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Um estudo de base vigotskiana sobre variação entre o desempenho de crianças e adolescentes na resolução das tarefas de vocabulário e cubos - Wisc III

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PROGRAMA

DE

MESTRADO EM PSICOLOGIA

UM ESTUDO DE BASE VIGOTSKIANA SOBRE VARIAÇÃO ENTRE O

DESEMPENHO DE CRIANÇAS E ADOLESCENTES NA RESOLUÇÃO

DAS TAREFAS DE VOCABULÁRIO E CUBOS - WISC III

Vera Lúcia Damásio Simões

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Ficha elaborada pela Coordenação de Processamento do Acervo do SIBI – UCB.

23/06/2008

S593u Simões, Vera Lúcia Damásio.

Um estudo de base Vigotskiana sobre variação entre o desempenho de crianças e adolescentes na resolução das tarefas de vocabulário e cubos – WISC III / Vera Lúcia Damásio Simões– 2008.

100 f. ; 30 cm.

Dissertação (mestrado) – Universidade Católica de Brasília, 2008. Orientação: Tânia Maria de Freitas Rossi

1. Psicologia. 2. Pensamento 3 . Linguagem. I. Rossi, Tânia Maria de Freitas, orient. II. Título.

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UM ESTUDO DE BASE VIGOTSKIANA SOBRE VARIAÇÃO ENTRE O

DESEMPENHO DE CRIANÇAS E ADOLESCENTES NA RESOLUÇÃO

DAS TAREFAS DE VOCABULÁRIO E CUBOS - WISC III

Dissertação apresentada ao Programa

de Pós-Graduação Stricto Sensu em

Psicologia, da Universidade Católica

de Brasília, como requisito parcial

para obtenção do Grau de Mestre em

Psicologia.

Orientador: Profª. Drª. Tânia Maria

de Freitas Rossi.

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Católica de Brasília, sob a orientação da Profª. Drª. Tânia Maria de Freitas Rossi.

Banca Examinadora

________________________________________________________ Profª Drª Tânia Maria de Freitas Rossi (Orientadora)

________________________________________________________ Profª Drª Mariza Borges Wall Barbosa de Carvalho (membro externo)

________________________________________________________ Profª Drª Erenice Natália Soares de Carvalho (membro interno)

________________________________________________________ Profª Drª Sandra Francesca Conte de Almeida (membro interno - suplente)

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Agradecer é o ato de demonstrar a alegria pela importância dos seres nas nossas vidas. Nesse momento, é reverenciar a dignidade da participação direta ou não, das pessoas na construção dos saberes.

Ao Prof. Doutor José Ferreira Simões, as leituras, correções e apoio incondicional.

A Valéria, amiga-irmã, a edificação partilhada diariamente.

A Elisângela, a amizade, a luta pelo saber.

A Aline, a formatação, o carinho da colaboração. A Profª. Doutora Tânia Maria de Freitas Rossi, minha orientadora e companheira na jornada acadêmica, o partilhar da vida, os ensinamentos fundamentais, científicos e de vida. O carinho, a amizade, a conquista deste título tão desejado. Aos doutores e mestres do Mestrado em Psicologia: Sandra Francesca, Álvaro Tamayo (em memória), Dayse Matos, Roberto Meneses, Ondina, Marta Helena os saberes acadêmicos e de vida.

Ao prof. Abreu e demais componentes do quadro de pessoal da UCB a sincera gratidão.

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A Deus a satisfação do viver e presença diuturna, visceral.

Aos meus pais (em memória), o amor e aprendizagem dos valores de convivência humana. A minha avó Emerenciana (em memória), minha tia Amélia e a “mãe Tereza” pela continuação do amor materno.

Aos irmãos e irmãs o carinho da presença e apoio. Aos familiares a importância da união, apoio, carinho.

Ao companheiro de vida, o Simões, o amor participante, compartilhado.

Aos filhos: Aline, Bruno e Priscila o exercício da maternidade e a alegria da partilha.

Aos netos: Isabela, André e Gabriela a renovação do amor materno.

Aos genros e nora: Camila, Gustavo e Thibério o amor fraterno.

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Na experiência clínica de atendimento psicológico a crianças e adolescentes, tem-se observado um descompasso no desempenho dos sujeitos, em atividades que exigem a utilização da linguagem verbal, em comparação com o desempenho nas atividades que exigem o pensamento em ação, ou seja, a realização de atividade prática com materiais, na qual a expressão oral não é prioridade. Este trabalho teve como objetivo realizar um estudo exploratório para verificar se há variação entre o desempenho de crianças e adolescentes, na resolução das tarefas de Vocabulário e Cubos da Escala de Inteligência Wechsler para Crianças -WISC III e, caso houvesse, analisá-la a partir de aportes teóricos da abordagem histórico-cultural. Foi realizado um estudo de casos com 5 sujeitos cuja faixa etária média era de 11 anos e seis meses. Solicitou-se que respondessem aos subtestes Vocabulário e Cubos da Escala de Inteligência Wechsler para Crianças- WISC III. Os resultados das tarefas foram analisados de acordo com a grade de correção da Escala de Inteligência. Também buscou-se identificar os estágios do desenvolvimento do signo e do conceito que os sujeitos apresentavam na definição dos conceitos do “Vocabulário” e, nos “Cubos,” verificar a presença de comportamentos que indicassem o uso da atenção voluntária, estratégias de adaptação e autocrítica na realização das atividades.

Os resultados indicam que 2 dos 5 sujeitos obtiveram escores mais altos no subteste “Vocabulário” do que nos “Cubos”. Apesar de os outros 3 sujeitos terem obtido escores altos nos Cubos, o desempenho não se igualou ao resultado alcançado no Vocabulário, que foram maiores. Não houve variações importantes no desempenho dos sujeitos quanto ao desenvolvimento de conceitos e do signo. Este estudo sugere que há uma variação real do desenvolvimento do curso da linguagem e do pensamento entre os sujeitos pesquisados mas o fenômeno demanda estudos aprofundados com amostra significativa.

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In the clinical experience of psychological care for children and adolescents, it was observed an imbalance in the performance of the subjects in activities that require the use of verbal language, compared with the performance in activities that require the thought into action, that is realization of practical activity with materials, in which the oral expression is not priority. This study aimed to carry out an exploratory study to verify if there is variation between the performance of children and adolescents, in the resolution of the tasks of vocabulary and Cubes of the Wechsler Intelligence Scale for Children-WISC III, and if there were, look at it from of theoretical contributions of historical-cultural approach. It was conducted a study of cases with 5 subjects whose average age was 11 years and six months. They were asked to reply to subtests Vocabulary and Cubes of Wechsler Intelligence Scale for Children-WISC III. The results of the tasks were analyzed according to the grade of correction of the Scale of Intelligence. It also sought to identify the stages of the development of the sign and the concept that the subject had in the definition of the concepts of "Vocabulary" and, in the "Cubes", to verify the presence of behavior that indicate the use of voluntary attention, strategies to adapt and self-criticism in carrying out activities. The results indicate that 2 of the 5 subjects received the highest scores in the subtest "vocabulary" than in "Cubes". While the other 3 subjects have obtained high scores in Cubes, the performance was not the same of the result in vocabulary, which were higher. There were no significant variations in performance of the subjects on the development of concepts and of the sign. This study suggests that there is a real change of the course of the development of language and the thinking among the subjects searched but the phenomenon demand deeper studies with significant sample.

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1. QUADRO TEÓRICO SOBRE A CONSTRUÇÃO DO PENSAMENTO E DA

LINGUAGEM ____________________________________________________________15 1.1. A gênese do pensamento e da linguagem ____________________________________ 15 1.2. O Desenvolvimento do Pensamento ________________________________________ 20 1.3. O Desenvolvimento da Linguagem _________________________________________ 29 1.4. A Relação Pensamento e Linguagem _______________________________________ 33 2. METODOLOGIA______________________________________________________55

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Tabela 1 - Nível de Escolaridade, Idade e Sexo dos Participantes da Pesquisa _________ 56 Tabela 2 - Desempenho dos sujeitos no subteste Vocabulário – WISC III _____________ 68 Tabela 3 - Evolução das Respostas dos Sujeitos nos Estágios do Desenvolvimento do

Conceito _________________________________________________________________ 71 Tabela 5 - Prova Vocabulário – Evolução das Respostas dos Sujeitos nos Estágios do

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INTRODUÇÃO

A relação entre pensamento e linguagem por um longo período de tempo não constituiu objeto de estudo da psicologia. As tentativas de análise eram superficiais e infecundas. A princípio, o estudo de tal relação passava pela análise atomista e funcional na qual as funções psicológicas particulares eram analisadas separadamente. O método de conhecimento psicológico objetivava o estudo desses processos isolados e particularizados como é o caso, por exemplo, do estudo da percepção que permanecia sempre ligada à atenção, do mesmo modo que o estudo da memória ligada à percepção e, o pensamento à memória. Vigotski (2001) mostrou na análise que empreendeu da velha psicologia, as relações interfuncionais tomadas enquanto multiplicidades que deveriam ficar fora do processo investigatório.

