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Representações sociais da escola em produções de alunos do Ensino Fundamental

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Academic year: 2021

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CINTHIA VIEIRA BRUM LIMA

REPRESENTAÇÕES SOCIAIS DA ESCOLA

EM PRODUÇÕES DE ALUNOS DO ENSINO

FUNDAMENTAL

CAMPINAS

2014

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UNIVERSIDADE ESTADUAL DE CAMPINAS FACULDADE DE EDUCAÇÃO

CINTHIA VIEIRA BRUM LIMA

REPRESENTAÇÕES SOCIAIS DA ESCOLA EM

PRODUÇÕES DE ALUNOS DO ENSINO

FUNDAMENTAL

Orientador(a): Prof. Dr. Sérgio Antônio da Silva Leite

Dissertação de Mestrado apresentada ao Programa de Pós- Graduação em Educação da Faculdade de Educação da Universidade Estadual de Campinas para obtenção do título de Mestra em Educação, na área de concentração de Psicologia Educacional.

ESTE EXEMPLAR CORRESPONDE À VERSÃO FINAL DA DISSERTAÇÃO DEFENDIDA PELA ALUNA CINTHIA VIEIRA BRUM LIMA E ORIENTADA PELO PROF.DR. SERGIO ANTÔNIO DA SILVA LEITE.

CAMPINAS 2014

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v

UNIVERSIDADE ESTADUAL DE CAMPINAS FACULDADE DE EDUCAÇÃO

DISSERTAÇÃO DE MESTRADO

REPRESENTAÇÕES SOCIAIS DA ESCOLA EM PRODUÇÕES DE

ALUNOS DO ENSINO FUNDAMENTAL

Autor: Cinthia Vieira Brum Lima

Orientador: Prof. Dr. Sérgio Antônio da Silva Leite

Este exemplar corresponde à redação final da Dissertação defendida por Cinthia Vieira Brum Lima e aprovada pela Comissão Julgadora.

2014

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AGRADECIMENTOS

Ao querido professor Sérgio, por toda a sua orientação no decorrer deste trabalho. Sempre atento, organizado, lendo e acompanhando tudo o que fiz, tornou-se um "professor inesquecível”1" para mim.

À professora Ana Smolka e aos colegas de seu grupo de pesquisa, o GPPL, por contribuírem muito para a minha formação problematizando e desafiando a sempre (re)pensarmos a educação, nossas práticas e o conhecimento.

Às professoras Ângela Soligo e Leila Salles, por contribuírem com valiosos apontamentos nas bancas de qualificação e defesa e, ainda, à Ângela por me socorrer desde o início indicando leituras importantes dentro do campo das Representações Sociais.

À Luciane Grandin, pelas conversas e indicação de leituras.

Ao grupo de pesquisa ALLE, em especial à Ana Cláudia, por todo o companheirismo e partilha de conhecimentos.

A todos os professores que já tive, da pré-escola à pós-graduação, pelo ensino. Às crianças, por nos desafiarem a sermos sempre melhores educadores.

A todos os professores e profissionais da educação que lutam por uma educação de qualidade. Todos aqueles com os quais trabalho diariamente e, em particular, aqueles com os quais tive a oportunidade e o privilégio de estabelecer frutíferas parcerias, Ana Flávia, Jean, Polly e Paulo. Vocês me inspiram por seu engajamento, conhecimentos e amizade.

Ao Ivan, amigo querido, profissional dedicado, por sempre me incentivar.

Aos amigos, companheiros de caminhada, com os quais divido alegrias e tristezas, sem os quais a vida seria menos colorida. Em especial, Bete, Valéria, Flávia, Vivi, Eduardo e César: vocês estão sempre em minha mente e coração.

À minha irmã, exemplo de dedicação. À minha mãe, por tudo.

1 Professor inesquecível é um termo cunhado pelo Grupo do Afeto (grupo de pesquisadores ligados ao ALLE- UNICAMP) para designar aqueles professores que aproximam o aluno do objeto de conhecimento através de uma relação de ensino marcadamente afetiva.

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Ao meu amado Kleber, exemplo em tudo, companheiro de todas as horas, pra sempre.

A Deus, “porque dele, e por ele, e para ele, são todas as coisas.2

2 Palavras do Apóstolo Paulo, em sua carta aos Romanos, registradas no livro intitulado Carta aos Romanos, capítulo 11, verso 36.

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[...] sonhamos com uma escola que, sendo séria, jamais vire sisuda. A seriedade não precisa de ser pesada. Quanto mais leve é a seriedade, mais eficaz e convincente é ela. Sonhamos com uma escola que, porque séria, se dedique ao ensino de forma competente, mas, dedicada, séria e competentemente ao ensino, seja uma escola geradora de alegria. O que há de sério, até de penoso, de trabalhoso, nos processos de ensinar e aprender, de conhecer não transforma este quefazer em algo triste. Pelo contrário, a alegria de ensinar e aprender deve acompanhar professores e alunos em suas buscas constantes. Precisamos é remover os obstáculos que dificultam que a alegria tome conta de nós e não aceitar que ensinar e aprender são práticas necessariamente enfadonhas e tristes. (FREIRE, 2001, p. 37)

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xi RESUMO

Este estudo investiga as representações sociais de escola em produções de alunos do Ensino Fundamental de uma escola pública municipal em Campinas, SP. Está ancorado na Teoria das Representações Sociais (TRS), do franco-romeno Serge Moscovici, que parte dos estudos sobre Representações Coletivas de Durkheim para elaborar o conceito de representações sociais. Moscovici elege a TRS como o cerne da Psicologia Social. Está relacionada ao conhecimento do/elaborado pelo senso comum, com a finalidade de comunicação e orientação de comportamentos. Sendo a escola uma das instituições marcantes na vida do sujeito social, investigar as representações ali formadas sobre a própria instituição torna-se relevante. Inúmeros são os trabalhos que abordam as representações sociais sobre a escola ou elementos do universo escolar, formadas por educadores, no exercício da profissão, ou por estudantes universitários. Porém, os trabalhos que versam sobre as ideias, concepções, discursos e representações das crianças, “usuárias” diretas desta instituição aqui problematizada, são em menor quantidade, conforme se constata na literatura; neste cenário, dar voz aos alunos torna-se relevante. Foram então analisadas produções “livres” e direcionadas de alunos do 5º ano do Ensino Fundamental. A análise foi baseada nos pressupostos da pesquisa de cunho qualitativo, nos quais a análise é o processo de busca e de organização sistemática dos dados coletados, com o objetivo de aumentar a compreensão desses materiais e permitir apresentar aos outros o que foi encontrado. Assim, a partir da leitura cuidadosa das produções das crianças, foi feita a seleção daquelas que possuem conteúdos que contribuem para este estudo. Em seguida, buscou-se identificar possíveis núcleos e subnúcleos de significação referentes às representações sociais que os alunos têm de escola, os quais foram posteriormente discutidos à luz da base teórica assumida. Esperou-se, com este estudo, identificar e analisar as representações que os alunos têm de escola e, a partir daí, inferir as possíveis relações que essas representações têm com o modo de participação dos sujeitos nesse ambiente. Os resultados sugerem que os alunos representam positivamente a escola, como lugar privilegiado para a aquisição do conhecimento, espaço das relações, das brincadeiras e também como preparatória para a inserção no mercado de trabalho. Através de suas expectativas e sugestões, foi possível acessar seus desejos sobre a escola: é um lugar que deve ser limpo e organizado, harmonioso e preocupado em oferecer educação integral através de uma reorganização das práticas e espaços/tempos escolares. Ressalta-se a importância de se legitimar a voz dos alunos e engajá-los junto aos outros atores da comunidade escolar para participar das decisões escolares, a fim de forjar um sujeito autônomo e participativo.

