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Revista – Historien. Índios e negros no Brasil: análises, perspectivas e iniciativas (UPE – 2012)

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H i s t o r i e n – R e v i s t a d e H i s t ó r i a [ 7 ] P e t r o l i n a , jun./nov 2 0 1 2 Página 3

ISSN: 2177 – 0786

Ilustração da capa: criação de Christoval Araújo Júnior.

CONSELHO EDITORIAL

Profª Dr.ª Andréa Bandeira (UPE) Prof. Msc. Harley Abrantes (UPE) Profª Drª. Lina M. B. de Aras (UFBA)

Prof. Msc. Lúcio Reis Filho (UFJF) Prof. Msc. Moisés Almeida (UPE)

Prof. Dr. Nilton Almeida (UNIVASF)

Prof. Msc. Reinaldo Forte (UPE) Profª Msc. Sheyla Farias (UFAL)

EDITOR RESPONSÁVEL

Prof. Msc. Moisés Almeida (UPE)

EDITORES-CHEFE

Prof. Cléber Roberto Silva de Carvalho Prof. Christoval Araújo Júnior Prof. Esp. Pablo Michel Magalhães

Prof. Rafael de Oliveira Cruz

EQUIPE DE EDIÇÃO

Dielson da Silva Vieira (Coordenador de Comunicação) Maria do Socorro Fonseca de Oliveira (Coordenadora de Revisão)

Tadeu Henrique Araújo Silva (Coordenador de Editoração) Nivaldo Germano dos Santos (Revisão)

Juliana Rodrigues Alves (Revisão) Lucas Matheus da Silva (Comunicação)

Albert Fagner Pereira (Editoração)

Paulo Henrique Carneiro Barbosa (Diretor de articulação)

OBJETIVO DA REVISTA

A Revista Historien é uma produção do Grupo de Estudos Históricos Sapientia et Virtute, sendo que seus membros são discentes da Licenciatura Plena em História da Universidade de Pernambuco - Campus Petrolina, juntamente com

professores do corpo docente do referido curso. A proposta da Historien é o incentivo a produção textual dos alunos da licenciatura, visando a expansão do

conhecimento em história por meio da produção dos próprios acadêmicos.

TODOS OS DIREITOS RESERVADOS

É proibida a reprodução total ou parcial, de qualquer forma ou por qualquer meio. A violação dos direitos autorais (Lei nº 9.610/1998) é crime estabelecido

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HISTORIEN

Revista Eletrônica Universitária

Petrolina – PE, Nº 7 – jun./Nov. 2012

Sumário

EDITORIAL ... 8

HISTORIA EM FOCO:

A RESISTÊNCIA INDÍGENA E CAMPONESA NO CONTEXTO DA EXPANSÃO DO LATIFÚNDIO E DOS GRANDES EMPREENDIMENTOS ECONÔMICOS EM RONDÔNIA ... 10

Marilsa Miranda de Souza Márcio Marinho Martins

O ENSINO DA HISTÓRIA INDÍGENA: UMA ANÁLISE SOBRE OS LIVROS DIDÁTICOS DE HISTÓRIA EM ALAGOAS E EM PERNAMBUCO. ... 26

Denise Batista Lira Gilberto Geraldo Ferreira

POVOS INDÍGENAS: HISTÓRIA, CULTURAS E O ENSINO A PARTIR DA LEI 11.645. ... 39

Edson Silva

REPRESENTAÇÕES EUROPEIAS NOS RELATOS CRONISTICOS: A CONSTRUÇÃO DA IMAGEM INDÍGENA. ... 50

Douglas Coelho Rodrigues Flávia Ribeiro de Sousa Luan Santos Souza

BRANCO NO PRETO: UMA ANÁLISE SOBRE A RELAÇÃO DO NEGRO COM O OUTRO COMO FORMA DE AFIRMAÇÃO NA SOCIEDADE BRASILEIRA. ... 59

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H i s t o r i e n – R e v i s t a d e H i s t ó r i a [ 7 ] P e t r o l i n a , jun./nov 2 0 1 2 Página 5 PROBABILIDADES E ENTRAVES DAS POLÍTICAS EDUCATIVAS PARA A EDUCAÇÃO ESCOLAR INDÍGENA NO ESTADO DE PERNAMBUCO. ... 66

Maria de Fátima Souza de França Cabral

A MESOAMÉRICA INDÍGENA EM SALA DE AULA: UM RELATO SOBRE INTERDISCIPLINARIDADE, CULTURA E IDENTIDADE. ... 77

Vanessa da Silva Pereira

ÍNDIOS GUEREN NA SESMARIA DOS JESUÍTAS: ARRANJOS E CONFLITOS NA BARRA DO RIO DE CONTAS. ... 87

Rafael dos Santos Barros

ROMANA, EX-ESCRAVA: MÃE DESNATURADA E ASSASSINA. ... 101

Cristiano Pessatti de Matos

O “BRANQUEAMENTO” E A INTOLERÂNCIA RELIGIOSA: UMA REFLEXÃO À LUZ DE FRANTZ FANON. ... 116

Maria Rosa Almeida Alves

À ÉPOCA DA CONSTRUÇÃO: HISTÓRIA IMPRESSA DE BRASÍLIA ENTRE ARQUITETAÇÕES POLÍTICAS E ENGENHARIAS SIMBÓLICAS. ... 124

Michelle dos Santos

COMUNIDADE QUILOMBOLA BARRA DA AROEIRA: UMA ANÁLISE ATRAVÉS DA FUNDAÇÃO E FORMAÇÃO NA PERSPECTIVA DE UM MITO FUNDADOR ... 135

Thasley Westanyslau Alves Pereira

OS XUKURU DO ORORUBÁ ENTRE IDAS E VINDAS: ANALISANDO OS PERCURSOS PARA O TRABALHO SAZONAL NA REGIÃO CANAVIEIRA EM PERNAMBUCO E ALAGOAS. ... 149

Edmundo Monte

ARTIGO ESPECIAL:

O “EU-HERÓI” VERSUS O “OUTRO-HERÓI”: O GÊNERO DA MEMÓRIA E DA HISTÓRIA. ... 165

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H i s t o r i e n – R e v i s t a d e H i s t ó r i a [ 7 ] P e t r o l i n a , jun./nov 2 0 1 2 Página 6 ARTIGOS:

IDÉIAS EM MOVIMENTO; APONTAMENTOS DO PROCESSO DE CIVILIZAÇÃO E MODERNIDADE DA CIDADE DE PETROLINA ATRAVÉS DO JORNAL O PHAROL, 1915-1930. ... 192

Ana Clara Farias Brito Ygor Barros Leal

MEMÓRIA, TRABALHO E ARQUIVOS JUDICIAIS: UMA ANÁLISE SEMÂNTICA DAS EXPERIÊNCIAS TRABALHISTAS NA ZONA DA MATA DE PERNAMBUCO (1979-1980). ... 205

Cristhiane Laysa Andrade Teixeira

O IMAGINÁRIO CAVALHEIRESCO DO SÉCULO DE OURO: CORTÉS POR ELE MESMO E SUA LIGAÇÃO COM SANCHO PANÇA DE CERVANTES ... 215

Dyego Rodrigo de Assis Santos

A EDUCAÇÃO PRIMÁRIA NA PRIMEIRA REPÚBLICA: OS GRUPOS ESCOLARES DE SERGIPE DENTRO DO PROCESSO CIVILIZATÓRIO BRASILEIRO. ... 227

Márcia dos Santos Bomfim

ENSINO DE HISTÓRIA: IDEOLOGIA, METODOLOGIA E PRÁTICA DOCENTE. ... 238

Marcelo Henrique Chiaretto

A INTRÍNSECA INFLUÊNCIA DO TEMPO NA CIVILIZAÇÃO MAIA. ... 244

Elma Jesus Matos e Silva

PATRIMÔNIOS DE SENADOR POMPEU EM FOCO: UMA ANÁLISE DA EXPERIÊNCIA DE ESTÁGIO NA DISCIPLINA DE AÇÃO EDUCATIVA PATRIMONIAL, 2011. ... 251

