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UNIVERSIDADE POSITIVO PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM DIREITO RODRIGO JACOB CAVAGNARI

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Academic year: 2022

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RODRIGO JACOB CAVAGNARI

REPERCUSSÃO GERAL EM MATÉRIA CRIMINAL:

AS DECISÕES DE MÉRITO DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL ENTRE OS ANOS DE 2007 E 2020 À LUZ DA RESPONSIVIDADE DO SISTEMA DE JUSTIÇA

CURITIBA 2021

(2)

REPERCUSSÃO GERAL EM MATÉRIA CRIMINAL:

AS DECISÕES DE MÉRITO DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL ENTRE OS ANOS DE 2007 E 2020 À LUZ DA RESPONSIVIDADE DO SISTEMA DE JUSTIÇA

Dissertação apresentada ao Programa de Pós- Graduação em Direito da Universidade Positivo como requisito para a obtenção do título de Mestre em Direito

Área de concentração: Direito, Tecnologia e Desenvolvimento

Orientação: Profª Drª Maria Tereza Uille Gomes

CURITIBA 2021

(3)

Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP) Biblioteca Central - Universidade Positivo - Curitiba - PR Elaborado pela bibliotecária Joelma Marques (CRB-9/1290)

C376 Cavagnari, Rodrigo Jacob.

Repercussão geral em matéria criminal : as decisões de mérito do Supremo Tribunal Federal entre os anos de 2007 e 2020 à luz da responsividade do sistema de justiça / Rodrigo Jacob Cavagnari. ― Curitiba : Universidade Positivo, 2021.

94 f.

Dissertação (Mestrado) – Universidade Positivo, Programa de

Pós-Graduação em Direito, 2021.

Orientador: Profa. Dra. Maria Tereza Uille Gomes.

1. Brasil. Supremo Tribunal Federal. 2.

Repercussão geral em matéria criminal. 3. Sistema de justiça responsivo. I. Gomes, Maria Tereza Uille. II.

Título.

CDU 34

(4)

O Supremo Tribunal Federal, nas duas últimas décadas, passou a se preocupar com a eficiência da prestação jurisdicional. Nesse período, o foco da gestão da Corte Suprema era combater a morosidade do Poder Judiciário. Com isso, ampliou-se o número de decisões proferidas pelo Tribunal. E no ano de 2004, com o advento da Emenda Constitucional 45, foi criado o instituto da repercussão geral, o qual serve de filtro hermenêutico para a análise de recursos extraordinários. A partir do ano de 2007, quando esse instituto foi implantado no órgão plenário, somente os recursos que ultrapassam os interesses subjetivos do processo, e que levam até a Corte Suprema questões relevantes do ponto de vista econômico, político, social ou jurídico, são admitidos com repercussão geral. A eficiência, todavia, não reside apenas na quantidade, mas também na qualidade das motivações dos acórdãos prolatados pelo Supremo Tribunal Federal. É por essa razão que a presente pesquisa tem por objeto a análise das rationes decidendi dos precedentes decididos em sede de repercussão geral. O recorte da pesquisa se dá nos casos julgados entre os anos de 2007 e 2020, no âmbito criminal, em decisões de mérito.

Na pesquisa dos dados foram constatados quarenta e dois casos sob essa classificação.

O marco teórico utilizado para a análise dos dados passa pelas características dos sistemas de justiça de Nonet/Selznick; pelo conceito e características do instituto da repercussão geral; pelos conceitos de precedente, ratio decidendi e inovação; e, por fim, pelos princípios da motivação das decisões, da razoável duração do processo e da colaboração com o juízo. As conclusões atingidas no trabalho constatam, em primeiro lugar, se as rationes decidendi desses precedentes apresentam motivação válida sobre a repercussão geral, e, em segundo lugar, se elas se harmonizam com um sistema de justiça responsivo, sob um viés propositivo, inovador.

Palavras-chave: Supremo Tribunal Federal. Repercussão geral em matéria criminal.

Sistema de justiça responsivo.

(5)

In the last two decades, the Brazilian Supreme Court reveals being concerned about the efficiency of jurisdictional provision. During this period, the Supreme Court’s management focus was to struggle the slowness of the Judiciary work. As a result, the number of decisions by the Court increased. In 2004, with the Constitutional Amendment 45, the institute of general repercussion was created, which serves as a hermeneutic filter for the analysis of extraordinary resources. From the year 2007, when this institute was implemented, only the resources that go beyond the subjective interests of the process, and that lead to the Supreme Court relevant issues from an economic, political, social or legal point of view, are admitted with general repercussion. Efficiency, however, does not reside only in the quantity, but also in the quality of the motivations of the judgments by the Supreme Court. It is for this reason that this research analyzes the rationes decidendi of precedents decided in terms of general repercussion. The research takes place in cases judged between 2007 and 2020, in the criminal matters. In the data search, forty- two cases were found under this classification. The theoretical framework used for data analysis involves the characteristics of justice systems from Nonet/Selznick; by the concept and characteristics of the institute of general repercussion; by the concepts of precedent, ratio decidendi and innovation; and, by the principles of judicial motivated decisions, reasonable length of proceedings, cooperation with the Court. The conclusions of the research verify, firstly, if the rationes decidendi of these precedents present valid motivation on the general repercussion, and, secondly, if they are reliable with a responsive justice system, under a propositional and innovative bias.

Keywords: Brazilian Supreme Court. General repercussion in criminal matters.

Responsive justice system.

(6)

1. INTRODUÇÃO... 7

2. MARCO TEÓRICO... 11

2.1. CARACTERÍSTICAS DOS SISTEMAS DE JUSTIÇA DE NONET/SELZNICK... 11

2.2. PANORAMA DA HISTÓRIA DOS PROCESSOS CRIMINAIS NO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL... 13

2.2.1. A implantação da Agenda 2030 da ONU no STF... 2.3. CONCEITO E CARACTERÍSTICAS DA REPERCUSSÃO GERAL... 19

22 2.4. CONCEITOS DE PRECEDENTE, RATIO DECIDENDI E INOVAÇÃO... 2.5. ÂMBITO DE PROTEÇÃO DO DIREITO FUNDAMENTAL À MOTIVAÇÃO DAS DECISÕES... 2.6. ÂMBITO DE PROTEÇÃO DO DIREITO FUNDAMENTAL À DURAÇÃO RAZOÁVEL DO PROCESSO... 2.7. ÂMBITO DE PROTEÇÃO DO DIREITO FUNDAMENTAL À COLABORAÇÃO NO PROCESSO... 26 27 29 31 3. METODOLOGIA, PROCEDIMENTOS DE PESQUISA E APRESENTAÇÃO DOS DADOS... 34

3.1 TEMA 50 (RE 575144/DF)... 36

3.2 TEMA 59 (RE 579167/AC)... 38

3.3 TEMA 113 (RE 583523/RS)... 39

3.4 TEMA 114 (RE 453000/RS)... 43

3.5 TEMA 129 (RE 591054/SC)... 46

3.6 TEMA 150 (RE 593818/SC)... 49

3.7 TEMA 154 (RE 593.443/SP)... 52

3.8 TEMA 158 (RE 597270/RS)... 55

3.9 TEMA 169 (RE 600817/MS)... 56

3.10 TEMA 170 (RE 597133/RS)... 59

3.11 TEMA 184 (RE 593727/MG)... 61

3.12 TEMA 187 (RE 795567/PR)... 64

3.13 TEMA 237 (RE 583937/RJ)... 67

3.14 TEMA 238 (RE 602072/RS)... 68

3.15 TEMA 239 (RE 602527/RS)... 69

3.16 TEMA 240 (RE 602543/RS)... 71

3.17 TEMA 280 (RE 603616/RO)... 73

3.18 TEMA 370 (RE 601182/MG)... 77

3.19 TEMA 371 (RE 628658/RS)... 79

3.20 TEMA 393 (RE 628624/MG)... 81

3.21 TEMA 423 (RE 641320/RS)... 83

3.22 TEMA 451 (RE 635729/SP)... 90

3.23 TEMA 453 (RE 549560/CE)... 91

3.24 TEMA 478 (RE 640139/DF)... 94

3.25 TEMA 486 (RE 607107/MG)... 96

3.26 TEMA 613 (RE 635145/RS)... 97

(7)

