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O que é o pentagrama?

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Academic year: 2021

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O que ´

e o pentagrama?

Um amuleto m´ıstico!

Dois mil anos depois dos pitag´oricos, o astr´onomo e matem´atico alem˜ao Johann Kepler (1571-1630) escrevia liricamente: “A Geometria tem dois grandes tesouros: um ´e o

te-orema de Pit´agoras; o outro, a divis˜ao de um segmento em m´edia e extrema raz˜ao. O primeiro pode ser comparado a uma medida de ouro; o segundo podemos chamar de joia preciosa.”

A joia preciosa a que Kepler se referia podia muito bem ser o pentagrama ou estrela de cinco pontas, representado na imagem anterior. De facto, ´e muito frequente encontrarmos pessoas com o amuleto da figura, tanto em pulseiras como pendentes em colares. Trata-se, sem d´uvida, de um belo objeto que, talvez por isso, fica sempre bem. Mas o curioso ´e que a maioria das pessoas n˜ao sabe o que esta estrela representa, nem conhece parte da sua hist´oria. Curiosamente, o pentagrama pode ser desenhado sem levantar o l´apis do papel, bastando para tal tra¸car todas as diagonais de um pent´agono regular. Dif´ıcil ´e construir o pent´agono, como veremos adiante.

Desde a sua descoberta, o pentagrama foi e ainda ´e um s´ımbolo m´agico, sendo talvez um dos s´ımbolos que tenha assumido mais interpreta¸c˜oes, algumas das quais bastante esot´ericas. No Egito era o s´ımbolo do ´utero da terra. Segundo algumas tradi¸c˜oes ocultas posteriores simbolizava a uni˜ao do masculino com o feminino (o andr´ogino). Para os he-breus era o s´ımbolo da verdade, em men¸c˜ao do Pentateuco (os cinco primeiros livros do Antigo Testamento). Para os agn´osticos representava a Estrela Ardente, um s´ımbolo rela-cionado com a magia e com os mist´erios do c´eu noturno. Os primeiros crist˜aos associavam-no `as cinco chagas de Cristo. Para os Dru´ıdas era o s´ımbolo do diviassociavam-no. O pentagrama dentro de um c´ırculo (imagem anterior) ´e o s´ımbolo da religi˜ao Wicca. Tal como a cruz est´a para o cristianismo e o hexagrama est´a para o juda´ısmo, o pentagrama identifica os wiccanos. Aparece no renascimento associado `a chamada geometria sagrada ou herm´etica e ´e ainda hoje muito usado como s´ımbolo da figura humana. Quando o pentagrama se in-verte, de modo a apresentar uma ponta para baixo, recebe o nome cabal´ıstico de pent´aculo e ´e frequentemente utilizado para representar o Diabo. No ´atrio da sede do edif´ıcio da Funda¸c˜ao Calouste Gulbenkian, em Lisboa, encontra-se o magn´ıfico painel Come¸car de

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Almada Negreiros (1893-1970), gravado em calc´ario polido, onde surgem v´arios s´ımbolos geom´etricos, entre eles um pentagrama. No romance O C´odigo Da Vinci de Dan Brown, o professor de simbologia de Harvard (Robert Langdon) aventura-se em v´arias explica¸c˜oes matem´aticas, passando pelo pentagrama descrito pelo planeta V´enus, pelo pent´aculo e pelo n´umero de ouro.

Agora olhe `a sua volta. Vˆe algum pentagrama? Provavelmente n˜ao, mas eu mostro-lhe alguns. S´o na bandeira da Uni˜ao Europeia encontra doze. Ali´as, aparece nas bandeiras de mais de sessenta pa´ıses. Ao longo do tempo estas estrelas tornaram-se s´ımbolos de excelˆencia (por exemplo: hot´eis e filmes), de ˆexito (alcan¸car o estrelato) e de autoridade (general de quatro estrelas). Identifica os favoritos da sua home page de Internet. H´a tamb´em v´arios logotipos comerciais com padr˜oes com estas estrelas. N˜ao se lembra dos famosos t´enis da estrela?