Lucas Pereira de Oliveira

Maria Elcelane de Oliveira Linhares

NARRATIVAS DO ENSINO DE HISTÓRIA NO COLÉGIO PEDRO II: POSSIBILIDADES INTERPRETATIVAS A PARTIR DAS AVALIAÇÕES DE ESTUDOS SOCIAIS. ... 260

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H i s t o r i e n – R e v i s t a d e H i s t ó r i a [ 7 ] P e t r o l i n a , jun./nov 2 0 1 2 Página 7 PAU-DE-COLHER: A VIDA EM SOCIEDADE E SEUS PRINCIPAIS LÍDERES. ... 274

Marcos Danilo Vieira Ferreira

DISCUTINDO A DIVERSIDADE NA EDUCAÇÃO: A TEMÁTICA INDÍGENA NO CURRÍCULO E A LEI 11.645/2008. ... 283

Maria da Penha da Silva

ENTREVISTA:

EGIPTOLOGIA E FILOSOFIA AFRICANA: OS PARADIGMAS E AS PERSPECTIVAS DE ESTUDO NA FALA DO PROF. YOPOREKA SOMET. ... 301

Pablo Michel Magalhães Rafael Quintela Lins

RESENHA:

OS VIVOS E OS MORTOS NA AMÉRICA PORTUGUESA: DA ANTROPOFAGIA À ÁGUA DE BATISMO. ... 308

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Caros leitores,

Em função de suas dimensões populacionais e territoriais, assim como de sua experiência específica de colonização e de formação nacional, o Brasil é um país marcadamente caracterizado por sua grande diversidade e, apesar da importante influência da cultura de matriz europeia, fruto especialmente da presença portuguesa em nossa história, as expressões culturais tidas como dominantes não foram capazes de destruir as culturas indígenas e afro brasileiras.

Nesse sentido, entendemos que é incontestável o fato de que, por força de nossa formação histórico-social, somos uma nação pluriétnica e multirracial. Apesar disso, é impossível negar a existência de uma espécie singular de racismo no país, além da discriminação e das dificuldades que pesam sobre a existência dos povos indígenas em território nacional.

Por esses e outros motivos, uma série de políticas públicas e de ações afirmativas vêm sendo implantadas, em meio a debates e resistências de seguimentos sociais mais bem representados por uma história dita oficial. No campo da Educação, as leis 10.639 e 11.645, a primeira em 2003 e a segunda em 2008, representam importantes avanços de uma caminhada em direção a uma sociedade não discriminatória e mais equilibrada em termos de oportunidades. Em trecho da segunda lei, afirma-se que “Nos estabelecimentos de ensino fundamental e de ensino médio, públicos e privados, torna-se obrigatório o estudo da história e cultura afro-brasileira e indígena.” Com isso, esperamos que, na medida em que a presença indígena e afrodescendente passem a ser trabalhadas de modo mais eficiente nas escolas e universidades, o racismo seja combatido, as lutas dos povos indígenas sejam compreendidas e as oportunidades de desenvolvimento econômico e social sejam apresentadas de um modo mais justo.

Refletindo nessa direção, a Universidade Estadual de Pernambuco em Petrolina, através do curso de História, há quatro anos realiza encontros acadêmicos que oportunizam a pesquisadores de diferentes áreas, refletirem sobre essa importante temática que, atualmente, se encontra, com toda a razão, entre as mais discutidas em nossa pauta social. Nesse sétimo volume da Revista Historien, o leitor terá a oportunidade de conhecer, através do dossiê temático do referido periódico, trabalhos frutos de pesquisas que abordam o tema da história e cultura dos povos indígenas e

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afrodescendentes. Esperamos, dessa maneira, estar contribuindo, como universidade, para que esse assunto seja cada vez mais pesquisado e discutido na academia, uma vez que a produção de conhecimento realizada nesse espaço social é de fundamental importância para o amadurecimento das reflexões que precisam ser realizadas para além do âmbito universitário. Assim, desejamos a todos que se insiram nesse circuito e que realizem boas leituras!

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HISTÓRIA E CULTURA DOS POVOS INDÍGENAS E AFRODESCENDENTES

Historien Ano IV

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A RESISTÊNCIA INDÍGENA E CAMPONESA NO CONTEXTO DA

EXPANSÃO DO LATIFÚNDIO E DOS GRANDES

EMPREENDIMENTOS ECONÔMICOS EM RONDÔNIA

Marilsa Miranda de Souza1 Márcio Marinho Martins2

RESUMO:

O trabalho centra-se na análise dos processos de resistência indígena e camponesa no contexto de expansão do latifúndio a partir do estudo sobre as relações semifeudais e semicoloniais do capitalismo burocrático brasileiro. Conforme dados oficiais, a concentração de terras no Brasil aumentou e a maior parte das terras públicas está ocupada ilegalmente pelos latifundiários, que continuam protegidos pelo Estado. Além da expansão do latifúndio, grandes empreendimentos econômicos avançam ameaçando as populações indígenas e camponesas que ampliam o nível de organização e combatividade na luta pela terra como vem ocorrendo no Estado de Rondônia nas últimas décadas.

PALAVRAS-CHAVE: Capitalismo Burocrático. Questão Agrária. Resistência Indígena

INTRODUÇÃO

A cada dia aumenta a invasão de terras dos povos indígenas por madeireiros, empresas de mineração e extração de matéria-prima e em consequência os assassinatos de lideranças indígenas, repressão, torturas e criminalização de suas lutas. O latifúndio se expande expulsando os camponeses para as periferias da cidade enquanto aumenta a pistolagem e o assassinato de indígenas que se organizam na luta em defesa de suas terras. Para compreender esse fenômeno faz-se necessário analisar a questão agrária.

Conforme os dados oficiais do Censo Agropecuário do IBGE/2006, a maior parte das terras públicas está ocupada ilegalmente pelos latifundiários, que continuam protegidos pelo governo. O latifúndio vem se expandindo devido aos processos de mecanização e

1 Doutora pela Universidade Federal de Rondônia – UNIR. msmarilsa@hotmail.com 2 Mestre pela Universidade Federal de Rondônia – UNIR. mmmartins_ro@hotmail.com

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Historien Ano IV

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commodities, chamados pelos capitalistas de agronegócio que é um tipo de latifúndio que conserva as relações semifeudais e vínculos mais fortes com o imperialismo que o latifúndio tradicional.

A política de reforma agrária para a América Latina foi gestada dentro da esfera do imperialismo norte-americano como estratégia de abrandamento da segunda onda revolucionária, que avançava por esse continente nas décadas de 1960 e 1970. A América Latina transformou-se num amplo laboratório de reforma agrária. Como uma política imperialista, a reforma agrária tem se reforçado ao longo dos anos por meio da concessão de créditos para a feitura da reforma agrária, em virtude do perigo que ela representa à ordem dominante. As classes dominantes brasileiras sempre encontraram fórmulas para “acalmar” os conflitos agrários e procrastinar a reforma agrária. Por isso mesmo, no Brasil ela é uma reforma tutelada (de mercado), que seguiu o caminho das concessões com o intuito de impedir a solução revolucionária do problema da terra.

Numa luta tão acirrada quanto à luta camponesa, nos últimos anos tem se destacado a luta dos povos indígenas para o reconhecimento de seus territórios tradicionais que foram ocupados pela expansão da fronteira agrícola ou frente às ameaças contra seus territórios pelos grandes empreendimentos de infraestrutura, especialmente na Amazônia. A violência praticada contra os povos indígenas no Estado de Rondônia e no Brasil assume diversas formas e diversos autores que a praticam. Dentre estas destacamos a violência cultural e a violência contra a pessoa representada na escravização e extermínio de indígenas. Mas o problema fundamental das populações indígenas é o problema da terra, espaço vital para a autosustentação da população indígena e da reprodução de práticas tradicionais. Os dados recentes mostram o avanço das contradições existentes entre os povos indígenas e os projetos de expansão do capital e do latifúndio na Amazônia.