3.30 TEMA 650 (RE 768494/GO)... 107

3.31 TEMA 712 (ARE 666334/AM)... 109

3.32 TEMA 713 (ARE 773765/PR)... 111

3.33 TEMA 811 (ARE 859251/DF)... 113

3.34 TEMA 907 (RE 971959/RS)... 116

3.35 TEMA 925 (ARE 964246/SP)... 121

3.36 TEMA 937 (ARE 999425/SC)... 124

3.37 TEMA 941 (RE 972598/RS)... 126

3.38 TEMA 946 (RE 985392/RS)... 129

3.39 TEMA 959 (RE 1038925/SP)... 132

3.40 TEMA 972 (ARE 1052700/MG)... 133

3.41 TEMA 990 (RE 1055941/SP)... 135

3.42 TEMA 1041 (RE 1116949/PR)... 139

4. ANÁLISE DOS DADOS... 142

4.1 TEMA 50 (RE 575144/DF)... 142

4.2 TEMA 59 (RE 579167/AC)... 143

4.3 TEMA 113 (RE 583523/RS)... 144

4.4 TEMA 114 (RE 453000/RS)... 146

4.5 TEMA 129 (RE 591054/SC)... 147

4.6 TEMA 150 (RE 593818/SC)... 148

4.7 TEMA 154 (RE 593.443/SP)... 149

4.8 TEMA 158 (RE 597270/RS)... 151

4.9 TEMA 169 (RE 600817/MS)... 151

4.10 TEMA 170 (RE 597133/RS)... 152

4.11 TEMA 184 (RE 593727/MG)... 153

4.12 TEMA 187 (RE 795567/PR)... 155

4.13 TEMA 237 (RE 583937/RJ)... 156

4.14 TEMA 238 (RE 602072/RS)... 156

4.15 TEMA 239 (RE 602527/RS)... 157

4.16 TEMA 240 (RE 602543/RS)... 158

4.17 TEMA 280 (RE 603616/RO)... 159

4.18 TEMA 370 (RE 601182/MG)... 161

4.19 TEMA 371 (RE 628658/RS)... 162

4.20 TEMA 393 (RE 628624/MG)... 163

4.21 TEMA 423 (RE 641320/RS)... 164

4.22 TEMA 451 (RE 635729/SP)... 168

4.23 TEMA 453 (RE 549560/CE)... 168

4.24 TEMA 478 (RE 640139/DF)... 169

4.25 TEMA 486 (RE 607107/MG)... 170

4.26 TEMA 613 (RE 635145/RS)... 172

4.27 TEMA 626 (ARE 663261/RS)... 173

4.28 TEMA 647 (RE 638491/PR)... 173

4.29 TEMA 648 (RE 835558/SP)... 174

4.30 TEMA 650 (RE 768494/GO)... 176

(8)

4.34 TEMA 907 (RE 971959/RS)... 179

4.35 TEMA 925 (ARE 964246/SP)... 181

4.36 TEMA 937 (ARE 999425/SC)... 181

4.37 TEMA 941 (RE 972598/RS)... 182

4.38 TEMA 946 (RE 985392/RS)... 183

4.39 TEMA 959 (RE 1038925/SP)... 184

4.40 TEMA 972 (ARE 1052700/MG)... 185

4.41 TEMA 990 (RE 1055941/SP)... 186

4.42 TEMA 1041 (RE 1116949/PR)... 187

5. CONCLUSÕES... 189

REFERÊNCIAS... 193

(9)

1. INTRODUÇÃO

No início do século XXI, as pesquisas acadêmicas, bem como a própria gestão do Supremo Tribunal Federal, revelavam a insatisfação com a efetividade do serviço público prestado pela Corte Suprema. As críticas mais contundentes, na primeira década, convergiam à morosidade de uma resposta judicial do órgão de cúpula do Poder Judiciário. Com o advento da emenda constitucional 45/2004, aliada à competente gestão da ministra Ellen Gracie na presidência, foram implantadas várias medidas administrativas para acelerar o julgamento dos processos no STF. Dentre elas, menciona-se, por exemplo, o advento dos processos eletrônicos, dos julgamentos virtuais e, recentemente, do uso da inteligência artificial (Victor/STF). Nota-se, portanto, que a ideia de um sistema de justiça responsivo almejado tanto pelos estudos acadêmicos – das últimas duas décadas –, quanto para o programa de gestão do STF – nos últimos quinze anos –, tem como foco o aspecto quantitativo, conforme demonstram, inclusive, as publicações institucionais do STF1.

Não obstante se reconheça a importância do aspecto quantitativo para o combate à mora da resposta jurisdicional, observa-se que o aspecto qualitativo das decisões do Supremo Tribunal Federal – órgão de cúpula do Poder Judiciário, responsável pela criação de precedentes – raramente é objeto de análise segundo as lentes de um sistema de justiça responsivo, com exceção de raras pesquisas empíricas recentemente realizadas sob esse viés2.

1 E.g., na publicação “Relatório 2019”, da Presidência do STF, cita-se, expressamente, a relação entre responsividade e a quantidade de decisões proferidas pela Corte: “Os números comprovam a efetividade dessas ações. O acervo atual é o menor dos últimos 20 anos: são 31.279 processos em tramitação, uma redução de 19,12% em relação a 2018. Em 2019, foram proferidas 115.603 decisões. Dentre elas, 17.695 foram colegiadas (Turmas e Plenário), número 21,74% maior do que o ano anterior, revelando o reforço da colegialidade”.

2 V.g., CUNHA, José Ricardo; BARROS JUNIOR, Evandro Monteiro. Espectros de Nonet e Selznick no Supremo Tribunal Federal e no Superior Tribunal de Justiça: os sistemas jurídicos repressivo, autônomo e responsivo. Revista da Faculdade de Direito UFPR, Curitiba, PR, Brasil, v. 64, n. 2, p. 37-60, maio/ago 2019. ISSN 2236-7284. Disponível em: https://revistas.ufpr.br/direito/article/view/62771. Acesso em:

5/7/2020. DOI: http://dx.doi.org/10.5380/rfdufpr.v64i2.62771; SANTOS, Maike Wile dos. O papel da ratio decidendi na construção de súmulas vinculantes pelo Supremo Tribunal Federal: um estudo de caso sobre argumentação e vinculação de precedentes. Revista de Estudos Empíricos em Direito, São Paulo, v. 4, n. 1, fev 2017, p. 140-159; BARBUTO, Campbell. Aspectos controvertidos do filtro da repercussão geral em perspectiva empírica. Revista de Estudos Empíricos em Direito, São Paulo, v. 4, n. 2, jun 2017, p.

105-120; GERALDO, Pedro Heitor Barros; ALMEIDA, Fábio Ferraz de. A produção da decisão judicial: uma

(10)

A inexistência de pesquisas sobre a análise qualitativa das decisões em sede de repercussão geral – que criam teses – é ainda mais acentuada no âmbito criminal. Isso porque, a história do Supremo Tribunal Federal em matéria criminal se confunde com a própria história do habeas corpus no país, que, via de regra, soluciona uma situação jurídica individual e casuística; além disso, era de tradição da Corte Suprema analisá-lo em cognição ampla e exauriente. Por conseguinte, as decisões proferidas em sede de recurso extraordinário em matéria criminal, mesmo em sede de repercussão geral, não despertavam, até o momento, o mesmo interesse de pesquisas e de publicações sobre esse objeto.

Ocorre que, nos últimos anos, a jurisprudência do STF está restringindo a cognição do habeas corpus, como se observa, por exemplo, da subementa do HC 112454, de relatoria da ministra Rosa Weber:

O habeas corpus tem uma rica história, constituindo garantia fundamental do cidadão. Ação constitucional que é, não pode ser o writ amesquinhado, mas também não é passível de vulgarização, sob pena de restar descaracterizado como remédio heroico3.

Nesse momento da dinâmica processual penal, considerando (i) os limites de cognição do habeas corpus; e, (ii) o uso da repercussão geral como instrumento da criação de precedentes, a história da jurisprudência criminal da Corte Suprema, portanto, também será escrita pela via do recurso extraordinário.