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xiii ABSTRACT

This study investigates the school’s social representations among children of a municipal public school in Campinas, by focusing on their school activities. It is based on the Theory of Social Representations of the Franco-Romanian, Serge Moscovici, who was inspired by the notion of Collectives Representations of Émile Durkheim. The Theory of Social Representations was elected by Moscovici as the core of the Social Psychology and it gives us an insight into how knowledge is understood by the common sense with the purposes of stablishing communication and guiding behaviours. Schools are strong influences at the lives of social subjects; therefore it is relevant to investigate what are the created representations of these institutions by those who are inside them. Most of the papers about social representations of schools and their elements have as their subjects professionals in education and university students. Children, however, have not received the same attention, and only a lower number of papers about pupil’s representations of their schools have been written. In order to gather information about the views of these children, who are the direct “users” of the Elementary School here in study, an analysis of their schoolworks was done. The students were all on 5th grade, and some of their works were produced with the guidance of the educator and others without it. A framework of qualitative research was used in the analyses, thus the process of searching data and its posterior systematic organization, aim to increase the comprehension of the gathered material and to enable the presentation of the findings. After a careful reading of the children’s productions, a selection of what would contribute to this study was made. Next step was to identify possible significant nucleus and sub-nucleus related to the pupils’ social representations about the school. These were discussed under the chosen theoretical framework. The study expects to identify and analyse the social representations that the children have about the school and infer the possible relations between these representations and the way the subjects participate in school environment. The outcome of it suggests a positive representation of the school by its pupils, who view the school as a privileged place where they can acquire knowledge, build relationships, have fun and also be prepared for the labour market. Through their expectations and suggestions it was possible to know that they idealize school as a place that should be organized, clean and harmonious. They also demonstrated a wish to have a more extensive type of education, in its scope and content, by reorganizing school practices, space and timetables. It is noteworthy the importance of legitimizing pupil’s voice and engaging them with the others at the school community for the decision making, in order to create autonomous and participative beings.

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xv SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO ... 1

1.1 Objetivos ... 4

2 REVISITANDO A ESCOLA ... 5

2.1 Voz das crianças, voz dos alunos ... 14

3 A TEORIA DAS REPRESENTAÇÕES SOCIAIS ... 19

3.1 A Representação Social da Psicanálise ... 19

3.2 Sociedade de pensadores amadores ... 22

3.3 Estado atual da teoria... 32

3.4 A Teoria das Representações Sociais e o campo da Educação ... 34

4 PERCURSO METODOLÓGICO ... 37

4.1 Fundamentação teórica ... 37

4.2 Descrição do bairro e da escola ... 38

4.3 Descrição dos sujeitos ... 47

4.4 Procedimentos de coleta de dados ... 50

4.4.1 Produção A: "Escreva sobre a escola e suas expectativas para o 5º ano" ... 52

4.4.2 Produção B: “Coisas que eu mais gosto na escola, o que eu não gosto na escola e minhas sugestões" (desenhos e legenda/pequenos textos); ... 53

4.4.3 Produção C: "O que eu gosto e o que eu não gosto na escola" ... 54

4.4.4 Produção D: Textos livres ... 55

5 PROCEDIMENTOS DE ANÁLISE DE DADOS E RESULTADOS...57

5.1 Pré-análise dos dados e exploração do material ... 59

5.2 Núcleo 1 - Escola como o lugar do Conhecimento ... 60

5.2.1 Subnúcleo 1.1 - Conhecimento para crescimento pessoal ... 61

5.2.3 Subnúcleo 1.2 - Conhecer o mundo ... 65

5.2.4 Subnúcleo 1.3 - Ascensão social ... 67

5.3 Núcleo 2 – As Relações no espaço escolar ... 70

5.3.1 Subnúcleo 2.1 - Os amigos ... 71

5.3.2 Subnúcleo 2.2 - Os professores ... 74

5.3.3 Subnúcleo 2.3 - As brincadeiras ... 76

5.4 Núcleo 3 – Estrutura e funcionamento da escola ... 80

5.4.1 Subnúcleo 3.1 - Melhorias ... 80

5.4.2 Subnúcleo 3.2 - Tempos escolares... 84

5.4.3 Subnúcleo 3.3 - Organização do trabalho pedagógico ... 86

6 DISCUSSÃO ... 91

6.1 Escola como espaço (de aquisição) do conhecimento ... 93

6.2 Escola como preparatória para o mercado de trabalho ... 101

6.3 Escola como espaço das relações ... 107

6.4 Escola como espaço da brincadeira ... 113

6.5 (Re)organização escolar ... 116

6.6 A escola ideal ... 118

6.7 Sobre a importância de ser ouvido ... 120

7 CONSIDERAÇÕES FINAIS ... 123

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APÊNDICES ... 139 ANEXOS ... 169

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1 1 INTRODUÇÃO

O presente estudo teve como inspiração e motivação a continuidade dos estudos e pesquisas derivados da participação no projeto de melhoria do ensino público financiado pela FAPESP, denominado “Condições de desenvolvimento humano e práticas contemporâneas: as relações de ensino em foco”, coordenado pela Prof.ª Dr ª Ana Luiza B. Smolka através do projeto individual Práticas da sala de aula: um diálogo com Freinet (processo 2010/18606-4), que tratou da parceria com uma professora que trabalha com a pedagogia Freinet, e da possibilidade de conhecer novas práticas, novas formas de organização do trabalho pedagógico.

No decorrer da atividade investigativa acima citada, durante as discussões com o grupo e também quando das problematizações e análises do material empírico, a atenção foi sendo direcionada para a questão das ideias - que mais tarde foi compreendida como o que Moscovici (1978) denominou representações sociais - que o aluno produz sobre a escola e os demais elementos do universo escolar: o aluno, o professor, bem como a relação dessas ideias com a forma que a criança lida com o próprio conhecimento e se relaciona neste universo. Desta forma, esta questão tornou-se um elemento de investigação e problematização.

Um trecho do relatório final do projeto supracitado, submetido à FAPESP em julho de 2011, suscita estes questionamentos:

Percebi durante o percurso desta pesquisa que em muitos textos os alunos falam sobre a própria escola. Chamou-me a atenção o texto de José, o qual infelizmente não tenho para anexar neste trabalho, em que ele afirma seu sonho de ser milionário, e que para isso iria estudar bastante, aprender as lições e surpreender os professores. (Diário de campo, 2010). Aqui José revela a si mesmo e a sua concepção de mundo: o sonho de ser rico, a crença de alcançar este sonho através dos estudos, mas o que para mim é mais intrigante é ele revelar que o fato de ‘ele’ aprender as lições será ‘surpreendente’ para os professores. Ele coloca em xeque a função da escola. Ora, por que os professores ficarão surpresos com a aprendizagem de José? Ela não é, então, algo esperado? Ensina-se, mas não se acredita que esse aluno possa aprender? (BRUM, 2011)3

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2

Este texto problematizado no relatório para a Fapesp foi produzido por um aluno, e registrado em seu “caderno de texto livre”, instrumento da pedagogia Freinet, em que o aluno produz textos para os quais ele escolhe tanto a forma quanto o conteúdo dos mesmos.

Vale ainda ressaltar que a problematização e análise de elementos da produção das crianças no próprio exercício da profissão é uma prática que pode contribuir para uma educação pública de qualidade e transformadora na medida em que, para muitos estudiosos, tais como Nóvoa (2001), é urgente a valorização/formação do professor-pesquisador.

Embora existam grupos que defendam que pesquisa e ensino constituem atividades distintas e que, portanto, exigem estratégias de formação diferentes, há também aqueles que são:

[...] defensores da pesquisa como elemento essencial no trabalho docente e, consequentemente, nesta visão, os cursos de formação docente devem voltar seus currículos para a preparação dos professores para o exercício dessa atividade. (SANTOS, 2004, p.15)

E, ainda:

Um número considerável de autores, alguns bastante conhecidos por suas obras já traduzidas entre nós, como D. Schön, H. Giroux, M. Apple, J. Elliott, M. Young, T. Popkewitz, A. Nóvoa, K. Zeichner e outros têm afirmado a importância da pesquisa junto ao professor da educação básica, não apenas como resultado do trabalho feito por pesquisadores externos, mas quando realizada pelo próprio professor, de maneira integrada ao seu trabalho na escola, dentro de um processo de ação e reflexão. (LÜDKE, 1998, p. 30)

Assim, este estudo busca investigar as representações sociais de4 escola, reveladas em produções de alunos do Ensino Fundamental de uma escola pública municipal em Campinas.