A QUESTÃO AGRÁRIA BRASILEIRA E A LUTA PELA TERRA

A concentração de terra no Brasil relaciona-se com a formação das classes sociais e do tipo de capitalismo aqui implantado, o capitalismo burocrático, que é o tipo de capitalismo engendrado pelo imperialismo nos países atrasados, ou seja, semifeudal e semicolonial, mediante o domínio do imperialismo sobre toda a sua estrutura econômica e social (MAO TSETUNG, 2008, p. 2 e GUZMÁN, 1974, p. 2).

A questão agrária aparece nos países de capitalismo burocrático (semicolonial e semifeudal) que não concluíram a revolução burguesa. Ainda que tenha se desenvolvido, o

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Historien Ano IV

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capitalismo no Brasil, por não ter feito a revolução democrático-burguesa, a exemplo de outros países capitalistas, hoje chamados de primeiro mundo, nunca democratizou a propriedade da terra. Acentuou-se ao longo dos anos o monopólio da terra e a manutenção de relações semifeudais que ainda encontramos no campo. Por isso, a questão agrária segue sendo de importância fundamental para a solução dos problemas sociais no Brasil, não apenas por ser a terra o meio de produção fundamental da agricultura, mas devido ao fato de estar ligada aos grandes problemas nacionais, como as questões regionais e energéticas, a questão urbana pelo crescente êxodo rural, a questão ecológica e indígena, mas principalmente porque os camponeses e os povos indígenas não desistiram e a cada dia fortalecem a luta pelo direito à terra.

Quando os portugueses aqui chegaram, se apossaram das terras dizimando os povos indígenas, para logo em seguida o rei de Portugal distribuí-las aos seus protegidos por meio das sesmarias. Para sustentar esses latifúndios e torná-los produtivos, funda-se a economia escravista que dura mais de 300 anos, explorando os negros trazidos da África. Com a abolição da escravatura, em 1888, à massa de indígenas sem terra é engrossada pelos ex-escravos, juntando-se ainda, mais adiante, os imigrantes europeus superexplorados na forma do colonato. Para não permitir que as terras devolutas fossem ocupadas pelos pobres (índios, negros e imigrantes), em 1850, com a Lei de Terras, o Estado instituiu que a posse da terra seria apenas por meio de sua compra.

O campesinato formado pelos indígenas, negros e imigrantes pobres ao longo da história do Brasil travou uma luta radical pela terra, uma luta sem trégua, muitas vezes armada, como foi em Canudos, Contestado, Porecatu, Trombas e Formoso etc. Mas, foi a partir da década de 1960 que os camponeses travaram uma luta política organizada, com reivindicações próprias, integrando-se às lutas mais gerais por meio dos sindicatos, da ULTAB - União dos Lavradores e Trabalhadores Agrícolas do Brasil e especialmente pelas Ligas Camponesas.3 Estas últimas, ao defenderem a reforma agrária radical “na lei ou na marra”, que garantisse “o livre e fácil acesso à terra para os que queiram trabalhar”, representaram não apenas as reivindicações da categoria, mas um projeto alternativo de agricultura e de sociedade. Refletiram uma nova concepção de trabalho, em contraposição ao latifúndio e seus mecanismos de superexploração da força de trabalho. A reforma agrária foi colocada no debate nacional e radicalizou a luta pela terra com a palavra de ordem “reforma agrária na lei ou na marra”, confrontando o poder político e o sistema latifundista. A luta pela

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As Ligas Camponesas nasceram na luta dos engenhos em Pernambuco, em 1954 e constituíram o movimento mais massivo e radical na luta pela terra, nas décadas de 1950 e 1960.

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reforma agrária assumiu, antes de tudo, um caráter político que mobilizava forças sociais no conjunto da sociedade brasileira que lhe rendeu a mais dura repressão a partir de 1964, com o golpe militar. Foi a partir desse período que a reforma agrária entra no debate e nas políticas governamentais, sob a orientação do imperialismo norte-americano. E por que esse interesse do imperialismo pela reforma agrária?

A opressão do sistema fundiário semicolonial e semifeudal, atado ao imperialismo, acabou despertando nos anos de 1950 em diante a mobilização dos camponeses em toda a América Latina, formando importantes movimentos revolucionários (LE COZ, 1976, apud MARTÍN MARTÍN, 2007, p. 26), pois “os fatos demonstram, a revolução há de ser em sua essência não apenas antiimperialista, mas também agrária” (ALVES, 1980, p. 66). Era preciso conter a luta pela terra e, consequentemente, os movimentos revolucionários. A fórmula encontrada pelo imperialismo foi o plano de reforma agrária.

A política de reforma agrária para América Latina foi gestada dentro da esfera do imperialismo norte-americano como uma estratégia de abrandamento da segunda onda da revolução proletária mundial que avançava pela América Latina. A América Latina transformou-se num amplo laboratório de reforma agrária, como explica Martín Martín (2007, p. 26):

[...] en el conjunto de América latina, unas reformas agrarias previas a toda acción de desarrollo. El Comité Interamericano para el Desarrollo de la Agricultura (CIDA) iba a ser, junto a la FAO, el órgano de enlace entre los diversos estados interesados. El concepto de reforma agraria integral se convertía em adelante en una de las bases de acción de desarrollo que iban a emprender diversos organismos interamericanos o internacionales.

Para Martín Martín (2007, p. 27), essa nova aliança com os países latino-americanos serviu para aplicar, entre outras políticas, a de reforma agrária, não para resolver o problema da terra, mas para reforçar a evolução da semifeudalidade no campo, como foi o caso do México, Peru, Brasil, entre outros. Essa política imperialista tem se reforçado ao longo dos anos por meio da concessão de créditos para a feitura da reforma agrária, pelo perigo que ela representa à ordem dominante. As classes dominantes brasileiras sempre encontraram fórmulas para “acalmar” os conflitos agrários e procrastinar a reforma agrária. Por isso mesmo, sempre guiada pelas políticas ditadas pelo imperialismo, ela seguiu o caminho das concessões, com o intuito de impedir a solução revolucionária do problema da terra. Dentre as políticas recentes de “reforma agrária” do governo brasileiro financiadas pelo Banco Mundial nos últimos anos estão a Cédula da Terra, o Banco da Terra e o Projeto de Crédito Fundiário e

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Combate à Pobreza Rural (programa de acesso à terra pela compra e venda, dá-se pela lógica do mercado).

Muitos movimentos de camponeses sem terras surgiram no País a partir da década de 1980, a exemplo do MST (Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra), e lutam pela reforma agrária dentro dos marcos do capitalismo burocrático, aceitam e defendem esse modelo de reforma agrária tutelada e toda a política dela decorrente. Contrapondo-se a esse modelo historicamente fracassado de reforma agrária, desenvolve-se a revolução agrária no Brasil, por meio da ação radical da Liga dos Camponeses Pobres, originada em Rondônia logo após o conhecido “Combate de Corumbiara”, chamado pelos camponeses de “Combate de Santa Elina”, em 1995, e que hoje está presente em vários Estados. Ao contrário da luta desenvolvida pelos movimentos reformistas, a revolução agrária está condicionada à participação e organização das massas camponesas e operárias na transformação revolucionária no sistema político e econômico, o que representa um avanço na luta de classes no campo nos últimos anos.

A ESTRUTURA FUNDIÁRIA E A EXPANSÃO DO LATIFÚNDIO NA ATUALIDADE

A concentração de terras no Brasil aumentou, conforme dados do último Censo Agropecuário do IBGE/2006, divulgado apenas em 2009, publicando erros e retificando-os, enquanto se tentava camuflar a realidade. O Relatório deste censo apresentou os seguintes dados: área territorial total do País: 851,4 milhões de hectares; área total ocupada pelos estabelecimentos: 330 milhões de hectares; área total das terras indígenas: 126 milhões de hectares; área total das unidades de conservação ambiental: 72,3 milhões de hectares; área com corpos d‟água: 12 milhões de hectares e área urbanizada: 2,1 milhões de hectares.