Por essas razões, avaliando a existência de uma lacuna de estudos acadêmicos sobre a análise qualitativa das teses criminais fixadas pelo STF em temas de repercussão geral, este trabalho tem como objeto de pesquisa: as fundamentações do STF, em sede de repercussão geral, com julgamento de mérito, no âmbito criminal.

Justifica-se a pertinência da pesquisa, porque, sob uma análise qualitativa, em um primeiro momento, torna-se possível diagnosticar se as rationes decidendi dos precedentes em matéria penal envolvem, de fato, questões relevantes do ponto de vista econômico, político, social ou jurídico que ultrapassam interesses subjetivos; e, em um

abordagem praxeológica dos julgamentos judiciais. Revista de Estudos Empíricos em Direito, São Paulo, v. 4, n. 3, out 2017, p. 23-37.

3 HC 112454, Relatora: Rosa Weber, Primeira Turma, julgado em 19/03/2013, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-066 DIVULG 10-04-2013 PUBLIC 11-04-2013.

(11)

segundo momento, se essas rationes decidendi apresentam inovação4 nas justificações de caráter prático e público, com um viés propositivo, em harmonia com um sistema de justiça responsivo.

Justifica-se a aderência do trabalho à área de concentração Direito, Tecnologia e Desenvolvimento, porque a criação de precedentes pelo STF, em sede de repercussão geral, exige uma responsividade qualitativa para atenuar os riscos de violação de garantias fundamentais e, ao mesmo tempo, ampliar a estabilidade, a efetividade e a uniformização da jurisprudência em todo o território nacional.

Justifica-se a aderência do trabalho à linha de atuação Sistemas de Justiça e Políticas Públicas, porque o estudo do sistema de justiça responsivo, sob a perspectiva qualitativa, faz parte de um planejamento estratégico das instituições públicas de compromisso com a transparência, bem como para dar a segurança jurídica ao jurisdicionado e à sociedade, por intermédio de justificações racionais que visem a solução de problemas práticos.

Justifica-se a aderência do trabalho nas agendas investigativas, porque (a) desenvolve estudos e pesquisas aplicadas no âmbito da jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, com amplitude nacional; (b) capacita os profissionais do Direito, permitindo uma reflexão sobre a sua própria prática perante a Corte Suprema; (c) produz e dissemina conhecimento jurídico empírico relacionado ao julgamento de questões constitucionais relevantes, no âmbito criminal, por uma Corte de Superposição; (d) insere-se no debate global, inclusive da Agenda 2030, no aspecto do desenvolvimento de instituições eficazes (meta 16.6)5.

O problema de pesquisa, portanto, pode ser sintetizado na seguinte pergunta: as rationes decidendi dos acórdãos proferidos em sede de repercussão geral em matéria criminal, com mérito julgado, entre os anos de 2007-2020, apresentam inovação, identificando-se com um sistema de justiça responsivo?

4 Segundo o artigo 2º, IV, da Lei 10973/2004, conceitua-se inovação como: “introdução de novidade ou aperfeiçoamento no ambiente produtivo e social que resulte em novos produtos, serviços ou processos ou que compreenda a agregação de novas funcionalidades ou características a produto, serviço ou processo já existente que possa resultar em melhorias e em efetivo ganho de qualidade ou desempenho”.

5 Segundo a observação do IPEA sobre essa meta, o termo “eficaz” deve ser lido “efetivo”. Efetividade:

“capacidade de alcançar os resultados pretendidos” (MARINHO, Alexandre; FAÇANHA, Luís Otávio (2001):

Programas Sociais: Efetividade, eficiência e eficácia como dimensões operacionais da avaliação, Texto para Discussão, N. 787, Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA), Brasília, p. 2).

(12)

A partir dessa pergunta de pesquisa, apresenta-se, nos tópicos a seguir, o marco teórico, a revisão bibliográfica, a metodologia e os procedimentos de pesquisa, os dados, o cronograma e a bibliografia utilizados na estrutura da dissertação.

(13)

2. MARCO TEÓRICO

O marco teórico dessa pesquisa passa (i) pelas características dos sistemas de justiça de Nonet/Selznick, (ii) por um panorama do desenvolvimento da jurisprudência criminal no Supremo Tribunal Federal, (iii) pelos conceitos e características do instituto da repercussão geral; (iv) pelos conceitos de precedente, ratio decidendi e inovação; (v) pelo âmbito de proteção do direito fundamental à motivação das decisões; (vi) pelo âmbito de proteção do direito fundamental à duração razoável do processo; e, (vii) pelo âmbito de proteção do direito fundamental à colaboração no processo.

2.1. CARACTERÍSTICAS DOS SISTEMAS DE JUSTIÇA DE NONET/SELZNICK

O marco teórico parte da análise do conceito de sistema de justiça responsivo.

Segundo Nonet/Selznick, na obra “Direito e sociedade: a transição ao sistema jurídico responsivo”6, o Direito, como um sistema jurídico, contém não apenas um conjunto de normas válidas (direito positivo), mas uma série de variáveis que diferem significativamente de acordo com a mudança de contextos7.

Nonet/Selznick, na obra citada, focam a análise no sistema de justiça, onde buscam compreender como se constitui a cultura jurídica e os parâmetros de interpretação e aplicação do direito positivo. O sistema jurídico é identificado por eles através de um conjunto de variáveis, as quais permeiam e definem três modelos de justiça.

O modelo de justiça repressivo8 tem como finalidade a manutenção da ordem, de sua legitimidade e da razão de ser do Estado, apresentando, por exemplo, as seguintes características marcantes: (i) subordinação do direito ao poder político conforme interesses dos grupos dominantes; (ii) a preservação da autoridade, sob uma perspectiva

6 NONET, Philippe; SELZNICK, Philip. Direito e sociedade: a transição ao sistema jurídico responsivo.

Rio de Janeiro: Revan, 2010.

7 NONET, Philippe; SELZNICK, Philip. Direito e sociedade: a transição ao sistema jurídico responsivo.

Rio de Janeiro: Revan, 2010, p. 54.

8 NONET, Philippe; SELZNICK, Philip. Direito e sociedade: a transição ao sistema jurídico responsivo.

Rio de Janeiro: Revan, 2010, p. 71 e ss.

(14)

de oficialidade, é uma preocupação dominante no mundo dos operadores do direito; (iii) o Código Penal reflete costumes dominantes onde o moralismo legal prevalece.

O modelo de justiça autônomo9 tem como finalidade a estabilidade do Estado fundada no consentimento, na autonomia e na independência das autoridades, apresentando, e.g., as seguintes características: (i) separação entre direito e política, com clara distinção entre as funções judiciárias e legislativas; (ii) a ordem jurídica adota um modelo normativo, em que as normas ajudam a impor a responsabilidade oficial e, ao mesmo tempo, limita a criatividade das instituições judiciárias; (iii) o procedimento se torna o coração do direito, em que prevalece a regularidade, e não a justiça substantiva;

(iv) a fidelidade à lei significa estrita obediência às normas do direito positivo, onde qualquer crítica às leis existentes deve ser canalizada através do processo político.

Por fim, o modelo de justiça responsivo10 tem como finalidade a concretização da justiça substantiva a partir da busca de respostas e soluções para os problemas que permeiam as controvérsias que chegam aos agentes do sistema de justiça, apresentando as seguintes características: (i) a dinâmica do desenvolvimento do direito aumenta a predominância do viés propositivo na argumentação jurídica; (ii) a finalidade tensiona a autoridade do direito, atenua a exigência de obediência e abre a possibilidade de uma concepção da ordem pública menos rígida e mais civil; (iii) à medida que o direito adquire abertura e flexibilidade, a defesa jurídica de causas públicas assume uma dimensão política, gerando forças que ajudam corrigir e modificar as instituições legais; (iv) uma regra não se sustenta por sua validade, mas pela sua capacidade de realizar certos fins;

(v) eleva-se o grau de racionalidade no processo de argumentação jurídica, pois a fundamentação das decisões não depende apenas da correta técnica jurídica, mas exige também uma justificação convincente de que aquela é a melhor decisão, que melhor concretiza princípios, que mais realiza os fins do direito e que produz as consequências mais positivas naquele contexto real; (vi) o pensamento jurídico consequencialista contrabalança a tendência de magistrados se esconderem atrás de regras e se esquivarem de sua responsabilidade com o jurisdicionado e com a sociedade.