E o que representa o pentagrama para os matem´aticos? Eis a quest˜ao que nos intriga. Para os matem´aticos o pentagrama ´e mais um s´ımbolo do poder do conhecimento, da imagina¸c˜ao e do racioc´ınio. O pentagrama foi o s´ımbolo especial da escola pitag´orica. De facto, o s´ımbolo ´e bem mais antigo do que Pit´agoras, que tˆe-lo-´a trazido do seu p´eriplo pela Babil´onia, onde a estrela tinha j´a um valor m´ıstico.

Comecemos por outra obra dos pitag´oricos − a constru¸c˜ao do pent´agono regular. Re-cordemos que as ferramentas dos antigos gregos eram a r´egua n˜ao graduada e o compasso. Vamos efetuar a constru¸c˜ao do pent´agono regular recorrendo exclusivamente a estes dois instrumentos, isto ´e, recorrendo apenas ao tra¸cado de retas e circunferˆencias. Para tal, partimos apenas de dois pontos e usamos como novos pontos aqueles que resultam da interse¸c˜ao de duas retas, de duas circunferˆencias ou de uma reta e uma circunferˆencia. ´E claro que tendo dois pontos podemos sempre tra¸car a reta (ou o segmento) que passa por esses pontos, assim como a circunferˆencia com centro num dos pontos e que passa pelo outro.

Na figura seguinte, A e B s˜ao os pontos iniciais e todos os outros pontos s˜ao obtidos atrav´es das regras que acabamos de definir. As linhas auxiliares da constru¸c˜ao (retas e circunferˆencias) est˜ao a tracejado. Sugiro que acompanhe esta constru¸c˜ao usando um programa de geometria dinˆamica.

1. Tra¸ca-se a circunferˆencia de centro A e que passa por B, que identificamos por AB;

2. Constr´oi-se a reta AB e a perpendicular a AB pelo ponto A. Estas retas intersetam AB

noutros pontos que designamos por C, D e E; 3. Constr´oi-se o ponto m´edio, F , do segmento AE;

4. Com centro em F tra¸ca-se o arco BG (ou a circunferˆencia FB), sendo G o ponto de AC

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5. Constr´oi-se o ponto m´edio, H, do segmento AG;

6. Tra¸ca-se uma paralela `a reta AB pelo ponto H. Esta paralela interseta AB nos pontos I

e J (que s˜ao dois v´ertices do pentagrama);

7. Constroem-se as circunferˆencias IC e JC que intersetam ABem dois novos pontos, L e K,

diferentes de C;

8. Finalmente, constr´oi-se o pol´ıgono CJKLI que ´e o pent´agono regular pretendido (e tem centro no ponto A).

Efetuada a constru¸c˜ao do pent´agono pode, se preferir, esconder todas as linhas auxi-liares. b A b B AB b C b D bE b F b G bH bI b J IC JC b K b L

Suponha agora, caro leiror, que j´a tem o pentagrama constru´ıdo1

. Experimente tra¸car todas as diagonais desse pent´agono sem levantar o l´apis do papel. Conseguiu? Que figura obteve? C´a est´a ele (figuras seguintes), o nosso pentagrama ou estrela de cinco pontas. Por´em, invertido dentro das linhas da estrela, encontra-se um novo pent´agono.

Dentro das diagonais do pent´agono . . . surge o pentagrama

1Se o leitor n˜ao quiser (ou n˜ao conseguir) construir o pentagrama tal como acabei de expor pode re-correr `a ferramenta Pol´ıgono Regular do GeoGebra. Esta ferramenta permite construir qualquer pol´ıgono regular. No entanto, nem todos os pol´ıgonos regulares s˜ao construt´ıveis com r´egua e compasso, seguindo um processo idˆentico ao apresentado para o pent´agono regular.