Historicamente, a psicologia, nas suas várias correntes, vinha contornando o problema do pensamento e da linguagem e, não encontrando solução, oscilava entre a plena identificação e a plena fusão do pensamento e da palavra, entre a plena separação e dissociação igualmente absoluta.

O estudo de como se constrói o pensamento e a linguagem, na psicologia histórico-cultural representa a superação de paradigmas arraigados na ciência psicológica desde o seu surgimento.

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da linguagem utilizados pela velha psicologia, criticando-os por não se adequarem à complexidade do objetivo a que se propunham.

Em decorrência, Vigotski (2001) propôs uma nova metodologia ancorada no método de análise que desmembra o todo em unidades. Essa nova postura compreendeu por unidade um objeto de análise que tenha todas as propriedades do todo e que, ao mesmo tempo seja parte viva que mantenha a integridade de tal unidade.

O significado da palavra é, portanto, a unidade que conserva as características do todo, do pensamento e da linguagem e não se deixa decompor. È parte inseparável da palavra e pertence ao domínio da linguagem, tanto quanto ao domínio do pensamento. O significado é, simultaneamente, linguagem e pensamento porque é uma unidade do pensamento verbal.

A inconstância e mutabilidade dos significados das palavras e o seu desenvolvimento é uma das descobertas importantes para o estudo do pensamento e da linguagem. Tal descoberta só foi possível quando Vigotski (2001) definiu a natureza do próprio significado corretamente que se apresenta na generalização e qualquer palavra já é uma generalização.

Ao clarificar o papel funcional do significado da palavra, no ato de pensamento, Vigotski (2001) explica o processo do pensamento verbal, reunindo dados necessários para conceber como esse processo se realiza nas linhas mais gerais. Considerou que se deve passar do plano genético para o funcional e promover o processo de funcionamento dos significados na realização do pensamento verbal.

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palavra como um processo, um movimento de mão dupla, um transitar por caminhos que seguem do pensamento à palavra e da palavra ao pensamento. O pensamento tem um movimento, uma função, trabalha, resolve tarefas. Seu fluxo é intenso e interno, por meio de planos, percorrendo a trilha que vai do ato de pensar ao ato de usar a palavra e vice-versa.

A análise realizada por Vigotski (2001) leva à distinção de dois planos na linguagem, o aspecto semântico, interior da linguagem e o aspecto exterior, físico e sonoro que, apesar de sua autêntica unidade, cada um apresenta leis próprias de desenvolvimento. A unidade da linguagem é heterogênea e complexa. Nos dois planos, físico e sonoro, os movimentos da linguagem e do pensamento incorporam-se em uma linha, mas podem transcorrer por linhas opostas. O pensamento da criança surge, a princípio, como um todo confuso e inteiro e, por isso, deve encontrar na linguagem a sua expressão em uma palavra isolada. Desmembra-se e se constitui a partir de unidades particulares, na medida em que passa das partes para o todo. Ocorre, também, o oposto, à proporção que, em sua linguagem, a criança transita das unidades para o todo desfeito em partes na oração, no pensamento, ela pode passar do todo não desfeito para as partes.

Nos planos semântico e sonoro da linguagem, os movimentos não coincidem, fundem-se em uma linha, mas podem transcorrer por linhas de fundem-sentido inteiramente contrários.

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Pensamento e linguagem são mutuamente constitutivos, como postula Vigotski (2001), em suas investigações e podem se unir ou trilhar caminhos diferenciados. Porém, não fica explicitado como isso se dá ao longo do desenvolvimento. A natureza da linguagem verbal possibilita que ela se desenvolva mais rapidamente do que o pensamento em ação, em crianças e adolescentes? Essa diferenciação, esse descompasso entre a linguagem verbal e o pensamento em ação, ocorre ao longo do desenvolvimento em um processo com peculiaridades? A natureza da variação seria de base genética, funcional ou ocorreria no próprio desenvolvimento da criança pelas influências socioculturais?

Na literatura pode-se encontrar um conjunto de pesquisas que se ocuparam, em alguma medida, com a relação entre o desempenho verbal e não verbal de crianças e adolescentes. A título de exemplo, tem-se Mercer, Wegerif e Dawes (1999) que realizaram um estudo, numa escola primária britânica. Sessenta crianças com idade entre 9-10 anos e seus professores tomaram parte em um experimental teaching programme, projetado para melhorar a qualidade do raciocínio das crianças e suas ações em colaboração para desenvolver a consciência do uso da linguagem utilizando um regulamento básico para a discussão conjunta. A performance das crianças foi avaliada por meio do teste não-verbal Matrizes Progressivas do Raven.

Os resultados mostram que, de acordo com os objetivos do experimental teaching programme a discussão dirigida ajudou os grupos a solucionarem os problemas do teste de raciocínio melhorando também os resultados individuais das crianças no teste de Raven.

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no teste não verbal. Não foi feita uma análise comparativa entre o desempenho verbal e não-verbal

Outro estudo realizado por Boomsma (2003) teve o objetivo de investigar o nível de diferenciação da influência genética e ambiental nas habilidades cognitivas, verbal e não-verbal na infância. Foram usadas seis medidas psicométricas para avaliar as habilidades cognitivas, verbal e não-verbal. As medidas foram administradas em 209 pares de gêmeos holandeses, com idades entre 5, 7 e 10 anos, num acompanhamento longitudinal. Os resultados apresentam pequena variação no cálculo da diferença das hipóteses genética e ambiental nas quais a estabilidade apresentada nos subtestes de desempenho é considerada função, principalmente, das influências genéticas. A cota de contribuição do ambiente para a estabilidade fenotípica é pequena, sendo a contribuição do ambiente afeita à somente na variação específica da idade.

O estudo corrobora a concepção inatista das habilidades cognitivas, pois, enfatiza o caráter hereditário da inteligência, deixando um espaço mínimo para as influências ambientais e relacionais. Vigotski (2001) propõe uma tese que está na contramão da inatista, ao afirmar que as habilidades verbais e não-verbais são socialmente constituídas ao longo do desenvolvimento da criança. O autor não descarta as contribuições biológicas, porém enfatiza a importância histórico-cultural para a formação das funções psicológicas superiores. Tal acepção incita a que se investigue a relação entre o desenvolvimento do pensamento e da linguagem, superando o intelectualismo e o reducionismo genético de certas abordagens da psicologia.

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Examinaram uma amostra de 4.446 crianças de 4 anos, gêmeas idênticas, do mesmo sexo. Os autores pesquisaram crianças advindas de tipos de ambientes diferentes, com famílias caóticas, famílias que possuíam uma comunicação instrutiva entre pais e filhos, e famílias com comunicação informal entre os pais e filhos. Os resultados apontam para uma significativa interação do genótipo e do ambiente nas habilidades verbais em três dos ambientes analisados, todos na direção do modelo de vulnerabilidade maior para o estresse (famílias caóticas, famílias que possuíam uma comunicação instrutiva entre pais e filhos e comunicação informal entre os pais e filhos). A pesquisa não atingiu resultados significativos para as habilidades não-verbais. A conclusão é a de que a interação entre genética e ambiente existe na habilidade verbal em tenra infância, e a tendência é seguir a direção de uma maior influência hereditária em ambientes de alto risco.