Oliveira (2010, p. 2) questiona esses dados, apontando que “a conta não fechou, ou seja, ficaram sobrando 309 milhões de hectares”, concluindo que:

A solução adotada pelos técnicos do IBGE foi denominar esses 36% da superfície do país de „área com outras ocupações‟. No entanto, se eles incluíram todas as possibilidades de ocupação de fato, ficou faltando as „terras públicas devolutas‟. É isto mesmo: mais de um terço da área do país está cercada, mas não pertence a quem cercou. Os „proprietários‟ não têm os documentos legais de propriedade destas terras. Por isso, essas terras são omitidas nos levantamentos estatísticos tanto do IBGE como do INCRA.

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Segundo Oliveira (2010), os técnicos do IBGE esconderam ao máximo os dados da estrutura fundiária, particularmente as variáveis por estratos de área total. “Ampliaram o que é positivo, a estratificação dos minifúndios, mas zelosamente agregaram os dados dos grandes estabelecimentos, escondendo os latifúndios”. O censo mostrou o que todos sabemos: as terras públicas estão quase todas ocupadas ilegalmente pelos latifundiários, que continuam protegidos pelo governo.

Sempre dominou no campo brasileiro o princípio da ilegalidade da ocupação das terras públicas pelos latifundiários. São esses 309 milhões de hectares de terras públicas devolutas ou não que somados aos 120 milhões de hectares de terras improdutivas dos grandes imóveis indicadas no primeiro documento do 2º Plano Nacional de Reforma Agrária (2003) que os sem terras não se cansam de denunciar. É por isso que os latifundiários travam combate sem trégua com os sem terras. E a maior parte da mídia acompanha e faz eco, mas os dados demonstram que a história está do outro lado, do lado dos sem terras (OLIVEIRA, 2010, p. 3).

A concentração de terras permanece inalterada nos últimos 20 anos. Os censos agropecuários de 1985, 1995 e 2006 mostraram que os estabelecimentos com mais de 1000 hectares ocupavam 43% da área total de estabelecimentos agropecuários no País, enquanto aqueles com menos de 10 hectares ocupavam apenas 2,7% da área total; 47% tinham menos de 10 hectares, enquanto aqueles com mais de 1000 hectares representavam em torno de 1% do total de proprietários, nos censos analisados. O índice de Gini - indicador da desigualdade no campo - registra 0,854 pontos, patamar próximo aos dados verificados nas duas pesquisas anteriores: 0,856 (1995-1996) e 0,857 (1985). O IBGE, após alguns “erros”, informou, finalmente, que o índice de Gini atingia 0,872 pontos, o que representava um crescimento de 1,9% na média nacional.

Conforme os dados do INCRA (2005-2006), apenas 30% das grandes propriedades são consideradas produtivas, o que indica que 70% poderiam ser desapropriadas para fins de reforma agrária por não cumprirem a função social (artigos 184, 185 e 186 da Constituição Brasileira). Se a lei fosse cumprida, estariam à disposição da reforma agrária 120.436.202 hectares de grandes propriedades de terra existentes no País, além das terras públicas (devolutas), grande parte também “griladas” nas mãos de latifundiários acobertados pelo Estado, conforme os dados do próprio Censo Agropecuário do IBGE/2006, citado acima. Essa estrutura fundiária extremamente concentrada visa atender aos interesses de poderosos grupos econômicos, conforme Camely (2009, p. 204):

Os grandes latifúndios no Brasil estão concentrados nas mãos de poderosos grupos econômicos, porque no país a terra funciona ora como reserva de valor e ora como reserva patrimonial. Em sua essência, a política agrária desenvolvida pelo estado

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brasileiro tem como conseqüência a capitalização dos latifundiários, a disponibilidade de força de trabalho farta e barata ao latifúndio através de projetos de assentamentos, ata o camponês ao latifúndio através da dívida e da ruína, levando ao despovoamento de áreas rurais que é agravado pela repressão sistemática do Estado e dos grupos armados dos latifundiários.

Nos últimos 30 anos o capital opera no campo por meio da modernização da agricultura fundada na grande propriedade e na monocultura voltada para a exportação, aumentando a concentração de terra e consequentemente a expulsão dos camponeses rumo às periferias da cidade.

Os dados do Censo Agropecuário do IBGE/2006 afirmam que a agropecuária extensiva em muito se sobrepõe à agricultura temporária, mas o crescimento da cultura de soja tem apresentado um altíssimo crescimento. Houve um aumento de 88,8% na produção de soja, alcançando 40,7 milhões de toneladas em 15,6 milhões de hectares, um aumento de 69,3% na área colhida. Em termos absolutos, representa um aumento de 6,4 milhões de hectares, caracterizando a soja como a cultura que mais se expandiu na última década e avança pela Região Norte rapidamente, especialmente Rondônia e Pará. Desta produção é importante destacar, conforme o referido Censo, que 46,4% dos estabelecimentos utilizaram sementes geneticamente modificadas, que foram cultivadas em cerca de 4,0 milhões de hectares.

O latifúndio vem se expandindo devido aos processos de mecanização e commodities, chamados pelos capitalistas de agronegócio4. É a nova roupagem da agricultura capitalista, para que seja vista como moderna e produtiva. É, antes de tudo, uma construção ideológica que tenta transformar a imagem do latifúndio atrasado e semifeudal para o latifúndio produtor de riqueza. Esse tipo de latifúndio significa mais concentração de terra e, consequentemente, sua expansão pelas fronteiras agrícolas, tornando ainda mais aguda as contradições e injustiças sociais. Na Amazônia Ocidental, especialmente em Rondônia o avanço do latifúndio tem sido meta do imperialismo no controle do território, tanto para a produção de grãos como para extração de recursos naturais.

A AÇÃO DO IMPERIALISMO E AS PERMISSÕES DO ESTADO AMAZÔNIA OCIDENTAL

4 Agronegócio é uma palavra nova, mas tem origem no sistema de plantation norte-americano e se refere ao modelo de desenvolvimento agropecuário capitalista.

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HISTÓRIA E CULTURA DOS POVOS INDÍGENAS E AFRODESCENDENTES

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A Amazônia é uma região estratégica para os interesses econômicos do imperialismo. As ações do imperialismo na Amazônia Ocidental são descritas mesmo antes da criação do Território Federal do Guaporé (atual Estado de Rondônia). Vários fatos do período situado do final do Império até a República oligárquica apontam que a região é alvo de interesse internacional. Algumas das suas personagens mais evidentes são: a) Na navegação dos principais rios da região: Earl Church (1868); b) na Revolução acreana: o Bolivian Syndicate (1901); c) na construção da E.F.M.M.: o truste de Percival Farquhar (1907-1912). Todos visavam o controle imperialista (exploração, transporte e comércio) da principal matéria-prima da indústria naquele período: a borracha. O produto só vai perder o interesse quando os ingleses, após roubarem mudas de seringueiras, iniciaram a produção na Malásia e passaram a controlar o mercado internacional. Também a expedição Roosevelt-Rondon (1913-1914) buscou fazer o levantamento de reservas minerais e da biodiversidade, supostamente com o intuito de obter exemplares da fauna sul-americana para o American Museum of Natural History of New York.