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Tra¸cando as diagonais desse pent´agono interior, criamos uma nova estrela pequena e invertida, que ´e exatamente a mesma, em propor¸c˜ao, que a estrela original. Esta estrela, por sua vez, cont´em um pent´agono ainda mais pequeno, que cont´em uma estrela mais pequena no seu pequen´ıssimo pent´agono. E, continuando, o resultado ´e sempre uma estrela de cinco pontas semelhante. Pensa-se que o interesse pitag´orico no pentagrama (e na raz˜ao de ouro) come¸cou aqui, precisamente neste conjunto infinito de pent´agonos e pentagramas que se encaixam uns nos outros. Fazendo o mesmo a partir de duas pontas da estrela vemos tamb´em aparecer uma sequˆencia de pentagramas cada vez mais pequenos at´e desaparecerem.

O pentagrama constitui um vislumbre do infinito!

Contudo, a propriedade mais importante do pentagrama n˜ao est´a na sua autosseme-lhan¸ca. Encontra-se escondida nas linhas da estrela. Se unirmos uma ponta da estrela com as duas pontas opostas ficamos com um triˆangulo is´osceles (figura seguinte). Esse triˆangulo tem dois ˆangulos de 72o

e o menor de 36o

, isto ´e, metade de cada um dos outros. Estamos perante o triˆangulo de ouro (lembra-se?). J´a vimos que a raz˜ao entre o lado maior (figura da direita), representado por a, e o menor (b) de um triˆangulo dourado ´e um n´umero irracional chamado n´umero de ouro. Essa raz˜ao aparece tamb´em entre a distˆancia que liga duas pontas consecutivas da estrela (b) e o comprimento de uma haste (c), ou entre o comprimento de uma haste (c) e a medida da sua base (d). Como vimos com o triˆangulo dourado, tamb´em das propor¸c˜oes do pentagrama resulta

a b = b c = c d = . . . = φ = 1, 61803398... 36o 72o 72o b a c d

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Quando os pitag´oricos descobriram que as propor¸c˜oes do pentagrama eram a sec¸c˜ao ´aurea (hoje chamado n´umero de ouro), tornaram este s´ımbolo estrelado como o s´ımbolo da sua escola. Por´em, uma das mais controversas quest˜oes da escola pitag´orica est´a relacionada com o pentagrama. Os pitag´oricos n˜ao conseguiam exprimir a raz˜ao entre a diagonal do pent´agono e o lado desse pent´agono como quociente entre dois n´umeros inteiros. Quando chegaram a esta conclus˜ao ficaram muito atormentados, pois isto era contr´ario a toda a l´ogica que conheciam e defendiam (tudo era mensur´avel atrav´es dos n´umeros inteiros ou das suas raz˜oes) que lhe chamaram incomensur´avel (que atualmente, chamamos irracional).

Hoje podemos n˜ao ter a certeza se os pitag´oricos observaram ou n˜ao esse processo infinito, ou se dele tiraram conclus˜oes significativas. At´e mesmo a quest˜ao fundamental de saber se os pitag´oricos de cerca de 500 aC sabiam dividir um segmento em m´edia e extrema raz˜ao (sec¸c˜ao de ouro) n˜ao pode ser respondida com seguran¸ca, embora pare¸ca muito prov´avel que sim. Mas uma coisa ´e certa, a irracionalidade que tanto atormentou a escola pitag´orica esteve sempre pendurada na sua porta de entrada. Afinal, sem querer, foram os pitag´oricos que descobriram os n´umeros irracionais.

Algumas fontes bibliogr´aficas

BOYER Carl B., Hist´oria da matem´atica, S˜ao Paulo, Editora Edgard Blucher, 2002. CRATO Nuno, et al, A espiral dourada, Lisboa, Gradiva, 2006.

Referências

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