O estudo visa identificar concepções que podem levar a escola, em especial a escola pública, a (re)pensar suas estratégias e organização, pois, certas

4 Machado (2013) insiste que “[...] a representação é sempre “de” e não “sobre” alguém ou alguma coisa. Entende-se que o “sobre” pressupõe um distanciamento entre sujeito e objeto de representação.”

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representações que circulam em seu ambiente podem favorecer ou não a aprendizagem dos alunos.

A escolha por uma escola pública não é aleatória, mas sim uma opção da pesquisadora, visto que a Educação é um direito assegurado pela Constituição Federal que deve ser garantido pelo Estado: é na escola pública o lugar em que a maioria dos brasileiros tem esse direito materializado.

Nos levantamentos bibliográficos empreendidos, verifica-se que este tipo de estudo é, na maioria das vezes, referenciado na Teoria das Representações Sociais (TRS), originada com a publicação do estudo “La Psychanalyse: Son image et son public” de 1961, obra publicada no Brasil em 1978, do romeno radicado na França, Serge Moscovici. Sua teoria das Representações Sociais parte dos estudos sobre Representações Coletivas de Durkheim (FARR, 2003).

Para Moscovici (1978, p.26), “em poucas palavras, a representação social é uma modalidade de conhecimento particular que tem por função a elaboração de comportamentos e a comunicação entre indivíduos”. Além disso, ele ressalta que tais representações possuem uma função constitutiva da realidade.

Sendo a escola uma das instituições marcantes na vida do sujeito social, cabe investigar sobre as representações ali formadas a seu próprio respeito. Como o comportamento dos alunos é orientado por essas representações? Refletir sobre tal assunto é uma possibilidade de melhor compreender e, assim, buscar formas eficazes de transformação das relações dentro do espaço escolar. Sobre a problematização da escola a partir da perspectiva da teoria moscoviciana, Feitosa (2012, p.60) afirma:

A ideia de escola foi e é longamente teorizada, ou seja, existem noções diversas que explicitam sua importância, sua configuração, a quem se destina, quando é mais eficaz, como influencia a sociedade, como e por quem é influenciada, quais conhecimentos deve transmitir e/ou construir, quem são os responsáveis pela mesma, quem deve mantê-las, etc. Existe, portanto, um conhecimento científico vasto acerca da escola que se distancia da realidade imediata da criança e de seus pais. Porém, em contrapartida, uma vez fazendo parte indistintamente da vida das pessoas, a escola é constantemente posta em questão pelas mesmas, ou seja, algo que de alguma maneira poderia ser estranha, torna-se familiar. É indispensável que se compreenda que existem mecanismos essenciais que tornam possível esta familiaridade, ou seja, como estes elementos acerca da escola que circulam no universo acadêmico,

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reificado, chegam ao universo cotidiano, comum.

Para tanto, serão analisadas as produções dos alunos: textos livres e produções direcionadas. Além disso, através de diário de campo, serão registrados e analisados eventos e informações julgadas importantes com o objetivo de compreender o contexto dos sujeitos da pesquisa no ambiente escolar.

O presente texto, portanto, está assim organizado: o próximo capítulo apresenta um levantamento bibliográfico acerca dos trabalhos que versam sobre a voz dos alunos no tocante às suas ideias e representações sobre a escola; o capítulo seguinte trata especificamente do conceito e da Teoria das Representações Sociais, de Moscovici, a qual ancora este estudo; na sequência, são discutidos o percurso metodológico, o contexto dos sujeitos da pesquisa, bem como os procedimentos de coleta de dados; depois, são apresentados os procedimentos de análise e os resultados, os quais serão discutidos no capítulo subsequente, e finalmente, algumas considerações acerca do trabalho que até aqui foi realizado.

1.1 Objetivos

Ao aprofundar a questão acerca da formação de representações sociais como resultantes das relações sociais, e o ressoar dessas representações afetando e (trans)formando as próprias relações humanas, buscou-se nesta pesquisa identificar, descrever e analisar as representações sociais de escola reveladas em produções de alunos do Ensino Fundamental de uma escola pública municipal em Campinas.

Dada a filiação teórica da pesquisa com a abordagem processual da TRS, é importante explorar a questão da construção das representações sociais, através dos elementos objetivados e ancorados nas representações sociais de escola entre as crianças pesquisadas.

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5 2 REVISITANDO A ESCOLA

Numa situação limite, para se observar a gênese de alguma representação social, deveria haver um objeto de representação completamente novo para a população, como o fenômeno de representações sociais da radiação atômica estudado na Itália. Normalmente, os objetos são representados por outros grupos, transmitidos socialmente e reelaborados pelos diferentes grupos e indivíduos a partir de um fundo cultural e social comum. (SOUZA FILHO, 1993)

Neste estudo, a escola, como objeto para o qual propõe-se olhar, já foi representada por outros grupos. No entanto, tais representações são reelaboradas pelos sujeitos da comunidade escolar. A esse respeito, Grandin (2008) salienta que

A escola, ou o próprio cotidiano escolar, é o espaço privilegiado de construção das representações docentes. Na escola, as representações estão postas, histórica e culturalmente, e são construídas pelos sujeitos que dela fazem parte. (GRANDIN, 2008, p. 63).

Inúmeros são os trabalhos que abordam as representações sociais sobre a escola, ou acerca de elementos que compõem o universo escolar, formadas por educadores no exercício da profissão ou estudantes das mais diversas licenciaturas ou cursos de formação. Soligo (2002, p.147), ao abordar as contribuições da psicologia social à formação de professores, afirma a importância deste tipo de estudo: “Estudos a respeito das representações sociais de professores nos fornecem importantes informações sobre a forma como o professor se apropria e relaciona com a realidade escolar.”

O trabalho de Grandin (2008) vai nesta direção: sua pesquisa intencionou identificar e analisar as representações sociais de professoras em processo de formação (no caso o curso PROESF5 e o PEFOPEX6, oferecidos pela UNICAMP) e também as mudanças nessas representações, após o término do curso, analisando os

5 Programa Especial de Formação de Professores em Exercício na Educação Infantil e Séries Iniciais do Ensino Fundamental da Rede Municipal da Região Metropolitana de Campinas, destinado aos professores da rede pública dos municípios, em convênio com a Unicamp. (GRANDIN, 2008, p. 8-9). 6 Programa Especial de Formação de Professores em Exercício na Educação Infantil e Séries Iniciais

do Ensino Fundamental, que atende aos professores das redes municipal e estadual e também das escolas particulares. (GRANDIN, 2008, p. 8).

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Memoriais de Formação que as mesmas entregavam como trabalho final do curso. Foi utilizada a Análise de Conteúdo, como instrumento para formação das categorias de análise, “tendo como referência dois eixos centrais: as representações de identidade e da prática docentes” (GRANDIN, 2008, p. ix).

Em sua análise, Grandin (2008) pontuou, em 11 quadros, categorias que emergiram da leitura dos Memoriais. Dentre elas, destacamos as categorias relacionadas às características dos ‘bons’ e ‘maus’ professores e as relacionadas à relação professor-aluno. Com relação à primeira, Grandin pontua que as representações indicam um modelo de ‘bom’ professor

Centrado na pessoa do aluno, que compreende suas necessidades e as inclui no planejamento de suas aulas. Ao contrário, a representação do mau professor é extremamente negativa e traumática: autoritarismo, mau relacionamento com os alunos, preconceitos, falta de compromisso e assiduidade, estão ligados à representação do professor que não deve ser tomado como referência (GRANDIN, 2008, p. 76-77).