A análise dos estudos recentes que abordam a linguagem verbal e a não-verbal são interessantes, porém, não aprofundam aspectos importantes do desenvolvimento do pensamento e da linguagem nem as peculiaridades da relação entre eles, no desenvolvimento infantil. O quadro teórico não se aproxima das inovações propostas pela psicologia histórico-cultural, no que diz respeito à construção do pensamento e da linguagem. É a partir dessa lacuna que o objetivo deste trabalho é:

Objetivo Geral:

Avaliar se há variação entre o desempenho de crianças e adolescentes na resolução das tarefas de Vocabulário e Cubos da Escala de Inteligência Wechsler para Crianças (WISC III).

Objetivos Específicos:

– Identificar o desempenho dos sujeitos nas tarefas relativas ao subteste verbal Vocabulário da Escala de Inteligência para Crianças – WISC III;

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QUADRO TEÓRICO SOBRE A CONSTRUÇÃO DO

PENSAMENTO E DA LINGUAGEM

1.1 A gênese do pensamento e da linguagem

A análise genética do pensamento e da linguagem elaborada por Vigotski (2001) oportunizou conclusões importantes para o estudo da relação entre o pensamento e a linguagem: a relação entre esses dois processos psicológicos é uma grandeza variável ao longo de todo o desenvolvimento. O pensamento e a palavra surgem e se constituem no processo de desenvolvimento histórico da consciência do homem. Em seus estágios primários, não apresentam relação de dependência entre suas raízes genéticas, quer na filogênese como também na ontogênese. Essa relação modifica-se no processo de desenvolvimento, tanto em termos quantitativos, quanto qualitativamente. Há convergências e divergências nas curvas desse desenvolvimento, cruzamentos, nivelamentos, confluências e bifurcações. Tanto no desenvolvimento filogenético, quanto no ontogenético.

Pensamento e palavra nascem com raízes genéticas diferentes e se constituem na formação social do homem. Somente a linguagem humana se vincula com o intelecto e a linguagem dos animais é uma expressão sonora sem ligação com a inteligência. O homem é o único animal com linguagem vinculada diretamente com a inteligência.

A linguagem, no estágio inicial do desenvolvimento da fala infantil, passa por um “estágio pré-intelectual” que se supõe um momento em que a linguagem da criança encontra-se despida de seu caráter racional.

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Até determinado ponto, o pensamento e a linguagem desenvolvem-se por linhas diferentes, e não há dependência entre elas. O balbucio, o grito, o sorriso, os gestos e até mesmo as primeiras palavras da criança são estágios pré-intelectuais com características de comunicação, de contato social. Porém, essas linhas de desenvolvimento do pensamento e da linguagem, em um determinado ponto, (em tenra idade) se cruzam e o pensamento se torna verbal e a fala se torna intelectual. Inicia-se uma nova forma de comportamento, própria da espécie humana. A criança se conscientiza de sua linguagem e há o desejo de apreendê-la, dominá-la. Ocorre, nesse momento, a ampliação de seu vocabulário de forma rápida e aos saltos.

Um novo enfoque e um novo método foram propostos por Vigotski (2001) para se estudar o problema da relação entre pensamento e linguagem. Utilizou a análise que desmembra a unidade complexa do pensamento discursivo em diversas unidades constituintes do todo, em relação ao fenômeno estudado. Estas não perdem as propriedades inerentes à totalidade. Elas são suscetíveis de explicação e contêm, em sua forma primária e simples, propriedades do todo, em função das quais se empreende a análise.

O significado da palavra é essa unidade, que reflete a unidade do pensamento e da linguagem. É uma unidade inseparável de ambos os processos, um fenômeno da linguagem e um fenômeno do pensamento. O significado é um traço constitutivo, imprescindível à palavra, a palavra vista interiormente e também é uma generalização ou conceito.

Falar em generalização e significado da palavra é abordar o mesmo tema, pois há igualdade semântica entre ambos. Pensar é fazer generalização, formar conceitos, pois, essas são suas funções específicas e autênticas.

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sua luz. É um fenômeno do pensamento discursivo ou da palavra consciente, é a unidade da palavra com o pensamento. (Vigotski, 2001)

A tese em que se alicerça todo o constructo teórico sobre o pensamento e a linguagem é a descoberta de que os significados das palavras se desenvolvem. A mudança dos significados das palavras tornou-se a descoberta capaz de superar os pressupostos de sua constância e imutabilidade do significado da palavra, que eram base das teorias anteriores do pensamento e da linguagem.

Em síntese, pode-se vislumbrar no quadro abaixo a evolução dos postulados sobre o significado da palavra comparando a velha psicologia com a nova psicologia proposta por Vigotski (2001).

Quadro 1 - Comparação entre a nova e a velha psicologia

Velha Psicologia Nova Psicologia

Acreditava na constância e imutabilidade do significado da palavra;

O significado da palavra se desenvolve – há mudanças do significado das palavras ao longo do desenvolvimento infantil;

a ligação entre a palavra e o

significado é associativa; constitutivo da palavra; o significado é um traço a ligação entre a palavra e o

significado se estabelece pela coincidência e pela impressão do objeto designado pela palavra;

do ponto de vista psicológico, o significado da palavra é uma generalização ou conceito;

a palavra pode sofrer várias mudanças quantitativas externas mas não pode mudar sua natureza psicológica interior.

o significado da palavra é ao mesmo tempo um fenômeno do pensamento discursivo e da palavra consciente, é a unidade da palavra com o pensamento.

(elaborado pela autora)

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O dado fundamental do desenvolvimento do pensamento e da linguagem é a dependência dos instrumentos de pensamento e da experiência sociocultural da criança. Os fatores externos são basilares para o desenvolvimento da linguagem interior. O caráter racional do pensamento está relacionado à linguagem. O desenvolvimento do pensamento da criança depende do desenvolvimento da linguagem, ou seja, do domínio que a criança tem sobre os meios sociais de seu pensamento, isto é, da linguagem.

O desenvolvimento da linguagem, assim como todas as outras operações psicológicas que se baseiam no uso de signos, passa por quatro estágios básicos: o primeiro é chamado de natural ou primitivo, se relaciona ao momento da linguagem verbal e do pensamento pré-intelectual, em que as operações são originais, conforme evoluíram na fase primitiva do comportamento.

O segundo estágio foi denominado de “psicologia ingênua”, por se tratar do primeiro exercício de inteligência prática, surgido na criança por meio de suas experiências com seu próprio corpo, com objetos que a circundam e pelo emprego das experiências com o uso de instrumentos à sua volta. A experiência é ingênua e revela-se insuficiente e incompleta, “ingênua no próprio sentido da palavra, razão pela qual redunda em um emprego inadequado das propriedades, estímulos e reações psicológicas”. (Vigotski, 2001, p. 138)

Nesse estágio, o desenvolvimento da linguagem infantil é facilmente observável na assimilação pela criança, das estruturas e formas gramaticais que ocorre primeiro do que a assimilação das estruturas e operações lógicas correspondentes. Portanto, ela assimila a sintaxe da linguagem antes da assimilação da sintaxe do pensamento.

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O quarto estágio Vigotski (2001), utilizando uma metáfora, denominou-o de crescimento para dentro, pois, há uma mudança substancial nas operações que eram externas e se interiorizam. A criança opera mentalmente utilizando-se da memória lógica, ou seja, opera com relações interiores em forma de signos também interiores. No desenvolvimento da fala, a isto corresponde a linguagem silenciosa ou interior. Existe uma interação dinâmica entre as operações externas e internas, uma se transformando facilmente na outra.

A relação entre pensamento e linguagem pode ser comparada a dois círculos que se cruzam, e, em determinado ponto, eles se coincidem formando o campo do “pensamento verbalizado” (Vigotski, 2001, p. 139). Este campo não compreende todas as formas de pensamento nem de linguagem. Existe uma área grande de pensamento que não mantém relação com o pensamento verbal. O pensamento pode funcionar sem nenhuma imagem verbal ou movimento de linguagem.

A linguagem interior se desenvolve tendo como pano de fundo um lento acúmulo de mudanças estruturais e funcionais que ocorrem ao longo do desenvolvimento humano. Ela se separa da linguagem exterior das crianças no momento em que aparece a diferenciação das funções social e egocêntrica da linguagem.

As estruturas da linguagem dominadas pela criança tornam-se estruturas básicas de seu pensamento. O desenvolvimento do pensamento e da linguagem depende dos instrumentos e da experiência sócio-cultural desta mesma criança.