9 NONET, Philippe; SELZNICK, Philip. Direito e sociedade: a transição ao sistema jurídico responsivo.

Rio de Janeiro: Revan, 2010, p. 98 e ss.

10 NONET, Philippe; SELZNICK, Philip. Direito e sociedade: a transição ao sistema jurídico responsivo.

Rio de Janeiro: Revan, 2010, p. 121 e ss.

(15)

O recorte do marco teórico dessa pesquisa está na ideia de um sistema de justiça responsivo, o qual, prima facie, guarda pertinência com o instituto da repercussão geral utilizado, hodiernamente, pelo Supremo Tribunal Federal.

Essa pertinência se justifica porque o objetivo desse instituto é debater e julgar questões jurídicas relevantes, em argumentação jurídica com justificação racional e prática, sob um viés propositivo, que deve impactar um determinado contexto social, veiculada por intermédio da edição de teses que sintetizam as rationes decidendi desses julgamentos em sede de recurso extraordinário.

2.2. PANORAMA DA HISTÓRIA DOS PROCESSOS CRIMINAIS NO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL

O instituto da repercussão geral – que prestigia a jurisdição constitucional em matéria penal – é recente, quando se analisa, com acuidade, a história da estrutura e da jurisprudência do órgão de cúpula do Poder Judiciário nacional, principalmente no âmbito penal.

Os órgãos de cúpula da Justiça brasileira, em ordem sucessiva, considerada a sua precedência história, foram: (i) o Tribunal de Relação, criado em Salvador, no ano de 1587, entretanto, não instalado por não haverem chegado ao país os seus integrantes;

somente em 13 de outubro de 1751 surge o Tribunal da Relação do Rio de Janeiro, criada por alvará de D. José I; (ii) a Casa da Suplicação do Brasil, instituída pelo Príncipe Regente D. João, mediante Alvará régio de 10 de maio de 1808; (iii) o Supremo Tribunal de Justiça, ainda na fase do Império; e, (iv) o Supremo Tribunal Federal, na fase da República.

Esses órgãos de cúpula da Justiça do país, ao longo do nosso processo histórico, desde a fase colonial (Tribunal de Relação e Casa da Suplicação do Brasil), passando pelo regime monárquico (Supremo Tribunal de Justiça) e chegando à República (Supremo Tribunal Federal), abrangem um período de mais de 350 anos, cumprindo, ao longo desses períodos, missões distintas11.

11 MELLO FILHO, José Celso de. Notas sobre o Supremo Tribunal (Império e República). 4 ed. Brasília:

STF, 2014, p. 10.

(16)

Observa-se que o Supremo Tribunal de Justiça, órgão de cúpula da Justiça do país durante o Império, previsto na Carta Imperial de 25 de março de 1824 e organizado pela Lei de 18 de setembro de 1828, foi instalado em 09 de janeiro de 1829, sob a presidência do Conselheiro José Albano Fragoso, natural de Lisboa (Portugal); o presidente foi escolhido pelo Imperador, com o mandato de três anos12. Em 19 de outubro de 1828 foram nomeados, por decretos imperiais, os Ministros que deveriam integrar o Supremo Tribunal de Justiça. Esta Corte era constituída de 17 juízes13.

Segundo a Lei de 1828, competia ao Supremo Tribunal de Justiça: (i) julgar delitos e erros de ofício que cometessem os seus Ministros, os das Relações, os Empregados do Corpo Diplomático e os Presidentes das Províncias; (ii) decidir sobre conflitos de jurisdição das Relações Provinciais; e, (iii) notadamente, conceder ou denegar revistas, recurso extremo para examinar apenas a questão de direito e a violação da lei, denominado pela doutrina como recurso extraordinário de revisão14.

Não obstante escassa a função política deste Tribunal, pois não lhe fora incumbida a defesa da Constituição, é indiscutível a importância que ele representou, sendo o órgão de cúpula da Justiça do país após a desvinculação dos laços coloniais.

De modo distinto do órgão que o antecedeu – Casa da Suplicação do Brasil – personificou a ruptura definitiva da submissão da Justiça Brasileira à da Metrópole Lusitana.

O Supremo Tribunal de Justiça exerceu suas atividades, sem interrupção, até o advento da República. Durante os 61 anos de existência deste órgão de cúpula, participaram do Supremo Tribunal de Justiça 124 Ministros, dos quais 11 ascenderam à presidência15.

Conforme consta do acervo documental eletrônico do Supremo Tribunal Federal, dentre os julgamentos mais importantes dessa fase encontram-se os de matéria criminal, em três habeas corpus.

12 MELLO FILHO, José Celso de. Notas sobre o Supremo Tribunal (Império e República). 4 ed. Brasília:

STF, 2014, pp. 10-11.

13 SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. Supremo Tribunal Federal 160 anos (1828-1988), Brasília: STF, 1988, p. 7.

14 SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. Supremo Tribunal Federal 160 anos (1828-1988), Brasília: STF, 1988, p. 8.

15 SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. Supremo Tribunal Federal 160 anos (1828-1988), Brasília: STF, 1988, pp. 8-9.

(17)

No julgamento do HC 73, ocorrido nas sessões dos dias 31 de agosto de 1870 e 03 de setembro de 1870, o Supremo Tribunal de Justiça concedeu a ordem de soltura, por considerar ilegal a detenção e não haver provas suficientes contra o paciente Nicolla Hanhello Mattocello, cidadão italiano, preso em Casa de Detenção, acusado de ser depositário infiel (Livro de Atas de Julgamento n. 11, p. 31).

Já no julgamento do HC 88, ocorrido na sessão do dia 03 de maio de 1871, o Supremo Tribunal de Justiça indeferiu a petição de habeas corpus por estar provado que os pacientes José Alves Pereira de Carvalho e Henrique Alves de Carvalho já se encontravam pronunciados em crime inafiançável, por saciar sede de vingança do Juízo municipal da 1ª Vara do Rio, que os pronunciou como mandantes em crime de estelionato (Livro de Atas de Julgamento n. 11, p. 69).

E no julgamento do HC 652, ocorrido na sessão do dia 05 de dezembro de 1888, o Supremo Tribunal de Justiça indeferiu a petição de habeas corpus por inexistirem fundamentos jurídicos para a concessão da ordem ao paciente Martinho José dos Prazeres, acusado de falsificação de assinatura de documento (Livro de Atas de Julgamento n. 18, p. 55).

Observa-se, a partir da análise do Catálogo de Processos Históricos do Supremo Tribunal Federal16, que a matéria criminal predominava nos julgamentos mais relevantes do Supremo Tribunal de Justiça.

Do acervo documental histórico dos julgamentos, constata-se o seguinte número de julgamento de classes processuais: (i) 119 acórdãos de habeas corpus; (ii) 9 acórdãos de revista comercial; (iii) 3 acórdãos de processo de responsabilidade; (iv) 3 acórdãos de revista cível; (v) 2 acórdãos de ação de embargo; (vi) 2 acórdãos de processo-crime; (vii) 1 acórdão de ação criminal; (viii) 1 acórdão de ação de corpo de delito indireto; (ix) 1 acórdão de ação de alimentos; (x) 1 acórdão de ação de libelo; (xi) 1 acórdão de justificação de testemunha; (xii) 1 acórdão de conflito de jurisdição; (xiii) 1 acórdão de recurso de graça; (xiv) 1 acórdão de manifestação de revista.

Nota-se, portanto, que a preocupação político-administrativa do Supremo Tribunal de Justiça, naquela época, consistia na desvinculação dos laços da Corte com a realidade

16 SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. Catálogo de processos históricos do Supremo Tribunal Federal.

Brasília: STF, 2017.

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do país colonizador. Quanto à prestação jurisdicional, a Corte estava concentrada na apreciação de demandas individuais, julgadas em última instância. Tratava-se esta instituição de um Tribunal de Justiça, o qual não tinha a missão de guarda da Constituição.