Com relação às representações sobre a relação professor-aluno, a autora afirma que por meio dos textos é possível perceber que as representações dos professores sobre o que deve ser o modelo ideal da relação professor-aluno estão ligadas “às relações afetivas e à criação de vínculos de carinho, interação, confiança, diálogo, apoio, amizade” (2008, p. 84). Seu trabalho, portanto, configura-se num excelente repertório das representações dos professores em formação e já em exercício, além de expor com clareza a Teoria das Representações Sociais.

Como o estudo discutido acima, há muitos outros cujos objetivos são apreender e analisar as representações dos professores sobre sua formação, sua atuação, a escola, os alunos, etc. Na revista Nuances: Estudos sobre a Educação (2009), por exemplo, em um volume dedicado ao dossiê: “Representações sociais e educação", todos os estudos focavam ou nas representações dos professores já em exercício, ou dos alunos de Pedagogia ou de outras licenciaturas.

Por outro lado, os trabalhos que versam sobre as ideias, concepções, discursos, expectativas e representações dos alunos, “usuários” diretos desta instituição aqui problematizada, a escola, são em menor quantidade, conforme se constata através do levantamento bibliográfico nos principais bancos de dados (Scielo, Periódicos Capes,

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7 SBU/Unicamp e Google Scholar).

Na Scielo, por exemplo, em pesquisa feita em meados junho de 2013, com a combinação de palavras "voz do aluno", não foi encontrado nenhum artigo. Com a combinação "voz dos alunos", foram encontrados 20 artigos, dos quais um somente se aproximava com a temática desta pesquisa, sendo os outros, em sua maioria, relacionados a ruídos em sala de aula ou à importância da voz para alunos com deficiência auditiva ou visual.

O artigo encontrado tratava do imaginário / representações sociais de alunos do Ensino Superior: "O artigo propõe uma auto-avaliação para recuperar a voz das comunidades, porque a qualidade é construída socialmente." (MURCIA-PENA; MURCIA-GOMEZ; MURCIA-GOMEZ, J., 2009, p. 110). O conceito de imaginário social da pesquisa foi ancorado nas proposições de Cornelius Castoríades.

No entanto, os estudos que versam sobre as representações dos alunos menores não são inexistentes. Utilizando as chaves “representações de escola” e “representações sociais” foi possível acessar alguns estudos. Entretanto, os achados mais valiosos foram feitos observando as referências bibliográficas de pesquisas com temática aproximada à deste estudo. Cruz (1997; 2001; 2002; 2004 e 2008), Franco e Novaes (2001), Simões (2001), Castro (2004), Checchia (2006), Osti (2010), Teixeira e Flores (2010), Barra Nova (2011), Machado (2011; 2013), Feitosa (2012), entre outros, são exemplos dos estudos encontrados que em muito contribuíram para o desenrolar deste.

Visto que neste estudo haverá momentos de diálogo e interlocução com os trabalhos ora referenciados, e ainda outros que se façam necessários, vale apresentar brevemente os objetivos e resultados de cada um deles, conforme a ordem em que foram referenciados.

Em terras brasileiras, Cruz (1997) utilizou a Teoria das Representações Sociais em uma pesquisa para compreender as representações de escola de alunos da classe trabalhadora. Observou que as representações evoluem negativamente com o tempo. Ela afirma: "Era meu desejo contribuir para o resgate do aluno enquanto sujeito que informa, em primeira mão, o que pensa e sente a respeito da sua vivência escolar" (CRUZ, 1997, não numerado). Mais tarde, trabalhando com a questão da educação

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infantil, Cruz realizou pesquisas para compreender a perspectiva de professores e família (CRUZ, 2001) bem como de alunos (CRUZ, 2002; 2004) sobre a creche.

Além disso, a autora organizou obras dedicadas à pesquisa com crianças pequenas, as quais incentivam a consulta às crianças, tais como “A CRIANÇA FALA: a escuta de crianças em pesquisas” (2008), entre outras publicações.

“A criança fala” (2008) é uma coletânea, escrita a muitas mãos, de artigos e relatos de pesquisas nas áreas de Educação, Psicologia e Enfermagem, focadas nas falas das crianças. Logo no início da apresentação, Cruz relembra que o significado etimológico da palavra infante, aquele que não fala, "revela a postura dominante, por séculos, diante do que as crianças podem ou devem expressar" (CRUZ, 2008, p. 11). Essas posturas vêm sendo questionadas por trabalhos recentes que têm mostrado o quanto criança e infância não são fenômenos naturais, mas sim históricos e socialmente construídos e sofrem, portanto, mudança ao longo do tempo (CRUZ, 2008). A autora aponta:

De fato, desde meados do século XX, a criança firmou-se como objeto de estudo, sendo construído um variado arsenal de estratégias (em grande parte desenvolvidas pela Psicologia) para investigar seu mundo subjetivo, avaliar as suas habilidades específicas, medir seu desempenho em diversas tarefas. Mas os julgamentos, os desejos, os receios, as preferências, etc. das crianças geralmente não têm sido alvos de interesse de estudo. Quando o são, a prática mais comum é se recorrer aos adultos (geralmente seus familiares ou professores) para obter essas informações - revelando a desconfiança em relação à competência das crianças para se comunicarem e também remetendo ao fato de ainda não serem tomadas como sujeitos. (p.12-13).

Em suma, há muitas pesquisas sobre a(s) criança(s), mas não com as crianças. Seus pontos de vista e perspectivas tendem a ser diversos, pois

Além de expressarem as peculiaridades da história de cada uma delas, também são marcados pelas experiências concretamente vividas, em determinado contexto e momento histórico, profundamente influenciadas pelos lugares que a criança e sua família ocupam na sociedade, assim como pelo pertencimento a determinado gênero, etnia e cultura. Afinal, em todos os tempos, são muito diversas as infâncias possíveis aos seres humanos, mesmo àqueles que convivem na mesma sociedade... (CRUZ, 2008, p. 13)

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É curioso notar que as pesquisas relatadas nesta obra foram, em sua maioria, direcionadas às crianças da Educação Infantil. Na seção "Educação", há apenas uma pesquisa realizada com crianças do Ensino Fundamental, o que indica a necessidade de avanços neste tipo de pesquisa com esta etapa escolar.

Ainda, vale ressaltar que a obra é parte do Projeto Ouvindo Crianças, projeto que tem "como objetivo maior contribuir para o avanço das discussões em curso sobre a pesquisa com crianças e para o aperfeiçoamento das estratégias utilizadas para ouvi-las." (CRUZ, 2008, p.5) e conta com o apoio do projeto Save the Children, do Reino Unido.

Franco e Novaes (2001) também empreenderam uma pesquisa que intencionava detectar as representações sociais de estudantes acerca da escola e do trabalho. Para tanto, através de um questionário, inquiriram 481 alunos de dez escolas estaduais da grande São Paulo, tidas como escolas de boa qualidade. Em seus resultados, verificaram que os jovens representavam a escola de forma positiva: ser alguém na vida, possibilidade de ascensão social e lugar de fazer amigos são alguns elementos que marcaram as respostas dos alunos. O mundo do trabalho, por sua vez, foi representado de forma idealizada e a-histórica.

Na literatura internacional, também há proximidade com os trabalhos e resultados aqui apresentados. Destaque para a pesquisa de Simões (2001): em seu trabalho intitulado “Representações sociais da escola rural de meados do século XX em Portugal”, ela entrevistou 30 sujeitos, nascidos entre 1926 e 1936, para compreender a escola daquele tempo. O estudo é referenciado na Teoria das Representações Sociais de Moscovici. Simões aponta que a escola foi representada tanto como um lugar de punições, dificuldades e pobreza, como um lugar agradável e de brincadeiras. Em suma, essa pesquisa, assim como a de Feitosa (2012), mostra a escola como um espaço de sentimentos contraditórios, um lugar da contradição.