A criação do Território Federal do Guaporé (1943) por Getúlio Vargas coincide com o interesse imperialista na exploração da borracha amazônica, episódio conhecido como 2º ciclo da borracha, já que a produção asiática estava sob controle do Eixo na 2ª Guerra Mundial. Em 1952 inicia-se a exploração da cassiterita, extraída de forma manual por garimpeiros que em 1960 atingiu 60 toneladas. Em 1972, em plena ditadura militar, o governo brasileiro optou por entregar a maior reserva de cassiterita já encontrada para a rapinagem dos monopólios, expulsando todos os garimpeiros. O Estado brasileiro mais uma vez garantiu a exploração do minério por grandes grupos econômicos ligados ao comércio mundial do estanho: Brumadinho, Patiño, Brascan, BEST e Paranapanema, gerando conflitos dos garimpeiros com o Estado e a falência das atividades comerciais em Ariquemes e Porto Velho. “O capital monopolista industrial estrangeiro assume totalmente o controle do processo produtivo da indústria extrativa de cassiterita de Rondônia” (PEREIRA, 2007, p. 111).

A partir do regime militar, o imperialismo impôs ainda mais sua política de controle da Amazônia, por meio de programas e obras públicas executadas com financiamento do próprio interessado, como a construção da rodovia Transamazônica, influenciando na estrutura fundiária e na definição de reservas ambientais e indígenas.

A população de Rondônia teve um aumento espantoso devido à implantação de projetos de colonização pelos governos militares a partir de 1970, que ocorreu, entre outras causas, pela necessidade de expansão econômica e controle do território amazônico pelo imperialismo e devido ao crescente problema social gerado pela existência de grandes

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latifúndios, em oposição à existência de camponeses pobres sem terras ou com pouca terra em todas as regiões do País. A colonização dirigida intensificou-se a partir de 1970, com o Programa de Integração Nacional - PIN (Decreto Lei 1.106, de 16/06/70), que pretendia assentar camponeses em lotes de 100 hectares numa faixa de terra de dez quilômetros de cada lado das rodovias em construção, a Transamazônica e a Cuiabá-Santarém. Esse projeto foi o início da campanha ufanista do regime militar, que dizia ser necessário “integrar a Amazônia para não entregá-la aos estrangeiros”. A intenção era, na verdade, regularizar e facilitar a aquisição de terras pelos estrangeiros e grupos agropecuários, além de permitir a entrega dos recursos naturais da região aos grupos multinacionais (OLIVEIRA, 1988, p. 70).

Os projetos de colonização privilegiaram especialmente os grandes proprietários, enquanto a propaganda enganosa do governo arrastava as multidões excluídas das outras regiões do País para o que ela denominava de “Eldorado brasileiro”. Dessa forma, muitas das famílias que vieram em busca de terra, não a conseguindo, tomaram as terras indígenas, se transformaram em meeiras, arrendatárias em pequenas e grandes propriedades, ou foram para as periferias das cidades. Essa “contrarreforma agrária” foi financiada pelo Banco Mundial, por meio da criação de programas que visavam a ocupação e o ordenamento econômico da região, como o Programa de distribuição de Terras e Estímulo à Agroindústria no Norte e Nordeste (PROTERRA), a Superintendência de Desenvolvimento da Amazônia (SUDAM), o Programa de Polos Agropecuários e Agrominerais da Amazônia (POLAMAZONIA), o Programa de Desenvolvimento dos Cerrados (POLOCENTRO), o Programa Integrado de Desenvolvimento do Noroeste (POLONOROESTE), o Plano Agropecuário e Florestal de Rondônia (PLANAFLORO) e o atual Zoneamento Socioeconômico Ecológico.

A partir de 1992, o imperialismo formulou o discurso de “Desenvolvimento Sustentável”, que foi utilizado para justificar novos projetos de financiamento de organismos internacionais na Amazônia, dentre estes as organizações não governamentais (ONGs), que interferem no planejamento regional a serviço do capital monopolista, possuem informações precisas sobre o território, por meio de fotos de satélites, são responsáveis pela biopirataria e estão presentes em áreas indígenas, áreas de mineração, de exploração agrícola e pecuária, manejo florestal, exploração de petróleo, no extrativismo, no ecoturismo, enfim, espalham seus tentáculos por todas as atividades, respaldadas por bancos e agências do capital financeiro internacional. A hegemonia do imperialismo norte-americano na Amazônia pode ser observada em diversos setores da economia da região. Nos últimos anos o imperialismo age na Amazônia sob o viés do discurso do “desenvolvimento sustentável” de um lado, envolvendo ONGs e Governo e, por outro, através dos grandes projetos de infraestrutura

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ditados diretamente pelo Governo Federal. Não é de se estranhar, por exemplo, que ONGs como a “Kanindé – Associação de Defesa Etno-Ambiental” desenvolva parceria com nada mais nada menos do que a USAID – United States Agency International Development. Apenas a título de exemplificação, a referida ONG realizou pesquisa em 2006 que resultou na publicação de um “Relatório Etnoambiental participativo e plano de gestão” na Terra Indígena Igarapé Lourdes, localizada no município de Ji-Paraná-RO. Na área vivem os povos Arara (Karo) e Gavião (Ikolen). Segundo o referido relatório, o objetivo da pesquisa é o de construir uma “proposição responsável de planos para gestão socioambiental”. O relatório ainda afirma a “parceira” com as agências imperialistas que financiaram a pesquisa e a anuência da FUNAI (DIAGNÓSTICO ETNOAMBIENTAL PARTICIPATIVO E PLANO DE GESTÃO, 2006, p. 6 e 7). Para os indígenas, conforme investigação feita por nós, o discurso empregado era de que o estudo visava ver os potenciais de recursos naturais que poderiam ser extraídos da floresta para fortalecer a economia da comunidade ao mesmo tempo em que se mantém sua cultura. Contudo, com um estudo do relatório percebemos que não só foi feito todo um inventário do meio biológico, mas também do meio físico, este último, descrito minuciosamente em 107 páginas, que incluem a pesquisa de solo e subsolo, onde se localizou a existência de nióbio, cassiterita, manganês e ouro.

A Kanindé age sob os ditames do imperialismo, realizando levantamento dos diversos recursos naturais das terras indígenas e cooptando lideranças de diversos povos para legitimar suas ações. Atualmente a referida ONG desenvolve um projeto denominado “Consórcio Garah Itxa”, que prevê entre outras ações a realização de um “Diagnóstico etnoambiental participativo com mapeamento cultural”, a exemplo do que foi feito na Terra Indígena Igarapé Lourdes. A área de atuação desse projeto, conforme sítio da mesma ONG, é o “corredor etnoambiental Mondé-Kwahiba”, que situa-se a leste de Rondônia, noroeste de Mato Grosso e sul do Amazonas, onde situam-se 13 terras indígenas e 33 unidades de conservação.

Sob o discurso do “Desenvolvimento Sustentável” o Governo Federal, também criou um programa de Licitações de Florestas Públicas que já está funcionando há três anos em Rondônia. Na Floresta Nacional do Jamari, só em 2012 a previsão de exploração é de 12.583,039 m³ de toras de madeira e 9.276,214 m³ de resíduos. A concessão total de Florestas Públicas, realizada pelo Ministério do Meio Ambiente (MMA) é de 144,8 mil hectares de floresta que prevê, além da extração de madeira extração de folhas, raízes, cascas, frutos, sementes, óleos, látex, resinas. Destrói-se a floresta, atendem-se os interesses do capital, criam-se mecanismos de uma “compensação” na maioria das vezes não cumpridas,

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utilizando-se o discurso de “agregar valor” à floresta para preservá-la. Eis a essência do discurso do desenvolvimento sustentável.

Contudo, o que mais afeta diretamente o cotidiano de povos indígenas, quilombolas e camponeses são os grandes projetos para a Amazônia, como a Iniciativa pela Integração e Infraestrutura Regional Sul-Americana (IIRSA) que corresponde a um conjunto de projetos propostos aos governos sul-americanos e agências do imperialismo visa a construção de grandes obras que incluem estradas, hidrovias, portos, barragens e outros empreendimentos (SOUZA, 2010, p. 129). Na Amazônia, estes empreendimentos foram implantados pelo governo brasileiro através do Plano de Aceleração do Crescimento (PAC) e incluem entre outras obras, as hidrelétricas de Santo Antônio e Jirau, no rio Madeira em Porto Velho-RO e a barragem de Belo Monte, no rio Xingu em Marabá-PA. Os porta vozes do “desenvolvimento sustentável” não titubearam em assumir a defesa desses empreendimentos que afeta diretamente milhares de pessoas, afinal os grandes beneficiários são grandes grupos estrangeiros.