Já o Supremo Tribunal Federal deixou de ser um simples Tribunal de Justiça, então destinado para guarda dos direitos individuais, e passou a se preocupar com a função principal de um tribunal de alta política e de guarda supremo da Constituição – verdadeiro órgão com poderes de governo.

Organizado com fundamento no Decreto 848 de 11 de outubro de 1890, editado pelo Governo Provisório da República, o Supremo Tribunal Federal teve a sua instituição prevista na Constituição republicana de 24 de fevereiro de 1891 (artigos 55 e 56).

Segundo ata obtida no acervo documental da Corte, o Supremo Tribunal Federal foi instalado no dia 28 de fevereiro de 1891, quando realizada a sua primeira sessão plenária, sob a presidência interina do Ministro Sayão Lobato (Visconde de Sabará), que, até então, presidira o Supremo Tribunal de Justiça.

Nessa mesma sessão plenária, aberta às 13 horas, o Supremo Tribunal Federal elegeu o seu primeiro Presidente, que foi o Ministro Freitas Henriques, natural da Bahia, e o seu primeiro Vice-Presidente, que foi o Ministro Olegário de Aquino e Castro, natural de São Paulo17.

A Constituição de 1891, no artigo 55, colocou o Supremo Tribunal Federal na cúpula do Poder Judiciário, instituído como um dos órgãos da soberania nacional. O STF era composto, originariamente, de 15 juízes (Constituição de 1891, artigo 56). Desta composição inicial, participaram 10 dos antigos Ministros do Supremo Tribunal de Justiça18.

Como relembrou o Ministro Carlos Thompson Flores, Presidente da Corte Suprema durante o sesquicentenário do Supremo Tribunal Federal (Ata da Segunda Sessão Solene, realizada em 18 de setembro de 1978, p. 30), a Corte, no momento inicial republicano, superou vários óbices, em memoráveis batalhas judiciárias, a começar pelo

17 SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. Supremo Tribunal Federal 160 anos (1828-1988), Brasília: STF, 1988, p. 9.

18 SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. Supremo Tribunal Federal 160 anos (1828-1988), Brasília: STF, 1988, p. 9.

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HC 300, impetrado por Rui Barbosa em favor de presos políticos, julgado na sessão de 27 de abril de 1892. Na hipótese, o Plenário do Supremo Tribunal Federal indeferiu a petição de habeas corpus, sob o fundamento da fiel aplicação dos novos textos legais previstos na Constituição de 1891, especificamente, sobre o estado de sítio (Revolta da Armada). Na sustentação oral, Rui descreveu a atmosfera da nova Corte:

Subjugado pela vocação desta causa incomparável, custa-me, entretanto, a dominar o respeito, quase supersticioso, com que me acerco deste tribunal, o oráculo da nova Constituição, a encarnação viva das instituições federais (Ata da Segunda Sessão Solene, realizada em 18 de setembro de 1978, p. 31).

No período compreendido entre 1892 e 1903, dentre os casos mais importantes, de acordo com o acervo de documentos eletrônicos do STF, todos derivam de matéria criminal (HCs 300, 406, 410, 415, 1063, 1073, 1974).

Esses casos, inclusive, eram utilizados para fins de exegese das novas regras e princípios estabelecidos na Constituição de 1891, do sistema checks and balances e do controle de constitucionalidade das leis, como se encontra no voto do Ministro Bernardino Ferreira, no julgamento do HC 1073, que concede a ordem de habeas corpus aos pacientes, concluindo que “sem formal transgressão do espírito da Lei Fundamental, não pode o presidente da República arrogar-se o direito de desterrar presos políticos para sítios destinados aos sentenciados em crimes comuns”.

Assim como foi constatado na pesquisa sobre o Supremo Tribunal de Justiça, essa é uma característica comum encontrada nos julgamentos históricos do Plenário do Supremo Tribunal Federal, desde o ano 1892 até o ano de 1991: a grande maioria dos acórdãos históricos deriva de matéria criminal, veiculados por meio da ação de habeas corpus.

Do acervo documental do STF, selecionado pela Coordenadoria de Gestão Documental e Memória Institucional, constata-se o seguinte número de julgamentos históricos de classes processuais: (i) 29 acórdãos de habeas corpus; (ii) 7 acórdãos de mandado de segurança; (iii) 3 acórdãos de recurso de habeas corpus; (iv) 3 acórdãos de extradição; (v) 2 acórdãos de recurso criminal; (vi) 1 acórdão de ação cível originária; (vii) 1 acórdão de ação criminal.

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Essa história dos processos e julgamentos criminais, no Plenário do Supremo Tribunal Federal mudou substancialmente no século XXI, como registra a doutrina:

O Supremo Tribunal Federal nunca esteve tão visível para a sociedade civil quanto nos últimos anos. Nos primeiros quinze anos após a promulgação da Constituição de 1988, embora algumas decisões do STF possam ter chamado a atenção de pessoas de fora do mundo jurídico, é certo que os integrantes do tribunal não eram conhecidos, às vezes nem mesmo dos estudiosos do direito constitucional. Hoje, ao contrário, não apenas as decisões, mas também os membros do STF estão submetidos a uma intensa publicidade e sobre elas e eles se comenta e se discute cotidianamente. Ministros e ministras do STF são mais conhecidos do que os membros do Congresso Nacional19.

Cumpre destacar, ainda, que entre os anos de 2005 e 2013, o Plenário do Supremo Tribunal Federal se ocupou do julgamento do Inquérito 2245 que foi convertido na Ação Penal 470 (Caso Mensalão). O julgamento da AP 470 foi o mais longo da história do STF. Foram necessárias 53 sessões plenárias para julgar o processo. E esse caso trouxe extrema publicidade à instituição, como retrata Silva:

O protagonismo do STF também foi ampliado em razão de julgamentos que colocaram em questão a independência do tribunal para controlar o sistema político. Um caso paradigmático nesse sentido foi o julgamento da ação penal 470, que envolveu aquilo que ficou conhecido como mensalão, um esquema de compra de apoio parlamentar em votações de interesse do Poder Executivo no Congresso Nacional. Embora oito dos doze ministros e ministras do STF na época houvessem sido indicados por presidentes vinculados ao Partido dos Trabalhadores (PT) e embora os envolvidos na ação fossem importantes figuras desse partido, ainda assim o tribunal decidiu pela condenação de boa parte deles.

Com isso, a reputação do tribunal como instituição independente ficou fortalecida20.

Após o julgamento da AP 470, nesta última década, verifica-se que a preocupação hodierna do Plenário do Supremo Tribunal Federal passou a ser o julgamento de matérias com repercussão geral, visando cumprir a missão primordial que lhe compete: a de julgar questões constitucionais com relevância social, política, econômica ou jurídica, que transcendam os interesses subjetivos da causa.

19 SILVA, Virgílio Afonso da. Direito constitucional brasileiro. São Paulo: Editora da Universidade de São Paulo, 2021, p. 508.

20 SILVA, Virgílio Afonso da. Direito constitucional brasileiro. São Paulo: Editora da Universidade de São Paulo, 2021, p. 509.

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2.2.1. A implantação da Agenda 2030 da ONU no STF

Esse escopo de relevância da matéria a ser julgada pela Corte Suprema revela perfeita harmonia com a recente inclusão da Agenda 2030 da Organização das Nações Unidas no âmbito do Supremo Tribunal Federal. Trata-se de um momento histórico de inovação do Poder Judiciário na forma de taxonomia do órgão de cúpula do Poder Judiciário.

Por intermédio da Portaria CNJ 133 de 28 de setembro de 2018, da Presidência do CNJ, o Ministro Dias Toffoli instituiu o Comitê Interinstitucional, sob a coordenação da conselheira Maria Tereza Uille Gomes, destinado a proceder estudos e apresentar proposta de integração das metas do Poder Judiciário com as metas e os indicadores dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS), da Agenda 2030 da ONU.

Um dos pontos importantes analisados pelo Comitê Institucional foi a inovação. Na oportunidade, constatou-se que os desafios se intensificaram em todas as esferas e as respostas a esses desafios se tornam urgentes, fazendo que a gestão pública procure incorporar novos elementos que lhes permitam atender aos anseios e às demandas sociais. O desafio proposto a partir da Agenda 2030 é um exemplo dessa complexidade, associado à prestação dos serviços públicos, incluindo-se aí a prestação jurisdicional.