Castro (2004), em seu Trabalho de Conclusão de Curso (TCC), estuda as representações de escola das crianças com dificuldade de aprendizagem em uma escola pública da rede municipal de Elias Fausto (SP). Seus resultados mostram o seguinte:

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Em geral, os resultados parecem demonstrar um maior interesse das crianças por atividades físicas e lúdicas, incluindo artes, visto que na categoria conteúdos escolares a preocupação das crianças parece se restringir aos recursos materiais da escola (lousa, cadeira, armário, cartaz, carteira, borracha, lápis e caderno) e não aos conteúdos escolares em si. (CASTRO, 2004, p. 82-83)

Já com relação a uma escola ruim, seus dados revelam que, para tais crianças, uma escola é assim representada quando faltam atividades diversificadas, espaços físicos adequados e existem relacionamentos negativos entre professores e alunos.

Checchia (2006) relata, na seção ‘Apresentação' de sua dissertação de Mestrado, que a leitura da dissertação de Mestrado de Cruz, “A representação da escola em crianças da classe trabalhadora” (1987), a motivou para aprofundar este tema com os adolescentes. A autora, então, realizou uma pesquisa ancorada na perspectiva crítica da Psicologia Escolar, intitulada “O que os jovens alunos de classes populares têm a dizer sobre a experiência escolar na adolescência” (2006), tomando como referência a noção sócio-histórica de adolescência.

Checchia, em suas considerações, aponta: "deve-se ressaltar que outro elemento central, intensamente enfatizado pelos jovens alunos na pesquisa que realizamos, consiste na necessidade e relevância de serem ouvidos.” (p. 143) e

[...] referem-se à necessidade de serem instituídos na escola espaços de discussão em que possam expressar suas opiniões, debater, refletir e se informar sobre temas como a experiência escolar, adolescência, sexualidade, política, drogas e violência. (p. 144-145)

Osti (2010), utilizando entrevistas e técnicas psicopedagógicas de coleta de dados, e fazendo análises quantitativa e qualitativa desses materiais, a autora, no trabalho intitulado “Representações de alunos e professores sobre ensino e aprendizagem” (2010), demonstra que “professores e alunos apresentam uma visão parcial dos fatores envolvidos no processo de ensino e aprendizagem e do que seja a dificuldade de aprendizagem”, conforme consta em seu Resumo.

Dentre outras iniciativas além-mar, Teixeira e Flores (2010) também destacam a importância de se ouvir a 'voz dos alunos'. As autoras apresentam os resultados de uma investigação, realizada em uma escola secundária em Portugal, que pretende

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“compreender as experiências e os percursos de alunos do ensino secundário.” (TEIXEIRA; FLORES, 2010, p. 113). Utilizando testemunhos escritos (narrativas) e entrevistas, as autoras apontam:

Dos relatos dos estudantes emergem algumas ideias centrais: a escola como local de descoberta e crescimento (intelectual e pessoal); como agente de socialização e como “rampa de lançamento" para o futuro. (TEIXEIRA; FLORES, 2010, p. 119, grifo nosso).

Vale ressaltar que, na pesquisa desenvolvida, as autoras verificaram que grande parte dos alunos "aponta o primeiro ciclo como fase de "ouro" de seu percurso escolar, destacando a figura do docente como primeiro mentor" (TEIXEIRA; FLORES, 2010, p.128).

As autoras destacam o baixo volume de trabalhos sobre a voz dos alunos, em comparação com os trabalhos que focalizam a voz, ideias e concepções dos professores. Em contrapartida, assinalam que, na Inglaterra, já existem vários projetos de investigações assentados na voz dos alunos, destacando-se os trabalhos de Jean Rudduck, da Universidade de Cambridge. Também observou-se baixo volume de trabalhos sobre as representações sociais dos alunos/estudantes acerca dos elementos da escola, em contrapartida com os realizados com os professores em formação ou já em exercício.

Elencando vários autores que trabalham com o postulado de que ouvir os alunos, ou a consulta aos alunos é um instrumento/procedimento importante para o comprometimento do aluno com o processo de ensino e aprendizagem, bem como com a promoção de uma educação democrática e voltada para as questões relacionadas à cidadania, as autoras apontam que, na maioria das vezes, a escola e as políticas educativas nem sempre valorizam e /ou investem nessa prática:

[...] consultar os alunos não deveria colidir com as agendas políticas e escolares, que apostam maioritariamente nos resultados dos discentes, mas focar outras competências que se deveriam desenvolver na escola, tais como a participação activa e democrática nas decisões escolares e curriculares e a intervenção responsável nos órgãos de decisão, quer ao nível micro (sala de aula), quer ao nível meso (escola). (TEIXEIRA; FLORES, 2010, p. 117, grifo nosso).

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Como já afirmado, há trabalhos focados com maior exclusividade nas ideias de Moscovici. Dentre eles, estão os de Silva (2008) e Feitosa (2012) - ambos da mesma autora, a qual teve seu sobrenome alterado -, que estudam as representações sociais da criança negra no ambiente escolar. Destacamos sua dissertação de mestrado (FEITOSA, 2012), em que é apresentada uma pesquisa, cujos dados foram coletados através de várias fontes, para identificar as representações das crianças, em consonância com o que advogam Moscovici e outros estudiosos do campo das representações sociais. Participaram deste estudo um total de 57 crianças de cor preta ou parda7 de escolas públicas municipais da Região Metropolitana de Campinas (RMC), tendo a autora visitado 19 escolas, uma de cada cidade da RMC.

Assim, no intuito de “diversificar as maneiras de instigar as crianças a expressarem suas representações acerca da escola e de si mesmas neste espaço durante a pesquisa” (FEITOSA, 2012, p. 67), a autora utilizou, de maneira original, uma entrevista compreendendo cinco etapas: na primeira e segunda, apresentou desenhos8 prontos de crianças e adultos que variavam entre si na questão racial e de gênero, bem como desenhos de sala de aula e depois do pátio, que eram utilizados para subsidiarem atividades de questionamentos diretos, indiretos e situações hipotéticas às crianças investigadas. As respostas de ambas as etapas foram registradas em uma ficha de pesquisa elaborada pela pesquisadora e anexada no trabalho.

A terceira etapa consistia em exibir uma lista de palavras referentes a elementos do meio escolar, elaborada pela pesquisadora, as quais as crianças deveriam classificar a partir das seguintes questões: “O que é bom na escola” e “O que não é bom na escola”. A quarta etapa consistia na contação de uma história, pela criança, de uma situação boa e outra ruim vivida por ela no ambiente escolar. Dessa forma, foi possível apreender as representações das crianças de uma forma mais livre, a partir das narrativas das mesmas. Na quinta e última etapa, questionamentos diretos foram feitos às crianças, um em relação à cor delas e os outros dois voltados às condutas

7 Cor ou Raça - característica declarada pelas pessoas de acordo com as seguintes opções: branca, preta, amarela, parda ou indígena, segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). 8 Os desenhos foram feitos pelo ilustrador Gerson Pereira da Silva, conforme consta na dissertação.

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13 imaginárias e simbólicas das mesmas.

A autora, primeiro em seu TCC (SILVA, 2008), e depois em sua dissertação de mestrado (FEITOSA, 2012), mostra que as escolas pouco têm valorizado e trabalhado a questão da diversidade racial; as crianças negras, por sua vez, cada vez mais se identificam com um padrão branco bem como relatam a sua vivência cotidiana dos preconceitos e o silenciamento da escola com relação a estes. Mesmo neste cenário, as crianças representam positivamente a escola, bem como seus professores, o que evidencia o peso desta instituição na constituição dos sujeitos e as contradições existentes em seu espaço. Está posta a relação dialética: a escola que eu valorizo é a mesma que me fere.

Machado (2011) publicou um artigo relacionado a uma pesquisa cujo objetivo era apreender as representações sociais de escola de alunos no início da escolarização. Pesquisou 34 crianças do I ciclo do Ensino Fundamental de escolas da rede pública de Recife – PE, de uma amostra de seis escolas diferentes.

Através da entrevista do tipo conversacional, seus resultados indicaram que as crianças possuíam as seguintes representações sociais de escola: “possibilidade de aprender a ler e escrever, preparação para o mercado de trabalho e, consequentemente, ascensão social” (p.143).

