma sucinta, em um histórico das constituições brasileiras para vislumbrarmos, assim, a sua evolução no Direito pátrio.

A Constituição Política do Império do Brasil, outorgada em 1824, nossa primeira Lei Magna, declarava que o Império do Brasil era a associação política de todos os brasileiros, não permitia qualquer união que viesse a opor-se à independência. Consubstanciava-se num governo monárquico hereditário.

Aspecto interessante dessa Constituição era a divisão administrativa do Estado em quatro poderes, sendo eles: Poder Legislativo, Poder Judiciário, Poder Executivo e Poder Moderador, este último exercia fiscalização sobre os demais, conforme esclarece José Afonso da Silva (2008, p. 75):

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O Poder Moderador, considerado a chave de toda a organização política, era exercido privativamente pelo imperador, como chefe supremo da nação e seu primeiro representante, para que incessantemente velasse sobre a manutenção da independência, equilíbrio e harmonia dos demais poderes políticos.

Já no período republicano, em 1891 foi promulgada a Constituição da República dos Estados Unidos do Brasil. Nessa Carta as antigas províncias tornaram-se Estados e instalou-se o presidencialismo à moda norte-americana. No tocante à divisão dos poderes, passou a vigorar a teoria tripartite de Montesquieu.

Rompera com a divisão quadripartita vigente no Império de inspiração de Benjamim Constant, para agasalhar a doutrina tripartita de Montesquieu, estabelecendo como “órgãos da soberania nacional o Poder Legislativo, o Executivo e o Judiciário, harmônicos e independentes entre si” (J. SILVA, 2008, p. 79).

Foi uma Constituição pouco vinculada com a realidade do país, pois tinha forte influência norte-americana, com algumas disposições das constituições Suíça e Argentina, razão pela qual “não teve eficácia social, não regeu os fatos que previra, não fora cumprida” (J. SILVA, 2008, p. 79).

Em 1934, fora promulgada uma nova Lei Máxima que passou a reger o país, que manteve da anterior a divisão dos poderes, o presidencialismo, a república e o modo federativo.

Ao lado da clássica declaração de direitos e garantias individuais inscreveu um título

sobre a ordem econômica e social e outro sobre a família, a educação e a cultura,

com normas quase todas programáticas, sobre a influência da Constituição alemã de Weimar [...] Fora enfim, um documento de compromisso entre o liberalismo e o intervencionismo (J. SILVA, 2008, p. 82).

Ademais, a Carta de 1934, ainda aumentou os poderes do Executivo, modificou o sistema bicameral do Legislativo, com a diminuição da importância do Senado em face da Câmara dos Deputados. Tal Constituição vigorou por um curto período de tempo.

Sob a influência das ideologias surgidas após a Primeira Guerra, Getúlio Vargas, então chefe do Executivo, dissolve a Câmara e o Senado e outorga, em 1937, uma nova Constituição no Brasil.

Em síntese teve a Constituição [...] de 1937, como principais preocupações: fortalecer o Poder Executivo, [...] atribuir ao Poder Executivo uma intervenção mais direta na elaboração das leis, [...] eliminar as causas determinantes das lutas e dissídios nos partidos, [...] reconhecer e assegurar os direitos de liberdade, de segurança e de propriedade do indivíduo, acentuando, porém, que devem ser exercidos nos limites do bem público (J. SILVA, 2008, p. 83).

No tocante a efetividade, a Lei Mor de 1937 não teve aplicação regular, pois ocorreu uma ditadura com a concentração dos poderes Legislativo e Executivo nas mãos de uma pessoa, qual seja o Presidente da República.

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Com o fim da Segunda Guerra e a queda dos regimes fascista e nazista na Europa, ganharam força no país os movimentos pela redemocratização. Foi assim que surgiu a Constituição de 1946.

Ao contrário das outras, não foi elaborada com base em um projeto preordenado, que se oferecesse à discussão da Assembléia Constituinte. Serviu-se para sua formação, das Constituições de 1891 e 1934. Voltou-se, assim, às fontes formais do passado, que nem sempre estiveram conformes com a história real, o que constituiu o maior erro daquela Carta Magna (J. SILVA, 2008, p. 85).

Essa Carta não logrou êxito em realizar-se plenamente em virtude das crises políticas que sucederam, inclusive, com a renúncia do presidente Jânio Quadros: os militares reagem com intuito de impedir a posse do Vice-Presidente João Goulart, este assume o poder, porém cai em 1964.