No discurso de posse na presidência do Supremo Tribunal Federal, em 10 de setembro de 2020, o Ministro Luiz Fux demonstrou a importância da Agenda 2030 da ONU em sua gestão:

Nossa gestão no Supremo Tribunal Federal e no Conselho Nacional de Justiça compreenderá cinco eixos de atuação. São eles: 1) a proteção dos direitos humanos e do meio ambiente; 2) a garantia da segurança jurídica conducente à otimização do ambiente de negócios no Brasil; 3) o combate à corrupção, ao crime organizado e à lavagem de dinheiro, com a consequente recuperação de ativos; 4) o incentivo ao acesso à justiça digital, e 5) o fortalecimento da vocação constitucional do Supremo Tribunal Federal. Todos esses eixos encontram-se alinhados aos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável da Agenda 2030 da Organização das Nações Unidas.

Em 20 de novembro de 2020, o Presidente do Supremo Tribunal Federal, Ministro Luiz Fux, assinou a Resolução 710, em que institucionaliza a Agenda 2030 da Organização das Nações Unidas no âmbito da Corte Suprema.

(22)

No texto da mencionada resolução consta a importância de alinhar a governança do Supremo Tribunal Federal com os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável estabelecidos na Agenda 2030 da ONU com o fim de incrementar o accountability da Corte, aprimorar seus processos internos e humanizar sua gestão.

Além disso, acentua a relevância de alinhar os processos e os procedimentos internos do Supremo Tribunal Federal com os padrões internacionais, com a identificação das controvérsias jurídicas aos respectivos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável e com o consequente aprimoramento da metodologia de classificação, agrupamento e organização dos processos.

E ressalta que a atuação jurisdicional do Supremo Tribunal Federal contribui, efetivamente, para o cumprimento das metas associadas aos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável da Agenda 2030 da ONU e aos valores nela insculpidos, uma vez que o ODS 16 (Paz, Justiça e Instituições Eficazes) estabelece a meta de promover instituições fortes, inclusivas, e transparentes em todos os níveis; o desenvolvimento de uma sociedade pacífica e baseada no respeito aos direitos humanos;

e a expansão do acesso efetivo à justiça.

A Resolução 710 ainda institui um grupo de trabalho para a implantação da Agenda 2030 no Supremo Tribunal Federal. Atribui-se a esse grupo de trabalho a coordenação do desenvolvimento de atividades de extração de dados e de análise de feitos da competência do STF, julgados ou não, especialmente as ações de controle concentrado e os temas de repercussão geral, para sua indexação relativa aos ODS preconizados pela Agenda 2030.

Ressalta, também, a necessidade de realização de ações conjuntas com outras instituições do sistema de justiça, da sociedade civil e da academia, voltadas à promoção dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável, com ênfase na temática “Paz, Justiça e Instituições Eficazes” (ODS 16).

Além disso, essa é a primeira vez que o Supremo Tribunal Federal autoriza a priorização de sua pauta a partir de dados externos. E tal medida implicará em relevante impacto nas decisões.

Segundo a Resolução 710, as pautas de julgamento, os informativos de jurisprudência e o acompanhamento processual podem tornar visível o apontamento do

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ODS correspondente, competindo: (i) à Assessoria de Plenário a identificação, na lista de processos pautados para o Plenário, de ações judiciais relacionadas aos ODS da Agenda 2030, conforme definições e diretrizes do Secretário Geral da Presidência; (ii) à Secretaria de Gestão de Precedentes a catalogação, no espelho do acórdão dos processos, da respectiva referência ao ODS da Agenda 2030, inclusive nos casos de novos temas submetidos à repercussão geral; e, (iii) à Secretaria Judiciária a catalogação de ações e recursos cuja aderência à Agenda 2030 for verificada, com anotação dos respectivos ODS no sistema informatizado de acompanhamento processual.

É oportuno ressaltar que no portal eletrônico do Supremo Tribunal Federal foi criado um hotsite21 específico para a Agenda 2030 da ONU, inclusive com uma aba

“Painel de Dados” que corresponde ao monitoramento de ações de controle concentrado e de recursos com repercussão geral reconhecida pelo Plenário do STF, com indicativo de correlação com um ou mais objetivos de desenvolvimento sustentáveis (ODS) da Agenda 2030 da ONU.

Conforme noticia o referido portal eletrônico, a pesquisa considerou os processos julgados em 2020 que foram divulgados no informativo de jurisprudência ou incluídos na pauta dirigida do Plenário ou inseridos na pesquisa de jurisprudência (acórdãos publicados em 2020).

O painel foi desenvolvido utilizando a ferramenta Qlik Sense, que permite uma análise interativa dos dados, em que é possível filtrar os dados por categoria (controle concentrado ou repercussão geral), por processos que estão na pauta do Plenário, por origem (estado de procedência) do processo, por ODS (basta clicar no gráfico), por classe, por processos finalizados ou em tramitação.

Nesse contexto, cabe mencionar, por oportuno, a Resolução 333 do Conselho Nacional de Justiça, de 21 de setembro de 2020, que considerou imperiosa a necessidade de possibilitar fácil acesso às informações consolidadas da atividade-fim dos órgãos do Poder Judiciário para a tomada de decisões e a imprescindibilidade do uso de dados atuais, confiáveis e desagregados, disponíveis em um mesmo campo/espaço no portal do tribunal. Essa reunião de dados abertos se dá por meio de

21 http://portal.stf.jus.br/hotsites/agenda-2030/

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painéis de business intelligence e relatórios estatísticos. A indexação tem como critério os ODS, em respeito à Agenda 2030 da ONU.

Para os fins da Resolução CNJ 333/2020, segundo dispõe o artigo 2º, inciso II, considera-se painéis toda forma de apresentação de métricas e indicadores que possibilite ao usuário a realização de consultas dinâmicas e interativas. Um dos painéis é o “Justiça em Números”, principal fonte das estatísticas oficiais do Poder Judiciário.

Anualmente, desde 2004, o Relatório Justiça em Números divulga a realidade dos tribunais brasileiros, com detalhamentos da estrutura e litigiosidade, além dos indicadores e das análises essenciais para subsidiar a gestão judiciária brasileira.

É importante salientar que, de acordo com o artigo 3º, inciso II, da Resolução CNJ 333/2020, os painéis com os dados de litigiosidade deverão conter os indicadores de desempenho e produtividade, tais como a taxa de congestionamento, índice de atendimento à demanda e tempo de duração dos processos.

Tais estudos do Conselho Nacional de Justiça podem ser analisados em uma série aproximadamente 30 relatórios temáticos encontradas em seu portal eletrônico22, desenvolvida como forma de sistematização de dados e informações levantadas em grupos de estudos e pesquisas, formados para auxiliar a Comissão Permanente de Acompanhamento dos ODS e da Agenda 2030, no desempenho de suas atribuições, em prol da consolidação dessa pauta do Poder Judiciário.

2.3. CONCEITO E CARACTERÍSTICAS DA REPERCUSSÃO GERAL

O instituto da repercussão geral é utilizado como referencial para o trabalho.

Instituído pela EC 45/2004, o texto da Constituição da República, em seu artigo 102, § 3º, prevê que:

No recurso extraordinário o recorrente deverá demonstrar a repercussão geral das questões constitucionais discutidas no caso, nos termos da lei, a fim de que o Tribunal examine a admissão do recurso, somente podendo recusá-lo pela manifestação de dois terços de seus membros.

22 https://www.cnj.jus.br/programas-e-acoes/agenda-2030/liods-cnj-laboratorio-de-inovacao-inteligenica-e- ods/relatorios/

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O Código de Processo Civil, em seu artigo 1.035, § 1º, conceitua o instituto da repercussão geral nos seguintes termos:

Para efeito de repercussão geral, será considerada a existência ou não de questões relevantes do ponto de vista econômico, político, social ou jurídico que ultrapassem os interesses subjetivos do processo.