A partir do artigo citado, tomamos contato com outros trabalhos de Machado, inclusive a obra organizada por ela, intitulada “Incursões e Investigações em Representações Sociais e Educação”, publicada em 2013. Nesta obra, estão reunidas interessantes pesquisas relacionadas à educação e ancoradas na Teoria das Representações Sociais, algumas das quais serão mencionadas no decorrer deste trabalho para fins de diálogo e discussão dos dados.

Finalmente, Barra Nova (2011), em sua dissertação de mestrado, intencionou analisar as representações sociais de escola de alunos dos anos iniciais do Ensino Fundamental, matriculados em escolas da rede pública de Recife-PE. Para isso, escolheu 12 escolas do município e investigou 5 crianças em cada uma delas, totalizando 60 crianças participantes do estudo. Fez questão de informar, em seu texto, que todas essas escolas possuíam em comum o fato de estarem localizadas em áreas periféricas da cidade.

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Combinando desenhos e entrevistas semiestruturadas, seus resultados apontam para a supervalorização dessa instituição, bem como para a grande esperança das crianças em superar suas condições de classe a partir da escola. A escola está objetivada como um portal, “por meio do qual se alcança um futuro promissor” (p.7).

Neste estudo, portanto, estaremos olhando mais atentamente para a escola sob o ponto de vista da criança. Para isso, é necessário e até mesmo inevitável, dado o referencial teórico assumido, que dá ao estatuto das relações sociais lugar privilegiado: compreender como ela – a criança, o aluno - significa este espaço; o que a organização da escola e as relações ali estabelecidas significam simbolicamente; dado que discursos contraditórios ali circulam, como esses sentidos divergentes convivem?

Duveen (2003) alerta que, embora a maioria das discussões acerca das representações sociais gire em torno do mundo adulto, aponta como legítimas as investigações com as crianças:

Se examinarmos os processos através dos quais a criança incorpora as estruturas do pensamento de sua comunidade e adquire assim um lugar como participante competente e funcional nessa comunidade, eles nos apresentam um campo de investigação que pode ser fonte de questões produtivas e contribuições construtivas para a própria TEORIA DAS REPRESENTAÇÕES SOCIAIS. (DUVEEN, 2003, p.261-262).

Não obstante, ainda há resistência em se dar voz às crianças, tema que será tratado na próxima seção.

2.1 Voz das crianças, voz dos alunos

O desejo de dar "voz às crianças" vem tomando forma em iniciativas por toda a parte. Em "Quando as crianças dizem: agora chega!" (TONUCCI, 2005), há, em cada capítulo, temas que foram sugeridos e debatidos pelas crianças participantes do projeto "A cidade das crianças", o qual nasceu em Fano, na Itália, no ano de 1991. Hoje, a "rede", como é chamada, é constituída por cidades na Itália, Espanha, Argentina e Portugal, e tem por objetivo "promover duas dimensões fundamentais na vida da

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criança: autonomia e participação." (2005, p. 218). Tonucci, na apresentação do livro, assinala:

Conceder a palavra às crianças não significa fazer-lhes perguntas e fazer com que responda aquela criança que levantou a mão em primeiro lugar. Dessa forma, conseguem-se somente lugares-comuns e estereótipos [...]. Conceder a palavra às crianças significa, pelo contrário, dar a elas as condições de se expressarem. (TONUCCI, 2005, p. 17)

Ainda sobre o "campo" sobre o qual as crianças têm condições de se expressar, o autor afirma:

As crianças são capazes de intervir, expressando opiniões e fazendo propostas a respeito de todos os problemas da cidade, porque elas também ali vivem, como cada cidadão, e ali vivem a partir de seu próprio ponto de vista particular que é, ao mesmo tempo, mais "baixo" e mais ignorado do que o dos outros. (TONUCCI, 2005, p. 20 e 21).

Neste projeto, as crianças são organizadas em conselhos - o Conselho das Crianças – através dos quais elaboram e discutem propostas sobre vários aspectos da vida nas cidades. Interessante notar que um dos capítulos do livro, cujo título é "Escola e não-escola", trata justamente da relação - ou da não-relação - das escolas com o projeto, apontada pelas crianças como essencial e reiterada pelo autor:

Pudemos verificar que a escola pode assumir um papel decisivo para o êxito da iniciativa. Não se trata de pedir à escola que apóie uma proposta externa, apesar de ser de alto valor educativo e cívico; trata-se, pelo contrário, de pedir à escola que se aproprie deste projeto [...] (TONUCCI, 2005, p. 224).

Ainda sobre a escola, Tonucci argumenta que, se a cidade requer a participação das crianças, a escola também a requer; ele dá algumas direções para que uma escola crie condições para a expressão e participação dos alunos:

Seria preciso iniciar com as assembleias de sala de aula, constituir conselhos escolares compostos pelos representantes das salas de aula, a fim de discutir, sobre todos os aspectos, do aproveitamento à

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disciplina, do horário ao recreio, da infra-estrutura das salas à reestruturação do pátio. Se as crianças perceberem que são reconhecidas, se tiverem motivos sérios e suficientes para considerar que a escola é delas, serão capazes de um entusiasmo e de uma disponibilidade ao compromisso e à responsabilidade que, de outra forma, seriam impensáveis. (2005, p. 179)

Não obstante as contribuições ora citadas para a formação do discente, Amado (2007), corroborando que a consulta aos alunos é importante para uma educação democrática e voltada para a cidadania, também ressalta que ainda há muita resistência

Alguns autores colocam reservas quanto à validade da opinião e do 'senso comum’ das crianças e dos alunos, justificando-se com a sua falta de maturidade e de sabedoria [...]. Classificam, por isso, as suas ideias como 'erróneas', 'ingénuas', informais, 'fragmentárias', etc. (Cubero, 2005; Soares & Tomás, 2002). Mas os estudos que comparam as observações de especialistas e a opinião dos alunos (Cooper & McIntyre, 1996) verificam um acordo significativo, o que leva a concluir que as percepções dos estudantes são fidedignas e razoavelmente válidas para que, uma vez sujeitas a uma análise rigorosa, se tomem como objecto de pesquisa no âmbito das Ciências da Educação, e proporcionem uma visão coerente e crítica do quotidiano educativo. (AMADO, 2007, p.119-120)

Tonucci (2005) também aponta tal resistência:

A criança é considerada pelos pais, pelos professores, pelos instrutores, como um sujeito a ser educado, que tem valor por aquilo que ele será amanhã. [...] A verdadeira criança, a criança de hoje, é continuamente negada. É inexistente, é transparente.

Julia Oliveira-Formosinho, professora da Universidade do Minho (Portugal) é, segundo Rodrigues (2011, p.156), autora de uma resenha sobre sua obra, “umas das pioneiras em estudos que têm a criança mais como sujeito e menos como objeto das investigações." Oliveira-Formosinho organizou, em 2008, a obra intitulada “A escola vista pelas crianças”, a qual é composta por artigos resultantes de pesquisas no âmbito da Educação Infantil, nesta abordagem de valorização da voz das crianças como fonte de informações sobre o cotidiano escolar.

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pesquisadores brasileiros, tais como Tizuko M. Kishimoto e Monica Appezzato Pinazza, que assinam o prefácio, e a já referenciada Silvia H. V. Cruz, que escreve um dos artigos relatando uma de suas pesquisas dentro deste cenário. Sobre o artigo de Cruz, Rodrigues (2011, p. 159) aponta:

Além da explicitação da metodologia diferenciada, o texto ainda apresenta os dados referentes às “vozes” das crianças. Tais dados reforçam a ideia de que a criança pequena é capaz de perceber aspectos da sua realidade socioeconômica, que eles têm impactos significativos em suas vidas, bem como são capazes de identificar as situações problemáticas do ambiente educativo e reivindicar melhorias não só individuais, mas de interesse coletivo. Evidencia ainda que a criança subverte as situações que considera inadequadas e são autônomas mesmo quando as condições para tanto não lhes são dadas.