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A complexidade da consciência humana é formada pelas condições histórico-sociais da vida. Portanto, o problema do pensamento e da linguagem transita pela centralidade da psicologia histórico-social do homem.

1.2 O Desenvolvimento do Pensamento

A consciência, em seu dinamismo complexo, transpõe as fronteiras do biológico e de sua gênese na vida social do homem, na perspectiva de sua história e cultura. As condições externas da vida social são os fundamentos para se explicar as formas mais complexas da consciência e dentre elas, está também o trabalho, como elemento de transformação do comportamento humano, em interlocução com a vida social, moldou a psique humana de forma original e singular. É o marco diferencial do homem em relação aos outros animais. (Vigotski, 2001)

O desenvolvimento do pensamento é basilar para toda a estrutura da consciência e para todo o sistema de atividade das funções psíquicas, como afirma Vigotski (2003). O pensamento funciona como o sol, que ilumina e faz a efervescência de todas as atividades psíquicas. O desenvolvimento do pensamento relaciona-se à idéia de intelectualização de todas as outras funções, ou seja, suas mudanças dependem de que uma determinada fase do pensamento leve à atribuição do sentido dessas funções. Depende, também, de que a criança comece a agir racionalmente e em conseqüência disso, as funções, que atuavam automaticamente, passam a fazê-lo de forma consciente. (Vigotski, 2003)

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se desenvolve o pensamento, que se materializa na palavra. São três os estágios do desenvolvimento do pensamento por conceitos estabelecidos por Vigotski (2001).

O primeiro estágio - amontoados (criança de tenra idade) - trata da formação de uma pluralidade, não informada e não ordenada. A discriminação de um amontoado de objetos variados ocorre no momento em que a criança se vê diante de um problema, que o adulto resolve com a inserção de um novo conceito. O significado da palavra é um encadeamento sincrético de objetos particulares que, nas representações e na percepção da criança, estão mais ou menos concatenados em uma imagem mista. Esse fenômeno pode ser descrito como uma tendência infantil, a substituir a carência de lógica objetiva, por uma abundância de conexões subjetivas. Isso leva a confundir a relação entre as impressões e o pensamento, com os objetos.

Claparéde (conforme citado por Vigotski, 2001) chamou essa tendência de “sincretismo da percepção infantil”, e Blonski (conforme citado por Vigotski, 2001) chamou de “nexo desconexo” do pensamento infantil.

A primeira fase desse estágio, ou fase da formação da imagem sincrética, da tentativa e erro. Coincide, com o período de provas e erros no pensamento infantil. A criança escolhe aleatoriamente os novos objetos, por meio de algumas opções que se substituem, mutuamente, quando se verifica o fato de estarem erradas.

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A terceira fase é superior, pois, marca a conclusão desse processo e a passagem para o segundo estágio na formação dos conceitos. É a fase em que a imagem sincrética equivalente ao conceito, forma-se em uma base mais complexa e se apóia na atribuição de um único significado aos representantes dos diferentes grupos unificados na percepção da criança. Nesse momento, por trás da palavra infantil, não se esconde mais o plano, mas a perspectiva, a dupla série de vínculos, a dupla estruturação dos grupos.

O segundo estágio configura-se em termos funcionais, estruturais e genéticos. Como os outros estágios, conduz à formação de vínculos e ao estabelecimento de relações entre impressões concretas, à unificação e à generalização de objetos particulares. Leva ao ordenamento e à sistematização de experiência da criança e foi denominado de pensamento por complexos.

As generalizações, criadas por intermédio desse modo de pensamento, representam, pela estrutura, complexos de objetos particulares, concretos. Eles são unificados por vínculos objetivos que, efetivamente, existem entre tais objetos. Os complexos são construídos, segundo leis do pensamento, diversas das leis do conceito. Nestas, estão refletidos os vínculos objetivos, mas, refletidos de modo diferente daquele que ocorre nos conceitos propriamente ditos. A linguagem do adulto é cheia de resíduos do pensamento por complexo, e um bom exemplo é o nome de família que classifica os indivíduos, de uma forma que se assemelha, em muito, àquela dos complexos infantis.

Nesse estágio do desenvolvimento, a criança pensa de forma que o universo dos objetos isolados torna-se organizado para ela, pelo fato de se agruparem em “famílias” interligadas. Ou seja, os significados das palavras podem ser definidos de forma abrangente, como nomes de famílias unificados em complexos ou grupos de objetos.

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na experiência imediata, pois, promove uma unificação concreta com um grupo de objetos, baseando na semelhança física. Portanto, o complexo é a generalização ou a unificação de objetos heterogêneos concretos. A diversidade de vínculos, que servem de base ao complexo, constitui o traço mais importante que o difere.

Pela investigação realizada, tanto experimental, quanto pela observação da criança em seu desenvolvimento natural, Vigotski (2001) delineou cinco fases básicas de pensamento por complexos, que fundamentam as generalizações da criança.

Primeira fase do pensamento por complexo é o complexo do tipo associativo. Baseia-se em qualquer vínculo associativo com qualquer dos traços observados pela criança no objeto. Qualquer relação concreta descoberta pela criança, qualquer ligação associativa entre o núcleo e um outro objeto do complexo, é suficiente para fazer com que a criança inclua esse objeto no grupo e o designe pelo nome de família comum. As palavras deixam de ser denominações de objetos isolados, de nomes próprios, tornando-se nomes de família.

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Terceira fase diz respeito ao complexo em cadeia. A base de sua construção é o princípio da combinação dinâmica e temporal de determinados elos, em uma cadeia única e, também, da transmissão do significado por meio de elos isolados dessa cadeia. Nos experimentos, foi observado por Vigotski (2001), que a criança escolhe, para certa amostra, objetos associados de alguma forma. Em seguida, reúne os objetos concretos em um complexo único seguindo a orientação de um traço secundário do objeto fora da amostra. Por exemplo: caso a amostra seja um triângulo vermelho, a criança começa a separar figuras triangulares até que sua atenção se volte para a cor azul de uma figura que tenha sido acrescentada ao conjunto. Começa, então, a selecionar figuras azuis, independente de serem circulares, ovais etc. Com isso, começa a escolher novas figuras com traços angulosos. Na formação do complexo, há um constante movimento de um traço a outro. O significado da palavra se desloca pelos elos da cadeia, que se vinculam por diferentes formas de combinação. A natureza do pensamento por complexo é concreta e figurada, não há, entre os traços, uma vinculação hierárquica como nos conceitos. Funcionalmente todos os traços são iguais.

Vigotski (2001) considera o complexo em cadeia a forma genuína do pensamento por complexos, por se tratar de um complexo em que inexiste um centro, um elemento comum. As aproximações ocorrem de forma factual, o começo e o final da cadeia podem ser muito diferenciados.

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semicírculos; aos semicírculos, os círculos. Verifica-se que o traço básico foi diluído e qualquer outro traço que tenha tomado seu lugar, também, é diluído e assim sucessivamente.

As características do pensamento por complexo difuso deixam transparecer o traço marcante do pensamento por complexos: seus contornos indefiníveis e ausência de limites, pensamento presente com regularidade no desenvolvimento natural da criança, e, não só, nas condições experimentais.

Vigotski (2001), ao estabelecer uma analogia entre o pensamento por complexo-coleção e por complexo difuso, afirma que o primeiro se faz representar na vida natural da criança, marcadamente por generalizações, alicerçadas na semelhança funcional de objetos particulares. O segundo, (complexo difuso), caracteriza-se por generalizações que envolvem campos do pensamento não-concreto, não prático, que não são passíveis de verificação prática.

A ausência de um delineamento sólido, dos processos ilimitados do pensamento da criança, as generalizações difusas, impressionam pela combinação dos vínculos, baseados em traços flutuantes, que a criança estabelece. No complexo difuso, a criança combina objetos que estão fora do conceito prático dela.

A quinta fase – pseudoconceito é a última forma de pensamento por complexos proposta por Vigotski (2001), no desenvolvimento do pensamento infantil. Os pseudoconceitos funcionam como uma via de mão dupla: por um lado, promovendo a compreensão dos estágios vivenciados pela criança em sua evolução do pensamento; por outro, estabelecendo a ligação entre o novo e superior estágio: a formação de conceitos propriamente ditos ou verdadeiros.