Ainda, no artigo 322 do RISTF: “O Tribunal recusará recurso extraordinário cuja questão constitucional não oferecer repercussão geral, nos termos deste capítulo”. E seu parágrafo único: “Para efeito da repercussão geral, será considerada a existência, ou não, de questões que, relevantes do ponto de vista econômico, político, social ou jurídico, ultrapassem os interesses subjetivos das partes”.

E na doutrina de Dinamarco conceitua-se o instituto do seguinte modo:

Repercussão geral é, nesse contexto, a relevância ultra partes da questão constitucional posta em julgamento, seja porque a decisão a ser tomada pelo Supremo Tribunal Federal possa constituir precedente para muitos outros julgamentos, seja porque o tema diga respeito a valores particularmente elevados, de interesse nacional, ou a uma quantidade significativa de pessoas23.

O Supremo Tribunal Federal distingue entre questões constitucionais marcadas pela relevância ou irrelevância, de modo que apenas as primeiras autorizam o conhecimento do recurso extraordinário.

Desse modo, volta-se o recurso extraordinário mais à proteção da ordem jurídica, sem olvidar que o Supremo Tribunal Federal, ao decidir o mérito recursal, também lhe atribui o efeito substitutivo. A adoção desse instituto tem o condão de maximizar a feição objetiva do recurso extraordinário24. E hoje é a repercussão geral que estabelece o equilíbrio entre o acesso irrestrito às Cortes de superposição e o papel dessas Cortes em atribuir a leitura final sobre os direitos em disputa25.

Coloca-se, portanto, o paralelo entre a repercussão geral e a arguição de relevância, instituto aplicado ao recurso extraordinário até o advento da Constituição da

23 DINAMARCO, Cândido Rangel. Vocabulário do processo civil. São Paulo: Malheiros, 2009, p. 244.

24 MENDES, Gilmar Ferreira; COELHO, Inocêncio Mártires; BRANCO, Paulo Gustavo Gonet. Curso de direito constitucional. São Paulo: Saraiva, 2007, p. 911.

25 ROCHA, Mauro Sérgio. Aplicação direta dos princípios constitucionais: controle de constitucionalidade das decisões judiciais. Porto Alegre: Sérgio Antonio Fabris Editor, 2016, p. 185.

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República de 1988. Vale dizer, a partir do advento da Constituição de 1988 e a Emenda Constitucional 45/2004, a interposição do recurso extraordinário passou a exigir a repercussão geral como requisito de admissibilidade do extraordinário. E isso se deu a partir de 03 de maio de 2007, porque, em questão de ordem no AI 664567, o Supremo Tribunal Federal decidiu que ela deveria incidir a partir da publicação da Emenda Regimental 21, de 30 de abril de 200526.

A arguição de relevância e a repercussão geral são mecanismos de filtragem, mas com algumas peculiaridades. A arguição de relevância – então prevista no artigo 327, § 1º, do RISTF, redação atribuída pela Emenda Regimental 02, de 04.12.1985 – dispunha:

“Entende-se relevante a questão federal que, pelos reflexos na ordem jurídica, considerados os aspectos morais, econômicos, políticos ou sociais da causa, exigir a apreciação do recurso extraordinário pelo Tribunal”.

Já a repercussão geral, para além da relevância da matéria sob os pontos de vista econômico, político, social e jurídico, leitura que em muito se aproxima da arguição de relevância, ainda pressupõe que o tema ultrapasse os limites subjetivos da causa27. Segundo Marinoni/Mitidiero:

A fim de caracterizar a existência de repercussão geral e, dessarte, viabilizar o conhecimento do recurso extraordinário, nosso legislador alço mão de uma fórmula que conjuga relevância e transcendência (repercussão geral = relevância + transcendência)28.

A relevância se opera pela repercussão geral da decisão sob os pontos de vista econômico, político, social ou jurídico – conceitos indeterminados. Evidente, portanto, as zonas de certeza – positiva e negativa –, ao passo que as zonas intermediárias é que permanecem em aberto. Sendo assim, em tese, pode-se dizer que uma demanda voltada à discussão de específica reclassificação funcional não enseja relevância jurídica e, porque circunscrita exclusivamente aos litigantes, também não se caracteriza pela transcendência (= zona de certeza negativa). De outro lado, uma demanda coletiva para

26 ROCHA, Mauro Sérgio. Aplicação direta dos princípios constitucionais: controle de constitucionalidade das decisões judiciais. Porto Alegre: Sérgio Antonio Fabris Editor, 2016, p. 186.

27 ROCHA, Mauro Sérgio. Aplicação direta dos princípios constitucionais: controle de constitucionalidade das decisões judiciais. Porto Alegre: Sérgio Antonio Fabris Editor, 2016, p. 187.

28 MARINONI, Luiz Guilherme; MITIDIERO. Repercussão geral no recurso extraordinário. São Paulo:

Revista dos Tribunais, 2007, p. 33.

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tutela de direitos ou interesses difusos pode ser relevante do ponto de vista social e, porque diz respeito a um número absolutamente indeterminado de sujeitos, também pode alimentar a exigida transcendência (= zona de certeza positiva), dependendo, tudo, da situação concretizada e dos seus contornos29.

Ademais, cumpre assinalar que o CPC/2015 impõe que haverá repercussão geral sempre que o recurso atacar decisão contrária à súmula ou à jurisprudência dominante do STF (artigo 543-A, § 3º), independentemente da demonstração da relevância econômica, social, política ou jurídica para além das partes da questão debatida no recurso extraordinário. Como assinalam Marinoni/Mitidiero/Sarlet:

O desiderato evidente aí está em prestigiar-se a força normativa da Constituição, encarnada que está, nesta senda, na observância das decisões do STF a respeito da mais adequada interpretação constitucional. O fito de perseguir a unidade do direito via compatibilização vertical das decisões faz-se aqui evidente30.

Vale dizer, a cada não observância das decisões do Supremo Tribunal Federal carece em força normativa a Constituição, o que deve ser combatido em um sistema de justiça responsivo. A todos interessa seja concretizada a Constituição, adequando-se as decisões, por irrecusável, ao posicionamento da Corte Suprema, que, em sede de repercussão geral, passa a ser enunciado e escrito, inclusive, de forma coletiva.

Insta considerar, por oportuno, que a prática recente do STF, inaugurada com as decisões sobre repercussão geral, é a de que ao final do julgamento de um recurso extraordinário com repercussão geral reconhecida a Corte Suprema fixa uma tese, existindo um debate entre Ministras e Ministros acerca da redação final dessa tese31.

Assim, é no instituto da repercussão geral que a Corte Suprema, por meio das rationes decidendi de seus acórdãos, e de sua veiculação em teses, encontra o veículo processual adequado para decidir as questões constitucionais mais relevantes, sob um

29 ROCHA, Mauro Sérgio. Aplicação direta dos princípios constitucionais: controle de constitucionalidade das decisões judiciais. Porto Alegre: Sérgio Antonio Fabris Editor, 2016, p. 187.

30 MARINONI, Luiz Guilherme; MITIDIERO, Daniel; SARLET, Ingo Wolfgang. Curso de direito constitucional. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2012, p. 843.

31 SILVA, Virgílio Afonso da. Direito constitucional brasileiro. São Paulo: Editora da Universidade de São Paulo, 2021, p. 505.

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viés propositivo, inovador, hábil a solucionar problemas práticos de um determinado contexto social.

2.4. CONCEITOS DE PRECEDENTE, RATIO DECIDENDI E INOVAÇÃO

Para a análise dos dados – teses de repercussão geral –, bem como para se atingir as conclusões do trabalho, a pesquisa ainda conta como referencial teórico a perspectiva apresentada por Marinoni/Mitidiero, de que o Supremo Tribunal Federal é uma Corte de Precedentes, conforme se observa nas obras “Curso de direito constitucional”32; “Recurso extraordinário e recurso especial: do jus litigatoris ao jus constitutionis”33; “Precedentes obrigatórios”34; e, “Cortes superiores e cortes supremas: do controle à interpretação, da jurisprudência ao precedente”35.

De acordo com os autores: “a existência do filtro da repercussão geral está intimamente ligada à transformação do Supremo Tribunal Federal em uma Corte Suprema – isto é, em uma corte de interpretação e de precedentes”36.