Tal análise positiva convida a práticas educativas e investigativas que coloquem a criança/aluno como sujeito ativo e participante das questões que os atingem diretamente.

Ainda neste movimento de dar voz aos alunos, em um evento recente ocorrido na Universidade de Campinas (UNICAMP), foi apresentada a pesquisa intitulada "O que pensam os jovens de baixa renda sobre a escola de ensino médio?”, abordada pelo professor Haroldo da Gama Torres no Fórum "Educação e Juventude: Novas possibilidades para o Ensino Médio". Sobre o estudo, o professor aponta:

Antes, é preciso saber quem é esse jovem, pois aquele extremamente pobre dificilmente chega ao ensino médio. Os alunos são de origem social diferenciada e capital cultural mais elevado, passaram pelo ensino infantil e possuem equipamentos em casa, como computador. De modo geral, a percepção que têm da escola é de deficiência na infraestrutura e de professores relativamente ausentes. Ainda assim, valorizam a escola como local de encontro e sociabilidade e como necessária para acesso ao mercado de trabalho. A escola é um lugar chato, mas que tem algum sentido. 9

Interessante observar que esta pesquisa traz, na fala dos jovens, tanto as questões sobre as deficiências na infraestrutura da escola, como a valorização ao

9 Disponível em <http://www.unicamp.br/unicamp/noticias/2013/10/21/fragilidades-dificuldades-e-percepcao-de-escola-dos-jovens-de-ensino-medio>. Acesso em: 23 de out. de 2013.

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espaço de sociabilidade que ela produz, questões que também são apresentadas pelas crianças deste estudo, conforme será discutido nos capítulos seguintes.

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19 3 A TEORIA DAS REPRESENTAÇÕES SOCIAIS 3.1 A Representação Social da Psicanálise

Ora, as representações sociais incitam-nos a preocupar-nos mais com as condutas imaginárias e simbólicas na existência ordinária das coletividades. (MOSCOVICI, 1978, p. 81)

A Teoria das Representações sociais aborda a questão da interpretação da realidade bem como da construção de conhecimentos. Foi originada com a publicação do estudo, já quinquagenário, “La Psychanalyse: Son image et son public” (1961), do romeno radicado na França, Serge Moscovici e publicada em terras brasileiras, em 1978, sob o título: “A Representação Social da Psicanálise”.

No prefácio desta obra, Lagache (1978, p.7) deixa claro que o estudo não é de psicanálise, "mas uma pesquisa de Psicologia Social e de Sociologia do Conhecimento" em que a psicanálise, por ter sido profundamente penetrada na sociedade francesa da época, constituía-se em

[...] um excelente objeto de estudo para se averiguar em que se converte uma disciplina científica e técnica quando passa do domínio dos especialistas para o domínio comum, como o grande público a representa e modela e por que vias se constitui a imagem que dela se faz. (LAGACHE, 1978, p. 8).

Para tanto, Moscovici promoveu pesquisas de opinião com amostras da população, incluindo os próprios psicanalistas, além de realizar análise de conteúdos da imprensa francesa sobre o tema em questão, durante um período de tempo determinado.

Algo que chama atenção e que suscita uma série de questionamentos é a relação dos psicanalistas da época com o estudo: como um número insignificante deles respondeu ao questionário, esse grupo amostral não aparece no estudo (LAGACHE, 1978). Moscovici (1978, p.13) registra as impossibilidades de diálogo com esse grupo:

Quando do seu aparecimento, a tese provocou certo mal-estar. Os psicanalistas, sobretudo, viram com maus olhos a tentativa de tomar a

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Psicanálise como qualquer outro objeto de estudo e situá-la no contexto da sociedade. Impressionava-me, então, e continua a impressionar hoje, o fato de os detentores de um saber, científico ou não, acreditarem ter o direito de tudo estudar - e, em definitivo, de tudo julgar -, mas considerarem inútil, e até mesmo pernicioso, explicar os determinismos de que eles são o lócus, os efeitos que eles produzem, em suma, serem estudados, por sua vez, e olharem-se no espelho que, por conseguinte, lhes é colocado.

Fica claro que a Psicanálise ocupava um lugar central entre as correntes intelectuais da época (1978), fato que legitima a investigação de Moscovici. Após alguns anos, sua investigação passa a ser aceita pela categoria dos cientistas que outrora o olhavam com desconfiança, segundo afirmação do mesmo no prólogo da segunda edição: "Percebi, entretanto, que num período de dez anos, pelo menos no que se refere à Psicanálise e aos psicanalistas, as atitudes mudaram muito num sentido favorável a um trabalho como este." (MOSCOVICI, 1978, p. 13-14).

O trabalho de Moscovici, situa-se no campo da Psicologia Social:

Tal projeto científico, foi situado no interior da psicologia social, por se tratar de fenômeno sui generis a meio caminho entre o psicológico e o social, a partir do qual Moscovici pretendia renovar o estudo de atitudes, opiniões, imagens e estereótipos e, igualmente, ideologia, visão de mundo, da psicologia social e da sociologia, respectivamente. (SOUZA FILHO, 1993, p.109)

Jovchelovitch (2008, p. 88-89) assim sintetiza o estudo de Moscovici:

[...] o estudo se centra nas maneiras como a psicanálise é apropriada e ressignificada por diferentes setores do público francês. O que acontece com o saber psicanalítico quando ele deixa seu contexto original de produção, sai das práticas privadas, de centros restritos de estudo e treinamento, das escolas médicas e das instituições que controlam a psicanálise e penetra outros contextos, outros horizontes, outras comunidades? Que acontece quando um tipo de conhecimento – aqui o conhecimento científico – circula na estrutura social para além de sua origem e contexto de produção? A resposta era clara para Moscovici: este saber se transforma. Ele muda, do mesmo modo como mudam as pessoas que originalmente o transformaram.

A discussão acerca das construções simbólicas sobre o real já foi abordada por autores como Weber, Marx e Durkheim (MINAYO, 2003). Portanto, o conceito de

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Representações Sociais tem tratamento diferenciado em diferentes abordagens. No artigo intitulado “O conceito de representações sociais dentro da sociologia clássica”, Minayo (2003, p. 89) afirma que

Representações Sociais é um termo filosófico que significa a reprodução de uma percepção retida na lembrança ou do conteúdo do pensamento. Nas Ciências Sociais são definidas como categorias de pensamento que expressam a realidade, explicam-na, justificando-a ou questionando-a.

Ela elabora que, "Enquanto material de estudo, essas percepções são consideradas consensualmente importantes, atravessando a história e as mais diferentes correntes de pensamento sobre o social" (MINAYO, 2003, p.89), complementando que elas "se manifestam em palavras, sentimentos e condutas [...]" (MINAYO, 2003, p.108). A autora discorre sobre as ideias dos três autores clássicos ora citados acerca deste conceito, apontando suas convergências e divergências. Ela sintetiza:

Com relação ao status das Representações Sociais no conjunto das relações, Durkheim estabelece que a vida social causa as idéias; para Weber existe uma relação de adequação entre idéias e base material; e Marx coloca a base material em relação de determinação. (MINAYO, 2003, p. 107)

Ela conclui seu artigo sintetizando os pontos principais de suas elaborações: a manifestação das Representações Sociais em "palavras, sentimentos e condutas" (p. 108); o estatuto da linguagem como mediadora; a abrangência de algumas Representações Sociais em determinadas épocas e lugares, revelando "a visão de mundo de determinada época" (p. 109); a aceitação de que as Representações não são necessariamente conscientes; e ainda a presença de elementos tanto de dominação quanto de resistência. Ela adverte: “[...] é importante observar que as Representações Sociais não conformam a realidade e seria outra ilusão tomá-las como verdades científicas, reduzindo a realidade à concepção que os homens fazem dela”. (MINAYO, 2003, p.110)

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22 3.2 Sociedade de pensadores amadores

Sá (1993, p.19), inicia seu capítulo acerca do conceito e estado atual das Representações Sociais, na obra organizada por Spink (1993), da seguinte forma:

O termo Representações Sociais designa tanto um conjunto de fenômenos quanto o conceito que os engloba e a teoria construída para explicá-los, identificando um vasto campo de estudos psicossociológicos. A cunhagem desse termo e, portanto, a inauguração do campo devem-se ao psicólogo social francês Serge Moscovici.