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empregado pelo adulto, diferencia-se muito do verdadeiro conceito, em termos de sua natureza psicológica.

Dados experimentais obtidos por Vigotski (2001), mostram a fragilidade dos vínculos dinâmico-causais que alicerçam as combinações realizadas com objetos, nessa fase as combinações, em seu aspecto externo, assemelham-se ao conceito, mas, em termos internos, é um complexo. Elas são produzidas em uma associação simples, baseada em vínculos concretos. Um exemplo desse tipo de pensamento é quando a criança, com uma amostra de triângulo amarelo, escolhe todos os triângulos do material experimental. O que, pela aparência, é um grupo surgido com base no pensamento abstrato, torna evidente uma construção alicerçada em vínculos diretos, fatuais e concretos, em que a criança estabeleceu uma associação simplificada entre os triângulos. O resultado é idêntico ao do conceito, porém, as trilhas percorridas pelas operações intelectuais da criança são totalmente diferenciadas.

Há prevalência, na idade pré-escolar, do pensamento por complexo, os pseudoconceitos. A criança, na maior parte do tempo, utiliza-se dessa forma de pensamento, pois os complexos infantis, que correspondem ao significado da palavra, são estabelecidos no discurso do adulto, não podendo, tais significados, desenvolver-se de forma livre e espontânea, por caminhos trilhados pela própria criança.

Surge o terceiro estágio da evolução do pensamento infantil, cuja função é o desenvolvimento da análise, síntese e da abstração. O conceito se refere a um traço abstraído que não se deixa destruir entre outras características, pois a totalidade concreta que vigorava no pensamento por complexos, foi superada pela sua abstração. Há 2 fases ou como afirma Rossi (1993, p.93) “Essas operações de diferenciação e generalização, isolamento/abstração, análise/síntese se realizam em três estágios.”

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abstração por meio de uma simples e vaga impressão de identidade. No pensamento da criança o objeto concreto se insere na generalização, mas, deixa de fora uma parte de seus atributos.

A primeira fase Vigotski (2001) chamou de estágio de conceitos potenciais em que a criança costuma destacar um grupo de objetos que ela generaliza depois de reunidos conforme um atributo comum. São comuns em várias fases do desenvolvimento da formação do conceito. Dessa forma, pode ser formado tanto no âmbito do pensamento perceptual e prático, de características reais e imediatas, calcado apenas em impressões semelhantes, ainda de cunho concreto-figurado. O sujeito já abstrai pelo menos, um atributo que constitui o conceito, não cedendo lugar a outro atributo, como acontece nos complexos.

A segunda fase se refere ao momento em que a criança, ao abstrair certos atributos, destrói a situação concreta e cria a premissa para uma nova combinação desses atributos em nova base. A palavra tem papel decisivo na orientação arbitrária da atenção da criança para certos atributos, pois com a palavra ela os sintetiza, simboliza o conceito abstrato e opera com ele como lei máxima do pensamento humano.

É quando a operação de abstração tem caráter estável. O sujeito consegue reunir todos os atributos abstraídos em uma nova síntese mais potencial e globalizante, abstrata. O processo de interiorização também se transformou, ou seja, há uma interiorização das operações externas e a capacidade de formar os conceitos. Essa última fase na evolução do pensamento infantil é marcada pelo uso da palavra como meio de formação de conceito que faz surgir a estrutura significativa e original que foi denominada de conceito na verdadeira acepção da palavra. (Vigotski, 2001)

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Vigotski (2001) foi o pioneiro neste estudo, observando que a análise comparada entre os conceitos cotidianos e científicos, na idade escolar, tem como objetivo principal verificar o curso real do pensamento infantil no processo de aprendizagem na escola. Pretendia encontrar a via original de desenvolvimento percorrida pelos conceitos científicos em comparação com os cotidianos, na tentativa de estudar o curso real do desenvolvimento do pensamento infantil na aprendizagem escolar por meio experimental.

As investigações experimentais mostraram a formação de conceitos científicos e também os cotidianos, começa no momento em que a criança assimila, pela primeira vez, um significado ou termo novo, veículo do conceito científico. Essa é a lei geral do desenvolvimento do significado das palavras, à qual estão subordinados, em seu desenvolvimento, tanto os conceitos científicos quanto os cotidianos.

No momento inicial, a palavra é apreendida pela criança, entra na rede das relações de generalidade e forma um sistema que determina a medida da generalidade. Todo conceito deve ser analisado em conjunto com todo sistema de suas relações de generalidade, de forma análoga a uma célula que deve ser olhada nas suas ramificações por meio das quais ela se torna parte de um tecido comum. No caso dos conceitos científicos, eles estabelecem uma ponte entre a experiência da criança e as novas aquisições, ampliando, significativamente, as relações com os significados ou conceitos cotidianos e o aspecto semântico como processo básico e decisivo do desenvolvimento do pensamento e da linguagem.

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Ao se desenvolverem, os conceitos ou significados das palavras exigem que se desenvolvam, também, funções como a atenção arbitrária, a memória lógica, a abstração, a comparação e a discriminação, e todos os processos psicológicos complexos.

1.3 O Desenvolvimento da Linguagem

Segundo Vigotski, (2004) nos processos psíquicos do homem há dois níveis distintos: o primeiro é a razão entregue a si mesma; o segundo é a razão armada de instrumentos e meios auxiliares. Em analogia, a atividade prática também teria dois níveis: o primeiro, a “simples mão”, o segundo a mão armada de ferramentas e elementos auxiliares. Nessa perspectiva, tanto na esfera prática do homem quanto na psíquica, a importância fundamental estava no nível dos instrumentos. Ao se referir ao campo dos fenômenos psíquicos, o autor nomeou o primeiro nível de processos psíquicos “naturais” e o segundo foi denominado de processos psíquicos “culturais”. O processo “cultural” é o natural convertido em mediato por meio de instrumentos e meios auxiliares psíquicos específicos.

Tal dicotomia entre os níveis, nos postulados vigotskianos, foi estabelecida em função do realce decisivo, que deveria ser dado, ao valor dos instrumentos psicológicos na evolução dos processos psíquicos humanos, transformando na tese principal dessas postulações.

Vigotski (2004), orientava-se para o estudo da atividade prática com a ajuda de objetos, pois compreendeu o papel da atividade laboral, destacando o instrumento como o elemento de mediação das funções psíquicas em sua determinação histórico-social no homem.

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entre as funções psíquicas superiores e as elementares (que dependem do caráter mediado das superiores por meio de “instrumentos”) como o nexo que há entre ambas (as funções superiores surgem sobre a base das inferiores). Por fim, as peculiaridades das funções psíquicas superiores (por exemplo, seu caráter arbitrário) tinham sua explicação na existência de “instrumentos psicológicos”.

Por meio da hipótese do caráter mediado dos processos psíquicos, por meio de “instrumentos” peculiares, os postulados vigotskianos introduziam na ciência psicológica as diretrizes da metodologia dialética marxista, materializada em um método.

Pode-se afirmar que o problema da metodologia é central na obra de Vigotski, (2001). A dialética interna tornou-se arraigada à sua forma de pensar. O caráter histórico de sua obra veio da tentativa de aplicar em psicologia o método de Marx. Assim, estabeleceu que os determinantes na evolução psíquica do homem são as atividades laborais com a ajuda de instrumentos. (Vigotski, 2004)

Ao ser questionado sobre o que são instrumentos psicológicos e qual o mecanismo de sua ação mediadora, o exemplo que Vigotski recorria, era de um senhor parksoniano internado em uma clínica. Quando lhe era pedido que andasse, seus temores se intensificavam de forma a impedi-lo de caminhar. Quando se colocavam à sua frente, papéis brancos alinhados, e, lhe solicitavam que andasse, o tremor arrefecia e o senhor conseguia andar, pisando em um papel, após o outro. Sua explicação era que o paciente se encontrava diante de duas séries de estímulos: os de ordem verbais que eram incapazes de despertar o comportamento adequado; e a segunda série de estímulos se refere aos pedaços de papéis que agem de forma mediada na reação do paciente. Tal série de estímulos age como meio ordenador do comportamento e foi denominada por Vigotski, (2004) de estímulos-meios.