Em 1967 é promulgada uma nova Constituição com grande influência da Carta Política de 1937 e atribuiu grandes poderes ao chefe do Executivo, colocado no cargo pelos militares.

A mesma “reformulou, em termos mais nítidos e rigorosos, o sistema tributário nacional e a discriminação de rendas [...] reduziu a autonomia individual, permitindo a suspensão de direitos e de garantias constitucionais” (J. SILVA, 2008, p. 87).

A Carta de 1969, outorgada pela ditadura, surgiu como uma emenda à constituição então vigente. Todavia, parte da doutrina entende como uma nova constituição.

Teórica e tecnicamente, não se tratou de emenda, mas de nova Constituição. A emenda só serviu como mecanismo de outorga, uma vez que verdadeiramente se promulgou texto integralmente reformado, a começar pela denominação que se lhe deu: Constituição da República Federativa do Brasil, enquanto a de 1967 se chamava apenas Constituição do Brasil. Ela foi modificada por outras vinte e cinco emendas, afora a de n. 26, que a rigor, não é emenda constitucional (J. SILVA 2008, p.87).

A referida Lei Magna concentrava os poderes nas mãos do regime militar, sendo a emenda n. 26 a que instituiu a Assembléia Nacional Constituinte, um ato político e, por isso, não considerado Emenda à constituição pelo supramencionado autor.

Já a nossa atual Constituição, promulgada em 1988, conhecida como a Constituição Cidadã, resgata a democracia, insere direitos sociais, direitos individuais e coletivos, direitos dos trabalhadores, dos partidos políticos, entre outros. Segundo José Afonso da Silva (2008, p.89), “é um texto moderno, com inovações de relevante importância para o constitucionalismo brasileiro e até mundial”.

É a conhecida Constituição Cidadã na expressão de Ulysses Guimarães, Presidente da Assembléia Nacional Constituinte que a produziu, porque teve ampla participação popular em sua elaboração e especialmente porque se volta decididamente para a plena realização da cidadania (J. SILVA, 2008, p. 90).

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Em virtude de não ser objeto principal do presente trabalho, não nos aprofundaremos nos detalhes das constituições brasileiras, que merecem estudo específico. O histórico citado apenas tem intuito de demonstrar que, em vários momentos de nossa história, tivemos mudanças de ordem constitucional. Todavia, em todos os momentos, prevaleceu como a Lei Máxima do Estado, predominando sobre as demais leis.

Para garantir que prevaleça essa superioridade da Constituição em relação a todas as demais leis ou demais atos do Estado, há necessidade de um controle de constitucionalidade das leis ou atos do poder público, que veremos no próximo capítulo, inclusive com breve histórico sobre o assunto.

3.1.1 Controle de Constitucionalidade

Para a existência de um controle de constitucionalidade é necessário que a Constituição seja colocada num patamar superior em relação com as demais leis. Conforme nos ensina Moraes (2008), “a ideia de controle de constitucionalidade está ligada à Supremacia da Constituição sobre todo o ordenamento jurídico e, também, à rigidez constitucional e proteção dos direitos fundamentais.” E prossegue sobre o assunto nos seguintes termos:

[...] a existência de escalonamento normativo é pressuposto necessário para a supremacia constitucional, pois, ocupando a constituição a hierarquia do sistema normativo, é nela que o legislador encontrará a forma de elaboração legislativa e o seu conteúdo. [...] verifica-se a superioridade da norma magna em relação àquelas produzidas pelo Poder Legislativo, no exercício da função legiferante ordinária (MORAES, 2008, p. 699).

Pois é na constituição, a lei suprema, que o Poder Legislativo encontra legitimidade para elaborar suas Leis, e o Executivo para reger o Estado. Assim, deve respeitar seus mandamentos, sendo que “a manutenção da efetividade do sistema de controle de constitucionalidade guarda relação direta com o conceito de Estado Democrático de Direito, com o conceito de cidadania e com a própria ideia de liberdade constitucional” (Barchet; Motta, P.485).

De forma bem simples e didática “controlar a constitucionalidade significa verificar a adequação (compatibilidade) de uma lei ou de um ato normativo com a constituição, verificando seus requisitos formais e materiais” (Moraes, 2008).

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