A partir desse ponto de vista, torna-se relevante para a pesquisa os conceitos de precedente e de ratio decidendi.

A pesquisa parte do conceito de precedente como:

(...) as razões necessárias e suficientes para solução de uma questão devidamente precisada do ponto de vista fático-jurídico obtidas por força de generalizações empreendidas a partir do julgamento de casos pela unanimidade ou pela maioria de um colegiado integrante de uma Corte Suprema37.

32 MARINONI, Luiz Guilherme; MITIDIERO, Daniel; SARLET, Ingo Wolfgang. Curso de direito constitucional. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2012.

33 MARINONI, Luiz Guilherme; MITIDIERO, Daniel. Recurso extraordinário e recurso especial: do jus litigatoris ao jus constitutionis. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2019.

34 MARINONI, Luiz Guilherme. Precedentes obrigatórios. 6ª ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2019.

35 MITIDIERO, Daniel. Cortes superiores e cortes supremas: do controle à interpretação, da jurisprudência ao precedente. 3ª ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2017.

36 MARINONI, Luiz Guilherme; MITIDIERO, Daniel. Recurso extraordinário e recurso especial: do jus litigatoris ao jus constitutionis. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2019, p. 214.

37 MARINONI, Luiz Guilherme; MITIDIERO, Daniel. Recurso extraordinário e recurso especial: do jus litigatoris ao jus constitutionis. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2019, p. 77.

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De ratio decidendi como: “a universalização das razões necessárias e suficientes constantes da justificação judicial ofertadas pelas cortes de interpretação para solução de determinada questão de um caso”38.

E para verificar se as rationes decidendi dos precedentes são inovadoras ou conservadores, utiliza-se o conceito de inovação extraído do artigo 2º, inciso IV, da Lei 10973/2004, que considera:

Inovação: introdução de novidade ou aperfeiçoamento no ambiente produtivo e social que resulte em novos produtos, serviços ou processos ou que compreenda a agregação de novas funcionalidades ou características a produto, serviço ou processo já existente que possa resultar em melhorias e em efetivo ganho de qualidade ou desempenho.

Acentue-se, por oportuno, que o uso do conceito de inovação está de acordo com a implantação da Agenda 2030 no Poder Judiciário. Essa ideia depende da cultura, do ambiente, enfim, da sociedade do conhecimento. Contudo, nada fará sentido se o foco não for a solução de algum problema, a melhoria de alguma situação social, política pública ou judiciária, ou, ainda, como destaca a definição legal do termo, a melhoria de qualidade ou desempenho de um produto ou serviço.

Esses três conceitos são essenciais para a análise dos dados que será realizada no capítulo 4, para revelar o aspecto qualitativo da motivação dos acórdãos, seja para informar se o tempo de duração do processo, desde a data de autuação até a data de julgamento, deu-se em tempo razoável e se houve indexação do precedente à taxonomia dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável da Agenda 2030.

2.5. ÂMBITO DE PROTEÇÃO DO DIREITO FUNDAMENTAL À MOTIVAÇÃO DAS DECISÕES

Os conceitos de precedente, ratio decidendi e inovação supracitados estão ligados ao direito processual fundamental de motivação das decisões, disciplinada no artigo 93, inciso IX, da Constituição da República.

38 MARINONI, Luiz Guilherme; MITIDIERO, Daniel. Recurso extraordinário e recurso especial: do jus litigatoris ao jus constitutionis. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2019, p. 76.

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Essa norma tem duas funções essenciais. A primeira possibilita a construção de um discurso jurídico a respeito da necessidade de justificação das decisões judiciais, à luz da teoria da motivação das decisões derivada do direito processual fundamental a um processo justo. A segunda, viabiliza a organização de um discurso jurídico a respeito da teoria dos precedentes judiciais obrigatórios, este ligado à unidade do Direito no Estado Constitucional, cuja missão está em orientar condutas sociais e promover a igualdade, a segurança jurídica e a coerência do sistema, sob um viés ultra partes. Nos dois casos a função pública da motivação está presente: justifica-se o exercício do poder e contribui para a evolução do Direito39.

No Estado Constitucional de Direito, para que seja considerada completa e adequada, a motivação de uma decisão judicial exige:

(a) a enunciação das escolhas desenvolvidas pelo órgão judicial para; (a1) individualização das normas aplicáveis; (a2) acertamento das alegações de fato;

(a3) qualificação jurídica do suporte fático; (a4) consequências jurídicas decorrentes da qualificação jurídica do fato; (b) o contexto dos nexos de implicação e coerência entre tais enunciados e (c) a justificação dos enunciados com base em critérios que evidenciam ter a escolha do juiz ter sido racionalmente correta. Em “a” devem constar, necessariamente, os fundamentos arguidos pelas partes, de modo que se possa aferir a consideração séria do órgão jurisdicional a respeito das razões levantadas pelas partes em suas manifestações processuais40.

Diante dessa exigência constitucional a motivação deve apresentar, no mínimo, os seguintes requisitos: (i) integridade, que supõe a adequação do discurso justificativo aos temas que são efetivamente objeto de decisão, afastando-se a excessiva utilização de desnecessários argumentos puramente retóricos e a indicação de fundamentos de duvidosa pertinência com o objeto da decisão; (ii) dialeticidade, pois, se a decisão só pode surgir do exame dos elementos que resultam de atividade e de participação das partes e de terceiros interessados, que visam exatamente influenciar o convencimento do juiz, é evidente que o discurso justificativo da decisão não pode ser algo semelhante a um monólogo; (iii) correção, seja do discurso justificativo, seja do reexame das próprias

39 MARINONI, Luiz Guilherme; MITIDIERO, Daniel; SARLET, Ingo Wolfgang. Curso de direito constitucional. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2012, p. 666.

40 MARINONI, Luiz Guilherme; MITIDIERO, Daniel; SARLET, Ingo Wolfgang. Curso de direito constitucional. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2012, p. 666.

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questões decididas pelo juiz ou pelo tribunal, é imperioso considerar que a correspondência entre os elementos considerados como base da decisão e aqueles efetivamente existentes no processo garante a própria validade da motivação, como garantia de uma cognição judicial efetiva; (iv) racionalidade interna, consistente na inexistência de contradição entre as várias proposições feitas ao longo do discurso justificativo, uma vez que a motivação, globalmente, não deve conter argumentos ou afirmações incompatíveis a respeito do mesmo objeto, ainda se apresentadas em lugares distintos do discurso; (v) racionalidade externa, porquanto, não basta que o raciocínio jurídico não contenha contradições, ele deve fazer sentido como um conjunto para a realização de um ou mais valores comuns41.

As decisões da Corte Suprema, portanto, não deve apenas observar a ordem jurídica. Elas devem ser igualmente fundamentadas: devem evidenciar as decisões interpretativas que são tomadas ao longo do processo de reconstrução da ordem jurídica para a aplicação do direito à espécie e, também, para a outorga de unidade ao Direito42. É com respeito a esse âmbito de proteção da motivação das decisões judiciais que as decisões do Supremo Tribunal Federal devem manter sua vocação expansiva, já que representam a palavra do guardião da Constituição sobre a legitimidade ou não um preceito normativo, apto a incidir sobre número indefinido de situações análogas em sede de repercussão geral43, conforme serão analisados os precedentes selecionados no capítulo 4 deste trabalho.

2.6. ÂMBITO DE PROTEÇÃO DO DIREITO FUNDAMENTAL À DURAÇÃO RAZOÁVEL DO PROCESSO

A responsividade de um sistema de justiça passa, além da concretização do direito à motivação das decisões, pelo direito fundamental à duração razoável do processo.

Também por intermédio da Emenda Constitucional 45/2004, o Congresso Nacional

41 GOMES FILHO, Antonio Magalhães. A motivação das decisões penais. 2ª ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2013, p. 142-152.

42 MARINONI, Luiz Guilherme; MITIDIERO, Daniel. Recurso extraordinário e recurso especial: do jus litigatoris ao jus constitutionis. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2019, p. 275.

43 ZAVASCKI, Teori Albino. Eficácia das sentenças na jurisdição constitucional. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2001, p. 147.

Referências

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