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cálculo, os mecanismos mnemotécnicos, os simbolismos algébricos, as obras de arte, a escrita, os esquemas, os diagramas, os mapas, os desenhos, todo tipo de signos convencionais, etc.. Todos esses elementos, apesar de heterogêneos, são criações artificiais dos seres humanos e que se constituem parte da cultura (por isso a denominação de histórico-cultural dada à teoria de Vigotski). Todos esses estímulos-meios ou instrumentos psicológicos, inicialmente estão dirigidos para fora do homem, para os seus pares. Depois é que tais estímulos-meios ou instrumentos psicológicos passam a si dirigirem para nós mesmos, a se transformarem em um meio direcionador dos processos psíquicos no plano individual, para depois se desenvolverem internamente. A função psíquica age de forma mediatizada desde dentro e decai a necessidade de um estímulo-meio externo. Todo esse processo, do início ao final, o autor chamou de “círculo completo de desenvolvimento histórico-cultural da função psíquica”. (Vigotski, 2004, p. 451)

Com o decorrer de suas pesquisas, os experimentos mostraram como resultado, que, o sujeito transformava a tarefa de generalizar as figuras, com ajuda dos estímulos-meios, na de descobrir o valor dos estímulos-meios. Com isso, os estímulos-meios ou instrumentos psicológicos se convertiam em portadores de significados. Então a denominação precisou ser modificada e os instrumentos psicológicos ou estímulos-meios receberam o nome de signos.

O desenvolvimento da linguagem, assim como todas as outras operações psicológicas que se baseiam no uso de signos, passa por quatro estágios básicos: o primeiro é chamado de natural ou primitivo, se relaciona ao momento da linguagem verbal e do pensamento pré-intelectual, em que as operações são originais, conforme evoluíram na fase primitiva do comportamento.

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instrumentos à sua volta. A experiência é ingênua e ocorre o emprego inadequado das propriedades, estímulos e reações psicológicas.

Nesse estágio, o desenvolvimento da linguagem infantil é facilmente observável na assimilação pela criança, das estruturas e formas gramaticais que ocorre primeiro do que a assimilação das estruturas e operações lógicas correspondentes. Portanto, ela assimila a sintaxe da linguagem antes da assimilação da sintaxe do pensamento.

O terceiro estágio tem como característica, a utilização de signos externos para ajudar na resolução de problemas externos. Pode ser chamado de estágio dos signos mnemotécnicos externos no processo de memorização. Corresponde à linguagem egocêntrica, no desenvolvimento da fala.

O quarto estágio Vigotski (2001), utilizando uma metáfora, denominou-o de crescimento para dentro, pois, há uma mudança substancial nas operações que eram externas e se interiorizam. A criança opera mentalmente utilizando-se da memória lógica, ou seja, opera com relações interiores em forma de signos, também interiores. No desenvolvimento da fala, a isto corresponde a linguagem silenciosa ou interior. Existe uma interação dinâmica entre as operações externas e internas, uma se transformando facilmente na outra.

As fases do desenvolvimento da linguagem infantil ocorrem de forma que, inicialmente, a criança sempre vai pronunciar palavras isoladas, os substantivos. Em seguida, aos substantivos, são incorporados os verbos e a criança começará a comunicar-se por meio de frases com dois termos. No terceiro período, aparecem os adjetivos e, quando a criança já se utiliza de um número significativo de frases, aparece o relato como a descrição de desenhos.

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final de alguns anos ela domina as orações compostas, suas partes principais e subordinadas, e o encadeamento das orações dá lugar ao relato, de certa forma, coerente.

A linguagem, em seu aspecto funcional desenvolvido, apresenta duas facetas: o lado fonético, a sua faceta verbal, mantém relação com o aspecto exterior da linguagem, e a faceta semântica da linguagem, seu lado significativo, que consiste em dar sentido ao que é dito e em retirar o significado do que se vê, se ouve e se lê.

1.4 A Relação Pensamento e Linguagem

O estudo da relação entre pensamento e palavra na consciência desenvolvida se apresenta como um desafio, dada às peculiaridades de sua construção, e, por se tratar de um processo complexo, sutil e misterioso da psique humana.

A meta da investigação de Vigotski (2001), e seu direcionamento teórico, é apresentar a relação entre pensamento e a palavra, como um processo dinâmico que vai do pensamento à palavra, da palavra ao pensamento, em constante desenvolvimento.

O desenvolvimento dessa relação passa por fases, estágios, transformações próprias, um desenvolvimento funcional que abdica do aspecto puramente etário para apresentar o movimento do processo de pensamento, da idéia à palavra.

A expressão do pensamento não acontece somente na palavra, mas ela se torna sua materialização, sua existência concreta, palpável. Ela é a própria expressão da consciência desenvolvida.

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A atividade principal, de uma análise da relação do pensamento com a palavra, é o estudo das fases, dos planos pelos quais passa o pensamento que se materializa na palavra.

A análise realizada por Vigotski (2001) levou à discriminação de dois planos na linguagem. O primeiro se refere ao aspecto semântico, interior da linguagem, e, o segundo, ao aspecto físico e sonoro exterior que, apesar de constituírem uma unidade, tem leis de desenvolvimento diferenciadas. A unidade da linguagem é complexa e heterogênea.

A existência do movimento da linguagem, nos aspectos semântico e físico, é apresentada em vários fatos relacionados ao desenvolvimento da linguagem da criança. Os dois mais importantes serão mencionados. O primeiro se refere ao aspecto externo da linguagem se desenvolver na criança a partir de uma palavra, depois, no sentido de uma frase simples, e da relação de frases resultarem em proposições complexas, e numa linguagem coordenada e formada pela variedade desenvolvida de orações.

Portanto, ao assimilar o aspecto fásico da linguagem a criança trilha o caminho que vai das partes para o todo. Por seu significado, a primeira palavra equivale a uma frase inteira, uma oração resumida, breve.

No desenvolvimento do aspecto semântico da linguagem, a criança inicia-se pelo todo, por uma oração, e, só com o desenvolvimento dentro de um tempo, passa a apreender as unidades particularizadas e semânticas, os significados de certas palavras. Estes são desmembrados em uma série de significados verbais interligados, o seu pensamento resumido e expresso em uma oração também concisa.

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Nos dois planos, semântico e sonoro da linguagem, não há confluência nos movimentos. Podem unir-se em uma linha, mas podem, também, transitar por linhas totalmente opostas. Podem apresentar uma unidade interior, entre ambos os aspectos da linguagem, ou podem, no processo de desenvolvimento infantil, manifestar grande discrepância entre eles.

O pensamento da criança inicia-se de forma inteira e confusa, e manifesta-se em uma palavra isolada, como se a criança escolhesse uma vestimenta de linguagem sob medida para seu pensamento. O pensamento da criança se separa se desmembra e passa a se edificar a partir de unidades particulares, trilhando o caminho das partes para o todo desmembrado em sua linguagem. A linguagem não é a imagem da estrutura do pensamento refletida no espelho. Ao transformar-se em linguagem, o pensamento refaz sua estrutura e transforma-se. Ele não se exprime de forma total, mas se realiza na palavra.

Por todas as análises realizadas por Vigotski (2001), pode-se dizer que os processos de desenvolvimento dos aspectos semântico e sonoro da linguagem, de sentidos opostos, são processos dialéticos, constituem uma autêntica unidade por força de sua oposição.

O segundo fato importante, no campo do desenvolvimento da linguagem infantil, ocorre em um período mais tardio desse desenvolvimento. Relaciona-se à gramática que se adianta à lógica. A criança emprega adequadamente as conjunções que esclarecem as relações de causa e efeito, temporais, adversativas, condicionais e outras em sua linguagem cotidiana, porém não apresenta consciência do aspecto semântico de tais conjunções. Não consegue, ao longo de toda a idade escolar, empregar as conjunções de forma arbitrária.

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viabilizar a unidade interna do significado e da palavra, traduzindo relações lógicas complexas.

Há, também, o descompasso entre os aspectos semânticos e fásicos no funcionamento do pensamento desenvolvido, que é de grande relevância no estudo da relação pensamento e palavra. Para se descobrir tal discrepância, é necessário realizar uma análise funcional, apesar, da análise genética fornecer conclusões fundamentais também de cunho funcional.