Moscovici parte do conceito de Representações Coletivas, de Durkheim (MOSCOVICI, 1978 e 2011; DUVEEN, 2011; FARR, 2003; GUARESCHI, 2003) para então propor um conceito alternativo, a saber, o de representações sociais. Por isso, Guareschi e Jovchelovitch (2003) fazem uma interessante análise afirmando que Moscovici pensou “com Durkheim e contra ele” (2003, p.19); Durkheim constitui-se, assim, em um “ancestral ambíguo” da psicologia social, para usar as palavras de Duveen (2011).

Moscovici, então, elege a TRS como o cerne da Psicologia Social: "Queria redefinir os problemas e os conceitos da Psicologia Social a partir deste fenômeno, insistindo sobre sua função simbólica e seu poder de construção do real." (MOSCOVICI, 1978, p. 14). Farr (2003, p. 49) aponta que a Teoria das Representações Sociais de Moscovici “se constituiu numa importante crítica sobre a natureza individualizante da maior parte da pesquisa em PSICOLOGIA SOCIAL na América do Norte”.

Durkheim preocupava-se com o que tornava a vida social ‘coesa', por assim dizer. Ele reafirmava não só a dualidade indivíduo/sociedade bem como a sobreposição desta em detrimento daquela.

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Do ponto de vista sociológico, Durkheim é o autor que primeiro trabalha explicitamente o conceito de Representações Sociais. Usado no mesmo sentido que Representações Coletivas, o termo se refere a categorias de pensamento através das quais determinada sociedade elabora e expressa sua realidade. (p. 90)

Ele advoga que essas categorias "surgem ligadas aos fatos sociais, transformando-se, elas próprias, em fatos sociais, passíveis de observação e de interpretação." (MYNAIO, 2003, p.90)

O esforço para estabelecer a sociologia como uma ciência autônoma, expresso principalmente em “As regras do método sociológico” (1960), levou Durkheim a tomar decisões que são questionadas por outras vertentes dentro das ciências sociais, dentre elas, defender uma separação radical entre representações individuais e coletivas e a sugerir que as primeiras deveriam ser objeto de estudo do campo da psicologia, enquanto as últimas formariam o objeto da sociologia [...] (DUVEEN, 2011). Além disto, advogou o não envolvimento do pesquisador na análise dos fatos sociais e representações (MINAIO, 2003).

Para Durkheim, as representações contêm, assim como as estruturas e instituições, "as duas características do fato social: (a) exterioridade em relação às consciências individuais; (b) exercem ação coercitiva em relação às consciências individuais, ou são suscetíveis de exercer essa coerção." (MINAYO, 2003, p. 91). Afirma ele que certas representações sociais históricas, tais como a religião e a moral, exercem sobre nós mais coerção do que outras representações.

Suas ideias, compartilhadas por diversos estudiosos, são duramente criticadas por outras vertentes dentro das ciências sociais, devido a essa “visão de objetividade extrema e positivista das representações sociais." (MYNAIO, 2003, p. 92).

Moscovici, por sua vez, não reitera essa passividade do indivíduo, ao contrário, afirma que a sociedade é pensante:

O que estamos sugerindo, pois, é que pessoas e grupos, longe de serem receptores passivos, pensam por si mesmos, produzem e comunicam incessantemente suas próprias e específicas representações e soluções às questões que eles mesmos colocam. Nas ruas, bares, escritórios, hospitais, laboratórios, etc. as pessoas analisam, comentam, formulam "filosofias" espontâneas, não oficiais, que têm um

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impacto decisivo em suas relações sociais, em suas escolhas, na maneira como eles educam seus filhos, como planejam seu futuro, etc. Os acontecimentos, as ciências e as ideologias apenas lhes fornecem o "alimento para o pensamento". (MOSCOVICI, 2003 p. 45)

Moscovici (1978) expõe que, embora a realidade das representações seja de fácil apreensão, o conceito não o é, em parte devido à sua posição "mista" - termo utilizado pelo próprio autor - entre termos psicológicos e sociológicos. No entanto, afirma que, “em poucas palavras, a representação social é uma modalidade de conhecimento particular que tem por função a elaboração de comportamentos e a comunicação entre indivíduos” (MOSCOVICI, 1978, p. 26). Além disso, ele ressalta ainda que tais representações possuem uma função constitutiva da realidade, na medida em que tornam em familiar o "não-familiar" e, assim, vão constituindo sentido às nossas experiências. (MOSCOVICI, 1978).

Ele nega que representação seja simplesmente reprodução ou cópia, mas, antes, esta envolve uma dimensão criadora: “De fato, representar uma coisa, um estado, não consiste simplesmente em desdobrá-lo, repeti-lo ou reproduzi-lo; é reconstituí-lo, retocá-lo, modificar-lhe o texto.” (MOSCOVICI, 1978, p.58).

Denise Jodelet, pesquisadora francesa e grande divulgadora da teoria, em suas obras e estudos, revisou e aprofundou a noção de Representações Sociais de Moscovici. É dela a definição mais aceita entre os que estudam as representações sociais: “uma forma de conhecimento, socialmente elaborado e partilhado, que tem um objetivo prático e concorre para a construção de uma realidade comum a um conjunto social.” (JODELET, 1993, p. 4-5).

Sua obra intitulada “Loucuras e representações sociais” (2005), sobre representações sociais da loucura, a partir de uma pesquisa realizada numa aldeia no interior da França, é um clássico dentro do campo de estudos. Além disso, organizou uma importante coletânea intitulada “As Representações sociais”, publicada em 1989 na França, que chegou apenas em 2001 no Brasil. Nesta obra, ela assina um artigo no qual afirma que complexidade, transversalidade e fecundidade são particularidades da noção de representações proposta por Moscovici:

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Situada na interface do psicológico e do social, a noção tem vocação para interessar todas as ciências humanas. É encontrada em operação na sociologia, antropologia e história, estudada em suas relações com a ideologia, com os sistemas simbólicos e com as atitudes sociais que refletem as mentalidades. (JODELET, 1993, p.7)

Para Moscovici, as representações têm, em sua estrutura, duas faces indissociáveis: a face icônica e a face simbólica, assim sintetizadas:

O autor arremata afirmando que a representação iguala “toda imagem a uma ideia e toda ideia a uma imagem” (MOSCOVICI, 2011, p. 46; MOSCOVICI, 1978).

Outro aspecto importante da teoria refere-se à importância do outro nas representações, o que indica a compreensão de um sujeito social, em oposição à dualidade indivíduo/sociedade, que por tanto tempo imperou na psicologia social norte-americana. Jovchelovitch (2008), em recente obra, discute a questão do conhecimento, utilizando como plataforma para tal discussão as representações sociais. Afirma:

A representação é social porque a criança humana não pode se construir como alguém que sente e pensa sem a participação de outros seres humanos; e é simbólica porque ela usa signos arbitrários para dar sentido ao objeto-mundo. (p.22).

Guareschi e Jovchelovitch (2003) expõem a dificuldade em teorizar acerca da relação entre sujeito individual e sua sociedade, e apontam para a TRS como propiciadora de novas possibilidades:

Em primeiro lugar, porque contra uma epistemologia do sujeito “puro”, ou uma epistemologia do objeto “puro”, a TEORIA DAS REPRESENTAÇÕES SOCIAIS centra seu olhar sobre a relação entre os dois. Ao fazer isso ela recupera um sujeito que, através de sua atividade e relação com o objeto-mundo, constrói tanto o mundo como a si próprio. (p. 19)

Sobre a formação dessas representações, Guareschi e Jovchelovitch (2003, p.20) afirmam que

É quando as pessoas se encontram para falar, argumentar, discutir o cotidiano, ou quando elas estão expostas às instituições, aos meios de

Representação = Figura Significação

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