Os povos indígenas da Amazônia se organizam em importantes processos de resistência frente aos grandes empreendimentos para a Amazônia. Inúmeras manifestações indígenas em Rondônia neste ano de 2012 denunciam a Portaria 303 da Advocacia Geral da União (AGU) que proíbe a ampliação de Terras Indígenas e permite a implantação de obras nessas áreas sem a consulta prévia às populações afetadas. Tal medida visa atender diretamente o conjunto de obras, como a barragem de Belo Monte e outros empreendimentos futuros.

A AÇÃO DO IMPERIALISMO E A VIOLÊNCIA CONTRA OS POVOS INDÍGENAS

Em Rondônia, há uma estimativa populacional de cerca de 12 mil indígenas (dados do IBGE 2010), distribuídos em 54 povos etnicamente identificados, sendo que mais de 9 mil vivem em terras indígenas. Do total desta população, 15 povos foram expulsos de terras tradicionais e vivem confinados em terras de outros povos, como, por exemplo, na aldeia Ricardo Franco, município de Guajará-Mirim, onde vivem 13 povos ou na Terra Indígena Rio Branco, município de Alta Floresta D‟Oeste, onde vivem 09 povos diferentes; com línguas, tradições, costumes e crenças diversas.

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Mesmo com todo o processo de violência cultural a que foram sucessivamente submetidos os indígenas desde o início da colonização do Brasil5, entendemos que há um problema ainda maior que é o problema da terra. Para o marxista peruano Mariátegui, “o problema do índio é o problema da terra” (MARIÁTEGUI, 2008). Além de espaço vital para a auto sustentação da população indígena, a terra apresenta-se como espaço de reprodução da cultura, das práticas tradicionais, religiosas e sociais. A luta pela terra coloca as populações indígenas em um choque constante, sobretudo, contra o Estado brasileiro que nos últimos anos incentivou a criação de grandes projetos de infraestrutura na Amazônia afetando diretamente suas terras. No que se refere à expansão do latifúndio, observa-se uma pressão dos produtores de soja, eucalipto e cana de açúcar no Cone Sul e Centro Oeste do Estado de Rondônia, que atinge diretamente os povos Nambikwara, Aikanã, Canóe, Kwaza e outros, a invasão de territórios indígenas e ação política que impedem a demarcação de terras indígenas por meio de Lobbies junto ao Governo Federal. A omissão do Estado brasileiro pode levar a extinção de dezenas de povos sem contato, da mesma forma violenta como ocorreu em anos anteriores, nos diversos ciclos econômicos da região Amazônica.

Exemplo oportuno a ser destacado ocorre com a construção de barragens, seja em megaprojetos como Jirau e Santo Antônio no Rio Madeira que afetarão diretamente as terras Indígenas Karitiana e Karipuna ou pequenas Centrais Hidrelétricas (PCHs) como as do Rio Branco em Alta Floresta d‟Oeste que criam impactos devastadores para as economias dos 09 povos da Terra Indígena Rio Branco, além dos povos isolados e da população ribeirinha do entorno.

A situação dos povos indígenas isolados é a mesma do início da colonização de Rondônia, como a que ocorreu em Corumbiara em 1995 quando a FUNAI localizou sobreviventes de massacres praticados na década de 1980, os povos Kanoê e Akuntsu e o chamado “Índio do Buraco”, filmados no Documentário “Corumbiara” de Vincent Carelli (2009) que denunciou a ação de latifundiários na região em atacar povos indígenas e ocultar provas de sua existência. Dados do CIMI (Conselho Indigenista Missionário) apontam que existem 15 grupos de indígenas isolados no estado de Rondônia. Em total, o levantamento confirma a existência de 90 grupos de indígenas isolados na Amazônia em situação de risco e a maioria sem território demarcado e protegido. A maioria destes vive

5

Há estimativas indicando que a população indígena do continente chegava, à época da conquista, a mais de cinquenta e três milhões de pessoas, sendo que só a bacia Amazônica teria mais de cinco milhões e seiscentos mil habitantes (NEVES, 1995, p. 170) e na região de Rondônia, no Século XVIII, estimava-se que havia uma população de mais de 80.000 mil indígenas de diferentes etnias (PANEWA, 2003, p. 5).

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perambulando por áreas ainda preservadas e em constante fuga quando o não índio tenta uma aproximação, conforme quadro elaborado por nós:

POVO ISOLADO LOCALIZAÇÃO MUNICÍPIOS

“Yviraparaquara” T. I. Uru-Eu-Wau-Wau São Francisco do Guaporé Isolados do Parque Estadual Guajará-Mirim Parque Estadual Guajará Mirim Guajará-Mirim Isolados do Rio Mutum – Uevae Próximo da T.I. Karipuna Nova Mamoré e Porto Velho Isolados do Rio Formoso e do Jaci – Paraná T. I. Pacaás Novos Nova Mamoré e Porto Velho Isolado do Igarapé Karipuninha Igarapé Karipuninha Porto Velho/RO e Lábrea/AM Isolado do Rio Candeias e Rio Branco Terra Indígena Karitiana Porto Velho

Povo Isolado da Serra da Cutia Serra da Cutia Guajará-Mirim

Isolado do Rio Novo e Cachoeira do rio Pacas Novas Rio Novo/Pacas Novas Guajará-Mirim

Isolados do Rio Omere e rio Tanaru T. I. Omerê Corumbiara

Isolado Jururei Reserva Florestal Urupá Alvorada d’Oeste e Urupá

Povo Isolado do rio Jacundá Floresta Nacional do Jamari Itapuã do Oeste, Cujubim e Candeias do Jamari

Povo Isolado da Rebio Jarú REBIO JARÚ Ji-Paraná-RO

Povo Isolado da Cabeceira do Rio Marmelo e Maicy Rio Marmelo e Maicy Humaitá/AM – Divisa com Porto Velho/RO Povo Isolado do Parque Estadual Corumbiara Parque Estadual Corumbiara Pimenteiras

Povo isolado da Terra Indígena Massaco Terra Indígena Massaco Costa Marques e Alta Floresta D’Oeste (Base de dados – Relatórios do Conselho Indigenista Missionário – CIMI, notícias de jornais da região, Relatórios da FUNAI – 2011-2012).

Diversos empreendimentos no pacote governamental do Plano de Aceleração do Crescimento (PAC) afetam e contaminam o meio ambiente, comprometem as fontes de alimentação, desrespeitam lugares sagrados, interferem no mundo mítico e religioso e desorganizam a economia das comunidades indígenas, enquanto apresentam medidas “compensatórias” para comunidades ribeirinhas e povos indígenas.

O Estado brasileiro cala-se diante da violência praticada por grupos de extermínio a serviço de latifundiários grileiros de terras públicas, madeireiros e fazendeiros, denunciados cotidianamente pelas organizações indígenas e sociais. De acordo com o relatório de violência contra os povos indígenas no Brasil, divulgado anualmente pelo Conselho Indigenista Missionário (CIMI), a partir de 2002, período da gerência petista, aumentou a violência contra povos indígenas e se estagnou as ações de Demarcação e Homologação de Terras Indígenas ao longo dos últimos 10 anos. Vejamos o quadro do CIMI (2011, p. 10) a seguir.