A análise funcional da linguagem destaca a discrepância entre o sujeito gramatical e psicológico e o predicado. Demonstra que, numa frase complexa, o predicado psicológico pode ser qualquer termo integrante da oração. Desde que tal termo assuma o acento lógico, cuja função semântica é, exatamente, destacar o predicado psicológico.

O exemplo posto por Vigotski (2001) elucida bem tal fato: na frase “O relógio caiu” mostra que, dependendo da situação em que a frase for pronunciada, terá um sentido. No caso de se perceber o relógio parado e se indagar sobre o que aconteceu com ele e ouvir a resposta “O relógio caiu”, como já existia uma consciência representativa do relógio, este passa a ser o sujeito psicológico – aquilo de que se fala. Nesse caso, as articulações: gramatical e psicológica coincidem, mas isso pode não ocorrer.

Em outra situação, uma pessoa ouve um barulho de um objeto que caiu e pergunta o que caiu. A resposta é “o relógio caiu”. Nesse caso, antes não havia a consciência representativa do objeto que caiu. Portanto, “caiu” é aquilo de que se fala, o sujeito psicológico. Aquilo que se diz desse sujeito, surge na consciência, é uma representação: é o relógio que no caso, é o predicado psicológico.

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ou formais ocultam categorias psicológicas: a fonética, a morfológica, o léxico, a semântica, o ritmo, a métrica e a música.

Apesar da discrepância entre os aspectos fásico e semântico da linguagem, há a unidade e, tal descompasso, pressupõe tal unidade. A discrepância não impede a concretização do pensamento na palavra, é condição básica para que o movimento entre o pensamento e a palavra possa desenvolver.

Vigotski (2001) utilizou-se de dois exemplos para explicar como as mudanças da estrutura formal e gramatical levam a uma mudança profunda de todo o sentido da linguagem, clarificando a dependência interna entre os seus dois planos. A tradução da fábula “A cigarra e a formiga”, do francês para o russo, em que a cigarra foi substituída pela libélula. O gênero gramatical predominou sobre o significado real para garantir a intenção do texto e, para tanto, foi necessário impingir características da cigarra à libélula.

O segundo exemplo se refere à tradução do poema “O pinheiro e a palmeira”, que, para garantir a nuance semântica do texto original, o pinheiro foi substituído pelo cedro. Um outro autor fez a tradução do mesmo poema conservando a integridade do mesmo. Com isso, o poema, em outra língua, perdeu a nuance semântica acarretando mudanças semânticas em todo o discurso. O que parecia uma simples mudança de um detalhe gramatical, em tais condições, levou à modificação de todo o aspecto semântico do discurso.

A análise dos dois planos da linguagem leva a concluir que a discrepância entre eles, mostra um movimento, uma transição da sintaxe dos significados para a sintaxe da palavra, a metamorfose da gramática do pensamento em gramática das palavras, a transformação da estrutura semântica com sua materialização em palavras.

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aparecem simultaneamente, mas pressupõem uma transição e um movimento de uma para a outra. Esse processo complexo de transição dos significados para os sons se desenvolve.

A decomposição da linguagem em seus aspectos semânticos e fonológicos surge apenas no processo de desenvolvimento: a criança precisa diferenciar ambos os aspectos da linguagem; conscientizar-se da diferença e da natureza de cada um desses planos, para tornar possível a passagem pelos estágios que se pressupõe, no processo vivo da palavra conscientizada.

A criança passa, inicialmente, pela fase da não conscientização das formas e dos significados das palavras e pela não diferenciação deles.

Em seguida, a criança percebe a palavra em sua estrutura sonora como propriedade inseparável do objeto. Tal fenômeno parece próprio de toda consciência lingüística primitiva. Respostas das crianças a questões como “por que a vaca se chama vaca”, mostram que, antes da idade escolar, a criança explica os nomes dos objetos pelas suas características próprias: “a vaca se chama vaca porque têm chifres”.

A criança, nessa fase, não consegue substituir o nome de um objeto por outro, pois, ao transferir o nome, teria que transferir suas propriedades e, isso lhe seria impossível. Portanto, nesse momento, há uma estreita e indissolúvel ligação entre as propriedades do objeto e seu nome.

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Com referência à função comunicativa dos significados, a comunicação da criança, por meio da linguagem, está ligada de forma direta à diferenciação dos significados das palavras e à tomada de consciência de tais especificidades.

Na construção do significado da palavra, há, em sua estrutura semântica a sua referencialidade concreta e o seu significado e é importante verificar que eles não coincidem.

Funcionalmente, pode-se diferenciar as funções indicativa e nominativa da palavra, como também a sua função significativa. O estudo comparativo das relações estruturais e funcionais do início, meio e final do desenvolvimento, mostrou a existência da seguinte lei genética: no início do desenvolvimento, na estrutura da palavra, existe a referencialidade (o conceito, informação ou imagem mental que o signo transmite ao seu usuário) concreta, exclusiva e, dentre as funções, existem a indicativa e nominativa. O significado independente da referencialidade concreta e a significação independente da indicação e nomeação do objeto aparecem em momento posterior e se desenvolvem pelas vias genéticas e funcionais.

Ao se comparar as peculiaridades estruturais e funcionais da palavra da criança e do adulto tem-se:

Quadro 2 - Referencialidade concreta

Referencialidade concreta

Criança Adulto Inicio do desenvolvimento existe a

referencialidade concreta exclusiva – funções indicativa e nominativa.

Manifestação nítida e intensa.

Manifestação menos visível e mais fraca

A palavra é parte do objeto, uma de suas propriedades – a ligação é indissolúvel.

A palavra pode separar-se do objeto facilmente; pode substituir o objeto no pensamento; pode ter vida autônoma.

Diferenciação insuficiente da referencialidade concreta e do significado da palavra A palavra está simultaneamente mais

próxima e mais distante da realidade.

A palavra se aproxima totalmente da realidade.

(elaborado pela autora)

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Quando o processo de desenvolvimento encontra-se em sua etapa final ou dos conceitos verdadeiros, surgem as relações complexas entre os planos semântico e fásico da palavra.

Tal diferenciação de ambos os planos cresce ao longo dos anos e é acompanhada do desenvolvimento do caminho que o pensamento percorre no curso da modificação da sintaxe dos significados em sintaxe das palavras.

Nessa transformação da relação lógica, o pensamento imprime a marca do acento lógico em uma das palavras de uma frase, colocando em destaque o predicado psicológico sem o qual a frase não é passível de ser compreendida.

A ação de falar exige a transição do plano interior, semântico, para o exterior, fásico, sonoro, enquanto o entendimento da fala pressupõe o movimento inverso do plano sonoro, externo da linguagem para o semântico, interno.

Em se tratando do plano semântico, é necessário compreender mais profundamente a estrutura interna da linguagem, pois, se trata do plano da linguagem interior. Para compreender a natureza psicológica da linguagem interior, faz-se necessário que se realize um estudo específico sobre os dados fundamentais sem os quais não se pode conceber a relação entre pensamento e palavra.

A questão primordial, entendida por Vigotski (2001), por ser o pioneiro em tal estudo, foi a clarificação terminológica de linguagem interior. Ela já foi confundida com memória verbal, que é um dos momentos determinantes dela, mas não encerra todas as suas especificidades.

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A linguagem interior tem uma função com especificidade própria e, para estudá-la, é necessário diferenciá-la tanto do pensamento quanto da palavra e distinguir suas particularidades. Ela é uma linguagem individualizada, para si, enquanto a linguagem exterior é coletiva cuja meta é o outro.

Portanto, é claro que a linguagem interior é oposta à linguagem exterior e por suas características torna-se uma área de difícil investigação na psicologia, segundo Vigotski (2001).

Em termos experimentais, o estudo da linguagem interior permaneceu quase inacessível até se conseguir aplicar o método genético. O desenvolvimento foi o pilar mais importante para a compreensão de tal linguagem com toda sua complexidade e seu status de uma das funções interiores mais difíceis de ser explicada da consciência humana.

As investigações vigotskianas elegeram a linguagem egocêntrica como a porta aberta, o método fundamental para o entendimento da linguagem ou discurso interior. Isto, porque ela é vocalizada, sonora, exterior, mas, ao mesmo tempo, interior por sua estrutura e suas funções.

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Vigotski (2001) propõe para a linguagem egocêntrica da criança, a seguinte teoria: ela é uma das formas em que se manifesta a transição dos modos de atividade social, coletiva, para as funções individuais, isto é, das funções interpsicológicas para as intrapsicológicas.

A transição é a lei geral que ocorre no desenvolvimento das funções psíquicas superiores. Tais funções iniciam-se de forma participativa, em cooperação, e só então são transferidas, pela criança, para o campo das suas formas psicológicas de atividades. A linguagem para si é fruto da diferenciação da função social da linguagem para os outros, externa.

O caminho do desenvolvimento da criança é a individualização gradual que surge embasada, alicerçada na sociabilidade interior da criança.

Há semelhança entre a linguagem egocêntrica e a linguagem interior: é independente, tem uma função autônoma que está na base da orientação intelectual, da consciência da superação de obstáculos, da reflexão e do pensamento. Desenvolve-se por uma linha de ascendência e de evolução, em sua destinação genética, que trilha pelas vias de desenvolvimento construtivo, criativo e cheio de significado positivo.

A vocalização, uma característica da linguagem egocêntrica, declina para dar lugar à abstração que se desenvolve a partir do aspecto sonoro da linguagem, e é um dos principais traços constitutivos da linguagem interior. A abstração é fruto da progressiva diferenciação da linguagem egocêntrica com a linguagem comunicativa, da crescente capacidade da criança para pensar, imaginar as palavras, de operar com a imagem delas, ao invés de pronunciá-las.

A principal distinção entre a linguagem interior e a exterior é a ausência de vocalização da primeira, ela é silenciosa.

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plano da linguagem exterior, mas mantém com ela uma inseparável unidade dinâmica de transições de um plano a outro.

A disposição das palavras na frase, das frases no discurso, a relação lógica das frases entre si e sua construção gramatical constituem a peculiaridade fundamental da linguagem interior, ou seja, sua sintaxe é absolutamente específica.

Há, na linguagem interior, a tendência original para a abreviação da frase e da oração, no sentido de se manter o predicado e os outros termos da oração a ele ligados, a custa da omissão do sujeito e das palavras a ele vinculadas. É a tendência para uma sintaxe predicativa característica da linguagem interior, ou seja, sua forma sintática basilar é a predicatividade.

A predicatividade pura aparece na linguagem interior em dois casos específicos: numa situação de resposta e numa situação em que o sujeito a ser enunciado é de conhecimento antecipado dos interlocutores. Em ambos os casos, o sujeito da enunciação está presente nos pensamentos do interlocutor. Se existe coincidência nas suas idéias, há a compreensão, o entendimento se concretiza só por meio de dois predicados.

Uma questão central, para toda linguagem interior, é o problema da abreviação. A simplicidade da sintaxe, a condensação do enunciado do pensamento, o número reduzido de palavras estão na base da tendência à predicatividade. Tais características da linguagem interior podem levar à compreensão total ou ao seu oposto, o desentendimento. Se o sujeito é comum aos pensamentos dos interlocutores, a compreensão acontece com sucesso.

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Na linguagem exterior, o fenômeno da abreviação ocorre quando há um sujeito comum no pensamento dos interlocutores. Neste caso, há a compreensão total com o uso do discurso abreviado, com a grande simplificação da sintaxe. Porém, em caso contrário, o entendimento não acontece nem que se use o discurso desenvolvido.

Portanto, a comunicação só é passível de ser compreendida, se os interlocutores se habituarem a apreender o pensamento alheio, a entrarem em contato psicológico com o outro. Quanto maior o contato, maior a possibilidade de comunicação por meias palavras, até mesmo de idéias complexas.

Com base no entendimento sobre o fenômeno da abreviação na linguagem exterior, que ocorre somente em alguns casos, Vigotski (2001) concluiu que na linguagem interior tal fenômeno é inerente a ela. Sempre que ela funciona, há a abreviação.

Para maior clareza sobre a importância do fenômeno da abreviação para a linguagem interior, o autor fez uma comparação entre a linguagem exterior, a escrita e a interior.

Na linguagem escrita, como há a ausência do interlocutor, é necessário que se empregue muitas palavras para comunicar cada pensamento isolado. O pensamento emitido se expressa nos significados formais das palavras, diferenciando da linguagem falada que conta com a presença do interlocutor e com certas peculiaridades próprias da linguagem exterior.

Como o discurso escrito é realizado sem a presença do interlocutor, ele utiliza-se da decomposição sintática em seu grau máximo e, raramente, pode contar com a compreensão por meio das meias palavras ou por causa de juízos predicativos.

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Segundo Tompson (conforme citado por Vigotski, 2001), na linguagem escrita existe o hábito de se empregar palavras, construções frasais, expressões que causariam estranheza na linguagem falada.

Em suma, cada tipo de linguagem tem suas peculiaridades próprias e seu funcionamento diferenciado em termos de uso de expressões, formas gramaticais e sintaxe.

Para a Psicologia da Linguagem, é fundamental a distinção entre as modalidades de discurso caracterizadas como monológico e dialógico. A linguagem interior e a escrita são modalidades monológicas de linguagem. Na grande parte dos casos, a linguagem falada é dialógica.

A comunicação dialógica parte de alguns pressupostos: os interlocutores devem conhecer o tema do discurso; há a percepção visual dos gestos e da mímica dos interlocutores; há a percepção auditiva de toda a sonoridade e entonação utilizadas na fala. Sendo assim, pode ocorrer, em determinados momentos, a abreviação da linguagem falada e a compreensão de juízos predicativos que eventualmente ocorram.

No diálogo, a entonação pode transmitir o contexto psicológico do falante, e isso possibilita o entendimento da palavra conscientizada. Pode, também, apresentar no discurso uma forte tendência para a abreviação.

Na escrita, os momentos que facilitam a abreviação da linguagem falada, quer sejam o conhecimento do sujeito ou a transmissão imediata do pensamento, por meio da entonação, não são possíveis de acontecer. Na linguagem escrita é imprescindível que se empregue muito mais palavras que na linguagem falada para transmitir um mesmo pensamento.

(50)

expressiva, nem da percepção imediata do contexto dialógico. A compreensão é obtida pelas palavras e combinações. É a linguagem escrita, a atividade complexa do discurso.

Em função da complexidade discursiva da linguagem escrita, que se faz uso do rascunho. A via de transição entre o esboço e o ato de passar a limpo é o caminho da atividade complexa, e, mesmo inexistindo a cópia, há um forte momento de reflexão. É comum que aconteça a fala para si mesmo, antes da transformação em escrita – isso recebeu o nome de rascunho mental.

Ao rascunho mental da escrita, Vigotski (2001) deu o nome de linguagem interior. Em função de seu interesse pela tendência à abreviação, fez comparações entre a linguagem falada, a escrita e a interior. Em síntese, pode-se afirmar que, na linguagem falada, a tendência para a predicatividade surge em determinados casos. Na linguagem escrita nunca ocorre e, na linguagem interior sua existência é perene.

Em termos psicológicos, a predicatividade é a maneira única, fundamental e absoluta da linguagem interior. Sua lei é omitir o sujeito e constituir-se tão somente de predicado.

Os experimentos vigotskianos, sobre quais seriam os fundamentos da predicatividade completa e absoluta que funciona como regras na linguagem interior, apresentaram como conclusões: a pessoa sempre sabe o tema de sua linguagem interior, sempre está a par da sua própria situação interna, o assunto do diálogo interior é sempre do conhecimento da pessoa. Sabe-se o que se pensa. O sujeito do juízo interior é sempre presente no pensamento, está sempre subentendido. Compreende-se a si mesmo por abreviação, por meias palavras, por insinuações.

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Tabela 1 - Nível de Escolaridade, Idade e Sexo dos Participantes da Pesquisa
Tabela 2 - Desempenho dos sujeitos no subteste Vocabulário – WISC III  Sujeito Idade  Pontos
Tabela 3 - Evolução das Respostas dos Sujeitos nos Estágios do Desenvolvimento do  Conceito  3º Estágio –  Conceito  2º Estágio – Complexos  1º Estágio – Amontoados  Palavras  Desconhecidas  Sujeito/Idade         10      06       00        14     I     7 a
Tabela 5 - Prova Vocabulário – Evolução das Respostas dos Sujeitos nos Estágios do  Desenvolvimento do Signo  4º Estágio –  Internalização  3º Estágio – Signos  Externos  Palavras
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