DEMARCAÇÃO DE TERRA INDÍGENA: COMPARAÇÃO DE GOVERNOS

Governos Número de Terras Homologadas Nº de Hectares

Fernando Collor de Mello / Itamar

Franco (Período: 1990-1994) 130 31.913.228

Fernando Henrique Cardoso

(Período: 1994-2002) 145 36.061.504

Luiz Inácio Lula da Silva

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A política indigenista da gerência Lula, seguida pela Gerência Dilma, produziu e produz efeitos catastróficos para as populações indígenas, “na medida em que as terras não foram demarcadas”. Fazendeiros, madeireiros e grandes monopólios transnacionais “passaram a se articular mais intensamente em diferentes flancos dos poderes públicos e, ao mesmo tempo, estabeleceram uma insistente perseguição às lideranças que lutam pela defesa dos direitos indígenas” além de incitarem a uma campanha de criminalizar as lutas e que, avalizados por um Estado inerte, “possibilitou, ao longo dos anos, assassinatos, espancamentos, ameaças de morte, invasão e depredação das terras” indígenas. Somente em 2006 e 2007 foram registradas denúncias de 30 casos de violência contra os povos indígenas no Estado de Rondônia, envolvendo conflitos territoriais, falta de assistência à saúde, discriminação e maus tratos feitos pela sociedade envolvente, racismos e, em diversos casos, envolvendo agentes públicos. Só em número de assassinatos, durante o período entre 2003 e 2010 foram assassinados 452 indígenas em todo o Brasil (CIMI, 2011, p. 09 e 10).

A existência de 55 povos já contatados e as referências de 15 povos em situação de isolamento e risco de extinção, fazem de Rondônia, um Estado rico em diversidade cultural e linguística, entretanto, mais da metade das terras destes povos (já identificadas) ainda não foram demarcadas. O Estado de Rondônia conta oficialmente com apenas 21 Terras Indígenas, ocupando 12% de sua superfície. Destas, 20 estão regularizadas e 01 interditada (T.I. do Rio Tanaru – índio do buraco). Falta ainda identificar as terras dos 06 povos indígenas resistentes e de povos indígenas livres ou sem contato.

Os povos Kaxarari, Karitiana, Sabanê, Oro Eo, Oro Mon, Oro At, Oro Nao, Gavião, Kwazá - RO; Tenharim, Mura, Apurina – AM, Mamaendê, Nambikwara, Zoró – MT, estão questionando a FUNAI com relação aos limites de suas terras, pois muitos lugares considerados por eles sagrados (cemitérios, pomares, cachoeiras, antigas malocas, roçados, etc.), ficaram fora da demarcação oficial. Os povos Miguelem, Puruborá, Kampé, Cassupá/ Salomãi, Cujubim e Wayoro exigem do órgão oficial que designe o Grupo Técnico de Trabalho para fazer o estudo de suas terras tradicionais, para que seja garantido o reconhecimento e identificação com documentação e registro.

Já são 13 povos indígenas em luta no Estado de Rondônia pela retomada de seus territórios, acompanhando a ação de resistência de outros povos de outras regiões do Brasil. Ainda são lutas pontuais e isoladas, com pautas imediatas e limitando-se à circunscrição do seu território original, mas com possibilidade de avanço rumo a uma luta mais ampla pela autodeterminação dos povos indígenas e pela destruição do velho Estado burguês-latifundiário.

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Atualmente os povos indígenas travam uma intensa luta pela revogação da Portaria 303 da AGU, que se soma a outras mobilizações como o repúdio à PEC 215/2000, a denúncia do engavetamento do Novo Estatuto do Índio e a morosidade na reestruturação física e financeira da FUNAI e de outros órgãos que deveriam prestar assistência aos indígenas. A PEC/2000, já aprovada no Congresso Nacional, prevê a alteração do dispositivo constitucional que dá ao Poder Executivo o poder para demarcar e homologar terras indígenas, quilombolas e áreas de conservação ambiental, que passaria, pela proposta, a ser competência do Legislativo Federal que é controlado pelos latifundiários.

CONCLUSÃO

O debate tratado aqui apenas evidenciou o que cotidianamente observamos: a atualidade do problema agrário que, pelo processo de manutenção de uma estrutura semifeudal, não resolveu as contradições existentes no campo. O Estado brasileiro, estruturado num capitalismo burocrático, umbilicalmente ligado aos interesses do imperialismo, não é capaz de resolver o problema agrário. O problema da terra se intensifica com o processo de expansão de fronteiras agrícolas e grandes projetos de infraestrutura na Amazônia, Rondônia e outros estados da Amazônia Ocidental são as áreas onde ocorrem os maiores conflitos, marcadas por altos índices de violência no campo e na floresta. Entretanto, mesmo com a voracidade do latifúndio, protegido pelo aparato estatal a seu serviço, os camponeses e indígenas radicalizam a luta pela terra e se organizam em retomadas ou na preservação de territórios conquistados.

Como observado, a luta das populações amazônicas atingem novo patamar nos últimos anos frente ao processo desenfreado de ação estatal sob os ditames do imperialismo. O Estado brasileiro, através de diversos organismos objetiva frear os movimentos sociais através de cooptação. Da mesma forma, as ONGs agem como reprodutoras de um discurso que seduz e que mascara seu papel enquanto agentes dos interesses transnacionais. Do outro lado encontram-se os camponeses, indígenas e populações ribeirinhas que têm dois caminhos a seguir: da conciliação e sujeição aos ditames do capital ou colocar-se em luta organizada para garantir sua sobrevivência. O Movimento Camponês em Rondônia tem demostrando significativo avanço ao fortalecer uma organização combativa que defende uma Revolução Agrária, rompendo com a espera da reforma agrária que nunca vem. Para os indígenas, anestesiados pela ação de ONGs e do Estado, o caminho é tortuoso e inseguro sendo

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necessário seguir o exemplo de outras regiões onde a luta do Movimento Indígena tem sido cada vez mais combativa e organizada.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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MARIÁTEGUI, J. C. Sete ensaios de interpretação da realidade peruana. São Paulo: Expressão Popular, 2008.

MARTÍN MARTÍN, V. O. El papel del campesinato en la transformación del mundo actual. Valencia: Baladre, 2007.

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PANEWA Especial. Conselho Indigenista Missionário – Regional Rondônia: Porto Velho, 2003.

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O ENSINO DA HISTÓRIA INDÍGENA: uma análise sobre os livros

didáticos de história em Alagoas e em Pernambuco

Denise Batista Lira1 Gilberto Geraldo Ferreira2

RESUMO:

Após as décadas de 1980 e 1990 ocorreram significativas produções que versam sobre os povos indígenas no Brasil e no Nordeste. É possível observar que essa historiografia sobre os povos indígenas no Nordeste, mais especificamente em Alagoas e em Pernambuco não tem sido respaldada pelos manuais de história na educação básica na mesma proporção. Este texto postula na análise de materiais de apoio didático em História de Alagoas e de Pernambuco possibilitando identificar como a educação básica está implementando a Lei 11.645/2008 que trata da obrigatoriedade da História e Cultura Afro-Brasileira e Indígenas nos estabelecimentos de ensino público e privado, objetivando identificar as possíveis mudanças na representação textual e imagética dos povos indígenas nesses dois estados respectivamente.

Palavras-chaves: História de Alagoas e Pernambuco, Lei 11.645/2008, História e Culturas

Indígenas.

Introdução

A discussão proposta neste texto será no sentido de por em debate o ensino da história indígena como possibilidades para abordagens que adotem como referência os princípios históricos3 e historiográficos4 desses povos. Tomará dimensões para além da perspectiva progressista ocidental, na medida em que questionará a hierarquização dos povos mundiais tendo como modelo a história ocidental grecoromana, europeia e estadunidense.

Não mencionaremos como base de análises as histórias de outros povos como africanos, indianos, chineses e outros mais, tendo em vista que, é visível, e, de certo modo,

1

Mestranda em História UFPE e Professora da Rede Municipal em Jaboatão dos Guararapes.

2

Doutorando em História UFPE, Professor no Curso de História do CESMAC (Maceió/AL), Técnico Pedagógico da Gerência de Diversidades – SEE/AL.

3

Nosso entendimento de história indígena deve está aproximado ao que esses povos pensam sobre as ideias gerais de história e sobre si mesmo, porém, há algumas limitações, por exemplo, quando se trata de contemplar todos os povos indígenas em Alagoas e Pernambuco.

4

Simplificadamente poderíamos entender como historiografia indígena as produções da sociologia, da arqueologia, da geografia, da história e principalmente da antropologia que tem produzido sobre os mais variados temas da vida indígenas nesses espaços.

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seria ingenuidade negar o imperialismo ocidental. Discutiremos o ensino e a história indígena tecendo algumas críticas ao ocidentalismo5, objetivando desmistificar a ideia de civilidade e incivilidade entre essas populações, impressos no ensino e nos livros didáticos de história em Alagoas e em Pernambuco.

Jack Goody, antropólogo britânico que tem produzido obras tecendo análise sobre a ideia ocidentalista, a exemplo de O Roubo da História6 na qual discute que a Europa teria se apropriado de conhecimentos de outros povos como africanos e chineses e toma como se fosse uma criação dos europeus. Não discutiremos aqui esta questão, mas aceitamos emprestada esta perspectiva para pensar que esse mesmo movimento nos ajuda a refletir o que ocorre no Brasil com os povos indígenas.

As pesquisas sobre os povos indígenas devem fomentar a busca por alternativas que possibilitem a reescrita da história indígena para além da visão ocidental.

A postura de projetar ou ocidentalizar uma visão sobre os indígenas e/ou apresentá-la como única alternativa para seus projetos de futuro é um equívoco, nenhuma história é dualista, que segue um movimento ou outro, que perde ou ganha, nesse caso, equivaleria a civilizar-se ou manter-se preso num dado espaço e tempo. O tempo do indígena seria substituído por outro cronológico. E qual seria o tempo do indígena para os “civilizados”? Certamente, permanecem em grande medida, no período colonial caracterizado pela selvageria e incivilidade: canibais, antropófago, incapazes. O ato da civilização se transformaria numa espécie de salvação ou de humanização, um ato de bondade. Essa historiografia se traduz em livros didáticos para o ensino de história.

O ensino de história na educação básica se configura, a nosso ver, em três dimensões: a primeira tenta traduzir de maneira didática os conhecimentos produzidos pela academia; em segundo, a formação do/a professor/a implicaria em conhecê-los criticamente redimensionando para a realidade do grupo ao qual se destina; terceiro, os conhecimentos que a sociedade “elege” para o ensino em história implica em relações de forças que se representarão na elaboração curricular conduzida por uma forte carga ideológica tensionada por regiões do Sul e Sudeste do Brasil.

Poderíamos apontar um quarto ponto para pensarmos essa questão. Este poderia ser identificado a partir das ações que são coordenadas por uma dinâmica interativa entre os três pontos apresentados anteriormente: produção da academia, formação do/a professor/a e os anseios da sociedade. Os educandos estariam motivados por este último ponto. Nessa

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Edward Said. Orientalismo: o oriente como invenção do ocidente. São Paulo, Companhia das Letras, 1990.

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perspectiva estaríamos tratando de um tipo de conhecimento específico, redimensionado no interior escolar, construído nas tensões do cotidiano dos/as envolvidos no processo.

O livro didático propõe atender as questões expostas acima. Este se configura como apoio básico, em alguns casos, único, para a construção do conhecimento histórico sobre os povos indígenas em Alagoas e Pernambuco. Nosso texto analisará como essa produção representa ou “constrói” os povos indígenas que vivem nessas regiões.

Partimos da premissa que a história é ordenada culturalmente de diferentes modos nas diversas sociedades, de acordo com os esquemas de significação das coisas. O contrário também é verdadeiro: esquemas culturais são ordenados historicamente porque, em maior ou menor grau os significados são reavaliados quando realizados na prática. A síntese desses contrários desdobra-se nas ações criativas dos sujeitos históricos, ou seja, as pessoas envolvidas. Porque, por um lado, as pessoas organizam seus projetos e dão sentido aos objetos partindo das compreensões preexistentes da ordem cultural (SAHLINS, 1999, p. 7).

Representação e construção dos indígenas em Alagoas e Pernambuco nos livros didáticos de história

Para nossas análises teremos como base dois livros didáticos, um sobre História de Alagoas7 e outro sobre História de Pernambuco8. Consideramos também nossas experiências como pesquisadores/as da temática e convivência com as populações indígenas na região e também como professores/as de História na Educação Básica nos respectivos estados mencionados. Os livros aqui selecionados foram identificados no interior escolar, publicados antes da Lei mencionada, mas que estão em uso nas bibliotecas na educação básica.

A visão de progresso civilizacional está presente não só nos livros de história, mas também em grande parte da produção historiográfica. Os indígenas aparecem na história como resultado de uma descoberta do europeu, para servir aos interesses de uma suposta expansão marítima comercial. As necessidades da história da Europa são pontos de partida para explicar a suposta inferioridade tecnológica, de produção e cultural dos povos indígenas.

As questões podem ser apresentadas com seus conflitos e tensões, equiparando as condições humanas dos grupos envolvidos no processo. Os grupos são capazes de existirem

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ALBUQUERQUE, Isabel Loureiro de. História de Alagoas. Maceió, Imprensa Oficial, 2002.

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nas suas realidades. Não seriam os europeus que projetariam os povos primeiros9 para uma civilização brasileira, e se essa existe, seria uma história fundada a partir da existência indígena, africana e europeia.

Selecionamos alguns pontos independentes da periodização da história alagoana e pernambucana para analisarmos suas exposições textuais e imagéticas sobre os povos indígenas. O período colonial segue certa padronização na representação escrita e nas imagens. Essa é uma tendência na produção didática nacional.

A chegada dos portugueses ao Brasil só foi possível devido às Grandes Navegações, iniciadas no século XV.

Na época das Grandes Navegações, os dois primeiros países europeus que se destacaram foram Portugal (pioneiro na expansão marítima) e Espanha (SIEBERT, 2002, p. 14).

Portugal era um pequeno país, cuja posição geográfica impelia para vida marítima. Situado entre o Atlântico e os poderosos reinos da Espanha, não podendo se expandir territorialmente, lançou-se ao mar a conquistar terras na costa africana e algumas ilhas

ocidentais (ALBUQUERQUE, 2001, p. 21).

Parte da historiografia brasileira põe em evolução tecnológica a história europeia, considerando como feitos heróicos, a navegação, os conhecimentos astronômicos e a própria produção de navios. Navegar e produzir tecnologia com conhecimentos astronômicos não eram exclusividade dos europeus, é possível apontar os chineses como povos que no mesmo período ou anterior dominavam essas tecnologias10.

Com arco e flecha um homem ou mulher indígena poderia alimentar um grupo de pessoas, calcular em seu tempo e espaço exatamente as necessárias compreensões astronômicas para elaborar e projetar os contornos dos “perigos” nas matas. A tecnologia não pode ser relacionada a um povo como modelo para imprimir a desvalorização e inferioridade aos demais. Cada povo se constrói a partir de suas interações num dado tempo e espaço.

Contudo a escassez não é propriedade intrínseca de meios técnicos. É relação entre meios e fins. Deveremos levar em consideração um objeto finito à possibilidade empírica de que os caçadores trabalham para sobreviver, e que o arco e flecha são adequados para esse fim11.

9 O termo Povos Primeiros está associado às populações que viviam no espaço que posteriormente foi nomeado

como Brasil. Entende-se que o indígena não poderia ser designado por definir os povos que viviam nas índias. 10

Ver: Jack Goody. O roubo da história. SP, Contexto, 2008. Ver: SAID, Edward w. O orientalismo: o oriente como invenção do ocidente. São Paulo, Companhia das Letras, 1990.

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SAHLLINS, Marshall. A primeira sociedade da afluência. Disponível em:

Referências

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